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DIREITO CIVIL: OBRIGAÇÕES

1ª edição
Alexandre Bento Bernardes de Albuquerque

DIREITO CIVIL: OBRIGAÇÕES


1ª edição

Teresina
Núcleo Jurídico
2012
E-mail:
nucleojur@hotmail.com
alexalbuquerque@hotmail.com

Albuquerque, Alexandre Bento Bernardes de


A345d Direito civil: obrigações / Alexandre Bento Bernardes
de Albuquerque. Teresina: Núcleo Jurídico, 2012.
334 p.

Inclui bibliografia
ISBN 978-85-91-4259-0-7

1. Direito civil. 2. Obrigações – Direito – Brasil. I. Título.

CDD 340.56
Às duas mulheres de minha vida, Dona
Maria sempre apoiando e questionando
e Dona Vanessa que até aceitava, mas
nunca concordava com as várias horas
na frente do computador digitando.
SUMÁRIO

I – INTRODUÇÃO ........................................................................ 13

II – NOÇÕES HISTÓRICAS .......................................................... 15


1. O Início ............................................................................... 15
2. Roma .................................................................................. 18
3. Idade média e os cânones ...................................................... 19
4. Expansionismo e mercantilismo ........................................... 20
5. Brasil ................................................................................... 21

III – DA RELAÇÃO OBRIGACIONAL ......................................... 25


1. Noções gerais. .................................................................... 25
2. Dos elementos. ................................................................... 27
2.1 Sujeito ativo – credor (aspecto subjetivo) ....................... 27
2.2 Sujeito passivo – devedor (aspecto subjetivo) ................. 28
2.3 Prestação – aspecto objetivo. ......................................... 31
2.4 Vínculo jurídico – aspecto imaterial (abstrato) ............... 34
3. Das fontes. ......................................................................... 36

IV – DA CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES ........................... 37


1. Quanto à exigibilidade. ....................................................... 37
1.1 Obrigações civis ........................................................... 37
1.2 Obrigações naturais ...................................................... 38
1.3 Obrigações morais ........................................................ 40
2. Quanto ao objeto. ................................................................ 40
3. Quanto aos elementos ......................................................... 41
4. Quanto à finalidade ............................................................. 42
4.1 Obrigação meio ............................................................ 42
4.2 Obrigação resultado ...................................................... 43
4.3 Obrigação garantia ........................................................ 45
5. Classificação quanto aos elementos acidentais ...................... 47
5.1 Obrigação condicional .................................................. 47
5.2 Obrigação a termo ........................................................ 48
6. Obrigações modais ou encargo ............................................ 50
7. Obrigações híbridas (propter rem ou ob rem) ........................... 51

V – DAS OBRIGAÇÕES QUANTO AO OBJETO. .......................... 53


1. Obrigação de dar ................................................................... 53
1.1 Obrigação de dar coisa certa. .......................................... 55
1.2 Obrigação de restituir. .................................................... 58
1.3 Obrigação de dar coisa incerta ........................................ 62
2. Obrigação de fazer ................................................................ 67
3. Obrigação de não fazer .......................................................... 74

VI – OBRIGAÇÕES ALTERNATIVAS ........................................... 79


1. Noções gerais ...................................................................... 79
2. Da escolha .......................................................................... 80
3. Da impossibilidade de entrega por partes .............................. 82
4. Das prestações periódicas e da pluralidade de optantes .......... 82
5. Da inexecução e das perdas e danos ...................................... 83
6. Das obrigações facultativas ................................................... 85

VII – DAS OBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS ............. 89


1. Prestação e sua divisibilidade. ............................................. 90
2. Obrigação divisível ............................................................. 92
3. Obrigação indivisível .......................................................... 93
4. Remissão da prestação ......................................................... 97
5. Perda da prestação e suas consequências ............................... 99

VIII – DAS OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS ................................... 103


1. Noções gerais .................................................................. 103
2. Solidariedade ativa .......................................................... 108
2.1 Noções gerais ........................................................... 108
2.2 Posição do herdeiro de credor solidário ..................... 112
2.3 Perda da prestação .................................................... 114
2.4 Relação interna ......................................................... 114
2.5 Exceções .................................................................. 116
3. Solidariedade passiva ...................................................... 119
3.1 Noções gerais ........................................................... 119
3.2 Herdeiros do devedor solidário ................................. 121
3.3 Pagamento parcial e da remissão ............................... 124
3.4 Agravamento da condição dos devedores solidários .... 125
3.5 Da perda da prestação ............................................... 126
3.6 Da mora ................................................................... 127
3.7 Exceções .................................................................. 128
3.8 Renúncia à solidariedade ........................................... 129
3.9 Relação interna ......................................................... 131
3.10 Comparação com a obrigação indivisível .................. 135

IX – DA TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES ........................... 139


1. Da cessão ......................................................................... 139
1.1 Noções gerais ............................................................. 139
1.2 Das proibições à cessão ............................................... 141
1.3 Nomenclatura das partes e os terceiros ......................... 143
1.4 O devedor - cedido ...................................................... 146
1.5 Atos conservatórios .................................................... 151
1.6 Das exceções .............................................................. 153
1.7 Da responsabilidade ................................................... 154
1.8 Da limitação à responsabilidade .................................. 158
1.9 Da penhora ................................................................ 160
2. Da assunção de dívida ....................................................... 160
2.1 Noções gerais ............................................................. 160
2.2 Do consentimento expresso ........................................ 162
2.3 Dos tipos de assunção ................................................. 163
2.4 Dos efeitos da assunção ............................................... 164
2.5 Das exceções e da hipoteca ......................................... 167
3. Cessão de contrato ............................................................ 168

X – DA EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO PELO PAGAMENTO ... 173


1. Noções gerais ..................................................................... 173
2. Quem pode pagar ................................................................ 174
2.1 Terceiros ..................................................................... 176
2.2 Terceiro não interessado ............................................... 177
2.3 Da entrega de bem para pagamento ............................... 179
3. Quem pode receber ............................................................. 180
3.1 Representantes do credor .............................................. 181
3.2 Credor putativo ............................................................ 183
3.3 Pagamento ao incapaz .................................................. 184
3.4 Do portador da quitação ............................................... 185
3.5 Da penhora .................................................................. 185
4. Dos elementos objetivos ...................................................... 186
4.1 Objeto do pagamento .................................................... 187
4.2 Lugar do pagamento ..................................................... 208
4.3 Tempo do pagamento ................................................... 212

XI – DOS PAGAMENTOS ESPECIAIS ....................................... 217


1. Pagamento em consignação ............................................... 217
1.1 Noções gerais ............................................................ 217
1.2 Possibilidades da consignação .................................... 218
1.3 Requisitos ................................................................. 222
1.4 Lugar da consignação ................................................. 225
1.5 Aceitação do depósito e seu levantamento .................. 225
1.6 Consignação de bens .................................................. 227
1.7 Prestações indeterminadas ......................................... 228
1.8 Despesas ................................................................... 229
1.9 Obrigação litigiosa ..................................................... 229
1.10 Quando o credor requer a consignação ....................... 230
2. Sub-rogação. .................................................................... 231
2.1 Noções gerais ............................................................ 231
2.2 Sub-rogação legal ....................................................... 233
2.3 Sub-rogação convencional .......................................... 236
2.4 Efeitos da sub-rogação ............................................... 238
3. Imputação do pagamento .................................................. 241
3.1 Noções gerais ............................................................ 241
3.2 Requisitos da imputação ............................................ 242
3.3 Quem imputa ............................................................ 243
4. Dação em pagamento ....................................................... 246
5. Novação. ......................................................................... 250
5.1 Considerações gerais .................................................. 250
5.2 Dos tipos de novação ................................................. 253
5.3 Efeitos da novação ..................................................... 255
6. Compensação ................................................................... 258
6.1 Noções gerais ............................................................ 258
6.2 Requisitos ................................................................. 259
6.3 Exceção à reciprocidade de polos ............................... 263
6.4 Exceções à compensação ............................................ 264
6.5 Compensação e cessão ............................................... 267
6.6 Imputação na compensação ........................................ 269
6.7 Terceiros ................................................................... 269
6.8 Compensação fiscal ................................................... 270
7. Confusão. ........................................................................ 271
8. Remissão das dívidas ........................................................ 274
9. Transação e do compromisso. ........................................... 277

XII – INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO .......................... 279


1. Noções gerais .................................................................. 279
2. Responsabilidade pelo inadimplemento ............................ 282
3. Caso fortuito e força maior ............................................... 284

XIII – DA MORA ........................................................................ 287


1. Conceito ......................................................................... 287
2. Consequências da mora ................................................... 287
3. Constituição da mora ...................................................... 288
4. Mora no ato ilícito .......................................................... 289
5. Mora e perda da prestação ............................................... 290
6. Mora do credor .............................................................. 291
7. Purgação da mora ........................................................... 293

XIV – DOS ACRÉSCIMOS .......................................................... 295


1. Da atualização monetária ................................................ 296
2. Das perdas e danos .......................................................... 297
2.1 Noções gerais ........................................................... 297
2.2 Danos emergentes ..................................................... 298
2.3 Lucro cessante .......................................................... 298
2.4 Prejuízos efetivos ...................................................... 299
2.5 Acréscimos às perdas e danos .................................... 301
3. Dos juros ........................................................................ 305
3.1 Noções gerais ........................................................... 305
3.2 Evolução dos juros ................................................... 306
3.3 As limitações dos juros e sua aplicação ....................... 307
4. Dos honorários advocatícios ............................................ 311
5. Da cláusula penal ............................................................ 311
5.1 Noções gerais ........................................................... 311
5.2 Aplicação na obrigação ............................................. 312
5.3 Limites de aplicação ................................................. 314
5.4 Da redução do valor da cláusula penal ....................... 315
5.5 Responsabilidade pela cláusula penal nas obrigações
indivisíveis e divisíveis ............................................. 317
5.6 Desnecessidade de prejuízo e caráter compensatório .. 318

XV – DAS ARRAS OU SINAL ..................................................... 321


1. Das arras confirmatórias ................................................... 322
2. Das arras penitenciais ....................................................... 324
3. Do pedido de complementação ......................................... 325

REFERÊNCIAS .......................................................................... 329


I
INTRODUÇÃO

O presente manual tem pretensões simples e básicas de


ajudar os novos operadores do Direito a entender melhor o
Direito das Obrigações, muitas vezes apontado como complicado
e difícil. Entre tantas alegações sobre a dificuldade de se estudar
esse ramo, talvez a maior seja acerca da existência de muitas
filigranas e detalhes doutrinários e positivados.
Aparentemente, tais conclusões remontam à crescente
necessidade de objetividade cega e resumida a que as novas
gerações têm se submetido. Impera a necessidade de se buscar
os caminhos mais rápidos para aprendizagem, muitas vezes, com
resumos superficiais, não os desmerecendo, vez que têm
aplicação prática.
Infelizmente, o que tem marcado futuros colegas
bacharéis em Direito é justamente esse tipo de leitura, o que
acaba afetando o entendimento de várias matérias da Ciência
Jurídica, as básicas, inclusive, que servem de suporte técnico
para o estudo da Ciência como um todo.
A atenção dos colegas no estudo das leis é necessária
para entender o cuidado que se deve ter com o conhecimento
doutrinário, que serve de suporte para todo o estudo do Direito.
Para entender a relação entre as pessoas civis, necessário se faz
entender quem são essas pessoas, o que é personalidade, quando
elas obtêm capacidade, quais são seus objetos e como elas
interagem pelo negócio jurídico. Com essas noções é possível se
entender como essas mesmas pessoas realizam o negócio jurídico,
quais efeitos esses negócios poderão gerar e quais as suas
consequências para cada um dos indivíduos envolvidos na relação.
Assim, no Direito das Obrigações, estudam-se as relações
entre as pessoas, o que é determinante para entender como cada
13
indivíduo pode pactuar e exigir o cumprimento do acordo, ou
buscar a reparação do dano causado por um ato ilícito. Trata-se
de uma área do Direito que não se prende ao estudo das relações
privadas, é pilar para princípios e institutos aplicados a diversos
outros ramos do Direito, como no Direito Tributário cujo estudo
tem como base a relação Contribuinte e Estado. É uma relação
decorrente de um fato gerador que impõe ao contribuinte o dever
de pagar a prestação obrigacional, um tributo.Também no Direito
do Trabalho, que tem por base uma relação obrigacional entre
empregador e empregado, sendo devidamente configurada com
prestação (trabalho) e contraprestação (remuneração).
Diversos são esses exemplos da importância do Direito
das Obrigações, mas este breve comentário serve apenas para
mostrar ao leitor a importância deste ramo do Direito, que se
sobrepõe ao estudo privado das relações, possuindo aplicação e
importância em diversos outros ramos jurídicos. Lembrem-se
que afora suas ligações e base para outros ramos do Direito, todo
o Direito Civil retrata basicamente as relações privadas e suas
consequências. Assim, paciência e interesse vão se fazer
necessários para a busca de conhecimento.

14
II
NOÇÕES HISTÓRICAS

1. O Início
Um conceito essencial ao desenvolvimento de qualquer
estudo em matérias sociais é o da Autotutela, que representa o
expoente máximo de selvageria e individualismo humano.
Lembre que por meio deste instituto se apresenta a forma de
resolver qualquer conflito de interesse pelo uso puro e simples
da força.
Imagine a humanidade em seus primórdios e sem a
sofisticação da sociedade moderna. Os bens de consumo eram
basicamente peles, alimentos, cavernas e parceiros. Neste período,
a posição de interesse do indivíduo, inserido neste contexto, não
seria satisfeita mediante um acordo camarada, ocorria a
imposição de vontade do indivíduo mais forte, que submetia os
mais fracos aos seus interesses.
No entanto, o ser humano não é solitário, o mesmo tem
natureza solidária. Por conta desta floriu a necessidade de
convivência em grupos (diversas podem ser as razões desta
aglomeração humana, seja a mera proteção ou mesmo o
sentimento inerente aos mamíferos de viver em bando), essa
convivência acarretou a introdução de novos valores e costumes
às essas comunidades primitivas. Esses valores geraram formas
primitivas de relações, entre as quais se tem como maior exemplo
o escambo (troca de itens), nota-se que esta é a forma mais
primitiva de uma relação obrigacional.
Essa acomodação de interesses leva a formação dos
deveres jurídicos, essas são imposições feitas ao indivíduo de
forma que esse é obrigado a adotar determinadas condutas, em
um primeiro momento sem sanções, por não existir uma
sociedade organizada, com leis e imposições. Em um segundo

15
momento, com o surgimento das nações primitivas, começa a
se observar a interferência destes entes na conduta destes deveres
jurídicos, passando a impor regras para o trato social. Necessário
lembrar, a evolução não é igualitária e algumas civilizações
desenvolveram-se mais que outras, quanto a autotutela, esta não
é totalmente extirpada das relações humanas, ainda em nossos
dias a mesma é utilizada, possuindo inclusive situações
codificadas1.
Os deveres jurídicos passam a ser analisados como as
condutas mantidas entre os indivíduos, pelas quais o interesse de
uma pessoa poderá ou não ser aceito pela outra, ocorre que em
algumas situações se vislumbra o caráter econômico deste
instituto, que corrobora para a formação das relações obrigacionais
propriamente ditas. Não desmerecendo parte da doutrina que
entende a não necessidade do cunho econômico para a existência
de uma relação obrigacional, o que interessa a este estudo é o fato
dos povos passarem a ter maior interesse nas relações entre seus
indivíduos, sobretudo naquelas de cunho econômico, que
possibilitavam a circulação e acúmulo de riquezas.
Neste momento aparecem as primeiras culturas a tratar
diretamente destes deveres jurídicos como relação obrigacional.
Esta relação gera a ligação entre os indivíduos, de forma que as
pessoas passam a ocupar posições para satisfazer seus interesses,
umas se vinculando às outras, muitas vezes submetendo a própria
vida como forma de forçar o cumprimento da relação
obrigacional. O dever jurídico retratava o interesse do indivíduo
“A” em trocar peles, pelos cereais do indivíduo “B” (escambo),
agora se retrata o acerto entre estes indivíduos e a possibilidade
de um deles forçar que o outro cumpra sua palavra, por meio da
interferência estatal.

1
Veja no Código Civil:
Art. 1210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação,
restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser
molestado.
§ 1º O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua
própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem
ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.

16
Gregos, Egípcios e Babilônios são as culturas mais antigas
e conhecidas a tratar da relação obrigacional, neste momento a
responsabilidade não era apenas patrimonial, a ligação entre os
indivíduos era considerada personalíssima, caso uma parte
descumprisse o acordo responderia com a sua própria vida, pelos
deveres assumidos. Veja os exemplos de positivação da relação
obrigacional no Código de Hamurabi2:
8º - Se alguém rouba um boi ou uma ovelha ou um
asno ou um porco ou um barco, se a coisa pertence ao
Deus ou a Corte, ele deverá dar trinta vezes tanto; se
pertence a um liberto, deverá dar dez vezes tanto; se
o ladrão não tem nada para dar, deverá ser morto.

[...]

43º - Se ele não cultiva o campo e o deixa em


abandono, deverá dar ao proprietário do campo
quanto trigo haja no campo vizinho e deverá cavar e
destorroar o campo, que ele deixou ficar inculto e
restituí-lo ao proprietário.

Os babilônios codificaram as condutas que os seus


cidadãos poderiam manter e os acordos que poderiam realizar,
esses artigos apresentam as possíveis consequências, inclusive,
pela prática de atos ilícitos. Na primeira transcrição é expressa a
prática de uma conduta delituosa, o roubo, que gerava ao
criminoso o dever de indenizar aquele que tivesse sido vítima
de sua conduta ilícita. Há a formação de uma obrigação, mas
esta obrigação primitiva não surgia apenas nesta situação, também
se verifica, no outro artigo transcrito, que nos contratos primitivos
haveria punição, caso o mesmo fosse descumprido. Há o
ressarcimento pelo prejuízo, pois o encarregado terá a obrigação
de reparar por não ter cumprido aquilo pelo que se havia obrigado.
Os elementos da obrigação primitiva são claramente
identificados, de um lado o indivíduo que aguarda determinado
bem capaz de satisfazer seu interesse, do outro um indivíduo
com o dever de entregar este bem, e ainda, o caráter
2
Fonte: DVD Magister Jurídico. LexMagister. Edição 39.ago/set 2011.

17
personalíssimo destas obrigações, em que o sujeito que deveria
entregar o bem, poderia perder a própria vida por descumprir o
acordo inicial. A vida logo será desvinculada do cumprimento
da obrigação, em Roma ocorrem mudanças nesta postura
obrigacional, quando se apresenta um “divisor de águas” entre a
relação personalíssima e a patrimonialização da mesma.

2. Roma
O Direito Civil brasileiro sofre forte influência do Direito
Romano. Neste, o Direito das Obrigações era tratado como um
ramo próprio, vez que para aquele povo o Direito se dividia em
Pessoais, Reais e Obrigacionais. Neste berço são encontradas as
bases de diversos institutos ainda utilizados, por exemplo, os
romanos dividiam as obrigações em dare, facere e non facere, por
sua influência, na atualidade, ainda se utiliza a clássica divisão,
apenas tendo sido traduzida para: dar, fazer e não fazer.
Apesar desta influência existem alguns institutos romanos
enterrados no passado, por exemplo, havia a aplicação da manus
injectio. Por este instituto, a ação executiva possuía especiais
características, vez que era personalíssima e não real (patrimonial),
essa tinha por base a relação estritamente privada e o vínculo
personalíssimo (intuito personae) entre as partes de um acordo,
por conta deste tipo de vínculo o devedor respondia com seu
próprio corpo, pelo cumprimento da relação obrigacional. Apesar
de sua força e tradição esse instituto sofrerá os efeitos da Lex
Poetelia Papiria, de 428 de Roma (ou 326 ac), muito bem explica
Fernando Noronha3:
A lex Poetelia Papiria foi conseqüência de uma
revolta da plebe, que se teria insurgido contra os maus-
tratos infligidos a um jovem, Lúcio Papírio, que estava
em estado de nexus (quase escravidão) devido a um
empréstimo que seu pai contraíra e não pagara, porque
este, no exercício da pátria potestas, o entregara ao
credor. A partir dessa lei, o corpus do devedor que

3
NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 3 ed. Revisada e atualizada. São
Paulo: Saraiva, 2010, p 165.

18
não fosse delinquente (isto é, aquele cuja obrigação
não resultasse de algum delito do jus civile) não mais
ficou na situação de obnoxium; a partir daí, pelas
obrigações provenientes de “atos lícitos”, o devedor
passou a responder apenas com os seus bens.4

Essa legislação tem o importante papel de romper com o


paradigma até então imposto, de que a pessoa envolvida na
relação obrigacional deve cumprir a entrega do bem pactuado, e
se não o fizer pagará com a própria vida, assim se verifica a
humanização do cumprimento da relação obrigacional. O
cumprimento da relação obrigacional será garantido não mais
pela vida do devedor, mas por seu patrimônio, que seria utilizado
para forçar o cumprimento da obrigação. Necessário lembrar, os
efeitos da Lex Poetelia Papiria foram aplicados apenas nas relações
obrigacionais decorrentes do não cumprimento de acordos e
contratos, nas situações que a relação obrigacional surgisse de
atos ilícitos nada foi alterado neste período, na realidade em
algumas sociedades os castigos corporais e a pena de morte se
mantêm até nossos dias.

3. Idade média e os cânones


Finda a idade antiga, historicamente segue-se ao período
tido como 1.000 anos de escuridão. Nesse período a humanidade
sofreu grande influência, por vezes imposta, da religião, o estudo
do Direito das Obrigações não ficaria fora desta influência. Os
cânones da Igreja Católica realizaram estudos e definiram
institutos que influenciariam as relações obrigacionais. Para estes,
a influência espiritual no cumprimento da relação obrigacional
era importantíssima, a parte envolvida na relação obrigacional
tem o dever de cumprir o acordado em razão do mesmo buscar
o Paraíso, e caso ele descumprisse o acordo estaria cometendo
pecado (peccatum), o que o levaria diretamente ao inferno. Veja o
que diz o ilustre mestre Caio Mário5:

4
Obnoxium: responder com o próprio corpo.
5
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil. Volume II. Teoria Geral
das Obrigações. 22 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p 11.

19
O Direito medieval, conservando embora a
concepção obrigacional da época clássica, introduziu-
lhe maior teor de espiritualidade, confundindo na
idéia mesma de peccatum a falta de execução da
obrigação, que era equiparada à mentira, e condenada
toda quebra da fé jurada. E, pelo amor à palavra
empenhada, instituíram os teólogos e canonistas o
respeito aos compromissos(pacta sunt servanda), que
lhe instilaram maior conteúdo de moralidade com a
investigação da causa.

Os cânones instituíram, em decorrência da espiritualidade,


a pacta sunt servanda, esse instituto é essencial à existência da
relação obrigacional, por influência desse brocardo a relação
obrigacional tem como pressuposto básico que o prometido deve
ser cumprido, as partes envolvidas na relação têm um dever não
apenas patrimonial, mas espiritual de cumprir o que foi pactuado,
evitando os castigos a serem impostos quando desencarnassem
e estivessem no mundo espiritual.
Veja que a pacta sunt servanda é aplicada modernamente,
sendo um dos pilares das relações obrigacionais. Sempre se busca
o cumprimento da obrigação, modernamente esse instituto tem
sofrido restrições e revisões, como serão vistas adiante, mas a
ideia básica do respeito ao acordado foi mantida.

4. Expansionismo e mercantilismo
A idade moderna é caracterizada pelo expansionismo
europeu que desenvolveu as ligações comerciais entre a Europa
e o resto do globo terrestre. A globalização não é um fenômeno
exclusivo do século XX, já na idade moderna se nota as
características desse fenômeno, este conhecimento e ligação entre
todas as partes do mundo mostra, também, o interesse estatal
em aumentar suas riquezas com a grande circulação de
mercadorias. Durante este período surge a maior necessidade de
bases jurídicas sólidas e capazes de garantir e assegurar o
cumprimento das relações obrigacionais.
O mercantilismo serviu de mola mestra para a aplicação
e exigência da relação obrigacional, sempre exigindo o efetivo

20
cumprimento do que foi prometido. A nova classe passou a
impor sua necessidade por liberdade (ideias do liberalismo), e
esta era sua maior preocupação, impõe-se a total liberdade de
contratar e de impor as cláusulas contratuais que os burgueses
entenderem, sem a participação ou a imposição de limites por
parte do estado, logo se nota que fraternidade e igualdade ficariam
em segundo plano.
O indivíduo se torna o centro de tudo, com maior
importância que o Estado, tendo o mesmo total liberdade para
pactuar e agir conforme sua vontade, o privado é mais importante
do que a coletividade e ninguém pode contrariar este interesse,
nem mesmo o Estado. As pessoas podem agir, na realização de
seus negócios, com total liberdade.

5. Brasil
As ideias europeias de que o “ter” seria mais importante
que o “ser” influenciam o pensamento neste período, sendo
importante a liberdade para realizar os atos privados sem a
interferência estatal, em decorrência deste pensamento surgem
os códigos totais com ampla proteção ao homem e a propriedade,
os contratos podem ser instituídos com total autonomia de
vontade das partes. É neste cenário que surgem as primeiras
ideias de um Código Civil brasileiro, primeiro com Teixeira de
Freitas, posteriormente com o projeto de Coelho Rodrigues, que
à época foi acusado de tentar impor legislação alienígena ao
Brasil, mas na realidade o mesmo tratava um projeto de Código
Civil tão moderno, que em meados do Século XIX, legislava
sobre questões como o divórcio, direitos na prestação de serviços
e direito do menor.
Ocorre que não foi este o Código com a responsabilidade
de cuidar da nação brasileira, sendo tal honra do Código
Bevilaqua (de 1916), esse centrado no indivíduo e na liberdade
do mesmo contratar de forma absoluta, podendo impor as
cláusulas que entendesse mais convenientes, conforme a
tendência da época.
A ideia do individualismo superior aos interesses públicos
21
ou a coletividade foi imposta à sociedade durante muito tempo,
essa ideia passou por efetiva transformação quando da elaboração
da Magna Carta de 1988. Infelizmente as mudanças da ciência
jurídica não aparecem na forma de um clarão imediato que
ilumina a todos e instantaneamente alteram a sociedade. As
mudanças são consequência dos anseios sociais, dos estudos
doutrinários e dos tribunais impondo novas formas de se
interpretar e aplicar a lei. Assim surge a Constituição Federal de
1988 que impôs uma nova forma de se vê e aplicar os anseios
sociais.
A Constituição vigente manteve os direitos do indivíduo
e o respeito aos mesmos, maior exemplo disto é que no art. 5º,
XXII, impõe a garantia à propriedade privada. No entanto, a
Constituição apresenta um princípio que muito influencia a
aplicação das normas e tem protegido diversos anseios sociais
(veja as recentes decisões do STF sobre união homoafetiva6 e

6
10230796 - UNIÃO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO. ALTA
RELEVÂNCIA SOCIAL E JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DA QUESTÃO
PERTINENTE ÀS UNIÕES HOMOAFETIVAS. LEGITIMIDADE
CONSTITUCIONAL DO RECONHECIMENTO E QUALIFICAÇÃO DA UNIÃO
ESTÁVEL HOMOAFETIVA COMO ENTIDADE FAMILIAR. (...) O DIREITO À
BUSCA DA FELICIDADE, VERDADEIRO POSTULADO CONSTI TUCIONAL
IMPLÍCITO E EXPRESSÃO DE UMA IDÉIA-FORÇA QUE DERIVA DO
PRINCÍPIO DA ESSENCIAL DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.(...).
Ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado de direitos nem sofrer quaisquer
restrições de ordem jurídica por motivo de sua orientação sexual. Os homossexuais,
por tal razão, têm direito de receber a igual proteção tanto das Leis quanto do sistema
político-jurídico instituído pela Constituição da República, mostrando-se arbitrário e
inaceitável qualquer estatuto que puna, que exclua, que discrimine, que fomente a
intolerância, que estimule o desrespeito e que desiguale as pessoas em razão de sua
orientação sexual. RECONHECIMENTO E QUALIFICAÇÃO DA UNIÃO
HOMOAFETIVA COMO ENTIDADE FAMILIAR. - O Supremo Tribunal Federal -
apoiando-se em valiosa hermenêutica construtiva e invocando princípios essenciais
(como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da autodeterminação, da
igualdade, do pluralismo, da intimidade, da não discriminação e da busca da felicidade)
- Reconhece assistir, a qualquer pessoa, o direito fundamental à orientação sexual,
havendo proclamado, por isso mesmo, a plena legitimidade ético-jurídica da união
homoafetiva como entidade familiar, atribuindo-lhe, em consequência, verdadeiro
estatuto de cidadania, em ordem a permitir que se extraiam, em favor de parceiros
homossexuais, relevantes consequências no plano do Direito, notadamente no campo
previdenciário, e, também, na esfera das relações sociais e familiares. (...) A família
resultante da união homoafetiva não pode sofrer discriminação, cabendo-lhe os mesmos
direitos, prerrogativas, benefícios e obrigações que se mostrem acessíveis a parceiros de
sexo distinto que integrem uniões heteroafetivas. (...). - O princípio constitucional da

22
prisão civil7), este é o da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III,
Constituição Federal). Tal princípio busca o respeito maior ao ser
humano e seus anseios, de forma que ninguém pode impor conduta
que desestabiliza a pessoa como membro da sociedade,
menosprezando ao mesmo ou o submetendo a situação vexatória.
O início do século XXI trouxe uma nova codificação civil,
que apesar de seu passado de Imperador (o Código Civil era tido
como a principal e mais importante legislação), passou a ocupar
a posição de fiel súdito do novo Rei (Constituição Federal).
Nesta nova posição de submissão aos anseios maiores da
Constituição Federal encontra-se o Código Civil de 2002, que
passa a respeitar mais o “ser” que o “ter”. Nesta última etapa, a
aplicação da legislação civil passa a sofrer a forte e importante
influência do princípio da boa-fé objetiva.
Conforme a denominação, a aplicação da boa-fé não se
submete a aspectos subjetivos da parte, tais como o
conhecimento de determinado detalhe contratual capaz de anular
o negócio, a boa-fé objetiva impõe que nas relações as partes

busca da felicidade, que decorre, por implicitude, do núcleo de que se irradia o postulado
da dignidade da pessoa humana, assume papel de extremo relevo no processo de
afirmação, gozo e expansão dos direitos fundamentais, qualificando-se, em função de
sua própria teleologia, como fator de neutralização de práticas ou de omissões lesivas
cuja ocorrência possa comprometer, afetar ou, até mesmo, esterilizar direitos e franquias
individuais. - Assiste, por isso mesmo, a todos, sem qualquer exclusão, o direito à busca
da felicidade, verdadeiro postulado constitucional implícito, que se qualifica como
expressão de uma idéia-força que deriva do princípio da essencial dignidade da pessoa
humana. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e da Suprema Corte Americana.
Positivação desse princípio no plano do direito comparado. A FUNÇÃO
CONTRAMAJORITÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E A
PROTEÇÃO DAS MINORIAS. - A proteção das minorias e dos grupos vulneráveis
qualifica-se como fundamento imprescindível à plena legitimação material do estado
democrático de direito. - Incumbe, por isso mesmo, ao Supremo Tribunal Federal, em
sua condição institucional de guarda da constituição (o que lhe confere “o monopólio
da última palavra” em matéria de interpretação constitucional), desempenhar função
contramajoritária, em ordem a dispensar efetiva proteção às minorias contra eventuais
excessos (ou omissões) da maioria, eis que ninguém se sobrepõe, nem mesmo os grupos
majoritários, à autoridade hierárquico-normativa e aos princípios superiores consagrados
na Lei Fundamental do estado. P recedentes. Doutrina. (Supremo Tribunal Federal
STF; RE-AgR 477.554; MG; Segunda Turma; Rel. Min. Celso de Mello; Julg. 16/08/
2011; DJE 26/08/2011; Pág. 55) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
(grifo nosso)
7
STF. Súmula vinculante nº 25.
É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito.
(DJe-STF 23.12.2009)

23
têm o dever de observar a lealdade e boa-fé necessária ao negócio
jurídico. Veja o que diz Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber8:
Como se pode depreender, a referência dessas normas
não é a uma boa-fé subjetiva, como estado de
consciência do fornecedor ou do consumidor, mas a
uma nova concepção de boa-fé, que, desvinculada
das intenções íntimas do sujeito, vem exigir
comportamentos objetivamente adequados aos
parâmetros de lealdade, honestidade e colaboração
no alcance dos fins perseguidos em cada relação
obrigacional.

Assim, neste breve esboço, observe que na história da


humanidade a relação obrigacional, antes personalíssima
(apoiava-se no poder de vida e morte do credor sobre o devedor)
evoluiu em um primeiro momento para a humanização, com a
submissão não mais do devedor, mas apenas de seu patrimônio,
para nos dias mais modernos se verificar o respeito à dignidade
do devedor, bem como a aplicação da própria boa-fé objetiva
sobre a relação. Efetivamente se continua a buscar o
cumprimento da obrigação, mas este não pode submeter o
devedor a situações que o impossibilitem de viver.

8
TEPEDINO, Gustavo (Coord.). Obrigações: estudos na perspectiva civil-
constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 32.

24
III
DA RELAÇÃO OBRIGACIONAL

1. Noções gerais
A palavra obrigação muita vezes é igualada a ideia simples
de dever, esta pequena confusão ocorre por conta da vinculação
que as pessoas fazem entre obrigação e dever. A palavra obrigação
tem sua etimologia no latim obligare que significa ligar ou vincular,
assim mais que a questão da necessidade de cumprir uma
determinada prestação, o fator determinante da existência da
obrigação é justamente o vínculo, a ligação entre as partes
submetidas à relação obrigacional.
A parte geral do Código Civil disseca o indivíduo, os bens
e os fatos jurídicos, estes institutos são necessários à formação e
constituição da relação obrigacional, que gira em torno
justamente da ligação entre os indivíduos, segundo a qual um
deverá submeter-se à vontade do outro e entregar o objeto
pleiteado. Melhor definem essa relação os doutrinadores pátrios,
Arnaldo Rizzardo9 entende a obrigação como “um vínculo de
direito que liga uma pessoa a outra, ou uma relação de caráter
patrimonial, que permite exigir de alguém uma prestação”, já
Flávio Tartuce10 assim conceitua a relação obrigacional:
[...] a relação jurídica transitória, existente entre um
sujeito ativo, denominado credor, e outro sujeito
passivo, o devedor, e cujo objeto consiste em uma
prestação situada no âmbito dos direito pessoais,
positiva ou negativa. Havendo o descumprimento ou
inadimplemento obrigacional, poderá o credor
satisfazer-se do patrimônio do devedor.

9
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 4.
10
TARTUCE, Flávio. Direito civil, v.2: direito das obrigações e responsabilidade civil.
5 ed. São Paulo: método, 2010, p 31.

25
Veja, também, o conceito de Cristiano Chaves e Nelson
Rosenvald11:
Assim sendo, considerada a necessária evolução
histórica do Direito das Obrigações, já vista alhures,
é possível, então, conceituar a obrigação como a
relação jurídica transitória, estabelecendo vínculos
jurídicos entre duas diferentes partes (denominadas
credor e devedor, respectivamente), cujo objetivo é
uma prestação pessoal, positiva ou negativa, garantido
o cumprimento, sob pena de coerção judicial.

Os conceitos de obrigação apresentam com clareza a


identidade de todos os elementos constitutivos da relação
obrigacional, nesses ela é caracteriza como uma relação
polarizada, constituída por um vínculo no qual um dos indivíduos
deve satisfazer o interesse do outro sujeito da relação, de forma
comissiva ou omissiva. Logo a obrigação é o vínculo existente
entre duas ou mais pessoas, no qual há um compromisso pela
entrega de determinado bem, prática de determinado ato ou uma
omissão, podendo o credor exigir, por meio do poder jurisdicional,
que o devedor entregue a prestação, bem como utilizar o
patrimônio deste para ver cumprida a relação obrigacional.
As relações obrigacionais fazem parte da maioria das
atividades diárias da humanidade, sendo fácil concluir que a
grande maioria dessas relações são devidamente cumpridas, com
uma parte entregando à outra o bem acordado, vez que caso elas
não tivessem esta morte natural seria fácil imaginar o caos que
se instalaria nas relações privadas, comerciais e bancárias.
Ademais, não fosse assim, o Poder Judiciário, já bastante
assoberbado, verificaria a total impossibilidade de julgar a imensa
quantidade de lides.
Se existe essa quantidade imensa de obrigações que se
finalizam naturalmente, para que este amparo e estudo das relações
obrigacionais? Simples, mesmo com a grande maioria sendo
cumprida sem grandes questionamentos, podem ocorrer casos de
11
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 11.

26
dúvidas sobre a forma de cumprir a obrigação, questionamentos
sobre possíveis reparações por descumprimento das mesmas e
diversas outras questões envolvendo quaisquer falhas na relação
obrigacional, o que torna necessário o estudo destas relações e
verificação do cumprimento da mesma.

2. Dos elementos.
A obrigação decorre da existência de certos elementos,
que a caracterizam e sem os quais não se poderia falar na relação,
os conceitos supra apresentados servem para a identificação dos
elementos, inclusive sem estes não se poderia falar da própria
validade da relação obrigacional. Imagine o mero ato de se
deslocar à cantina de sua instituição de ensino, para adquirir um
refrigerante. Este ato tão simples, igual a tantos outros que são
realizados e verificados durante todo o dia, nada mais é do que a
formação de uma relação obrigacional. A relação obrigacional
está inserida na vida de qualquer cidadão.
Naquele exemplo há o aluno, a cantina e um bem pelo
qual é demonstrado interesse (refrigerante), assim se tem um
indivíduo que aguarda a entrega de um bem, sendo dever da
cantina a entrega deste item. Claramente se nota a existência de
todos os elementos formadores da obrigação. Estes elementos
são: os aspectos subjetivos (credor e devedor), aspecto objetivo
(objeto ou prestação) e elemento espiritual da relação (vínculo),
os quais passaram a ser estudados adiante.

2.1 Sujeito ativo – credor (aspecto subjetivo)


O credor é o indivíduo que impõe seu interesse em receber
determinado bem, com o fito de obter a devida satisfação pessoal,
apesar do mesmo não poder agir antes do vencimento do prazo
para o pagamento da obrigação, ele é tido como o sujeito ativo,
por ser aquele que tem o direito de exigir o cumprimento da
prestação, sendo assim ele é a pessoa que pode tomar as famosas
“providências legais” para ver a prestação pactuada ser entregue.
Lógico que nos casos em que a relação obrigacional for cumprida
não vai haver a necessidade desta ação por parte do credor. O
27
credor tem um direito latente, o de agir e exigir a entrega da
prestação pactuada, apenas podendo tomar esta atitude se o
devedor não cumprir a forma ou a data combinada para a entrega.
Um questionamento que pode ser feito, sobre o credor, é
justamente de quem pode ocupar esta posição na relação
obrigacional. Pois bem, todo indivíduo que possua personalidade
pode ser credor. Sim, aqui não se terá a limitação da capacidade
para exercer atos da vida civil. Todos podem ocupar a posição
ativa na relação obrigacional. Por exemplo, um indivíduo de 10
anos de idade não possui capacidade civil, imagine que o mesmo
é filho de um casal que é proprietário de 20 imóveis alugados na
cidade de Guaraciaba do Norte (CE). Infelizmente, o casal sofre
um acidente e falece, por conta disto os devedores dos aluguéis
(locatários) deixarão de cumprir sua obrigação de pagar a locação?
Nesta situação os locatários continuarão obrigados a pagar
as prestações de seus contratos de locação, a relação deverá ser
cumprida perante o herdeiro do falecido casal, com uma pequena
diferença, por não possuir capacidade o menino não poderá
receber diretamente tais valores. Assim, o judiciário nomeará
representante (tutor) para realizar os atos da vida civil do herdeiro.
Este procedimento será mantido até o herdeiro completar 18
anos de idade, ou preencher os requisitos para conseguir a
emancipação civil.

2.2 Sujeito passivo – devedor (aspecto subjetivo)


O que dizer daquele tantas vezes tido como grande vilão,
sabe-se que, não poucos, são os adjetivos pejorativos utilizados
para destratar e desdenhar o devedor. Durante toda a história da
humanidade o mesmo ocupa a posição mais frágil da relação
obrigacional, veja que caso não entregasse a prestação o mesmo
poderia morrer, virar escravo, ser preso, perder sua família,
queimar no fogo eterno do inferno, afora ter expropriados todos
seus bens e em quase que todas as situações seriam inadmissíveis
quaisquer justificativas para a ausência de pagamento.
Esta é a visão geral que se tem do devedor, um sujeito
que tem o dever de entregar o bem pactuado, mas a qualquer
28
momento pode descumprir o acordado. Sabe-se que isto não
corresponde à realidade, o devedor está inserido na relação
obrigacional e tem interesse no cumprimento da mesma, apenas
ele não pode ser submetido a situações vexatórias e que o
impossibilitem de viver, esta proteção ao devedor, em nossos
dias, decorre da aplicação do princípio da dignidade da pessoa
humana e da boa-fé objetiva, que ajudam a frear os impulsos
mais agressivos do credor.
O devedor é o indivíduo ou pessoa jurídica que tem o
ônus de entregar determinado bem, ou realizar determinada
conduta (omissiva ou comissiva) capaz de satisfazer o interesse
do credor. O devedor sofre a imposição de cumprir o pactuado
(pacta sunt servanda), lembre que a obrigação tem uma prestação
a ser entregue de determinada forma e em dado tempo, logo, o
devedor tem de obedecer ao instituto acima transcrito, não com
medo de ir para o inferno, mas em decorrência de ser o dever do
mesmo na relação em que é inserido.
O devedor deve, ao cumprir a obrigação, se precaver e
evitar o erro quanto à pessoa, pois ele deve pagar apenas a quem
pode receber a prestação, razão pela qual é necessário que o
devedor identifique claramente o seu credor, neste sentir veja o
que fala Arnaldo Rizzardo12:
Primeiramente, indispensável que saiba o devedor a
quem deve cumprir a obrigação, assim como se mostra
necessário que o credor fique ciente de quem pode
exigir o cumprimento da obrigação. Inadmissível que
haja aleatoriedade, ou indefinição do credor, pois tal
ensejaria a inexigibilidade, com a conseqüente
possibilidade de se impor novamente a satisfação, sob
o princípio de que quem mal paga deve pagar duas
vezes.13

12
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 37.
13
Veja o Código Civil e a Jurisprudência:
Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob
pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito.
44008573 - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. INSTRUÇÃO
DA INICIAL. NOTAS PROMISSÓRIAS SEM FORÇA EXECUTIVA.

29
O devedor pode sofrer as consequências de qualquer ato
seu que saia da normalidade da relação obrigacional, inclusive o
fato de pagar a prestação à pessoa errada, o que pode acarretar o
ônus de pagar duas vezes a mesma prestação, pelo simples fato
de não conhecer devidamente o credor ou quem o represente.
No campo da responsabilidade civil a posição de devedor
pode ser imposta em decorrência de imputação legal, até o presente
momento se tem tratado do devedor que participa por sua vontade
de uma relação obrigacional, no entanto a lei impõe determinadas
situações em que o cidadão comum pode transformar-se em
devedor, mesmo sem exprimir sua vontade, veja o Código Civil:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação
civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob
sua autoridade e em sua companhia;
II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados,
que se acharem nas mesmas condições;
III - o empregador ou comitente, por seus
empregados, serviçais e prepostos, no exercício do
trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou
estabelecimentos onde se albergue por dinheiro,
mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes,
moradores e educandos;

PAGAMENTO. PROVA TESTEMUNHAL. INADMISSIBILIDADE.


