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N°USP 12510300 – Laura Cabrera Alcantara

Tema: Direitos Germânicos

Os Direitos Germânicos: suas principais fontes e características.

Sumário: 1.Introdução. 2. Organização dos povos Germânicos e o Direito Germânico antes


das invasões. 3. As invasões germânicas e a influência do Direito Romano. 4. Fontes do
Direito Germânico 5. Conclusão 6. Fontes Consultadas. 7. Fontes Jurídicas.

1. Introdução

Esse trabalho possui como objetivo caracterizar os direitos germânicos, apresentando


suas singularidades e como ele se expressava anteriormente as invasões germânicas ao
Império romano no século V, além de discutir de qual modo o contato com o Império do
ocidente e com o direito romano, já bem desenvolvido, afetou e influenciou os direitos
germânicos. Também é explicado o modo de vida dos povos germânicos antes das invasões,
citando suas instituições e seus aspectos sociais e familiares.

Além disso, são destacadas e comentadas as principais fontes dos direitos germânicos,
diferenciando-as e relacionando-as a seus respectivos povos formuladores, como os francos e
os visigodos, por exemplo.

2. Organização dos povos Germânicos e o Direito Germânico antes das invasões.

Os povos germânicos, que ainda permaneciam relativamente nômades, habitavam a


área entre o leste do rio Reno e ao norte dos Alpes. No entanto, eles se deslocaram para o
Ocidente, em virtude de outros povos originários da Ásia central e acabaram por invadir o
Império Romano do Ocidente no século V, dando origem aos reinos germânicos1.

Anteriormente as invasões germânicas no Império Romano, durante a época romana,


os povos germânicos possuíam um direito pouco desenvolvido, ainda com características
tribais e arcaicas. Esse sistema jurídico passa a evoluir após as invasões, principalmente na
parte ocidental, uma vez que ele entra em contato e, na época carolíngea, em fusão com os
direitos dos povos romanos.2

Ao que diz respeito à organização sociopolítica dos povos germânicos, antes das
invasões ao Império Romano, é possível dizer que ela era estruturada em forma de clã, que
era chamado de sippe ou fara. Sippe era a família germânica, na qual os seus membros
possuíam, além de lações sanguíneos e ancestrais compartilhados, interesses convergentes,
também estão presentes os escravos. Quem controla o clã é a figura paterna, chamada de
Mund, ele é encarregado de manter a ordem e a paz. Entretanto, mesmo sendo o chefe da
família, o Mund possui poderes limitados em relação ao pater famílias em Roma, tendo os
integrantes da família mais liberdade e capacidade, como, por exemplo, em relação aos
negócios jurídicos. Outra diferença está em que os filhos alcançavam sua plena liberdade e
capacidade ao estarem aptos a utilizarem armas.

Além disso, a família germânica, a sippe ou fara, era formada pelo contrato do
casamento, tendo o esposo, a partir daí, poderes sobre sua mulher. A faida era a luta e a guerra
privada entre os clãs, que tinha como propósito resolver uma ofensa cometida3.

Acerca do Direito dos povos germânicos antes do século V e das Invasões, nota-se que
havia, na realidade, uma pluralidade de direitos e representavam, principalmente os costumes
de diferentes povos germânicos. Não há registros, documentos e livros escritos na época sobre

1
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Página 127)

2
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Páginas 17 e 18)

3
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. Página 162 e Dizionario di Storia del Diritto, Simone, Itália,
2002. (CD de domínio público).Adaptação - Hélcio Madeira.)
tais direitos, mas é lícito postular que eram direitos consuetudinários, ou seja, baseados
fortemente dos costumes. Pela ausência de registros, utilizou-se para o estudo dos direitos dos
povos germânicos literaturas latinas, como Tácito, lendas germânicas, as leges barbarorum (
redigidas após as invasões) e os costumes escandinavos4.

3. As Invasões Germânicas e a influência do Direito Romano

No século V, o Império Romano do Ocidente cai em ruína, visto as Invasões


Germânicas ocorridas nesse contexto. Assim, os Visigodos, povo germânico, adentram a
península itálica pelo Norte, saqueiam Roma e estabelecem um reino com capital em Toledo.
Eles são acompanhados por outros diversos povos germânicos que criam seus próprios reinos.
Neles, que, agora, eram habitados por germanos e romanos, se mantém a importância dos
costumes e da sippe, dos clãs, mas, ao mesmo tempo, a influência Romana permanece alta,
com a manutenção de aspectos do direito romano. Na organização sociopolítica, nota-se a
existência de assembleias com características formalistas, observadas por Tácito5.

No entanto, a partir do contato com o Império do Ocidente, as estabelecidas normas de


agir sofrem alterações e os povos germânicos, principalmente os chefes dos clãs, se
interessam pelo legado do ordenamento jurídico deixado por Roma, esse interesse era
justificado pela maior possibilidade de asseguração do poder, em que o soberano possuía
autoridade absoluta. O primeiro sinal da influência do Direito Romano nos direitos
germânicas baseados em costumes são as "leges barbarorum", conhecidas como leis
populares6.

