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CAPÍTULO

INTRODUÇÃO AOS
EXAMES BIOQUÍMICOS
Na prática clínica do Nutricionista, os exames laboratoriais são uma
ferramenta de extremo valor, tornando possível ao profissional melhor
compreender e avaliar aspectos individuais do paciente. No qual por meio
do uso correto dos exames bioquímicos pode-se analisar as condições
inicias de saúde do indivíduo e monitorar as respostas fisiológicas quanto
a introdução do acompanhamento nutricional. Dessa maneira, é essencial
que o Nutricionista esteja apto para lidar com esse material em mãos,
tornando-se seu papel não apenas requisitar exames laboratoriais, mas
também conhecer profundamente suas particularidades, aspectos e
justificativas.

Fora isso, ainda deve ficar claro que o Nutricionista esta amparado
legalmente quanto a solicitação de exames laboratoriais segundo a Lei
Federal 8234/91, Art. 4º, Inciso VIII e Resolução CFN 306/03.
Entretanto, também deve ser dito que a requisição laboratorial deverá
estar de acordo com a alçada do nutricionista, atendendo pontos como:

Servir como base para o profissional de Nutrição melhor compreender


o status de saúde do indivíduo, direcionando a conduta dietética.
Avaliar os impactos metabólitos e fisiológicos do plano alimentar no
organismo do indivíduo.
Requisitar exames laboratoriais que estejam de acordo com a alçada
do Nutricionista quanto a intervenções, não justificando marcadores
bioquímicos que ultrapassem o limite da profissão.

Dessa forma, nesse material serão apresentadas informações técnico-


científicas e práticas quanto ao embasamento profissional dos exames
laboratoriais. Sendo abordado desde seu papel no cenário clínico a até
mesmo sua utilização em meio ao ambiente da Nutrição esportiva, afim de
garantir que após a leitura desse conteúdo, você estará mais preparado
para usar dessa ferramenta de extremo valor em sua rotina profissional.
QUAL IMPORTÂNCIA?

Na prática, os exames laboratoriais são uma forma objetiva de avaliação


do indivíduo/atleta utilizado para detectar desde deficiências nutricionais a
interpretação avaliativa do funcionamento do organismo, analisando ainda
de forma complementar o risco para doenças.

Saúde metabólica analisada, com lacunas


identificadas
Deficiências nutricionais avaliadas e corrigidas
Monitoramento da resposta fisiológica do
indivíduo

Com exames bioquímicos

Ausência da compreensão das necessidades do


paciente
A conduta foi eficaz para o paciente? Corrigindo
necessidades?
Quais foram as repercussões fisiológicas?

Sem exames bioquímicos

Atualmente no mercado de exames bioquímicos temos


aproximadamente 4000 testes possíveis de serem realizados a fim de
investigar pontos da fisiologia humana, conduzindo a em média 70% das
decisões clínicas sendo tomadas a partir dos resultados obtidos.
Entretanto, em meio a tantas opções, é normal por parte de profissionais
da saúde demonstrar dúvidas quanto a quais exames solicitar, quais
devem ser analisados e interpretados em conjunto, como e até mesmo
quando solicitar.

Deixando claro que a solicitação de exames laboratoriais deve ser


desenvolvida de maneira objetiva, visando esclarecer lacunas na avaliação
do paciente, não sendo necessário a solicitação de exames desenfreada.
COMO SOLICITAR?

Para solicitação dos exames laboratoriais é necessário que sejam


levados em consideração alguns pontos e questionamentos sobre a
mesma, tendo em mente os princípios de necessidade, aplicabilidade,
relevância ao tratamento, viabilidade financeira e validade científica. Assim
algumas perguntas que devem ser realizadas antes da solicitação de
exames poderiam ser:

ANTES DA REQUISIÇÃO!
Esse exame realmente é necessário?

Os parâmetros avaliados estão de acordo com a


minha conduta?

O resultado desse exame irá alterar minha


conduta clínica?

Esse exame vai apresentar custos ao meu


paciente?

Esse exame apresenta embasamento


científico comprovado?

Após se perguntar sobre esses pontos e ocorrida a solicitação, agora é


papel do Nutricionista realizar a interpretação adequada dos resultados
encontrados. No qual como será discutido detalhadamente logo, a visão
do profissional sobre os exames deve ser executada de maneira integrada,
englobando os valores de diferentes marcadores de maneira conjunta
pois só assim irá possibilitar ao profissional a melhor compreensão do
estado de saúde e funcionamento do organismo do indivíduo em questão.