JULGAMENTO ANTECIPADO. CERCEIO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA.
DEMONSTRAÇÃO DOCUMENTAL PELO DEVEDOR. AUSÊNCIA.
PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 333, INC. II, DO CPC. 1)
A dispensa do depoimento de testemunha destinado a provar pagamento, ante a
imprestabilidade desse meio probatório para tal fim, não constitui cerceio de defesa –
2) se o devedor não consegue provar que os pagamentos parciais e avulsos se destinaram
ao adimplementos das notas promissórias sem força executiva que instruem a exordial
de ação monitória, correta é a sentença que julga improcedentes os embargos monitórios
e constitui o título judicial, convertendo o mandado inicial em mandado executivo, tal
como previsto no art. 1.102C, do código de processo civil – 3) ex vi do disposto no art.
333, inc. II, do código de processo civil, a prova de fato extintivo do direito alegado na
inicial é ônus do réu – 4) a circunstância do credor encontrar-se de posse dos títulos
representativos de seu crédito, transfere para o devedor o ônus de provar que já os
pagou, de sorte que, não o fazendo por falta de documento hábil, poderá ver-
se obrigado a pagar novamente, pois, conforme o adágio popular: “quem
paga mal, paga duas vezes”. (TJ-AP; AC 2593/05; Ac. 8718; Câmara Única; Rel.
Des. Mário Gurtyev de Queiroz; Julg. 22/11/2005; DOEAP 05/12/2005) Fonte:
DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012. (grifo nosso)

30
V - os que gratuitamente houverem participado nos
produtos do crime, até a concorrente quantia.

A imposição do Código Civil exemplifica a situação em


que uma pessoa, estranha a uma relação, possa ocupar a posição
de agente passivo, vez que o mesmo se torna responsável solidário
da prestação, o que será estudado em seu devido momento.
Assim a pessoa que se torna responsável pela entrega de uma
prestação será o devedor da relação obrigacional, lembrando,
que mesmo sem possuir capacidade, a criança e o adolescente
poderão ocupar esta posição. É uma situação mais rara, mas
poderá ocorrer nos casos em que ocorrerem gastos para aquisição
de itens necessários à sua subsistência.

2.3 Prestação – aspecto objetivo.


O que o devedor tem que entregar? Essa é a questão que
dá significado a este elemento da relação obrigacional, a prestação
é justamente o objeto pelo qual o credor demonstra seu interesse
e o devedor se vê investido do ônus de entregar, podendo a
prestação ser um bem (coisa) ou uma conduta. Quanto ao
primeiro tem-se vasta gama de exemplos que demonstram este
tipo de situação, caso o credor aguarde um bem (seja o carro
novo, a casa, o medicamento no balcão da farmácia) a prestação
está vinculada a mera entrega de um bem.
Na outra forma de desempenhar a prestação não há a
apresentação de um bem, mas uma conduta a ser realizada pelo
devedor, por exemplo a conduta que o professor aguarda de seu
aluno (estudar), a conduta a ser realizada pelo advogado (defender
seu cliente), a conduta do pintor (confeccionar uma obra de arte),
estes exemplos demonstram que o devedor tem que realizar
determinado ato, que pode resultar na produção de determinada
peça material ou intelectual.
Restando observar que esta conduta, conforme se
verificará adiante, pode ser positiva ou negativa, nos últimos
exemplos se tem condutas apenas positivas. Quanto à conduta
negativa, tem-se, por exemplo, a situação do grande biógrafo
que fez todo o levantamento da vida política de um famoso
31
Senador da República do Brasil e este senador faz um acordo
com o mesmo para que não seja publicada esta obra (biografia
do senador), na realidade o escritor/biógrafo se omitirá de realizar
a publicação, assim sendo uma conduta negativa.
Além da forma de externar esta prestação por uma
conduta positiva ou negativa, importante lembrar, o aprendido
com os estudos da Parte Geral do Código Civil. A prestação,
obrigatoriamente, deve ser possível, determinada ou
determinável e lícita. A possibilidade interfere na própria
existência da relação obrigacional, caso alguém se comprometa
a realizar uma conduta impossível a relação obrigacional estaria
prejudicada. Como Joãozinho pode se obrigar com Zequinha a
chutar sua bola na lua? Lógico que tal conduta é impossível, não
podendo se considerar existente tal obrigação.
A impossibilidade da prestação impõe a inexistência da
obrigação, e por consequência a ausência de direito do credor de
exigir a satisfação da mesma, não podendo forçar o cumprimento
da obrigação por parte do devedor. Veja um exemplo por meio
jurisprudencial:
63070407 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.
DISCUSSÃO DE CONTRATO. NULIDADE.
OBJETO IMPOSSÍVEL. VENDEDOR NÃO
PROPRIETÁRIO. RECONHECIMENTO
INCIDENTAL. NEGADO PROVIMENTO. Deve
ser julgada improcedente a ação de consignação em
pagamento, pois não foram preenchidos os requisitos
que validam o pagamento efetuado. Verificado nos
autos a existência de negócio jurídico nulo, é possível
o reconhecimento da nulidade, em caráter incidental,
como fundamento da decisão que recusa a ação de
consignação em pagamento, quando o objeto é
impossivel, tendo em vista que a consignante
efetivou parte do pagamento da dívida com bem que
não lhe pertencia. (TJ-RO; APL 0002618-
53.2010.8.22.0009; Rel. Des. Sansão Saldanha;
Julg. 23/08/2011; DJERO 30/08/2011; Pág. 53),
(grifo nosso)

32
Na jurisprudência transcrita tem-se a tentativa do devedor
de pagar a obrigação com bem que não lhe pertence, lógico que a
entrega desta prestação é inválida, por conta da impossibilidade do
devedor dar algo que não é seu. Apresentada a prestação impossível
houve entendimento da nulidade do negócio, vez que o bem não
poderia ser entregue por pessoa que não é seu proprietário.
O segundo requisito de validade do negócio jurídico,
imposto à prestação, trata da estimativa desta (determinado ou
determinável), a posição do devedor seria muito complicada se
o mesmo não tivesse ideia de quantidade ou gênero do que deve
entregar. Pense a situação do devedor que se comprometeu a
entregar 1.000 pedras preciosas a seu credor. Com certeza a
entrega de diamantes seria mais benéfica ao credor do que a
entrega de opalas. Esta situação seria exageradamente vantajosa
a apenas uma das partes e afetaria a própria validade da obrigação.
Não bastassem os requisitos expostos, tem-se o mais
simples, e não menos importante, ninguém pode pactuar e exigir
cumprimento de prestação ilícita. As partes envolvidas em uma
relação obrigacional têm liberdade de acordar, mas não podem
submeter a lei à sua vontade, para realizar transações com itens
ilícitos. Por exemplo, imagine o diálogo de um credor e um devedor,
no qual o credor aguarda a entrega de 10 caixas de algum tipo de
droga ilícita, podem ser devidamente configurados todos os itens
da relação obrigacional, no entanto o objeto carece de licitude.
Nunca poderia o credor exigir o cumprimento desta obrigação.
Por fim, a estimativa econômica do objeto da obrigação.
Em muitos casos pensa-se apenas na possibilidade de valoração
monetária da prestação devida, é lógico que as partes envolvidas
em uma obrigação exigem o cumprimento da mesma por conta
das vantagens envolvidas na relação. No entanto, não se pode
pensar neste objeto como algo apenas com cunho econômico o
mesmo pode possuir outros panos de fundo, assim expõe Arnaldo
Rizzardo14:

14
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 41.

33
Em outras situações, o objeto da obrigação, embora
não inserindo um conteúdo econômico, revela
dimensões de outra ordem, também de cunho
imaterial, como o direito ao meio ambiente sadio, ao
silêncio durante o horário noturno, à observância de
posturas municipais de higiene e conduta compatível
com convivência social em um aglomerado de
habitações.

O ilustre mestre chama a atenção para a prestação


imaterial, que não necessariamente terá valoração, pois as
situações envolvidas são pessoais e afetam a cada um de uma
forma, logicamente sem a possibilidade de igualitária
monetarização ou imposição de valor sobre os objetos
exemplificados. A prestação em sua maior parte tem valorização
econômica, no entanto a imposição de alguns tipos de prestação
não sofrerá determinação monetária, sendo apenas um objeto
que decorre de interesses outros do que a mera avareza ou
materialismo humano.
A doutrina a muito debate esta necessidade da prestação
ser valorada economicamente, sendo esta uma consequência da
tradição do Direito Romano. Modernamente se tem caminhado
para o entendimento de não ocorrer esta necessidade para
configurar uma relação como obrigacional. O fato de as partes
estipularem um acordo, sem que o mesmo tenha valoração
imediata, não descaracterizaria a obrigação. Mesmo porque, caso
ocorra o descumprimento, a lei enumera situações capazes de
proporcionar ao credor a satisfação da obrigação ou a
compensação pela não entrega da prestação.

2.4 Vínculo jurídico – aspecto imaterial (abstrato)


O vínculo jurídico da obrigação é a ligação existente entre
devedor e credor, capaz de gerar consequências ao devedor acaso
este não cumpra a prestação pactuada, esse liame era entendido
na antiguidade como uma ligação personalíssima entre os sujeitos
da relação obrigacional, havendo inclusive a possibilidade do
devedor se submeter à vontade do credor em caráter intuito
personae, entregando a própria vida para adimplir a obrigação.
34
A doutrina discute a questão envolvendo a existência e
como se define este vínculo com base em três teorias: monista,
dualista e eclética. O debate refere-se a como se apresenta esta
ligação e sempre recorre à questão dever/direito, ou seja, o dever
do sujeito passivo cumprir devidamente a prestação e o direito
do credor impor o cumprimento da mesma prestação.
As teorias impõem como seria a ligação entre esse dever
e o direito, para a monista existiria apenas um vínculo, sendo o
direito do credor nascido do dever do sujeito passivo. Assim a
existência desta ligação se submete ao direito do credor de impor
o cumprimento da obrigação.
Para a dualista haveria a existência de dois vínculos, cada
um ligado ao dever ou ao direito, a ligação entre devedor e credor
teria como vetor o dever para o devedor (primeira ligação) e
para o credor, o seu direito (segunda), enquanto para a eclética,
conforme Maria Helena Diniz15:
Na obrigação reúnem-se e se completam, constituindo
uma unidade, o dever primário do sujeito passivo de
satisfazer a prestação e o correlato direito do credor
de exigir judicialmente o seu cumprimento,
investindo contra o patrimônio do devedor, visto que
o mesmo fato gerador do débito produz a
responsabilidade.

Note que o debate gira em torno de como se apresenta


esta ligação entre os principais componentes da relação
obrigacional, quais sejam os sujeitos. O vínculo vai ser uma
ligação abstrata, incapaz de ser materializada, mas que protege
ambas as partes envolvidas na relação obrigacional.
O vínculo ocupa importante papel na relação obrigacional,
mas sem os sujeitos de nada adiantará o debate sobre como
surgem e qual é o tipo de ligação. O vínculo expõe esta ligação e
ao mesmo tempo protege as partes envolvidas na obrigação, e
não apenas ao credor, a existência do vínculo protege também
ao devedor, ele possui o DEVER de entregar devidamente a
15
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2: Teoria geral das
obrigações. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p 39.

35
prestação ajustada, e o fará na forma, local e tempo determinados,
por tanto o credor só pode exigir a entrega da prestação nas
situações em que ocorrerem o descumprimento do acordado pelo
devedor. O credor não poderá exigir o cumprimento da obrigação
antes do pactuado ou de forma diversa da acordada, portanto
este vínculo é único, suportado por ambos e com consequências
a ambos os sujeitos.

3. Das fontes.
O estudo das fontes das obrigações possibilita a indicação
da origem da relação obrigacional, mostrando como a mesma
pode surgir e identificando a existência de seus elementos e sua
validade. Os romanos tinham como fontes da obrigação a
vontade e o ato ilícito. Para o Código napoleônico as fontes são:
contrato, delito, quase contrato e quase delito. A base do Direito
Civil entende que a fonte de uma obrigação estaria sempre ligada
aos atos da vontade humana, ou em decorrência da realização
de um pacto ou por conta de conduta inapropriada ou ilegal.
A doutrina apresenta alguns posicionamentos sobre quais
seriam as fontes da relação obrigacional. Maria Helena Diniz
entende que a obrigação tem como fonte imediata a Lei e mediata
os atos jurídicos stricto sensu, negócios jurídicos bilaterais ou
unilaterais e atos ilícitos. Já Orlando Gomes entende que a lei,
para ser considerada fonte, deve sofrer ato da vontade humana,
assim não seria fonte imediata, sendo a principal fonte o ato de
vontade humana.
Não seguindo a celeuma doutrinária e abraçando a fala
pacificadora de Flávio Tartuce, as fontes da obrigação são: A lei,
o contrato, os atos ilícitos e o abuso de direito, os atos unilaterais
e os títulos de crédito. Ademais, a vontade humana ou as
consequências pelo exercício de um ato, qualquer que seja, pode
gerar a relação obrigacional. Não há como falar da existência de
uma obrigação se não houver a participação do elemento
humano, seja por sua vontade, ou em decorrência de ato
praticado que gere consequências e a necessidade de reparação.

36
IV
DA CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

Quando se classifica, dividindo o objeto de estudo em


grupos nos quais as suas unidades sejam parecidas ou de mesma
espécie, se tenta facilitar a apreciação da matéria, bem como
possibilitar a identificação mais fácil daquele objeto. Não é
diferente com a relação obrigacional, diversas são as classificações
apresentadas ao estudo da relação obrigacional.
Estas classificações tentam agrupar as obrigações de forma
que seja mais fácil identificar a mesma. São utilizados diversos
critérios para a apresentação das classificações. Os principais são:
quanto a exigibilidade, quanto ao objeto, quanto aos elementos,
quanto à finalidade e as decorrentes de elementos acidentais.
Verifique cada uma destas classificações.

1. Quanto à exigibilidade.
Este critério utiliza o direito do credor de exigir o
cumprimento da relação obrigacional por meio do Poder
Jurisdicional, a fim de forçar a entrega da prestação. Neste tipo
de obrigação a relação é dividida em dois tipos, a obrigação civil
e a obrigação natural. A Professora Maria Helena Diniz acrescenta
uma terceira espécie, a obrigação moral.

1.1 Obrigações civis


Obrigação na qual se encontram todos os elementos supra
mencionados, inclusive quanto ao vínculo obrigacional, e se
observa claramente a possibilidade do credor exigir a satisfação
da prestação, por meio do amparo jurisdicional.
Para Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald16, tem-se:

16
FARIAS, Cristiano Chaves; Rosenvald, Nelson. Direito das obrigações. 4 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 276.

37
Portanto, as obrigações civis são dotadas de plena
exigibilidade, à medida que a ofensa ao direito
subjetivo do credor lhe concede a pretensão de exigir
do devedor aquela coisa ou conduta voluntariamente
recusada, em regra por meio de uma ação executiva.
Por isto, as obrigações civis também são chamadas
de obrigações perfeitas.

São civis todas as obrigações que possuem os elementos


formadores do vínculo obrigacional e tem a possibilidade de se
exigir o seu cumprimento por medidas coercitivas, através da
interferência do Poder Judiciário. Por exemplo, Ricardo deve R$
40.000,00 a Paulo, este aguarda o pagamento, infelizmente não
ocorre. Paulo poderá propor ação executiva, na qual buscará
coercitivamente o patrimônio de Ricardo, de forma que o
pactuado seja cumprido.

1.2 Obrigações naturais


Obrigação que remonta ao passado do dever jurídico das
relações, nesta se observa a existência de todos os elementos
caracterizadores, no entanto ela desconhece a coercibilidade
disponibilizada às obrigações civis (forma de forçar a entrega da
prestação pactuada).
Exemplo clássico deste tipo de obrigação são as apostas
em período de eleição. Em certas cidades a rivalidade entre os
políticos é transmitida para seus eleitores, imagine o João, eleitor
do candidato A, e o José, eleitor do candidato B, ambos apostam
que seu candidato é que vencerá. O objeto da aposta: seus carros.
Ocorre que o candidato A vence. Em tese tem-se o seguinte
quadro: credor – João; devedor – José; prestação – Automóvel de
José e vínculo – dever de José entregar a prestação. Como visto
há clara formação de uma relação obrigacional, no entanto o
Código Civil entende não haver coercibilidade neste caso, in verbis:
Art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam
a pagamento; mas não se pode recobrar a quantia,
que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por
dolo, ou se o perdente é menor ou interdito.

38
O exemplo configura uma obrigação natural. Esta foi
constituída, bem como se caracteriza pela existência de todos
os elementos da relação, no entanto não pode ser exigido seu
cumprimento. Outro exemplo no ordenamento para a presente
situação são as dívidas prescritas, veja o Código Civil, que impõe
em seu art. 882, o seguinte: “Não se pode repetir o que se pagou
para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente
inexigível”.
Da mesma forma como as dívidas de jogo/aposta, as
dívidas prescritas não possuem mais possibilidade de serem
exigidas por meio do Poder Judiciário. Importante lembrar que,
caso o devedor se apresente e entregue a prestação, tal ato
futuramente não poderá ser desfeito. Ele, neste caso, aceitou a
existência da relação e em respeito ao vínculo obrigacional
cumpriu a sua parte da relação, não podendo se arrepender depois
por tal ato. Melhor conceitua e explica a forma de existência
desta obrigação o mestre Bittar17:
São, em verdade, deveres morais ou sociais, ou outros
a que a lei não concede ação, excluído, no entanto, a
repetição, quando pagos espontaneamente – na
fórmula do Código Civil italiano -, oriundos de
negócios nulos por defeito de forma, ou de obrigações
de que o devedor, por erro judicial, ou por ausência
de prova, se viu desvinculado em juízo, ao lado das
figuras mais comuns das dívidas de jogo, das prescritas
e das não convencionadas. Entendem-se, pois, como
os deveres providos de conteúdo patrimonial, não
suscetíveis de exigência judicial, mas de legítimo
ingresso no patrimônio do credor quando saldados
(como os deveres de remunerar serviços inestimáveis;
o de dar gorjetas; o de solver indenização não cobrável
judicialmente etc.)

Na obrigação natural o credor sabe da existência da


prestação a ser entregue, bem como tem interesse na mesma,

17
BITTAR, Carlos Alberto. Direito das obrigações. 2ed. Revista, atualizada e ampliada
de acordo com o novo Código Civil por BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Rio de
Janeiro, Forense universitária, 2004, p 37.

39
mas dependerá exclusivamente da boa vontade do devedor, que
poderá ou não cumprir a “palavra” empenhada e pagar a prestação.
Agora, uma vez paga, o devedor não poderá alegar que a mesma
é natural e requerer o recebimento de volta do que pagou, sendo
a prestação integralizada ao patrimônio do credor e proibida a
repetição nestes caos.

1.3 Obrigações morais


Obrigação acrescentada por Maria Helena Diniz18, que
a conceitua da seguinte forma: “obrigação moral constitui mero
dever de consciência, cumprido apenas por questão de
princípios; logo, sua execução é, sob o prisma jurídico, mera
liberalidade”.
Esta obrigação será aquela que não possui coercibilidade
e poderá ser cumprida ou não, por mera educação do envolvido,
se diferenciando da natural por não ter sua origem em expressão
de vontade do envolvido. Pode se exemplificar a mesma com o
bom dia, falado para alguém, não necessariamente quem recebe
o bom dia deverá respondê-lo, no entanto por questão de conduta
pessoal as pessoas educadas respondem.
Nessa existe uma conduta aguardada pelo credor e
imposta pelas regras de convivência social, não havendo
expressão de vontade das partes vinculadas na mesma, de toda
forma uma vez inadimplida a prestação, o credor não tem como
impor que haja cumprimento da mesma.

2. Quanto ao objeto.
Classificação na qual se analisa o próprio objeto da
obrigação a ser disponibilizado pelo devedor em favor do credor.
A prestação, nesta classificação, é o parâmetro observado com
o fito de facilitar o estudo da relação obrigacional.
Esta, provavelmente, é a classificação mais antiga utilizada
para a obrigação, veja que a mesma servia de base para a divisão

18
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2:Teoria geral das
obrigações. 25 ed. SP: Saraiva, 2010, p 54.

40
do direito obrigacional romano, quando este era fracionado em
dare, fazere e non facere. Assim, se têm as três primeiras obrigações
apresentadas pelo Código Civil, a de DAR, FAZER e NÃO
FAZER. Estas serão adiante analisadas.

3. Quanto aos elementos


Outra classificação a ser analisada é a que utiliza os
próprios elementos da obrigação como parâmetro. Neste tipo é
observada a quantidade de elementos disponibilizados, dividindo-
a em singular ou múltipla, por exemplo, na relação obrigacional
em que Paulo comprou um quadro de João, verifica-se
claramente a existência de um único credor, um único devedor
e uma única prestação, assim tem-se singularidade dos elementos,
o que acarreta a classificação da obrigação no tipo SIMPLES.
Em outro exemplo, se existe uma relação obrigacional
na qual Paulo e Maria contratam Flávio, para pintar um muro
na residência daqueles, claramente se verifica a existência de
dois credores, um devedor e uma prestação (fazer a pintura),
assim o tipo de obrigação disposta é chamada de COMPLEXA.
Nestas obrigações a pluralidade de um dos elementos
acarreta a identidade da obrigação como complexa, mas essa
pluralidade não é necessariamente apenas dos elementos
subjetivos, são dispostas diversas situações em que se encontra
a pluralidade no aspecto objetivo da relação obrigacional, ou
seja, multiplicidade de prestações. Caso ocorra este tipo de
multiplicidade, verifica-se a subdivisão da obrigação complexa
em CUMULATIVA e ALTERNATIVA.
Na obrigação complexa cumulativa há a necessidade de
entregar duas ou mais prestações pactuadas, por exemplo, João
contratou a Construtora “Fernando & Cia” para edificar uma
casa, neste contrato há o compromisso da construtora em realizar
o serviço com seus materiais, tem-se a acumulação de mão de
obra e materiais como prestações da obrigação, por conta desta
acumulação, sabe-se que estas prestações devem ser entregues
conjuntamente.
Na segunda espécie de obrigação complexa, chamada de
41
alternativa, tem-se aquele tipo de relação obrigacional em que o
devedor se compromete a entregar uma ou algumas prestações
entre diversas opções apresentadas. Exemplificando, caso o
menino de 10 anos de idade diga a seu pai, que quer de natal um
carro de controle remoto ou um skate, tem-se uma situação na
qual a prestação é múltipla, mas basta a entrega de uma das
requisitadas para se ter adimplemento da obrigação, neste caso
a alternatividade se encerraria com a escolha, e a obrigação se
extinguiria com o pagamento.
A apresentação destas espécies de obrigações será
utilizada posteriormente neste estudo, pois a obrigação solidária
e a obrigação indivisível decorrem da existência desta
multiplicidade de elementos.

4. Quanto à finalidade
Esta classificação submete à análise a utilidade da
prestação pactuada e os efeitos da entrega da mesma ao credor.
Deve ser observada a utilidade desempenhada pela prestação,
aqui é necessário saber qual o destino da prestação e se a forma
como o devedor a implementou foi capaz de satisfazer o interesse
do credor. Quanto à finalidade a obrigação será dividida em:
meio, resultado e garantia.

4.1 Obrigação meio


Nesta a mera entrega da prestação ao credor possibilita a
extinção do vínculo obrigacional, seu adimplemento independe
dos benefícios que por ventura o credor aguarde, ao receber o
objeto da obrigação. Partindo de uma exemplificação mais
simples, pense que Paulo comprou um quadro de Luis, Paulo é
dono de uma pinacoteca e espera que com a aquisição do quadro
o movimento em sua exposição aumente, no entanto o
movimento, depois da entrega do quadro, diminui
demasiadamente. Neste caso o cumprimento da obrigação não
está atrelado a futuros benefícios ou retornos ao credor (Paulo).
Os exemplos clássicos utilizados para esta são o dos
serviços prestados por médico e serviços prestados por advogado.
42
Em ambos tem-se que a pessoa que contrata um destes
profissionais o faz aguardando um resultado específico, no
entanto, em decorrência da própria atividade, estes profissionais
não podem prometer a cura ou a vitória em determinado processo
judicial.
Por exemplo, se Carlos possui um Glioblastoma
multiforme (tumor cerebral bastante agressivo, com sobrevida
de 6 meses a 2 anos) e procura o Dr. Salgado, contratando-o para
prestar seus serviços médicos, qual benefício Carlos aguarda?
Lógico que a cura, no entanto o Dr. Salgado não pode prometer
este resultado a seu paciente. O Dr. Salgado poderá fornecer a
devida prestação de seus serviços médicos ante toda técnica e
qualidade de serviço que o mesmo possui, sem prometer o fim
maior que Carlos aguarda.
Na obrigação meio não há independência da prestação
contratada com a satisfação pessoal do credor, só o fato de a
prestação ser entregue (ou feita) possibilita a declaração de
quitação da obrigação ao devedor, mesmo que o credor não
consiga atingir o objetivo que originalmente pensou.

4.2 Obrigação resultado


Obrigação em que as partes envolvidas vislumbram a
existência de um resultado dentro das expectativas criadas pelo
credor. Na obrigação resultado a prestação não fica atrelada a
mera entrega de um bem ou serviço, esta necessariamente estará
vinculada a determinado objetivo, alem da entrega a mesma
deverá gerar uma satisfação ao credor.
Veja o cirurgião plástico, quando é procurado em seu
consultório é contratado para realizar determinada cirurgia, este
contrato gera na pessoa que o contratou a expectativa de correção
de determinada parte do corpo. Exemplificando, Paula contrata
o Dr. Flávio para realizar cirurgia de aumento dos seios, a
prestação que Paula aguarda não é apenas o acréscimo de volume
em seus seios, Paula aguarda que os mesmos fiquem maiores,
rígidos e no formato que a mesma explicou no consultório do
Dr. Flávio, logo a prestação estará atrelada a esta expectativa de
43
Paula. A jurisprudência pátria bem exemplifica:
48353885 - CIVIL E PROCESSO CIVIL.
CIRURGIA PLÁSTICA REPARADORA. DANOS
MORAIS. INDENIZAÇÃO DEVIDA.
CARACTERIZAÇÃO DO NEXO CAUSAL
ENTRE A CONDUTA ILÍCITA E OS DANOS
SOFRIDOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
ENTRE HOSPITAL E MÉDICO. SENTENÇA
REFORMADA. 1. “”os hospitais, clínicas e casas
de saúde devem garantir o fornecimento de um serviço
sem defeito. Os estabelecimentos hospitalares são
fornecedores de serviço, enquadrando-se no art. 14
do CDC, portanto, respondem objetivamente pelos
danos causados aos pacientes. Ocorrendo, pois, um
acidente de consumo causado por médico, o
fornecedor deve responder de forma solidária pelo
simples fato de ter lançado no mercado um serviço
defeituoso. “” (APC 20030110308045) 2. Restam
caracterizados os danos morais, eis que os
documentos acostados e as provas colhidas
comprovam a existência de seqüelas oriundas da
operação plástica que visava reduzir o tecido adiposo
no abdome da autora, resultando a conduta do médico,
sem dúvida, na ocorrência da dor moral pela qual
esta passa, em razão de, tratando-se de obrigação de
resultado, não ter desincumbido o profissional médico
de cumprir com o prometido. 3. “”contratada a
realização da cirurgia estética embelezadora, o
cirurgião assume obrigação de resultado
(responsabilidade contratual ou objetiva), devendo
indenizar pelo não cumprimento da mesma,
decorrente de eventual deformidade ou de alguma
irregularidade. “” (RESP 81.101/PR) 4. A
indenização deve ser fixada em patamar razoável,
sendo suficiente para diminuir o sofrimento da vítima
e prevenir os autores para que fatos idênticos não
mais venham a ocorrer. 5. Recurso da autora
conhecido e provido. Maioria. (TJ-DF; Rec.
2003.01.1.083296-8; Ac. 491.915; Quinta Turma
Cível; Rel. Des. Romeu Gonzaga Neiva; DJDFTE
06/04/2011; Pág. 159) (grifo nosso)

44
A obrigação resultado vincula a prestação ao próprio
anseio do credor. Busca-se, neste tipo de obrigação, o alcance do
resultado prático aguardado pelo sujeito ativo, podendo
considerar este tipo de obrigação descumprida caso o mesmo
não seja alcançado. Aqui a prestação, além de ser entregue, tem
que cumprir com os anseios do credor.

4.3 Obrigação garantia


Esta figura apresenta um tipo de obrigação que possibilita,
ao credor, a certeza de que a prestação será cumprida, bem
explicam este tipo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald19:
O conteúdo dessa modalidade consiste na função
atribuída ao devedor de eliminar o risco que pesa
sobre o credor ou as suas conseqüências. O
adimplemento da obrigação se perfaz pelo simples
fato da assunção do risco, independentemente do
resultado.

A obrigação garantia visa diminuir ou finalizar os riscos


que a prestação ou determinado bem da esfera jurídica do sujeito
pode conter. Ela é utilizada como uma proteção ao cumprimento
da prestação, ou de um bem que o credor tenha o temor de perdê-
lo. Por exemplo, Paulo contrata a firma “Só Seguros” para garantir
que se algo acontecer a seu carro ele terá um novo ou o conserto
daquilo que foi danificado, a seguradora terá a obrigação de
reparar um dano que o carro tenha sofrido, mas a obrigação só
seria cobrada se ocorresse o sinistro (dano ou perda do veículo).
A jurisprudência anexa, também exemplifica este tipo de
obrigação:
64367773 - APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA DE
ALUGUERES. AÇÃO INTENTADA CONTRA OS
FIADORES. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DA
LIDE POR ILEGITIMIDADE PASSIVA AD
CAUSAM. RECURSO DO LOCADOR. PLEITO

19
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 281

45
PELA RESPONSABILIZAÇÃO DOS FIADORES
MESMO APÓS A RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA
DA LOCAÇÃO. PEDIDO DE APLICAÇÃO DO
DISPOSTO NO ARTIGO 39 DA LEI N. 8.245/
1991. IMPOSSIBILIDADE. A FIANÇA, POR SER
CONTRATO GRATUITO, DEVE SER
INTERPRETADA DE FORMA RESTRITA.
INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1.453 DO
CÓDIGO CIVIL DE 1916. INSTRUMENTO
CONTRATUAL QUE NÃO PREVÊ A
EXTENSÃO DA GARANTIA ATÉ A EFETIVA
ENTREGA DAS CHAVES. PRESUNÇÃO DE
ASSUNÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE GARANTIA
TÃO-SOMENTE NO PRAZO ORIGINAL DE
VIGÊNCIA DA LOCAÇÃO. ENTENDIMENTO
CONSOLIDADO NA JURISPRUDÊNCIA DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO
DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. “1º). Se
os fiadores concordaram em garantir a locação, tão-
somente, até o termo final do contrato locativo (prazo
certo), não responderão pelos débitos advindos da
sua prorrogação para prazo; 2º) se os fiadores
concordaram em garantir a locação até o termo final
do contrato locativo (prazo certo) e expressamente
anuíram em estender a fiança até a entrega do imóvel
nos casos de prorrogação do contrato locativo para
prazo indeterminado, responderão pelos débitos daí
advindos. “ (stj, embargos de divergência em recurso
especial n. 566.633, rel. Min. Paulo medina, julgado
em 22/11/2006) (TJ-SC; AC 2006.000396-3;
Criciúma; Relª Desª Subst. Denise Volpato; Julg. 24/
11/2010; DJSC 02/12/2010; Pág. 97) (grifo nosso)

A obrigação garantia será aquela mantida apenas para


proteger coisa de propriedade do credor, ou o próprio
cumprimento da obrigação original, assim sendo, ela será um
acessório ao cumprimento da relação obrigacional original. Por
meio deste tipo, se verifica maior segurança ao credor, de que
verificará o cumprimento da obrigação, seja pela prestação
pactuada ou pela garantia fornecida.

46
5. Classificação quanto aos elementos acidentais
A doutrina utiliza a existência de elementos que não se
encontram em toda relação obrigacional, no entanto podem
surgir de forma específica em algumas situações. Conforme
explicado anteriormente os elementos da obrigação são: credor,
devedor, prestação (objeto) e vínculo. Ocasionalmente pode
ocorrer a influência de elementos estranhos aos
supramencionados.
A doutrina chama aos mesmos de elementos acidentais,
eles não fazem parte dos elementos clássicos da relação
obrigacional, no entanto influenciam o seu cumprimento. A
existência ou o momento em que ocorrem estes elementos impõe
que a obrigação deve ser cumprida. Estes elementos são a
condição e o termo.

5.1 Obrigação condicional


A condição está conceituada no art. 121, do Código Civil,
veja: considera-se “condição a cláusula que, derivando
exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do
negócio jurídico a evento futuro e incerto.”, assim se tem um
elemento que submete a realização de um negócio jurídico
(obrigação) à ocorrência de um evento futuro, evento este que
não se tem certeza de que acontecerá.
Caso haja expressão da vontade dos sujeitos de uma
obrigação, que só ocorrerá a entrega da prestação com o
implemento de determinada condição, enquanto não ocorrer a
realização desta condição, não se poderá exigir o cumprimento
da relação obrigacional. Por exemplo, um advogado ao ser
contratado por seu cliente pactua um percentual sobre a vitória
na causa a ser proposta, hipoteticamente uma ação por danos,
na qual o advogado pactuou receber 30% do que seu cliente
obter favoravelmente na sentença. Tem-se: credor – advogado;
devedor – cliente; prestação – 30% sobre valor sentenciado a
favor do cliente; vínculo – dever de pagar do cliente e elemento
acidental – vitória na causa.
Apresentado este quadro, caso o juiz não sentencie a favor
47
do cliente, nada este deverá ao advogado20. Assim se verifica
um tipo de obrigação na qual, além da vontade das partes, está
incrustada a incerteza pertinente a muitos dos fatos que
acontecem aos seres humanos.
Importante lembrar, que a obrigação condicional pode se
subdividir em resolutiva ou suspensiva. No primeiro tipo o credor
exercerá o direito à prestação enquanto não ocorrer o evento
futuro e incerto, por exemplo, o arrendamento de um pasto, no
qual o proprietário, que possibilitou a utilização do pasto por
um pequeno criador de gados da região, condicionou esta
utilização até a data que ele vender a propriedade, quando for
feita a venda extingue-se a obrigação.
Já a situação suspensiva, tem-se no exemplo
supramencionado envolvendo advogado e seu cliente, o direito
fica latente, apenas podendo ser implementado quando ocorrer
o evento a que este direito ficou condicionado.

5.2 Obrigação a termo


O outro elemento acidental é o termo, este é o evento
que vai submeter a realização da obrigação a um evento futuro e
certo. As partes envolvidas sabem, ao contrário da condição,

20
54996376 - APELAÇÃO CÍVEL Embargos do devedor- contrato de prestação de
serviços advocatícios- honorários ad exitum - Obrigação condicional - Proveito em ação
distinta - Obrigação de cunho pessoal - Honorários indevidos - Recurso provido - Embargos
julgados procedentes - Execução extinta. nos termos do art. 736 do CPC, os embargos do
devedor constituem ação de conhecimento, através da qual o devedor se defende da
execução forçada. o contrato de prestação de serviços advocatícios impõe ao profissional
contratado obrigações de meio e não de resultado. Contudo, inexiste vedação legal a que
a contraprestação seja condicionada ao êxito do provimento buscado. a cláusula de
honorários ad exitum, aduzindo que incidirão sobre o valor recebido pelo cliente, vem
sendo admitida pela jurisprudência pátria, não se impondo nenhuma obrigação ao
contratante, sem que ocorra a implementação da expectativa que deu ensejo à demanda.
a análise dos autos de execução revela que a embargada-exequente pretende receber os
honorários relativos à prestação de serviços advocatícios desempenhada por outro causídico,
em ação diversa (nº 1999.01.00.104576-2). tendo em vista que o título objeto da execução
refere-se à obrigação de cunho pessoal, adjeta ao contrato de prestação de serviços
advocatícios, não há que se falar em obrigação do embargante-executado de pagar
honorários relativos a proveito obtido em outra causa, devendo ser extinto o processo de
execução em apenso. recurso provido. Embargos acolhidos. Execução extinta, por falta
de título executivo. (TJ-MG; APCV 0805088-96.2008.8.13.0024; Belo Horizonte;
Décima Sétima Câmara Cível; Rel. Des. Eduardo Mariné da Cunha; Julg. 07/07/2011;
DJEMG 17/08/2011) CPC, art. 736 – Fonte DVD magister.

48
que o evento acontecerá, a incerteza na obrigação anteriormente
estudada tem-se como verdade absoluta nesta.
Esta obrigação dependerá de um elemento acidental que
na realidade nem sempre decorre desta incerteza de seu
acontecimento. O termo de uma obrigação normalmente é tido
como o vencimento da mesma, a maior parte das obrigações se
submete ao vencimento, as partes sabem a data em que a
prestação deve ser entregue.
Então, quando se poderia falar de termo como elemento
acidental? Falar-se-á deste tipo de termo, quando apesar de se
saber da realização do evento, o mesmo tem por incerto o quando
vai acontecer, veja a jurisprudência:
11729451 - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA PROCESSADA
PELO RITO ORDINÁRIO. DILAÇÃO
PROBATÓRIA. ADMISSÃO. TEMPO DE
PAGAMENTO. TERMO INCERTO.
EXIGIBILIDADE IMEDIATA DA OBRIGAÇÃO.
TEMPERAMENTO DA REGRA. CANA-DE-
AÇÚCAR. REGIME DE PREÇO OFICIAL.
UTILIZAÇÃO COMO INDEXADOR.
CABIMENTO. [...] 3. A estipulação do tempo de
pagamento como sendo a colheita de um produto
agrícola caracteriza obrigação a termo incerto, na
medida em que a ocorrência do evento, apesar de cabal,
não tem data exata para acontecer. Nessa
circunstância, incide a regra dos arts. 127 e 952 do
CC/16 (cuja essência foi mantida nos arts. 134 e 331
do CC/02), os quais autorizam que seja a dívida
cobrada de imediato, mas que hão de ser interpretados
com temperamento, concedendo-se ao devedor prazo
compatível com a espécie de obrigação exigida. [...]
5. Recurso Especial provido. (Superior Tribunal de
Justiça STJ; REsp 1.115.754; Proc. 2009/0004956-
3; SP; Terceira Turma; Relª Minª Fátima Nancy
Andrighi; Julg. 12/04/2011; DJE 09/08/2011) CC-
16, art. 127 CC-16, art. 952 CC, art. 331. (grifo nosso)

Aqui se tem o exemplo de termo como elemento


acidental, vez que se sabe da ocorrência do evento (colheita), no

49
entanto não se pode precisar a data exata do mesmo, o que gera
uma obrigação a termo incerto.

6. Obrigações modais ou encargo


São obrigações em que o beneficiário de uma prestação
acaba conjuntamente com a prestação recebendo uma
incumbência a ser realizada, a fim de dar o devido cumprimento
do pactuado. Paulo Nader21 assim a entende:
Em se tratando de obrigações modais ou com encargo,
o debitor assume determinado ônus. São próprias dos
negócios jurídicos gratuitos. É comum a inserção de
tal cláusula nos contratos de doação e ainda nos
testamentos. Tal modalidade pode estar presente
também nos negócios jurídicos onerosos. O
adquirente de uma propriedade rural, por exemplo,
pode assumir o encargo de abrir uma estrada em sua
propriedade, a fim de ensejar servidão de passagem.

Esta obrigação configura-se pela entrega do bem e


acompanhando a prestação o credor recebe um encargo. O
exemplo clássico deste tipo, fornecido por Maria Helena Diniz,
é o de um terreno doado, e o donatário (beneficiado pela doação)
recebe junto o ônus de fazer no citado imóvel uma escola22.
Veja que se caracteriza devidamente a existência da
relação obrigacional, com credor (quem recebe o terreno), do
devedor (quem doou o terreno) e a prestação (o terreno),
identificando-se, ainda, o encargo (construir a escola), que caso
não seja cumprido pode sofrer os efeitos do art. 555, Código
21
NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 2: obrigações. Rio de Janeiro:
Forense, 2008, p 51.
22
54960162 - AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM PERDAS E DANOS.
DOAÇÃO MODAL. DESCUMPRIMENTO DO ENCARGO. PRESCRIÇÃO
QUINQUENAL. OCORRÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO. Constatando-se que
a pretensão posta nos autos não envolve revogação de doação modal por
descumprimento do encargo, mas de pleito consistente na obrigação de fazer cumulada
com perdas e danos, o prazo prescricional aplicável é aquele previsto no Decreto nº20.
910/1932. O termo inicial da prescrição, tanto para o pedido cominatório quanto para
aquele atinente à indenização por perdas e danos, conta-se a partir do ato ou fato do
qual se originaram as pretensões deduzidas. Recurso ao qual se nega provimento. (TJ-
MG; APCV 0106261-47.1996.8.13.0145; Juiz de Fora; Terceira Câmara Cível; Rel.
Des. Dídimo Inocêncio de Paula; Julg. 31/03/2011; DJEMG 10/05/2011)

50
Civil, que impõe: a “doação pode ser revogada por ingratidão
do donatário, ou por inexecução do encargo”.

7. Obrigações híbridas (propter rem ou ob rem)


Ao expor esta obrigação, necessário se faz tecer alguns
poucos comentários sobre o estudo do Direito Civil. Como já
mencionado, no Direito das Obrigações se estuda a relação
existente entre as pessoas, na qual é produzido o vínculo entre
devedor e credor. Ocorre que outro ramo do Direito Civil estuda
uma ligação, apenas que um pouco diferente da apresentada até
este momento, neste outro tipo de ligação se estuda a submissão
das coisas à pessoa, assim neste ramo se vislumbra a ligação
existente entre a pessoa e um bem (posse, propriedade, uso,
usufruto...), este ramo é o Direito das Coisas(Reais).
A necessidade deste parêntese é bem simples, no estudo
de Direito Civil são encontradas situações em que não se
consegue estabelecer se a ligação entre credor e devedor é pessoal
(Direito das Obrigações) ou real (Direito das Coisas). Isto ocorre
por conta de uma intersecção entre estes dois ramos do Direito.
Apesar do debate que ocorreu na doutrina sobre onde deveria
ocorrer este estudo, nota-se que houve pacificação sobre o
mesmo, entendendo que este tipo de obrigação é hibrida,
justamente em decorrência da ligação entre os ramos, bem como
por conta dos elementos caracterizadores da mesma possuírem
aspectos dos dois ramos expostos.
Nesta obrigação tem-se uma ligação na qual o devedor
possui o ônus de entregar uma prestação, não por conta de um
vínculo constituído diretamente com o credor, mas em
decorrência de uma ligação que o devedor possui com o bem,
qual seja a de exercer o direito de propriedade sobre o mesmo.
Imagine-se como proprietário de um imóvel, uma casa
na Vila do Sossego, diversos cuidados com o imóvel e respeito
aos vizinhos, vossa senhoria deverá manter. Agora, entre os
deveres decorrentes do imóvel existe, ao final de cada mês, a
cota de condomínio. Assim, há uma relação entre você (devedor)
e um credor (o condomínio Vila do Sossego), ocorre que o vínculo
51
obrigacional não surgiu de um contrato ou de uma relação
instituída entre você e a Vila do Sossego, esta obrigação decorre
de um simples fato: a sua qualidade de proprietário do imóvel.
Todos os condôminos deste imóvel têm a mesma obrigação de
pagar a taxa condominial, não porque querem ou em decorrência
de serem cidadãos conscientes, mas tão somente por conta da
relação de direito real entre cada proprietário e seu apartamento.23
Um importante detalhe deve ser lembrado sobre este tipo
de obrigação, o fator determinante da existência dela é a qualidade
de proprietário de um bem, caso seja perdida a propriedade, o
devedor, a partir daquele momento, deixa de ser vinculado a
esta obrigação. Veja o exemplo do condomínio, caso vossa
senhoria venda o citado imóvel, não será mantido o vínculo entre
condômino e a Vila do Sossego, o novo proprietário é que passa
a ser devedor. Esta obrigação é chamada, também, de propter
rem ou ob rem.

