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Faculdade de Artes e Humanidades

Licenciatura em Psicologia
2019/2020
Unidade Curricular: Psicologia da Motivação e Personalidade
Docente: Prof.ª Alda Portugal

Análise do filme “O Rapaz que Prendeu o Vento”

à luz da Teoria Motivacional de Mowrer - Incentivos


como Geradores de Emoção

Discente: Sara Ornelas nº2066518


Introdução
O presente trabalho incidirá sobre a análise do filme “O Rapaz que Prendeu o Vento”
(2019) à luz da teoria motivacional de Orval Hobart Mowrer - incentivos como
geradores de emoção, contemplando igualmente aspetos da abordagem da motivação
intrínseca.

Este drama britânico é baseado numa história verídica, dirigido e realizado por Chiwetel
Ejiofor (que também integra o elenco e interpreta o pai da personagem principal) e foi
lançado em janeiro de 2019. Explora a vida de William Kamkwamba (Maxwell Simba),
um menino de treze anos que vive na aldeia de Wimbe, no Malawi, com a sua família.
A história passa-se em 2001, ano em que o Malawi enfrenta algumas mudanças e
dificuldades económicas devido a cheias fortes, seguidas de secas que afetam a
agricultura – a fonte de alimento da população. As comunidades de Wimbe e das aldeias
vizinhas encontram-se sozinhas a lutar contra a possibilidade de passarem fome, uma
vez que o governo do país não os ajuda, simplesmente se limita a fazer campanha como
tentativa de ganhar as eleições.

William é um menino ternurento, que se dedica à escola, a arranjar rádios para os seus
amigos e vizinhos bem como a procurar peças e aparelhos eletrónicos que possa
reutilizar e é curioso sobre o mundo que o rodeia. Os seus pais são agricultores, contudo
fazem todos os esforços para pagar os estudos aos seus filhos, com a ambição de que se
irão tornar pessoas melhores. William demonstra uma simplicidade e alegria
admiráveis, encontrando a felicidade nas pequenas coisas da vida.

Infelizmente, o efeito das mudanças climatéricas faz-se sentir, e a população começa a


enfrentar um grave período de fome. Os pais de William deixam de conseguir pagar os
seus estudos e vêm-se na obrigação de racionalizar a pouca quantidade de comida que
têm. Annie, a filha mais velha do casal, vê a sua oportunidade de frequentar a
universidade negada e decide fugir com um professor da escola de William por quem se
apaixonou deixando a família “com menos uma boca para alimentar”.

Vendo a sua família e comunidade a passar por grandes dificuldades, William procura
ajudá-los e, por ainda ter acesso à biblioteca da sua escola, encontra um livro que irá
mudar tudo – “Usar a energia”. William procura criar um moinho de vento que, ligado a
uma bateria, possa gerar eletricidade capaz de pôr a funcionar uma bomba de água que
encontrou e assim conseguir água para irrigar as plantações e alimentar a população
(Ejiofor, 2019).

Seleção da Teoria

A teoria motivacional incentivada, em particular a teoria desenvolvida por O. Hobart


Mowrer em 1960, que compreende o incentivo como gerador de respostas emocionais,
pelos seus construtos e racional teórico muito associado à emoção possui uma maior
capacidade compreensiva e descritiva do comportamento e motivação de William. A
proposta de Mowrer refere que a motivação incentivada intervém entre estímulo e
resposta ao criar respostas emocionais, em particular de medo, esperança, alívio e
desapontamento (Petri & Govern, 2013). A associação que faz entre estímulo e emoção
e como essa associação incentiva comportamentos que mantenham essa emoção é uma
boa forma de explicar a determinação e resiliência de William demonstrada ao longo do
filme. Apesar da proposta de Mowrer ser o foco teórico, é significativamente importante
olhar para a motivação de William segundo a abordagem das componentes da
aprendizagem, em especial a motivação intrínseca, pois salienta o aspeto individual e
singular das suas atitudes e ações.

O seu estudo sobre a energia eólica e eletricidade, a busca pelos materiais que precisa, a
ajuda que pede a amigos e ao pai são alguns dos comportamentos centrais que irão ser
explorados. Usar o conceito de incentivo como motivador do comportamento humano é
benéfico para sermos capazes de compreender porque é que as pessoas fazem o que
fazem e, neste caso particular, porque é que William fez o que fez.