Desse modo, percebe-se uma distinção entre as Leis Romanas, ou seja, leis no direito
germânico que possuíram influência do sistema jurídico de Roma e as Leis Germânicas, que
representavam a influência dos costumes e do direito dos povos germânicos. As primeiras

4
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Páginas 162, 163 e 164.)

5
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Página 166.)
6
AZEVEDO, L. C. de. O direito visigótico. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de
São Paulo, [S. l.], v. 96, p. 3-16, 2001.
possuem, como exemplos, o Edictum Theodoricii, Responsa Papiani e Breviarum
Alaricianum. Já a segunda, pode ser exemplificada pela Lex Salica, pela Lex Ripuaria, pela
Lex Alamanica, pela Lex Borgundionum e pela Lex Longobardorum. A maior distinção entre
elas era que, enquanto as Leis Romanas eram aplicadas de forma geral, as Germânicas
seguiam o sistema de personalidade.7

Esse sistema de personalidade funcionava da seguinte maneira: cada grupo social


distinto, como os germânicos e os romanos, seguiam o seu próprio direito, assim, o fator
determinante era a etnia, não o território. Esse princípio foi aplicado uma vez que os direitos
dos povos germânicos não correspondiam ao mesmo grau de evolução do direito romano. Nos
casos em que era necessário resolver uma problemática envolvendo um germânico e um
romano, era levado em consideração, na maioria dos casos, o direito seguido pelo réu8.

A Influência Romana também pode ser percebida no ato de certos reis germânicos
estabelecerem o uso de compilações do direito romano aos seus juízes aplicando-as aos seus
reinos. Os Visigodos, por exemplo, fizeram grande uso da compilação: O Breviário de
Alarico, que contia trechos das Institutas de Gaio e do Código Teodosiano. 9

Portanto, é possível concluir que o direito romano sobreviveu ao desmantelamento do


Império do Ocidente graças a sua influência nos direitos germânicos, desenvolvida pelo
interesse dos reis em assegurar sua autoridade, e ao princípio de personalidade. Dessa forma,
os povos germânicos não só preservaram o direito romano como colaboraram para sua
evolução, formando-se o direito romano vulgar. No entanto, é importante ressaltar que, apesar
da convivência, por causa das diferenças religiosas, não houve completa fusão entre
germânicos e romanos.10

7
A. Cunha Lobo, Curso de Direito Romano, O DIREITO CANÔNICO E O DIREITO
GERMÂNICO. (Página 532)

8
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Páginas 168 e 169)

9
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Página 170)

10
BRUNNER, M. C. Lex Salica. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo,
[S. l.], v. 111, p. 409-425, 2017.
4. Fontes do Direito Germânico

Como já mencionado antes, os direitos germânicos antigos, antes das invasões, eram
baseados fortemente no costume e não deixou nenhum registro em escrito. Assim, as suas
fontes podem ser estudadas principalmente a partir das legislações fabricadas após o contato
com o Império do ocidente.

As primeiras fontes a serem citadas são as leis decorrentes do direito romano vulgar
reduzido a escrito, que foram denominadas leges romana barbarorum, que incluíam a lex
Romana Burgundiorum (Lei Romana dos Burgúndios); a lex Romana Visigothorum (Lei
Romana dos Visigodos) e o Edito de Teodorico (aplicável aos Ostrogodos).

A segunda fonte do direito germânico a ser analisada são as Leges Barbarorum, que
eram o modo pelo qual os povos germânicos estabeleceram e conservaram suas normas
vindas dos seus costumes e tradições. Nas Leges Barbarorum estão inclusas - Lex Salica, Lex
Ripuaria, Lex Chamavorum, Lex Borgundionum, Lex Allamanorum, Lex Wisigothorum
(Código Euriciano), Leges Longobardicai, Lex Thuringorum, Capitularia, Sachsenspiegel e
Schwabenspiegel.

Dando maior destaque para a Lex Sálica, uma vez que é a expressão do direto
germânico mais memorável. Nota-se que ela é originária dos Francos Sálios, sendo, em um
primeiro momento, produzida em sua língua para depois ser traduzida para o latim ao longo
das diversas revisões a que foi exposta. Seguindo o princípio de pessoalidade das leis, a Lei
Sálica era aplicada aos Francos Sálios. Nela, os conteúdos são, em sua maioria, de cunho
penal, uma vez que a sociedade de onde se originou era marcada por violência e roubos
relacionados ao aspecto agrário. Assim, ela prevê diversos crimes e suas penas. 11. Há um
entendimento que julga que alguns de seus títulos, com influência romana, possuem como
finalidade evitar a faida. 12 Sua importância pode ser observada no caso ocorrido na França,
em que ela foi utilizada para não permitir que a sucessão do trono fosse para uma mulher.

11
BRUNNER, M. C. Lex Salica. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo,
[S. l.], v. 111, p. 409-425, 2017.

12
BRUNNER, M. C. Lex Salica. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo,
[S. l.], v. 111, p. 409-425, 2017.
Ainda comentando sobre os Francos, a Lex Ripuaria, ou Lei Ripuária, foi uma obra
desenvolvida pelos Francos ripuários, ela era baseada na Lei Sálica, sendo ela uma
“organização” do conteúdo exposto na Lei Sálica, recebendo influência do direito romano.13.