23
11694810 - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA.
COTAS CONDOMINIAIS. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. EXECUÇÃO
DE SENTENÇA DE DÉBITOS CONDOMINIAIS EM FACE DO ANTIGO
PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. ALIENAÇÃO DO BEM NO CURSO DA
EXECUÇÃO. INOCORRÊNCIA DE SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL.
DESISTÊNCIA DA EXECUÇÃO. PROPOSITURA DE NOVA AÇÃO DE
COBRANÇA CONTRA OS ATUAIS PROPRIETÁRIOS. LIMITES SUBJETIVOS
DA COISA JULGADA. OFENSA AO ART. 267, V, DO CPC. INOCORRÊNCIA.
DÍVIDA CONDOMINIAL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. 1. A ausência de decisão
acerca dos dispositivos legais indicados como violados impede o conhecimento do
Recurso Especial. 2. Consoante o princípio da obrigação propter rem, responde
pela contribuição de pagar as cotas condominiais, na proporção de sua fração
ideal, aquele que possui a unidade e que, efetivamente, exerce os direitos e
obrigações de condômino. 3. O adquirente de imóvel em condomínio responde
pelas cotas condominiais em atraso, ainda que anteriores à aquisição, ressalvado o seu
direito de regresso contra o antigo proprietário. 4. O trânsito em julgado de ação de
cobrança proposta em face dos antigos proprietários, que se encontrava em fase de
cumprimento de sentença quando homologada a desistência requerida pelo exequente,
não constitui ofensa à coisa julgada, porquanto, de acordo com os limites subjetivos da
coisa julgada material, essa produz efeitos apenas em relação aos integrantes na relação
jurídico-processual em curso, de maneira que, em regra, terceiros não podem ser
beneficiados ou prejudicados. 5. Ante à inocorrência, na espécie, de ofensa à coisa
julgada e, levando-se em consideração, ainda, a natureza propter rem das obrigações
condominiais, nenhum impedimento havia, portanto, ao condomínio - autor da presente
demanda - de propor nova ação de cobrança contra os atuais proprietários do imóvel,
recorridos, como de fato fez. 6. Recurso Especial não provido. (Superior Tribunal de
Justiça STJ; REsp 1.119.090; Proc. 2009/0011931-7; DF; Terceira Turma; Relª Minª
Fátima Nancy Andrighi; Julg. 22/02/2011; DJE 02/03/2011) (grifo nosso)

52
V
DAS OBRIGAÇÕES QUANTO AO OBJETO

Quando da apresentação das classificações das


obrigações, cuidou-se em mencionar o estudo das que levam em
conta o objeto da obrigação sem expor seus pormenores, agora é
o momento de dissecar estas obrigações. Estes tipos de
obrigações levam em conta o ato a ser realizado pelo devedor,
deve-se verificar qual tipo de prestação deve ser implementada:
se a mera entrega de um bem, a realização de determinada
conduta ou a plena omissão do devedor. Assim elas são divididas
em DAR, FAZER e NÃO FAZER.

1. Obrigação de dar
A nomenclatura é autoexplicativa, trata-se de um tipo de
obrigação na qual o ato aguardado pelo credor é a entrega de um
bem, este ato é o que caracteriza o pagamento desta obrigação e
sua extinção, bem explica Clovis Bevilaqua24, quando diz que é
“aquella cuja prestação consiste na entrega de uma coisa movel
ou immovel, seja para constituir um direito real, seja sómente
para facultar o uso, ou ainda, a simples detenção, seja, finalmente,
para restituil-a ao seu dono”(sic).
A obrigação de dar está ligada à conduta de entregar a
prestação. Esta entrega da prestação é que determina o momento
em que a relação obrigacional fora devidamente cumprida, tal
conduta tem fundamental importância no estudo da obrigação de
dar, recebendo o nome de tradição. A tradição25 é determinada

24
BEVILAQUA, Clovis. Direito das Obrigações. Revista e accrescentada. 5 ed. 1940.
Freitas Bastos. Rio de Janeiro, p 60.
25
A tradição pode ser dividida em três tipos:
a) Real, representada pela entrega do próprio objeto pactuado. Veja : AGRAVO
RETIDO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. VEÍCULO ALIENADO. CONTRATO COM
FIRMA RECONHECIDA. TRADIÇÃO REAL DO BEM. O antigo proprietário de

53
pela entrega do bem pactuado, exemplo, a compra da última edição
do Código Civil brasileiro, o aluno acessa um site de compras

veículo automotor não pode ser responsabilizado civilmente por acidente provocado
pelo novo proprietário, só porque este não levou a registro público o instrumento de
contrato de compra e venda ou porque não promoveu a transferência na repartição de
trânsito competente. A venda foi formalizada e a tradição real do bem ocorreu, portanto,
a responsabilidade pelos danos causados pelo veículo em acidente de trânsito é do atual
adquirente. AGRAVO RETIDO PROVIDO. APELAÇÃO PREJUDICADA. (TA-
PR; AC 0233081-0; Ac. 5085; Colombo; Nona Câmara Cível; Rel. Des. Nilson
Mizuta; Julg. 20/04/2004);
b) Simbólica, tipo no qual um ato realizado pelo devedor representa a entrega da
prestação, como se o mero ato representasse a entrega em mãos de todo o bem de
interesse do credor, bastante utilizado na entrega de bens imóveis, normalmente a
entrega de um imóvel é representada pela mera entrega das chaves. Veja: PROCESSO
CIVIL. CIVIL. EXERCÍCIO DE POSSE. INEXISTÊNCIA. ENCARGO NO ATO
DE DOAÇÃO NÃO CUMPRIDO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA POSSE. 1. A Lei
Municipal n. 459, de 25 de março de 1.959, firmada pelo Prefeito do Município de
Mirassol, destinava o imóvel objeto da lide em prol do “Instituto de Aposentadoria e
Pensões”, com o encargo de ser edificado no local a “construção de um conjunto de
apartamentos destinados aos associados do referido Instituto para instalação dos serviços
relacionados com o mesmo”. 2. Não cumprido o encargo, foi editada nova Lei com o
intento de revalidar e convalescer a doação anteriormente feita, o que se deu por meio
da Lei Municipal n. 565, de 5 de fevereiro de 1.964, promulgada pelo Prefeito Municipal
de Mirassol Elias Thomé. 3. Nesse último instrumento legal eram fixados prazos para
o início e o término da obra. 4. O Instituto dos Bancários nunca assumiu a posse do
terreno para nele edificar a construção, razão primeira da Lei local. 5. Diante desse
quadro deve ser prestigiada a interpretação dada pela sentença quando assevera que
“não tendo sequer demonstrado a sua posse, isto é, disponibilidade sobre o
bem, ou quando menos a tradição do bem (ainda que simbólica), não logrou o
autor se desincumbir do ônus probatório que lhe tocava, razão pela qual não
merece prosperar o seu pedido inicial. “M (fl. 132). 6. Apelação e remessa oficial
tida por interposta improvidas. (TRF 03ª R.; AC 0231391-04.1980.4.03.6100; SP;
Turma Y; Rel. Juiz Fed. Conv. Wilson Zauhy; Julg. 15/06/2011; DEJF 06/07/2011;
Pág. 126) (Grifo nosso)
c) Ficta, tipo de tradição na qual o devedor realiza um ato simbólico, como se estivesse
entregando o objeto da prestação, no entanto o credor não assume o controle deste
bem, ficando o mesmo, ainda algum tempo com o devedor. Veja: APELAÇÃO CÍVEL.
OBRIGAÇÃO DE ENTREGAR PRELIMINAR. INÉPCIA DA INICIAL.
INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. REJEITADA. MÉRITO: COMPRA E VENDA
DE SOJA PARA ENTREGA NO PLANTIO. COMPROVAÇÃO DE RECEBIMEN-
TO DOS VALORES DEVIDOS. OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR O PRODUTO
ARMAZENADO. TRADIÇÃO FICTA. ART. 1267 DO CC. RECURSO
IMPROVIDO. Rejeita-se a preliminar de inépcia da inicial, por inadequação da via
eleita, se resta demonstrado nos autos que as partes formalizaram contrato de compra e
venda de soja e não de depósito. Pelo instituto do constituto possessório, pode haver a
tradição ficta, ficando o alienante na posse do móvel, que deixa de possuí-lo como
dono e passa possuí-lo a outro título. Comprovado nos autos que as partes formularam
contrato de compra e venda de soja para entrega no momento do plantio, bem como
que houve o pagamento do preço contratado, fica a vendedora obrigada a restituir o
produto que com ela ficou armazenado. (TJ-MS; AC-Or 2010.010959-8/0000-00;
Maracaju; Terceira Turma Cível; Rel. Des. Rubens Bergonzi Bossay; DJEMS 31/05/
2010; Pág. 24)

54
(internet), faz o pedido do livro e paga pelo mesmo com o cartão
de crédito. Existe a obrigação do site de compras, apenas ocorrerá
tradição na data em que o livro for entregue ao aluno, assim se
verificará o cumprimento da obrigação.
Em relação a esta prestação deve ser observado, também,
que este objeto pode ser determinado ou determinável. Em boa
parte das obrigações de dar sabe-se exatamente o bem que deve
ser entregue (aquele carro, esta bola, aquela camisa, a caneta
azul...), no entanto, podem ocorrer obrigações nas quais o objeto
é indeterminado e o credor não sabe exatamente o item a ser
entregue. Em decorrência desta indeterminação verifica-se a
subdivisão da obrigação de dar, em obrigação de dar coisa certa
e obrigação de dar coisa incerta. Veja cada um dos tipos:

1.1 Obrigação de dar coisa certa.


É a obrigação disposta nos arts. 233 a 242, do Código
Civil. Neste tipo de obrigação a prestação é claramente
determinada, não podendo sofrer alteração em sua qualidade e
quantidade. Apenas com a entrega do exato objeto combinado,
o devedor se desvincula de sua obrigação com o credor.
Aqui se encontra especificadamente remissão a uma regra
da parte geral do Código Civil, a de que o acessório segue o
principal. Esta regra é aplicada de forma que, por exemplo, a
pessoa que vende um carro esportivo com rodas de liga leve,
deverá na data de entrega do mesmo o fazer com as citadas
rodas, não podendo retirá-las com a suposta alegação que as
mesmas foram compradas em separado do veículo. Lógico que
caso as partes resolvam acordar a venda com a retirada das rodas,
a lei não os proíbe de agir assim.
Entregue a coisa, objeto da obrigação com seu acessório,
nota-se o cumprimento da relação obrigacional, encerrando a ligação
credor-devedor. Agora, se o importante momento da tradição não
tiver acontecido e a prestação sofrer algum tipo de abalo, seja a
perda desta ou apenas algum tipo de deterioração, necessário se faz
proteger o interesse das partes, mesmo como forma de garantir o
equilíbrio da relação obrigacional e as necessárias reparações.
55
A tradição tem fundamental importância, pois a mesma
definirá a responsabilidade sobre os prejuízos decorrentes da perda
ou da deterioração. Necessário, neste momento, lembrar o
brocardo res perit domino (a coisa perece para o dono), neste define-
se de quem é o prejuízo caso um bem seja perdido. Por exemplo,
Vossa Senhoria estava caminhando em uma rua segurando um
livro de Química Orgânica, livro este vendido ao SEBO
HISTÓRIA & POEIRA. Pense nas três situações: primeira, o
livro foi devidamente entregue; segunda, em decorrência de um
escorregão, realmente acidental, o livro cai em um bueiro,
ocasionando a perda do mesmo e, por fim, você, em um ato de
plena liberalidade, resolve não entregar o livro e o joga em um
bueiro.
Observam-se três situações que acarretam consequências
jurídicas diferentes. Na primeira se vislumbra a prática do res
perit domino. Atente-se ao exemplo supra mencionado, acrescente
que o livro foi devidamente entregue, ocorre que o depósito onde
foi colocado sofreu um vazamento hidráulico que o tornou
imprestável, em decorrência de já ter ocorrido a tradição, a sorte
do livro e o prejuízo pela possível perda do mesmo é da firma
compradora.
Agora, ocorrendo esta perda, conforme transcrito nas
demais situações, as consequências são um tanto diferentes. O
art. 234, do Código Civil, impõe a solução para estes casos.
Observe a segunda situação do exemplo da perda do livro, esta
ocorre sem culpa, não houve tradição, logo o prejuízo por tal perda
deve ser suportado pelo devedor, não podendo o credor exigir
reparação ou qualquer outro valor daquele. É como se fosse
restabelecida a situação inicial, o SEBO fica com o dinheiro e
Vossa Senhoria com o livro, apenas que como o livro foi perdido,
Vossa Senhoria (devedor do livro) ficará com o prejuízo desta perda.
Acompanhando o já citado exemplo da perda do livro,
tem-se a terceira situação, observa-se a proteção aos direitos do
credor. Veja que fora realizada negociação e o SEBO efetivou o
devido pagamento pelo livro, o que gera o ônus ao devedor de
entregar esse bem. Infelizmente, o devedor simplesmente joga o
56
livro fora, por sua livre vontade, há culpa do devedor pela perda
do bem. Nesta situação, além de devolver os valores referentes
ao bem, o SEBO terá direito de cobrar os prejuízos (perdas e
danos) pelo não cumprimento da obrigação.
E não apenas a questão da perda integral da prestação é
disposta no Código Civil. Existem situações que o bem sofre
perda parcial em decorrência de sua deterioração, neste caso,
novamente se deve observar a participação do devedor na
deterioração. Sendo esta sem culpa, o credor terá o direito de
resolver a obrigação (finalizá-la de forma que ambos ficam livres
da relação obrigacional), ou, se achar mais conveniente, poderá
receber a prestação na forma que se encontre, sendo abatido o
valor da deterioração.
Citando outro exemplo, Paulo comprou de Carlos 100 taças
de cristal italiano. Durante o transporte, um motorista irresponsável
invade um semáforo e abalroa o carro de Carlos, ocasionando que
50 taças se quebrem. Carlos não teve culpa do ocorrido, logo se
aplica o art. 235, Código Civil, Paulo terá o direito de desfazer o
negócio ou receber as taças restantes, com o devido abatimento
do valor das que se perderam. Note, que em uma situação ou em
outra, a perda será suportada sempre por Carlos.
Agora, caso a perda parcial (deterioração) tenha ocorrido
por culpa do devedor, disponibiliza-se, ao credor, o direito de
exigir o equivalente (receber os valores que teria pago) ou aceitar
a coisa no estado em que se acha, sendo que em qualquer das
situações supra mencionadas ele terá o direito de exigir
indenização das perdas e danos, que por ventura venha ter pelo
não recebimento da prestação na íntegra.
Felizmente, não apenas desgraças podem acontecer com a
prestação, em algumas situações a mesma pode sofrer as melhorias
ou acrescidos apontados pelo art. 237, do Código Civil. Em
decorrência das melhorias ou acrescidos, o credor da relação
obrigacional é quem passa a ter um encargo, o de pagar um
complemento ao valor inicialmente pactuado pelo bem
(prestação). Exemplificado: a fazenda Tamarindo, vendida por
Paulo para João, pela importância de R$ 1.000.000,00. Tendo
57
ficado combinado que Paulo apenas transferiria o imóvel e
entregaria o mesmo a João, após um ano da realização do contrato.
Neste período, em decorrência do aumento do gado (bois),
Paulo se viu obrigado a construir uma Câmara Frigorífica e um
curral com o triplo do tamanho do curral original. As citadas
melhorias tiveram custo, não seria justo Paulo perdê-las para
João, em decorrência desta situação nasce o direito a Paulo, de
exigir o aumento do preço estipulado pela Fazenda.
Não deixa de ter a mesma sorte o credor de uma relação
obrigacional em que a prestação tenha sida acrescida por outros
fatores. Uma situação clássica em que se vislumbra o aumento
da prestação é a apresentada pelo aluvião, que Orlando Gomes26
conceitua como sendo “[...] o acréscimo paulatino de terras que
o rio deixa naturalmente no terrenos ribeirinhos, assim como o
que se forma pelo desvio das águas.” Aquela propriedade, citada
no exemplo acima, tem uma linha de fundos com 300 metros
de rio, caso o rio deposite areia suficiente para aumentar esta
área em 100 metros, nos fundos, seria caracterizado este tipo de
acréscimo, capaz de gerar, também, o aumento de valor da
prestação. Verifica-se a necessidade do credor pagar mais pelo
acrescido na coisa, podendo, caso haja recusa do credor, ser
desfeito o negócio a pedido do devedor.

1.2 Obrigação de restituir.


Na obrigação de restituir existe um tipo de prestação que
determina a entrega de um bem certo, no entanto este bem não
é de propriedade do devedor, o mesmo pertence ao próprio credor.
Na obrigação de dar sempre foi demonstrada a transferência de
propriedade do bem a ser entregue, neste subtipo da obrigação
de dar coisa certa o devedor apenas detém a posse da prestação.
Venosa27 diz que na “obrigação de restituir coisa certa, a
prestação consiste na devolução da coisa ao credor, que já era

26
GOMES, Orlando. Direitos reais. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p 144.
27
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos
contratos. Volume II. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003, p 87.

58
seu proprietário ou titular de outro direito real, em época anterior
à criação da obrigação”, a principal característica deste tipo de
obrigação é o domínio (propriedade do bem) ser do credor, o
devedor apenas esteve na posse deste bem por um lapso de
tempo.
Exemplificando, Paulo, presidente da comissão de
formatura de uma turma de Ciências Contábeis, contratou com
uma firma de refrigerantes o empréstimo de um freezer, a fim
de que fosse realizado um churrasco para angariar fundos para a
festa de formatura. A festa foi no sábado e Paulo pactuou que
entregaria o citado freezer na segunda-feira e assim faz. O que se
observa é que o citado freezer nunca foi de Paulo, apenas manteve
a posse do mesmo, tendo a obrigação de devolvê-lo a seu legítimo
dono.
Também, nesta obrigação, devem ser cuidadas as
situações que saem da normalidade, estas podem gerar conflitos
e dificuldades para sua resolução. A primeira tutela apresentada
é justamente nas situações envolvendo a perda do bem, a lei
impõe a mesma regra res perit domino. Nos casos de perda na
obrigação de restituir a coisa perece para o dono. A prestação
sendo perdida, sem culpa do devedor, acarretará a resolução da
obrigação e o credor é que sofrerá o prejuízo28.
Apresentam-se, assim, duas situações. No exemplo do
freezer emprestado, caso o mesmo fosse atingido por um
relâmpago e incendiasse, Paulo não teria culpa sobre a perda e o
prejuízo seria integralmente suportado pela fábrica de
refrigerantes, pois o credor é que suporta o prejuízo no caso de
perda sem culpa.
A segunda situação decorre de culpa do devedor, no
mesmo exemplo ocorrendo um incêndio por conta de uma

28
DEVER DE INDENIZAR DO APELADO. RES PERIT DOMINI.
INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 238 DO CÓDIGO CIVIL. O apelante terá direito ao
pagamento do aluguel vencido até o dia do furto, pois a Resolução não se operará com
efeito retroativo. Juros de mora a partir da citação. Aplicação do parágrafo único do
art. 21 do CPC quanto à sucumbência. Conheço do recurso, negando-lhe provimento.
(TJ-RJ; AC 2005.001.54652; Primeira Câmara Cível; Rel. Des. Mario Guimarães
Neto; Julg. 26/04/2006)

59
instalação elétrica malfeita por Paulo, este estaria concorrendo
para a perda do objeto da obrigação, vez que deu causa ao
incêndio. Até mesmo por mera lógica, tem-se que Paulo seria
responsável pelo prejuízo causado à fábrica de Refrigerantes, neste
caso ele teria que pagar o equivalente (valor do bem que se perdeu)
mais as perdas e danos resultantes do ato que afetou a esfera
jurídica da fábrica, conforme impõe art. 239, Código Civil.
Esta prestação da obrigação de restituir pode sofrer os
efeitos da perda parcial ou deterioração, resultante de quaisquer
tipos de desgastes que possibilitem algum tipo de dano, no entanto
a prestação não perde sua natureza e muito menos sua
funcionalidade. Em uma situação hipotética, a firma Olhe e
Alugue ltda. aluga à Secretaria de Fazenda de Minas Gerais um
veículo, para realizar inspeções e fiscalizações no interior do
estado, contrato de 6 (seis) meses. Ao final deste período o veículo
deverá ser restituído à Olhe e Alugue ltda., ocorre que este
veículo, com certeza será devolvido com a pintura não mais tão
brilhosa como quando foi entregue à secretaria (efeitos do sol),
bem como o veículo que foi usado por 50.000 Km (cinquenta
mil quilômetros) desenvolveria diversos desgastes em sua parte
mecânica, tal como motor, suspensão e outras peças.
A firma teria direito de exigir a reparação destes desgastes?
O art. 240, caput, impõe a solução, como ocorreu desgaste natural
pela utilização do bem, não pode a firma locadora exigir qualquer
tipo de reparação, o bem apenas sofreu os efeitos de seu uso, o
que aconteceria com qualquer locatário que viesse a utilizar o
citado veículo.
No entanto, a firma poderia agir diferente caso verificado
que o desgaste ocorreu por culpa do devedor, o credor poderia
aplicar o disposto no art. 240, in fine, combinado com o art. 239,
Código Civil. Nesta situação a firma locadora exigiria o
equivalente ao bem deteriorado, ou a reparação deste bem, com
a exigência em um ou em outro caso das perdas e danos.
Melhor sorte possui o devedor caso os bens sofram
melhoramento ou acréscimo. No citado exemplo da locação de
veículo, caso no decorrer da locação, a fábrica do veículo alugado
60
convocasse todos os usuários para um recall29, e neste fosse trocado
todo o motor do veículo, faltando 10 dias para a restituição do
bem. Com certeza o bem estaria melhor avaliado por conta desta
troca, ocorre que conforme leciona o art. 241, Código Civil,
sobrevindo melhoramento ou acréscimo à coisa, sem despesa
ou trabalho do devedor, lucrará o credor, desobrigado de
indenização. Ou seja, o Estado de Minas Gerais nada poderia
cobrar à firma de locação, em razão da inexistência de qualquer
tipo de trabalho ou despesa sua para possibilitar a melhoria do
veículo.
Agora, conforme o art. 242, do Código Civil, se “para o
melhoramento, ou aumento, empregou o devedor trabalho ou
dispêndio, o caso se regulará pelas normas deste Código atinentes
às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa-fé ou de má-fé”.
Nos casos em que ocorrer qualquer tipo de melhoramento ou
aumento do bem a ser restituído adota-se a regra de que tal
melhoria tendo ocorrido por trabalho ou dispêndio do devedor
poderá ser indenizada, desde que obedecidas às regras de boa-fé
e má-fé determinadas pelo Código Civil.
Esta estipulação visa evitar que pessoas de má índole se
aproveitem da posse momentânea de um bem (posse esta obtida
por formas ilegais) e quando obrigado a devolver este bem ainda
obtenham algum lucro, vez que forçariam o credor a pagar
quaisquer benfeitorias realizadas. Logo, apenas poderão ser
indenizados os melhoramentos realizados em bem a ser
restituído, obedecida a regra de boa-fé ou má-fé.
No caso de boa-fé, veja a situação de Paulo, que adquiriu
um bem de Luiz, este inclusive mostrou certidão atualizada de
cartório de que o bem (uma casa) era dele. Paulo não cuidou de
realizar a transferência em cartório. Após seis meses de uso, Paulo
recebe ordem judicial mandando-o entregar a citada casa para

29
Termo em inglês que significa “chamar de volta”, utilizado pelo Direito do Consumidor
para representar aquelas situações em que os fabricantes são obrigados a convocar os
clientes para corrigir problemas nos produtos vendidos. Tal procedimento é regulado
pela Portaria MJ n.º 487, de 15 de março de 2012, que “Disciplina o procedimento de
chamamento dos consumidores ou recall de produtos e serviços que, posteriormente à
sua introdução no mercado de consumo, forem considerados nocivos ou perigosos“.

61
Maria (ex-mulher de Luiz, que ficou com o citado imóvel quando
da partilha de bens na ação de Divórcio). Antes de receber tal
ordem, Paulo fez diversas benfeitorias, entre elas, colocou uma
nova caixa d’água, aumentou em mais dois cômodos a casa e
construiu uma piscina.
Nesta situação, tem-se uma obrigação de restituir, Paulo
é o devedor e Maria a Credora, no entanto o bem sofreu varias
melhorias. Ocorre aqui posse de boa-fé de Paulo, assim, aplicando
o art. 1219, Código Civil, Paulo deve ser indenizado pelas
benfeitorias necessárias e úteis, bem como levantar (tirar) a
benfeitoria voluptuária (a piscina) 30. Lembrando que ficam
resguardadas as situações envolvendo os frutos no que se diz
respeito, também, à boa-fé e a má-fé31

1.3 Obrigação de dar coisa incerta


A obrigação de dar coisa incerta pode ser conceituada
como aquela que a prestação é genericamente apresentada no
momento de sua constituição e o devedor não sabe
especificadamente o que será entregue ao credor.

30
Veja o Código Civil sobre a posse de boa-fé e de má-fé:
Art. 1219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias
e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las,
quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo
valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Art. 1220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias;
não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as
voluptuárias.
Art. 1221. As benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao ressarcimento
se ao tempo da evicção ainda existirem.
Art. 1222. O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé,
tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo; ao possuidor de boa-fé
indenizará pelo valor atual.
Art. 1216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos,
bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se
constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.
31
Veja o Código Civil sobre os frutos recebidos de boa-fé e má-fé
Art. 1214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser
restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também
restituídos os frutos colhidos com antecipação.
Art. 1215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que
são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.

62
O Código Civil, em seu art. 243, impõe que a coisa incerta
será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade. A
obrigação de dar coisa incerta depende destas duas varáveis que
demonstram a incerteza de seu objeto, apenas sendo convertida
em certeza quando ocorrer a escolha e identificação dos bens a
serem entregues. Um cuidado na interpretação da palavra gênero
deve ser demonstrado, veja o que diz Álvaro Villaça Azevedo32:
Tivesse dito o legislador: espécie e quantidade. Não:
gênero e quantidade, pois a palavra gênero tem um
sentido muito amplo.
(...)
Cereal é gênero e feijão é espécie. Se, entretanto,
alguém se obrigasse a entregar uma saca de cereal
(quantidade: uma saca; gênero: cereal), essa obrigação
seria impossível de cumprir-se, pois não poderia saber
qual dos cereais deveria ser o objeto da prestação
jurídica.

O citado mestre chama a atenção para a palavra que


respeitaria integralmente a técnica, e que deveria ser utilizada
no art. 243, do Código Civil, qual seja: espécie. Já Fábio Ulhoa
Coelho33 interpreta esta questão assim: “Note-se que, por gênero,
na interpretação desse dispositivo, entende-se uma designação
da coisa capaz de identificá-la em termos gerais. É conceito
próprio do direito”. A afirmação tenta mostrar que a utilização
do termo gênero é mera questão de direito, capaz de possibilitar
a identificação genérica de determinado item e não a divisão
geral que se faz entre os termos gênero e espécie.
Fábio Ulhoa, também, chama a atenção para que esta
identificação não seja por demais genérica, vez que acarretaria
dificuldade no cumprimento da relação obrigacional. Apesar do
debate, o gênero disposto na obrigação de dar coisa incerta,
possibilita ao credor e ao devedor firmar um tipo de obrigação

32
AZEVEDO, Álvaro Villaça. In GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil
brasileiro, volume II: teoria geral das obrigações. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p 62.
33
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil obrigações; responsabilidade civil,
volume 2, 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p 50/51.

63
que gera maior segurança de seu cumprimento. O fato de ser
genérica aumenta o universo de bens entre os quais o devedor
escolherá alguns a serem entregues, o que acarreta melhores
possibilidades de cumprir o pactuado.
Exemplificando, Ricardo resolveu negociar com a firma
“Foruns & Boss” a compra de 3 calças, tamanho 48, dentre todas
existentes em seu estoque. A firma ficou de entregar as calças
em sua sede no dia seguinte à formalização do contrato. Assim
há obrigação de entregar as calças, no entanto a firma não sabe
exatamente quais os três itens a serem entregues, entre todos os
existentes. Este universo implica diversas possibilidades ao
cumprimento desta obrigação, as calças podem ser prestas, azuis,
vermelhas, rosas ou qualquer outra disponível no estoque. O
exemplo mostra uma situação em que há maior facilidade de
cumprimento da prestação, apenas ao início da relação existe a
incerteza, em dado momento a obrigação perde esta incerteza,
veja a seguinte definição de Flávio Tartuce34:
Assim, coisa incerta não quer dizer qualquer coisa,
mas coisa indeterminada, porém suscetível de
determinação futura. A determinação se faz pela
escolha, denominada concentração, que constitui um
ato jurídico unilateral. Assim, enuncia o art. 243 do
atual Código que a coisa incerta será indicada, ao
menos, pelo gênero e pela quantidade.

O ilustre mestre apresenta o momento mais importante


da obrigação de dar coisa incerta: escolha. A obrigação apenas
será incerta até o instante em que forem definidas exatamente
as prestações a serem entregues, no exemplo citado, no momento
em que Ricardo ou a Fábrica definir exatamente as calças a serem
entregues ocorre a chamada concentração, que especifica que
itens devem ser entregues.
Ocorrida a escolha, a obrigação perde seu caráter de
incerteza e a prestação se torna certa. A obrigação, neste

34
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil; volume único. 1 ed. Rio de janeiro.
Forense; São Paulo. Método, 2011, p 290.

64
momento, se transforma em obrigação de dar coisa certa, o
art. 245, Código Civil, impõe este entendimento quando informa
que realizada a escolha vigorará o disposto na seção antecedente,
que é justamente a seção I, que trata da obrigação de dar coisa
certa.
A escolha é um importante momento da obrigação, vez
que ela acarreta justamente a concentração e finaliza a dúvida
existente sobre quais itens devem ser constituídos como
prestação e serem entregues ao credor. A dúvida que pode surgir
neste momento é sobre quem pode realizar a escolha. Assim o
art. 244, Código Civil, diz:
Nas coisas determinadas pelo gênero e pela
quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o
contrário não resultar do título da obrigação; mas
não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a
prestar a melhor.

O artigo transcrito soluciona a situação ao determinar que


a escolha deva ser realizada pelo devedor, caso ocorra silêncio
entre as partes envolvidas na obrigação, claro que há a
possibilidade das próprias partes determinarem quem realizará
a escolha, no exemplo da fábrica de roupas e Ricardo, caso no
pacto entre eles nada tivesse sido dito sobre quem realizaria a
escolha das 3 calças, o direito de indicá-las seria da fábrica. Agora,
as partes poderiam, no ato de constituição da obrigação, estipular
que Ricardo (credor) realizaria a escolha, nada obstando que
devedor e credor acordassem, também, que uma terceira pessoa,
estranha à relação obrigacional, realizasse a escolha.
Ao mesmo tempo em que se estipula como será realizada
a escolha, o Código Civil impõe uma regra de fundamental
importância neste tipo de obrigação, ao dispor sobre a qualidade
da prestação que deverá ser entregue (art. 244, in fine). É
estipulado que o devedor não poderá dar a coisa pior, e não será
obrigado a dar a melhor. Apesar da redação um pouco imprecisa,
deve ser aplicada a boa-fé objetiva ao presente caso.
A determinação legal evita que entre os itens disponíveis
sejam escolhidos os “menos piores”, exemplificando, Paulo se
65
obrigou a entregar 200 ovelhas, de seu rebanho de 1000. Destas,
500 são tidas como normais, nem muito gordas e nem muito
magras, 200 são magras, 100 estão quase desfalecendo de tão
fracas e 200 são a excelência em saúde (muito peso e lã). Em
uma situação dessas seria injusto com o credor se o devedor
escolhesse as 200 magras, vez que elas não são as piores, mas
longe estão de serem as melhores.
Aplicando a boa-fé objetiva deve-se buscar o padrão de
honestidade e lealdade para a realização da escolha. As partes,
em decorrência deste respeito mútuo, visualizarão um meio
termo entre as possibilidades para escolha e este meio-termo
indicará a escolha sobre as 500 ovelhas que são consideradas
normais, nem de excessiva qualidade nem de ridícula situação
visual, há a busca por um padrão mediano, capaz de satisfazer
as partes envolvidas na obrigação.
O credor é amplamente protegido neste tipo de obrigação,
pois o risco do devedor não entregar a prestação é minimizado
por conta da generalidade a que inicialmente é submetida a
prestação. As partes não individualizam o objeto, em decorrência
disto caso o universo apresentado de opções seja perdido, o
devedor não poderá se eximir de cumprir a obrigação.
Neste sentir, Gama35 leciona:
Neste caso, observa-se o brocardo genus nunquam perit,
ou seja, a idéia de que o gênero não perece, motivo
pelo qual não poderá o devedor se furtar do
cumprimento da prestação sob o argumento de que
houve perda ou deterioração da coisa, ainda que em
decorrência de força maior ou de caso fortuito (art.
246 do Código Civil de 2002). Em outras palavras:
não há que se cogitar da aplicação da teoria dos riscos
em se tratando de obrigação de dar coisa incerta,
exatamente por não se ter operado a individualização
da prestação – sua completa identificação de modo
que a coisa não seja confundida com qualquer outra.

35
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo:
Atlas, 2008, p 123.

66
Até a escolha o devedor não pode alegar a perda da coisa
para se eximir de cumprir a obrigação, conforme o exemplo já
exposto, Paulo é obrigado a entregar 200 ovelhas de um rebanho
de 1000, caso ocorra uma tempestade elétrica que aniquile todo
o rebanho, Paulo não poderá alegar esta situação para se eximir
de entregar as 200 ovelhas. Ele, justamente por conta da incerteza
da prestação (não ocorreu escolha), terá mantida a obrigação de
dar coisa, devendo para cumprir a mesma adquirir 200 ovelhas
para entregá-las a seu credor. Assim, antes “da escolha, não
poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda
que por força maior ou caso fortuito” (art. 246, Código Civil).

2. Obrigação de fazer
Na lição de Barros36 tem-se:
Nas obrigações de fazer, a prestação consiste num ato
do devedor, ou num serviço deste. Qualquer forma
de atividade humana, lícita e possível, pode constituir
objeto da obrigação. Os atos ou serviços, que se
compreendem nas obrigações de fazer, se apresentam
sob as mais diversas roupagens: trabalhos manuais,
intelectuais, científicos e artísticos.

O objeto da obrigação apresenta a necessidade da


realização de determinada conduta por parte do devedor, assim,
neste tipo de obrigação se determina uma atividade a ser realizada
pelo devedor, ficando o credor aguardando a realização desta ou
o resultado final do ato realizado pelo devedor.
Nessa obrigação a conduta é o próprio objeto da relação
obrigacional, Imagine Silvana, a mesma deve a importância de
R$ 1.200,00 à loja “Saltos e Sapatos Ltda.”. Em razão deste
débito, Silvana tem seu nome inserido no SPC. Hoje, Silvana
resolveu pagar seu débito, no momento da quitação do débito
originou-se uma obrigação de fazer, da qual Silvana é credora e a
loja devedora, sendo prestação a retirada de seu nome do SPC.
Silvana não aguardará um objeto acabado por parte da loja, ela
36
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, volume 5, direito das
obrigações – 1ª parte. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p 86.

67
aguardará o ato da loja junto ao SPC, de informar que seu nome
deve ser retirado do cadastro de inadimplentes.
A outra forma de apresentação da obrigação de fazer é
aquela na qual o fazer pode ser confundido com a obrigação dar,
pois na conduta do devedor fica inserida a obrigação de entregar
algo. Por exemplo, Rodrigo é um famoso pintor de quadros
familiares na cidade de Barreiras, Bahia. Ele foi contratado por
Ivilene para pintar um retrato desta e de seu marido, aqui o objeto
da obrigação se caracterizará por duas ações, a primeira pintar o
quadro e a segunda entregar o mesmo à Sr. Ivilene.
Em um primeiro momento pode-se achar que esta
obrigação se confundiria com a obrigação de dar, mas basta uma
simples pergunta para identificar o tipo de obrigação: Qual o ato
mais importante? Lógico que pintar o quadro, este ato pode existir
sem a entrega do mesmo, a mera confecção do mesmo determina
que a obra existe, necessitando apenas a devida entrega, no
entanto se o quadro não for pintado, nunca se poderá falar de
entrega, nem mesmo em decorrência de medida judicial.
Apesar da possível confusão, este tipo de obrigação tem
elevada importância para a sociedade, se busca do devedor a
técnica apurada para realizar a atividade pela qual o credor
mostrou seu interesse. Por conta desta atividade humana é que
se observa o cuidado com quem vai cumpri-la, na obrigação de
dar a conduta de entregar algo pode ser realizada pelo próprio
devedor ou seu representante, no entanto o mesmo não se pode
dizer em uma obrigação de fazer na qual se contrata um indivíduo
especificadamente para realizar o ato. Como no exemplo do
quadro, a contratação foi do pintor Rodrigo, individualizado o
devedor, não poderá a prestação ser cumprida por terceiros.
Em decorrência desta questão, há necessidade de
identificar se há fungibilidade da prestação, a fim de se saber
quem realmente pode cumpri-la, assim se divide a prestação da
obrigação de fazer em fungível e infungível, sendo a primeira,
segundo Podestá 37 , “[...] a prestação relacionada com as

37
PODESTÁ, Fábio Henrique. Direito das obrigações: teoria geral e responsabilidade
civil. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2008, p 108.

68
qualidades pessoais do devedor, as chamadas obrigações intuitu
personae”, enquanto que a fungível seria aquela obrigação “que
pode ser cumprida por qualquer pessoa, pouco importando as
qualidades pessoais como determinante da contratação”.
A presente subdivisão, da obrigação de fazer, tem
fundamental importância para o seu cumprimento. Veja que em
uma obrigação infungível, intuitu personae, não se poderá falar
que representante do devedor realizará a prestação, apenas o
próprio devedor é quem detém a técnica para a realização daquela
prestação. Como exemplo, verifique a seguinte jurisprudência38:
67037167 - HONORÁRIOS PROFISSIONAIS.
ADVOGADO. CONTRATO. CLÁUSULA
PENAL. VALOR EXAGERADO. REDUÇÃO.
ADMISSIBILIDADE. O contrato de honorários de
patrocínio advocatício é celebrado intuitu personae,
circunstância que autoriza a revogação do mandato
a qualquer tempo, facultando-se ao advogado cobrar
o que lhe é devido pelos serviços contratados e
prestados; entretanto, a faculdade não autoriza o
reconhecimento de cláusula contratual pela qual
ocorre a imposição de cláusula penal de 500%
(quinhentos por cento). Referida cláusula, mesmo
rebaixada para 100% (cem por cento) em relação ao
débito, na sentença originária, afigura-se exagerada.
No caso é de ser aplicada a regra sugerida no sistema
do consumidor, no índice de 10% (dez porcento),
sobre o valor devido. (TACSP 2; Ap. c/ Rev. 614.689-
00/4; Terceira Câmara; Rel. Juiz Aclibes Burgarelli;
Julg. 19/02/2002) (grifo nosso)

A jurisprudência expõe a infungibilidade do contrato entre


cliente e o advogado, entendendo que apenas aquele advogado é
que deveria prestar os serviços ao cliente, assim este advogado é
o único devedor dos serviços.
Agora, nas obrigações caracterizadas por prestações
fungíveis não se poderá falar que apenas aquele devedor pode
cumprir a prestação, por exemplo: na contratação de um pintor

38
Fonte: DVD Magister, nº 40, Out/Nov 2011.

69
de paredes, para realizar a pintura de um quarto em uma
residência, caso ele não compareça no dia combinado, qualquer
outro pintor que realize os mesmos serviços pode ser chamado
a fazer esta pintura, o que seria uma obrigação de fazer fungível.
A determinação do tipo de obrigação de fazer é
importante para definir a saída jurídica a ser adotada caso ocorra
descumprimento da prestação, nas situações envolvendo
obrigações de fazer infungível não há como se falar em
substituição do devedor da relação obrigacional. O Código Civil
determina que incorre na obrigação de indenizar perdas e danos
o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele
exeqüível (art. 247). Para essas obrigações, sendo a mesma intuito
personae não se pode falar em substituição do devedor, a saída
jurídica é a conversão da prestação em valores pecuniários, a
título de perdas e danos.
A infungibilidade da prestação impõe a impossibilidade
de qualquer pessoa poder cumpri-la, essa se encontra vinculada
apenas ao devedor original. A recusa no cumprimento da
obrigação é amparada pela aplicação do brocardo nemo potest
precise cogi ad factum 39, que protege o devedor de ser submetido a
situações vexatórias ou mesmo impositivas, caso se recuse a
cumprir a obrigação. A forma de impor o cumprimento da
obrigação é pela aplicação de multa por descumprimento da
prestação, mas mesmo esta apenas acarretará dispêndio ao
devedor, o que poderá aumentar seu prejuízo, mas não o forçara
a cumprir a prestação.
Esta multa é conhecida como astreinte, a sua origem
remonta ao Direito Francês e posteriormente abraçada pelo
ordenamento brasileiro, segunda a mesma o juiz apreciando
pedido de cumprimento de obrigação de fazer poderá impor este
multa pelo descumprimento da obrigação, de forma que o
devedor sofra os efeitos de sua atitude, veja o disposto no art.
462, §4º, Código de Processo Civil:

39
Ninguém pode ser constrangido a fazer o que por isso se obrigou.

70
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento
de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a
tutela específica da obrigação ou, se procedente o
pedido, determinará providências que assegurem o
resultado prático equivalente ao do adimplemento.
[...]
§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior
ou na sentença, impor multa diária ao réu,
independentemente de pedido do autor, se for
suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-
lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

Assim, na recusa do devedor de cumprir a prestação ainda


poderá o credor requerer judicialmente a entrega da prestação,
sob pena de multa por dia de descumprimento da ordem judicial40,
agora, não se verificando o efeito desejado, tem-se o quadro de
não cumprimento da obrigação, que é dividido em três situações,
a primeira é o inadimplemento com culpa, conforme já comentado,

40
11709310 - PROCESSUAL CIVIL. ART. 461, § 4º, DO CPC. OBRIGAÇÃO DE
FAZER. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. APRESENTAÇÃO DE EXTRATOS
DE CONTAS VINCULADAS AO FGTS. COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA.
ASTREINTES. POSSIBILIDADE. 1. Recurso repetitivo julgado pela Primeira Seção
do Superior Tribunal de Justiça, com fulcro no art. 543 - C do CPC, firmou o
entendimento de que “a responsabilidade pela apresentação dos extratos analíticos é da
Caixa Econômica Federal - enquanto gestora do FGTS -, pois tem ela total acesso a
todos os documentos relacionados ao Fundo e deve fornecer as provas necessárias ao
correto exame do pleiteado pelos fundistas” (RESP 1.108.034/RN, Rel. Min.
Humberto Martins, Primeira Seção, julgado em 28.10.2009, DJe 25.11.2009). 2. O
presente Recurso Especial repetitivo trata da consequência lógica pelo não cumprimento
da obrigação imposta à CEF, qual seja, a possibilidade de aplicação de multa diária
prevista no art. 461, § 4º, do CPC. 3. É cabível a fixação de multa pelo descumprimento
de obrigação de fazer (astreintes), nos termos do art. 461, § 4º, do CPC, no caso de
atraso no fornecimento em juízo dos extratos de contas vinculadas ao FGTS. 4. A ratio
essendi da norma é desestimular a inércia injustificada do sujeito passivo em cumprir a
determinação do juízo, mas sem se converter em fonte de enriquecimento do autor/
exequente. Por isso que a aplicação das astreintes deve nortear-se pelos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade. 5. Precedentes: RESP 998.481/RJ, Rel. Ministra
Denise Arruda, Primeira Turma, DJe 11.12.2009. AGRG no RESP 1.096.184/RJ,
Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 11.3.2009; RESP 1.030.522/ES, Rel.
Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19.2.2009, DJe 27.3.2009;
RESP 836.349/MG, Rel. Min. José Delgado, DJ de 9.11.2006. Recurso Especial
improvido para reconhecer a incidência da multa. Acórdão sujeito ao regime do art.
543 - C do Código de Processo Civil e da Resolução 8/2008 do Superior Tribunal de
Justiça. (Superior Tribunal de Justiça STJ; REsp 1.112.862; Proc. 2009/0059017-6;
GO; Primeira Seção; Rel. Min. Humberto Martins; Julg. 13/04/2011; DJE 04/05/
2011)

71
decorre da falta do próprio devedor que não cumpre a obrigação
por sua vontade, essa situação é resolvida com a conversão da
prestação em perdas e danos (art. 247, Código Civil).
As outras formas de não cumprimento serão
impossibilidade sem culpa e a impossibilidade com culpa,
conforme expresso no art. 248, Código Civil. O primeiro caso,
apresentado pelo art. 248, decorre de situações que fogem ao
controle do devedor e acarretam a não entrega da prestação. Pense
na seguinte situação, Joaquim, o mais famoso confeiteiro de
Londrina, é contratado para preparar o bolo do casamento de
Marlúcia e Wendell, ocorre que quando está preparando o bolo, o
confeiteiro sofre um princípio de infarto e acaba internado durante
uma semana o que impede a entrega do confeito, esta situação
acarreta a impossibilidade sem culpa, o que ocasiona a resolução
do contrato, sem gerar direito a perdas e danos ao credor.
Agora, se a impossibilidade resultar de culpa, a situação
é diferente. Na impossibilidade com culpa o devedor quer cumprir
a obrigação, no entanto por algum motivo a mesma não é
realizada. Apesar da vontade do devedor ele age de uma forma
que o prejudica e acarreta o inadimplemento da prestação. Pode-
se gerar a dúvida: como alguém quer cumprir uma obrigação e
não a cumpre com culpa?
Exemplificando: o Sr. Raul é um famoso alfaiate de
Campos do Jordão, o mesmo, consegue confeccionar apenas dois
ternos em uma semana, caso em determinada semana 6 pessoas
o contratem para fazer ternos, 4 das 6 pessoas não terão suas
prestações satisfeitas. Apesar da vontade do Sr. Raul de cumprir
a prestação o mesmo não guardou o devido cuidado de contratar
apenas a quantidade que tem capacidade de fazer, nesta forma
se verifica culpa do devedor, assim, os 4 que não obtiveram suas
prestações terão direito a requerer perdas e danos do alfaiate.
Por fim, lembre que a obrigação de fazer pode ser fungível,
ou seja, poderá ser realizada a prestação por terceiro estranho ao
contrato original. Esta possibilidade decorre da situação
envolvendo uma prestação que não é intuito personae, qualquer
pessoa pode realizar o ato. Exemplificando, caso o “Seu Zé”
72
seja contratado para pintar uma parede frontal de uma residência,
receba o combinado e não compareça para realizar o serviço,
esta prestação não é personalíssima, qualquer outro pintor de
paredes poderá realizá-la.
Logo, se o fato puder ser executado por terceiro, será livre
ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa
ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível(art. 249,
Código Civil). O credor terá a liberdade de contratar terceiro
para executar a prestação e o devedor será obrigado a assumir as
despesas resultantes deste ato, veja a jurisprudência:
58105904 - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE
CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR
DANOS MATERIAIS E MORAIS. REQUISITOS
DO ART. 927 DO CPC PRESENTES. ESBULHO
CARACTERIZADO. PROCEDÊNCIA DA
POSSESSÓRIA EM FAVOR DA PARTE QUE
SOFREU O ESBULHO. ALEGAÇÃO DE
PROPRIEDADE PELO RÉU. DISCUSSÃO
IRRELEVANTE. DANO MORAL.
INOCORRÊNCIA. DANO MATERIAL.
OCORRÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
OCORRÊNCIA. 1. A ação de reintegração de posse
permite ao autor recuperar a posse perdida em razão
de esbulho e depende da comprovação dos seguintes
pressupostos: posse do autor, esbulho praticado pelo
réu e perda da posse (art. 927 do CPC). 2. Considerada
a natureza possessória da ação de reintegração,
eventual discussão acerca da qualidade de
proprietário do réu é irrelevante para o deslinde da
demanda. 3. O mero dissabor ou aborrecimento não
gera dano moral indenizável. 4. Deve a suplicada
demolir o muro que construiu e edificar outro no
local em que se encontrava o anterior, não podendo
ser de qualidade inferior ao antigo. Caso a
demandada não cumpra a obrigação em 60 (sessenta)
dias, estão autorizados os demandantes a mandar
executar a obra à custa da demandada, nos termos
do art. 249 do Código Civil. 5. Ante a sucumbência
da demandante quanto aos danos morais, há
ocorrência da sucumbência recíproca prevista no art.
73
21 do Código de Processo Civil, compensando-se os
honorários e dividindo-se as custas processuais. 6.
Recurso de Apelação Parcialmente Provido. (TJ-PE;
AC 0161443-9; Recife; Quarta Câmara Cível; Rel.
Des. Francisco Manoel Tenório dos Santos; Julg. 17/
05/2011; DJEPE 27/05/2011)41 (grifo nosso)

A obrigação de fazer fungível poderá ser realizada por


pessoa que não o devedor original, ademais o parágrafo único de
art. 249, Código Civil, possibilita, ainda, que nos casos de
urgência, o credor possa, independentemente de autorização
judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo
posteriormente ressarcido pelo devedor.

