acidente de trabalho Destrinchando o acidente de trabalho
O Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) é
alimentado pelas informações prestadas nas notificações e investigações de doenças e agravos que fazem parte da lista nacional de doenças de notificação provenientes tanto no setor formal quanto informal da economia. Segundo dados do Sinan, o número de acidentes de trabalho graves no Brasil cresceu aproximadamente 40% no ano de 2020, saindo de 94.353 em 2019 para 132.623 (OIT, 2021).
Entre 2012 e 2020 registrou-se 5,6 milhões de doenças e acidentes
do trabalho no Brasil, os quais ocasionaram um gasto previdenciário que ultrapassa 100 bilhões de reais com as despesas acidentárias resultantes, levando a uma perda de 430 milhões de dias de trabalho. Adicionalmente, o número de afastamentos e auxílios-doença relativos à transtornos mentais e comportamentais como depressão, ansiedade, estresse (acidentários e não-acidentários) foram de 224 mil, em 2019, para 289 mil em 2020, refletindo num aumento de 30% mesmo durante o primeiro ano da pandemia de COVID-19 (OIT, 2021).
Nos próximos itens serão apresentados os conceitos de acidente de
trabalho do ponto de vista legal e Prevencionista, as causas prováveis, bem como os procedimentos obrigatórios de serem realizados mediante a concretização de um sinistro. Além disso, serão discutidos alguns exemplos de situações possíveis.
Conceito de Acidente de Trabalho
O acidente de trabalho impacta não somente a própria vítima, como
também: os funcionários da organização, tanto de setores próximos quanto distantes; os familiares, dependentes e amigos da vítima; a comunidade presente nos arredores de onde se deu o sinistro; a comunidade em geral, que obtenha conhecimento do ocorrido de forma direta ou indireta do ocorrido, até mesmo por meio de noticiários de rádio e televisão; e, em última instância, toda a sociedade, visto que a previdência social representa uma despesa para todos os cidadãos.
Nas palavras de Barsano e Barbosa (2014b, p. 96):
O acidente do trabalho é uma das formas mais
cruéis de castigar a sociedade. Quando ele ocorre, todos perdem, pois o trabalhador fica lesionado ou até inválido, sua família terá gastos com medicamentos e hospitais, a empresa terá de arcar com os depósitos do FGTS e ficar com uma imagem negativa, e a previdência social (representando toda a sociedade) terá́ mais uma despesa com um trabalhador improdutivo, que poderia estar contribuindo com o INSS e que, agora, só trará gastos (BARSANO; BARBOSA, 2014b, p. 96).
A Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os Planos de
Benefícios da Previdência Social, no seu artigo 19 define legalmente o acidente de trabalho como uma consequência do exercício do trabalho a serviço de uma organização, de um empregador ou pelos segurados descritos no inciso VII do art. 11 desta mesma Lei, que resulte em lesão corporal ou perturbação funcional e que provoque a morte ou a perda ou redução, de forma permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho (BRASIL, 1991).
O artigo 11 da Lei 8.213/91, referido acima, por sua vez, estabelece
que o segurado especial da Previdência Social é a pessoa física residente na zona rural ou aglomerado urbano ou rural próximo a ela que, de forma individual ou em regime de economia familiar, mesmo com o auxílio eventual de terceiros, na condição de produtor, o qual realize atividade agropecuária em área de até 4 módulos fiscais. Também está incluso o seringueiro ou extrativista vegetal ou pessoa que conduza essas atividades como meio de vida. Adicionalmente, consistem em segurado especial o pescador artesanal ou que exerça função semelhante e que tenha a pesca como principal meio de vida. E, ainda, o cônjuge, companheiro ou filho maior de 16 anos de idade ou equiparado, do segurado os quais trabalhem com o grupo familiar (BRASIL, 1991).
De acordo com a Lei 8.213/91, outras ocorrências e situações que
são reconhecidas como acidente de trabalho, equiparando-se a este perante a lei. Assim, o artigo 20 estabelece que o acidente do trabalho contempla também a doença profissional, a qual é produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho em virtude da realização de uma atividade de forma constante, descrita pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social. Além disso, também é tido como acidente de trabalho a doença do trabalho que venha a ser adquirida ou desencadeada em função de condições especiais inerentes ao modo pelo qual o trabalho é realizado e que tenha conexão direta com ele (BRASIL, 1991).