Lembrando que ética, bom senso e responsabilidade também são


elementos que devem essencialmente estar presentes no momento de
requisição, respeitando limites profissionais e do paciente.
Fora isso, na prática, a requisição de exames deve ser realizada
conforme um padrão pré estabelecido, principalmente a partir de um
receituário contendo elementos como data, nome do paciente, indicação
clínica, material, lista de exames solicitados, nome do profissional,
assinatura e CRN, bem como as respectivas orientações para o exame.

AS 3 FASES DO EXAME

Ao analisar profundamente a estrutura da solicitação de exames


bioquímicos, podemos observar que essa é dividida em principalmente 3
momentos, sendo eles:

PRÉ-ANÁLISE
Momento onde é feita a requisição do exame conforme a avaliação
dos pontos comentados como necessidade e relevância ao
tratamento, incluindo também a orientação e preparo do paciente
para realização do exame.

ANÁLISE
Engloba desde o laboratório escolhido para execução do exame até
mesmo ao tipo de metodologia utilizada para avaliação dos
marcadores biológicos, sendo estes um importante ponto a ser
compreendido e conhecido.

PÓS-ANÁLISE
Fase na qual são feitas correlações, diagnóstico, observações e serve
como base para a decisão da conduta a ser adotada frente ao
encontrado.

Mas por quê compreender tão exatamente cada fase desse processo
"tão simples? Basicamente, a importância de desenhar muito bem cada
momento da realização dos exames laboratoriais inclui principalmente a
minimização de erros, no qual destaca-se que a maior parte da tomada de
decisões equivocada ocorre por interferências em alguma dessas fases,
sendo pela escolha do exame, realização ou posterior interpretação.
Sobretudo, aponta-se que é na fase pré-analítica, ou seja, aquela que
antecede a execução do exame laboratorial, onde 62% das interferências
ocorrem. Isto é uma consequência principalmente em decorrência de
orientações claras e adequadas para preparo do antecedente do exame
bioquímico, prejudicando o processo como todo.

Em contrapartida, podemos destacar que outras interferências como


na fase analítica e pós analitica correspondem a apenas 15 e 23%
respectivamente, ou seja, os erros cometidos pela metodologia escolhida
pelo laboratório ou até mesmo a aqueles cometidos quanto a
interpretação dos resultados são menos frequentes e alarmantes quanto
a ausência do preparo adequado do paciente.

Um oequeno adentro para o cenário esportivo, como será discutido


posteriormente, corresponde ao fato de no esporte a categorização de
diversas modalidades conduzir a particularidades e aspectos específicos
de cada um, assim também dirigindo a solicitação de exames laboratoriais
individualizada. No qual o primeiro passo para requisição de exames
vinculando-se a compreensão do status fisiológico e características
próprias do atleta, é ideal que seja desenvolvida uma lista de exames
padronizadas para pessoas fisicamente ativas, tendo em vista a grande
diferença metabólica entre sujeitos sedentários ou não.

RACIOCÍNIOS IMPORTANTES

O raciocínio clínico é complementar e justifica o exame laboratorial,


sendo ele fundamental para a prática de qualquer tipo de profissional da
área da saúde, onde devem ser traçadas ferramentas de avaliação, a fim
de avaliar e monitorar as principais queixas e problemas do indivíduo.
Bem como é a partir disso que será determinada a estratégia dietética a
ser seguida para gerar os resultados desejados, sejam eles em estética,
saúde ou performance.

Dessa forma, é ideal que sejam levados em consideração fatores como


histórico, cenário atual do paciente, uso de medicamentos e suplementos,
fatores confundidores, cronobiologia, condições climáticas e altitude.
É clara a importância de diferenciar pessoas diferentes por marcadores
diferentes, avaliando pré-disposições maiores em decorrência de histórico,
genética e passado familiar. Bem como de avaliar detalhadamente o contexto
atual do paciente, realizando conexões entre particularidades ambientais e
possíveis desfechos.

A utilização de alguns suplementos alimentares e sobretudo a fármacos como


o uso de anabolizantes esteróides podem vir a promover mudanças em
marcadores bioquímicos. Entretanto até mesmo medicamentos
frequentemente mais utilizados podem vir a interagir bioquimicamente
alterando resultados.