3. Obrigação de não fazer


Obrigação em que se exige uma conduta negativa do
devedor, devendo se omitir de praticar determinado ato, bem
explica Tartuce42, a “obrigação de não fazer (obligatio ad non
faciendum) é a única obrigação negativa admitida no Direito
Privado Brasileiro, tendo como objeto a abstenção de uma
conduta”, e completa, “obrigação de não fazer é quase sempre
infungível, personalíssima (intiuitu personae), sendo também
predominantemente indivisível pela sua natureza, nos termos
do art. 258 do Código Civil”.
Esta obrigação tem caracterização própria e na
classificação quanto ao objeto dificilmente será confundida com
as demais obrigações, pois é a única que implica em conduta
omissiva. A obrigação de não fazer tem um “cruzar de braços”
do devedor, que para manter as graças do credor e ser considerado
adimplente não pode realizar determinada conduta. A
jurisprudência mostra a imposição desta conduta negativa:
48366401 - INDENIZAÇÃO. VIZINHO. IMÓVEL
RESIDENCIAL. BARULHO EXCESSIVO. DANO
MORAL. VALORAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE NÃO

41
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
42
Tartuce, Flávio. Direito civil, v.2: direito das obrigações e responsabilidade civil. 5
ed. São Paulo: Método, 2010. Pag 88.

74
FAZER. MULTA. I. Condenada a obrigação de não
fazer barulho nem perturbar o sossego dos vizinhos,
observadas as regras da Convenção Condominial e a
Lei, tudo sob pena de multa conforme fixada na
sentença e neste acórdão. II. A produção de barulho
excessivo em imóvel residencial, prejudicando o
sossego dos moradores vizinhos, enseja a obrigação
de indenizar por danos morais. III. A valoração da
compensação moral deve observar o princípio da
razoabilidade, a gravidade e a repercussão dos fatos,
a intensidade e os efeitos da lesão. A sanção, por sua
vez, deve observar a finalidade didático-pedagógica,
evitar valor excessivo ou ínfimo, e objetivar sempre
o desestímulo à conduta lesiva. Mantido o valor
fixado pela r. sentença. lV. Apelação improvida. (TJ-
DF; Rec. 2010.07.1.004546-6; Ac. 508.874; Sexta
Turma Cível; Relª Desª Vera Andrighi; DJDFTE 10/
06/2011; Pág. 255) (grifo nosso)

A decisão apresenta o cerne da obrigação de não fazer, o


devedor em tal relação não poderá executar qualquer ato que vá
de encontro a uma conduta negativa imposta, a prestação da
jurisprudência é justamente a manutenção do silêncio (ato
negativo do devedor), vez que este não pode fazer qualquer tipo
de barulho que incomode seus vizinhos.
Na obrigação de não fazer, diferente das de dar ou fazer,
não tem como ser identificado o momento específico que
demonstre o cumprimento da mesma. Veja que a obrigação de
dar possui um momento específico que demonstra o seu
cumprimento, a tradição, na obrigação de fazer o serviço ou ato
a ser realizado e entregue ao credor constitui a adimplência da
mesma.
Na obrigação de não fazer, a prestação é cumprida em
decorrência de uma omissão, não há como determinar o instante
exato em que a mesma está sendo cumprida, a adimplência desta
se perfaz a cada segundo da vida do devedor, usando um exemplo
da produção de imagens, a obrigação de dar poderia ter
materializado o momento de seu cumprimento, por meio de uma
fotografia do devedor entregando a prestação ao credor, já a

75
obrigação de não fazer, para demonstrar seu cumprimento, o
devedor deveria ser filmado em todos os momentos de seu dia,
vez que a adimplência do mesmo se demonstra a cada instante
em que se mantém a omissão, logo uma foto poderia apenas
demonstrar segundos antes dele descumprir a relação.
Em contrapartida, o momento do inadimplemento da
obrigação de não fazer será facilmente identificado, por exemplo:
um biógrafo muito famoso, Marcos Aflitos da Paz, realizou
pesquisa dos oito anos de governo de um certo Governador
nordestino, durante sua pesquisa descobre tudo o que envolve a
vida deste político, os fatos bons, os ruins, os sórdidos e os
profanos. Sabendo desta pesquisa o político faz um contrato com
o biógrafo, no qual este não pode publicar este livro. Enquanto o
biógrafo mantiver a omissão, esta obrigação está sendo cumprida,
não podendo dizer que este ou aquele momento caracterizou o
adimplemento. No entanto, após de 3 anos, o biógrafo resolve
publicar a biografia do Governador, no momento em que for
publicado tal livro, se materializaria o descumprimento da
obrigação.
O Código Civil, ao retratar a obrigação de não fazer, o
faz impondo regras sobre duas situações, a primeira, apresentada
pelo art. 250, impõe que “extingue-se a obrigação de não fazer,
desde que, sem culpa do devedor, se lhe torne impossível abster-
se do ato, que se obrigou a não praticar”. A lei impõe uma
situação em que a relação obrigacional é extinta e nada poderá
alegar o credor, a fim de forçar o cumprimento do originalmente
pactuado.
Exemplificando esta situação, Raifran comprou um carro
esportivo com faróis de xenon (tipo de farol de carro que tem
uma luz branca e muito intensa, ótima para o dono do veículo,
mas às vezes muito incômoda para os motoristas dos outros
veículos), a loja deu um bom desconto em razão de querer fazer
a propaganda do veículo e acordou que Raifran não trocaria os
faróis de xenon por de outros tipos durante 12 meses. Raifran se
transformou em devedor de uma prestação de não fazer para a
loja de veículos.
76
Ocorre que, após 6 (seis) meses do citado acordo, o
CONTRAN impõe uma resolução proibindo o uso dos citados
faróis de xênon, em decorrência da imposição, Raifran se vê
obrigado a praticar o ato de trocar os faróis, em tese estaria
descumprindo a relação obrigacional, no entanto por ter se
tornado impossível a prestação (regulamento que proibiu o uso
dos faróis) ocorre a extinção da obrigação e a loja nada pode
exigir de Raifran.
Em contraponto, o art. 251 impõe que “praticado pelo
devedor o ato, a cuja abstenção se obrigara, o credor pode exigir
dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo
o culpado perdas e danos.”. Nesta situação, a imposição legal é
de forçar a manutenção da omissão por parte do devedor, a lei
busca desestimular que o devedor faça o ato pelo qual se obrigara
não fazer.
No exemplo do Governador e do Biógrafo, ambos
formaram uma obrigação de não fazer, na qual era exigida a
omissão de publicar o livro. O biógrafo resolvendo publicar a
obra sobre a vida do governador descumpre a obrigação com
culpa, vez que ele agiu e praticou o ato por sua vontade. Nesta
situação, o governador exigirá que o biógrafo retire os livros
publicados das livrarias e da editora. Ademais, o governador
poderá requerer quaisquer danos que tenha sofrido, decorrentes
da publicação deste livro.
Ao mesmo tempo, o parágrafo único possibilita que o
credor desfaça o ato praticado, neste exemplo o governador
poderia por conta própria recolher os livros e impor que a editora
não os coloque novamente em circulação, podendo cobrar pelas
despesas e danos ocorridos por conta da publicação. Não se
esqueça, também na obrigação de não fazer há a possibilidade
de se exigir astreintes43 (multa), como forma de se impor que o

43
11723311 - PROCESSO CIVIL. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. ASTREINTES.
EXIGIBILIDADE. MOMENTO. EXEQUIBILIDADE. DEMONSTRAÇÃO. ÔNUS.
RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CARÁTER INDENIZATÓRIO.
DESCABIMENTO. 1. A exigibilidade das astreintes depende da apuração, no plano
do direito material, do inadimplemento do devedor no cumprimento da ordem judicial
a ele dirigida. 2. Em se tratando especificamente de obrigação de não fazer, o devedor

77
devedor cumpra devidamente o acordado, veja o Código de
Processo Civil:
Art. 645. Na execução de obrigação de fazer ou não
fazer, fundada em título extrajudicial, o juiz, ao
despachar a inicial, fixará multa por dia de atraso no
cumprimento da obrigação e a data a partir da qual
será devida.

O dispositivo supratranscrito possibilita ao magistrado,


durante ação judicial, impor multas por descumprimento de
obrigação de não fazer, assim como ocorre na obrigação de fazer,
forçando o devedor a respeitar a pacta sunt servanda.

será dado por inadimplente a partir do momento em que realizar o ato do qual deveria
se abster - nos exatos termos do art. 390 do CC/02 -, fazendo surgir automaticamente
o interesse processual do credor à medida coercitiva, ou seja, a prática do ato proibido
confere certeza, liquidez e exigibilidade à multa coercitiva, possibilitando a sua cobrança.
3. A demonstração da exequibilidade das astreintes constitui ônus do credor. 4. Não
podem retroagir os efeitos das astreintes, de modo que alcancem obrigação imposta em
decisão proferida anteriormente, sem estipulação de multa cominatória. 5. A natureza
jurídica das astreintes - medida coercitiva e intimidatória - não admite exegese que a
faça assumir um caráter indenizatório, que conduza ao enriquecimento sem causa do
credor. O escopo da multa é impulsionar o devedor a assumir um comportamento
tendente à satisfação da sua obrigação frente ao credor, não devendo jamais se prestar
a compensar este pela inadimplência daquele. 6. Recurso Especial a que se nega
provimento. (Superior Tribunal de Justiça STJ; REsp 1.047.957; Proc. 2008/0079258-
7; AL; Terceira Turma; Relª Minª Fátima Nancy Andrighi; Julg. 14/06/2011; DJE
24/06/2011) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

78
VI
OBRIGAÇÕES ALTERNATIVAS

1. Noções gerais
No capítulo destinado às diversas classificações das
obrigações foi exposta a situação envolvendo a multiplicidade de
prestações em uma relação obrigacional. Entre os tipos apresentados
de obrigação complexa encontra-se a obrigação alternativa, que se
caracteriza pelos diversos itens apresentados como prestação. Para
Pothier44, este tipo de obrigação se descreve como:
Huma obrigação alternativa he aquella pela qual
alguem se obriga a dar ou a fazer muitas cousas, com
a declaração que o pagamento de huma cousa livra de
pagar as outras: como se eu me obriguei a dar-vos tal
Cavallo, ou vinte escudos; ou se me obriguei a edificar-
vos huma casa, ou pagar-vos cem moedas, &c. (sic)

A obrigação alternativa possibilita às partes a convenção


de que entre certas opções, previamente estipuladas, ocorrerá a
determinação de um ou de alguns itens, que acarretará a entrega
destes ao credor, possibilitando o adimplemento da relação
obrigacional. Washington de Barros45 cita as grandes vantagens
deste tipo de obrigação, vez que a mesma amplia a possibilidade
de pagamento, bem como diminui os riscos de seu cumprimento,
o que denota a fundamental importância deste tipo de relação.
Sem dúvidas, a obrigação alternativa possibilita maior segurança
ao credor quanto ao cumprimento da obrigação, bem como a
vantagem do devedor possuir mais de uma forma de cumprir o
que foi combinado.

44
MR. POTHIER. Tratado das obrigações pessoaes e recíprocas nos pactos, contractos,
convenções, &c. Traduzido por José Homem Correa Telles. Tomo I. Lisboa:
Typographia de Antonio José da Rocha, 1849, p 184.
45
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, volume 5, direito das
obrigações – 1ª parte. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p 106.

79
Esta obrigação apresenta a especificação das
possibilidades de prestação. Os sujeitos inseridos nesta
determinam ao início do pacto que itens serão dispostos e
submetidos à escolha. Por exemplo, quando da compra de um
carro, para efetivar o negócio, o vendedor oferece ao comprador
um jogo de tapetes ou o seguro ou o pagamento do IPVA do
veículo. O comprador terá direito de receber um dos itens
oferecidos e ocorrida a entrega deste item escolhido, não mais
haverá a necessidade de entregar qualquer outro item, vez que a
relação obrigacional estará quitada.
Um detalhe pode levar a confundir este tipo de obrigação
com a obrigação de dar coisa incerta, justamente o fato da
necessidade de escolha. Na obrigação de dar coisa incerta ocorre
o fenômeno da generalidade da prestação, ou seja, há uma
disposição de itens a ser entregues por gênero e quantidade, o
credor não sabe exatamente que itens vão ser entregues, veja as
duas situações: Exemplo A: um fazendeiro vende 20 vacas de
seu rebanho (1000 vacas leiteiras) a seu vizinho. Elas serão
entregues após a escolha pelo comprador. Exemplo B: Este
mesmo fazendeiro vende a seu vizinho uma vaca, a ser escolhida
entre uma vaca preta e uma vaca malhada.
Nas duas situações existe uma incerteza, no entanto no
primeiro caso há uma incerteza sobre os próprios bens a serem
entregues, não há uma especificação, apenas se sabe que em um
universo de 1000 vacas, ocorrerá uma escolha. Na segunda
situação tem-se uma escolha a ser efetuada, no entanto as
possíveis parcelas são exatamente determinadas (a vaca preta
ou a vaca malhada), aqui se diferencia a obrigação de dar coisa
incerta da alternativa. Nesta, não há generalidade, o credor sabe
exatamente quais são os itens a serem dispostos, apenas faltando
a indicação de qual deverá ser entregue.

2. Da escolha
Ante os exemplos e situações mostradas verifica-se que
nessa obrigação há um momento que define a execução da
mesma: a escolha, pois apenas com a mesma as partes sabem
80
exatamente que itens podem ser entregues e ocorre o
cumprimento da obrigação. Verifica-se a grande importância da
escolha, que acarreta a desnecessidade do devedor entregar
qualquer outro item diferente do escolhido, por exemplo, João
deve entregar a Paulo, uma caneta Paker, ou uma caneta
Montblanc, ocorrida a escolha basta a entrega do item escolhido
para as partes esquecerem a outra opção.
Este momento é conhecido como concentração,
justamente por conta do fato da indicação do bem a ser entregue
possibilitar que os demais itens listados sejam esquecidos pelos
sujeitos da relação. A parcela escolhida possibilita a concentração
de todas as possibilidades de parcelas em apenas uma, a que
deve ser entregue46.
O Código Civil retrata no art. 252 a questão supra
abordada, o caput do citado artigo expõe quem poderá escolher
a prestação a ser entregue e que representa a concentração. Neste
sentir o Código Civil brasileiro respeita a vontade das partes,
pois possibilita que estas estipulem quem realizará a escolha
da prestação, no entanto caso as mesmas se omitam,
silenciando-se sobre este tema, tal responsabilidade é depositada
sobre o devedor, que realizará a escolha da prestação a ser
entregue.

46
11670268 - PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. OBRIGAÇÃO
ALTERNATIVA. ESCOLHA DO CREDOR. INEXIQUIBILIDADE DA
PRESTAÇÃO ESCOLHIDA. INCIDÊNCIA DAS DISPOSIÇÕES DO ARTIGO
255 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 1. Nas obrigações alternativas a escolha
é a concentração da obrigação na prestação indicada, momento no qual torna-se simples,
pelo que, apenas a escolhida poderá ser reclamada. 2. Segundo dispõe o artigo 255 do
Código Civil, se a escolha couber ao credor e uma das prestações houver perecido,
pode escolher a outra ou optar pelo valor da perdida mais perdas e danos. 3. Devedor
de obrigação alternativa que grava com ônus reais imóvel que era objeto de possível
escolha pelo credor, sem adverti-lo de tal hipótese, torna viciosa escolha, mormente
quando não honrar a obrigação com credor hipotecário que, posteriormente, vem a
executar a garantia. Assim, concentrada a obrigação em prestação inexigível por culpa
do devedor, terá o credor o direito de exigir a prestação subsistente ou o valor da outra.
4. Recurso Especial conhecido e provido. (Superior Tribunal de Justiça STJ; REsp
1.074.323; Proc. 2008/0148009-7; SP; Quarta Turma; Rel. Min. João Otávio de
Noronha; Julg. 22/06/2010; DJE 28/10/2010) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/
Maio 2012.

81
3. Da impossibilidade de entrega por partes
Ao mesmo tempo a lei impõe outras regras com a
finalidade de dirimir possíveis controvérsias entre credor e
devedor. No parágrafo primeiro, do art. 252, verifica-se a
impossibilidade do devedor dividir as prestações e entregar parte
de cada uma das possibilidades apresentadas, como se fosse a
própria prestação da relação. Exemplificando, aquele devedor
submetido a uma obrigação alternativa na qual exista a opção
de entregar, ou 50 kg de arroz ou 30 kg de feijão, não poderá
obrigar seu credor receber metade de cada uma das possibilidades,
a forma de finalizar a presente obrigação será mediante a escolha
e entrega de um dos itens.
Importante lembrar que caso credor e devedor resolvam
transacionar e realizar um acordo mediante entrega de partes de
cada um dos itens, haverá entrega de prestação possível,
determinada e lícita, assim eles podem realizar este tipo de
acordo, caso não ocorra este entendimento é que segue a
necessidade da relação obrigacional ser resolvida mediante a
entrega na íntegra de uma das possibilidades apresentadas.

4. Das prestações periódicas e da pluralidade de optantes


Os demais parágrafos do art. 252, Código Civil, cuidam
das questões envolvendo a escolha, no parágrafo segundo impõe-
se que quando a obrigação for de prestações periódicas, a
faculdade de opção poderá ser exercida em cada período. Ou
seja, qualquer situação em que se envolva escolha em períodos
deve ser respeitado o direito de se exercer a escolha a cada ciclo,
bem leciona Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald47: “Portanto,
se couber ao credor A se defere a escolha mensal entre 1 kg de
arroz ou 1 kg de feijão, a cada mês poderá pleitear do devedor B
a entrega de uma opção nova”.
Agora, se em vez de haver um único optante (pluralidade
de devedores ou de credores) ocorrer a multiplicidade de sujeitos

47
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 240.

82
no polo, todos autorizados a realizar a escolha, tem-se um
potencial problema. Nem sempre estas pessoas podem coadunar
suas vontades. Exemplificando: dois irmãos arrendaram 10
hectares de pasto para Flávio e acordaram que mensalmente
Flávio fornecerá aos mesmos 250 Kg de carne ou R$ 3.000,00,
pode acontecer que em dado mês estes não concordem com a
parcela a ser entregue, neste caso decidirá o juiz, após o prazo
por este assinado para a deliberação.
Por fim, mais uma vez pode ser convocado um magistrado
para realizar a escolha, pois o Código Civil brasileiro possibilitou
que credor e devedor estipulem que um terceiro realize a escolha,
caso o terceiro não realize a escolha, por não querer ou não poder,
e as partes nada acordem sobre a prestação a ser recebida, o juiz
é quem terá de escolher o bem a ser entregue.

5. Da Inexecução e das perdas e danos


A obrigação alternativa, também, poderá ser atingida por
situações que impossibilitem seu curso natural, tem-se como
primeira situação a narrada no art. 253, do Código Civil, que
afirma: se “uma das duas prestações não puder ser objeto de
obrigação ou se tornada inexeqüível, subsistirá o débito quanto
à outra”. Na realidade o dispositivo traz uma conclusão lógica,
entre os itens que podem ser escolhidos se um não puder ser
objeto, este será excluído da relação e permanece apenas o que
sobrevive.
Importante verificar dois detalhes sobre este artigo, lógico
que a perda de uma possibilidade não pode ocorrer por culpa do
devedor, pois nesta situação ocorreria justamente situação a ser
estudada adiante. A segunda questão a ser levantada trata da
forma como o art. 253 dispõe sobre a existência da obrigação
alternativa. Ao expressar “se uma das duas prestações” o texto
legal pode levar a ideia de que este tipo de obrigação apenas
existiria mediante a apresentação de uma prestação a ser
escolhida entre dois itens. No entanto, na obrigação alternativa
os itens a serem apresentados podem ser muito mais do que
apenas dois, imagine a obrigação na qual Paulo se obriga entregar
83
a um aluno de sua turma de Direito das Obrigações um livro de
Orlando Gomes, ou um livro de Clóvis Beviláqua ou um livro
de Washington de Barros, claramente se tem uma obrigação
alternativa com mais de duas possibilidades de prestação. O texto
legal é impreciso, no entanto a doutrina e a jurisprudência
protegem a interpretação da possibilidade de não apenas duas
prestações, mas diversas.
Apresentada a questão de perda de prestações tem-se que
verificar as situações envolvendo culpa do devedor, como já
esboçado nas situações em que o devedor concorre para a perda
da prestação é gerado para o mesmo o ônus de ressarcir os
prejuízos causados pela perda. Em nada é diferente na obrigação
alternativa, há imposição de perdas e danos decorrente da perda
de prestação por culpa do devedor, no entanto deve ser observada
uma questão, de quem é a escolha?
Para determinar a resolução da obrigação alternativa, que
teve perda da prestação por culpa do devedor, deve-se saber a
quem caberia a escolha da prestação, pois o Código Civil
apresenta soluções diferentes para esta situação. O art. 254 diz
que nos casos em que cabe ao devedor escolher a prestação a ser
entregue e estas se perdem por culpa do devedor, este deverá
pagar o valor da que por último se perdeu mais perdas e danos,
se houver.
Seria a situação do vendedor de livros que realizou uma
transação com Nelson, nesta transação o vendedor ficou de
entregar um livro de matemática, ou um livro de física ou um
livro de português para Nelson. Sem lembrar a negociação, o
vendedor vende os três livros para outras pessoas, sendo que o
último a sair de sua loja foi o livro de português. Assim, o
vendedor de livros deverá pagar o valor deste livro de português,
mais as possíveis perdas e danos que Nelson tenha sofrido.
Agora, caso a escolha caiba ao credor tem-se:
Art. 255. Quando a escolha couber ao credor e uma
das prestações tornar-se impossível por culpa do
devedor, o credor terá direito de exigir a prestação
subsistente ou o valor da outra, com perdas e danos;

84
se, por culpa do devedor, ambas as prestações se
tornarem inexeqüíveis, poderá o credor reclamar o
valor de qualquer das duas, além da indenização por
perdas e danos.

Quando a escolha da prestação cabe ao credor têm-se


duas situações, a primeira envolve a perda parcial, apenas uma
ou algumas das prestações estão perdidas por culpa do devedor,
nesta situação o credor terá o direito de exigir a prestação
sobrevivente ou o valor da prestação que tiver se perdido, com
direito a reparação por perdas e danos.
No exemplo citado, caso o vendedor que se comprometera
a entregar um de três livros para Nelson, tenha vendido apenas
o livro de português. Restando os livros de matemática e de
física, será respeitado o direito de escolha do credor, que poderá
cobrar do devedor um dos livros sobreviventes ou o valor daquele
que o vendedor perdeu, mais as perdas e danos. E mais, caso
nesta obrigação alternativa (credor tem direito de escolha) todas
as prestações se perderem por culpa do devedor, terá o credor o
direito de exigir o valor de qualquer uma das prestações perdidas
mais perdas e danos.
Por fim, caso todas as prestações se perderem sem culpa
do devedor, a obrigação será extinta. Voltando ao exemplo do
vendedor e de Nelson, se ocorrer um incêndio antes da escolha,
ocasionado pela queda de um relâmpago, e todos os livros forem
perdidos neste incêndio, não há culpa do devedor. Neste caso, o
mesmo poderá entender extinta a relação obrigacional.

6. Das obrigações facultativas


Explicada a obrigação alternativa, necessário se faz
mostrar um tipo de obrigação muito semelhante a essa, que não
pode ser considerada da mesma espécie, vez que seu objeto tem
características próprias, esta é a obrigação facultativa.
É uma obrigação não codificada, que decorre diretamente
da vontade das partes, tendo ab initio única prestação, mas que
quando de seu cumprimento pode ocorrer a entrega de objeto
diferente do combinado. A obrigação facultativa é aquela que as
85
partes pactuam inicialmente determinada prestação, no entanto
pode o devedor dispor de outro item, não apresentado como
prestação para adimplir sua obrigação, inclusive sem a anuência
do credor, nas palavras de Bevilaqua48 o “devedor é obrigado a
cumprir uma certa prestação, mas se lhe concede a faculdade de
substituil-a por outra, egualmente indicada. Essa obrigação é
facultativa” (sic). Acrescenta Bittar49:
Diz-se facultativa a obrigação em que, apesar da
imprecisão terminológica, é permitido ao devedor
substituir a prestação devida por outra. Trata-se, pois,
de obrigação com uma só prestação, em que o devedor
goza da faculdade de substituí-la por outra; daí o nome
adequado da figura, ou seja, de obrigação com
faculdade alternativa, ou com faculdade de
substituição, que a doutrina lhe empresta (em razão
do caráter vinculativo da obrigação).

Tem-se, assim, um tipo de obrigação na qual é fornecida


uma possibilidade restrita e específica ao devedor. Neste tipo de
obrigação em nenhum momento pode o credor opinar sobre a
prestação facultativa (prestação oculta), a mesma é uma
faculdade dada ao devedor. Esta faculdade é simples, há uma
prestação previamente pactuada, caso o devedor não queira pagar
a prestação poderá entregar outro item.
Por exemplo, Leonardo, a fim de angariar fundos para a
festa de formatura, colocará uma barraca de venda de bebidas
em um festejo de sua cidade, recebeu da empresa de bebidas
1.500 latinhas de refrigerante, tendo que pagar a importância de
R$ 2.000,00 pelas latas. A firma de bebidas realiza esta venda
com cláusula de consignação. O credor (firma de bebidas) aguarda
uma única prestação os R$ 2.000,00, no entanto quando
Leonardo for cumprir a prestação, caso não tenha inteiramente
o valor, poderá devolver as latas de refrigerantes não consumidas,

48
BEVILAQUA, Clovis. Direito das Obrigações. 5 ed. Revista e accrescentada. 1940:
Freitas Bastos. Rio de Janeiro, p 88.
49
BITTAR, Carlos Alberto. Direito das obrigações. 2ed. Revista, atualizada e ampliada
de acordo com o novo Código Civil por BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Rio de
Janeiro: Forense universitária, 2004, p 69.

86
vez que pelo contrato ele tem direito a esta escolha, nada podendo
a firma alegar ou protestar, a faculdade de entregar a prestação
ou a opção é exclusiva de Leonardo. A venda em consignação,
ou contrato estimatório, está disposto no Código Civil:
Art. 534. Pelo contrato estimatório, o consignante
entrega bens móveis ao consignatário, que fica
autorizado a vendê-los, pagando àquele o preço
ajustado, salvo se preferir, no prazo estabelecido,
restituir-lhe a coisa consignada.

Esta não é uma obrigação alternativa, não são


apresentadas opções de escolha, há uma faculdade
disponibilizada única e exclusivamente ao devedor, o STJ impõe
que só na obrigação facultativa ocorre a possibilidade ao devedor,
veja:
PROMESSA DE VENDA E COMPRA.
VALIDADE E EFICÁCIA DA INTERPELAÇÃO
PRÉVIA. FACULDADE DE SUBSTITUIÇÃO.
INEXISTÊNCIA. MORA IMPUTÁVEL AOS
COMPROMISSÁRIOS-COMPRADORES.
- Hipótese em que não caracterizada a “obrigação
facultativa” ou a “faculdade de substituição”
(inviabilizada a primitiva prestação, seria dado ao
devedor oferecer uma outra em seu lugar).
- Manifestada a recusa do imóvel substitutivo
oferecido pelos compromissários-compradores, era
permitido à promitente-vendedora reclamar na
interpelação prévia o cumprimento da obrigação
principal ou o pagamento do saldo do preço.
- Ato interpelatório que alcançou a finalidade de
exortar o devedor em atraso, a fim de cumprir a sua
obrigação.
- Válida e eficaz a interpelação, a mora é imputável
aos compromissários-compradores.
- Tendo a autora decaído de parte do pedido, não se
podendo considerar como mínima a sucumbência,
aplicável é o art. 21, “caput”, do CPC.
Recurso especial conhecido, em parte, e provido
apenas para proporcionalizar as custas e reduzir a
verba advocatícia.

87
(REsp 59.498/RS, Rel. Ministro BARROS
MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 18/
11/1999, DJ 21/02/2000, p. 125) 50

Para a existência da obrigação facultativa, a jurisprudência


apresentou a sua principal característica a possibilidade de
substituição da prestação por outra, desde que fosse oferecida
esta oportunidade ao devedor, e apenas este poderia realizar esta
troca, não podendo a mesma ser feita ou impedida pelo credor.

Fonte:https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo
50

=&num_registro=199500030284&dt_ publicacao=21/02/2000, em 17/08/2012.

88
VII
DAS OBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS
E INDIVISÍVEIS

O presente estudo passa a tratar de outra obrigação em


que há importante relevância a pluralidade de um de seus
elementos, mas desta vez o parâmetro é o elemento subjetivo. As
lições, até o momento, se centraram na figura do objeto da relação
obrigacional, deixando em segundo plano os sujeitos envolvidos
no pacto, ocorre que quando se estuda as obrigações divisíveis e
indivisíveis, apesar de ser essencial caracterizar a divisibilidade
que envolve a prestação, verifica-se a necessidade de determinar a
pluralidade de sujeitos envolvidos na relação.
Uma relação em que exista apenas um credor e um devedor
para entrega de determinada prestação não gerará dúvidas sobre a
divisão ou não do bem, como existe um único credor apenas este
poderá receber a prestação e somente poderá exigir o cumprimento
do único devedor inserido na relação. Afirma Bevilaqua51:
A divisibilidade ou indivisibilidade das obrigações
só apparece, em toda luz, e só offerece interesse
juridico, havendo pluralidade de credores ou de
devedores. Havendo unidade, nem mais de um
devedor obrigado a sómente um credor, as obrigações
são, em regra, indivisiveis, porque nem o credor é
obrigado a receber pagamentos parciaes, nem o
devedor a fazel-os, salvo se outra coisa foi
estipulada.(sic)

Esta situação é justamente a antítese do que ocorre na


relação obrigacional simples, caso exista mais de um credor, podem
surgir diversas situações em que se impossibilitaria, inclusive, a

51
BEVILAQUA, Clovis. Direito das Obrigações. 5 ed. Revista e accrescentada. 1940:
Freitas Bastos. Rio de Janeiro, p 88.

89
entrega da prestação. São essas situações que o Código Civil centra
seus estudos quando trata da obrigação disposta neste capítulo.

1. Da prestação e de sua divisibilidade.


O Código Civil conceituou os bens divisíveis. Em suma,
são aqueles bens em que se pode dividi-los em fração menor
sem que os mesmos percam sua natureza. Situação na qual
alguém divide um saco de 50 kg de arroz com seus nove irmãos,
cada irmão será o feliz proprietário de 5 kg de um cereal que
continuará sendo arroz, apesar de sua nova apresentação em lotes
menores. Para Bevilaqua52:
A divisão jurídica suppõe que cada parte da divisão
constitue um todo, reproduzindo o inteiro dividido,
como: um terreno, que se separa em lotes; as coisas,
que se pesam, ou medem, as quaes, facilmente, se
dividem, a peso ou medida.(sic)

A divisibilidade da prestação, também, não geraria


grandes dificuldades às partes envolvidas na obrigação, vez que
a possibilidade de fracionar em porções menores, com certeza
facilita tanto o pagamento como a identificação dos credores
envolvidos na relação.
As dificuldades podem acontecer quando a prestação,
inserida em uma relação complexa com diversos credores ou
devedores, é indivisível. Primeiro é importante determinar o que
seria este bem indivisível, o Código Civil determinou os itens
divisíveis, logo se tem como indivisíveis todos e quaisquer bens
que seu fracionamento impõe a perda de suas características
iniciais ou de sua natureza.
Por exemplo, João se comprometesse a entregar um ar-
condicionado de 18.000 BTUs a Ricardo, Fábio e Stanley, não
poderia o devedor desmontar o citado aparelho e entregar o rotor
a Ricardo, a parte de fiação a Fábio e as demais peças a Stanley,

52
BEVILAQUA, Clovis. Codigo civil dos estados unidos do Brasil commentado por
Clovis Bevilaqua. Volume I. São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte: Livraria
Francisco Alves. 1927, p 275.

90
neste caso o bem perderia sua utilidade, logo esta prestação é
indivisível, não podendo ser fracionada.
O Código Civil ao tratar da obrigação indivisível estipula
as situações em que ocorre a indivisibilidade, veja o art. 258,
Código Civil, neste existe a estipulação de três situações nas
quais o objeto da prestação se não é, torna-se indivisível. Os
casos anteriormente expostos vislumbram justamente a primeira
situação, o objeto inserido na obrigação não pode ser dividido
sob pena de perder sua própria natureza.
A segunda situação, disposta no Código Civil, apresenta
o motivo de ordem econômica, por uma imposição e para evitar
prejuízos com o fracionamento da prestação a mesma é
considerada indivisível. Imagine a situação do diamante
conhecido como Grande Estrela da África, que possui 530,20
quilates, pertencente à Coroa Inglesa. Pensando hipoteticamente,
caso a Coroa Inglesa resolvesse vender o citado diamante a um
grupo internacional formado por 3 pessoas. Este diamante teria
o mesmo valor caso fosse quebrado em três pedaços e entregue
a cada um dos compradores?
A resposta logicamente é não, haveria grande perda de
valor e o mesmo deixaria de ser conhecido como um dos maiores
diamantes do mundo, a imposição de seu valor econômico o
mantém indivisível. E, por fim, a razão determinante do negócio
jurídico, que impõe indivisibilidade à prestação inserida em dada
obrigação. Segundo Coelho53:
Em decorrência do dispositivo legal, pode-se falar
em indivisibilidade material, econômica e jurídica.
[...]
Por fim, a indivisibilidade é jurídica quando a lei
impede a repartição. É o caso da prestação consistente
em entregar lotes de terreno com dimensões
correspondentes ao tamanho mínimo legal de 125
m². Como o art. 4º, II, da Lei n. 6.766/79 impede a
comercialização de lotes menores do que estes, a
prestação não comporta divisão.
53
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil obrigações; responsabilidade civil,
volume 2. 3 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, p 85/86.

91
Nesta obrigação indivisível as determinações legais
proíbem que um bem, mesmo que por sua natureza possa ser
dividido, o seja. Muito feliz o exemplo do menor lote permitido
para negociação. Apesar da terra poder ser dividida em frações
menores do que 125 m², a lei não permite que seja e os loteamento
urbanos só podem ter como menor lote os deste tamanho.

2. Da obrigação divisível
As obrigações em que há pluralidade em um ou nos dois
polos e que o objeto é um bem divisível não sofrem grandes
dificuldades para serem resolvidas, pelo menos não em
decorrência da entrega da prestação. A regra imposta pelo art.
257 simplesmente adota lógica, cada um deve ou tem direito à
porção ideal sobre a prestação, o citado artigo afirma: havendo
“mais de um devedor ou mais de um credor em obrigação
divisível, esta presume-se dividida em tantas obrigações, iguais
e distintas, quantos os credores ou devedores.”
Na obrigação divisível existe uma prestação que pode
ser dividida em frações menores sem perder sua natureza, e será
repartida entre aqueles que tiverem que recebê-la ou para quem
tiver que pagá-la. Assim, caso os advogados Caio, Cesar e Pompeu
tenham sidos contratados por Livius para emitirem um parecer
jurídico, e este contrato seja no importe de R$ 60.000,00
(sessenta mil reais), tem-se uma obrigação divisível, vez que não
há nenhuma convenção adicional sobre este contrato, o que gera
a cada um dos advogados o direito de exigir a sua porção ideal
sobre o valor devido, sendo a cota individual de cada um no
importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Importante resalvar que, caso os advogados tivessem a
formação de uma sociedade fática na qual Caio detém 50% dos
direitos, e os demais 25% cada, a divisão não seria em cotas iguais
e sim proporcionais a cada uma das cotas de participação. Assim,
as partes envolvidas em uma relação divisível deverão preocupar-
se apenas com a sua cota, vez que neste tipo de obrigação o limite
da responsabilidade do devedor sobre a prestação é imposto
justamente pelo valor de sua cota dentro da relação, desnecessário
92
lembrar que no caso de vários credores cada um pode exigir apenas
a cota que lhe cabe da prestação divisível.

3. Da obrigação indivisível
A obrigação indivisível é um tipo de obrigação complexa
na qual as partes envolvidas não têm a possibilidade de fracionar
a prestação, sendo mantida a união dos credores ou devedores
não por sua vontade, mas em decorrência do objeto não poder
ser fracionado e distribuído entre as partes envolvidas na relação.
Paulo Nader54 assim expõe:
Indivisível é a obrigação cujo objeto não comporta
separação em partes, sob pena de perda de qualidade
em relação ao todo ou porque, comportando, a sua
divisão foi excluída em lei ou por ato negocial. Assim,
a divisibilidade não depende apenas da natureza da
coisa ou fato, que podem ser objeto da prestação. Por
outro lado, há obrigação indivisível que, por morte
do credor ou do devedor, se faz divisível, quando
nada em fração ideal.

A existência dessa obrigação depende da pluralidade de


credores e/ou devedores e a indivisibilidade do bem utilizado
como prestação. Esta impossibilidade de divisibilidade da
prestação ocasiona a manutenção e proximidade entre os sujeitos
envolvidos na relação, gerando o direito a toda a parcela ou a
responsabilidade por toda a dívida, dependendo da posição em
que os sujeitos se encontrem.
O art. 259, Código Civil, afirma que caso exista dois ou
mais devedores e a prestação seja indivisível, cada um será
obrigado pela dívida toda. Esta regra impõe a ligação entre os
devedores incluídos na mesma relação obrigacional, veja a
situação de Steve e Bill, ambos foram contratados pelo escritório
Advogados Associados. A finalidade do contrato é fazer um
programa de acompanhamento de processos com acesso pela
internet e aberto a alguns clientes.

54
NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 2: obrigações. Rio de Janeiro:
Forense, 2008, p 114.

93
No contrato citado, o programa é uma prestação
indivisível, a ser entregue por ambos contratados, não podem
eles individualmente alegarem que só são responsáveis por parte
da obrigação. O escritório Advogados Associados possui o direito
de cobrar a entrega do programa de qualquer um dos dois
devedores, nesta situação Bill, Steve ou ambos serão cobrados e
possuem a obrigação de entregar o programa de informática
conforme combinado.
Bem explica Gama55:
Sem dúvida, trata-se de hipótese que favorece o
credor, eis que mesmo a insolvência de um dos
devedores não o impedirá de receber a totalidade de
qualquer um dos outros devedores. E, relativamente
ao devedor que efetuou o pagamento da prestação
integral, caso se verifique a insolvência de um dos
outros devedores, não poderá dividir a cota do
insolvente com o outro devedor solvente, assumindo
sozinho as conseqüências da insolvência de um dos
devedores.

