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HABERMAS

Contexto: Filósofo alemão nascido em 1929 – nasceu quando a Alemanha sofria as


consequências da primeira guerra mundial (fome, desemprego) e o ocidente sofria
com a queda da bolsa de Nova York. Vivenciou a segunda guerra mundial, Hitler,
bomba atômica.
Foi da segunda geração da Escola de Frankfurt (era assistente do Adorno), que tentava
realizar uma teoria crítica do marxismo, atualizando a crítica ao capitalismo a partir de
releituras marxistas.
Início do trecho: Ele usa a teoria crítica do valor de Marx para explicar o que ele
entende que falta na teoria ortodoxa marxiana sobre intervencionismo estatal,
democracia de massa e o Estado de bem-estar social.
1. Teoria do valor em Marx
Tudo que é produzido para ser comprado/vendido é mercadoria e tem um valor (valor
de uso – determinado pela utilidade, trabalho concreto, que vemos a pessoa fazendo;
e valor de troca - ficção da sociedade que pactua o valor do trabalho abstrato, o
quanto valeria aquilo naquela sociedade).
Fetichismo: o processo de produção capitalista afasta o trabalhador (quem produz) do
resultado do seu trabalho (mercadoria) – alienação do trabalho, fazendo parecer que a
mercadoria tem vida própria – as coisas passam a controlar as pessoas – o sistema
capitalista tem como foco não as pessoas e suas relações, mas sim as mercadorias e as
suas relações de troca. Todo a forma como vivemos está em função da mercadoria e
do dinheiro, inclusive o Estado.
Teoria da crise: inerentes e inevitáveis ao capitalismo – crises de consumo.
2. Teoria crítica do valor
Aos poucos, toda a vida social é conectada à lógica do dinheiro, leva a crise das
divisões de classe, individualização e vão falar sobre as formas de dominação nas
sociedades modernas. Transformação da cultura como mercadoria e controle social.
Voltando ao trecho: pra ele, as teorias marxianas fracassam ao tentar explicar a
pacificação do conflito de classes e o sucesso dos modelos socialdemocratas
implantados desde o fim da segunda guerra.
Se propõe a mostrar os déficits teóricos, apresentar um modelo que explique as
estruturas e fraturas do capitalismo tardio e por fim, falar sobre o papel da cultura.
a) Intervencionismo do Estado – teoria das crises abordaria apenas o aspecto
econômico das crises: o crescimento e desequilíbrio econômico está sim ligado a
economia, mas não só, já que o Estado intervém e balanceia esses desequilíbrios,
suprindo as lacunas do mercado. No entanto, não se pode substituir 100% o mercado
pelo Estado, não podendo afetar a divisão do trabalho entre a economia: o Estado não
pode ser produtivo economicamente, devendo apenas garantir os modos de produção.
Democracia de massa: entende que a teoria funcionalista marxista é insuficiente para
explicar os meios de controle (dinheiro e poder). Segundo ele, o dinheiro está no
mundo da vida por conta das instituições do direito privado burguês e a teoria do valor
toma forma pela relação contratual entre os proprietários do capital e os
trabalhadores assalariados. Já o poder, o direito público que organiza cargos não é
suficiente para explicar, pois não traz a questão da legitimação da ordem do poder – a
legitimidade só se produziria por procedimento democráticos de formação política da
vontade. O processo de legitimação de regula pela liberdade de opinião e organização,
concorrência entre partidos, eleições. Porém, a participação dos cidadãos se encontra
sob restrições estruturais.
Pra ele, há uma tensão indissolúvel entre o capitalismo e a democracia, já que são dois
princípios opostos de integração social. Pelos princípios democráticos, as sociedades
modernas teriam como o mundo da vida se sobrepondo aos subsistemas. A
democracia estaria ancorada nas exigências das pessoas e suas necessidades coletivas
– ação e integração social. De outro lado, a dinâmica capitalista somente se preserva
quando o processo de acumulação se separa do valor de uso – se afasta cada vez mais
do mundo da vida e das exigências de legitimação da ação administrativa.
Cita Offe, que fala sobre a diferença das sociedades capitalistas para as outras: ao
mesmo tempo que há o reconhecimento do problema da integração social e do
sistema, mas os caminhos de solução são dois contraditórios: privatização da produção
e politização. O sistema normativo precisa se tornar cada vez mais abstrato, sem os
sentidos dos sujeitos, ao mesmo tempo que não pode excluir os sujeitos totalmente.
De um lado, a opinião pública é vista como manifestação de interesse geral, elo da
vontade política e base da legitimação, por outro, é resultado da produção de lealdade
das massas ao sistema político que as conquista para se tornar independente do
mundo da vida.
Para Habermas, o sistema político garante a lealdade das massas de duas formas:
programas de Estado social e sua exclusão da discussão pública (seja dificultando o
acesso a esfera política como pela burocracia e manipulando os fluxos de
comunicação). O papel do cidadão é apenas de eleger os líderes.
Estado social: transferência dos problemas do trabalho da vida privada para pública,
transformando o Estado numa democracia de massa, institucionalizando os conflitos,
“defendendo” os trabalhadores assalariados (direito trabalhista) sem que as relações
de dependência, propriedade e rendimentos, que são estruturalmente desiguais,
sejam afetadas.
O Estado social é obrigado a absorver os efeitos negativos do sistema e da acumulação
do capital sem poder mexer com a forma de organização/estrutura da produção
econômica. Assim, os limites fiscais regulam os investimentos sociais, que precisa se
adaptar as estruturas controladas pelo dinheiro e o poder.
Assim, conforme os sistemas políticos se desenvolve, assumem uma forma paradoxal:
a pacificação dos conflitos no Estado Social se dá sob a condição de manter e continuar
o processo de acumulação do capital.
As fontes da desigualdade mudam, não só por conta das compensações trazidas pelo