A carga de estresse individual, proveniente tanto de estímulos psicológicos e


físicos também podem vir a alterar a fisiologia do organismo daquele indivíduo.
Da mesma maneira que traumas, como lesões recentes e outros problemas
devem ser analisados quanto aos exames laboratoriais.

É essencial que sejam levados em consideração os aspectos fisiológicos


relacionados ao ciclo circardiano, no qual alguns marcadores laboratoriais
serão influenciados quanto ao horário da coleta. Como por exemplo as
concentrações de cortisol que serão dinâmicas ao decorrer do dia, e a
marcadores agudos do metabolismo da glicose que sofrem influência da
alimentação.

Em alguns parâmetros específicos como Vitamina D, o qual é dependente da


rotina de exposição solar do indivíduo, podem ser afetados devido a condições
climáticas e regionais
Para indivíduos com alta frequência de realização de viagens, como atletas e
sujeitos com carga profissional elevada, é passível a influência da altitude como
um fator determinante para marcadores bioquímicos principalmente da série
vermelha do sangue (eritrócitos)

INTERPRETAÇÃO DE EXAMES
A grande questão que norteia a interpretação de exames laboratoriais
é referente a análise dos resultados obtidos a partir dos valores de
referência especificamente, prática comum por diversos profissionais da
área da saúde.

Contudo, o desenvolvimento dos valores de referência relacionam-se


com fatores matemáticos oriundos de uma amostra populacional
distribuída em uma curva de normalidade apontando os valores de 95%
da população. Assim, é necessário uma amostragem mínima de 120
indivíduos, os quais são diferentes quanto a gênero, idade, raça, nível de
atividade, alimentação e diversas outras variáveis, onde evidencia-se aqui a
dificuldade de definir valores de referência que sejam capazes de refletir a
refletir a realidade da fisiologia daquele indivíduo em questão.

Desta maneira, é recomendado na prática clínica e sobretudo no


cenário esportivo que avaliação e interpretação dos exames laboratoriais
seja executada a partir de uma visão individualizada, onde o indivíduo e
seus próprios resultados sejam o ponto de referência conforme histórico e
monitoramento continuo.

Por fim, cabe comentar da importância de ao avaliar os exames


laboratoriais ter claro que é o indivíduo quem deve ser avaliado e não os
valores ali obtidos, onde o aforismo claro da medicina nos diz que a Clínica
é soberana, assim sinais clínicos e outros aspectos do paciente devem ser
levados em consideração de maneira complementar aos exames
bioquímicos.
CAPÍTULO

EXAMES LABORATORIAIS
NO CENÁRIO ESPORTIVO
Os exames laboratoriais são frequentemente utilizados na prática
clinica para confirmar uma condição de doença ou para avaliar o estado
de saúde dos paciente, entretanto, diversos marcadores são
frequentemente mal interpretados por alterações influenciadas por conta
da prática de atividade física.

Além disso, alguns marcadores podem ser utilizados no âmbito


esportivo como um auxiliador para o desenvolvimento de um atleta ou
desportistas, visto que, ele pode indicar se o momento em que o
organismo se encontra é favorável ou não para uma estratégia dietética ou
de treinamento para fins de aumento de performance.

Um exame laboratorial representa uma fotografia do estado fisiológico


momentâneo do paciente. Na prática esportiva, as analises requerem um
cuidado ainda maior, pois, o desportista e atleta tem alterações esperadas
que devem ser levadas em consideração, visto que o exercício modifica
alguns marcadores.

Os sinais clínicos, aliados aos marcadores bioquímicos, possibilitam


uma conduta completa da parte do profissional, impulsionando a
performance esportiva a mantendo a saúde. Um dos fatores mais
importantes que requerem atenção na analise de exames bioquímicos em
atletas e desportista, é saber em qual fase o individuo estava quando fez o
exame.

Pré Fase Competição Fora de


Competição Competitiva e treinos Competição
Marcadores de Parâmetros Risco para Valores da linha
transição entre após testes de lesões de base/Período
preparação e performance aumentado de testes
competição
HEMOGRAMA NO ESPORTE

O hemograma é um exame laboratorial básico e recorrente, que


constantemente é utilizado na prática clinica e que é extremamente
importante no cenário esportivo. A série vermelha do hemograma tem
uma grande relação com o estado nutricional referente ao ferro no
individuo e os parâmetros que envolvem o metabolismo do ferro tem uma
relação com o exercício físico.