Focando, agora, no reino dos Visigodos, suas fontes eram, além do direito vulgar,
compilações como o "Código de Eurico", em que se notava a fusão de aspectos do Direito
Romano com costumes germânicos, o "Edictum Theodorici" e o Breviário de Alarico, já
citado14. Essas leis são denominadas Lex Wisigothorum.15. O direito visigótico foi
romanizado rapidamente após o contato com o direito romano, desse modo, o direito
costumeiro com base nos direitos germânicos prevaleceu apenas para as classes inferiores. 16

Sobre o Código de Eurico, era um agrupamento de todas as leis visigodas destinadas


aos súditos dos dominadores da maior parte da Península Ibérica cunha lobo, entende-se que
ele demostra como o direito romano funcionava na prática para os Visigodos. No entanto,
esse código demonstrava, pelo seu caráter pouco sofisticado, as diferenças existentes com o
direito romano. 17

Discutindo as Leges Longobardicae, ou seja, as leis dos lombardos, destaca-se o


Edictum Rotharis, que representa a compilação de costumes germânicos mais completa,
contribuindo fortemente para a sobrevivência do direito germânico na Itália18

Outra fonte de destaque são as Capitulares, que iam contra o princípio de


personalidade do direito, aplicando-se a todos do Império, no contexto da monarquia franca,

13
A. Cunha Lobo, Curso de Direito Romano, O DIREITO CANÔNICO E O DIREITO
GERMÂNICO. (Página 536)

14
AZEVEDO, L. C. de. O direito visigótico. Revista da Faculdade de Direito, Universidade
de São Paulo, [S. l.], v. 96, p. 3-16, 2001.
15
A. Cunha Lobo, Curso de Direito Romano, O DIREITO CANÔNICO E O DIREITO
GERMÂNICO. (Página 538)

16
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Página 175)

17
A. Cunha Lobo, Curso de Direito Romano, O DIREITO CANÔNICO E O DIREITO
GERMÂNICO. (Página 538)

18
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Página 176)
elas eram atos legislativos dos monarcas19. As Capitulares podem ser divididas em: 1.
Capitulares eclesiásticas. 2. Capitulares laicas. 2.1. Capitulares com valor de lei. 2.2.
Capitulares direcionadas aos delegados. 2.3. Capitulares como conjunto de artigos. Os
conteúdos delas eram, em sua maioria, de caráter administrativo20.

5. Conclusão

Após a análise feita nos tópicos anteriores, é possível a redação de uma conclusão
sobre os direitos germânicos, seus aspectos principais, suas fontes e a influência do direito
romano.

Portanto, conclui-se que os direitos germânicos eram pouco desenvolvidos,


representando apenas os costumes dos povos germânicos, podendo ser caracterizado como
arcaico, na época dos clãs, anterior as invasões, havendo falta de documentos escritos para o
seu estudo. É feita, também, uma breve descrição das estruturas sociais e familiares dos
germânicos nessa época, notando o destaque da figura paterna, do chefe do clã.

Além disso, vê-se que após as invasões dos povos germânicos no império do ocidente,
formaram-se reinos, nos quais havia uma fusão entre os costumes germânicos e a influência
do direito romano, já bem mais desenvolvido. Também, entende-se que pelo estabelecimento
do princípio da personalidade, foi possível a permanência e sobrevivência do direito romano.

Sobre as fontes dos direitos germânicos, depreende-se que diferentes reinos


desenvolveram diferentes fontes, leis e compilações, em sua maioria, trazendo influência dos
costumes germânicos e do direito romano.

19
A. Cunha Lobo, Curso de Direito Romano, O DIREITO CANÔNICO E O DIREITO
GERMÂNICO. (Página 542.)

20
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1995. Capítulo 4. (Página 181.)
6. Fontes consultadas

A. Cunha Lobo, Curso de Direito Romano, O DIREITO CANÔNICO E O DIREITO


GERMÂNICO.

GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 2ª edição, Fundação Calouste Gulbenkian,


1995.

AZEVEDO, L. C. de. O direito visigótico. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de


São Paulo, [S. l.], v. 96, p. 3-16, 2001. Disponível em:
https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67491.
file:///C:/Users/Laura/Downloads/67491-Texto%20do%20artigo-88913-1-10-20131125.pdf

BRUNNER, M. C. Lex Salica. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo,


[S. l.], v. 111, p. 409-425, 2017. Disponível em:
https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/133519. Acesso em: 27 out. 2021.

7. Fontes Jurídicas

Lei Sálica (séculos VI-IX) - disponível em


https://www.dmgh.de/mgh_ll_nat_germ_4_2/index.htm#page/(IV)/mode/1up

Código de Eurico - disponível em


https://www.boe.es/biblioteca_juridica/abrir_pdf.php?id=PUB-LH-2014-1

Lei Ripuária - disponível em


https://www.dmgh.de/mgh_ll_nat_germ_3_2/index.htm#page/(6)/mode/1up

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