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Causas Sociais e Tipos Sociais

Cap. I: Métodos para os determinar

 Em cada grupo social há uma tendência específica para o suicídio, que não pode se
explicar nem através da constituição psíquica de cada indivíduo (por questões de
tendências orgânicas individuais) e nem através da natureza do meio físico. O que seria
este meio físico? Para Durkheim, ele está separado do meio social?
 Depende necessariamente das causas sociais e se constitui como um fenômeno
coletivo. As variações geográficas e periódicas do suicídio pode levar a esta conclusão.
 Há uma pluralidade de tendências ao suicídio que podem ser estudadas
separadamente. E as tendências só podem ser observadas a partir dos suicídios
individuais, que é como o suicídio se manifesta na vida real. Deveria ter selecionado o
maior número de suicídios, com exclusão daqueles vinculados à alienação mental
(como ele fez esta diferenciação? O que seria, para ele alienação mental?), para
descrevê-los e agrupá-los a partir das diferenças, semelhanças e analogias. Quanto
mais tipos encontrassem, mais correntes se formariam, havendo a necessidade de
determinar/identificar as causas e a importância delas.
 Mas, os documentos para as análises e descrições, no caso dos suicídios racionais,
eram insuficientes. Como identificar o estado psíquico do suicida no momento do
suicídio? As informações neste sentido só são acessíveis em se tratando dos suicídio
vesânico, que tem a loucura como causa determinante, e somente em relação a eles
foi possível determinar os tipos e as respectivas causas. As cartas deixadas pelo suicida
não é suficientemente objetivas para a análise e conclusões.
 Propôs, então, a inversão da ordem das investigações. Partiu-se para a análise e
classificação das causas que os determinam. Se as causas são diferentes, os tipos de
suicídio também o são. Um mesmo antecedente não pode produzir ora um tipo de
suicídio ora outro. A preocupação para construir a causa não estar em buscar a razão,
mas sim as condições sociais de quem dependem. Então a partir da reunião das
diferentes e semelhantes condições sociais, se chagará aos tipos diferentes de suicídio.
A classificação será etiológica (e não morfológica).
 Esse método postula a diversidade dos tipos, mas não pode caracterizá-los em suas
especificidades. Tenta superar este defeito afirmando que será possível, definindo e
classificando as causas, deduzir a natureza dos efeitos (suicídios) caracterizados e
classificados em relação às suas causas. Pode-se dizer que ele se baseia numa relação
de causalidade? Esta dedução precisa estar orientada pelos fatos, com a ajuda de
algumas informações relativa à morfologia dos suicídios. Estas informações são
insuficientes para basear o principio da classificação, mas ajudam na dedução, quando
as linhas gerais da classificação já estiverem definidas. Em termos metodológicos,
haveria o risco de se utilizar os dados morfológicos apenas para justificar e
fundamentar as classificações deduzidas?
 O objeto de análise dele é a taxa social do suicídio. Logo, os únicos tipos que
interessam são aqueles que contribuem para a formação dessa taxa. (mas, como saber
se não se conhece de forma profunda a morfologia dos suicídios?). Vai buscar os dados
estatístico, que seria a expressão do suicídio em sua forma coletiva. Parte do todo para
se chegar às partes.
 Como chegar às causas. Parte-se do que há de motivos formalmente relatados. Eles
revelam os antecedentes imediatos de cada suicídio. Mas, essa estatística dos motivos,
na verdade é uma estatística de opiniões sobre os motivos. Achando um motivo
aparente, capaz de justificar, não se buscam outros, que podem ser verdadeiros. Os
motivos então, não são as verdadeiras causas. A estatística dos motivos não bate com
as estatísticas gerais dos suicídios, com seus números absolutos. Considerando a
França e a Saxônia no mesmo recorte temporal, aumenta-se de forma demasiada o
numero de sucidios nessa ultima, mas há uma permanência, tanto na Franca quanto na
Saxonia das variáveis em relação aos motivos explicitados. Talvez então tenham
elementos mais gerais (estado mais geral) capazes de justificar o aumento demasiado
do suicídio na Saxônia. Busca-se este estado mais geral sem se deter nas repercussões
que pode ter nas consciências particulares.
 Ele foi buscar também a diferenciação das estatísticas considerando a agricultura e as
profissões liberais. Se há um estado geral que impulsiona o suicídio, deve haver
diferenciações em relação às tão diferentes ocupações profissionais, já que em relação
aos motivos aparentes não houve diferenciações significativas. Há uma corrente
exterior que “induz” ao suicídios que podem se expressar, individualmente, nesses
motivos aparentes (pontos fracos do indivíduo). Necessario buscar então as
características sociais do suicídio, sem se deter aos “problemas insolúveis da casuística
moral”.
