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Revista Pontes, Paranavaí, 2020, v. 8, p.

63-74 – ISSN 1808-6462

A ÉTICA ARGUMENTATIVA HOPPEANA

Taiane da Silva Copello1

Resumo: Neste artigo pretendo explicar a Ética Argumentativa de Hans-Hermann Hoppe,


filósofo da Escola Austríaca, que buscou justificar os direitos naturais do indivíduo. Para isso,
explicarei passo-a-passo as influências de outros pensadores, como Ludwig Von Mises e John
Locke, na ética hoppeana bem como irei expor os problemas suscitados na mesma, levando a
conclusão de que a norma de propriedade é a única ética capaz de evitar conflitos.

Palavras-chave: Ética. Argumento. Norma. Propriedade.

THE HOPPEAN ETHICS OF ARGUMENTATION

Abstract: In this article I intend to explain the Ethics of Argumentation of Hans-Hermann Hoppe,
philosopher of the Austrian School, who sought to justify the individual's natural rights. To do
so, I will explain step by step the influences of other thinkers, such as Ludwig Von Mises and
John Locke, on Hoppean ethics as well as I will expose the problems raised in it, leading to the
conclusion that the property rule is the only ethics capable to avoid conflicts.

Key-words: Ethics. Argument. Law. Property.

1. Introdução

Hans-Hermann Hoppe, um filósofo alemão da Escola Austríaca de Economia, entendia a


ética como um sistema normativo do certo e do errado. Em seu entendimento, para encontrarmos
a fonte do nosso direito é necessário usar da nossa razão para descobrirmos qual é o nosso dever

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Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Rio de Janeiro - RJ, Brasil. Email: taiane.copello@gmail.com

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e nosso direito com a finalidade de evitar conflitos. Os conflitos são disputas por recursos
escassos, objetos físicos os quais são impossíveis de serem usados para fins excludentes.
Tomemos como exemplo uma maçã: ela pode ser usada para fazer um suco de maçã ao passo que
esta também seria usada para ser comida na sua forma original? Se a sua resposta for não, você
entendeu a escassez. Os conflitos são gerados por existir escassez no mundo. Uma vez em que há
insuficiência de recursos para todos, seria plausível sustentar que uns podem agredir os outros
tentando apropriar os recursos para si. Ora, isto geraria certo desconforto para aqueles que vivem
neste mundo, por isso é necessário evitar conflitos. Mais a frente entenderemos sobre a natureza
humana, que age propositadamente para buscar maior conforto.

Nesse sentido, há uma forma de evitar esses conflitos se uma norma for seguida:
respeitando-se a norma de propriedade; o que Hoppe sustenta como tese é que isso é uma condição
transcendental da própria ação argumentativa. Pois nossa argumentação exige controle de uso
exclusivo sobre nosso próprio corpo. Falarei mais adiante sobre o que é uma condição
transcendental e porque este uso de controle exclusivo do corpo e de objetos extensos ao corpo,
como no exemplo da maçã, é uma condição transcendental inerente à natureza do indivíduo, bem
como isso é demonstrado no ato interpessoal de argumentar.

2. A Natureza da Escassez

Nenhum objeto físico pode ocupar o mesmo espaço. Objetos físicos têm uma natureza de
tal modo que aquelas partículas só podem ser usadas para um fim, pois se outro fim contraditório
fosse usado simultaneamente este objeto precisaria se dividir em dois. A escassez é uma certa
impotência ou impossibilidade nos seres sensíveis de limitação material. E isso ocorre não só nos
animais, sejam eles racionais ou irracionais como nas coisas que possuem matéria. Mas não é só
em objetos físicos que se encontra a escassez, apesar da escassez ser sempre inerente a eles. Uma
exceção à isso seria seria o tempo. Ele é um recurso escasso porque todos os seres sensíveis um
dia perecem. Hoppe explica que:

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Eu não tenho a abundância de corpos que me permitiria aproveitar, simultaneamente,


todas as satisfações possíveis num único momento êxtase. Num outro aspecto, eu
também estaria limitado pela escassez: na medida em que esse recurso escasso
chamado de "corpo" não é indestrutível e nem equiparado com saúde e energia
eternas, mas um organismo com apenas um tempo um tempo de vida limitado, o
tempo também é escasso. O tempo utilizado para buscar o objetivo A reduz o tempo
disponível para perseguir outros objetivos. E quanto mais tempo se gasta para atingir
o resultado desejado, maiores serão os custos envolvidos na esfera e maior deve ser a
satisfação esperada para justificar esses custos. (HOPPE, 2013, p. 23).

