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NEGOCIAÇA9 COLETIV~:
TRATAMENTO TEORICO E PRATICA
A
análise da prática da negociação coleti- dade nas decisões da Justiça do Trabalho, e
va entre patrões e empregados na socie- também à quase inexistência de custos ou pe-
dade brasileira envolve preliminar- nalidades de se promover o impasse, recor-
mente uma mínima e essencial compreensão rendo-se ao dissídio.'
das características corporativistas do sistema Na prática, em matéria de negociação cole-
de relações profissionais, ainda vigente no País. tiva e do tratamento institucional dos confli-
Destaca-se, principalmente, como a negocia- tos nas relações de trabalho, pode-se falar da
ção coletiva se insere no âmbito desse siste- existência de dois mundos. O que se refere ao
ma, enquanto prevista pela lei e enquanto sistema formal, privilegiando os procedimen-
prática dos atores sociais diante das possibili- tos legais, e que se mantém desde 1943, com
dades de ação permitidas por esse mesmo sis- pouco espaço para a regulação dos conflitos
tema. entre os grupos de interesses, seja a nível indi-
Primeiramente, convém explicitar que o vidual ou coletivo. O outro espaço é a prática
sistema brasileiro de relações profissionais foi desenvolvida e em desenvolvimento em vários
desenvolvido com o claro objetivo de mediar setores econômicos, caminhando-se em dire-
os conflitos inerentes às relações sociais de ção da negociação direta e da colocação em
produção, através de três linhas estratégicas: prática de outros mecanismos de regulação de
conflito.
a) obscurecendo-os sob a égide da cooperação A partir de 1979, percebe-se uma disposi-
de classes; ção, principalmente por parte dos trabalhado-
b) retirando-os do ambiente do local de traba- res, de buscar o entendimento direto. E inte-
lho para remetê-los para a instância do legal, ressante observar que, a cada momento, no-
no interior da Justiça do Trabalho; e vas categorias se agregam a esse grupo que,
c) apoiando-se numa certa antecipação e ou- com avanços e refluxos, busca a trajetória da
torga embutida na Consolidação das Leis do negociação.
Trabalho (CLT). A CLT, em relação aos trabalhadores, dá o
monopólio da negociação aos sindicatos. Do
Dessa forma, percebe-se um desestímulo lado dos empresários, ela pode ser realizada
ao desenvolvimento da prática da negociação diretamente por uma só empresa, ou através
coletiva através do poder normatizador do de seus sindicatos congregando mais de uma
Estado, que numa considerável abrangência empresa, como são os casos das federações re-
busca prever, evitar e mediar o conflito ao es- presentantes das classes econômicas.
tabelecer uma legalidade nas relações de tra- A partir da pauta de reivindicações envia-
balho (CLT), e através da definição da Justiça da pelo sindicato representante da categoria
do Trabalho como instância última para a "so- profissional à empresa empregadora e/ou ao
1. Este artigo é resultado da lução" dos conflitos.
segunda parte da pesquisa
sindicato representante da categoria econômi-
Relações de Trabalho em Além desse caráter inibidor quanto à con- ca, existe uma sistemática que estabelece a
Minas Gerais: Uma Configu- cretização do potencial inerente ao processo trajetória de uma negociação coletiva no Bra-
ração do Processo de Nego- da negociação coletiva, deve-se considerar, sil.
ciação Coletiva, financiada
pelo CNPq e finalizada em
ainda, que o sistema influencia o comporta- As principais modificações trazidas pela
março de 1990. Gostaria de mento dos grupos de interesses, ao ensejar Constituição de 1988 à negociação coletiva
agradecer e registrar a parti- possibilidades alternativas de ação. ocorreram, não quanto ao processo em si, mas
cipação de bolsistas de Ini- Inseridos neste contexto, os atores so-
ciaçao Científica e de alunos quanto à posição em que se realinham as for-
da disciplina Relações de ciais/ grupos de interesses passaram a consi- ças dos protagonistas no conflito entre capital
Trabalho, do Curso de Admi- derar o possível comportamento dos tribu- e trabalho, diante dos novos direitos e garan-
nistração da UFMG, Renata nais e a jurisprudência para a determinação tias definidos pela Constituição.