Não restam dúvidas do ônus adicional do devedor solvente,


apesar de sozinho continua obrigado a cumprir a obrigação, inclusive
se responsabilizando pela parte do devedor que se ausenta ou se
torna inadimplente. A situação, apresentada pelo art. 259, impõe a
regra de que não interessa quem, mas um dos devedores inseridos
na relação responde integralmente pelo cumprimento da prestação.
No entanto, o devedor que paga a dívida sub-roga-se no direito de
credor em relação aos outros coobrigados, este devedor será investido
nos poderes do credor e exigirá o pagamento de uma cota parte
ideal dos demais devedores, como forma de evitar que seja
prejudicado por assumir isoladamente a prestação, surge a relação
interna da obrigação, observe a jurisprudência:
67035668 - CONDOMÍNIO. DESPESAS
CONDOMINIAIS. COBRANÇA.
LEGITIMIDADE PASSIVA. PROPRIETÁRIO.

55
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo:
Atlas, 2008, p 163.

94
CASAL SEPARADO. SOLIDARIEDADE.
RECONHECIMENTO. Na cobrança de despesas
condominiais vale a regra do artigo 891 do Código
Civil de 1916, correspondente ao artigo 259 do
Código Civil de 2002, ou seja, não sendo divisível a
prestação, cada um dos devedores (co-proprietários)
será obrigado pela dívida toda, resultando que, do
ponto de vista prático, estão eles sujeitos aos efeitos
da solidariedade passiva. (TACSP 2; Ap. s/ Rev.
661.846-00/3; Oitava Câmara; Rel. Juiz Orlando
Pistoresi; Julg. 31/07/2003) 56

A jurisprudência apresenta uma obrigação indivisível, o


condomínio não irá fracionar a parcela devida. Ex-marido e ex-
mulher estão obrigados por toda a prestação, agora, se a ex-
mulher realizar o pagamento desta parcela condominial, ela terá
o direito de cobrar o valor da parte que seria de responsabilidade
de seu ex-marido, neste caso 50% das prestações condominiais
devidas. A mesma atenção é dada aos credores envolvidos na
obrigação indivisível, este detém o direito de exigir a satisfação
integral da prestação. Qualquer um dos credores pode impor que
o devedor entregue o objeto diretamente.
O art. 260, Código Civil, impõe que havendo diversos
credores qualquer um deles pode exigir a dívida inteira, o que pode
acarretar complicações ao devedor. Ele poderá sofrer a cobrança da
prestação de qualquer um dos credores e pagando a um ele teria
que se proteger dos demais. A fim de evitar esta situação, o próprio
Código Civil no art. 260, por meio de seus incisos, fornece a forma
como o devedor pode agir, a primeira possibilidade é a entrega da
prestação a todos os credores conjuntamente, o devedor os chamaria
em data e local combinado e entregaria a prestação a todos no
mesmo momento, assim receberia a quitação, com a consequente
extinção da relação obrigacional.
Na segunda situação, imposta pelo Código Civil, tem-se
o caso em que um dos credores exige a prestação, ocorre que a
exigência por apenas um dos integrantes do polo ativo gera o

56
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

95
risco ao devedor de ter que arcar com possíveis prejuízos de
entregar o bem, caso os demais reivindiquem posteriormente a
prestação. Nesta situação, pode o devedor entregar a um dos
credores, deste que este forneça caução57 de ratificação, capaz
de garantir as partes dos demais credores.
A caução será uma garantia fornecida pelo credor, que
exigiu isoladamente o cumprimento da obrigação indivisível, a
finalidade da garantia é proteger o devedor contra os demais
credores, pois caso eles também exijam a prestação a caução
será utilizada para pagar as cotas de cada um.
O Código Civil impõe a divisibilidade em cotas ou frações
ideais a ser feita entre os credores, exemplificando: Vicente,
Barreto e Sérgio compraram um quadro de Inácio. Este quadro,
na data combinada foi entregue apenas a Vicente. Esta situação
seria injusta aos demais credores, pois não podem utilizar o bem,
assim neste tipo de obrigação é concedido o direito de exigir e
receber a sua cota ideal em dinheiro. No exemplo citado, caso o
valor do quadro seja na ordem de R$ 120.000,00, Barreto poderá
exigir R$ 40.000,00 de Vicente, assim como Sérgio poderá exigir
o mesmo valor, também de Vicente.
Bem explica Gagliano e Pamplona Filho58, in verbis:
Essa regra se justifica pelo fato de que a coligação
entre os credores decorreu da própria impossibilidade
de fracionamento da prestação, e, se assim foi, os
outros deverão se contentar com as suas parcelas em
dinheiro, caso hajam permanecido inertes, sem exigir
do devedor o cumprimento da sua obrigação. Aquele
que demandou o sujeito passivo terá, pois, o direito
de ficar com a coisa devida. É a solução mais razoável,
na falta de outra melhor.

57
Diz-se de garantia real ou fidejussória, do adimplemento de uma obrigação, ou da
responsabilidade resultante do exercício de certa função, ou profissão. É realizada por
penhora ou hipoteca, depósito de dinheiro ou de valores representados por títulos,
peças de metal nobre, etc. In NEVES, Iêdo Batista. Vocabulário prático de tecnologia
jurídica e de brocardos latinos. Rio de Janeiro: APM Editora, 1987.
58
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito
civil, volume 2: obrigações. 13 ed. Rev. Atual. e Ampl. São Paulo: Saraiva, 2012, p
127/128.

96
A forma de resolver a relação com diversos credores
ligados a uma única prestação, é a responsabilização daquele
que recebeu a prestação mediante o pagamento da cota parte,
em dinheiro, dos demais credores59.

4. Da remissão da prestação
E caso um dos credores, em um ato de amor ou piedade,
resolva perdoar a prestação do devedor? Como podem agir os
demais credores? Ocorre extinção da obrigação? O Código Civil
impõe:
Art. 262. Se um dos credores remitir a dívida, a
obrigação não ficará extinta para com os outros; mas
estes só a poderão exigir, descontada a quota do credor
remitente.
Parágrafo único. O mesmo critério se observará no
caso de transação, novação, compensação ou confusão.

Os credores detêm uma porção ideal sobre o todo, não


podendo dispor sobre as parcelas dos demais credores, assim se
cada um só pode dispor sobre sua parte não há possibilidade de
um perdão isolado da prestação integral, bem como caso ocorra
o citado perdão, não seria justo com o devedor exigir a prestação
sem o desconto do valor perdoado.
Para aplicar essa regra, lembre-se que sendo a prestação

59
JURISPRUDENCIA 48209235 - COBRANÇA. CORRETAGEM. DÍVIDA
DIVISÍVEL. PLURALIDADE DE CREDORES. QUANTIA PAGA A UM DELES.
DIREITO DO OUTRO CREDOR DE EXIGIR DAQUELE A PARTE QUE LHE
CABE NO TOTAL DO CRÉDITO. ARTIGO 261 DO CÓDIGO CIVIL. 1. Sendo a
dívida divisível (dívida em dinheiro), em que há pluralidade de credores, e a dívida foi
paga na totalidade a um deles, deve-se aplicar o artigo 261 do Código Civil, que
prescreve. “Art. 261. Se um dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos
outros assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que lhe cabia no total”. No
caso em apreço, o autor intermediou a permuta de imóveis juntamente com outra
imobiliária, sendo-lhes devida a corretagem estipulada no contrato, no valor de R$
20.000,00 (vinte mil reais) pro rata. No entanto, os réus pagaram a integralidade da
quantia à imobiliária. Assim, cumpre ao autor cobrar da imobiliária a parte que lhe
cabe, na forma do artigo 261 do Código Civil. 2. O artigo 260 do Código Civil se aplica
às obrigações indivisíveis. 3. Recurso conhecido e desprovido, para manter incólume
a r. sentença que julgou improcedente o pedido de cobrança formulado na inicial. (TJ-
DF; AC 2002.01.1.008225-8; Ac. 292177; Primeira Turma Cível; Rel. Des. Roberval
Casemiro Belinati; DJU 17/01/2008; Pág. 856)

97
divisível é suficiente a diminuição do valor da cota do credor
que a remiu, por exemplo, Raimundo e Nonato emprestaram
R$20.000,00 a Francisco. Este, um dia antes de pagar o
empréstimo, recebe o perdão da dívida por parte de Nonato,
assim Francisco mantém apenas a obrigação de pagar R$
10.000,00 a Raimundo.
Na obrigação divisível cada um dos credores apenas pode
dispor sobre sua cota parte do todo, não podendo exigir a dívida
completamente ou mesmo perdoá-la desta forma, desde que seja
uma obrigação divisível pura. O mesmo não pode se esperar
caso a prestação seja indivisível, a situação da prestação e sua
cota interna entre os credores, muda drasticamente.
Na obrigação indivisível a solução do questionamento
será dada pela vantagem a ser recebida pelo devedor, voltando
ao exemplo do quadro (valor de R$ 120.000,00) que Vicente,
Barreto e Sérgio compraram de Inácio. A prestação é indivisível,
caso Sérgio queira simplesmente se retirar desta sociedade e
resolva remir (perdoar) a prestação de Inácio, o devedor deverá
usufrui os efeitos deste perdão. Vicente e Barreto cobrarão o
quadro de Inácio, para tanto deverão reembolsar ao devedor os
valores referentes ao que seria a parte de Sérgio, a importância
de R$ 40.000,00. Esta situação pode gerar dúvidas, vez que onera
aos demais credores, mas para ocorrer a real vantagem e o perdão
surtir efeito a doutrina tem entendido desta forma, veja
Gonçalves60:
Como é impossível fazer a dedução dessa parte in
natura, na hipótese de obrigação indivisível, a solução
plausível é que se faça a dedução por equivalente, ou
seja, estimando-se em dinheiro o valor do crédito e
determinando-se, em seguida, a fração do crédito do
remitente. O devedor, então, acionado pela totalidade
da obrigação, tem direito, como sub-rogado do
remitente, ao embolso da quantia a este originalmente
devida.

60
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 125.

98
E complementa Silvio Venosa61:
Se for indivisível, e sendo vários os credores, a relação
não se extingue pela remissão feita por um deles, e os
demais credores têm o direito de exigir o pagamento,
restituindo, em dinheiro, ao devedor, a cota
correspondente ao credor remitente. Tome-se como
exemplo três credores de um apartamento, em que
um deles remite a dívida. O apartamento pode ser
exigido pelos outros dois, que devem reembolsar ao
devedor o equivalente a 33,33% do valor do
apartamento, por ser esta a parte do credor remitente.

A conduta imposta, aos demais credores, de ter de pagar


a cota do credor que perdoou sua parte pode gerar estranheza,
mas veja que em todos os exemplos apresentados o devedor
recebe o perdão da terça parte da prestação que deve entregar,
esta parte da prestação deve ficar com ele, pois tornou-se sua
propriedade, assim para os demais credores exigirem todo o bem
indivisível deverão reembolsar ao devedor por esta terça parte
dos exemplos, ou qualquer que seja a parte em outras situações.
Ademais, o parágrafo único do art. 262 impõe que mesma
sorte terão os demais credores envoltos em uma obrigação indivisível
que um destes resolva realizar transação, novação, compensação
ou confusão, sendo que estes institutos são formas especiais de
pagamento a serem estudadas posteriormente nesta obra.

5. Da perda da prestação e suas consequências


A obrigação divisível não gerará grandes dificuldades para
seu encerramento, vez que havendo perda da prestação com culpa
ocorrerá a divisão das perdas e danos entre seus membros. Por
exemplo, se três agricultores têm contrato para entrega de 300
kg de bacuris ao Supermercado Barato é Aqui, e antes da entrega,
em decorrência dos três não terem armazenado corretamente os
bacuris, os 300 kg se estragarem, as perdas e danos resultantes

61
VENOSA, Silvio. In TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES,
Maria Celina Bodin de. Código civil interpretado conforme a Constituição da República.
2 ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p 545.

99
do prejuízo serão cobradas dos três agricultores, com a
responsabilidade individual de cada de 1/3.
Na obrigação indivisível também ocorrerá a necessidade
de reparar as perdas e danos quando há culpa pela perda da
prestação, mas antes da reparação se observa uma transformação,
o que era indivisível se torna divisível. O Código Civil impõe
que perde a qualidade de indivisível a obrigação que se resolver
em perdas e danos (art. 263), naturalmente que ocorrendo a perda
da prestação indivisível, os credores terão o direito a serem
indenizados, tanto pela parcela devida (referente a própria
prestação), como por eventuais perdas e danos decorrentes da
perda.
O Código, ao retratar esta situação, não se preocupou em
relatar como seria a sorte de eventual pluralidade de credores,
vez que por aguardar a prestação e esta se transformar em
divisível, cada um receberá a cota ideal de direito. O Código
Civil cuidou do que ocorre com os devedores inseridos neste
tipo de relação.
Os parágrafos do art. 263, Código Civil, impõem uma
regra simples e justa, deve ser identificado o culpado. Se houver
culpa de todos os devedores, estes responderão por partes iguais,
caso a culpa seja apenas de um, ficarão exonerados os outros,
respondendo só esse pelas perdas e danos. Aqui pode surgir uma
dúvida sobre a própria prestação a ser paga, veja que a imposição
legal trata da culpa e da identificação de quem pagará as perdas
e danos, mas a lei não fala da questão da própria prestação, só
afirma quem pagará as perdas e danos, a fim de sanar esta dúvida
veja Azevedo62:
Entretanto, a culpa é meramente pessoal,
respondendo por perdas e danos só o culpado, daí o
preceito do art. 895, que trata da perda da
indivisibilidade das obrigações deste tipo, que se
resolvem em perdas e danos, mencionando que, se

62
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de direito civil: teoria geral das obrigações. 5 ed,
rev e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1990, p 96.

100
todos os devedores se houverem com culpa, todos
responderão em partes iguais(§ 1.º) e que, se só um
for culpado, só ele ficará responsável pelo prejuízo,
restando dessa responsabilidade exonerados os
demais, não culpados. Veja-se, bem! Exonerados, tão
somente, das perdas e danos, não do pagamento de
suas cotas. 63

Azevedo esclarece a situação, havendo perda de prestação


indivisível com culpa, em uma relação obrigacional indivisível,
o culpado pela perda responde sozinho pelas perdas e danos
provocadas por seu ato, quanto ao valor a ser ressarcido que
representa o bem perdido todos os demais devedores responderão
por suas cotas ideais.

63
Código Civil de 1916 (correspondente ao art. 263, Código Civil de 2002):
Art. 895. Perde a qualidade de indivisível a obrigação que se resolver em perdas e
danos.
§ 1º Se, para esse efeito, houver culpa de todos os devedores, responderão todos por
partes iguais.
§ 2º Se for de um só a culpa, ficarão exonerados os outros, respondendo só esse pelas
perdas e danos.

101
VIII
DAS OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS

1. Noções gerais
Apresenta-se por este tipo de obrigação uma relação na
qual a pluralidade de sujeitos é exigência para a existência da
mesma, nesta obrigação existem diversos credores e/ou diversos
devedores, mas a forma de cobrar a prestação não é dividida
como na obrigação divisível, ou pode se torna divisível como na
indivisível, o que se tem é justamente a possibilidade de qualquer
credor poder cobrar qualquer dos devedores a prestação
integralmente, mesmo que a mesma seja divisível. Bem afirma
Orlando Gomes64
Quando na mesma obrigação concorre mais de um
credor, ou mais de um devedor, cada um com direito,
ou obrigação, à dívida toda, há solidariedade. Se o
concurso é de vários credores, há solidariedade ativa,
se de devedores, solidariedade passiva.

Veja também Barros65:


A solidariedade apenas surge quando, existindo
pluralidade de credores, ou de devedores, pode
qualquer daqueles exigir a prestação total, como se
fora único credor, ou pode qualquer destes ser
compelido a solver a dívida toda, como se fora único
devedor.

Assim, visualiza-se um tipo de obrigação em que no


mesmo polo há pluralidade de sujeitos, gerando a solidariedade
ativa, quando diversos os credores, ou a solidariedade passiva,

64
GOMES, Orlando. Obrigações. 8 ed. 3ª tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p
74.
65
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, volume 5, direito das
obrigações – 1ª parte. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p 145.

103
quando diversos devedores, mas não basta a pluralidade para
configurar este tipo de obrigação, seu grande diferencial se
encontra justamente no fato da prestação poder ser cobrada
integralmente por qualquer um dos credores, ou o dever de
qualquer um dos devedores de pagá-la integralmente.
Esta junção de credores ou devedores fortalece a relação
obrigacional, sendo capaz de gerar vantagens para ambas as partes.
A possibilidade de receber a prestação com certeza aumenta quando
se tem à disposição, no polo passivo, diversos devedores capazes
de pagar integralmente o objeto da obrigação. Não bastasse esta
vantagem, ao credor, os próprios devedores inseridos em uma
relação solidária têm o aumento das possibilidades de linhas de
crédito o que melhora suas chances de adquirir produtos no mercado.
Por exemplo, as firmas Eletro & Cia e Junior Sat resolvem
importar mercadorias de uma fábrica na China, no entanto
individualmente as mesmas não possuem o capital exigido pela
fábrica chinesa. Assim, as firmas brasileiras firmam pacto em
que comprarão e serão devedoras solidárias da fábrica chinesa,
só podendo realizar este contrato por conta de assumirem a
posição conjunta de devedoras.
As vantagens e imposições legais não se restringem aos
casos apresentados, as situações envolvendo a solidariedade terão
influência em diversos campos do Direito, tais como
Administrativo, Tributário e Consumidor. Comece pelo Direito
Administrativo, a Constituição Federal impõe:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[...]
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de
direito privado prestadoras de serviços públicos
responderão pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito
de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou
culpa. (grifo nosso)

104
Vê-se que o parágrafo impõe uma regra de solidariedade
entre a administração e seus prestadores de serviço, de forma que
se utiliza deste instituto como forma de proteger aos particulares,
bem como aumentar a possibilidade dos mesmos virem a ser
realmente indenizados por danos causados pelos agentes da
administração ou seus prestadores. No Direito Tributário:
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos
créditos correspondentes a obrigações tributárias
resultantes de atos praticados com excesso de poderes
ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
I - as pessoas referidas no artigo anterior;
II - os mandatários, prepostos e empregados;
III - os diretores, gerentes ou representantes de
pessoas jurídicas de direito privado.

A legislação tributária impõe regras de solidariedade entre


a firma devedora de impostos e os seus responsáveis, o que
possibilita melhores chances aos órgãos fazendários de receberem
os tributos devidos. Outro importante exemplo, desta feita no
Código do Consumidor:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor,
nacional ou estrangeiro, e o importador respondem,
independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos decorrentes de projeto, fabricação,
construção, montagem, fórmulas, manipulação,
apresentação ou acondicionamento de seus produtos,
bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua utilização e riscos. (grifo nosso)

A solidariedade é importantíssima nas relações de


consumo, pois aumenta as possibilidades do consumidor lesado
vislumbrar, realmente, a devida reparação por quaisquer defeitos
dos produtos adquiridos e que tenham qualquer vício ou defeito.
Diversos são os exemplos de solidariedade na legislação
pátria, não havendo necessidade de expor todos, mas apenas para
encerrar, já de volta ao Direito Civil, veja dispositivo do Código
Civil que trata da Responsabilidade Civil:

105
Art. 932. São também responsáveis pela reparação
civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob
sua autoridade e em sua companhia;
II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados,
que se acharem nas mesmas condições;
III - o empregador ou comitente, por seus
empregados, serviçais e prepostos, no exercício do
trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou
estabelecimentos onde se albergue por dinheiro,
mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes,
moradores e educandos;
V - os que gratuitamente houverem participado nos
produtos do crime, até a concorrente quantia.

Note a importância e a relevância da solidariedade e como


a mesma faz parte do dia a dia da sociedade. Em todos os
exemplos demonstra-se como se constitui a solidariedade, a regra
básica é expressa no art. 264, Código Civil, que diz haver
“solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de
um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou
obrigado, à dívida toda”, simplificando: todos pelo todo, essa é
a base de qualquer relação solidária.
Essa é a principal característica da obrigação solidária,
no entanto lembre que sua fonte é a lei, o art. 265, Código Civil,
afirma que a solidariedade não se presume, resulta da lei ou da
vontade das partes. Logo não se pode, por conta do tipo de
prestação imposta no contrato, subentender que a obrigação é
solidária, necessário se faz a interação das partes ou a imposição
legal, a fim de que se constitua uma relação solidária, veja o
entendimento jurisprudencial:
49161603 - APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS
MONITÓRIOS. LEGITIMIDADE AD CAUSAM.
OS SÓCIOS EM EMPRESA CONSTITUÍDA NO
MODELO DA RESPONSABILIDADE
LIMITADA NÃO RESPONDEM
SOLIDARIAMENTE PELAS DÍVIDAS DA
EMPRESA. CONTRATO DE ABERTURA DE
CONTA-CORRENTE. DOCUMENTOS
106
APRESENTADOS SUFICIENTES PARA
INSTRUÇÃO DA AÇÃO MONITÓRIA. FICHA
PROPOSTA E CARTÃO DE ASSINATURAS
PROVAM A EXISTÊNCIA DA RELAÇÃO
JURÍDICA. AUSÊNCIA DE PROVAS NOS
EMBARGOS MONITÓRIOS A DEMONSTRAR
A IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1) A
responsabilidade solidária não se presume, devendo
resultar da vontade das partes contratantes ou da Lei
(artigos 264 e 265 do Código Civil de 2002). Se, do
contrato de abertura de conta-corrente em nome de
empresa constituída como sociedade de
responsabilidade limitada, não há qualquer
indicativo expresso do aspecto volitivo quanto à
solidariedade da responsabilidade ali assumida, esta
não se presume. da Lei também não decorreria tal
solidariedade, uma vez que os sócios na sociedade de
responsabilidade limitada respondem apenas pelo
valor de suas quotas. Assim, são ilegítimos para
figurar no pólo passivo de ação monitória que
pretende a obtenção de crédito constituído contra a
empresa, os sócios desta. 2) a ação monitória não
exije do demandante a demonstração de crédito certo
e líquido, bastando que o conjunto probatório levado
aos autos convença o juiz, em cognição sumária, da
verossimilhança das afirmações do demandante. A
Súmula nº 247 do STJ já admitiu que o contrato de
abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado
do demonstrativo de débito, constitui documento
hábil para o ajuizamento da ação monitória. Na
ausência do contrato, a ficha-proposta e o cartão de
assinaturas são suficientes para provar a existência
da relação. Precedentes do STJ. 3) cabe ao devedor,
em embargos monitórios, demonstrar, inclusive por
meio de provas e por dados objetivos, a validade de
suas alegações. A mera alegação não é suficiente para
invalidar o mandado monitório. 4) recurso
parcialmente provido. (TJ-ES; AC 11119002852;
Terceira Câmara Cível; Relª Desª Eliana Junqueira
Munhos Ferreira; DJES 03/10/2011; Pág. 32)66
(grifo nosso)
66
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

107
A jurisprudência expõe a imposição legal segundo a qual
não se presume a solidariedade, a mesma deve ser expressa. Surgindo,
assim, por imposição de algum dispositivo legal (como tantos
transcritos anteriormente) ou por expressa vontade das partes.
Respeitada a questão da fonte da obrigação, o Código Civil
passa a tratar dos elementos acidentais da obrigação, a lei impõe
que a “obrigação solidária pode ser pura e simples para um dos
co-credores ou co-devedores, e condicional, ou a prazo, ou pagável
em lugar diferente, para o outro”(art. 266). Veja que o dispositivo
legal possibilita que no mesmo vínculo obrigacional se observe
um devedor submetido ao cumprimento da prestação, enquanto
outro devedor só poderia ser cobrado quando do implemento de
determinada condição. Coelho67, neste sentido, exemplifica:
Assim, Antonio e Benedito podem ser devedores
solidários de Carlos, prevendo o contrato, entretanto,
que a obrigação de Antonio é pura e simples e a de
Benedito, sujeita ao implemento de certa condição
suspensiva. Neste caso, enquanto não verificada a
condição prevista no instrumento contratual, Carlos
só poderá exigir o cumprimento da obrigação de
Antonio, malgrado a solidariedade. Uma vez
implementada a condição, poderá escolher qualquer
um dos co-devedores solidários.

O texto demonstra a liberdade existente nos contratos,


pela qual na constituição da relação solidária há o direito de impor
diferentes formas e condições a cada um dos devedores
envolvidos na relação, todos serão obrigados pelo todo, no entanto
aqueles submetidos às condições ou casuística próprias só
poderão ser cobrados tendo ocorrido as mesmas.

2. Da solidariedade ativa
2.1 Noções gerais
Ante as noções apresentadas sabe-se que este tipo de
solidariedade será aquela em que há a pluralidade dos credores

67
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil obrigações; responsabilidade civil.
Volume 2. 3 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, p 88.

108
envolvidos na relação obrigacional, em tal panorama qualquer
um dos citados credores (sujeitos do polo ativo) terá o direito de
exigir o inteiro cumprimento da prestação. O devedor só terá
um caminho a seguir, cumprir a relação obrigacional. Realizando
a entrega da prestação, ele estará quitando a obrigação, não
podendo ser chamado pelos demais credores. Bem conceitua
Gonçalves68:
Na solidariedade ativa concorrem, assim, dois ou
mais credores, podendo qualquer deles receber
integralmente a prestação devida. O devedor libera-
se pagando a qualquer dos credores, que, por sua vez,
pagará aos demais a quota de cada um.

Esta obrigação é voltada para o polo ativo da relação, e


seu estudo é centrado no relacionamento entre os credores e a
possibilidade de qualquer destes receber integralmente a
prestação. Verifica-se o que a maior parte da doutrina critica, há
grande risco aos credores neste tipo de obrigação, à medida que
não há garantias no sentido de que quem recebeu irá realizar o
pagamento das cotas internas de cada um dos outros credores,
Farias e Rosenvald69 afirmam:
É instituto de reduzida repercussão no tráfego
jurídico, pelo risco de os co-credores não obterem
ressarcimento daquele que recebeu o pagamento, seja
por incorrer em insolvência ou simples desonestidade.
Muitos credores optam pela outorga de mandato, eis
que os mandatários agem em nome alheio e em
caráter revogável.

Ao tempo em que Farias e Rosenvald citam esta questão


da reduzida repercussão deste tipo de obrigação, citam, também,
vantagens para este tipo de obrigação, sobretudo para o devedor.
Os mestres exploram a seguinte situação, na relação indivisível
são impostas as formas do devedor adimplir sua prestação,

68
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 139.
69
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4 ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 253.

109
conforme o art. 260, Código Civil. Naquela situação, o devedor
muitas vezes não encontra a paz que busca com o cumprimento
da prestação, na realidade ele pode adentrar em um conflito maior
apenas por ter pago a um único credor, entre tantos outros
existentes.
Na relação solidária este cenário sofre grande alteração,
o devedor não fica preso a uma declaração conjunta de quitação
de seus credores, o ato de quitação pode ser dado individualmente
por qualquer dos credores. A divisão da prestação entre os
credores fica integralmente a cargo destes, nada mais restando
contra o devedor. Assim, a obrigação solidária ativa será capaz
de fornecer vantagem ao devedor.
O aspecto legal dessa questão é verificado na combinação
de dois artigos, veja o que diz o art. 267, Código Civil: cada “um
dos credores solidários tem direito a exigir do devedor o
cumprimento da prestação por inteiro”. Este dispositivo é um
pouco vago quanto à segurança do devedor, mas tal situação se
complementa pelo art. 268, Código Civil, que afirma que
enquanto “alguns dos credores solidários não demandarem o
devedor comum, a qualquer daqueles poderá este pagar”, a
combinação dos artigos impõe justamente a regra
supramencionada, segundo a qual o devedor tem a liberdade de
pagar a qualquer um dos credores solidários e obter a quitação
da obrigação.
Importante ressalvar, esta liberdade só existe até o
momento em que não houve atividade de cobrança por algum
dos credores, caso um credor solidário tome a iniciativa e exija a
satisfação do crédito, antes dos demais, o devedor deve se
submeter à vontade daquele que “não dormiu” e agiu com o
ímpeto de proteger seu direito, conforme o brocardo dormientibus
non sucurrit jus70.

70
Significa: “O direito não socorre a quem dorme”, In: NEVES, Iêdo Batista. Vocabulário
prático de tecnologia jurídica e de brocardos latinos. Rio de Janeiro: APM Editora,
1987.

110
Bem explica a jurisprudência:
53190372 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE
INDENIZAÇÃO. CREDORES SOLIDÁRIOS.
PAGAMENTO INTEGRAL REALIZADO A UM
DELES EXTINÇÃO DA DÍVIDA EM RELAÇÃO
AOS DEMAIS. SOLIDARIEDADE
COMPROVADA PELO CONTRATO FIRMADO
ENTRE AS PARTES. NEGADO PROVIMENTO
AO RECURSO. 1. Nos termos dos artigos 268 e 269
do Código Civil, havendo pluralidade de credores, o
devedor poderá promover ao pagamento a apenas um
deles, desobrigando-se em relação a todos caso seja
no valor integral da dívida. Dessa forma, nenhum
credor poderá exigir do devedor pagamento, ainda
que na proporção de sua quota, eis que se extinguiu a
obrigação. 2. A solidariedade não se presume, resulta
da Lei ou da vontade das partes. Tendo os credores
firmado contrato de compra e venda de equipamentos
em parceria, evidenciada a solidariedade, razão pela
qual o pagamento integral da dívida oriunda da
penhora dos bens, realizado a um deles, desobriga o
vendedor/devedor em relação ao outro. (TJ-MS; AC-
Or 2011.015519-6/0000-00; Campo Grande;
Terceira Turma Cível; Rel. Des. Fernando Mauro
Moreira Marinho; DJEMS 13/09/2011; Pág. 20)71

O devedor tem o direito de escolher a quem pagar,


obtendo do credor escolhido a devida quitação pela dívida, no
entanto se qualquer um dos credores exigir judicialmente a
prestação, estaria o devedor submetido à vontade do credor que
o demandou, bem explica Caio Mário72:
Uma vez iniciada a demanda, opera-se o que se
denomina prevenção judicial: o devedor somente se
libera pagando ao credor que o acionou; não tem mais
a faculdade de pagar senão a ele, ao contrário do que
ocorria até o momento da instauração da instância,

71
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
72
Pereira, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil. Volume II. Teoria Geral
das Obrigações. 22 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p 89.

111
quando era lícito prestar a qualquer (Código Civil de
2002, art. 268). Falando-se em demanda, exclui-se
toda medida preventiva ou preparatória de ação, como
hábil a gerar a prevenção judicial.

A lei estabelece o direito do devedor, no entanto o fato


de um dos credores propor ação para exigir o pagamento da
prestação, impõe ao sujeito passivo o dever de cumprir a
prestação perante o credor que primeiro exigiu o pagamento.
Caio Mário chama atenção que não são meros atos preparatórios
capazes de impor a ordem legal ao devedor, mas sim
procedimentos judiciais realizados pelo credor com a clara
intenção de exigir o cumprimento da obrigação.
Ademais, o art. 269, Código Civil, complementa a questão
envolvendo o pagamento da prestação a um dos credores, vez
que este dispositivo afirma que o pagamento feito a um dos
credores solidários extingue a dívida até o montante do que foi
pago. A lei oferece atenção ao pagamento parcial de relação
solidária, caso ocorra este tipo de pagamento, a relação solidária
é mantida, sendo obrigatória a diminuição do valor recebido sobre
a prestação devida.
Oportuno mencionar, mesmo que o credor solidário tenha
recebido parte do pagamento, ele continua com o direito de
receber o restante devido. Por exemplo: Flávio, Octávio e Ricardo
são credores solidários de Antônio, da importância de R$
30.000,00, Antônio ao ser cobrado por Ricardo paga a este a
importância de R$ 10.000,00. A relação solidária continuará a
existir, vez que não houve quitação da mesma, apenas pagamento
parcial. A prestação da relação passa a ser de apenas R$
20.000,00, e Ricardo, por ser credor solidário, continua com o
direito de receber o restante devido.

2.2 Posição do herdeiro de credor solidário


Das incertezas da vida, a maior certeza é a morte. Caso
um dos credores solidários venha a óbito, a posição dos seus
herdeiros e se os mesmos podem ser inseridos na relação solidária
é um problema a ser apreciado. O art. 270, Código Civil, afirma
112
que se um dos credores solidários falecer deixando herdeiros,
cada um destes só terá direito a exigir e receber a quota do crédito
que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação
for indivisível.
A lei impõe que os herdeiros, que atuem individualmente
para cobrar a dívida (direito do falecido), só teriam o direito de
cobrar o valor do que seria transferido como herança para ambos.
No exemplo supramencionado em que Flávio, Octávio e Ricardo
são credores solidários de Antônio, da importância de R$
30.000,00. Caso Flávio faleça e deixe dois filhos, o Júnior e o
Filho, nenhum destes poderia individualmente interferir na relação
solidária, como se estivesse ocupando o lugar do falecido. O
direito que assiste a ambos é o de cobrar do devedor apenas a
cota hereditária de cada um, neste caso R$ 5.000,00 (a cota do
pai na relação solidária era de R$ 10.000,00).
Esta regra do Código Civil pode sofrer exceções, veja o
que afirma Gonçalves73:
Assim não acontecerá, todavia, nas hipóteses
seguintes: a) se o credor falecido só deixou um
herdeiro; b) se todos os herdeiros agem
conjuntamente; c) se indivisível a prestação. Em
qualquer desses casos, pode ser reclamada a prestação
por inteiro.

Na primeira situação transcrita só existe um herdeiro, isto


facilita o cálculo e a transferência da herança, pois este passa a
dispor dos direitos do falecido, sem a necessidade de dividi-los
com ninguém, o que permitiria a manutenção da solidariedade
em relação ao único herdeiro.
Parecida situação se vislumbra quando o falecido deixa
diversos herdeiros e estes atuam em um grupo único, sem pedidos
individuais ou isolados. Neste caso, os herdeiros agem
conjuntamente, possibilitando a cobrança como se fosse o próprio
devedor solidário da relação, normalmente esta situação ocorre

73
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 145.

113
quando o processo de inventário está em andamento, e ainda
não foi realizada a partilha de bens.
Por fim, sendo a prestação devida um bem indivisível é
impossível o devedor dividir a prestação em cotas e entregar a
cota hereditária para os herdeiros, logo eles podem exigir a entrega
da prestação por inteiro, o que farão amparados no próprio
Código Civil (art. 270, in fine).

2.3 Perda da prestação


Outra questão importante, apresentada pelo Código Civil,
trata da manutenção da solidariedade quando ocorre perda da
prestação, neste caso, conforme art. 271, a prestação se converte
em perdas e danos, no entanto, apesar da conversão da prestação
a obrigação continua sendo solidária.
Imagine a situação de Douglas e Marcos, que compraram
do Haras Brasil um cavalo, o contrato entre estes impôs regras
de solidariedade. No entanto, antes da entrega da prestação, um
funcionário do Haras deu veneno para o cavalo, tendo o
semovente morrido por conta desta conduta. A prestação
indivisível será convertida em perdas e danos, o valor dado ao
cavalo é de R$ 50.000,00, como é mantida a solidariedade,
qualquer um dos credores terá o direito de exigir a entrega dos
R$ 50.000,00.
A manutenção da relação com as qualidades de uma
relação solidária implica a conservação de todos os direitos
inerentes à solidariedade, sobretudo o direito de exigir o
cumprimento da prestação em sua integralidade, mesmo que
convertida em perdas e danos.

2.4 Da relação interna


A solidariedade apresenta duas relações dentro da mesma
obrigação, uma externa e outra interna. A externa trata da relação
entre o devedor e os credores, efetivado o pagamento esta é
extinta, restando resolver o rateio de direitos entre os credores,
este acerto entre os credores é denominado de relação interna.
O art. 272, Código Civil, apresenta a relação interna da obrigação
114
solidária, impondo a responsabilidade do credor que tiver
recebido a prestação para com os demais credores, estes podem
cobrar do primeiro suas cotas internas da solidariedade. Diz o
citado artigo que o credor que tiver remitido a dívida ou recebido
o pagamento responderá aos outros pela parte que lhes caiba74.
Os valores recebidos, por um dos credores solidários,
serão devidamente apresentados aos demais credores, devendo
aquele que recebeu a prestação responder aos demais por sua
cotas individuais. Por exemplo, caso 3 credores solidários
aguardem o pagamento de R$30.000,00 do devedor, este
realizando o pagamento para o credor 1, tem-se a extinção da
relação obrigacional com o devedor. Restando a resolução da
relação interna, na qual o credor 1, transforma-se em devedor
do credor 2 e do credor 3, da importância de R$ 10.000,00,
para cada um.
A responsabilidade do credor solidário não se resume à
situação envolvendo o pagamento e rateio do valor ou do bem
recebido, um dos credores pode remir a dívida, perdoando o
devedor do pagamento e extinguindo a relação obrigacional.
Nesta situação, o credor que remir terá o dever de responder aos
demais credores solidários, assim como o que recebeu deverá
74
48178061 - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANCA. SEGURO
OBRIGATÓRIO. DPVAT. ILEGITIMIDADE ATIVA. PRELIMINAR REJEITADA.
ACIDENTE DE TRÂNSITO COM EVENTO MORTE. DIREITO AO
RECEBIMENTO DA DIFERENÇA. SALÁRIO MÍNIMO COMO CRITÉRIO DE
CÁLCULO. RESOLUÇÕES DO CNSP. CORREÇÃO MONETÁRIA. 1. Não há
que se falar em ilegitimidade ativa ad causam se o pleito de indenização do
seguro obrigatório (DPVAT) é formulado apenas pela mãe da vítima, ainda
que o pai seja também beneficiário, uma vez que, em se tratando esses dois
beneficiários de credores solidários da seguradora, cada um pode exigir o
cumprimento da prestação por inteiro, e, uma vez recebido o pagamento,
responderá ao outro pela parte que lhe caiba (artigos 267 e 272 do CC/02). 2.
Possibilidade de vinculação do salário mínimo como critério de cálculo do valor da
indenização e não como fator de correção. O art. 3º da Lei nº 6.194/74, que estabelece
o critério de fixação de indenização em salários mínimos, não foi revogado pelas Leis
nºs 6.205/75 e 6.423/77, pelo que se afasta a aplicação das resoluções do CNSP
quando contrárias à legislação. 3. Constatando-se a diferença entre o valor efetivamente
pago e o montante legalmente devido, merece ser acolhido o pedido de pagamento de
tal diferença relativa à indenização do seguro DPVAT, em decorrência do evento
morte. 4. Recurso conhecido e improvido. (TJ-DF; AC 2006.03.1.015428-9; Ac.
260938; Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais; Rel. Juiz Silva Lemos; DJU
07/12/2006; Pág. 247) Fonte: DVD Magister. (grifo nosso)

115
pagar ao demais credores o valor de suas cotas. Bem explicam
Gagliano e Pamplona Filho75:
Nesse caso, assim ocorre quando recebe o pagamento,
o credor remitente (que perdoou) responderá perante
os demais credores pela parte que lhes caiba.
Exemplificando: A, B e C são credores solidários de
D. C perdoou toda a dívida de R$ 300.000,00. De tal
forma, não havendo participado da remissão, os outros
credores poderão exigir daquele que perdoou (C) as
quotas-partes que lhes caibam (R$ 100.000,00 para
A e R$ 100.000,00 para B).

O credor de bom coração, que tenha resolvido perdoar a


dívida, poderá fazê-lo vez que o crédito é solidário, no entanto
ele não pode dispor das cotas dos demais credores, assim aquele
que remir a dívida estará obrigado a arcar o valor das cotas
internas aos demais credores.

2.5 Das exceções


O devedor sempre é apresentado como o sujeito passivo,
que sempre deverá arcar com a prestação exigida pelo credor,
no entanto existem situações em que a pessoa obrigada a entregar
a prestação poderá argumentar e se impor contra a obrigação,
opondo-se às exigências do credor por meio do que a lei e a
doutrina chamam de: exceções. Os arts. 273 e 274 tratam do
que o devedor poderá alegar contra cada credor, bem como o
alcance das decisões judiciais.
Antes de tratar dos próprios artigos, necessário se faz
apresentar pequenas observações sobre o termo exceção. A
exceção trata justamente de toda e qualquer matéria de defesa
que pode o devedor utilizar para proteger-se das investidas
judiciais dos credores, são as matérias que o devedor alega em
sua defesa, a fim de se abster do pagamento da prestação, ou
diminuir o valor cobrado.

75
Gagliano, Pablo Stolze e Pamplona Filho, Rodolfo. Novo curso de direito civil,
volume 2: obrigações. 13 ed. Rev. Atual. Ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. Pag 110

116
As exceções dividem-se em dois tipos: pessoais e comuns.
Oliveira76 diz que as “exceções pessoais, assim entendidas as
defesas que dizem respeito apenas a um dos credores solidários,
não podem ser opostas aos demais credores”, é um tipo de defesa
em que o devedor pode negar a existência do débito, sua nulidade
ou a sua diminuição apenas contra um dos credores, não podendo
a mesma questão ser alegada contra os demais, a doutrina
apresenta como exemplos destas situações a incapacidade e os
vícios de consentimento.
Sendo a pessoal tida como individualizada e de caráter
subjetivo a um único credor solidário, tem-se que a exceção
comum será aquele tipo de exceção que poderá ser alegada contra
qualquer um dos credores solidários, o devedor poderá se negar
a cumprir a obrigação pelo mesmo fundamento contra qualquer
um dos credores, principal exemplo seria o das dívidas atingidas
pela prescrição.
Esta diferenciação da exceção pessoal e comum é essencial
para a aplicação do disposto na lei, veja o art. 273, Código Civil, diz
que “a um dos credores solidários não pode o devedor opor as
exceções pessoais oponíveis aos outros”, assim definiu o
anteriormente descrito, o devedor só poderá alegar a exceção pessoal
exclusivamente contra um ou alguns dos credores, não podendo
generalizar a sua defesa. Aplicando a regra, diz a jurisprudência:
67019684 - FIANÇA. RESPONSABILIDADE DO
FIADOR. LOCAÇÃO. EXTENSÃO A TODAS AS
OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS PELO
AFIANÇADO. DEVOLUÇÃO DO IMÓVEL
ANTES DE FINDO O CONTRATO. ALEGAÇÃO
DO GARANTE DE NÃO APRESENTAR
CONDIÇÕES DE HABITABILIDADE.
ARGUMENTO QUE CONSTITUI EXCEÇÃO
PESSOAL DO LOCATÁRIO.
RECONHECIMENTO. Tendo em vista o disposto
no artigo 4º, caput, segunda parte da Lei nº 8245/91,
se o contrato de locação define que a responsabilidade

76
OLIVEIRA, James Eduardo. Código civil anotado e comentado: doutrina e
jurisprudência. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 237.