A série vermelha do hemograma é extremamente relevante para a


analise de um exame laboratorial no cenário esportivo, visto que
apresenta uma relação direta com a capacidade de transporte de oxigênio
que deve estar adequado para atingir a máxima performance. Na série
vermelha podemos destacar alguns marcadores como hematócrito,
hemoglobina, ferritina e saturação de transferrina.

O hematócrito é um marcador que mostra o percentual que as células


vermelhas ocupam no volume total de sangue, este que pode ser
influenciado por aumento ou diminuição no número de células e por
alteração de volume total de sangue, por aumento ou perda de líquidos.

Hemoconcentração Hemodiluição
↑Hematócrito ↓Hematócrito
Volume
Plasmático

Volume
de eritrócitos

Valor de referência:
Homem: 42-52% | Mulher: 37-47%
A contagem total de hemácias, como o nome já diz, refere-se a
quantidade total de hemácias em uma quantidade específica de sangue. O
valor das hemácias reduzidos pode indicar uma anemia e quando elevado
pode referir-se a uma policitemia secundária ou policitemia vera.

Valor de referência:
Homem: 4,3 - 6 x 10 ^6/mc | Mulher: 3,5-5,5 x 10^6 mcL

No âmbito esportivo há fatores que podem impactar a avaliação


deste marcador. O exercício físico pode gerar aumento ou redução no
valor de contagem de hemácias, essa alteração pode ser resultante do
estado de hidratação do individuo ou da ocorrência de hemólise causada
pelo estresse mecânico.

A desidratação causada por uma atividade física resulta em uma


redução do volume plasmático do sangue e, portanto, um aumento do
hematócrito, gerando uma hemoconcentração. Nessa condição, há um
aumento no valor medido de contagem total de hemácias por uma
situação de maior concentração de células vermelhas, entretanto, não
houve aumento na produção destas células e isso deve ser levado em
consideração.

Após uma hidratação adequada, o valor tende a se normalizar pois o


sangue se dilui com o aumento do volume plasmático, entretanto, até a
estabilidade ocorrer de fato, pode haver um período transitório em que há
uma compensação daquela situação de desidratação em que o volume
plasmático se eleva mais que o normal e gera uma hemodiluição. A
hemodiluição transitória leva a uma menor contagem de hemácias no
sangue por uma diminuição da concentração de células naquele meio.

Outro fato que pode levar a diminuição de hemácias transitória é a


hemólise causada pelo exercício em que ocorre o rompimento de
hemácias por um estresse mecânico repetitivo.
O Contato repetitivo da pisada com o solo é um fator de estresse ao
organismo e que causa a hemólise, este estresse é inerente a diversas
modalidades do esporte de endurance (ex: ultramaratona). O rompimento
das hemácias leva a liberação de hemoglobina no sangue.

Os parâmetros bioquímicos podem indicar esta condição hemolítica, a


partir de marcadores relacionados ao metabolismo da hemoglobina, que
após a lise das hemácias esta hemoglobina será metabolizada em
bilirrubina, no qual pode estar aumentada após exercícios físicos e pode
gerar sinais clínicos como escurecimento da urina.

Urobilonogênio
Hemácias frágeis
Urolobina
Heme
Urina

Bileverdina

Bilirrubina
Bilirrubina não conjugada
conjugada
Esterocobilogênio

Estericibolina

Conteúdo intestinal

Os atletas de endurance apresentam uma hemácia com menor tempo


de vida, no qual, pela rotina de treinamentos há uma diminuição média do
tempo estimado de 120 dias para cerca de 70 dias, necessitando de
mecanismos compensatórios para suprir a necessidade de produção
destas células.

Sendo isso principalmente uma consequência em atletas de impacto


permanente, como a hemólise causada pelo choque entre a sola do pé eo
chão em maratonistas.
O hematócrito se eleva após uma desidratação gerada pela atividade
física, entretanto, como uma resposta compensatória, quando há uma
ingestão hídrica, há uma elevação do volume plasmático e uma diminuição
do hematócrito (hemodiluição). Em condições de hemodiluição é gerada
uma menor pressão de O2 arterial por uma diminuição da concentração
de hemácias e isso gera uma respostas nos rins.