No entanto, para entender melhor a escassez, não somente do tempo, mas como um todo,
é preciso conhecer a ação humana.

3. A Praxeologia

Nesse sentido, Ludwig Von Mises [1], foi quem descobriu a ciência da ação humana por
ele denominada Praxeologia (praxis = ação e logia = ciência). Esse campo de estudo busca
entender as relações dos indivíduos na economia, em suas relações de troca diante da escassez.
Na introdução de sua obra “Ação Humana: Um Tratado de Economia” defendeu que:

Ao fazer sua escolha, o homem escolhe não apenas entre diversos bens materiais
e serviços. Todos os valores humanos são oferecidos para opção. Todos os fins e todos
os meios, tanto os resultados materiais como os ideais, o sublime e o básico, o nobre
e o ignóbil são ordenados numa sequência e submetidos a uma decisão que escolhe
um e rejeita outro. Nada daquilo que os homens desejam obter ou querem evitar fica
fora dessa ordenação numa escala única de gradação e de preferência. A moderna
teoria de valor estende o horizonte científico e amplia o campo dos estudos
econômicos. Da economia política da escola clássica emerge a teoria geral da ação
humana, a praxeologia. (MISES, 2010, p. 23).

Em outras palavras, para Mises, a economia é a ação humana dos indivíduos diante da
escassez. Pois algo só é atribuído preço por possuir uma demanda e os recursos não serem

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superabundantes, podendo ser consumidos por todos. O que move a economia são os próprios
indivíduos, com as suas preferências, custos, tempo, valores e trocas – embora ele tenha afirmado
que a ação humana não está apenas baseada na busca dos bens materiais e serviços. E essa parte
também possui serventia para entendermos o a priori da argumentação mais adiante.

Primordialmente, o que fundamenta a Praxeologia é o axioma da ação [2], i.e., ao agir,


todo indivíduo busca sair de um estado de menor conforto, para um de maior conforto, de acordo
com a sua vontade. Supondo que alguém tente refutar o axioma, ainda sim este alguém o
confirmaria, uma vez que foi preferível agir em função de tentar refutar o axioma – por alguma
razão, não importa qual, o indivíduo sentiu que estaria em uma posição melhor refutando-o. Dado
que o agente que discorda do axioma possui outros fins e outros meios que são disponíveis para
agir, e este opta por tentar refutar o axioma, acaba por o confirmar. Assim, aquele que negar a
proposição “todo indivíduo ao agir busca sair de um estado de menor conforto para passar para
um de maior conforto” cairá em contradição performática, na qual você contradiz as condições
transcendentais para aquilo ser dito.

Mas se faz necessário também investigarmos o que é a vontade, posto que a ação humana
é colocada em prática através desta. Sendo assim, dado axioma da ação, julgamos que um estado
possui uma satisfação maior (exemplo: jogar basebol é melhor do que ficar em casa) porque a
vontade motiva o indivíduo na sua busca de atingir seu fim, que é este mesmo objeto da vontade,
o qual, no dado exemplo é o jogo de basebol. A vontade, para Mises, é a resposta aos estímulos
do ego, do ‘eu’. Possuindo uma vontade, o indivíduo irá alocar aquilo que ele considera como
melhores meios para o alcance do seu fim, aquilo que ele sente vontade. Sendo assim, a ação
humana é a vontade posta em funcionamento.

Nesse contexto, é válido distinguir o que a ação humana não é do que a ação humana de
fato é. Ela não é qualquer mudança corporal, pois se alguém me derrubar no chão, esta mudança
não dependeu de mim. Essa alteração que se dá no corpo acidentalmente não é uma ação
praxeológica. A ação humana é uma mudança de corpo se, e somente se, esse comportamento for
propositado pela vontade do agente. Portanto, tendo em vista a vontade como aquilo que dá
propósito, a ação humana é definida como a vontade posta em funcionamento. Ação humana é
sempre um comportamento propositado. Todavia, a ação humana dos indivíduos possui potencial

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de estar propício a conflitos. E de onde vem esses conflitos? Como eles são gerados? E o que
afinal eles são?