 Deixa de lado o indivíduo e vai se perguntar sobre o estado dos diferentes meios
sociais. Só depois volta ao indivíduo para saber como estas causas gerais se
individualizam para produzirem os efeitos suicidas, em seus diferentes modos.

O SUICÍDIO ANÔMICO

 A sociedade não é apenas um objetivo que suscita os sentimentos e a atividade dos


indivíduos. É também um poder que regula. Há uma relação entre a forma como a
sociedade exerce a ação reguladora e a taxa social dos suicídios.
 Traz a dimensão das crises econômicas como fator que influencia a taxa social. Crise
de 1873-74 em Viena e o aumento do número de suicídio nos momentos mais agudos
dela. Exemplifica também com a falência da Bolsa de Paris em 1882. Além da crise em
si, um indicador para ela é o número de falências.
 Questiona pq as falências e a crise econômica como um todo influenciam no aumento
da taxa de suicídio? É pq aumenta a pobreza e miséria, pq a vida se torna mais difícil?
Ele diz que explicar a partir deste viés é simplificar demais. Pq se não, com o aumento
do bem estar, se diminuiriam os suicídios. (Eu não faria esta dedução lógica). Ele faz
uma relação com a diminuição dos preços dos alimentos (que, em tese significaria
melhor condição de vida) com a taxa social, demonstrando que ela inclusive
aumentou quando houve diminuição do preço do trigo. Logo, para ele, não é o
crescimento da miséria causa social do suicídio.
 Trouxe o exemplo do crescimento economico da Itália, a partir da conquista de Roma,
e da Prússia afirmando que no mesmo período houve aumentos exponenciais da taxa
social dos suicídios. Na França ressalta que os suicídios são mais numerosos quanto há
mais pessoas vivendo de renda. “A miséria protege”.
 Então, se as crises econômicas aumentam o suicídio não é por causa do
empobrecimento, já que as crises de prosperidade conduzem ao mesmo efeito. É,
segundo o autor, por serem crises, perturbações da ordem coletiva, ruptura de
equilíbrio.
 As necessidades do homem não se restringem às necessidades orgânicas do corpo.
Como refletem, essas necessidades (e outras) são mediadas pelo desejo, e não há um
limite determinado para estes desejos (nem na constituição orgânica e nem da
constituição psíquica do indivíduo). Então, se nada contém, se nada limita os
desejos/necessidades, eles não constantemente fontes de tormento. Desejos
ilimitados são insaciáveis. Ressalte-se que essa indeterminação/ausência de limites
está mais relacionada com estado de vida mental do que com o físico. O homem
precisa então sentir-se avançando no caminho da conquista destes desejos, sentir-se
andando na busca de um objetivo. E, não se avança quando não se tem objetivo ou
quando o objetivo está no infinito. Perseguir um fim inacessível (ou inexistente) é
estar-se em permanente estado de descontentamento. É necessário que o prazer de
conquistar algo e de se aproximar de um determinado objetivo seja sentido para que
se aquiete a dor de não se chegar nunca a ele (já que os desejos são ilimitados e que
quanto mais se tem, mais se quer). Logo, este caminhar não pode ser entravado, mas
seria milagroso se obstáculos não surgissem. Então, a vida estará sempre por um fio.
 Importante etão estabelecer limites para estes desejos. Como eles jamais virão de
dentro dos indivíduos, importante que eles venham de alguma força exterior, que,
para o autor, seria uma força reguladora, que só pode ser moral, por meio de alguma
coerção. Este limite deve vir de uma autoridade que o indivíduo respeite e da qual se
inclinem automaticamente, que, no caso, seria a sociedade. Ela é o único poder moral
superior ao indivíduo e cuja superioridade ele aceita.
 Essa regulamentação envolve a definição do máximo de abastança e do limite de
pobreza que cada classe da sociedade pode legitimamente tentar atingir. Mas, essa
definição não é imutável, variando conforme a remuneração coletiva cresça ou
decresça. Assim, se define um limite para os desejos, que nada tem de rígido e
absoluto. Com o limite, é possível contentar-se, e esse contentamento médio gera o
sentimento de calma e alívio. Mas, mesmo com o limite o homem não está
condenado à imobilidade, podendo buscar mais, sendo que se houver frustração não
vai ser tão doloroso assim, pois permanece-lhe o essencial.
 No entanto, esta regulação não basta. É necessário que o trabalhador esteja em
harmonia com sua condição social, com os limites impostos à classe que pertence. É
necessária uma regulação que “estabeleça a maneira pela qual as diferentes
condições deve ser aberta às pessoas”. Para esta regulação se fazer valer, ser aceita,
há a necessidade de autoridade e coerção moral. Isso porque há desigualdades
“intrínsecas”, que se apresentam desde o nascimento. Para o autor essa desigualdade
diferencia os mais úteis e merecedores dos mais medíocres e incapazes.