Uma menor pressão de O2 arterial nos rins leva a um aumento na


secreção de eritropoietina (EPO). A EPO sinaliza então na medula óssea a
produção de eritrócitos, como forma de responder ao baixo conteúdo de
O2, logo, os níveis de hematócrito e de hemácias tendem a voltar ao
estado basal do atleta.

O atleta deve estar com a concentração adequada de eritrócitos e


hemoglobina no sangue, visto que são responsáveis pelos transporte de
gases que tem uma relação direta com a capacidade de performance de
um atleta.

A hemoglobina é a principal proteína dos eritrócitos que transporta


oxigênio dos pulmões para os tecidos periféricos. A hemoglobina é
composta por 3,8% de heme e 96,2% de globina. Os níveis de
hemoglobina podem estar alterados indivíduos que são desportistas ou
atletas e isso pode ocorrer por motivos relacionado a prática de atividade
física ou com o estado nutricional.

Valor de referência:
Homem: 12-16 g/dL | Mulher: 14-18 g/dL

A hemoglobina é um marcador específico para identificar a presença


de anemia. O valor de referência da hemoglobina varia entre homens e
mulheres, porém, ao analisar este marcador em atletas de endurance de
longa duração, a referência pode indicar uma falsa anemia, denominada
anemia do atleta.
AVALIAÇÃO DE ANEMIA EM ATLETAS

A condição de anemia significa que há uma deficiência de hemoglobina


no sangue, que pode ser causada por redução do número de hemácias ou
do teor celular de hemoglobina. O atleta pode ter esses marcadores
afetados pelo exercício físico ou por outros fatores comuns na rotina de
atletas, como:

Hematúria Desidratação Deficiências nutricionais


Sangramentos intestinais Hemólise

A exposição a condição de estresse crônico do atleta frente a


treinamentos, gera uma adaptação do organismo que resulta em um nível
normal de hemoglobina e hematócrito mais baixo, o que deve ser levado
em consideração antes de diagnosticar uma anemia de fato. Por conta
disso, é necessário avaliar outros parâmetros bioquímicos e os sinais e
sintomas clínicos como:

Irritabilidade Atenção diminuída


Fadiga Redução desempenho
Diminuição atividade Redução cognitivo

A condição de anemia ainda é comum em atletas, principalmente por


motivos nutricionais, visto que em diversas modalidades é necessário
realizar um controle ou perda de peso, nesse sentido há diversas práticas
errôneas relacionadas a restrições alimentares severas e nestas ocasiões
há desenvolvimento de deficiências de minerais e vitaminas que impactam
na condição de saúde e de performance.

Uma das deficiências comuns em atletas é de ferro que pode resultar


em uma condição de anemia ou pré anêmica. Mulheres tendem a ter
maiores deficiências, visto que o fluxo menstrual aumenta a perda de ferro
e pode contribuir para um desenvolvimento de anemia.
PARAMÊTROS DE FERRO NO ESPORTE

A avaliação de um quadro de anemia de fato ocorre pelo hemograma,


entretanto é possível avaliar uma possível pré anemia e impedir isso
utilizando os marcadores relacionados ao estado do ferro no individuo. Os
marcadores de ferro podem indicar a quantidade plasmática, estocada e
transportada, além de indicar a capacidade de ligação do ferro.

Ferro sérico Transferrina


Ferritina Índice Sat. Transferrina

Ferro sérico
O ferro (Fe) está presente no organismo humano de muitas maneiras:
Na forma de hemoglobina nos eritrócitos circulantes e eritroblastos;
Em proteínas que contém ferro em sua constituição, como mioglobina,
citocromos, peroxidases, oxidases e catalases;
Ligado à transferrina, proteína que tem função de transporte;
Ligado à ferritina, proteína que tem função de armazenamento;
Na hemossiderina, em uma forma extremamente insolúvel.

Valor de referência:
Homens: 45 a 182 ug/dL | Mulheres: 28 a 170 ug/dL

O nível sérico de ferro reflete o Fe3+ ligado à transferrina, e não a Hb


livre no soro. Em atletas o nível de ferro pode estar menor em tempos
competitivos, visto que uma prática de exercícios extenuante resulta em
um processo inflamatório que afeta a absorção do ferro.

