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PODER JUDICIÁRIO DA PARAÍBA

COMARCA DA CAPITAL
1a VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE

Ref. Processo nº 0000000-00.0000.000.0000

SENTENÇA

AUTORIZAÇÃO DE VIAGEM DE
ADOLESCENTE AO EXTERIOR.
NEGATIVA DE CONSENTIMENTO
PATERNO. SUPRIMENTO PELA
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. PREVALÊNCIA
DO MELHOR INTERESSE DO MENOR.
ADOLESCENTE COM DISCERNIMENTO
SUFICIENTE. MANIFESTAÇÃO DE
VONTADE A SER CONSIDERADA.
IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
- Nos termos dos arts. 84 e 85 da Lei nº
8.069/90 – ECA, a autorização judicial para
viagem de menor ao exterior é indispensável
quando um dos genitores não consente com o
pedido.
- O suprimento do consentimento paterno só é
possível quando as circunstâncias do caso
concreto revelam que a ida do filho ao exterior,
para a companhia da mãe, atende ao bem- estar
do menor e privilegia o princípio do melhor
interesse da criança, notadamente quando o
incapaz, adolescente de 14 anos, manifesta o
seu ponto de vista em relação ao local mais
adequado para residir.

Vistos etc.

Tratam-se os presentes autos de Ação de Autorização para Viagem e


Emissão de Passaporte requerida por R. M. em favor de seu filho, J. M., nascido em
16.07.2001, filho também de M. O., visando suprir o consentimento paterno para que o
adolescente possa empreender viagem com destino à Espanha, local em que pretende
fixar residência durante alguns meses.

Narra a inicial que a genitora pretende realizar um Mestrado na


Universidade de Castilla na Espanha, ressaltando a importância desses estudos para a
mesma. Aduz que deseja levar o seu filho para que esse possa ter uma oportunidade de
crescer culturalmente e aprender um novo idioma. No entanto, aduz que o genitor se
nega, injustificadamente, em conceder a autorização para a viagem internacional do
adolescente.

Juntou documentos às fls. 06/23.

A tutela foi antecipada parcialmente, conforme decisão à fl. 26, tendo


o alvará ficado retido nos autos até o julgamento do agravo de instrumento interposto
pela parte promovida.

O genitor do menor contestou a presente ação, conforme petição às


fls. 53/63, suscitando, inicialmente, a conexão processual. No mérito, assevera que
convive com o seu filho diariamente, haja vista que devido às viagens da genitora,
aquele está sob a sua guarda de fato, e por essa razão, intentou com a ação de guarda
no juízo da Vara de Família, visando à regularização dessa situação. Afirma, ainda, que
a genitora requereu a presente autorização judicial sem o consentimento do
adolescente.

Juntou documentos às fls. 64/88.

Impugnação à contestação às fls. 90/95.

Termo de Audiência de Instrução e Julgamento às fls. 126/127, no


qual foi ouvido apenas o adolescente.

O Ministério Público, à fl. 128/129v, pugna pelo indeferimento do


pedido inicial.

É o breve relatório.

Decido:

Inicialmente, ressalto que não há que se falar em conexão para


reunião dos feitos, já que, não obstante os feitos – ação de suprimento de
consentimento paterno para autorização de viagem e a ação de guarda – possuírem
identidade entre as partes, os seus objetos e as causas de pedir não se confundem.

Ademais, a justiça da infância e da juventude é competente para ação


de suprimento de consentimento paterno para menor empreender viagem ao exterior,
nos termos do art. 148, IV do estatuto da Criança e do Adolescente.

No entanto, este juízo só terá competência para apreciar os feitos


relacionados ao instituto da guarda de criança e de adolescentes se esses estiverem na
situação do art. 98 do mesmo diploma legal, o que não é o caso dos autos.
Sendo assim, rejeito a preliminar suscitada.

Colhe-se dos autos que R. M. ajuizou a presente ação pretendendo o


suprimento do consentimento paterno e a expedição de alvará para autorização judicial
para que o seu filho, J. M., 13 anos, possa viajar à Espanha e lá residir com a mesma
por alguns meses.

A autorização de viagem de menores para o exterior está disciplinada


nos arts. 83 e 84 do Estatuto da Criança e do Adolescente, assim redigidos:

Art. 83. Nenhuma criança poderá viajar para


fora da comarca
onde reside, desacompanhada dos pais ou
responsável, sem
expressa autorização judicial.