4. A Origem dos Conflitos

Conflitos, segundo Hans-Hermann Hoppe, são disputas por recursos escassos. Dado que
a natureza destes objetos não os permite serem utilizados para fins excludentes, os indivíduos
podem tentar se apropriar destes recursos com aspirações distintas uns dos outros. A escassez é a
origem de todos os conflitos humanos. É pela própria natureza desta que fica evidente essas
disputas. Se houvesse uma superabundância paradisíaca de bananas não haveria nenhuma disputa
pois seu desejo de consumi-la seria ilimitado. Para saciar cada conforto, bastaria apenas estender
a mão e tomar para si aquilo o qual deseja. Não seria necessário alguém empreender esforços para
disputar quem vai ficar com cada banana. Todavia, a escassez é presente em nosso mundo, pois
até mesmo no Jardim do Éden, exemplo supracitado por Hoppe, conquanto existiria uma
superabundância de coisas, o tempo seria presente na natureza dos seres humanos Adão e Eva,
bem como seus próprios corpos - e então haveria algo necessário para evitar conflitos. Mas por
quê evitar conflitos? Dada a natureza da ação humana como comportamento propositado, o
sentido da nossa ação é por vezes excludente com o de outras pessoas. Os conflitos atrapalham
essa busca de felicidade que é alcançar nosso propósito. Se eu ajo em função do seu desconforto,
nada te impediria de fazer o mesmo com os outros. Mas pelo princípio de universalização de
Hoppe, se todos fizessem isso, de disputar por recursos escassos, não haveria como alcançar
propósito na ação humana, ainda que isso faça parte da natureza de cada um. A harmonia do
propósito da ação humana é, portanto, encontrar algo que evite esses conflitos.

5. O Conceito de Propriedade

A única função da propriedade é evitar conflitos. O surgimento desse conceito de


propriedade se dá através de uma escassez de bens. Caso ela não existisse, todos os bens seriam
chamados de "bens gratuitos", cujo uso destes as pessoas não excluísse a finalidade do uso de
outras pessoas. Entretanto, de maneira já supracitada de antemão, o uso entre as pessoas pode ser

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excludente, daí se segue que o respeito à propriedade seria necessária. Ora, o conceito de
propriedade é o controle de uso exclusivo sobre bens escassos com o fim de evitar conflitos.

A propriedade é, dessa forma, um conceito normativo, concebido para tornar possível


uma interação livre de conflitos pela estipulação de regras de conduta (normas)
mútuas e vinculativas em relação aos recursos escassos. (HOPPE, 2013, p. 22).

6. O a priori da argumentação

A argumentação é uma troca proposicional com o telos [3] de evitar conflitos e de resolver
discordâncias. Dado o axioma da ação, todos os indivíduos ingressam numa argumentação porque
estão buscando um conforto maior. Na argumentação essa busca é saciada ao passo que os
indivíduos estão buscando justificar seu valor-verdade, i.e., apresentar seu argumento. Busca-se
tentar convencer o outro de forma pacífica a perceber que está errado e mudar de opinião.

Nesse sentido, é imprescindível constatar que estes possuem autopropriedade sobre seus
próprios corpos, já que para ingressar numa argumentação é necessário possuir controle de uso
exclusivo sobre os meios alocados para o alcance do seu fim. O corpo será um meio alocado bem
como a sua comunicação para transmitir as ideias expostas durante o procedimento
argumentativo. E, uma vez já demonstrado o axioma da ação, não agimos sem a vontade de
alcançar maior satisfação - o que torna nossa ação um comportamento propositado. Além disso,
na argumentação não existem conflitos já que se trata de uma interação interpessoal propositada
pelos agentes. Isso implica, obviamente, que não há agressão. Não está sendo disputado um objeto
escasso por meio do uso da força. Isso trás a tona que é possível uma ação livre de conflitos.

Podemos, a partir disso, extrair uma ética, sistema normativo que legitima ações como
certas ou como erradas, porque na argumentação a lei de autopropriedade é respeitada por ambos
os indivíduos que não estão se agredindo e sim respeitando o uso de controle exclusivo do corpo
do indivíduo. Sendo assim, foi abdicado o uso dos meios de agressão em provisão dos meios de
ação onde se respeita a propriedade privada. É impossível portanto, argumentar validamente a
favor da agressão sem incorrer numa contradição performativa.