117
do fiador abrange não só o adimplemento dos aluguéis
mas, também, o cumprimento de todas as demais
cláusulas contratuais, conclui-se que, devolvido o
imóvel antes de vencido o prazo estipulado, o garante
é também responsável pela multa proporcional devida
em virtude do descumprimento de cláusula contratual
livremente aceita por ele e pelo afiançado. Não pode
o fiador alegar que o imóvel locado não apresentava
condições de habitabilidade, porque esse argumento
constitui exceção pessoal do locatário. (TACSP 2; EI
596.957-01/4; Terceira Câmara; Rel. Juiz Milton
Sanseverino; Julg. 18/09/2001)77 (grifo nosso)

A jurisprudência transcrita deixa claro que este tipo de


defesa é específica, não podendo ser alegada aleatoriamente
contra qualquer um dos envolvidos na relação solidária, exceto
contra aquele vinculado à questão com o devedor. Ademais, o
Código Civil também inovou no art. 274, quando tratou das
consequências de um julgamento envolvendo o cumprimento
da relação solidária perante os credores solidários, veja que o
mesmo diz: “O julgamento contrário a um dos credores solidários
não atinge os demais; o julgamento favorável aproveita-lhes, a
menos que se funde em exceção pessoal ao credor que o obteve”.
O Código Civil apresentou uma regra processual, este
dispositivo trata justamente das consequências da decisão
judicial, bem apresenta a solução para este caso Didier Júnior78:
a) se um dos credores vai a juízo e perde, qualquer
que seja o motivo (acolhimento de exceção comum
ou pessoal), essa decisão não tem eficácia em relação
aos demais credores; b) se o credor vai a juízo e ganha,
essa decisão beneficiará os demais credores, salvo se
o(s) devedor(es) tiver(em)exceção pessoal que possa
ser oposta a outro credor não participante do
processo, pois, em relação àquele que promoveu a
demanda, o(s) devedor(es) nada mais pode(m) opor
(art. 474 do CPC).

77
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
78
DIDIER JR, Fredie. In TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil – volume único.
São Paulo: Método, 2011, p 306.

118
A solução apresentada gira em torno das próprias
consequências da decisão judicial, sendo a mesma desfavorável
ao credor (autor da ação de cobrança da prestação) não afetará
aos demais credores que não participaram desta cobrança, caso
o credor autor proponha ação e ganhe, lógico que não
imediatamente, mas todos os demais credores terão a vantagem
de poder cobrar sua cota parte do credor vencedor.

3. Solidariedade passiva
3.1 Noções gerais
É uma relação obrigacional com ampla aplicação, sendo
mais comum no mundo jurídico e na sociedade do que a
solidariedade ativa. É uma relação obrigacional muito vantajosa
para o credor, note que o ordenamento sempre busca aumentar
as chances de o sujeito ativo receber a prestação. A solidariedade
é perfeita neste sentido, vez que qualquer devedor, dentre vários,
vê-se com o ônus de cumprir toda a prestação, possibilitando ao
credor maior segurança de que a obrigação será cumprida.
Nessa obrigação cada um dos devedores é responsável
pela integralidade da prestação, podendo sofrer (qualquer um
deles e/ou todos) os efeitos da ação proposta pelo credor no
sentido de receber sua prestação, nas palavras de Orlando
Gomes79:
Estabelecida a solidariedade passiva, pela vontade das
partes, ou por lei, o credor tem direito de exigir e
receber de qualquer dos devedores a dívida comum.
Pode reclamá-la no todo ou em parte. Se recebe
apenas uma fração, os demais devedores continuam
obrigados solidariamente pelo resto, dando-se a
extinção parcial da dívida em relação ao que pagou.
Com efeito, o pagamento parcial feito por um dos
devedores só aproveita aos demais até a concorrência
da quantia paga.

79
GOMES, Orlando. Obrigações. 8 ed. 3ª tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p
81.

119
Gomes apresentou a solidariedade passiva e expôs o
quanto a relação entre os devedores é total e universal, vez que
possibilita ao credor se impor perante qualquer dos sujeitos
inseridos no polo passivo. Esta é a regra encontrada no art. 275,
Código Civil, que diz o “credor tem direito a exigir e receber de
um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida
comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais
devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto”.
Na solidariedade passiva existe o tipo de obrigação na
qual os devedores formam um bloco de pessoas entre as quais o
credor tem o direito de exigir a entrega da prestação de um, de
alguns ou de todos. Logo, caso os devedores não se apresentem,
a sorte destes será determinada pela vontade do credor (ou
credores, caso seja uma obrigação com diversos credores).
Uma pequena observação àqueles que fazem a primeira
leitura do Direito das Obrigações, o Código Civil, ao final do
art. 275, afirma que “os demais devedores continuam obrigados
solidariamente pelo resto”, tal dispositivo deixa claro que no
caso de pagamento parcial a dívida continua a existir, abatido o
valor pago, bem como que permanece a solidariedade a TODOS
os devedores, inclusive aquele que por ventura tenha feito o
pagamento parcial.
Exemplificando, caso Vitor seja credor de R$ 9.000,00,
em um contrato com cláusula de solidariedade, de Orlando, Braz
e Jurandir. Orlando se apresentando e pagando a importância de
R$ 3.000,00, em tese teria pagado sua cota parte. Em uma
obrigação divisível isso acarretaria a quitação do débito de
Orlando, no entanto por se tratar de solidariedade passiva,
Orlando pode ser novamente cobrado por Vitor (credor) do
restante do contrato, no caso R$ 6.000,00, justamente em
decorrência de sua condição de devedor solidário.
Ainda sobre este artigo, o parágrafo único informa não
ser renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor
contra um ou alguns dos devedores, ou seja, a regra possibilita
ao credor o exercício de uma mera opção, vez que pode cobrar a
prestação de qualquer dos devedores, não se concentrando a
120
cobrança na figura de apenas um devedor, pois o direito do credor
de exigir de qualquer dos devedores é mantido, mesmo que
inicialmente exija de apenas um deles.

3.2 Dos herdeiros do devedor solidário


O falecimento de um dos devedores solidários é um
problema que pode atingir a relação, não necessariamente
prejudicando ao credor, mas poderia acarretar dúvidas sobre a
forma que se pode cobrar aos devedores e/ou herdeiros do
devedor solidário falecido, sobretudo na relação interna.
Importante relatar que no estudo do Direito das Sucessões
aprende-se justamente o que ocorre com o patrimônio, direitos,
ônus e dívidas daquela pessoa que faleceu (de cujus), sendo
apurados os valores positivos e passados aos herdeiros. Desta
situação surge uma regra na sucessão, nenhum herdeiro será
obrigado a assumir dívidas deixadas pelo falecido.
Esta situação ocorreria caso o falecido deixasse apenas
dívidas, neste caso, os seus herdeiros informariam inventário
negativo, e nenhum deles estaria obrigado a assumir as contas
deixadas. Gonçalves80 melhor explica:
Segundo dispõe o art. 1792, primeira parte, do novo
Código Civil, “o herdeiro não responde por encargos
superiores às forças da herança”. A integralidade da
herança recai sobre o conjunto de herdeiros, pois se
sub-rogaram na posição ocupada, na relação jurídica,
por um dos devedores solidários. Este, em razão da
natureza da obrigação, respondia pela obrigação
inteira.

E Podestá81 também explica:


O herdeiro, em verdade, representa a pessoa do de
cujus, mas tão-somente na qualidade de herdeiro e,
portanto, dentro dos limites da herança. Obrigar o

80
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 157/158.
81
PODESTÁ, Fábio Henrique. Direito das obrigações: teoria geral e responsabilidade
civil. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2008, p 137.

121
herdeiro, por sua pessoa e seus bens, a responder por
dívidas da herança é obrigá-lo não em sua figura de
representante da herança, mas no seu caráter
individual.

Assim, sabe-se que o herdeiro não pode assumir dívida


instituída pelo falecido. E no caso de falecimento de um dos
devedores solidários, o Código Civil impõe:
Art. 276. Se um dos devedores solidários falecer
deixando herdeiros, nenhum destes será obrigado a
pagar senão a quota que corresponder ao seu quinhão
hereditário, salvo se a obrigação for indivisível; mas
todos reunidos serão considerados como um devedor
solidário em relação aos demais devedores.

Exemplificando, Rufino é Credor, em uma relação com


regras de solidariedade, de Robert, Jardel e João, da importância
de R$ 90.000,00. Antes da data de pagamento João morre,
deixando dois herdeiros, de nomes João Filho e João Júnior. O
patrimônio deixado por João é da ordem de R$ 150.000,00. Este
exemplo origina duas situações.
Na primeira situação, ou já ocorreu a partilha ou o credor
resolve impor o pagamento da dívida individualmente a cada
herdeiro. O credor, neste caso, não leva em conta a existência de
espólio, apenas a pessoa dos herdeiros, assim o credor só poderá
cobrar, de cada a herdeiro, a importância de R$ 15.000,00, vez
que é o valor da cota individual do João dividida por seus filhos.
Como João deixou bens e os herdeiros estão sendo cobrados
individualmente, cada um só assumirá até o valor do rateio da
dívida pelos dois. A jurisprudência transcrita bem narra esta
situação:
23045721 - COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO
SINDICAL RURAL. CONTRIBUINTE
FALECIDO. PARTILHA DE BENS AINDA NÃO
FORMALIZADA. HERDEIROS. Ilegitimidade
passiva a herança é uma universalidade indivisível
até a partilha. Após o trânsito em julgado da sentença
de partilha, os bens que até então integravam aquela
universalidade são divididos entre os herdeiros,
122
extinguindo-se a comunhão hereditária e, por
conseguinte, o espólio. Assim, somente após a
partilha dos bens inventariados é que os herdeiros
podem ser acionados pessoalmente por pretensa
dívida do de cujus, respondendo cada herdeiro até a
força da herança e na proporção do seu quinhão.
Antes de partilhados os bens da herança, somente o
espólio tem legitimidade ativa e passiva para estar
em juizo. Inteligência dos arts. 597 do código de
processo civil e 1.997 do Código Civil. (TRT 09ª R.;
Proc. 01040-2007-659-09-00-7; Ac. 05293-2008;
Primeira Turma; Rel. Des. Ubirajara Carlos Mendes;
DJPR 19/02/2008)82(grifo nosso)

Na segunda hipótese, o credor resolve cobrar o espólio,


não separando a responsabilidade dos herdeiros, mas se
concentrando no instituto jurídico utilizado para representar o
falecido, neste caso conforme a jurisprudência e a lei o credor
poderá cobrar o valor integral dos herdeiros. No exemplo já
citado, o credor poderia cobrar os R$ 90.000,00 do espólio de
João.
Duas observações são necessárias, primeiro, mesmo sendo
cobrados individualmente os herdeiros devem responder por toda
a prestação se a mesma se tratar de bem indivisível. Pense que
no exemplo citado, João Filho detinha um quadro de Cândido
Portinari, e que esta era a prestação de João e dos demais
devedores solidários, neste caso não há como dividir a prestação,
devendo o herdeiro entregar a mesma por inteiro, em decorrência
de sua própria natureza.
A segunda observação gira em torno da cobrança do
espólio de forma solidária, neste caso o espólio, por ter pagado
todo o valor devido da relação solidária, terá o direito de exigir
dos demais devedores as cotas internas da relação, voltando ao
exemplo de R$ 90.000,00, caso o espólio pague este valor, ele
terá do direito de cobrar R$ 30.000,00 de Jardel e R$ 30.000,00
de Robert.

82
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

123
3.3 Do pagamento parcial e da remissão
A solidariedade passiva, também, possibilita o pagamento
parcial ou remissão de um ou alguns dos devedores, neste caso se
aplica a regra de que o pagamento parcial feito por um dos
devedores e a remissão por ele obtida não aproveitam aos outros
devedores, senão até à concorrência da quantia paga ou relevada
(art. 277, Código Civil), logo o credor que receber parte da conta,
apenas poderá exigir dos demais devedores até o valor da prestação
abatida do valor recebido parcialmente. Se existem 3 devedores
solidários, e o primeiro paga R$ 1.000,00, da prestação de R$
3.000,00, o credor só poderá cobrar R$ 2.000,00 dos devedores.
Na leitura deste artigo pode-se entender que pago o valor
de sua cota individual, o primeiro devedor estaria isento de ser
cobrado do restante da parcela devida, o humilde entendimento
do autor é que não pode ocorrer esta quitação por pagamento
parcial, em razão de ser uma relação obrigacional solidária o
devedor que pagou sua cota interna continua obrigado pelo
restante da prestação, podendo ser cobrado pelos R$ 2.000,00
que restam.
No entanto, nada impede ao credor de realizar acordo
com o primeiro devedor, que realizou o pagamento de R$
1.000,00, a fim de que este receba uma quitação parcial, e não
mais possa ser cobrado pela obrigação supra exemplificada,
conforme a jurisprudência abaixo transcrita:
91268774 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO
DE EXECUÇÃO. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA.
TRANSAÇÃO FEITA PELO CREDOR E
ALGUNS DEVEDORES. QUITAÇÃO PARCIAL.
Em havendo quitação parcial da dívida através da
transação realizada por alguns dos devedores
solidários, a execução prossegue contra os demais
devedores solidários, deduzidos os valores já
recebidos. Incidente a regra do artigo 277 do Código
Civil. AGRAVO PROVIDO DE PLANO, FORTE
NO ARTIGO 557, §1º-A, DO CPC. (TJ-RS; AI
70036354108; Porto Alegre; Vigésima Câmara Cível;
Rel. Des. Rubem Duarte; Julg. 08/06/2010; DJERS
17/06/2010)
124
O mesmo pode se falar da remissão (perdão), o credor
pode realizar remissão parcial da dívida, na qual possibilita que
apenas alguns ou um único devedor fique isento de pagar a sua
cota sobre a prestação, assim tem-se que caso o credor de R$
40.000,00, de 4 devedores solidários, resolva perdoar o devedor
número 3, este será excluído da relação, ficando a prestação de
R$ 30.000,00 a ser cobrada dos devedores 1, 2 ou 4.

3.4 Agravamento da condição dos devedores solidários


Uma das teorias de natureza jurídica da obrigação solidária
trata justamente da mútua representação, segundo a qual o
vínculo interno seria decorrente da outorga tácita de poderes
entre os integrantes da solidariedade, que teriam poderes para
representar uns aos outros. Os credores, em decorrência destes
poderes, poderiam receber toda a prestação e os devedores cada
um representando ao outro teria o dever de pagar a prestação.
Nas palavras de Monteiro83:
Por exemplo, ex vi do art. 907, do Código Civil,
qualquer cláusula, condição ou obrigação adicional
estipulada entre um dos devedores solidários e o
credor, não agravará a posição dos outros, sem o
consentimento destes. Que espécie de representação
é essa em que nenhum vínculo direto surge para o
representado, não obstante o ato praticado pelo
representante?

Monteiro se utiliza do art. 907 (Código Civil de 1916),


atual art. 27884, para afirmar a impossibilidade desta teoria e
demonstrar que havendo a necessidade de consentimento, não

83
Monteiro, Washington de Barros. Curso de direito civil, volume 5, direito das
obrigações – 1ª parte. 27 ed. São Paulo, Saraiva, 1994, p 152.
84
Código Civil de 1916:
Art. 907. Qualquer cláusula, condição, ou obrigação adicional, estipulada entre um
dos devedores solidários e o credor, não poderá agravar a posição dos outros, sem
consentimento destes.
Código Civil de 2002:
Art. 278. Qualquer cláusula, condição ou obrigação adicional, estipulada entre um dos
devedores solidários e o credor, não poderá agravar a posição dos outros sem
consentimento destes.

125
há como se falar de representação. Em suma, nenhum dos
devedores tem o direito de alterar o inicialmente pactuado, sem
consultar aos demais integrantes da relação. Tal alteração poderia
prejudicar a situação do devedor.
Exemplificando, 3 devedores solidários possuem uma
prestação de R$ 30.000,00 a ser paga dentro de 15 dias. O
devedor número 3, sem consultar aos demais, renegocia a dívida
aumentando o prazo para 30 dias, mediante o acréscimo de R$
1.200,00 na prestação, este acréscimo é de inteira
responsabilidade do devedor 3, que sem consultar aos demais85,
autorizou o aumento.
A posição dos devedores solidários não pode ser agravada
no contrato através de composição de vontades entre o credor e
apenas um dos devedores, há a necessidade dos demais devedores
serem consultados e emitirem seu aceite.

3.5 Da perda da prestação


O risco de perda da prestação é inerente a qualquer relação
obrigacional, em uma obrigação simples a perda da prestação
acarreta a possibilidade de reparação dos danos, na relação
solidária se pode observar que não se trata apenas de pagar o
prejuízo, mas também de quem arcará com as perdas e danos.
O Código não retrata a questão envolvendo a perda sem
culpa, de onde se subtrai o entendimento que não havendo culpa
das partes pela perda da prestação esta deve apenas se resolver,
85
95301826 - APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. Acolhida a
pretensão do autor ao ressarcimento de danos materiais em prédio de sua propriedade
e que poderiam ser evitados com a atuação efetiva do ente público municipal,
caracterizadas omissão quanto à fiscalização da obra e negligência na aprovação do
projeto, não aproveitando à Prefeitura a transação parcial celebrada nos autos
apenas entre o autor e a corré, arquiteta responsável pela obra e condenada
solidariamente em primeiro grau. Hipótese, entretanto, em que subsiste a
responsabilidade da arquiteta quanto ao pagamento do valor residual da condenação a
ser apurado em liquidação de sentença, visto que a quantia objeto do acordo não
alcança metade do montante condenatório. Inteligência dos artigos 277 e 278 do
Código Civil. Homologação do acordo nesta instância. Ação parcialmente procedente.
Reexame necessário desacolhido. Recurso da Municipalidade não provido. (TJ-SP;
APL 0149170-08.2007.8.26.0000; Ac. 5527967; Atibaia; Oitava Câmara de Direito
Público; Rel. Des. Osni de Souza; Julg. 09/11/2011; DJESP 05/12/2011) Fonte:
DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012. (grifo nosso)

126
restabelecendo-se o status quo ante das partes. Conforme Diniz86:
“A impossibilidade da prestação: a) sem culpa dos devedores
solidários, por ser decorrente de força maior ou de caso fortuito,
acarretará a extinção da relação obrigacional, liberando todos os
codevedores;”.
No entanto, se a prestação torna-se impossível de ser
cumprida por culpa do devedor solidário, deverá ocorrer o
pagamento do equivalente da prestação e a reparação do dano,
conforme o Código Civil: impossibilitando-se “a prestação por
culpa de um dos devedores solidários, subsiste para todos o
encargo de pagar o equivalente; mas pelas perdas e danos só
responde o culpado”(art. 279).
O Código Civil disciplina que uma vez perdida a prestação
todos os devedores continuam obrigados a pagar o valor da mesma,
não se rompendo o vínculo da solidariedade em razão desta perda,
exemplificando, Mateus e Nicolau são devedores solidários de
um carro a Cláudio. O carro, em decorrência da embriaguez de
Mateus, sofre um acidente com perda total. A prestação é
convertida em dinheiro, sendo o veículo avaliado em R$ 40.000,00.
Para este tipo de relação, por ser solidária, o credor terá direito de
cobrar o valor tanto de Mateus como de Nicolau, vez que se trata
do valor do bem, antes objeto da obrigação.
Agora, se este carro seria transformado em um taxi e
prestando este serviço o carro renderia a importância de R$
500,00 por dia. Tendo transcorrido 10 dias até o recebimento da
prestação, foi gerado um prejuízo de R$ 5.000,00, como se trata
de perdas e danos, o credor não poderá cobrar de qualquer um
dos devedores solidários, mas apenas daquele que causou o
prejuízo, no caso Mateus.

3.6 Da mora
A mora trata do atraso na entrega da prestação, os
devedores solidários por não entregarem a prestação na data

86
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2: Teoria geral das
obrigações. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p 191.

127
devida serão obrigados a arcar com os juros. A aplicação do art.
280, Código Civil, é clara, a lei impõe que todos “os devedores
respondem pelos juros da mora, ainda que a ação tenha sido
proposta somente contra um; mas o culpado responde aos outros
pela obrigação acrescida”, a solidariedade não é esquecida caso
ocorra atraso da prestação.
Todos os devedores solidários responderão pelos juros,
imagine a situação na qual Vanessa, Liduina e Taise são
devedoras solidárias de R$ 30.000,00 ao Banco Bom. Vanessa
e Liduina entregam R$ 20.000,00 a Taise, a fim de que esta
realize o pagamento no vencimento, ocorre que Taise, por não
contar com sua parte não realiza o pagamento, e devolve à
Vanessa e Liduina os valores entregues anteriormente, dias após
o vencimento.
O Banco, em decorrência do atraso, cobra o pagamento
da dívida de Vanessa, desta feita R$ 30.000,00 mais R$ 500,00
pelos juros. Vanessa será obrigada a pagar a importância de R$
30.500,00 ao Banco, tal ato extingue a relação externa com o
Banco, resta a Vanessa cobrar os valores de responsabilidade
das demais devedoras solidárias. Taise e Liduina serão cobradas
em R$ 10.000,00 cada uma, no entanto, o valor de R$ 500,00
será cobrado apenas de quem deu causa ao atraso, neste caso
Taise.

3.7 Das exceções


O art. 281, Código Civil, impõe que o “devedor
demandado pode opor ao credor as exceções que lhe forem
pessoais e as comuns a todos; não lhe aproveitando as exceções
pessoais a outro co-devedor”, tal determinação trás novamente
a discussão neste trabalho sobre as exceções comuns e pessoais,
segundo Antunes Varela87:
Os meios pessoais de defesa são os factos que,
afastando temporária ou definitivamente a pretensão

87
VARELA, João de Matos Antunes. Das obrigações em geral. Volume I. 8ª Ed.
Revista e actualizada. Coimbra: Livraria Almedina, 1994, p 785.

128
do credor, se referem apenas a um dos condevedores,
só por este podendo ser invocados. Enquanto os
meios comuns atingem a relação obrigacional complexa
no seu todo, os meis pessoais atingem apenas uma das
várias relações obrigacionais através das quais o
credor pode exigir de cada um dos devedores a
prestação integral a que tem direito.

Como exposto, tem-se que o devedor pode fazer sua


defesa em forma de exceções apresentadas contra o credor. No
caso da solidariedade passiva, como se trata de uma obrigação
complexa com diversos devedores, a questão é saber se a defesa
(exceção) beneficiará a todos devedores ou a apenas um. Tome-
se, por exemplo, um contrato em que Arthur, Lancelot e
Guinevere são devedores de Mordred, da importância de R$
90.000,00, sendo este contrato com regras de solidariedade e
com vencimento em 01º de janeiro de 1999. Mordred resolve,
em dezembro de 2012, cobrar o valor do débito, ocorre que tal
direito está prescrito. O credor não pode exigir o pagamento de
qualquer dos devedores, estes podem alegar a prescrição como
forma de se eximir, se tem uma exceção comum.
Agora, se o mesmo contrato foi assinado a pouco mais
de um mês e durante a confecção do mesmo, Guinevere foi
coagida a assinar pelo credor, neste caso a nulidade do ato esta
restrita a Guinevere, não podendo nenhum dos outros devedores
alegar em sua defesa a coação. Apenas ela poderá alegar e exigir
a declaração de nulidade do mesmo, vez que é uma exceção
pessoal.

3.8 Da renúncia à solidariedade


Uma figura apresentada pelo Código Civil, que em rápida
leitura pode ser confundida com o instituto da remissão é a
renúncia à solidariedade, no entanto ambas são diferentes. Na
Remissão há perdão da dívida e exoneração do devedor do
pagamento de qualquer valor perante o credor.
Na Renúncia, tem-se uma situação em que o credor
rompe o laço de solidariedade entre um ou alguns dos devedores

129
solidários, nesta o credor não perdoa a dívida, apenas retira um
ou alguns dos devedores da solidariedade, mantendo a dívida
(cota parte) do devedor renunciado. Veja a situação de Júnior,
Francisco e Antonio, que assinaram perante o Banco BH um
contrato, com regras de solidariedade. Por este contrato eles
teriam que pagar a importância de R$ 120.000,00. Por se tratar
de solidariedade, o Banco pode exigir de qualquer um dos
devedores a prestação completa. No entanto, por questões
internas, o Banco resolve renunciar à solidariedade de Júnior,
neste caso o devedor é retirado da relação solidária e será
cobrado individualmente pelo valor de sua cota, a qual
corresponde a R$ 40.000,00. Quanto aos demais devedores, os
dois são mantidos na relação solidária, sendo cobrados pelo
valor restante total, na ordem de R$ 80.000,00. Veja a
jurisprudência:
48180732 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE
DEBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. SENTENÇA FAVORÁVEL À
AUTORA. RENÚNCIA À SOLIDARIEDADE
EM RELAÇÃO A UMA DAS DEVEDORAS.
INEXISTENCIA DE REMISSÃO. EXECUÇÃO
DA INTEGRALIDADE DA OBRIGAÇÃO PELA
DEVEDORA RESTANTE. A renúncia à
solidariedade não se confunde com a remissão do
débito. Na hipótese de renúncia à solidariedade,
prevista no art. 282 do Código Civil, “”o credor não
exclui a responsabilidade do devedor remitido, apenas
ameniza sua situação ao convertê-lo em mero devedor
fracionário”” ( in Direito das Obrigações - Nelson
Rosenvald 3ª Edição, p. 93). - Recurso provido.
Unânime. (TJ-DF; AI 2007.00.2.002285-8; Ac.
272592; Sexta Turma Cível; Rel. Des. Otávio
Augusto; DJU 31/05/2007; Pág. 181) (grifo nosso)

A renúncia vai retratar apenas a retirada de um ou de


alguns devedores do seio da relação solidária, não podendo mais
este devedor ser cobrado pela a integralidade da prestação, no
entanto o que seria considerado a cota de responsabilidade
130
individual deste devedor permanece, devendo ser paga esta
porção ao credor.

3.9 Da relação interna


A relação interna da obrigação solidária é retratada pelo
art. 283, Código Civil, este artigo afirma que o “devedor que
satisfez a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada um dos
co-devedores a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a
do insolvente, se o houver, presumindo-se iguais, no débito, as
partes de todos os co-devedores.”
É a aplicação da regra segundo a qual a prestação principal
é subdividida entre os devedores, de forma que cada um tem
responsabilidade sobre parte do débito. Em uma situação na qual
os amigos Eduardo Gomes, Mascarenha de Moraes e Castelo
Branco retiraram um empréstimo de R$ 90.000,00, com cláusula
de solidariedade, junto ao Banco do Catete. Poderá o Banco
cobrar a importância de um dos devedores, neste caso o Banco
resolveu cobrar e recebeu a prestação de Eduardo Gomes. O
fato de Eduardo pagar a importância de R$ 90.000,00 ao Banco,
extingue a relação originária do empréstimo (relação externa).
Eduardo não é o único responsável pelo débito, todos os demais
envolvidos têm responsabilidade sobre parte da prestação
original. São R$ 90.000,00 divididos igualmente pelos 3
devedores solidários. Assim tem-se R$ 30.000,00 de
responsabilidade de cada um dos devedores.
Dos R$ 90.000,00 originais, R$ 30.000,00 serão de
responsabilidade do próprio Eduardo, bem como ele terá o direito
de cobrar R$ 30.000,00 de Mascarenha de Moraes e também
cobrar R$ 30.000,00 de Castelo Branco, aqui aparecem as
relações internas da solidariedade. Sendo Eduardo credor em duas
obrigações, uma com Mascarenhas e outra com Castelo.
A possibilidade de um dos devedores solidários vir a
tornar-se insolvente, também, é amparada pela lei, tal situação
impõe aos demais devedores o dever de ratear a cota do
insolvente, conforme o texto do art. 284, Código Civil, no “caso
de rateio entre os co-devedores, contribuirão também os
131
exonerados da solidariedade pelo credor, pela parte que na
obrigação incumbia ao insolvente.”
Os exonerados de uma relação obrigacional são aqueles
excluídos do polo passivo, não mais estando obrigados a cumprir
a relação, conforme as determinações de lei são os remidos e os
renunciados. Aqui surge uma discussão doutrinária, há corrente
que entende que o exonerado no art. 284, Código Civil, trata-se
apenas do renunciado, à medida que o remido teve total
rompimento do próprio vínculo obrigacional. Neste sentido veja
o Enunciado da IV Jornada de Direito Civil88 89, da lavra de
Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber:
350 — Art. 284: A renúncia à solidariedade
diferencia-se da remissão, em que o devedor fica
inteiramente liberado do vínculo obrigacional,
inclusive no que tange ao rateio da quota do eventual
co-devedor insolvente, nos termos do art. 284.

Assim, no rateio dos devedores solidários insolventes,


aqueles que tivessem sido remidos não estariam obrigados a
participar. No entanto, mesmo que seja com base em
interpretações ao Código Civil de 1916, encontra-se voz que

88
AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de (Coord). Jornada de Direito Civil. Brasília :
Conselho da Justiça Federal, 2007.
89
Justificativa: A exoneração da solidariedade, nos termos do art. 282, não isenta o
devedor exonerado da obrigação; apenas o exime do dever de pagar a dívida
integralmente. Vale dizer, quando exonera um devedor da solidariedade, abre mão o
credor de uma garantia que possui: a de responsabilizá-lo por toda a dívida. A exoneração
afeta a responsabilidade, não já o débito, conservando o devedor exonerado sua posição
de devedor, apenas não mais pelo todo. Por essa razão, o art.284 impõe que os exonerados
da solidariedade contribuam no rateio da quota do codevedor insolvente.
A doutrina diverge quanto à aplicação da norma ao devedor remisso. Alguns autores
sustentam que também o devedor remisso deve ser chamado a contribuir em caso de
insolvência de algum de seus consortes. O melhor entendimento, contudo, é o de que
o rateio não deve ser imposto àquele que, exonerado do débito, deixou de ser “devedor”
em sentido técnico. A remissão, com efeito, extingue a dívida quanto à parcela relevada
(arts. 277 e 388). Não pode, entretanto, prejudicar terceiros ou os próprios co-devedores
(arts. 385 e 278). Daí a solução alvitrada pela doutrina, desde Pothier, no sentido de
atribuir ao credor remitente o ônus de suportar a perda da fração que competiria ao
devedor remisso no rateio da parcela de seu consorte insolvente1. A orientação resulta
coerente com o fato de que o credor perdoou o débito por liberalidade sua, não sendo
razoável que os demais devedores arquem com o desfalque daí decorrente. Sofre o
próprio credor as conseqüências de seu ato, sem que se prejudique os demais devedores
solidários.

132
entende que os exonerados seriam tanto os remidos como os
renunciados, veja a afirmação de Lopes90 91:
O estado de insolvência de um dos co-devedores
solidários, privando o procedimento do rateio, sob
uma forma igualitária, determina o acréscimo da
responsabilidade dos co-devedores para cobrir o
desfalque daí resultante. Trata-se de um ponto
importante na obrigação solidária, atento a que êle
influi mesmo até na posição do devedor exonerado
pelo credor, por fôrça de remissão do débito ou de
renúncia da solidariedade. (Cód. Civ. Arts. 913, 914
e 912).

Lopes, interpretando o Código Civil de 1916, entendia


não haver ressalva sobre qual das duas figuras estaria realmente
excluída da relação e não poderia ser convocada a participar do
rateio da cota do insolvente. Para Serpa Lopes ambos, renunciado
e remido, estariam obrigados a participar da cota do insolvente.
Assim, a solução apresentada por Tepedino e Schreiber é
a mais justa, vez que leva em conta a vontade do credor em
perdoar a cota de um devedor solidário. No entanto o
entendimento levantado por Lopes utiliza justamente o poder
legal do Código Civil. A lei poder impor o como devem ser
resolvidos os problemas e dúvidas inerentes à relação obrigacional,
no presente caso, apesar de poder especificar quem seria este
devedor exonerado não o faz, logo estariam ambos, remido e
renunciado, igualados pelo termo exonerado.

90
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil – obrigações em geral.
Volume II. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 1955, p 181.
91
Veja Código Civil/1916:
Art. 912. O credor pode renunciar a solidariedade em favor de um, alguns, ou todos os
devedores.
Parágrafo único. Se o credor exonerar da solidariedade um ou mais devedores, aos
outros só lhe ficará o direito de acionar, abatendo no débito a parte correspondente aos
devedores, cuja obrigação remitiu (art. 914.).
Art. 913. O devedor que satisfez a dívida por inteiro, tem direito a exigir de cada um
dos co-devedores a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a do insolvente, se o
houver. Presumem-se iguais, no débito, as partes de todos os co-devedores.
Art. 914. No caso de rateio, entre os co-devedores, pela parte que na obrigação incumbia
ao insolvente (art. 913.), contribuirão também os exonerados da solidariedade pelo
credor (art. 912).

133
Tratada a exoneração, o art. 285, Código Civil, impõe
que se “a dívida solidária interessar exclusivamente a um dos
devedores, responderá este por toda ela para com aquele que
pagar”. Há a determinação de se observar a ligação de um dos
devedores solidários com a dívida, havendo o interesse especial
de um dos devedores acarretaria que apenas este assumisse a
cota interna na relação obrigacional.
Veja a situação de Everanes, alugou um imóvel de Afonso,
este exigiu que fosse apresentada fiança por meio de duas pessoas,
prontamente Everanes apresentou Elvis e Evaldo como fiadores.
Na data combinada, Everanes não pagou o acordado e saiu do
imóvel deixando um débito de R$ 9.000,00. Afonso cobrou o
débito de um dos fiadores, neste caso Elvis. Quando Elvis for
exigir o pagamento, não haverá rateio, na verdade ele cobrará de
Everanes, eis que o principal interessado na presente conta. A
jurisprudência informa:
67024939 - CONDOMÍNIO. DESPESAS
CONDOMINIAIS. COBRANÇA.
LITISCONSÓRCIO PASSIVO. ALIENANTE E
ADQUIRENTE. TÍTULO AQUISITIVO NÃO
REGISTRADO. RECONHECIMENTO. Em
princípio o condômino (proprietário) é o responsável
pelas despesas condominiais. Mas como a obrigação
é propter rem o possuidor, munido de contrato com
promessa de transferência do domínio e responsável
pelos encargos condominiais, também pode ser
acionado; é possível, por isso, a condenação de ambos,
quando integrantes da lide, como litisconsortes e
devedores solidários. Se a dívida solidária perante o
condomínio interessar exclusivamente a um dos
devedores, responderá este por toda ela para com
aquele que, executado, eventualmente pagar (artigo
915, do Código Civil de 1916 e artigo 285 do Código
Civil de 2002). (TACSP 2; APL s/Rev 752.241-00/
0; Segunda Câmara; Rel. Juiz Norival Oliva; Julg.
10/11/2003) 92(grifos nossos)

92
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

134
A determinação legal impõe ao devedor solidário, único
interessado no pagamento, o dever de assumir e se responsabilizar
perante os demais devedores solidários por toda a prestação, não
podendo exigir rateio de uma prestação que é de seu interesse
exclusivo.

3.10 Comparação com a obrigação indivisível


Após a apresentação da obrigação solidária percebe-se
que a mesma é parecida, em alguns pontos, com a obrigação
indivisível, observa-se em ambas a possibilidade de uma só
pessoa, dentre as diversas envolvidas na relação obrigacional,
exigir a satisfação integral da prestação.
A legislação que trata da obrigação solidária cita situações
envolvendo a indivisibilidade da prestação, como forma de exigir
a prestação. Apesar destes pontos de intersecção a doutrina cita
diversas situações em que se podem diferenciar estes dois tipos
de obrigação, logo, ambas não podem ser consideradas do mesmo
tipo, vez que são institutos com características próprias, veja:
Primeira diferença, a Solidariedade sempre decorre da Lei
ou da vontade das partes, por exemplo se um grupo de 3 amigos
deve a importância de R$ 9.000,00 a Luiz, e o contrato tiver
sido celebrado com regras de solidariedade, apesar da prestação
ser em dinheiro (bem divisível) qualquer um dos três amigos
poderá ser cobrado pela integralidade do valor. Em contrapartida,
a Indivisibilidade ocorre simplesmente em decorrência da
natureza da prestação, no mesmo exemplo se os três amigos
forem devedores de um cavalo a Luiz, a prestação é indivisível
pela natureza da mesma, não em decorrência da vontade das
partes.
A segunda diferença ocorre com base na mora. O atraso
em cumprir a prestação pactuada terá efeitos diferenciados
conforme o tipo de obrigação (divisível ou solidária). Na
solidariedade o atraso em cumprir a obrigação gera ao credor o
direito de exigir de qualquer dos devedores o valor dos juros de
mora, lógico que aquele que tiver dado causa ao atraso responderá
aos demais pelo valor dos juros acrescentados. Imagine a situação
135
em que Ivan, Joaquim e Flávio são devedores solidários de R$
90.000,00. Ivan fica responsável por apresentar-se ao credor e
pagar a conta. Este some durante uma semana sem maiores
explicações e sem pagar a dívida. O credor cobra de Joaquim os
R$ 90.000,00, mais R$ 5.000,00 de multa e juros.
Neste caso, nas cotas da relação interna, Joaquim terá o
direito de cobrar R$ 30.000,00 de Flávio, enquanto que de Ivan,
Joaquim poderá cobrar a cota da relação interna (R$ 30.000,00)
mais o valor de R$ 5.000,00, em decorrência da culpa de Ivan,
com base no art. 280, Código Civil.
Em contrapartida, na obrigação indivisível não se observa
a possibilidade de qualquer dos devedores ser obrigado a arcar
com qualquer acréscimo decorrente de culpa de um dos outros
devedores, por exemplo Gilson, Jairo e Bento são obrigados a
entregar um cavalo a Dilma, sob pena de pagar a importância de
R$ 10.000,00. Jairo fica encarregado de realizar a entrega,
infelizmente o mesmo passa 4 dias ingerido bebidas alcoólicas,
o que acarreta o descumprimento da obrigação. Dilma cobrará a
entrega do Cavalo de qualquer dos devedores, já que a prestação
é indivisível e todos são responsáveis pela mesma. No que diz
respeito à multa, esta só poderá ser cobrada de Jairo, conforme
determinações do art. 263, Código Civil.
Por fim a questão envolvendo a perda da própria
prestação. Ocorrendo esta, não há perda das características de
solidariedade da relação, por exemplo, 3 amigos devem entregar
um cavalo, contrato com regras de solidariedade, e o cavalo é
picado por uma cobra e morre, neste caso as características da
solidariedade são mantidas, vez que o cavalo seria convertido
em um valor pecuniário e o credor teria o direito de cobrar este
valor de qualquer um dos 3 devedores.
Tal situação já não ocorre na obrigação indivisível,
havendo perda de uma prestação indivisível esta será convertida
em uma obrigação divisível, cada devedor vai arcar apenas com
sua cota parte perante o credor. Voltando ao exemplo dos três
amigos, devedores de um cavalo à Dilma. Como não há
exigências de solidariedade, estão inseridos em uma obrigação
136
indivisível, assim, se o cavalo morrer, este sofrerá uma avaliação
e estipulado um valor pela prestação perdida, neste exemplo R$
90.000,00, tem-se assim a divisão deste valor em cotas iguais
entre os devedores, a obrigação indivisível deixa de existir, sendo
paga a prestação de forma divisível.

137
IX
DA TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES

As relações obrigacionais expressam o direito de receber


a prestação, o sujeito ativo aguarda a satisfação deste e assim é
extinta a obrigação. No entanto, algumas vezes o credor por
questões de ordem pessoal, financeira ou impaciência resolve
negociar o crédito a receber, o que possibilita, na realidade,
circulação de mercadorias e riquezas.
Esta transferência origina diversas formas de negociar a
obrigação, veja cada uma:

1. Da cessão
1.1 Noções gerais
A circulação de riquezas possibilita a negociação do
próprio direito que será recebido futuramente. Aqui não se fala
em compra e venda, mas na transferência por meio de cessão.
Caio Mário93 define a cessão, como o negócio jurídico “em
virtude do qual o credor transfere a outrem a sua qualidade
creditícia contra o devedor, recebendo o cessionário o direito
respectivo, com todos os acessórios e todas as garantias”.
A sociedade atual tem grande apego ao crédito e a sua
disponibilização, bem como a própria riqueza que o mesmo pode
propiciar. Caio Mário apresenta esta figura importante do Direito
Civil e das obrigações, vez que ela possibilita justamente esta
circulação, não de um bem propriamente dito, mas do direito a
um crédito que apenas será recebido dias ou meses após a sua
transferência.

93
PEREIRA, Caio Mário da Silva. GAMA, Guilherme Calmon Nogueira (Rev. ).
Instituições de direito civil. Volume II. Teoria Geral das Obrigações. 22 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2009, p 357.

139
A circulação de riquezas e a necessidade de capital influem
de muitas formas na vida dos particulares, e a cessão de crédito é
capaz de proporcionar ambas as situações, que possibilitam a rápida
acomodação financeira de um credor em desvantagem pecuniária.
Veja o caso do comerciante que tem em seu poder um
cheque emitido por cliente seu, no valor de R$ 10.000,00, tendo
o mesmo sido apresentado ao banco e retornou sem provisão de
fundos. Tempos depois, este comerciante resolve ceder o direito
de receber os R$ 10.000,00 a uma firma de factoring. Esta firma
é um tipo de investidora que adquire créditos, para fazer a
cobrança, segundo Arnaldo Rizzardo94:
Por este contrato, um comerciante ou industrial,
denominado ‘faturizado’, cede a outro, que é o
‘faturizador’ ou ‘facto’, no todo ou em parte, créditos
originados de vendas mercantis. Assume este, na
posição de cessionário, o risco de não receber os
valores. Por tal risco, paga o cedente uma comissão.

Neste exemplo, a factoring paga ao comerciante a


importância de R$ 8.000,00 pela cessão do direito de receber o
crédito, nesta situação o comerciante deixa de ser o credor desta
relação, sendo a partir desta data a posição de credor ocupada
pela factoring95.
Assim se apresenta a cessão, uma forma de transferir o
direito a um crédito, realizada entre partes capazes e obedecendo
aos requisitos do negócio jurídico. Lembra Gama96 que a cessão
“é uma conquista relativamente recente no Direito, eis que o
94
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p 1.383.
95
55029414 - EMBARGOS À EXECUÇÃO. TÍTULO. CONTRATO DE
FACTORING. ENDOSSO. DESCABIMENTO. MERA CESSÃO CIVIL DE
CRÉDITO. PENHORA DO CRÉDITO NA JUSTIÇA LABORAL. I. A faturização
é mera cessão civil de crédito, não podendo ser regida pela legislação pertinente as
relações cambiais. II. In casu, houve a penhora na justiça laboral de crédito faturizado,
sendo o factoring contrato de risco, não como se considerar endosso, sem que se falar
em abstração do título. III. Eventual discussão quanto ao descabimento da penhora
deveria ter sido feita perante a justiça laboral através de recurso próprio. lV. A maioria,
recurso de apelação conhecido e improvido. (TJ-PA; AC 20103017647-9; Ac. 99695;
Belém; Quarta Câmara Cível Isolada; Relª Desª Maria do Carmo Araújo e Silva; Julg.
04/07/2011; DJPA 12/08/2011; Pág. 59)
96
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo:
Atlas, 2008, p 418.

140
direito romano não a admitia devido à consideração da obrigação
como vínculo de natureza personalíssima”. Aos romanos não
havia a possibilidade de se utilizar da cessão para transferir seus
créditos a novos credores, para o romano a relação obrigacional
era intuito persoane, assim só o credor ligado especificamente a
seu devedor poderia exigir o cumprimento da mesma.
A ideia de transferir algo, que ainda não está materializado
nas mãos do credor, com certeza chocaria qualquer romano da
antiguidade, no entanto este instituto moderno tem imensa
validade no mundo atual, não mais sendo impedida a sua
existência pelo caráter personalíssimo, que a muito deixou de
ser essencial à obrigação.
A cessão de forma geral é um negócio jurídico que não é
afetado por grandes restrições, uma vez obedecidas as regras
gerais do negócio (agentes capazes, forma prescrita ou não defesa
em lei, objeto lícito, determinado ou determinável) quaisquer
partes poderão realizar este tipo de negócio.

1.2 Das proibições à cessão


A liberdade de realizar a cessão é explícita, no entanto
ocorrem especificações de cunho legal que podem limitá-la, veja
o art. 286, Código Civil:
Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso
não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a
convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da
cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-
fé, se não constar do instrumento da obrigação.