de Magalhães Gaspar, Adria-
na Ventola, Maria de Fátima de suas estratégias e táticas na mesa de nego- Pelo texto constitucional, não é prevista a
Pereira Rossi, Marcelo Gou- ciações. A CLT e a Justiça do Trabalho são vis- intervenção do Ministério do Trabalho, atra-
vea Teixeira e Alessandra Al- tas como meios de manobra, instrumentos tá- vés das Delegacias Regionais do Trabalho, co-
ves Ped rosa, nessa fase da ticos utilizados conforme a conveniência para
pesquisa. mo mediador nas mesas de negociação entre
se alcançar objetivos desejados. As partes, en- empregados e empregadores, a exemplo do
2. Para uma visão mais
completa do assunto ver tão, tentam explorar as vantagens comparati- que a Consolidação das Leis do Trabalho pre-
PASTORE, José & ZYLBER- vas do exercício da negociação ou de se recor- vê. Uma outra modificação relaciona-se à pos-
STAJN, Hélio. Administra- rer à Justiça do Trabalho. sibilidade das partes poderem eleger árbitros
ção do conflito trabalhista Verifica-se que é comum as partes recorre-
no Brasil. São Paulo, Institu- para dar tratamento aos conflitos trabalhistas,
to de Pesquisas Econômi- rem à Justiça do Trabalho, através do dissídio, se frustrada a negociação coletiva. No entan-
cas/USP, 1977. quando desejam usufruir do amparo legal- to, a Justiça do Trabalho permanece com seus
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interesse coletivo e de forças de pressão, ques- mesmo tempo, buscam modificar as regras,
tionando a autoridade do poder central ou es- não apenas porque elas lhes trazem vanta-
tabelecido. gens, mas, principalmente, para que essas re-
Como objeto de estudo, a negociação vem gras estejam mais de acordo com suas racio-
permitindo o desenvolvimento de diversas nalidades. Pode-se mesmo dizer que o produ-
apreciações e utilização de diferentes paradig- to de uma negociação constitui-se principal-
mas teóricos relativos à sua significação, aos mente de regras estabelecidas.
processos empregados, ao papel dos atores A terceira anotação relaciona-se à disputa
(grupos de interesses) envolvidos, à extensão central em um processo de negociação. São os
e definição do negociável. interesses dos grupos em questão, acrescidos
Ao lado de trabalhos de reflexão, de análi- do sistema de regras existentes, que refletem
se teórica, de apresentação de resultados de as relações de poder existentes. O que se ne-
pesquisa, tem surgido um número significati- gocia "são as futuras posições de poder de cada
vo de manuais práticos. A maioria deles, com um"? Neste caso, este encontro entre grupos
destaque para os americanos, visam a forne- sociais (ou representando-os), possuindo ob-
cer meios para conduzir uma negociação, des- jetivos e racionalidades distintas, com suas re-
tacando o plano das condições materiais, a servas de poder, começa a se distanciar do pa-
preparação, as táticas, os comportamentos, os radigma da teoria dos jogos.
rituais a serem observados e as estratégias. Percebe-se, então, que uma negociação é
Essas obras, apoiando-se em exemplos práti- um momento difícil, mas também revelador,
cos, se enquadram na visão normativa dos li- onde se identificam combate e adaptação mú-
vros de receitas, preconizando uma moral de tua, luta e acordo, oposição profunda de racio-
"confiança no homem e naquilo que ele tem de nalidades e compromisso de convivência. A
bom, capaz de fazer desenvolver um sistema partir desse panorama geral, pode-se levantar
melhor". pontos mais precisos de identificação e análi-
Um outro tipo de contribuição, de aporte se da negociação social, favorecendo uma me-
americano, relaciona-se com a teoria dos jo- lhor compreensão dessa prática social.
gos, que, a partir de 1960, vai dar uma "confi- A negociação é um fato tipicamente huma-
guração científica" a uma corrente de pesqui- no, como já assinalado por outros autores, cu-
sas sobre a negociação.' jos componentes essenciais, identificados nu-
Através da teoria dos jogos, pode-se forne- ma situação de negociação, agrupam-se em
cer modelos simplificados de negociação, tomo da noção de atores, da noção de diver-
apoiando-se nos postulados da racionalidade gência e da noção da busca de um arranja-
dos atores e num conjunto de convenções ar- mente."