 A regulação, a disciplina precisa se manter pelo hábito e pela autoridade (que é
obedecida não por medo, mas por respeito), pois se não a paz e a harmonia só se
manterão pela aparência e as inquietações e descontentamentos começam a
desencadear. Isso acontece em situações de crise. A atividade humana, então, não
pode ser libertada de todos os freios (sociais, morais), o homem escapa ao jugo do
corpo, mas é submetido ao da sociedade.
 Quando a sociedade é perturbada, seja por crises econômicas maléficas ou por
ascensões favoráveis (mas repentinas), ele perde a capacidade de regulação e a taxa
social dos suicídios aumenta. As condições de vida em ambas as situações são
mudadas e a escala segundo a qual se regulavam as necessidades não pode continuar
a mesma. Mas, a sociedade para se reajustar às novas situações e encontrar o
equilíbrio, precisa de tempo. Então, enquanto isso não acontece, há ausência de
regulamentação. Este abalo atinge os próprios princípios definidores da distribuição
dos cidadãos em empregos.
 O estado de anomia/desregramento é intensificado pelo fato dos desejos estarem
menos disciplinados, justamente no momento que há a necessidade de um controle
mais efetivo.
 Quanto menos possuimos, menos somos levados a ampliar sem limites os nossos
desejos. Por isso, há anomia quando temos uma ampliação repentina das condições
de vida. Começamos a querer sempre mais, pois a riqueza nos dá a impressão de que
só dependemos de nós mesmos e o céu vira o limite e novamente teremos desejos
infinitos. Evidencia nisso, um perigo moral, mas não é impeditivo da humanidade
melhorar sua condição material. Ressalta a religião como um controle de limites.
 Ressalta que a anomia não se estabelece apenas por acessos intermitentes (crises),
mas existem setores em que há um estado de anomia crônico, a exemplo da indústria
e comércio. Afirma que o progresso econômico tem consistido em liberar as relações
industriais de qualquer regulamentação, seja da religião, das corporações de ofício, do
poder governamental ou quaisquer outras. A ausência de regulamentação é para
garantir o objetivo central de se prosperar industrialmente, tornando a indústria o fim
supremo dos indivíduos e da sociedade. Qualquer autoridade a regular esta atividade
tornou-se um sacrilégio. O desencadeamento de desejos foi proporcionado pela
ausência de regulação na indústria e seu desenvolvimento e pela ampliação quase
ilimitada do mercado (mundo inteiro).
 Nesta esfera social o estado de crise e anomia é constante e nada é capaz de acalmar
a cobiça. (Aqui, será que podemos fazer a relação com a reprodução ampliada do
capital?). Então, ao sobrevir o menor obstáculo, não há forças para suportá-lo. Talvez
isto também explique o aumento da taxa social dos suicídios nas catástrofes
econômicas. As funções industriais e comerciais estão entre as que mais abastecem o
suicídio. E os patrões e os que vivem de renda são os mais atingidos pela anomia.
 A anomia é então um fator regulador dos suicídios, é uma das fontes que alimenta sua
taxa social. Este tipo de suicídio depende não da maneira como indivíduo de liga à ela,
mas ao modo como a sociedade o regulamenta. Os indivíduos sofrem com o
desregramento.
 O suicídio anômico tem uma relação com o suicídio egoísta, pois se constituem por
uma ausência de sociedade, em esferas diferentes em cada um deles. No egoísta ela
está ausente em sua propriedade coletiva, deixando-a desprovida de significado e no
anomico a ausencia se mostra em relação aos limites dos desejos e paixões. São
independentes. Sem ser egoísta, pode-se viver em estado de anomia e vice e versa. O
egoísta tem como adeptos prediletos os intelectuais e o anômico o mundo industrial e
comercial.
 A anomia econômica não é a única a provocar o aumento da taxa social do suicídio.
Há também a anomia doméstica, provocada pelo falecimento de um dos cônjuges. Há
também uma outra variedade do suicídio anômico, por ser crônica, que vale a pena
ressaltar, que é aquela relacionada do divórcio e separação de corpos. Bertillon
produziu um estudo no qual concluiu que na Europa a taxa de suicídios varia
conforme a de divórcio. (um dado interessante a se buscar seria se, no caso das
separações, quem se mata mais são os homens ou as mulheres). Mas Berillon explica
essa associação afirmando que os divorcios acontecem por causa de conjuges
insuportaveis, que seriam já as pessoas propensas à psicopatia e ao suicídio. Não o
explica pela ocorrência do divorcio sem si. Durkheim afirma que este autor chega a
esta conclusão apenas por inferência, sem provas, já que não se pode dizer que o
número de desequilibrados é proporcional ao número de divórcios. Não são as
condições individuais que irão explicar o suicídio.