Estado Social, mas porque a situação das classes mudou. O Estado social modifica
como as relações de troca de estabelecem entre o sistema (economia e Estado) e
mundo da vida (na esfera pública e privada) e os papéis de trabalhador, consumidor,
cliente e cidadão.
Marx na teoria do valor focou apenas na troca decorrente de força de trabalho e
salário, ou seja, sobre a valorização das coisas no mundo do trabalho (alienação). Para
o Habermas, conforme o Estado Social se desenvolve, os problemas da alienação
aumentam – o trabalhador também é consumidor, e o Estado apazigua os conflitos –
aparece o cidadão, mas, que é neutralizado; e o cliente do Estado, que é inflado.
Ao mesmo tempo que a existência e implantação de direito políticos significa a
universalização do papel de cidadão e o esvaziamento da participação política: ao
mesmo tempo que se legitima o Estado, cria-se a lealdade de massa. Envolve,
portanto, o mundo da vida que passa a ser redefinido em tono do sistema – a
economia de consumo de massa e as relações de clientela exercitadas burocratizando
a vida.
A teoria da consciência de classe, por conta da pacificação do conflito perde
referência, já que o Estado Social dificulta a identificação de mundos da vida
específicos de uma única classe – Horkheimer a substituem por uma teoria de cultura
de massa.
Habermas entende que Marx havia entendido que a cultura burguesa era ambivalente:
ao mesmo tempo que alimenta as pretensões de liberdade individual, cientificidade,
universalismo, de uma prática crítica e modificadora, também se transfigura numa
prática confirmadora. Compara com a religião, que é mantida pela tradição e rituais,
que quando é racionalizada, perde a razão de ser: quando a cultura burguesa se
“seculariza”, surgem visões como fascismo, comunismo, socialismo e radicais
conservadores.
Assim, os subsistemas Estado e economia interferem na reprodução do munda da vida
por meios burocráticos e monetários (colonização do mundo da vida).
Para testar a tese da colonização, quer usar o “caso da juridificação de esferas de ação
estruturadas comunicativamente”: ou seja, no desenvolvimento do direito se vê as
relações sociais organizadas formalmente, de forma que a passagem da integração
social para a integração sistêmica se dá por meios de processos de juridificação.
O QUE É JURIDIFICAÇÃO? Tendência de aumento do direito escrito, regulação jurídica
de novos assuntos (extensão do direito) ou adensamento de regras já existentes
(condensação do direito), situações que antes eram geridas de forma informal no
mundo da vida.
Voltando ao texto: vê 4 impulsos de juridificação: 1) Estado burguês da Europa
Ocidental 2) Estado de direito da monarquia alemã do séc. XIX 3) Estado de direito
como consequência da Revolução Francesa (democrático) e 4) Estado de direito
democrático e social do século XX.
Durante o absolutismo, o direito europeu permitiu a institucionalização dos meios que
permitiram que a economia e o Estado se diferenciassem em subsistemas – passa-se
de uma sociedade estamental para capitalista, em que se cria um direito privado que
fala sobre os contratos e o comércio privado entre proprietários, com objetivo de
garantir a liberdade e propriedade, segurança jurídica de igualdade formal e, por outro
lado, cria o monopólio do poder/violência no poder soberano no Estado como única
fonte de poder legal, colocando o mundo da vida à disposição do mercado.
No segundo surto, os burgueses passam a ter direitos subjetivos reclamáveis perante o
soberano (que ainda não é democrático), ou seja, o mundo da vida da burguesia
merecia ser protegido – criação das constituições.
No terceiro surto, no âmbito constitucional, vem ideais de liberdade e participação
política – os burgueses são tidos como cidadãos e as leis tem a suposição de que
expressam o interesse geral (juridificação do processo de legitimação), já que nascem
do direito de voto igual e liberdade de partidos políticos.
No quarto surto, entende-se pela constitucionalização da relação de poder social
ancorado nas estruturas de classe – limitação de tempo de trabalho, proteção contra
demissão, seguro social, etc., ou seja, refere-se ao poder de organização dos meios de
produção (direitos trabalhistas). Está, então, garantindo a liberdade ao mesmo tempo
que a subtrai. Ex.: aposentadoria – progresso na forma de cuidar dos pobres, porém,
juridificar os riscos da vida exige um preço que é pago por meio da interferência no
mundo da vida dos beneficiados (burocracia estabelece critérios para recebimento,
que é monetarizado).
As normas de direito podem ser consideradas sob dois aspectos: serem legitimadas
exclusivamente pelo procedimento (positivismo) ou mediante uma justificação
material (no mundo da vida). O direito media o mundo da vida e os sistemas, mas
pode ser usado como meio de controle (nos casos do direito administrativo e
econômico) e tem esse aspecto aliviado por ser vinculado por meio de procedimentos
formalmente corretos (princípio da positivação).
No direito de família e escolar (exemplo do Habermas), como estes são anteriores a
qualquer juridificação e estão ligados diretamente ao mundo da vida, a sua
juridificação é apenas a complementação de um contexto comunicativo de ações,
tendo o direito como meio e não através de instituições jurídicas – quando os
processos da escola e da família passam a ser controlados sem somente complementar
contextos sociais, surgem desequilíbrios funcionais.
Os cidadãos passam a ser clientes da Administração Pública, o que vai neutralizando a
participação política e a emancipação dos sujeitos – positivar os direitos sociais ajuda a
melhorar as condições de vida, mas gera serviços impessoais e burocráticos, que não
tem conexão com o mundo da vida e a real necessidade das pessoas. O cidadão teria
espaços de atuação e interação comunicativa, enquanto o cliente somente tem
espaços de reclamação individual.

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