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Enquanto o exercício ocorre há um link objetivo intersubjetivamente determinado que é


esta troca de proposições objetivas, sendo toda troca uma atividade interpessoal já que é
impossível trocar algo se não houver quem trocar - pela própria ideia de uma troca, i.e. um acordo
de associação com o outro. É por essa razão que dá uma intersubjetividade da ação: ela é
determinada por indivíduos distintos, tendo corpos e pensamentos diferentes que se inter-
relacionam um com o outro voluntariamente. Hans-Hermann Hoppe afirmou: “Somente se houver
pelo menos um reconhecimento implícito do direito de cada indivíduo sobre a propriedade de seu próprio
corpo é que pode haver argumentação”. (HOPPE, 2013, p. 129).

Como já mencionou Hoppe, existe um reconhecimento implícito do direito de cada um a


respeito da autopropriedade já que há interação livre de conflitos. Um direito é uma garantia
inviolável por outrem prescrita sob uma norma capaz de evitar conflitos se for seguida por todos.
Você reconhece esse direito do outro ao argumentar pacificamente em busca de alcançar seu telos
de resolução de discordâncias.

Ainda que se discorde sobre o conteúdos dos argumentos que estão sendo propostos, há
concordância de que ambos discordam um do outro na argumentação. É isso que torna a
argumentação uma interação livre de conflitos. Segundo Hoppe:

Dizer isso [que é possível sempre discordar da validade do que foi dito] não é nada
mais do que o reconhecimento mútuo de que o controle exclusivo de cada pessoa
sobre seu próprio corpo deve estar pressuposto enquanto houver argumentação.
(HOPPE, 2013, pp. 129).

É impossível negar este fato, afirmando que sua negação seja verdadeira, sem
implicitamente ter que admitir sua verdade.

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7. A Apropriação Originária

Mas como não é somente sobre o corpo que há ameaça de conflitos, mas também sobre
objetos extensos ao corpo, é necessário haver propriedade sobre eles. Todavia, como definir quem
é o dono legítimo? Para demonstrar isso, Hoppe foi influenciado pela Teoria Lockeana da
Apropriação Original. Essa teoria consiste na regra do primeiro-que-usa-é-o-primeiro-que-possui.
Imaginemos um terreno inabitado: tal não pertence a nenhum indivíduo, então, o que impede um
indivíduo x de usá-lo? Nada, pois a sua atividade com aquele espaço não irá agredir ou sequer
causará problemas a alguém. Mas se posteriormente chegar outra pessoa, indivíduo y, e usar o
mesmo espaço já usufruído por x, querendo estipular outras regras ou usar de outros modos este
mesmo espaço que x já usava de antemão, passará a haver problemas. E o mesmo com uma
suposta terceira pessoa, ou quarta, e assim ad infinitum [4]. Quem deve ficar com a propriedade,
segundo John Locke [5], é o primeiro que usou, justamente em decorrência do fato de que se fosse
do segundo em diante, estes posteriores entrariam em conflito com os anteriores pela tomada da
propriedade, bem como o primeiro que usou foi o único capaz de usá-la quando não havia como
agredir alguém.

Uma importante questão suscitada é se podemos ou não nos apropriar de todo o espaço
que quisermos no mundo e o que delimita isso, ou até mesmo se há limites. Ora, segundo Murray
N. Rothbard [7] e até mesmo para o próprio Locke, é necessário misturar o seu trabalho com
aquilo o qual está se apropriando. Misturar seu trabalho consiste em usar aquele território. Por
exemplo, numa terra inabitada, o proprietário desta pode misturar seu trabalho delimitando o
espaço usado por uma cerca. Isso evitaria o conflito de outra pessoa, que não identificou que o
território já pertencia a alguém, use a propriedade. Caso não acontecesse nenhuma demarcação,
o culpado seria aquele que autodeclarou posse, mas não misturou seu trabalho.

Declarações não são suficientes e também não valeriam de nada se não houvesse mistura
de trabalho durante a apropriação das terras, já que isso permitiria possíveis conflitos com os
próximos habitantes. O mesmo serviria para a apropriação de outros objetos não-territoriais, mas
que ocupam lugar no espaço. Segundo Hoppe, o direito à autopropriedade é demonstrado ação

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argumentativa pelo reconhecimento mútuo implícito desta atividade interpessoal livre de


conflitos.