Análise do Filme à luz da Teoria de Mowrer

O comportamento humano tende a ser ativo, organizado e orientado para objetivos e


eventos específicos, contudo, essa organização e integridade podem ser modificadas
tanto pelo contexto social, como por aspetos intrínsecos ou fatores biológicos (Ryan,
2012). No caso de William, a sua motivação é claramente intrínseca e isso pressupõe
que o que o motiva resulta das suas necessidades psicológicas e tem um cariz
espontâneo. Ele procura atingir um objetivo por si próprio, porque quer e sente-se capaz
e não porque algo ou alguém o incentivou a fazer (Reeve, 2009). Esta abordagem da
motivação intrínseca olha para o comportamento e motivação à luz da aprendizagem e
realça que quanto maior for a motivação intrínseca, maior será a persistência em
alcançar o objetivo (Reeve, 2009). William, desde o início, comprova o seu desejo por
conhecer e saber mais, sendo muito dedicado à escola e, quando foi obrigado a deixar
de ir, ficou desolado. Este desejo por saber mais está intimamente ligado com a procura
de obter realização pessoal e praticar as suas próprias competências (Reeve, 2009). A
sua persistência é também inegável e conseguimos observá-la do início ao fim do filme,
principalmente quando alguns acontecimentos o afastam do seu objetivo, como o pai
que não o apoia, e a sua reação é de continuar e insistir.

Seguindo esta perspetiva, os conceitos que as teorias da motivação incentivada postulam


tornam-se pertinentes para o estudo da motivação humana, como o conceito de
incentivo, referente a um evento ambiental ou objeto capaz de aproximar ou afastar uma
pessoa de um objetivo e que oscilam o seu valor em função do momento (Reeve, 2009).
O incentivo é algo aprendido, no sentido em que o ser humano ao longo da sua vida,
possui objetivos e metas que pretende alcançar e não nasce com a necessidade de as
satisfazer; o valor do incentivo de um determinado estímulo ambiental é puramente uma
aprendizagem (Reeve, 2009). Esta aprendizagem destaca o que o organismo quer
realizar, mais do que o que simplesmente pode realizar (Petri & Govern, 2013). William
não nasceu incentivado nem com a necessidade inata de querer construir um moinho de
vento para ajudar a sua comunidade, aprendeu que, dadas as circunstancias do seu
contexto ambiente, aquele objetivo seria uma mais valia.

Na sua conceptualização teórica, Mowrer salienta que um estímulo é capaz de gerar


emoções que, por sua vez, direcionam a nossa resposta, afastando ou aproximando do
objetivo em vista (Petri & Govern, 2013). Para este autor, a motivação humana está
profundamente conectada ao processo de aprendizagem de respostas emocionais, e, na
sua teoria apresentou quatro emoções envolvidas neste processo: o medo, a esperança, o
alívio e o desapontamento, todavia, o foco recairá na esperança (Petri & Govern, 2013).

O comportamento de William, muito focado e determinado a construir o moinho de


vento, tem por base o medo de ver a sua família e a sua comunidade a passar fome. O
medo é neste caso a emoção impulsionadora das suas ações em direção ao seu objetivo.
Todavia, são as emoções positivas que o condicionam a construir o moinho e detêm um
papel extremamente importante. Há durante o filme vários momentos onde vemos
presente o sentimento de esperança e de facto, é essa emoção que o faz continuar a
tentar todos os dias. Considerando as atitudes e comportamentos de William podemos
ver que o livro que encontra sobre como usar a energia é o que lhe dá esperança de
conseguir salvar a sua família e a comunidade dos tempos de seca e escassez que se
avizinham. William persiste e faz uma série de tentativas para criar um moinho de
vento: uma demonstração clara da sua motivação intrínseca. O facto de conseguir
arranjar as peças que necessitava e criar um pequeno moinho, funcional e capaz de
acender uma lâmpada foi um momento impulsionador da sua esperança e expetativa.
Ainda assim, o estado emocional de desapontamento está bem presente quando o seu
pai se zanga e obriga-o a trabalhar na agricultura e a parar de tentar criar algo que não
crê que vai funcionar.

William, por estar motivado intrinsecamente, não desiste e evidencia uma grande
persistência, criatividade e capacidade de superação (Reeve, 2009). No final do filme,
ao conseguir construir um moinho de vento funcional e que trouxe água para regar as
plantações, é dominado por um sentimento de alívio.

Conclusão

A teoria de O. Hobart Mowrer vem dar sentido e significado à persistência e


determinação de William, com o seu conceito de ativação do comportamento através de
um incentivo de cariz emocional, porque de facto a parte emocional é o que move
William. Esta teoria permite-nos compreender que é o medo que ativa o comportamento
de William e a esperança, o desapontamento e o alívio direcionam e orientam-no para
alcançar o seu objetivo. Tudo o que consegue alcançar são pequenos estímulos
associados à esperança inicial – criar um moinho de vento. A utilização da abordagem
das componentes da aprendizagem permitiu uma reflexão mais detalhada e completa da
motivação de William por destacar o seu caráter interno e espontâneo.

Referências
Ejiofor, C. (Realizador). (2019). O Rapaz que Prendeu o Vento [Filme].

Petri, H., & Govern, J. (2013). Motivation: Theory, Research and Application. Califórnia:
Wadsworth.

Reeve, J. (2009). Understanding Motivacion and Emotion. Iowa: John Willey & Sons.
Ryan, R. M. (2012). The Oxford Handbook of Human Motivation. Oxford: Oxford University
Press.

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