bitrárias com o objetivo de modelar estraté- A negociação social reúne pelo menos
gias e prever resultados. dois atores (parceiros/ adversários/protago-
Apesar da contribuição para a sistematiza- nistas/interlocutores/representantes com manda-
ção do suporte teórico para a análise do pro- to etc.). Duas ou mais pessoas, duas ou várias
cesso de negociação, é necessário levantar res- delegações, dois ou mais grupos, que se si-
trições a essa corrente de estudos. tuam na maioria dos casos em duas condi-
Reynaud' aponta três tipos de correções ao ções:
esquema proposto pela teoria dos jogos. Ini-
cialmente, só se pode analisar de forma mais a) Participação voluntária: enquanto relação
correta um jogo se os dados desse jogo apre- entre dois ou vários atores, a negociação social
sentam uma certa estabilidade. Ora, as dispu- evidencia o fenômeno da participação volun-
tas, os atores e as regras, componentes da ne- tária. Baseando-se no princípio de que nin-
gociação coletiva, tomam bastante complica- guém é obrigado a negociar e, principalmente,
do o jogo social embutido num processo de permanecer na situação de negociador, a op-
6. Sobre a teoria dos jogos,
negociação. A cada fase do processo, os atores ção de não negociar e a existência de "pontos
ver, entre outros, SCHELLlNG, mudam ou podem mudar, as disputas se de ruptura" permitem manter em equilíbrio a
T. The strategy of conflict transformam, alianças diferentes podem condição da participação voluntária.
Cambridge, Harvard Universi- acontecer, as regras do jogo também mudam.
ty Press, 1960. b) Participação por representação: a noção de
Sem dúvida, o esquema estático do jogo tor- ator exige clareza de sua composição. A maio-
7. ADAM, G. & REYNAUD, na-se inadequado a esta prática social.
G. D. Gonflits du travail et ria das negociações supõe uma atividade de
changement social. Paris, O segundo ponto a considerar diz respeito representação ou de delegação. Assim, a
PUF,1978. à pluralidade das racionalidades. Essa plura- questão do mandato e da delegação trazem
8. Idem, ibidem, p, 126. lidade de racionalidade explica uma das ca- características e influências importantes na
9. DUPONT,C. La negociation: racterísticas da negociação: os atores buscam condução de negociações.
conduite, théoríe, applícatí- obter o melhor resultado possível no interior
ons. Paris, Dalloz, 1982. das regras existentes e, em alguns casos, ao A noção de divergência, causa da negocia-
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ção, diz respeito à inerência do conflito nas a) todo processo de negociação social é carac-
relações sociais estruturadas, e pode ser vista terizado por variáveis ideológicas, contex-
quanto aos aspectos da manifestação do con- tuais e institucionais. No campo das variáveis
flito, que podem ser explicitados segundo a ideológicas, as posições se situam entre os pó-
natureza das divergências (de interesses, de los da ideologia da luta de classes e da gestão
objetivos, de métodos, de status e papéis, de racional dos conflitos, resultando em negocia-
interpretação de fatos, de valores etc.). Aqui ção à dominante distributiva (idéia de regula-
também se configuram as outras opções, além ção) até a negociação à dominante integrativa
da negociação para regular conflitos. Isto sig- (idéia de conciliação). As variáveis contex-
nifica que a negociação não é a forma exclusi- tuais são as mais estudadas, apontando a in-
va de regulação, estando quase sempre asso- fluência de certos dados exteriores sobre a
ciada a outras formas de tratamento de confli- instauração e o desenrolar da negociação.