A inflamação módula a expressão do gene da hepcidina que


permanece aumentada em processos inflamatórios. A hepcidina atua nos
transportadores intestinais na membrana basolateral dos enterócitos,
denominado ferroportina 1, diminuindo a absorção do ferro.
Absorção do ferro

Transportador
Fe2+ HEME

Hepcidina
Heme
oxidase
Ferro da
dieta Citocromo B Fe2+
Duodenal
Ferroportina 1
Fe3+

Fe3+
Fe 3+
Hepestina

Fe2+
DMT1 Ferritina
Mucosa

Medula
Perdido pela eliminação eritróide
de células epiteliais
(Milman, 2020)

LEGENDA
Fe3+
Fe não DMT1: Transportador
Transferrina heme
Fe2+ Fe heme de metal divalente 1

A maior parte do ferro é absorvida no duodeno e jejuno proximal


devido ao pH ácido do conteúdo intestinal. Além disso, na região distal
do jejuno, o pH torna-se neutro ou alcalino e a absorção de ferro
diminui. O ferro alimentar não heme (Fe 3+) e o ferro heme (Fe 2+) são
direcionados aos seus respectivos reservatórios. O Fe 3+ é reduzido a Fe
2+ pelo citocromo B duodenal e, subsequentemente, entra no lado
luminal do enterócito pela via do importador de ferro DMT-1. Fe 2+ é
transferido pela face basolateral do enterócito, exportado pela
ferroportina (exportadora de ferro), após isso, oxidado a Fe 3+pela
hepestina e transferida para a proteína transportadora transferrina no
plasma sanguíneo.
Transferrina
A transferrina é uma proteína que tem como função transportar
moléculas de Fe3+ circulantes. Normalmente, apenas ⅓ dos locais de
ligação do ferro está ocupado. A transferrina possui meia vida de
aproximadamente 8 a 10 dias.

Suas concentrações plasmáticas são reguladas pela disponibilidade


de ferro. Este marcador bioquímico está elevado em situações de
anemia ferropriva, que é uma condição comum em desportistas e atletas
de endurance, principalmente do sexo feminino, logo, serve como mais
um marcador para acompanhar o estado nutricional do desportista e
atleta.
Valor de referência:
202 a 336 mg/dL

Ferritina
A ferritina é a proteína de armazenamento celular do ferro. A ferritina
medida clinicamente no plasma é habitualmente a apoferritina, uma
molécula que não contém ferro. A ferritina é uma proteína de fase aguda
que, em conjunto com a transferrina, medeiam a defesa celular contra o
estresse oxidativo e a inflamação.

A ferritina é um marcador que quando medido após uma prova


competitiva, no qual o individuo realizou um esforço exteneuante, ela
estará aumentada, visto que, o processo inflamatório induz a elevação
deste marcador. A analise de ferritina para analisar o estoque de ferro é
viavel em casos que não exista um processo inflamatório, logo, para um
desportista e atleta é necessário considerar quando foi realizado o
exame e se foi próximo a um dia de treino ou competição.

Valor de referência:
Homem: 23 a 336 ng/mL | Mulher: 11 a 306 ng/mL
Saturação de Transferrina (%)
A saturação de transferrina consiste na quantidade de locais de
ligação do ferro ocupados. É considerado um índice mais válido para
monitoramento das reservas de ferro do que o ferro sérico,
isoladamente.

Em atletas e desportista a saturação de transferrina expressa alto


valor como marcador bioquímico para ser utilizado como um sensor de
deficiência de ferro. Normalmente a ferritina é utilizada para avaliar este
parâmetro nutricional, porém, a atividade física que resulta em
inflamação afeta a analise de ferritina, logo mascarando a avaliação
correta, entretanto, a saturação de transferrina não é afetada, sendo um
marcador confiável.

Valor de referência:
20 - 50%

AVALIAÇÃO DE DEFICIÊNCIA DE FERRO NO ORGANISMO

Ferritina <20 μg/L Conteúdo de ferro e Hemoglobina


proteínas associadas <12 g/100ml (M)
(Estoque de ferro) no sangue <13-14 g/100ml (H)

Fe Sérico <60 μg/L


Transferrina <16%

Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3

Depleção nos Eritropoiese com Deficiência de


estoques deficiência de Fe Fe e anemia
MARCADORES DE DANO MUSCULAR

O exercício físico é um estímulo estressor agudo ao organismo e a


prática deste resulta em adaptações benéficas a saúde, entretanto, após a
atividade física, a depender da intensidade, pode ocorrer alterações nos
níveis de constituintes sanguíneos que estavam presentes no músculo
esquelético.

