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Capítulo 1

Definindo conceitos

Prof.Ms. Viviane Barbosa Caldeira Damacena

Viviane Barbosa Caldeira Damacena é graduada em Letras Português/Inglês pela Universidade


de Uberaba, pós-graduada em Educação Especial pela mesma instituição. Mestre em Letras
pelo programa Profletras pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro - UFTM, e
atualmente é doutoranda pelo programa Estudos Linguísticos da Universidade de Uberlândia -
UFU. É professora de língua portuguesa, intérprete de Libras e professora de língua portuguesa
como L2 para surdos, tendo experiência ministrando cursos de capacitação para professores,
sobre língua portuguesa, aquisição de língua materna e língua não materna, além de ter
experiência em produção de materiais didáticos.

Definições:

A aprendizagem de uma outra língua denota inúmeras concepções e


abordagens que, apesar de apresentarem características semelhantes, diferem no
que se refere aos objetivos e ao público alvo. Assim, consideramos a importância das
diversas abordagens, percebendo aquela que mais se enquadra na perspectiva
escolhida.
Semelhanças e discordâncias acontecem em todas as teorias, porém é
necessário que saibamos diferenciá-las para que as práticas de ensino sejam
pautadas em questões teóricas, que possibilitam uma prática efetiva no ensino de
línguas.
Pensando nisso, é interessante conhecer as principais concepções, para que,
assim, se torne possível a realização de uma escolha mais adequada. Sendo assim,
parte-se da conceituação de tópicos básicos, porém essenciais para a aquisição de
uma outra língua.
Fonte: Arquivo pessoal (2022)