Este artigo expressa três situações nas quais há restrições


à essa moderna espécie de circulação de riquezas, que são a
natureza da obrigação, a lei ou a vontade das partes. A primeira
situação retrata justamente a própria natureza do crédito, não se
podendo falar na cessão daqueles créditos personalíssimos, tais
créditos são encontrados naqueles pagamentos de natureza
alimentar, por exemplo salários, pensões, soldos e vencimentos.
Estes créditos são indisponíveis para a cessão, por conta da perda
da própria subsistência. Veja a jurisprudência impondo
141
interpretação neste sentido:
22536822 - CRÉDITOS TRABALHISTAS.
NATUREZA ALIMENTAR. IMPOSSIBILIDADE
DE CESSÃO. A natureza alimentar dos créditos
trabalhistas inviabiliza a sua cessão, nos termos do
que dispõem o parágrafo 1º-a do artigo 100 da
constituição, com a redação da Emenda Constitucional
nº 30/2000, os artigos 286 e 1.707 do Código Civil/
2002 e o art. 100 da consolidação dos provimentos
da corregedoria geral da justiça do trabalho. Agravo
de petição não-provido. (TRT 04ª R.; AP 0138200-
54.1999.5.04.0561; Oitava Turma; Relª Desª Ana
Rosa Pereira Zago Sagrilo; Julg. 26/05/2011;
DEJTRS 03/06/2011; Pág. 183) 97

No voto do acórdão ementado, encontra-se a seguinte


afirmação98:
Logo, em razão da natureza alimentar dos créditos
trabalhistas é vedada a sua cessão. Resta inviável,
portanto, acolher a pretensão da agravante, não sendo
cabível, no âmbito trabalhista, que terceira pessoa
(no caso, a empresa (...)) venha a substituir o
reclamante no pólo ativo da demanda, ainda que este
tenha cedido seus créditos em favor daquela.

Por sua natureza, qualquer parcela alimentar não pode ser


objeto de cessão, neste tipo de prestação protege-se a própria
manutenção da vida de seu credor, aqui se ressuscita a
impossibilidade de cessão com base nas regras de direito romano,
ou seja, sendo personalíssimo o crédito está indisponível para cessão.
A segunda imposição do art. 286 trata justamente da
impossibilidade de ocorrer cessão por determinação da lei, veja
alguns exemplos, todos do Código Civil:
Art. 497. Sob pena de nulidade, não podem ser
comprados, ainda que em hasta pública:
I - pelos tutores, curadores, testamenteiros e

97
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
98
Fonte: http://www.magisteronline.com.br/Integras/22000000/22300000/
22536822.html, em 17/08/2012.

142
administradores, os bens confiados à sua guarda ou
administração;
II - pelos servidores públicos, em geral, os bens ou
direitos da pessoa jurídica a que servirem, ou que
estejam sob sua administração direta ou indireta;
III - pelos juízes, secretários de tribunais,
arbitradores, peritos e outros serventuários ou
auxiliares da justiça, os bens ou direitos sobre que se
litigar em tribunal, juízo ou conselho, no lugar onde
servirem, ou a que se estender a sua autoridade;
Parágrafo único. As proibições deste artigo estendem-
se à cessão de crédito. (grifo nosso)
Art. 520. O direito de preferência não se pode ceder
nem passa aos herdeiros.
Art. 1749. Ainda com a autorização judicial, não pode
o tutor, sob pena de nulidade:
[...]
III - constituir-se cessionário de crédito ou de direito,
contra o menor.
Art. 1707. Pode o credor não exercer, porém lhe é
vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o
respectivo crédito insuscetível de cessão,
compensação ou penhora.

A lei restringe, em algumas situações, a liberdade de ceder


créditos, não podendo as partes em nome de interesses pessoais
suplantarem a vontade do ordenamento jurídico.
Por fim, o art. 286 diz que as partes podem convencionar
cláusula proibitiva da cessão, nesse caso o credor não poderia
transferir seu direito, sendo mantida até a data do pagamento a
composição original da obrigação, em decorrência da vontade
das partes que acaba por impor a impossibilidade da circulação
do direito, o credor obedece a vontade do devedor. Parte da
doutrina critica esta posição, pois ela impossibilita a transmissão
do crédito, e acorrenta o credor à vontade do devedor.

1.3 Nomenclatura das partes e os terceiros


As partes envolvidas na cessão recebem terminologia
própria, sendo o credor originário chamado de CEDENTE, o

143
novo credor CESSIONÁRIO e o devedor de CEDIDO. A
transferência de crédito, possibilitada pela cessão, faz com que
um direito que estaria sendo aguardado pelo credor originário
(cedente) saia de suas mãos e seja entregue a um novo credor
(cessionário). Ocorre que nas relações obrigacionais sabe-se que
terceiros não diretamente envolvidos na relação obrigacional
podem ter interesse sobre as mesmas.
Por exemplo, um comerciante tem um crédito a receber
de R$ 9.000,00 de um cliente. O comerciante, ao mesmo tempo,
é devedor de um fornecedor de pimenta, da importância de R$
5.000,00. Caso o comerciante não pague o valor devido ao
Fornecedor de Pimenta, este poderá intentar ação judicial
exigindo que o cliente não pague ao comerciante, e sim que o
crédito seja entregue ao próprio Fornecedor de Pimenta. Para
apimentar esta situação, caso o comerciante tenha cedido seu
crédito a Wellington, esta cessão poderia ter validade?
A solução a esta situação é imposta pelo art. 288, Código
Civil, que diz ser ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão
de um crédito, caso não obedeça a certas formalidades. Assim,
no caso apresentado, o comerciante (cedente) por não obedecer
às formalidades de lei junto com Wellington (cessionário),
possibilitará que o Fornecedor de Pimenta (terceiro) não sofra
os efeitos da cessão, podendo exigir que o crédito seja entregue,
como forma de pagar o débito. A Cessão apenas não tem validade
em relação a terceiros, mas entre as partes envolvidas
diretamente, cedente, cedido e cessionário, ela continua
possuindo validade (a mesma obedece todos os requisitos do
negócio jurídico).
O cedente e cessionário que queiram evitar o infortúnio
de terceiros alegando a ineficácia da cessão, deverão obedecer a
certas exigências legais. A primeira exigência seria que a cessão
fosse realizada por instrumento público. Não querendo realizar
este ato público, as partes têm direito de realizar a cessão por
meio de instrumento particular, sendo que este instrumento para
ter validade deverá conter a indicação do lugar onde foi passado,
a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo
144
da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos,
conforme art. 654, §1º, Código Civil.
Mas não bastaria a obediência ao art. 654, Código Civil,
veja que a Lei n.º 6.015/73, em seu art.129 diz:
Art. 129. Estão sujeitos a registro, no Registro de
Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação
a terceiros:
[...]
9º) os instrumentos de cessão de direito e de créditos,
de sub-rogação e de dação em pagamento.

A lei impõe a necessidade de ser registrada em cartório a


cessão, com o fito de poder ser alegada contra terceiros que
tentem interferir em sua validade. Retratada esta exigência
verifica-se que no art. 289, Código Civil, é proporcionado ao
cessionário de crédito hipotecário o registro na margem do
registro do imóvel da própria cessão. A hipoteca é um tipo de
garantia na qual para se receber um crédito o devedor coloca a
disposição do credor um imóvel em garantia, segundo Bittar99:
A hipoteca é o direito real, incidente sobre imóveis,
seus acessórios e equipamentos e acessões,
enumerados em lei, para efeito de garantia do
cumprimento de obrigação de ordem econômica.
Trata-se, como os demais direitos de garantia, de
vínculo acessório, que pressupõe a prévia constituição
de obrigação, ou se assenta concomitantemente.

Neste tipo de garantia ocorre a inscrição desta no Registro


de Imóveis no local da situação do bem, ou seja, no livro que consta
o registro do imóvel é anotada a existência de hipoteca sobre aquele
bem. Assim, se possibilita que o cessionário deste tipo de crédito,
anote a existência da cessão, também, neste registro. A anotação
da cessão no registro de imóveis serve para proporcionar a
publicidade da mesma e evitar o perecimento do direito cedido, se
for oposta qualquer alegação ou requerimento de terceiros.

99
BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos reais. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense universitária,
1991, p 202.

145
1.4 O devedor - cedido
Na situação supra-apresentada se nota a necessidade de
obedecer a certos requisitos legais, a fim de evitar a interferência
de terceiros na cessão de crédito. No entanto, nada foi falado
sobre aquele que possui o ônus de arcar com a prestação. A
cessão apresenta um tipo de relação na qual cedente e cessionário
negociam o crédito, sem a necessidade de consulta ao cedido,
este possui o dever de cumprir a prestação, mas não pode se
impor contra a realização da cessão, exceto se no contrato original
existir cláusula proibitiva de cessão.
Nota-se a desnecessidade de se questionar o cedido
(devedor) se o mesmo aceitaria a cessão, ocorre que a lei faz uma
pequena ressalva aos direitos do devedor, veja o Código Civil:
Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em
relação ao devedor, senão quando a este notificada;
mas por notificado se tem o devedor que, em escrito
público ou particular, se declarou ciente da cessão
feita.

Em decorrência de uma leitura rápida pode se chegar ao


equivocado entendimento de que a cessão seria nula. Na
realidade, o Código Civil apenas estabelece a necessidade de se
notificar ao cedido (devedor), a fim de que a cessão possa ser
imposta a esse, bem explica Antunes Varela100:
Nas relações entre as partes, a cessão de créditos
produz os seus efeitos imediatamente, ou seja, desde
a conclusão do contrato. Em relação ao devedor,
torna-se indispensável que a cessão lhe seja notificada,
e só a partir da notificação (denuntiatio) o devedor
fica obrigado perante o cessionário.

O fato de notificar ao devedor tem mais caráter


informativo do que autorizativo, ao ser informado da cessão, o
cedido identificará corretamente a quem deve realizar a entrega
da prestação, note que tendo o devedor realizado escrito, público

VARELA, João de Matos Antunes. Das obrigações em geral. Volume II. 7ª Ed.
100

Coimbra: Edições Almedina. 2006, p 310.

146
ou particular, no qual reconhece a existência da cessão, entender-
se-á que ocorreu a notificação do cedido101.
A situação do devedor em alguns casos é delicada, a
cessão pode ser realizada por diversas vezes, gerando a existência
de diversos cessionários. Por exemplo, um devedor que emitiu
Nota Promissória em favor de seu credor e este a passa ao senhor
X, que a repassa ao senhor Y. Seriam diversas cessões, que até
poderia gerar dificuldades ao devedor, mas caso os três senhores,
integrantes da cessão, apresentem-se, o devedor pagará a quem
estiver com o título de crédito, conforme impõe o art. 291.
A questão pode apresentar dificuldades naqueles casos
em que foi emitido mais de um documento, ou mesmo uma
situação na qual o devedor não consiga determinar com quem
esteja o título. Imagine a situação em que a dívida é representada
por um contrato escrito e redigido em 4 vias, segundo o credor
original necessárias estas vias para registro em cartório.
Caso este credor transfira seu crédito para o cessionário
X e entregue a este duas vias do contrato, e este posteriormente
transfira o mesmo crédito a Y e entregue uma via do contrato,
ter-se-ia uma situação na qual o devedor verificaria cada um dos
envolvidos na cessão com o título a ser cobrado, neste caso, o
contrato. Assim, a regra supra transcrita não poderia ser aplicada,
o devedor não saberia a quem entregar a prestação. A saída, que
se apresentara ao devedor, é realizar o depósito judicial do crédito,
101
91275086 - RESPONSABILIDADE CIVIL. ATLÂNTICO FUNDO DE
INVESTIMENTO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE PROTEÇÃO
AO CRÉDITO. CESSÃO DO CRÉDITO A TERCEIRO. ILEGITIMIDADE PASSIVA
AFASTADA. NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR. AUSÊNCIA. DEVER DE
INDENIZAR. DANO MORAL. Sendo a ré cessionária do direito de crédito, de
acordo com o disposto no art. 294 do Código Civil, tem legitimidade para responder
por todas as exceções pessoais oponíveis ao cedente. A cessão de crédito realizada
pela Brasil Telecom às empresas demandadas sem a devida notificação do devedor
revela-se ineficaz perante este. Inteligência do artigo 290 do CC/02. A comunicação
prévia prevista no art. 43, § 2º, do CDC não supre a notificação formal do art. 290 do
CC/02. A indevida inscrição do nome do postulante em cadastros restritivos de crédito
acarreta dano moral indenizável. Trata-se do chamado dano moral in re ipsa. Indenização
fixada em R$ 3.000,00, consoante os parâmetros utilizados por esta Câmara Cível em
situações análogas. Aplicação do art. 557, caput, do CPC. APELAÇÃO DESPROVIDA.
RECURSO ADESIVO DESPROVIDO. (TJ-RS; AC 70036430353; Porto Alegre;
Décima Câmara Cível; Rel. Des. Túlio de Oliveira Martins; Julg. 31/05/2010; DJERS
18/06/2010) (grifo nosso)

147
como forma de se proteger da cobrança daquele a quem
realmente pertença a prestação.
O Código Civil também protege o devedor com base no
art. 292, veja que este impõe a possibilidade do devedor ficar
desobrigado, caso antes de ter conhecimento da cessão, pague
ao credor primitivo, ou se houver mais de uma cessão notificada,
pagar ao cessionário que apresentou, com o título de cessão, o
da obrigação cedida.
Conforme o exemplo supra narrado, em que se tem um
devedor, o credor original e duas cessões sucessivas, primeiro a
X, posteriormente a Y. A primeira possibilidade que o Código
Civil agracia o devedor é no caso deste não ter conhecimento
das cessões a X e Y, e o devedor pagar diretamente ao credor
original, nada mais poderá ser cobrado do devedor. X e Y deverão
acertar-se com o credor original.
Neste mesmo sentido o devedor é protegido caso
notificado tanto por X como por Y e apenas um destes se
apresente com o título original do crédito, bem como com
documento que comprove a existência da Cessão. O outro
cessionário nada poderá alegar contra o devedor.
O mesmo art. 292, Código Civil, faz uma terceira ressalva
sobre a sorte do devedor envolvido em pluralidade de cessões
do mesmo crédito, caso exista escritura pública da cessão do
crédito, conforme já tratado anteriormente, esta prevalece sobre
qualquer outra notificação particular. No exemplo citado, o credor
original transfere o crédito primeiro a X e este registra a mesma
por meio de escritura pública, posteriormente Y recebe em cessão
o mesmo crédito e apenas notifica por meio de carta ao devedor,
este poderá pagar a X, em razão de a escritura pública prevalecer
sobre a notificação particular. Quanto a estas situações veja as
jurisprudências:102
48394998 - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CESSÃO DE
CRÉDITO. NOTIFICAÇÃO. AUSÊNCIA.

102
Fonte DVD Magister. Edição 42. Fev-Mar/2012.

148
CADASTRO DE INADIMPLENTES. MORA. 1.
Na efetuação da cessão de crédito é desnecessário o
consentimento prévio do devedor, visto que este não
tem o condão de obstar a transmissão do crédito. 2. O
dever de informar o devedor da cessão, previsto no
artigo 290 do CC, consiste em um dever anexo de
lealdade, cujo intuito é comunicá-lo que, após a
notificação, a dívida deverá ser paga ao novo credor
(cessionário), e não ao primitivo (cedente), além de
poder gerar, diante da inércia do cedente, a sua
responsabilidade por danos ao cessionário. 3. A
notificação do devedor, na cessão de crédito, não é
pressuposto para a sua configuração em mora,
tampouco para a validade da cessão, tendo como
objetivo apenas evitar o pagamento, por equívoco, ao
credor primitivo. Ausente, contudo, a notificação, caso
o pagamento ocorra, é válido e desobriga o devedor
(art. 292 do Código Civil). 4. Ainda que ausente a
notificação, demonstrado que a dívida já existia antes
mesmo da cessão, a negativação do nome do devedor
pelo cessionário é legítima, eis que decorrente de
exercício regular de direito. 5. Apelação provida. (TJ-
DF; Rec 2009.01.1.163333-0; Ac. 547.977;
Primeira Turma Cível; Relª Desª Lucimeire Maria
da Silva; DJDFTE 24/11/2011; Pág. 95) CC, art.
292

52120872 - RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL.


SENTENÇA PROFERIDA EM CONJUNTO
PARA DOIS PROCESSOS CONEXOS.
EMBARGOS DO DEVEDOR E AÇÃO
DECLARATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO.
POSSIBILIDADE. ILIGITIMIDADE DE PARTE.
REJEIÇÃO. MÉRITO. CESSÃO DE CRÉDITO.
PAGAMENTO FEITO AO CEDENTE. PRÉVIA
NOTIFICAÇÃO EXISTENTE. INEFICÁCIA.
INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 292, 308 E
309 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO.
PRETENSÃO DE NULIDADE DA EXECUÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE. MAJORAÇÃO DOS
DANOS MORAIS. INACOLHIMENTO. BEM DE
FAMÍLIA DEMONSTRADO. LEI Nº 8009/90.
LIBERAÇÃO DA PENHORA. CORRETA
APLICAÇÃO DA LEI. MAJORAÇÃO DOS
149
HONORÁRIOS EM EMBARGOS. NÃO
ACOLHIMENTO. Sendo os feitos conexos ou
existindo a continência, possível se apresenta o
julgamento simultâneo e numa única sentença os
embargos do devedor interpostos e a ação ordinária
proposta, sobretudo quando, por aspectos
prejudiciais, ambas estão ligadas por um liame
jurídico indissolúvel, sob pena de decisões
contraditórias e inexigíveis. Se a parte recebe
determinado valor, alcunhada de suposto preposto
de outra, a questão se resolve com o mérito e, por
conseqüência, não há o que se falar em ilegitimidade
de parte. Quando o devedor, previamente notificado
da cessão de crédito a terceiros, sabedor de que o
pagamento deveria ser efetuado ao cessionário, efetua,
ao seu talante e por conta e risco, o pagamento ao
cedente, sendo demonstrado de que não foi feita a
necessária transferência, este pagamento, em
desconforme com o estabelecido a espécie, é
considerado ineficaz e, por conseqüência, não serve
para quitar o processo execução em andamento
promovido pelo novo credor. Credor putativo (artigo
309, CC), é aquele que ostenta a aparência de credor
ou de pessoa autorizada a receber o credito, situação
que não se concilia em favor da parte desidiosa que,
sabedora do endosso translativo do título, desconhece
esta situação, efetua o pagamento ao cedente. Correta
é a sentença que, não acolhendo a pretensão de
quitação da obrigação estabelecida ao cessionário e
alvo do processo de execução promovida pelo
cessionário, condena aquele que recebeu
indevidamente o valor a restituí-lo integralmente ao
que foi ludibriado. Patente que o ato causou danos
morais ao pagador, correta é a condenação em danos
morais. Estando o valor de acordo com o principio
da razoabilidade e da proporcionalidade, não se fala
em majoração ou minoração, devendo o valor fixado
pelo juiz de piso (r$30.000,00), para a situação
concreta, ser mantido em grau recursal. Se há
demonstração nos autos de que o bem penhorado no
processo de execução, imóvel urbano, é o local onde
o embargante/executado tem sua moradia com sua
família, albergado na Lei de Regência, não há o que

150
se falar em penhora e, se feita, esta deve ser excluída,
como o feito na sentença guerreada. “o bem de família
consiste na separação de um patrimônio, móvel ou
imóvel, capaz de garantir a sobrevivência da família”
(rtjsp, 135/294). Para arbitramento de verba de
sucumbência em sede de embargos do devedor, não
se tratando de sentença condenatória, deve o
magistrado pautar pela observância do § 4º, do artigo
20, código de processo civil e não em percentual
estabelecida no § anterior. Divisando que a sentença
de piso, arbitrando o valor em quantia determinada
(r$6.000,00) e estando esta dentro do princípio da
razoabilidade e da proporcionalidade e em face dos
predicados estabelecidos a espécie, não há o que se
falar na elevação da verba honorária pretendida. (TJ-
MT; APL 24241/2011; Água Boa; Quinta Câmara
Cível; Rel. Des. Sebastião de Moraes Filho; Julg.
09/11/2011; DJMT 17/11/2011; Pág. 40) CC, art.
292 CC, art. 308 CC, art. 309

Em ambas, observa-se justamente a situação apresentada,


bem como a resposta do judiciário à aplicação do art. 292, Código
Civil. O devedor pode se proteger em decorrência da ignorância,
mas não pode fazê-lo caso tenha sido devidamente notificado.

1.5 Dos atos conservatórios


A leitura do art. 293, Código Civil, apresenta a
possibilidade de o cessionário proteger o crédito recebido, ele
poderá realizar os atos necessários à proteção de seu crédito,
bem explica Rizzardo103:
Ao que recebe um crédito assegura-se o uso dos
remédios judiciais admissíveis para a defesa de seu
crédito. Nesta ênfase, pode promover a busca e
apreensão de um título, ou pleitear o seu sequestro,
de modo que não proceda o cedente a transferência a
terceiros.[...]
Inclusive perante o devedor asseguram-se os meios
de defesa. Se ele deve efetuar o pagamento, e está

RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.


103

Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 268.

151
desbaratando seu patrimônio, assiste ao cessionário
as medidas de proteção, como averbação, no registro
de imóveis, de protesto contra a alienação, ou a busca
e apreensão do bem objeto do crédito cedido, e que
está o devedor obrigado a entregar ao seu credor.

Como explicado, é transmitido ao cessionário não apenas


o direito de exigir e receber um crédito, o cessionário disporá de
direitos que o credor original possuía. Poderá, o cessionário, atuar
de forma ativa na proteção de seus interesses, não apenas
propondo as medidas supramencionadas, mas inclusive atuando
na cobrança administrativa de seu crédito. Veja:
91942215 - APELAÇÃO CÍVEL.
RESPONSABILIDADE CIVIL. CESSÃO DE
CRÉDITO. INSCRIÇÃO DO DEVEDOR EM
ÓRGÃO DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO.
COMPROVADA NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR
DA CESSÃO. DÉBITO ORIGINÁRIO
EXISTENTE. EXERCÍCIO REGULAR DE
DIREITO. ATO ILÍCITO NÃO
CARACTERIZADO. Comprovado nos autos a
existência do crédito que fora objeto da cessão, oriundo
de negócio jurídico celebrado entre o cedente e o
cessionário, bem como a notificação prevista no art.
290 do CPC. Outrossim, mesmo a eventual ausência
de notificação do devedor relativa à cessão de crédito
não interferiria na validade do negócio jurídico
entabulado entre o credor originário (cedente) e o
credor atual (cessionário), que não resta obstado de
adotar as medidas tendentes a preservação do seu
crédito, independentemente do conhecimento do
devedor acerca da cessão, conforme lhe faculta o art.
293, do Código Civil, tais como o registro em cadastros
restritivos. Apelo desprovido. (TJ-RS; AC 430763-
26.2011.8.21.7000; Porto Alegre; Nona Câmara Cível;
Rel. Des. Leonel Pires Ohlweiler; Julg. 23/11/2011;
DJERS 28/11/2011) (grifo nosso)

Os atos do cessionário são de proteção, não realizando


qualquer conduta que confronte a validade do negócio jurídico.
Haverá a permissão legal para aquele tomar as providências
necessárias, a fim de garantir o recebimento do crédito negociado.
152
1.6 Das exceções
Os atos de proteção, realizados pelo cessionário, podem
sofrer efeitos não agradáveis, caso ocorra ausência de notificação
ao devedor. O art. 294, Código Civil, retrata a possibilidade de o
devedor levantar questões em sua defesa e contra a existência,
validade e/ou liquidez do débito, a já falada e apresentada
EXCEÇÃO.
O citado artigo afirma que o “devedor pode opor ao
cessionário as exceções que lhe competirem, bem como as que,
no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha
contra o cedente”, apesar de não ser obrigatória, nota-se a
importância da notificação da cessão ao devedor. Este, no
momento em que toma conhecimento da cessão pode opor as
exceções, situação que inclusive possibilita ao devedor nada
pagar caso a exceção que o mesmo tenha a apresentar destitua a
existência do próprio crédito. Bem explica a jurisprudência:
47055149 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE
EXECUÇÃO. CÁRTULA ENDOSSADA.
CESSAO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE
NOTIFICAÇAO AO DEVEDOR. PAGAMENTO
REALIZADO AO ANTIGO CREDOR.
EVIDENCIADO O PAGAMENTO A CREDOR
PUTATIVO. DÍVIDA QUITADA. RECURSO
NÃO PROVIDO. 1. Deve ser julgado improcedente
o pedido de ação execução, fundada em cheque
endossado para terceiro, quando fica evidenciado
que o emitente devedor pagou a dívida diretamente
ao credor putativo com quem tinha realizado no
negócio de compra e venda em detrimento, ao atual
portador da cártula com quem nunca teve qualquer
relação jurídica. 2. O objetivo da notificação é
informar ao devedor quem é o seu novo credor, isto
é, a quem deve ser dirigida a prestação. A ausência
da notificação traz essencialmente duas
consequências: Em primeiro lugar dispensa o
devedor que tenha prestado a obrigação diretamente
ao cedente de pagá-la novamente ao cessionário. Em
segundo lugar permite que devedor oponha ao
cessionário as exceções de caráter pessoal que teria

153
em relação ao cedente, anteriores à transferência do
crédito e também posteriores, até o momento da
cobrança (inteligência do artigo 294 do CC/02) 3.
Recurso conhecido e improvido. (TJ-CE; APL
48215-63.2003.8.06.0000/0; Sexta Câmara Cível;
Rel. Des. Jucid Peixoto do Amaral; DJCE 01/09/
2011; Pág. 91)104

O devedor tem a seu favor justamente a inexistência de


notificação, quando o mesmo toma conhecimento da cessão
pode alegar as suas defesas pessoais, que maior defesa do que o
fato que já pagou a dívida? Não existe melhor proteção ao
devedor, caso o cessionário houvesse realizado a tão citada
notificação não sofreria os efeitos retratados na jurisprudência.

1.7 Da responsabilidade
Apresentadas as imposições anteriores, deve-se passar a
tratar da responsabilidade pela própria cessão e a existência do
crédito. Importante lembrar que a questão deve ser vista além
dos dispositivos legais, a aplicação da boa-fé objetiva se faz
necessária em todos os negócios jurídicos, principalmente nas
obrigações. A boa-fé objetiva impõe o respeito a deveres além
dos explicitamente esboçados e acordados, as partes têm o dever
de agir com zelo, honestidade e lealdade. O desrespeito a este
princípio é capaz de gerar direito a reparação.
A cessão depende, mais do que se imagina, da boa-fé entre
as partes envolvidas na transferência do crédito. O credor original
cede ao cessionário seu direito contra o devedor, o cessionário
recebe este direito e pode exigir a satisfação do originalmente
acordado entre credor e devedor (cedente e cedido). Assim,
mesmo tendo a possibilidade de aplicar o princípio supraexposto,
o Código Civil impôs dispositivo tratando diretamente da
responsabilidade das partes envolvidas na cessão, veja o art. 295:
Art. 295. Na cessão por título oneroso, o cedente,
ainda que não se responsabilize, fica responsável ao

104
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

154
cessionário pela existência do crédito ao tempo em
que lhe cedeu; a mesma responsabilidade lhe cabe
nas cessões por título gratuito, se tiver procedido de
má-fé.

O Código Civil impõe a necessidade de existência do


débito ao tempo em que foi cedido, veja que a legislação está
exigindo que o crédito tenha validade e seja legítimo, neste
momento não se retrata a questão do próprio adimplemento do
mesmo, nas palavras de Venosa105:
[...], na cessão de crédito onerosa, mesmo não se
responsabilizando pelo crédito, fica responsável ao
cessionário pela existência do crédito à época da
cessão. Mutatis mutandis, na cessão de posição
contratual, o cedente é responsável pela existência
do contrato, por sua validade e pela posição que está
cedendo.

O cedente tem o dever legal de garantir a validade do


crédito a que tem direito e resolveu transferir ao cessionário.
Este tem o direito de exigir que o cedente garanta a validade
do negócio, possibilitando assim, quando da época de
recebimento do crédito, que o cessionário o receba, sem
quaisquer vícios.
A questão envolve a própria existência do crédito, o
credor original (cedente), ao realizar a cessão, deve fazê-lo sabendo
que caso o crédito seja declarado nulo, ele (cedente) assumirá a
responsabilidade pela existência do mesmo e deverá arcar com
o prejuízo do cessionário, mesmo que não tenha se
responsabilizado diretamente.
Serpa Lopes afirma ser esta uma obrigação garantia, na
qual o cedente tem a responsabilidade pela existência do crédito,
devendo responder ao cessionário caso o crédito torne-se
inexistente, afirma106:

105
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil : teoria geral das obrigações e teoria geral
dos contratos. Volume II. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003, p 355.
106
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil – obrigações em geral.
Volume II. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 1955, p 530.

155
Em síntese: a responsabilidade do cedente pela
existência do crédito se opera: 1.º) quando o crédito
por êle cedido já não existe no momento da cessão;
2.º) quando o cedente não é o seu legítimo titular;
3.º) quando o crédito está inquinado de vício de modo
a torná-lo suscetível de anulação ou de nulidade; 4.º)
quando sôbre êle pender direito impeditivo de sua
transferência plena.

As observações de Lopes dispõem sobre a própria


validade do crédito e do título que o representa, estando este
devidamente constituído, sem vícios de validade e sendo o
devedor solvente, não se debaterá a possível inadimplência deste.
A questão supra-apresentada é imposta aos contratos onerosos,
não importando a boa-fé ou má-fé do cedente, vez que ele
responde caso o contrato não tenha validade, pela mera culpa.
O mesmo não ocorre em situações similares envolvendo
contratos a título gratuito, nestes casos o cedente responderá
apenas por má-fé. Bem leciona Rizzardo107:
Na gratuita, para ensejar a responsabilidade,
indispensável a prova da má-fé de parte do cedente.
Como nada deu em troca o cessionário, nada perde o
mesmo. Mas, demonstrado que maliciosamente o
crédito cedido havia sido transferido a terceiro, ou
que simplesmente inexistia, não se reconhece a
isenção de responsabilidade. Cabe ao cedente a
indenização, pois não admitida a conivência com a
má-fé.

O Código Civil não pactua com a má-fé do cedente,


mesmo em um tipo contratual no qual não haveria
contraprestação, como o contrato de doação, ocorrendo má-fé,
o cedente sofrerá os efeitos de seu ato, sendo obrigado a ressarcir
os prejuízos que o cessionário sofrer.
A validade do crédito e a responsabilidade sobre o
mesmo, por vezes, se confunde com o próprio pagamento. O

RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.


107

Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 271.

156
que se apresentou foi justamente a diferença entre estas situações,
a validade de um crédito não implica que o mesmo será pago,
pode acontecer justamente o contrário, em contraposição pode-
se ter uma obrigação não exigível sendo adimplida, como uma
mera obrigação natural sendo paga.
As questões envolvendo a validade e o adimplemento
não necessariamente possuem a mesma repercussão para o
cedente, a responsabilidade do cedente quanto à validade do título
independe de acerto entre as partes, neste caso sempre o cedente
é responsável pelo crédito.
Já na questão envolvendo o pagamento propriamente dito
(a entrega do crédito ao cessionário) a responsabilidade do
cedente dependerá do acordado em termo de cessão. A
responsabilidade pela solvência (pagamento) do crédito, por parte
do devedor ao cessionário, depende da conveniência das partes
envolvidas na cessão.
O artigo 296 declara que salvo estipulação em contrário, o
cedente não responderá pela solvência do devedor, ou seja, caso
no momento em que se perfez a cessão não for convencionado a
responsabilidade do cedente pelo pagamento do crédito e o
devedor (cedido) não cumpra a obrigação na data estipulada, nada
poderá o cessionário fazer contra o cedente, restringindo-se aquele
(cessionário) a cobrar a dívida apenas do cedido (devedor).
São duas as modalidades de cessão utilizadas para
determinar a responsabilidade do cedente, quais sejam a pro soluto
e a pro solvendo, o Código Civil estipula que as cessões são pro
soluto, no caso de silêncio dos contratantes. O credor original
(cedente) apenas responde pela validade/existência do crédito,
não podendo ser a ele imposto que pague a prestação devida,
caso o devedor (cedido) deixe de fazê-lo.
No segundo tipo de cessão, a pro solvendo, há um
compromisso do credor original (cedente). Caso o cedido deixe
de cumprir sua obrigação aquele poderá sofrer a cobrança por
parte do cessionário, assim leciona Gama108.

Gama, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo, Atlas,
108

2008. Pags. 425/426.

157
A respeito, devem-se distinguir duas modalidades de
cessão: (a) cessão pro soluto; (b) cessão pro solvendo.
De acordo com a primeira – a cessão pro soluto -, o
cedente apenas garante a existência do crédito, sem
responder pela solvência do devedor, ao passo que,
na segunda, o cedente obriga-se a pagar a dívida se o
devedor for insolvente, mas limitado tal pagamento
ao que recebeu do cessionário com os juros daí
decorrentes.

A solvência do crédito, inicialmente, é de responsabilidade


exclusiva do devedor (cedido), podendo se exigir do credor
original (cedente) apenas nas situações em que ele se
comprometeu a arcar, caso o devedor não cumprisse com a
prestação, bem informa a seguinte jurisprudência.
60028004 - COMERCIAL. APELAÇÃO CÍVEL.
Ação declaratória de nulidade de cláusulas contratuais
c/c obrigaç ão de fazer. contrato de fomento mercantil
(factoring). cheques. Devedores primitivos
(emitentes). inadimplemento. Empresa faturizada.
responsabilização. Previsão contratual. Art. 296 do
atual Código Civil. Em sede de contrato de fomento
mercantil ( factoring), em regra, a responsabilidade
pelo pagamento do título de crédito é do seu emitente,
salvo se as partes contratarem de forma diversa,
estando, para tanto, autorizadas pelo art. 296 do
vigente Código Civil. É da empresa faturizada o
encargo de adimplir o título de crédito, no caso de o
emitente deste não honrar sua obrigação perante a
empresa faturizadora, se assim restou consignado no
contrato de fomento mercantil celebrado entre as
partes. Conhecimento e provimento do apelo.
Improcedência do pedido formulado na ação
declaratória. (TJ-RN; AC 2010.006360-1; Segunda
Câmara Cível; Rel. Juiz Conv. Klaus Cleber Morais
de Mendonça; DJRN 19/11/2010; Pág. 66)109

1.8 Da limitação à responsabilidade


A possibilidade de exigir que o cedente cumpra a
obrigação, caso o cedido não o faça, recebe uma limitação legal,
109
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

158
qual seja o art. 297, Código Civil, este impõe que o cedente não
responde por mais do que recebeu do cessionário, mais os juros
e deverá ressarcir as despesas da cessão e as que o cessionário
houver feito com a cobrança.
O cedente não poderá sofrer a imposição de pagar valores
maiores que a vantagem recebida do próprio cessionário, por
exemplo, Carlos possuía uma Nota Promissória no valor de R$
10.000,00, emitida em seu favor por Fábio. Carlos resolve ceder
seu direito de receber este crédito a Raimundo. Este entrega a
Carlos a importância de R$ 7.000,00 pelo crédito original e exige
que caso Fábio não pague, Carlos assuma o débito.
Pois bem, se Fábio não pagar, Raimundo apenas poderá
cobrar de Carlos os valores correspondentes ao que foi
desembolsado em favor deste para ocorrer a cessão. Carlos
estaria obrigado a ressarcir a Raimundo o valor de R$ 7.000,00,
mais os juros pelo atraso e quaisquer outras despesas que por
ventura tenham ocorrido na realização da cessão ou para cobrar
o débito (despesas com correspondência, taxas dos cartórios
para registro da cessão, deslocamento para exigir o
pagamento...).
Esta situação surge como forma de evitar o
enriquecimento sem justa causa do cessionário, não se pode impor
que cedente pague mais do que a vantagem realmente recebida.
Em se falando de enriquecimento sem causa, Orlando Gomes110
assim entendia:
Há enriquecimento ilícito quando alguém, a expensas
de outrem, obtém vantagem patrimonial sem causa,
isto é, sem que tal vantagem se funde em dispositivos
de lei ou em negócio jurídico anterior. São
necessários os seguintes elementos: a) o
enriquecimento de alguém; b) o empobrecimento de
outrem; c) o nexo de causalidade entre o
enriquecimento e o empobrecimento; d) a falta de
causa ou causa injusta.

110
Gomes, Orlando. Obrigações. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p 303.

159
Como visto, o enriquecimento ocorre com o acréscimo
de patrimônio de forma injusta, tal matéria é tratada nos arts.
884 e seguintes do Código Civil, que visa evitar esta forma ilícita
de agregar riqueza, bem como a própria restituição dos valores
recebidos de forma injusta.

1.9 Da penhora
Uma vez penhorado o crédito, não pode mais o credor
transferi-lo, ou seja, aquelas situações em que um credor tem a
sua disposição diversos créditos, no entanto todos estes são
penhorados em processos que este credor sofre, não poderão ser
cedidos. Exemplificando: Jorel, é credor de Wayne da
importância de R$ 500.000,00. Ele possui um crédito que pode
ser negociado. No entanto, Jorel é devedor de Xavier e este
ajuizou ação executiva contra Jorel, nesta ação foi penhorado o
crédito de R$ 500.000,00. Neste caso, Jorel, sabedor da penhora,
fica impossibilitado de realizar cessão da mesma, é o que impõe
o caput do art. 298, vez que afirma que o “crédito, uma vez
penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor que tiver
conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo
notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o
credor os direitos de terceiro”.
A parte final deste artigo possibilita proteção ao devedor,
quando o exonera de responsabilidade, nos casos em que não
conhecia a penhora. No exemplo dado, caso Wayne não saiba
da penhora e na data de pagamento se apresente perante Jorel e
realize o pagamento dos R$ 500.000,00, nada poderá ser alegado
contra o devedor (Wayne). O credor que recebeu o crédito é
quem tem o dever de responder perante os terceiros interessados
na obrigação, conforme art. 298, in fine, Código Civil.

2. Assunção de dívida
2.1 Noções gerais
Assim como a cessão de crédito, este tipo de transmissão
de uma relação obrigacional não era aceito pelo Direito Romano,
a assunção surge como consequência clara dos interesses da
160
sociedade. O Código Civil de 1916 não previa este tipo de
transmissão, ela apenas foi codificada em 2002, com o atual
Código Civil foram estipuladas as regras sobre este tipo de
transmissão da prestação.
A transmissão estudada na assunção é a da posição passiva
da obrigação, transmite-se o dever de pagar a prestação, talvez por
isso a estranheza quanto a este instituto, pois é difícil achar quem
queira assumir a posição passiva em uma relação obrigacional e
se obrigar a pagar uma prestação que originalmente não é sua.
Essas situações, apesar de inusitadas, podem acontecer, por
exemplo, veja a firma individual “Quitanda do Sheldon”, com
esta firma o Sr. Sheldon sustenta a esposa e três filhos. Um dia
Sheldon amanhece morto, a firma por ser em seu nome não poderá
mais funcionar, devendo encerrar as atividades e ser inventariada,
como único patrimônio do Sr. Sheldon. Ocorre que caso a firma
feche, a família perderá sua fonte de renda.
Nesta situação, o filho mais velho se apresenta aos
credores do falecido pai e diz que assumirá as dívidas pendentes,
pede a estes mesmos credores, que sejam mantidas as linhas de
crédito do mercadinho, assim a firma poderá continuar suas
atividades. Este é um exemplo de assunção.
Da forma apresentada, este instituto poderia ser
confundido com a novação. Poder-se-ia afirmar que esta troca
do polo passivo geraria na realidade uma novação, vez que esta
mudança estaria surgindo uma nova relação obrigacional. No
entanto, o que se observar é o vínculo original ser mantido, com
todas as exigências e estipulações do pacto original.
Por conta da manutenção do vínculo é que a obrigação
original é mantida, o conceito da assunção segundo Rodrigues111
é o “negócio pelo qual o devedor transfere para outra pessoa sua
posição na relação jurídica, de modo que esta o substitua na
obrigação” e complementa Rizzardo112, “por esta figura, faculta-

111
RODRIGUES, Silvio. Direito civil – Parte geral das obrigações. Volume II. 20 ed.
São Paulo: Saraiva, 1991, p 338.
112
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 282.

161
se ao terceiro assumir a obrigação do devedor, desde que
expressamente consinta o credor”. As duas características
essenciais a este tipo de cessão são vislumbradas nestes
conceitos: a troca ocorrida no polo passivo e a anuência do credor.
O Código Civil, neste sentido, afirma que é “facultado a
terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento
expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo
se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o
ignorava”(art. 299). Este novo devedor receberá a denominação
de ASSUNTOR.

2.2 Do consentimento expresso


Não há que se falar em assunção de dívida sem a
interferência expressa do credor, a este é dado o direito de dizer
se aceita ou não a troca dos devedores, caso não forneça seu
consentimento, não surtirá efeito a tentativa de ceder o débito.
Necessário lembrar que este consentimento, deve ser expresso.
Não será admitido como aceitação o mero silêncio do credor.
Por exemplo: veja Fred, que se apresenta a Hering,
dizendo que assumirá um débito de Wilma (decorrente do
conserto de seu carro). Caso Hering apenas dê as costas a Fred e
nada fale, seu silêncio não será interpretativo como aceite e sim
como RECUSA. Nesta situação quem cala não consente. Veja a
jurisprudência113:
93119832 - AÇAO DE OBRIGAÇAO DE FAZER
DE TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE DE
VEÍCULO AUTOMOTOR CUMULADA COM
PEDIDO DE REPARAÇAO DE DANOS.
COMPRA E VENDA DE AUTOMÓVEL.
IMPOSSIVEL A TRANSFERÊNCIA DA
PROPRIEDADE PARA O NOME DO RÉU
ENQUANTO NÃO QUITADO O
FINANCIAMENTO BANCÁRIO GARANTIDO
POR ALIENAÇAO FIDUCIÁRIA. Também não
se afigura possível a transmissão do financiamento

113
Fonte DVD Magister – Ed. 43. Abril/maio de 2012.

162
do veículo para o demandado porque depende de
anuência expressa da instituição financeira credora,
na forma do art. 299 do Código Civil. Dano moral
não evidenciado. Os danos suportados pelo
demandante em virtude das infraçoes de trânsito
cometidas pelo demandado foram suportados em
virtude de desídia do demandante, único obrigado de
acordo com o § 7º do art. 257 do código de trânsito
brasileiro a apresentar o condutor do veículo de modo
a se eximir da inclusão de pontos em sua carteira de
habilitaçao. Recurso inominado provido. (TJ-RS;
RecCv 33214-40.2010.8.21.9000; São Gabriel;
Primeira Turma Recursal Cível; Rel. Des. Edson
Jorge Cechet; Julg. 19/12/2011; DJERS 17/01/
2012)(grifo nosso)

A interferência do credor com a apresentação de sua


anuência expressa é condição essencial para a existência da
assunção, sem o cumprimento desta exigência não se poderá
falar da validade deste tipo de cessão. O parágrafo único, do art.
299, Código Civil, não deixa nenhuma dúvida sobre esta
exigência quando afirma que qualquer “das partes pode assinar
prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida,
interpretando-se o seu silêncio como recusa”(grifo nosso).