O músculo esquelético contém enzimas que participam do metabolismo


deste tecido, porém, o estresse mecânico gerado pela atividade física e a
produção de ERO´s, resulta em uma maior permeabilidade de membrana,
o que resulta em um extravasamento destas enzimas e a elevação dos
níveis sanguíneos.

Estas enzimas estão presentes em outros tecidos e quando a elevação


destas podem estar indicando condições patológicas ou não, apenas
representando que houve dano muscular, devido a atividade física. Estes
marcadores bioquímicos são chamados então de marcador de dano
muscular, dentre eles estão:

Creatina quinase (CK ou CPK)


Lactato desidrogenase (LDH)
Alanina aminotransferase (ALT ou TGP)
Aspartato Aminotransferase (AST ou TGO)

Estresse
PERMEABILIDADE DE MEMBRANA mecânico

ERO´s

TGP TGO
LDH CK
Creatina quinase
A Creatina Quinase (CK ou CPK) desenvolve um papel chave na
ressíntese de ATP e pode ser encontrada no citosol e na mitocôndria. O
mecanismo de ação desta enzima ocorre pela capacidade de reter e de
doar grupo fosfato, no qual, é rapidamente doado para um ADP para
uma formação de ATP instantânea. A CK é encontrada em diversos
tecidos que exigem uma alta demanda de energia, como o músculo,
cérebro e coração.

A enzima creatina quinase é formada por 2 subunidades, a M e B, o


que resulta em diferentes formas de apresentação da enzima, ou seja,
podemos encontrar 5 isoformas de CK no organismo, dentre elas estão a
CK-MM, CK-MB, CK-BB, CK-Mt1 e CK-Mt2. As isoformas MM, MB e BB
referem-se a CK presente no citosol, enquanto as isoformas Mt 1 e 2 são
as CKs mitocondriais. A isoforma Mt1 está predominantemente
presente no cérebro enquanto a Mt2 no coração e músculo esquelético

Concentração das isoformas citosólicas de CK

CK-MM - 98% CK-MM - 70% ~ CK-MB - 100%


CK-MB - 2% CK-MB - 30%

Valor de referência:
Homem: 49 a 348 UI/L | Mulher: 38 a 206 UI/L
Lactato desidrogenase
A lactato desidrogenase (LDH) é uma enzima tetramérica, que
apresenta 5 isoformas diferentes, compostas por 2 subunidades (M e H).
A LDH é um enzima essencialmente citoplasmática, que catalisa a
interconversão entre piruvato e lactato.

A LDH é uma enzima fundamental no metabolismo glicidico e tem


uma alta atuação em situações de esforço físico em mais alta
intensidade, visto que, em situação de anaerobiose, o produto final da
glicólise é o lactato.

A enzima LDH tem seus níveis sanguineos aumentados, assim como


a CK, pelo extravasamento do conteúdo interno celular para o sangue,
justamente pelo exercício gerar maior permeabilidade de membrana,
logo em desportistas e atletas que realizam atividade física de forma
frequente, encontrar valores acima da referência é algo esperado.

A LDH é uma enzima que pode ser encontrada não só no músculo


esquelético como também no coração, rins, eritrócitos e fígado, na clínica
é comumente utilizada para avaliar condições patológicas dos tecidos
que contém esta enzima. A LDH é uma enzima inespecífica para
condição patológica, logo, deve ser analisada considerado a indução de
aumento nos níveis sanguíneos por conta do exercício.

SUBUNIDADES E ISOFORMAS DE LDH


LDH-1 LDH-2 LDH-3 LDH-4 LDH-5
LDH-H LDH-H LDH-H LDH-H LDH-M
LDH-H LDH-H LDH-H LDH-M LDH-M
LDH-H LDH-H LDH-M LDH-M LDH-M
LDH-H LDH-M LDH-M LDH-M LDH-M

Valor de referência:
88-230 U/L
Enzimas transaminases
A alanina aminotransferase (ALT/TGP), é a enzima que catalisa a
transferência reversível entre o piruvato e a alanina. Essa enzima esta
presente em diversos tecido como no músculo esquelético, cardíaco e
nos rins, porém a maior concentração de ALT é no fígado.