O primeiro conceito a ser tratado é o de língua materna, que é considerada


como a primeira língua adquirida pelo indivíduo. É aquela língua utilizada no seio
familiar, com a qual teve o seu primeiro contato, na mais tenra idade. Língua materna,
assim, torna-se o primeiro contato linguístico do aprendiz, aquele com o qual ele se
torna mais confortável ao utilizar. Porém, ainda assim, percebe-se apresentar uma
definição mais complexa, quando tratamos de língua materna, ou L1, como afirma
Spinassé (2006):
“A Língua Materna, ou a Primeira Língua (L1) não é,
necessariamente, a língua da mãe, nem a primeira língua que
se aprende. Tão pouco trata-se de apenas uma língua.
Normalmente é a língua que aprendemos primeiro e em casa,
através dos pais, e também é frequentemente a língua da
comunidade. Entretanto, muitos outros aspectos linguísticos
e não-linguísticos estão ligados à definição. A língua dos
pais pode não ser a língua da comunidade, e, ao aprender as
duas, o indivíduo passa a ter mais de uma L1 (caso de
bilinguismo). Uma criança pode, portanto, adquirir uma língua
que não é falada em casa, e ambas valem como L1.” (p. 05)
Outro desses conceitos está relacionado à segunda língua, que se caracteriza
como a aquisição de uma outra língua que não a língua materna, muitas vezes
ocorrendo de forma natural em um ambiente linguístico usuário dessa língua. Ela tem
um papel essencial na vida do usuário, pois apresenta um papel comunicativo para
esse indivíduo, considerando seu ambiente social, “uns colocam que língua segunda
é aquela em que a pessoa quando vai viver em outro país tem que aprender, pois
precisa dela para se comunicar o tempo todo e que acaba se tornando sua segunda
língua.” (SOUTO et.al., 2014, p. 893). Citando um exemplo de como essa aquisição
acontece, podemos considerar uma família brasileira, usuária da língua portuguesa,
que mudou-se para os Estados Unidos, passando a utilizar a língua inglesa. Assim,
essa família utiliza-se da sua língua materna no ambiente familiar e da segunda língua
em um ambiente social.
Em relação à aquisição de segunda língua, consideramos as questões que
envolvem as pessoas surdas, que tornam-se pessoas bilíngues por utilizarem duas
línguas, a língua de sinais e a língua oral na modalidade escrita. No caso dos surdos
brasileiros, a sua língua materna é a Língua Brasileira de Sinais, Libras, possuindo
como segunda língua a Língua Portuguesa, na modalidade escrita. Por ser
reconhecida como língua oficial de pessoas surdas do país, esse status demonstra
ser imprescindível a aprendizagem destas duas línguas, principalmente por surdos.
Há, também, a definição de língua estrangeira, que é aquela em que o usuário
aprende uma outra língua ainda em seu ambiente linguístico, isto é, ele não está
inserido em um ambiente que utiliza uma língua diferente da sua. Essa língua não é
aprendida com objetivo comunicacional, pois o aprendiz pode nunca precisar utilizá-
la. Souto et.al. afirma que “a grande diferença é que a língua estrangeira não serve
necessariamente à comunicação e, a partir disso, não é fundamental para a
integração, enquanto a segunda língua desempenha um papel até mesmo vital numa
sociedade”. (2014, p. 892-893). Aqui, podemos citar, como exemplo, um brasileiro,
residente no Brasil, que aprende a língua espanhola em uma escola de idiomas.
A grande diferença é que a língua estrangeira não serve necessariamente à
comunicação e, a partir disso, não é fundamental para a integração, enquanto a
segunda língua desempenha um papel até mesmo vital numa sociedade.
O aprendiz de uma língua estrangeira demonstra ter diversos objetivos, como
a aquisição de uma outra língua por motivo de trabalho, financeiro ou mesmo apenas
por curiosidade, diferentemente daquele que passa por uma aquisição de segunda
língua, cujo principal objetivo torna-se a comunicação em uma comunidade.
Há, ainda, a língua como forma de acolhimento. Nesta concepção, a língua é
vista como forma de acolher refugiados que escolheram o país como refúgio. Muitas
vezes estas pessoas não apresentavam vontade de aprender a língua, mas se veem
obrigados a necessitarem viver em um país que não o seu.
“A língua de acolhimento ultrapassa a noção de língua
estrangeira ou de língua segunda. Para o público-adulto, recém-
imerso numa realidade linguístico-cultural não vivenciada antes,
o uso da língua estará ligada a um diversificado saber, saber
fazer, a novas tarefas linguístico-comunicativas que devem ser
realizadas na língua-alvo.” (GROSSO, 2010, p.68)
Como exemplo, podemos citar os argentinos, que fugindo da crise econômica
que seu país enfrenta, encontraram no Brasil uma forma de sobrevivência e refúgio e,
assim, se veem obrigados a adquirirem a língua portuguesa como modo de
sobrevivência.
Além desses conceitos, temos ainda conceitos relacionados à língua adicional,
língua franca, língua de herança, língua transnacional, entre vários outros conceitos
linguísticos. Não iremos nos prolongar nessas especificações, por não serem
relacionadas às questões bilíngues de pessoas surdas, porém, ainda assim, torna-se
interessante o conhecimento de que tais conceitos existem e que a linguística, tal qual
ela é, possibilita a diversidade nos momentos de interação.
Considerando toda essa gama de diversidade de aquisição de uma outra
língua, escolhe-se o objetivo de aprendizado a ser alcançado. Esse objetivo faz com
que o ensino seja pautado em metodologias e estratégias específicas a cada um
deles. Citando alguns exemplos, quando falamos sobre o ensino de segunda língua
para surdos, em um primeiro momento considera-se o ensino da língua apenas na
modalidade escrita, pensando na sua língua materna como língua de instrução e
apoio. Além disso, quando a língua portuguesa, para o surdo, necessita ser ensinada
na modalidade escrita, significa que é necessário o uso de uma metodologia
específica que não utiliza como suporte a língua oral, pois o surdo não consegue
utilizar os resíduos fônicos da língua como base no aprendizado.
Da mesma forma que é necessário utilizar outro tipo de abordagem ao
tratarmos de língua como acolhimento, pois o aprendiz prevê uma urgência maior na
aquisição dessa língua, em se tratando da necessidade de conseguir um emprego,
uma escola ou mesmo uma moradia. Assim, as metodologias e estratégias utilizadas
necessitam ser voltadas ao uso social da língua, para que o refugiado possa se inserir
na comunidade, possibilitando, assim, a sua sobrevivência no país em que se
refugiou.
Percebendo essas diferenças conceituais, torna-se imprescindível o
discernimento e a escolha da metodologia, estratégia e objetivos mais adequados ao
aprendiz e à sua necessidade de aprendizado de uma língua diferente da sua língua
materna.

Referência Bibliográfica

SOUTO, M.V.L., ALÉM, A.O.F.G., BRITO, A.M.S., BERNARDO, C. Conceitos de


língua estrangeira, língua segunda, língua adicional, língua de herança, língua
franca e língua transacional. Revista Philologus, ano 20, nº 60, Supl. 1: Anais da IX
JNLFLP. Rio de Janeiro: CiFEFiL, set./dez. 2014. p. 890-900

SPINASSÉ, K.P. Os conceitos Língua Materna, Segunda Língua e Língua


Estrangeira e os falantes de línguas alóctones minoritárias no Sul do Brasil.
Revista Contingentia, vol. 1. novembro 2006, p. 1-10

GROSSO, M.J.R. Língua de acolhimento, língua de integração. Horizontes de


Linguística Aplicada, v.9, n.2, p; 61-77, 2010.

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