tos. Quanto às variáveis institucionais, elas deter-
O terceiro componente que caracteriza em minam o enquadramento jurídico e regula-
definitivo a situação de negociação é a busca mentar, influenciando ao mesmo tempo os
efetiva e mútua de um "arranjamento". Duas procedimentos e as práticas. Neste ponto é
idéias estão embutidas nesse componente: bom lembrar que não existe uma possibilida-
de real de se concretizar uma negociação cole-
a) uma vontade de se chegar a um resultado tiva sem o pleno direito do exercício de greve;
aceitável; e b) a negocição social tem como uma disputa
b) o arranjamento buscado é suscetível de ser generalizada o poder, seja para conservá-lo
realizado de formas diferentes. Isto se deve a ou acrescê-lo. O que se busca, na verdade, é a
diferentes variáveis, entre elas a natureza da melhoria das partes ou dos grupos de interes-
disputa (da divergência), a atitude das partes se em questão, na sua relação de força;
e as relações de força. c) a negociação é um processo dinâmico,
constituindo-se na última fase das etapas de
Assim, a negociação social pode ser defini- manifestação do conflito nas relações de tra-
da como aquela que se passa entre os grupos balho, o que significa que imediatamente
de interesses, a diversos níveis, buscando rear- após a assinatura do acordo, ou mesmo antes
ranjar, modificar, reinterpretar, criar regras e dele, haverá um retorno ao estado inicial de
normas que enquadram as relações de traba- manifestação do desacordo ou divergência de
lho e o espaço social. Estando profundamente interesses. 10
enraizada num contexto de relação social, essa
ação visa, de forma particular, ao ajustamento A negociação coletiva, seja curta ou prolon-
de regras referentes a essa relação. A negocia- gada, passa por um certo número de fases
ção coletiva será institucional se se desenrola que se repetem, como se seguissem algumas
através de instâncias oficialmente definidas, regras, compondo uma espécie de liturgia
podendo, e devendo, no entanto, ocorrer a ní- com seus ritos próprios. Pode-se distinguir na
vel do quotidiano como prática ou exigência negociação as fases de inventário dos pontos
das situações de trabalho. de litígio, de reconhecimento das possibilida-
O objetivo explícito de uma negociação co- des de negociação, do desenlace do processo
letiva é de se chegar a um acordo. Isto não e da conclusão ou do momento onde os nego-
equivale à criação de uma harmonia ou con- ciadores sentem ter atingido um ponto de
senso, mas principalmente colocar-se de acor- não-retorno. 10. Consideramos o confli-
to possuindo uma certa
do sobre um mínimo aceitável por uns e um Também há de se considerar que o desen- continuidade evolutiva, o
máximo tolerado pelos outros. Além do mais, volvimento e o resultado de uma negociação, que permite identificar, para
a negociação social não pode ser reduzida a em termos de processo, são diretamente influ- efeitos de análise, as se-
uma negociação de contrato ou ao ajustamen- enciados pela confrontação das estratégias guintes fases: rnanltestação
do desacordo ou divergen-
to de posições divergentes sobre um dado utilizadas no curso da ação. A estratégia se cia de interesses; sentimen-
problema. Ao centro dessa atividade, situa-se articula em torno dos seguintes fatores de ba- to de insatisfação ou mal-
uma relação definida pela posse ou não dos se: a questão em divergência (ou a disputa), estar social; reconhecimen-
to da situação e organiza-
meios de produção e/ou de decisão, e por as tensões e as relações de força. As questões ção da ação/reação; mani-
uma organização do processo de trabalho. divergentes (ou as disputas entre os grupos festação explícita e proposi-
Não existe um modelo de negociação so- de interesses) no processo de negociação de- ção; negociação; retorno ao
cial. Cada negociação se inscreve dentro de terminam o grau de engajamento, de motiva- estado de desacordo ou de
divergência de interesses.
realidades particulares e se explica segundo a ção e de energia das partes, e ainda definem a Lembramos que, a cada fa-
situação concreta de cada caso. Cada negocia- lógica da negociação. Para Dupont, o ponto se, pode ocorrer a interven-
ção, então, é única, não se repetindo, seja na importante não está em saber se os atores so- ção de processos de regu-
lação implícita ou informal
sua forma ou no seu resultado. Essa situação ciais em face de uma negociação adotam ou com conseqüente retorno
é decorrente de alguns fatores básicos: não estratégiats) consciente(s), mas em exami- ao estado inicial.