Art. 84. Quando se tratar de viagem ao exterior,


a autorização
é dispensável, se a criança ou adolescente:
I - estiver acompanhado de ambos os pais ou
responsável;
II - viajar na companhia de um dos pais,
autorizado expressamente pelo outro através de
documento com firma reconhecida.

Conforme se vê, a autorização judicial para viagem de menor ao


exterior é indispensável, salvo quando a criança estiver acompanhada de ambos os pais
ou responsável, ou quando estiver na companhia de um dos genitores, autorizado pelo
outro.

No caso concreto, uma vez que não houve o consentimento do pai do


adolescente, a parte promovente não está autorizada a viajar para o exterior com o seu
filho, senão mediante prévia autorização do juiz, suprimindo a vontade do genitor.

Resta perquirir, portanto, a pertinência das razões da discordância


paterna.

Extrai-se dos autos que o genitor não é favorável à ida do filho à


Espanha em companhia da genitora, uma vez que é ele quem tem exercido a guarda de
fato e participado ativamente da vida do adolescente. Ademais, afirma que essa não é a
vontade do seu filho.

De fato, através de sua oitiva no termo de audiência às fls. 126/127


vê-se que o adolescente manifestou claramente a sua vontade de permanecer no Brasil,
ressaltando o seu desejo de continuar residindo com o seu genitor.

O legislador brasileiro, priorizando a doutrina da proteção integral e


do melhor interesse da criança e do adolescente, previu no §1º do art. 28 do Estatuto da
Criança e do Adolescente a regra de que, tratando-se de maior de doze anos de idade,
será necessário seu consentimento que deve ser colhido em audiência.

Dessa forma, vê-se que o Estatuto se alinha perfeitamente ao art. 12


da Convenção dos Direito da Criança, senão vejamos:

Artigo 12
1. Os Estados Partes assegurarão à criança que
estiver capacitada a formular seus próprios
juízos o direito de expressar suas opiniões
livremente sobre todos os assuntos relacionados
com a criança, levando-se devidamente em
consideração essas opiniões, em função da
idade e maturidade da criança.
2. Com tal propósito, se proporcionará à
criança, em particular, a oportunidade de ser
ouvida em todo processo judicial ou
administrativo que afete a mesma, quer
diretamente quer por intermédio de um
representante ou órgão apropriado, em
conformidade com as regras processuais da
legislação nacional.

Assim, no presente caso, tratando-se de um adolescente de 13 (treze)


anos, que já dispõe de algum discernimento para fazer suas escolhas, e considerando o
que foi relatado pelo mesmo na audiência, o que demonstra estabilidade e consolidação
de sua convivência com o genitor, razoável que seja a sua vontade levada em
consideração na presente decisão.

É inegável que a convivência materna é importante para a formação


do adolescente. Afinal, o próprio texto constitucional atribuiu à “família” e aos “pais”
o dever de assistir, criar e educar os filhos, contribuindo para a formação de sua base
social, moral e intelectual (arts. 227 e 229 da CR/88).

Da mesma da forma, é verdade que um período residindo e


estudando no exterior traria para o adolescente uma experiência que lhe proporcionaria
enriquecimento tanto pessoal quanto cultural.

Todavia, havendo dissenso dos genitores quanto à pretensão ajuizada,


cabe ao magistrado ponderar todas as circunstâncias do processo, de forma a
resguardar os melhores interesses da criança ou do adolescente.

Portanto, se os autos não apontam razoabilidade para deferir a


viagem do adolescente para o exterior, juntando-se à mãe, o indeferimento do pedido é
medida que se impõe.

Frise-se, mais uma vez, que a prestação jurisdicional em causas dessa


natureza deve contemplar precipuamente o incapaz, e não apenas os interesses e a
conveniência de seus genitores.

Por isso, ainda que relevante os argumentos da genitora, quanto à


necessidade da convivência com o filho e da importância dessa experiência de estudar
e residir em outro país para o adolescente, não há como prevalecer apenas o desejo da
mesma, pois é dever do magistrado zelar pelo bem-estar do adolescente, propiciando-
lhe todas as condições para uma vida normal, digna e tranquila.
Por tais razões, consoante parecer ministerial, revogo os termos da
decisão que antecipou parcialmente a tutela e na forma do art. 269, I, do Código de
Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial de autorização judicial
para que a promovente realize a sua inscrição no exame supletivo.
Sem custas e honorários.
P. R. I.

João Pessoa, 25 de fevereiro de 2015.

Adhailton Lacet Correia Porto


Juiz de Direito

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