A aspartato aminotransferase (AST/TGO), é a enzima que catalisa a


transferência reversível de um grupo alfa-amino entre o aspartato e o
glutamato. Essa enzima esta presente em diversos tecido,
principalmente no músculo esquelético, cardíaco, nos rins e no fígado.

Estas duas enzimas são membros da família das transaminases (que


catalisam reações de transaminação/transferência de um grupo amina
entre um aminoácido e um alfa-cetoácido), que estão amplamente
distribuídas nas células de todo o corpo.

Na prática clinica são principalmente utilizadas como marcadores


hepáticos, pois em condições patológicas associadas ao fígado estas
duas enzimas sofrem alterações significativas. Entretanto, pela presença
das transaminases no músculo esquelético há também uma elevação
nos níveis sanguíneos destas enzimas em condições de permeabilidade
aumentada de membrana deste tecido, ou seja, são marcadores de
dano muscular.

A enzima ALT ou TGP sofre maior elevação frente a atividade física, já


a alteração de TGO ou AST é menor. Sabendo disso, é possível ter uma
análise com maior acuracia do individuo desportista e atleta, visto que se
houver uma elevação excessiva de TGO e menor de TGP deve-se ter
atenção a uma investigação aprofundada sobre uma possível alteração
hepática.

Valor de referência:
TGO: 1 a 40 U/l | TGP: 1 a 40 U/l
MARCADORES METABÓLITOS NO
CENÁRIO ESPORTIVO

Alguns metabólitos gerados nas reações metabólicas podem ser


medidos como marcadores bioquímicos, no qual, alguns deles são
comumente utilizados na prática clinica e em exames de rotina para
indicar algum risco de patologias, principalmente associada a função renal.

Em atletas e desportista o estilo de vida voltado a atividade física pode


alterar os valores destes metabólitos e assim gerar uma interpretação
equivocada do estado de saúde do atleta. Os principais marcadores
influenciados pela rotina do praticante de atividade física são:

Ureia
Creatinina
Ácido Úrico

Ureia e Acido Úrico

A ureia é um produto do metabolismo proteico, resultante do


catabolismo de aminoácidos e de ácidos nucleicos. Mais de 90% da ureia
produzida é excretada pelos rins por meio da urina. A excreção de ureia
é fundamental por ser a forma que nosso organismo excreta a amônia
formada no fígado, esta que é uma substancia tóxica ao organismo.

A ureia é um marcador utilizado para a avaliação da função renal e


do estado hipercatabólico de pacientes críticos. No cenário esportivo é
comum um consumo alto de proteína pelos atletas e desportistas, por
conta disso, pode haver uma elevação nos níveis de ureia. Os níveis
elevados de ureia ocorrem principalmente em indivíduos que
necessitam realizar grande perda de peso ou que realizam atividades de
longa duração que gera maior quebra de proteínas e aumenta a
excreção de amônia, resultando em elevação de ureia.
O ácido úrico (AU) é um produto final do catabolismo das purinas,
liberado quando o DNA e o RNA são degradados pelas células que estão
sofrendo lise. A maior parte do ácido úrico é sintetizada no fígado e na
mucosa intestinal, sendo dois terços excretados pelos rins, e um terço
pelo trato gastrointestinal. Assim como a ureia, um consumo elevado de
proteína e o exercício físico intenso são fatores que elevam os níveis de
ácido úrico, logo, quando analisar este marcador e ureia em desportistas
e atletas, a influencia da dieta e da atividade física deve ser levado em
consideração.

Valor de referência:
Ureia: 7 a 23 mg/dL.
AU - Homens: 2,5 a 8,0 mg/d | Mulheres: 1,9 a 7,5 mg/dL

Cratinina

A creatinina é um produto da creatina e da fosfocreatina, no qual,


por meio de uma reação não enzimática e espontanea, é gerado a
creatinina. A creatinina é um metabólito que é excretado pelos rins via
urina e por conta disso, é utilizado como um marcador que avalia a
função renal.

A creatinina pode estar elevada em desportistas e atletas por conta


do maior consumo dietético de creatina ou por meio da suplementação,
que gera maior retenção muscular dela e consequentemente maior
formação deste metabólito, porém, as elevações nos níveis de creatinina
são esperadas e não indicam dano renal.

Valor de referência:
Homem: 0,5 a 1,2 mg/dL | Mulher: 0,6 a 1,3 mg/dL

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