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nar a relação da estratégia com os fatores de- Por outro lado, os trabalhadores do Estado
terminantes apontados acima." De maneira de Minas Gerais têm demonstrado fases de
rápida, pode-se dizer que as técnicas e táticas mobilização e organização em algumas cate-
utilizadas na negociação coletiva se referem a gorias. Observa-se um movimento novo em
processos de coerção, de dissimulação, de fábricas, empresas (principalmente de presta-
persuasão e de acomodação. ção de serviços) e sindicatos. Mas não se pode
Um dos elementos importantes do proces- fazer uma generalização sobre o movimento
so de negociação é a reivindicação. A compre- sindical mineiro para o conjunto do Estado."
ensão da configuração reivindicativa pede Existe ainda um significativo peso morto de
que se estabeleça a relação entre a reivindica- diretorias sindicais. Encontram-se as catego-
ção e as condições nas quais tais reivindica- rias mais avançadas e politizadas nos grandes
ções foram produzidas. A reivindicação não é centros urbanos ou em regiões de grandes
isolável, nem do conjunto que constitui as ca- concentrações industriais.
racterísticas do sistema de relações de traba- As percepções de representantes patronais,
lho nem das circunstâncias econômicas, so- representantes sindicais e representantes do
11. Dupont completa sua ciais e políticas que favoreceram a sua apari- governo sobre a prática da negociação coleti-
análise de determinação das ção. Elas são, ainda, ao mesmo tempo, modu-
estratégias na negociação
va no Estado mostram um processo em evo-
social, dizendo que os ato- láveis na sua expressão imediata e representa- lução, a busca e o exercício da aprendizagem
res sociais podem adotar tiva das aspirações de categoria, ou da classe e contradições esperadas."
estratégias mais ou menos trabalhadora, fornecendo dados de tendência Os entrevistados, de uma forma geral,
detalhadas, explícitas e re-
fletidas, mas, como em as- indicativa do conjunto reivindicativo. apresentaram definições de negociação co-
sunto de decisão, não ter Enquanto componente central do processo letiva segundo a estrutura básica: a existên-
uma estratégia é em si já ter de negociação, as disputas entre os grupos de cia de divergências entre capital e trabalho,
adotado uma. Ver DUPONT, interesse raramente são totalmente reveladas,
C. Op. cit., pp.221-2. sendo a negociação um espaço para tratar
pois, além de seu conteúdo explícito, combi- essas divergências, mostrando a fase em
12. Para uma visão mais
completa do movimento nam entre si a realidade e o simbolismo, o ins- que se encontra o sistema brasileiro de rela-
sindical mineiro, ver, entre tante presente e o projeto futuro. Outro ponto ções profissionais: a da institucionalização
outros, LE VEN, Michael de análise refere-se à transformação das dis- do conflito.
Marie. "Movimento operário putas (manifestadas explicitamente nas rei-
e sindical, 1972-85". In: As percepções complementares, ou aquilo
POMPERMAYER, Malori J. vindicações) no curso da negociação. Aconte- que é destacado na conceituação da negocia-
(org.) Movimentos sociais ce mesmo que certas disputas chegam a se ção coletiva, são decorrentes da prática e vi-
em Minas Gerais, emergên- deslocar numa variação e com uma imprevisi- vência do entrevistado no assunto, bem como
cia e perspectivas. Belo Ho-
rizonte, UFMG, 1987. bilidade surpreendentes. Esses deslocamentos da sua inserção profissional ou social, resul-
13. Foram realizadas 29 en-
podem surgir do desenrolar espontâneo da tando num posicionamento ideológico, iden-
trevistas entre representan- negociação, como podem fazer parte de uma tificando, na prática, uma das variáveis que
tes patronais, sindicais e do elaboração estratégica. caracterizam o processo de negociação, ou se-
governo, com vivência na Em síntese, a negociação social se instala ja, todo processo de negociação social é carac-
prática da negociação, com
a intenção de levantar a ca- num espaço onde sua originalidade está na terizado por variáveis ideológicas, contex-
racterização e a evolução do ambigüidade de seus fins, na legitimidade da tuais e institucionais.