No entanto, a Lei 8.213/91 distingue as enfermidades que não podem
ser tidas como doença do trabalho, são elas: doenças degenerativas, doenças relativas ao grupo etário do qual o indivíduo faz parte, as moléstias que não ocasionem incapacidade laborativa, doenças endêmicas adquiridas por segurado habitante de região na qual ela seja frequente, salvo mediante comprovação de que foi adquirida por conta da exposição ou do contato direto devido à natureza do trabalho. Porém, a Lei 8.213/91 também descreve casos excepcionais, visto que, tendo-se constatado que a doença resultou das condições especiais inerentes ao trabalho ou tenha conexão direta com ele, a Previdência Social deve sim considerá-la acidente do trabalho (BRASIL, 1991).
No artigo 21 da Lei 8.213/91 são enumerados outros tipos de eventos
que também se equiparam ao acidente do trabalho, tais como o acidente conectado ao trabalho que, mesmo que não tenha uma causa única, tenha corroborado diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou que tenha resultado em lesão que exija assistência médica para a sua recuperação. Adicionalmente, também são mencionados os acidentes sofridos pelos segurados no local e no horário do trabalho, como consequência de algum ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho. Outros eventos considerados acidentes de trabalho são as ofensas físicas intencionais, incluindo as provenientes de terceiros, por motivo de disputa relacionada ao trabalho. Adicionalmente, são englobados os atos de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho, os atos de pessoas privadas do uso da razão e atos fortuitos como desabamento, inundação, incêndio ou decorrentes de força maior (BRASIL, 1991).
No artigo 21 ainda são listadas como equiparadas ao acidente de
trabalho as doenças ocasionadas por contaminação acidental do empregado durante a execução de atividade laboral, bem como o acidente sofrido pelo segurado fora do local e horário de trabalho, quando da execução de ordem de serviço sob a autoridade da organização. Além disso, também se encaixam como acidente de trabalho a prestação espontânea de serviço à empresa com a finalidade de evitar prejuízo ou proporcionar algum resultado positivo; durante viagem a serviço do empregador, inclusive para capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção usado, ou mesmo veículo de propriedade do segurado. Também o acidente que tenha se dado no percurso da residência para o local de trabalho ou e vice-versa, utilizando qualquer meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado é uma modalidade de acidente de trabalho (BRASIL, 1991). Um adendo é feito pelo artigo 21 no que diz respeito à delimitação do que faz parte do exercício do trabalho, definindo que o empregado é considerado no exercício do trabalho ao longo dos períodos reservados para a refeição ou descanso, satisfação das necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este (BRASIL, 1991).
De acordo com Mattos e Másculo (2019), críticas são feitas a essa
definição legal devido ao fato dela não descrever o evento em si, se limitando a determinar o acidente de trabalho perante um antecedente (o exercício de trabalho e a existência de uma relação com uma empresa) e uma consequência (lesão ou perturbação funcional). Isso significa que a definição legal diz respeito a aspectos que têm relação com o trabalhador, de modo que acaba reportando mais do acidentado do que do acidente em si. Entretanto, os autores supracitados justificam essa espécie de “desvio” do foco da definição por se tratar de uma lei que serve de base para o sistema previdenciário, de modo que, com base nela, será definido quem faz jus a receber auxílios reparatórios de perdas provocadas por acidentes de trabalho.
O que se percebe perante a discussão em torno da definição legal é
que ela deixa uma lacuna no tocante à prevenção da ocorrência dos sinistros. É justamente para preenchê-la que emergiu o conceito prevencionista do acidente de trabalho. Sob essa perspectiva, o acidente de trabalho é tido como “qualquer ocorrência fora da programação, que pode ou não ser inesperada, interrompendo o processo normal da atividade, tendo como consequência isolada ou concomitante o tempo perdido, dano material ou lesões humana” (STUMM, 2020, p.33).
A irrepetibilidade dos valores pagos por erro da Administração Pública como efeito da extinção do ato administrativo de concessão de benefícios previdenciários:: uma abordagem de acordo com os ditames do neoconstitucionalismo