 A causa dessa relação deve ser buscada, então, na natureza intrínseca do divórcio. Os
suicídios de divorciados são bem maiores do que de outras parcelas da população. E
ressalte-se que os homens de matam muito mais do que as mulheres no caso das
separações (divórcio ou viuvez). Já há uma diferença entre homens e mulheres
suicidas, pois os homens se matam mais, mas esta proporção aumenta
significativamente no caso das separações. Isso ocorre por causa da mudança do
regime moral e material advindo do divórcio. Mas somente isso não é capaz de
explicar.
 Quando a sociedade conjugal se desfaz pela morte, os efeitos que o casamento tinha
em relação ao suicídio continuam a existir, em parte para o sobrevivente. Em relação
ao divorciado, “o fenômeno deve estar ligado a uma certa constituição matrimonial
cuja influência os cônjuges continuam a sofrer, mesmo separados.
 Demonstra o alto numero de suicídios nos países em que o divorcio é mais
amplamente admitido não está ligado a predisposições orgânicas, mas sim em alguma
particularidade, seja do casamento, seja da família. Sugere que as razões estejam na
natureza do casamento, pois nos países em que o divorcio é admitido o coeficiente de
preservação dos homens casados é menor, destacando que o das mulheres é maior.
Nos países onde o divórcio não existe, a mulher é menos preservada que os maridos.
Esta diferenciação entre homens e mulheres é mais um elemento que leva a crer que
o “mal” está localizado na constituição/situação do casamento, pois o casamento,
diferentemente da família age em sentido diferenciado entre homens e mulheres. A
explicação também não está localizada em ocorrência da briga, pois não justificaria a
diferenciação, já que a briga atinge tanto o marido como a mulher.
 Para ele, a própria instituição do divorcio, pela ação que exerce sobre o casamento,
determina o suicídio. O casamento, sobretudo o monogâmico, é o regulador social da
vida passional, que garante o “equilíbrio moral”. Não pode, com o casamento, sem
faltar aos deveres buscar outras satisfações além daquelas que são limitadas. Deve
encontrar a felicidade aí. A solterisse desvairada é propenda ao suicídio (ele não se dá
definitivamente e ele não possui nada definitivamente, estando em condição de
anomia).
 O divorcio implica um enfraquecimento da regulamentação matrimonial. Destaca-se
que nos locais onde ele é amplamente usado, o casamento não exerce as mesmas
funções úteis, é um casamento menor. O limite ao desejo não tem mesma fixidez. A
possibilidade de divórcio promove um estado de inquietude que impede o homem de
se ater ao que tem, já que o vínculo é mais fraco e o futuro está menos garantido. O
homem se aproxima então do solteiro e por consequência o número de suicídios se
eleva.
 Para ele, essa consequência é especial ao homem, não atinge as mulheres. “As
necessidades sexuais da mulher têm um caráter menos mental, porque, de maneira
geral, sua vida mental é menos desenvolvida”. A mulher é mais instintiva e para
encontrar a paz e a calma basta seguir seus instintos e, neste sentido, a
regulamentação do casamente não é tão necessária para contê-la. A disciplina,
mesmo que seja útil tem seus inconvenientes. A fixidez do casamento (nos locais
onde o divórcio não é permitido) traz transtornos tanto para o homem quanto para a
mulher, limita o horizonte e impede esperanças. Mas, para o homem esta fixidez traz
algumas vantagens: a regulação, que nem é necessária para a mulher e os privilégios
da vida casada. Para a mulher, não há compensação ou atenuação e nem vantagens.
Por isso o divórcio a protege, por isso ela recorre mais facilmente a ele.
 É a situação de anomia conjugal que explica o paralelo entre divórcio e suicídio. O
suicídio do homem nas sociedades em que o divorcio é aceito é uma variação do
suicídio anômico e resultam do enfraquecimento da regulação matrimonial. Destaca
que a anomia matrimonial pode existir mesmo sem o divórcio estar previsto em lei,
mas é quando o é reconhecido institucionalmente que pode atingir suas máximas
consequências. Inclusive há uma taxa maior de suicídio entre os divorciados do que
entre os separados apenas.
 A tendência dos solteiros está ligada à anomia sexual, ao desregramento e por isso
tem mais incidência na época em que o sentimento sexual é mais efervescente (20 a
45 anos). O período sexual não afeta da mesma forma o suicídio feminino, pois as
mulheres estão menos sujeitas a este tipo de anomia. (Ele não comprova a lógica
desta diferenciação entre homens e mulheres, fixando-se apenas na questão sexual)

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