processo. Os dados obtidos própria negociação enquanto prática de regu- Se "a negociação coletiva é um jogo de força",
pelas entrevistas foram ana- lação de conflito, na sua instabilidade, e, con-
lisados utilizando procedi- onde "quem estiver melhor preparado tem mais
mentos de tratamento de seqüentemente, numa grande indetermina- chance de vencer" (representante sindical), o
dados qualitativos, buscan- ção. Trata-se, portanto, de um procedimento acordo, no entanto, é destacado pelos entre-
do, através de um resumo social suficientemente imbuído de ideologia e vistados, pois é "a oportunidade que as partes
das respostas de cada um
dos entrevistados, recom- de história, e por isso contínuo, inacabado e têm de convergir" (representante sindical),
por os itens que caracteri- sempre renovável. constituindo-se mesmo num "processo onde ca-
zassem e informassem so- pital e trabalho procuram estabelecer um contrato
bre os diversos ângulos do
tema, colocando-os num UM ESTUDO EMPíRIcO DO PROCESSO DE mínimo que regulamente as suas relações" (repre-
quadro comparativo. A par- NEGOClAçlO EM MINAS GERAIS sentante sindical), "feito através de representan-
tir dessa fase, foram elabo- tes legais das duas partes, estabelecendo as regras
radas tabelas, possibilitando
a recomposição dos itens
de convívio entre capital e trabalho por um período
discriminados pelos entre- O Brasil não tem experiência acumulada e estipulado" (representante patronal).
vistados e sua freqüência nem tradição em negociação coletiva. Em Mi- Pode-se identificar três componentes inte-
em porcentagem correspon- nas Gerais, as coisas não se passaram de for- grantes e implícitos ao processo de negocia-
dente. A soma das freqüên-
cias relativas pode ser supe- ma diferente. As práticas gerenciais ainda se ção coletiva, analisando-se o discurso dos en-
rior a 100%, já que foram agrupam em tomo de um estilo autocrático, trevistados em relação à conceituação da ne-
considerados todos os itens com o exercício de comunicações unidirecio- gociação:
discriminados por cada en- nais descendentes, mostrando bem as dificul-
trevistado. As entrevistas fo-
ram realizadas no segundo dades de se manter permanente o processo de a) a necessidade da cooperação, apesar das
semestre de 1989. negociação ao longo do ano. divergências entre as partes;
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transporte (8%), comissão paritária para dis- (58%), um bom preparo dos negociadores
cussões (8%) e estabilidade para gestantes (33%), bom senso de ambas as partes (17%),
(8%). Nota-se nessa análise dos entrevistados perspicácia (17%), e vontade de realizar um
uma mistura entre conquistas nas mesas de acordo (17%). Para os empregadores os prin-
negociação e mudanças constitucionais. cipais fatores são: vontade de realizar um
Na verdade, as conquistas mais importantes acordo (50%), diálogo aberto entre as partes
variam de acordo com cada categoria e em ca- (17%), conjuntura econômica do País estável
da momento, demonstrando resultados de (17%), gerar confiança na outra parte (17%) e
evoluções e de mudanças nas relações de força. credibilidade perante a parte adversa (17%).E
A tabela 1 mostra os principais fatores que para os representantes do governo, a vontade
levam uma negociação ao sucesso. Os sindi- de realizar um acordo (75%) e o bom senso de
calistas apontam a mobilização da categoria ambas as partes (50%).
MobilizaçãO da categoria 08 58 -
Perspícaca - 17 -
Fonte: Entrevistas.
OBS.: A Soma das freqüências relativas é superior a 100% por terem sido dadas mais de uma resposta pelos entrevistados.
Em relação aos fatores que levam ao insu- item) e o governo (50% e 25%). A falta de con-
cesso de uma negociação coletiva, é curioso fiança entre as partes, assim como a agressão
notar que somente os representantes sindicais mútua, crise econômica do país, a desonesti-
apontam entre estes fatores a falta de mobili- dade e má fé, tratamento de questões particu-
zação da categoria (42%), e a falta de preparo lares, falta de cumprimento de itens negocia-
dos sindicatos (42%). A intransigência das dos, interferência da oposição sindical, colo-
partes e o despreparo emocional e intelectual cações mal feitas pelo negociador, falta de diá-
do negociador conduzem ao insucesso de logo entre as partes e boatos da imprensa são
uma negociação, de acordo com os emprega- os outros fatores de insucesso apresentados
dores (27% e 18% respectivamente), segundo pelos entrevistados.