8. Os Contratos

Não é somente por meio da origem que se pode se tornar um proprietário legítimo. Se o
homem é o dono legítimo de uma propriedade ele é livre para fazer o que quer com ela, tanto
permanecer com ela, quanto dar a alguém e se livrar dela. Ora, certamente seria uma agressão eu
me livrar de um bem lançando-o na propriedade de outra pessoa. Um lixo jogado no quintal do
vizinho contra o consentimento dele certamente viola sua propriedade e trará um conflito. A
forma pacífica de se fazer isso seria por meio de acordos voluntários, ou seja, de contratos. Os
indivíduos os quais estão envolvidos no contrato devem se decidir qual propriedade será trocada.

Mas há ainda uma terceira forma de se abrir mão de títulos de propriedade: A doação. Um
proprietário pode não ter interesse em obter algo em troca de seu bem, e não há conflito presente
nisso. Supondo que este está prestes a morrer e escreve um testamento; ele nada poderá mais
possuir debaixo da terra, quando estiver morto, então pode transferir seus títulos de bens de
propriedade para terceiros.

No que diz respeito à legitimidade das trocas, é imprescindível destacar que na ação
argumentativa, há troca proposicional, i.e., de proposições. Isso faz parte da estrutura analítica da
argumentação, como já foi supracitado neste texto na seção 6. Também já demonstramos que esta
ação tem um intuito de resolver discordâncias sem causar conflitos. Ora, os contratos são trocas
voluntárias, portanto, é ético fazer estas trocas já que elas não agridem ou causam conflitos entre
indivíduos. Trocas são links intersubjetivamente determináveis de recursos escassos porque
ocorre uma determinação de recursos numa atividade entre duas pessoas ou mais, uma interação
interpessoal. Uma apropriação originária, por sua vez, é um link objetivo indireto, uma vez
pressuposto que para se apropriar é necessário agir tendo, primordialmente, a autopropriedade,
que a partir de uma ação irá se apropriar de objetos escassos que não estão sendo ocupados por
outrem.

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Nem todas as apropriações podem ser justificadas pois nem todas elas podem ser feitas de
forma pacífica, mas ao passo em que se apropria originalmente de algo ou se entra em acordos
voluntários com alguém isso não gera conflito e é argumentativamente justificado.

9. Considerações Finais

Portanto, concluo que a ética de propriedade é a única capaz de evitar conflitos se for
seguida por todos. Um indivíduo não consegue negar isso sem cair em contradição performática,
pois está implícito na sua argumentação que você é dono do seu próprio corpo. Essa ética também
pode ser chamada de ética libertária, pois uma sociedade que respeitasse a ética de propriedade
seria uma sociedade anarcocapitalista, na medida em que o Estado é um monopólio coercitivo do
uso da força por natureza, o qual não realiza contratos e trocas em seu modus operandi [8]. A
ética libertária é o respeito total aos direitos naturais de propriedade privada dos indivíduos. Sendo
assim, essa sociedade com base na ética seria uma sociedade com iniciativas privadas, voluntárias
e contratuais, evitando o uso da força e os conflitos entre indivíduos não agressivos.

[1] Economista da Escola Austríaca de Economia que escreveu Ação Humana.

[2] Valendo ressaltar que denomina-se por axioma uma sentença primitiva.

[3] “Telos” significa finalidade.

[4] Termo grego que significa ‘finalidade’.

[5] Termo latino que significa ‘até o infinito’.

[6] Filósofo moderno do liberalismo clássico que escreveu Dois Tratados do Governo Civil.

[7] Economista e filósofo da Escola Austríaca de Economia que escreveu A Ética da Liberdade. Rothbard é o pai do
Anarcocapitalismo.

[8] “Modus operandi” significa modo de operar.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Daniel Chaves Claudino. Instituto Ludwig Von Mises Brasil. The Foundation of Modern
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POLLEIT, T. O apriorismo de Mises contra o relativismo nas ciências sociais. Instituto


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Disponível em <https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1464>. Acesso em 14 de junho de
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HOPPE, H.H. Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo. 2º Ed. São Paulo – SP: Ed.
Instituto Ludwig Von Mises Brasil, 2013.

HOPPE, H. H. Economics and Ethics of Private Property. 2º Edição. Auburn, Alabama:


Ed. Ludwig von Mises Institute, 2006.

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da Costa. 1ª Edição. Ed. Edipro, 2014.

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KINSELLA, N. S. Contra a Propriedade Intelectual. Tradução de Rafael Hotz. Revisão


de Paulo Cossari. 1º Edição. São Paulo: Instituto Ludwig Von Mises Brasil, 2010.

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