os representantes sindicais (25% para cada As atitudes necessárias para um bom nego-
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ciador, na opinião dos empregadores, são: ser do operariado e do contexto (55%) são as es-
paciente (42%),ser uma pessoa simples (25%), tratégias essenciais para se ter sucesso numa
ser disponível (25%), conquistar a confiança situação de negociação. As outras estratégias
da parte alheia (17%), ser honesto (25%), de- apontadas foram: conhecimento das negocia-
monstrar segurança (17%) e ter bom conheci- ções anteriores (18%), conhecimento técnico
mento de Direito do Trabalho (17%).Segundo específico (18%), vontade de negociar (18%),
um representante patronal, o negociador "tem preparação dos negociadores (18%), negocia-
que ser capaz, tolerante, estar pronto para ouvir, ção permanente (27%), coerência (9%), tran-
ser paciente, e ter disponibilidade. Mas, além de qüilidade na mesa de negociação (18%),capa-
tudo, ser uma pessoa extremamente simples". Pa- cidade de persuasão (9%) e manutenção de
ra os sindicalistas e os representantes do go- certa proximidade da empresa com o sindica-
verno, é muito importante conhecer bem as to (9%).
questões a serem negociadas (61,5% e 50%, Os representantes dos empregados consi-
respectivamente), e estar bem preparado (46% deram as estratégias essenciais como sendo: a
e 50%). Os empregadores ainda acrescentam organização sindical (55%), a mobilização da
que é necessário ter sensibilidade para captar categoria (55%), conhecimento geral da situa-
as fraquezas, forças, e intenções da parte ad- ção (33%) e conhecimento técnico específico
versa (25%) e impor-se (17%), sendo que 31% (33%). Acrescentam a negociação permanen-
dos sindicalistas entrevistados concordam te, a capacidade de persuasão, pressão do go-
com essas mesmas opiniões. verno e do congresso, política de desgaste da
Quando nos reportamos à dinâmica do imagem da empresa e diálogo (não apelar pa-
processo de negociação coletiva, e se os entre- ra a Justiça do Trabalho), com 11% de mani-
vistados a consideram satisfatória ou não, as festação cada uma. Os representantes do go-
opiniões se dividiram em "sim", "não", e em verno ainda acrescentam a suspensão da reu-
termos. nião de negociação pelo preposto da empresa
Entre os entrevistados que responderam (25%) e a manutenção da intransigência e re-
que não estão satisfeitos com a dinâmica do lutância em atender reivindicação concebível
processo de negociação coletiva, ou o estão (25%).
em termos, foram indicadas certas alterações Quanto às principais estratégias adotadas
para o melhor andamento do processo. Os re- pelo sindicato num processo de negociação,
presentantes sindicais apresentaram as se- elas não estão claramente definidas, de acor-
guintes propostas: que a política de interven- do com os entrevistados. Para os empregado-
ção do governo seja menos atuante (38%),que res (30%), os empregados (36%) e o governo
o processo de negociação seja direto e cons- (67%),a estratégia depende de cada sindicato
tante entre empresa e empregados (23%),que e do momento em que se realiza a negociação.
haja investimento no desenvolvimento econô- Isto mostra bem que as negociações não se re-
mico do País (15%),que a negociação coletiva petem na sua forma e na sua estratégia (ver as
seja nacional e unificada (15%), e que seja re- principais estratégias adotadas pelo sindicato
gulamentado o direito de greve e a organiza- na tabela 2). Para negociar é essencial que "se
ção sindical (15%). No Brasil, "não existe uma organizem os trabalhadores, analisem a conjuntu-
tradição de negociação, então ela fica limitada à ra atual, conheçam-se os contratos, os estoques da
data base ou aos momentos de conflito, que são empresa, isso é uma estratégia fundamental para a
normalmente momentos dificeis de se negociar.O negociação" (representante sindical).
processo de negociação, no meu entender, deveria Tratando-se das estratégias adotadas pelo
ser permanente" (representante sindical). patronato, notamos, novamente, que elas não
Grande parte dos representantes do gover- são claramente reveladas. De acordo com os
no também concorda que o processo de nego- representantes patronais, as suas principais
ciação coletiva entre empresa e empregado, estratégias adotadas são: mostram que a em-
deve ser constante (50%).A negociação coleti- presa está em má situação financeira, elabo-
va "deve ser um processo, não um ato único, iso- ram uma contraproposta abaixo do que po-
lado. Deve transcorrer através de conversas e dis- dem dar, antecipam as reivindicações, a estra-
cussões, onde o sindicato tenha acesso aos livros tégia utilizada depende do momento e das
da empresa, à situação da empresa" (representan- reivindicações, não existem estratégias, utili-
te do governo). Acham também que a política zam da abundância da mão-de-obra, tentam
de interferência do governo deve ser menos persuadir os trabalhadores através do diálo-
atuante (25%)e que deve haver um desenvol- go, utilizam técnicas apresentadas por consul-
vimento da arbitragem (25%). tores na área, e mantêm a categoria calma (ver
Segundo os representantes patronais, a sin- tabela 3). Na opinião de um empregador, a
ceridade (55%), o conhecimento geral da si- principal estratégia utilizada pelo patronato é
tuação (55%) e a estratégia definida a partir ir ao "outro extremo; se se pede muito, não se ofe-
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RAE NEGOCIAÇÃO COLETWA
FREQÜ~NCIARELATtVA (EM %,
ITENS DISCRIMINADOS
EMPREGADORES EMPREGADOS GOVERNO
Fonte: Entrevistas.
OBS.: A Soma das freqüências relativas é superior a 100% por terem sido dadas mais de uma resposta pelos entrevistados.
tece nada. Até chegar a uma pusiçãu racional; e que é usada sempre para defender os interesses do
mostrar os dados da situação da empresa, de ou- patrão, vêm com a cara de defender a ordem públi-
tros dissídios, e de negociações que já ocorreram." ca, mas na realidade acabam defendendo os inte-
Por sua vez, os representantes sindicais resses do patrão".
apontam, como uma forte tendência, que a es- Os representantes do governo ainda apon-
tratégia principal do patronato é a elaboração tam que os empregadores costumam não ne-
de uma contraproposta bem abaixo do que gociar com a categoria parada (33%). E, nor-
podem conceder (50%). E comum os patrões malmente, os patrões utilizam a "contrapro-
"começarem a levar a discussão de que eles estão posta bem abaixo, para depois ir cedendo cláusu-
mal, que a culpa é do governo. Como se, nós, pa- las que não sejam as econômicas, que vão afetar
trões e empregados, tívéssemos boa vontade, mas o mais diretamente o caixa" (representante do go-
governo e a atual política fossem os únicos empe- verno).
cilhos. E falam demais da situação econômica ruim; Os sindicatos têm se apresentado cada vez
"~todas as vezes que eu negociei até hoje, a empresa mais atuantes e reivindicativos, exercendo um
estava sempre quase falida e em situação dramáti- papel primordial no fomento da negociação
ca" (representante sindical). Acrescentam, ain- coletiva. Para os empregadores, as principais
da, outras estratégias não citadas pelos em- funções dos sindicatos são: a defesa dos inte-
pregadores: não cumprem o que está na lei, resses da categoria (67%),não se envolver em
procuram criar um clima fraternal, desviar a questões políticas (50%),incentivar a produti-
atenção quando eles começam a perder, criar vidade e o progresso profissional dos traba-
discórdia no interior da categoria, repressão lhadores (33%), e lutar por melhores salários
psicológica, e repressão policial. Um outro (25%). Contrapondo-se às opiniões dos em-
sindicalista presta o seguínte depoimento so- pregadores, os sindicalistas acham que os sin-
bre as estratégias utilizadas pelo patronato: dicatos devem: promover a conscientização
"A repressão psicológica, de colocar anúncios em política da categoria (54%), lutar por melho-
rádios, que agride a liberdade do trabalhador de fa- res salários (38%) e por melhores condições
zer a greve, os carros de som, a repressão policial de trabalho (23%)(ver tabela 4).
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NEGOOAÇÃO COLETIVA RAE
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Tabela 3: Principais estratégias adotadas pelo patronato
Fonte: Entrevistas.
OBS.: A Soma das freqüências relativas é superior a 100% por terem sido dadas mais de uma resposta pelos entrevistados.
Fonte: Entrevistas.
OBS.: A Soma das freqüências relativas é superior a 100% por terem sido dadas mais de uma resposta pelos entrevistados.
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