2.3 Dos tipos de assunção


São apresentadas duas classificações para se analisar a
assunção, uma divide a assunção em liberatória e cumulativa e a
outra a divide em assunção por expromissão e por delegação.
Veja cada uma:

a) Liberatória e cumulativa
Na primeira classificação a assunção liberatória será
aquela assunção na qual o novo devedor assume a dívida e se
obriga a pagar a prestação, ocorrendo liberação do devedor
original e toda responsabilidade sobre o pagamento é do novo
devedor (assuntor).
Na cumulativa já ocorre uma situação inversa, o assuntor
é aceito como novo devedor, mas o credor exige que o devedor
163
primitivo fique atrelado ao negócio, não sendo liberado de sua
responsabilidade perante o credor. Logo este poderá cobrar o
cumprimento da prestação tanto do devedor primitivo como do
assuntor. Gera-se, assim, uma obrigação solidária, na qual o credor
terá o direito de cobrar a prestação de qualquer de seus devedores.

b) Por expromissão e por delegação


Nesta segunda forma de classificação é utilizado como
critério a própria indicação do assuntor, na assunção por
expromissão o assuntor (novo devedor) assume a posição do
polo passivo por apresentar-se diretamente ao credor ou por ser
indicado pelo próprio credor, não havendo participação do
devedor nesta indicação. Por exemplo, Luiz, plenamente capaz
e mora com os pais, faz uma grande conta no mercadinho perto
de sua casa. O dono do mercadinho tem dúvidas se receberá
esta conta, e sem consultar Luiz fala ao pai deste sobre a
obrigação, o pai prontamente assume a conta. Aqui se tem uma
situação de expromissão, o pai de Luiz assume a posição de
assuntor (novo devedor) sem nada informá-lo.
Na assunção por delegação, conforme o próprio nome
diz, ocorre a indicação por parte do devedor primitivo de quem
será o novo devedor (assuntor), lógico que em ambas as
assunções será necessária a autorização expressa do credor.
Seguindo o exemplo do mercadinho, antes do dono do mercado
falar algo com o pai de Luiz, este pede a um tio que assuma a
conta. O tio de Luiz será um assuntor indicado por Luiz.

2.4 Dos efeitos da assunção


As consequências da assunção são definidas no Código
Civil, a principal, segundo o art. 299, é justamente a exoneração
do antigo devedor. Duas observações são feitas a esta situação,
a primeira é que nada impede que o credor em vez de liberar o
devedor primitivo, exija que este permaneça atrelado à relação
obrigacional, conforme a assunção cumulativa, ficando devedor
primitivo e assuntor inseridos na relação como devedores
solidários.
164
A segunda observação trata da validade da assunção, esta
pode ser invalidada caso o assuntor seja insolvente civil e esta
informação não seja de conhecimento do credor. Assim, o
devedor primitivo não estaria liberado de sua responsabilidade,
pelo mero fato de um novo devedor assumir o débito, o assuntor
sendo insolvente acarreta o retorno do devedor primitivo à
relação, evitando que ocorra fraude.
Outra consequência da assunção refere-se às garantias
prestadas para o pagamento da prestação. O art. 300, Código
Civil, impõe que salvo “assentimento expresso do devedor
primitivo, consideram-se extintas, a partir da assunção da dívida,
as garantias especiais por ele originariamente dadas ao credor”.
Aqui cabe imediatamente um questionamento, o que seriam estas
garantias especiais.
A doutrina debate este tema, alguns entendem que há
apenas má textualização, sendo estas todas as garantias dispostas
em favor da proteção à obrigação, no entanto tende esta obra a
seguir o entendimento de Diniz114:
Sobrevivência das garantias reais (penhor, hipoteca),
prestadas pelo devedor originário, que acediam à
dívida, com exceção das garantias especiais (fiança,
aval, hipoteca de terceiro) que foram constituídas,
em atenção à pessoa do devedor, por terceiro alheio à
relação obrigacional, a não ser que ele consinta na
sua permanência.

Entende-se que para possibilitar a certeza do pagamento,


haveria dois tipos de garantia, aquelas de caráter pessoal,
fornecidas pelo próprio devedor ao credor, normalmente penhor
ou hipoteca. E a garantia fornecida por terceiros, em total
atenção e repeito ao devedor, nas quais esses terceiros
apresentam-se como a forma de garantir o pagamento da
prestação em caso de inadimplemento por parte do devedor
original.

114
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2: Teoria geral das
obrigações. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p 479.

165
A ideia é que estas garantias foram fornecidas em razão
da pessoa do devedor original, não sendo justo a um fiador ou
avalista, que se mantenha preso a uma relação obrigacional na
qual o devedor que o mesmo estava garantindo tenha sido
substituído por um novo devedor (assuntor) que o garantidor
pode nem conhecer.
No sentido de pacificar a questão, veja o enunciado abaixo
transcrito do CJF, lavrado na IV Jornada de Direito Civil:
Nº 352.
Art. 300: Salvo expressa concordância dos terceiros,
as garantias por eles prestadas se extinguem com a
assunção de dívida; já as garantias prestadas pelo
devedor primitivo somente são mantidas no caso em
que este concorde com a assunção.

As garantias dadas por terceiros apenas são mantidas


na assunção no caso de expresso aceite dos garantidores,
aquelas prestadas pelo próprio devedor primitivo serão
mantidas pelo mero aceite deste 115. Esta apresentação das
garantias especiais, como aquelas fornecidas por terceiros, é
de certa forma referendada pelo art. 301, que afirma que se
“a substituição do devedor vier a ser anulada, restaura-se o
débito, com todas as suas garantias, salvo as garantias
prestadas por terceiros, exceto se este conhecia o vício que
inquinava a obrigação” (grifo nosso).

115
54523005 - AÇÃO COMINATÓRIA. DEPÓSITO DE GRÃOS EM GARANTIA
DA DÍVIDA. DESPESAS DE ARMAZENAGEM. OBRIGAÇÃO DA
DEPOSITANTE ATÉ NOTIFICAÇÃO DO TERCEIRO FAVORECIDO.
ASSUNÇÃO DA DÍVIDA POR TERCEIRO. EXTINÇÃO DA GARANTIA DADA
PELO DEVEDOR PRIMITIVO. LIBERAÇÃO DO BEM. MORA DO CREDOR.
RESPONSABILIDADE PELOS PREJUÍZOS DAÍ DECORRENTES. Depositados
os grãos, com cláusula à ordem em benefício da autora, vinculada à liberação do réu (f.
6) e, não havendo prova de ajuste contratual em contrário, a autora é mesmo a
responsável pelas despesas do referido armazenamento. Ocorrida a sucessão de
devedores, extinguiu-se a garantia da dívida dada pela autora, devendo o réu proceder
a sua liberação, nos termos do art. 300 do Código Civil. Extinta a garantia da dívida
dada pela devedora primitiva, ao credor incumbe sua liberação, sob pena de responder
pelos prejuízos daí advindos. (TJ-MG; APCV 1.0470.05.019956-6/0021; Paracatu;
Décima Quarta Câmara Cível; Rel. Des. Valdez Leite Machado; Julg. 15/05/2008;
DJEMG 10/06/2008)

166
Nos casos de nulidade da assunção há imposição no
sentido de que seja restabelecida a relação obrigacional original,
com todas as garantias oferecidas pelo devedor, exceto aquelas
dadas em atenção à pessoa do devedor. A exceção que se
apresenta é no caso deste terceiro garantidor conhecer a
nulidade, nesta situação é restabelecida inclusive a garantia dada
por ele.
Por exemplo, Luiz deve R$ 2.000,00 à Flávio, esta dívida
tem seu pagamento garantido por Marcos (Avalista). Luiz
apresenta a Flávio o Sr. Anderson, como pessoa que pagará a
conta por ele, Flávio concorda com a assunção. Veja que neste
caso se tem: a) devedor original: Luiz; b) avalista (terceiro
garantidor): Marcos; c) credor: Flávio e d) assuntor: Anderson.
Pela situação original, com a assunção, Luiz deixaria o vínculo
com Flávio e o novo devedor deste seria Anderson. Marcos por
não ter sido consultado verificaria a extinção da garantia dada,
com base no art. 300.
Agora, imagine que Anderson tem apenas 15 anos de
idade. A assunção não tem validade, devendo ser anulada, neste
caso se restabelecerá a relação original, de Luiz com Flávio. A
priori Marcos continua liberado da garantia, exceto se ele tinha
conhecimento da idade de Anderson, neste caso ele retorna a
sua posição original de avalista.

2.5 Das exceções e da hipoteca


A defesa contra a cobrança da obrigação foi apresentada
em capítulos anteriores, esta é conhecida como exceção. O art.
302 do Código Civil impõe uma regra notória, a de que o assuntor
não poderá alegar em seu benefício as exceções pessoais do
devedor primitivo. Exemplificando, caso o devedor primitivo
possua valores a compensar com o credor, o assuntor não poderá
realizar o encontro de contas em nome daquele, vez que neste
caso se tem uma exceção pessoal.
Por fim, aparece na assunção uma situação utilizada por
pessoas que querem adquirir um imóvel, o financiamento. A
pessoa realiza a compra e deve o valor do imóvel perante uma
167
instituição financeira, passado algum tempo esta pessoa pode
querer transferir este bem, mas não pode quitá-lo, por não possuir
recursos. O que o comprador da casa pode fazer é transferir o
débito a um terceiro (assuntor).
Existe um detalhe muitas vezes esquecido pelos
particulares envolvidos neste negócio: informar ao credor a
existência da assunção. Lembre-se que é obrigatória a
anuência do credor, com o fito de validar a assunção. Neste
sentido o art. 303, do Código Civil, impõe que o “adquirente
de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento
do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar
em trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o
assentimento”. O adquirente recebe o bem e assume o dever
de pagar o crédito.
Este deve informar ao Banco a assunção, aqui ocorre a
exceção à regra do aceite expresso. Neste caso, se o Banco for
notificado e não exercer o seu direito de recusar a cessão de
débito no prazo de 30 dias, entender-se-á que houve aceite da
assunção.

3. Cessão de contrato
A cessão foi apresentada como a forma de transferir uma
obrigação, seja na posição de crédito ou de débito. Esta
transmissão não pode ser retratada como compra e venda, à
medida que não se apresenta um bem de propriedade de quem
está transmitindo, apresenta-se um crédito e a expectativa de
recebê-lo (ou entregá-lo), assim não há que se falar em entrega
de bens e sim transferência de direitos.
Na cessão (crédito ou débito) se transfere uma posição
dentro da relação obrigacional, mas as relações obrigacionais em
sua grande maioria são bilaterais, ou seja, dentro do mesmo pacto
uma pessoa ocupa a posição de credor e devedor, situação tratada
como a reciprocidade obrigacional, por exemplo: Carlos comprou
um carro de Luis, por R$ 30.000,00, ao mesmo tempo em que
Carlos é credor da prestação carro ele é devedor da prestação
dinheiro.
168
Em decorrência da bilateralidade, pode acontecer de uma
pessoa, inserida em um contrato ainda não concluído, resolva
sair desta relação e realize a cessão do próprio contrato,
transmitindo a inteira posição. Este tipo de cessão é, segundo
Caio Mário116:
[...] aquele em que há a transferência da inteira posição
ativa e passiva do conjunto de direitos e de obrigações
de que é titular uma pessoa, decorrentes de um
contrato bilateral celebrado, mas de execução ainda
não concluída.

E Venosa117 completa:
É indiscutível que a cessão de posição contratual é
negócio jurídico e tem também características de
contrato. Nesse negócio, vamos encontrar que uma
das partes (cedente), com o consentimento do outro
contratante (cedido), transfere sua posição no
contrato a um terceiro (cessionário).

A doutrina apresenta um novo instituto, ainda não


positivado, a cessão de contrato, nessa não se transfere um direito,
é transferida a própria posição que um indivíduo ocupa dentro
de uma relação contratual, com todos os seus deveres e
obrigações, nessa cessão há a confluência de diversos interesses
do cedente (quer sair da relação contratual) e do cessionário (quer
ser inserido naquela relação contratual).
Observa-se que neste tipo de cessão há uma verdadeira
ciranda, na qual não se busca a extinção da relação com a quitação
do débito, mas sim a manutenção do contrato em sua forma
original, apenas com a mudança de uma das partes envolvidas.
Exemplificando, veja o caso de um contrato de locação com
opção de compra de um apartamento, entre Jerry (locatário) e
Spike (dono do imóvel e locador). O citado contrato impõe

116
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Volume II. Teoria
Geral das Obrigações. 22 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 381/382.
117
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos
contratos. Volume II. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003, p 346.

169
direitos e deveres entre as partes, o Spike (dono do imóvel) tem
o dever de garantir a posse ao locatário, emitir recibos, manter
os tributos pagos, arcar com despesas supervenientes do
condomínio, entre outras.
O locatário, por sua vez, tem dever de zelar pelo bem,
aceitar as vistorias, manter em perfeito estado de uso o bem.
Claro que o aluguel é dever do locatário e direito de locador.
Esse contrato ainda terá validade por mais 2 anos. No entanto,
Jerry resolveu morar em outra cidade, não tendo mais interesse
em manter o citado contrato, em decorrência disto resolveu ceder
a posição assumida neste contrato a Tom. Caso Spike concorde
com esta cessão, Tom assumirá a posição original de Jerry,
recebendo o conjunto de direitos e deveres envolvidos nesta
relação, inclusive a opção de compra do imóvel.
Este é o ponto determinante de quando se trata da cessão
de contratos, há uma transferência integral de direitos e deveres,
da qual todas as partes estão cientes. Extrai-se do exemplo um
conjunto de requisitos exigíveis para a perfeita validade desta
cessão. O primeiro requisito envolve as exigências de qualquer
negócio jurídico (forma prescrita ou não defesa em lei, agentes
capazes, objeto lícito, determinado ou determinável), outro
requisito é a integralidade do contrato, conforme exposto não
está se transferindo apenas um direito, como na cessão de crédito,
ou um dever (assunção de dívida), a transmissão negociada é a
própria posição contratual com todos seus ônus e bônus. Assim,
o cessionário recebe a posição contratual na qual ele terá o direito
de cobrar o bem envolvido no contrato, mas em conjunto terá o
dever de arcar com quaisquer pagamentos pendentes por este
bem.
Por fim, a autorização, não apenas do cedido, mas de todos
os envolvidos na cessão. Quando as partes são alteradas no
contrato, a transmissão só pode existir se o cedente, cedido e o
cessionário tiverem real interesse nesta alteração. O cedente com
sua saída do contrato e o cessionário com sua inclusão. O cedido,
também, será obrigatoriamente ouvido, não podendo ocorrer a
cessão sem sua autorização, mesmo porque não seria de seu
170
interesse a inclusão de um cessionário incapaz de arcar com o
cumprimento do contrato118.
A cessão de contrato possibilita a manutenção da
circulação de riquezas ao abrir o caminho para que os indivíduos
presos a um contrato, não mais de seu interesse, possam transmitir
sua posição original sem grandes ônus. Veja que quando o
cessionário assume a posição contratual ele mantém um negócio
jurídico anterior, que pode trazer vantagens a ele, o cedido não
se vê as voltas com a busca de um novo cliente, comprador ou
locatário, vez que a manutenção do contrato possibilita a
manutenção do recebimento de determinado crédito. E ao
cedente, a transferência evita o pagamento de multas por rescisão
bem como a extinção de suas obrigações perante o cedido, não
mais sendo obrigado a pagar.

118
48411555 - DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. NULIDADE DO JULGADO
REJEITADA. CESSÃO DE QUOTA DE CONSÓRCIO. CARTA DE CRÉDITO
PAGA AO TITULAR ORIGINÁRIO. PRETENSÃO DO CESSIONÁRIO DE
RESSARCIMENTO. NÃO ANUÊNCIA DA ADMINISTRADORA DO
CONSÓRCIO QUANTO À CESSÃO. EFICÁCIA DO PAGAMENTO. REFORMA
DA SENTENÇA. 1. Apreciados os pontos controversos, o julgador a quo consignou
de forma precisa a sua impressão e conclusão acerca do conjunto probatório constante
nos autos, de modo que a sentença não padece dos vícios apontados. Preliminar
rejeitada. 2. Na cessão de “Contrato de Participação em Grupo de Consórcio“, é
indispensável o consentimento do cedido para que se opere a exoneração do
cedente e a inclusão do cessionário. Na espécie, o consórcio réu não anuiu ao
contrato de cessão de quota. sequer tendo sido demonstrado que o próprio tinha
ciência da referida cessão antes de realizar o pagamento ao cedente -, razão pela qual é
válido e eficaz o pagamento da carta de crédito ao titular originário. 3. Preliminar
rejeitada. Recurso do réu provido para reformar a r. sentença, julgando improcedentes
os pedidos deduzidos na inicial. Recurso da autora julgado prejudicado. (TJ-DF; Rec
2006.01.1.051097-4; Ac. 566.305; Terceira Turma Cível; Rel. Des. Humberto Adjuto
Ulhôa; DJDFTE 06/03/2012; Pág. 94) (sem grifo no original)

171
X
DA EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO
PELO PAGAMENTO

1. Noções gerais
A forma natural de extinção da relação obrigacional é a
entrega da prestação pactuada, esse é o momento aguardado
pelo credor desde a constituição da relação, sendo extinta nada
mais pode ser alegado por qualquer das partes, sábias as palavras
de Orlando Gomes119:
Nascem as obrigações para ser cumpridas, mas, no
exato momento em que se cumprem, extinguem-se.
O adimplemento é, com efeito, o modo natural de
extinção de toda relação obrigacional.

O pagamento possibilita o fim da relação obrigacional, a


entrega da prestação pelo devedor ao credor é a forma como a
grande maioria dos negócios jurídicos se extingue, com o puro e
simples ato de cumprir o que foi combinado, Paulo Nader120
afirma que “é a etapa culminante da relação obrigacional, pela
qual o devedor satisfaz o crédito e extingue a obrigação, operando-
se a solutio”. Importante lembrar que a prestação a ser paga não
é exclusivamente dinheiro, podendo ser qualquer item que fora
acordado entre as partes.
A fim de que este pagamento seja devidamente
constituído e realize seu papel de extinguir o vínculo obrigacional,
deve ser observada a existência de certos elementos, que são,
segundo Podestá121:

119
GOMES, Orlando. Obrigações. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p 105.
120
NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 2: obrigações. Rio de Janeiro:
Forense, 2008, p 217.
121
PODESTÁ, Fábio Henrique. Direito das obrigações: teoria geral e responsabilidade
civil. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2008, p156.

173
a) Uma obrigação precedente constituída por um
vínculo jurídico válido;
b) A intenção de extingui-la, o animus solvendi;
c) A pessoa que efetua o pagamento, o solvens; e
d) A pessoa que recebe, o accipiens;

O vínculo jurídico retrata a ligação entre os sujeitos da


relação obrigacional, não se poderá falar de pagamento caso não
exista esta ligação, a entrega de uma prestação à pessoa errada
não extingue a ligação obrigacional, assim só existirá o
pagamento ocorrendo a entrega da prestação à pessoa que seja
realmente o credor.
A intenção de pagar, ou animus, refere-se à vontade que o
devedor possui em realizar livremente o pagamento, este é uma
forma livre, cordial e natural de extinção da relação obrigacional,
independente das razões subjetivas (medo dos comentários de
vizinhos, medo de registro em cadastro de maus pagadores...).
Há clara vontade de realizar o ato de entregar a prestação.
Lógico que caso o devedor não queira realizar este
pagamento, o credor terá a sua disposição os meios jurídicos
capazes de forçar a extinção da relação obrigacional, como
exemplo se tem a ação de execução forçada, que busca a
constrição de patrimônio do devedor.
Por fim, tem-se a necessidade da existência das figuras
do solvens e do accipiens, que são respectivamente aquele que deve
realizar a entrega da prestação e a pessoa que aguarda pagamento.

2. Quem pode pagar


A relação obrigacional dependerá do pagamento para ser
extinta de forma natural, a primeira questão que o Código Civil
trata é justamente das pessoas que podem ocupar a função de
solvens no pagamento, assim a lei impõe que “qualquer interessado
na extinção da dívida pode pagá-la, usando, se o credor se opuser,
dos meios conducentes à exoneração do devedor” (grifos nossos),
conforme art. 304, Código Civil. E o parágrafo único completa:
“Igual direito cabe ao terceiro não interessado, se o fizer em nome
e à conta do devedor, salvo oposição deste”.

174
Falando das pessoas interessadas, por vezes é esquecida
a primeira pessoa a realizar o pagamento que é o próprio devedor,
este é quem primeiro sofre qualquer consequência pelo
inadimplemento, bem como sempre buscará a extinção da relação
obrigacional, para não mais submeter-se à vontade do credor.
Além do devedor, qualquer pessoa pode realizar o
pagamento, estes podem inclusive utilizar os meios necessários
a forçar o credor receber a prestação, como exemplo, caso um
credor recuse o recebimento de uma prestação a ser paga por
terceiro, este tem o direito de intentar a ação de consignação em
pagamento, a fim de forçar o recebimento da prestação por parte
do credor. Veja que este terceiro pode ou não ter interesse na
dívida, podendo agir não por temer algum resultado patrimonial
da cobrança daquela dívida, mas por motivos pessoais.
Nota-se que não ficam claros os interesses destas pessoas
em verificar o fim da dívida, o Código Civil se restringe a afirmar
que buscam a extinção da dívida, ao que parece esta imposição
se restringe ao aspecto patrimonial, Flávio Tartuce122 muito bem
explica esta questão, ao afirmar que o terceiro interessado:
“[...]corresponde à pessoa que tenha interesse
patrimonial na sua extinção, caso do fiador, do avalista
ou do herdeiro. Havendo o pagamento por esse
terceiro interessado, esta pessoa sub-roga-se
automaticamente nos direitos de credor[...]

Mas deve ser tomado cuidado, uma vez que interesse


patrimonial não significa interesse afetivo. Dessa
forma, um pai que paga a dívida do filho por intuito
afetivo não pode ser considerado terceiro interessado
no campo do direito obrigacional. O pai que paga a
dívida deve ser considerado, na verdade, um terceiro
não interessado na dívida.

Fica clara a distinção existente entre as pessoas que


podem se apresentar como solvens, veja que surgem dois
indivíduos capazes de realizar o pagamento, quais sejam: o próprio

122
TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade
civil. 5 ed. São Paulo: método, 2010, p 139.

175
devedor e os terceiros. O devedor é a pessoa diretamente
interessada na solução da relação obrigacional e de que seja
realizado o pagamento, só evitará quaisquer das formas de
cobrança, quando da entrega da prestação pactuada.

2.1 Terceiro interessado


Os demais indivíduos apresentados são justamente os
terceiros, sendo que neste caso se apresentará uma subdivisão,
os terceiros interessados e os terceiros não interessados. Segundo
Stolze e Pamplona Filho123:
Por terceiro interessado, entenda-se a pessoa que, sem
integrar o polo passivo da relação obrigacional-base,
encontra-se juridicamente adstrita ao pagamento da
dívida, a exemplo do fiador que se obriga ao
cumprimento da obrigação caso o devedor direto
(afiançado) não o faça.

Os terceiros interessados são pessoas que têm


envolvimento patrimonial com a relação obrigacional, o interesse
deles decorre de uma ligação com a própria obrigação, vez que a
mesma não sendo paga pelo devedor, acarretará consequências
à esfera jurídica daqueles. Em razão de poder sofrer estas
consequências é que o terceiro assume a responsabilidade e realiza
o pagamento, como no exemplo transcrito, o fiador tem
conhecimento que sua posição na relação obrigacional é garantir
o cumprimento da prestação pactuada entre credor e devedor,
caso este não realize o pagamento, será o fiador cobrado, podendo
sofrer atos de constrição de patrimônio, por meio de medida
judicial, bem como o próprio registro de seu nome em algum
cadastro de maus pagadores.
O terceiro realiza o pagamento e sub-roga-se (forma de
pagamento especial) na obrigação, podendo cobrar do devedor
original os valores que despendeu para finalizar a relação
obrigacional com o credor, conforme art. 346, III, Código Civil.

123
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito
civil, volume 2: obrigações. 13 ed. Rev. Atual. Ampl. São Paulo: Saraiva, 2012, p 151.

176
2.2 Terceiro não interessado
Mas não apenas quem tem interesse na relação
obrigacional poderá pagá-la, existe um estranho que não tem
interesse e pode realizar o pagamento da prestação, segundo
Serpa Lopes124, “terceiro não interessado é o que de modo
nenhum é parte na obrigação”. Este, conforme já explicitado, é
aquele tipo de solvens que não tem interesse patrimonial sobre a
prestação, sua ligação decorre, na maioria das vezes, da afinidade
com o devedor ou de fortes sentimentos altruístas.
O terceiro não interessado se divide em dois subtipos, o
que paga em nome do devedor e o que paga em nome próprio.
A diferença é importante, pois a partir dela verificam-se as
consequências e a possibilidade deste terceiro ser reembolsado
pelos valores ou bens que pagou.
Os pagamentos feitos por pessoas não interessadas
normalmente envolvem familiares, veja duas situações. Na
primeira, Jonh Junior mora em um apartamento e não paga o
aluguel a meses, seu pai apresenta-se ao locador e paga todos os
meses devidos, neste caso o ato do pai é de doação, é como se
ele estivesse dando o dinheiro à Jonh Junior para realizar o
pagamento, só Pai para agir assim!
Na segunda hipótese, imagine que o mesmo Jonh Junior
continua sem dinheiro para pagar suas contas, mas um primo se
apresenta para pagá-las, só que desta vez não o faz com o animus
de doar o dinheiro. Este primo faz o pagamento ao locador, mas
não em nome de Jonh e sim de forma que fique claro que ele
pagou, por ter interesse em ser reembolsado. Aqui se tem a
segunda figura, a de terceiro não interessado que paga em nome
próprio.
Fica clara a diferença entre ambas, quando se paga a conta
em nome do próprio devedor, há doação, o terceiro nada poderá
cobrar posteriormente, no entanto se ele o fizer sem a intenção
de doar e utiliza seu próprio nome para realizar o pagamento,

124
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil – obrigações em geral.
Volume II. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1955, p 216.

177
terá este terceiro o direito de ser reembolsado pelo devedor
original dos valores gastos com o pagamento.
Esta regra não é mero posicionamento doutrinário, o art.
305, Código Civil, é expresso quanto a esta situação e ainda
impõe que neste caso não ocorre sub-rogação, assim o terceiro
não interessado, que pagou em nome próprio, terá o direito de
exigir apenas os valores que utilizou para pagar a prestação, não
passando a ocupar a posição do credor da relação. Os terceiros,
no entanto, devem ter cuidado com sua conduta, pois existe a
possibilidade dos mesmos realizarem estes pagamentos e não
serem ressarcidos. O Código Civil impõe direito ao devedor, a
fim de evitar o pagamento da prestação:
Art. 306. O pagamento feito por terceiro, com
desconhecimento ou oposição do devedor, não obriga
a reembolsar aquele que pagou, se o devedor tinha
meios para ilidir a ação.

O devedor pode recusar o pagamento efetuado por


terceiro, no entanto esta recusa não pode ser só por “orgulho
ferido”. Não é apenas a vontade do devedor que interfere nesta
situação, a recusa deve possuir motivos reais, legais e justos para
afastar a cobrança. Por exemplo, em uma relação obrigacional
prescrita, o devedor tem como se defender de qualquer ação do
credor, vez que a prestação não pode mais ser exigida, caso um
terceiro pague a citada prestação, este terceiro não poderá requerer
reembolso do devedor original125.

125
95289225 - COBRANÇA RESSARCIMENTO TERCEIRO QUE PAGOU DÍVIDA
DO INQUILINO REEMBOLSO CC/02, ARTS. 305 E 346, III. Diferenças de
consumo de energia elétrica decorrente de suposta irregularidade no relógio medidor
detectada pela concessionária após a desocupação do imóvel pelo inquilino termo de
parcelamento firmado com a concessionária por terceiro estranho à relação locatícia
imposição ao ex-inquilino e fiador que não anuiu ao referido acordo descabimento.
Prova da existência das referidas diferenças ônus dos locadores acionantes (CPC, art.
333, I) ação improcedente recursos parcialmente providos. Nos termos do art. 23 da
Lei nº 8.245/91, cabe ao locatário e respectivo fiador responder pelo pagamento dos
encargos locatícios, dentre eles, as despesas de energia elétrica geradas no período de
ocupação do imóvel locado. Não tendo o usuário dos serviços honrado o pagamento
das faturas, qualquer um que quite referida dívida subroga-se no referido crédito, tendo
direito ao reembolso, nos termos dos arts. 305 e art. 346, III do Código Civil em vigor.
Contudo, o devedor não está obrigado a reembolsar aquele que pagou sua

178
Importante lembrar que existem relações obrigacionais
com caráter intuito personae, como já explicado anteriormente,
neste tipo de relação apenas o próprio devedor poderá
implementar a prestação e realizar o pagamento, seria o caso de
um famoso estilista contratado para desenhar e fazer um vestido
de noite para uma famosa atriz. Ninguém poderá se apresentar
como terceiro, a fim de pagar a prestação do famoso estilista,
apenas o próprio devedor realizará o pagamento.

2.3 Da entrega de bem para pagamento


Mais duas questões envolvem o solvens, ambas ligadas
àquelas obrigações em que a prestação é um bem. A primeira
envolve o direito de disponibilidade do bem, nesta só ocorrerá
pagamento com a entrega do bem, se este for de quem possa
aliená-lo ou dispuser da propriedade do mesmo. O devedor não
pode realizar pagamento com bem que não é seu, ou não tenha
o direito de aliená-lo.
Tepedino, Barboza e Moraes126 muito bem exemplificam
esta situação:
Imagine-se, por exemplo, que o pagamento consista
na entrega de uma coisa, mas que esta não seja de
propriedade do solvens. A entrega da coisa, realizada
a non domino, acarretará a ineficácia do adimplemento
e não terá, evidentemente, o condão de transmitir a
propriedade, pois não oponível ao legítimo
proprietário (CC, art. 1.268). Também será ineficaz,
é claro, o pagamento que recair em coisa inalienável.

dívida se não anuiu ao acordo firmado por terceiro com a concessionária,


envolvendo débito cuja existência é incerta (CC/02, art. 306). Eventuais
diferenças não faturadas na época própria pela concessionária, por não se
tratarem de despesas ordinárias, ainda que assumidas como devidas por terceiro
estranho à relação locatícia, não podem ser impostas ao inquilino e respectivo
fiador, sem prévia e cabal demonstração de sua exigibilidade. (TJ-SP; APL
0144595-45.2007.8.26.0100; Ac. 5525731; São Paulo; Trigésima Quinta Câmara de
Direito Privado; Rel. Des. Clóvis Castelo; Julg. 07/11/2011; DJESP 18/11/2011)
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012. (grifo nosso)
126
TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin
de. Código civil interpretado conforme a Constituição da República. 2 ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2007, p 603.

179
Assim, por exemplo, no caso do devedor que entrega
em dação em pagamento bem inalienável.

A questão é a validade da entrega e se a mesma surtirá


efeitos, conforme a imposição do art. 307, Código Civil. Caso
ocorra a entrega de um bem que o devedor não seja o proprietário,
ou este bem esteja submetido à cláusula de inalienabilidade, o
pagamento não terá validade, justamente por não ser eficaz ao
accipiens.
A outra situação envolve a entrega de bens fungíveis e
está disposta no parágrafo único do art. 307, Código Civil, este
impõe que “se der em pagamento coisa fungível, não se poderá
mais reclamar do credor que, de boa-fé, a recebeu e consumiu,
ainda que o solvente não tivesse o direito de aliená-la”127. A
questão envolve o accipiens que de boa fé recebeu em pagamento
bens que estavam com o solvens e este não poderia utilizá-los.
Exemplo típico desta situação seria o caso de Mônica,
que deixou com Tina 10 melancias para esta guardar (contrato
de depósito). Ocorre que Tina é devedora de 9 melancias à
Magali. Assim, Tina (solvens) dá em pagamento 9 melancias à
Magali (accipiens). Quando Mônica cobra a restituição de suas
melancias à Tina, esta diz que as utilizou como pagamento.
Tendo Magali consumido todas, Mônica nada poderá fazer contra
Magali, esta recebeu os bens de boa-fé e os consumiu. Mônica
requererá o ressarcimento apenas de Tina.

3. Quem pode receber


A figura do credor sempre vem à mente quando se retrata o
accipiens, lógico que quem pode receber o pagamento é aquele que
figura no polo ativo da relação obrigacional, não restando dúvidas
de seu direito a receber a prestação. A preocupação em saber a
quem se pagar pode parecer inócua, no entanto como bem lembra
Serpa Lopes: “quem paga mal, paga duas vezes”, eis o cuidado que
se apresenta a esta questão, se a parte não paga ao correto accipiens

127
Art. 85. São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma
espécie, qualidade e quantidade.

180
corre o risco de pagar a mesma conta, desta vez para a pessoa que
realmente possuía o direito de receber o pagamento.

3.1 Representantes do credor


Pessoa indicada pelo credor, que pode determinar se
houve ou não o pagamento, vez que o “pagamento deve ser feito
ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer
depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu
proveito” (art. 308, Código Civil). O pagamento deve ser feito
ao credor, no entanto este pode determinar outras pessoas a
receber em seu nome, seriam os representantes que o art. 308
menciona. Estes possuem poderes para receber o pagamento em
nome do credor, assim não precisaria qualquer tipo de
confirmação do credor de que ocorreu o pagamento.
Gama 128 fala muito bem sobre esta representação,
informando que são de 3 (três) tipos: representação legal (poder
familiar, tutela e curatela); representação judicial (decorre de
decisão judicial, por exemplo: inventariante e síndico da massa
falida) e representação convencional (poderes expressos do
credor, a fim de que alguém receba em seu nome).
Neste último tipo de representação tem-se a situação mais
comum, na qual a pessoa indicada pelo credor pode receber e dá
a devida quitação da parcela entregue pelo solvens. Este caso pode
ser exemplificado com o advogado que possui poderes expressos
em seu instrumento procuratório para receber valores em nome
de seu cliente.
Entretanto, ocorrem casos em que há necessidade do
credor ratificar o recebimento da parcela devida. O solvens corre
o risco de pagar a parcela e não verificar a extinção da relação
obrigacional, vez que estaria pagando a pessoa sem poderes para
receber, veja a jurisprudência129:
64436346 - RESPONSABILIDADE CIVIL.
REPARAÇÃO. DANOS MATERIAL E MORAL.

128
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo:
Atlas, 2008, p 229/230.
129
Fonte DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

181
MÚTUO CONTRATADO COM ENTIDADE DE
PREVIDÊNCIA PRIVADA. ALEGADO
PAGAMENTO IMPLEMENTADO A
TERCEIRO, DE FORMA DIVERSA DA
PACTUADA. INEXISTÊNCIA DE PROVA
DANDO CONTA DE SER O TERCEIRO
PREPOSTO, MANDATÁRIO OU
MANTENEDOR DE ALGUMA VINCULAÇÃO
COM A MUTUANTE. INVALIDADE DA
PRETENSA QUITAÇÃO. INTELECÇÃO DO
ART. 308 DO CÓDIGO CIVIL. PEDIDO
REJEITADO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A
quitação de dívida de valor implementada através de
terceiro. a tal não qualificado pelo credor ou seu
legítimo representante. não tem qualquer efeito
liberatório, nem vincula, evidentemente, o credor,
no tocante à eventual pretensão reparatória contra
ele deflagrada pelo devedor à guisa de ressarcimento
por danos material e moral por locupletamento ilícito.
2. Sendo assim, se a regra do art. 308 do Código
Civil não for atenta e corretamente seguida pelo
devedor, de se aplicar então a ele o conhecido
ensinamento do inolvidável Washington de barros
Monteiro segundo o qual “quem deve a Pedro e paga
a gaspar, que torne a pagar”. (TJ-SC; AC
2010.072286-0; Blumenau; Quarta Câmara de
Direito Civil; Rel. Des. Eládio Torret Rocha; Julg.
10/11/2011; DJSC 08/12/2011; Pág. 195)(sem
grifo no original)

Há um pagamento realizado a terceiro, neste caso o


terceiro não tem poderes para receber em nome do credor, assim
este pagamento não teria eficácia, devendo o solvens realizar
novamente o pagamento. A forma que o devedor teria de se
proteger em uma situação destas seria a ratificação do ato pelo
credor, este deve confirmar o recebimento da conta. Percebe-se
o risco a que é submetido o devedor, o mesmo deve evitar este
tipo de pagamento e sempre procurar o credor. Pagando
diretamente a quem de direito, o devedor não é submetido ao
risco de pagar duas vezes pela mesma obrigação.

182
3.2 Credor putativo
Uma situação inusitada acontece quando o solvens paga a
alguém que ele imagina ser o accipiens, mas não é, esta ocorre
quando a entrega da prestação é realizada ao chamado credor
putativo130. Esta é uma figura que se apresenta com todos os
traços do verdadeiro credor, a situação leva o devedor entender
que aquela pessoa é o verdadeiro credor e teria o direito de exigir
e receber o pagamento. As circunstâncias envolvem o devedor
de forma que ele erra, no entanto este não pode ser um erro
grosseiro. O devedor guarda os cuidados necessários e tem a
prudência para pagar ao credor, infelizmente o conjunto fático
apresentado faz com que ele incida em erro.
Exemplificando, imagine a situação do Policial Nascimento,
o mesmo é morador de um condomínio no Rio de Janeiro, ele fez
uma viagem para treinamento em Los Angeles, passando 2 (dois)
meses neste treinamento. Quando retornou, lembrou que estava
sem pagar seu condomínio durante este período, encaminha-se ao
apartamento da síndica, Sr.ª Clara (a mais de 10 anos ela é síndica
do prédio). Em conversa com esta senhora expõe seu atraso, a
mesma prontamente calculou os juros e apresentou o valor devido,
pelo que o Sr. Nascimento pagou e recebeu a quitação. Dois dias
após este fato, bate à porta do Sr. Nascimento, o Sr. Rocha, que
informa que um mês atrás ocorreu uma eleição para síndico do
condomínio e este foi eleito o novo síndico, por esta razão ali
estava para cobrar os dois meses atrasados.
Ao exemplo dado aplica-se que o “pagamento feito de
boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado depois que
não era credor” (art. 309, Código Civil), assim o Sr. Nascimento
não mais será cobrado, em razão de ter realizado o pagamento
com boa-fé131 à uma pessoa que, pela situação, seria a credora.

130
putativo 1 Diz-se de tudo aquilo que tem aparência de legal ou se supõe verdadeiro,
embora na realidade não o seja: Pai putativo. 2 Suposto, reputativo. 3 V casamento
putativo.
(fonte:http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-
portugues&palavra=putativo em 14/07/12)
131
98010197 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE E
TÍTULOS. CHEQUES ENDOSSADOS À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.

183
3.3 Pagamento ao incapaz
Há outra situação que pode gerar problemas ao solvens,
nesta o pagamento é realizado perante a pessoa correta, mas
que não tem poderes para dar a devida quitação. Isto ocorre com
os incapazes132, pois este é o credor, no entanto não pode o
pagamento ser feito diretamente a ele em decorrência de não
poder exercer todos os atos da vida civil, entre os quais declarar
a quitação de débito, conforme art. 310, Código Civil. Aqui não
se debate o direito do credor ao pagamento, sabe-se que este o
tem, no entanto em decorrência da inexistência de capacidade
civil, ou de sua relatividade, este credor não tem poderes de dar
a quitação (declarar que o débito foi pago), gerando o risco ao
devedor de ter de pagar a conta novamente.
O Devedor pode conseguir a quitação desta prestação paga
ao credor incapaz, bastando para isto comprovar que o valor pago
foi convertido em benefício do próprio credor, conforme dispõe o
próprio art. 310, Código Civil: “Não vale o pagamento
cientemente feito ao credor incapaz de quitar, se o devedor não
provar que em benefício dele efetivamente reverteu” (grifo nosso).
O devedor é obrigado a provar que este pagamento
reverteu-se em benefício direto do credor. Veja a situação de
Brandão, alugou um apartamento para morar em Manaus (ele
AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR QUANTO AO ENDOSSO.
PAGAMENTO FEITO A CREDOR PUTATIVO. VALIDADE. TEORIA DA
APERÊNCIA. PROTESTO DOS TÍTULOS ILÍCITA. SUSTAÇÃO DECLARADA.
RECURSO PROVIDO. É válido o pagamento feito a quem esteja em situação tal,
causada pelo credor, que haja permitido ao devedor acreditar na legitimidade da sua
qualificação para receber e dar quitação. Não havendo o banco endossatário
desincumbido-se da responsabilidade de cientificar o devedor da circulação dos títulos,
ilícito é o encaminhamento a protesto destes, por causar prejuízo ao pagador de boa-fé.
(TA-PR; AC 0224598-1; Ac. 17848; Ponta Grossa; Oitava Câmara Cível; Rel. Des.
Dimas Ortêncio de Melo; Julg. 30/03/2004) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/
Maio 2012.
132
Veja no Código Civil:
Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I - os menores de dezesseis anos; II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não
tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III - os que, mesmo por
causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais, os
viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV - os pródigos.

184
acabou de tomar posse como Procurador Municipal), em
decorrência da urgência o locador, representado por um tio,
deixou o Dr. Brandão ocupar o imóvel. Passado o primeiro mês
ele ainda não assinou o contrato, mas se dirigiu ao apartamento
do Locador, Sr. Osíris, a fim de realizar o pagamento.
O Locador tem apenas 15 anos de idade, a priori este
seria um pagamento nulo, ocorre que o Dr. Brandão, em conversa
com o próprio Osíris, descobre que os valores pagos naquele
dia, foram utilizados para pagar contas pessoais de Osíris, quais
sejam, companhia de água, companhia de energia elétrica e
mensalidade de colégio. Por conta deste uso em proveito e
benefício real do incapaz, o devedor não poderá ser obrigado a
pagar novamente a prestação.

3.4 Do portador da quitação


O art. 311, Código Civil, não é atingido por dúvidas, mesmo
porque a lei determina algo, que é prática comum na sociedade.
Qualquer serviço ou produto a ser entregue em uma residência, o
é por meio de funcionários ou prepostos da firma ou da pessoa
que dispõe o serviço, assim, normalmente quem contrata este tipo
de obrigação, quando do pagamento apenas exige que seja entregue
o recibo (quitação) e se entende cumprida a relação obrigacional.
O cuidado que o devedor deve manter é caso ele suspeite
do portador do recibo, por exemplo, Maria sempre faz compras
em um mercado próximo a sua residência, pagando ao final de
cada 15 dias a um funcionário do mercado que vai a sua casa,
fardado e portando o recibo. Se por acaso um dia aparecer alguém
portando o recibo e for uma pessoa que Maria nunca viu no citado
mercado, as circunstâncias podem levar Maria a entender que esta
quitação não será efetiva, assim o melhor é que a devedora não
proceda ao pagamento e procure diretamente seu credor.

3.5 Da penhora
O art. 312, Código Civil, volta à questão sobre a ciência
pelo devedor da situação do credor e que este não pode dispor
de seu crédito, devendo o mesmo ser encaminhado ao juízo que
185
o penhorou ou que recebeu a impugnação oposta por terceiros,
assim o citado artigo impõe:
Art. 312. Se o devedor pagar ao credor, apesar de
intimado da penhora feita sobre o crédito, ou da
impugnação a ele oposta por terceiros, o pagamento
não valerá contra estes, que poderão constranger o
devedor a pagar de novo, ficando-lhe ressalvado o
regresso contra o credor.

Muito bem explica esta situação Antonio Chaves133


O credor é legítimo, mas perdeu a faculdade de receber
porque seu crédito foi penhorado em execução, por
ter sido decretada a sua falência, ou por ter feito a
cessão ou caução do título respectivo. Se o devedor
tiver sido intimado da penhora, arresto ou sequestro
do crédito, ou notificado da sua cessão ou da caução,
ou de uma oposição de terceiro e, não obstante, pagar
ao credor, seu pagamento será ineficaz em relação
aos terceiros interessados, que poderão exigir dele
novo pagamento.

Novamente surge a máxima de que quem paga mal paga


duas vezes, o credor original perdeu o direito de receber a prestação
em decorrência de imposição jurisdicional, ou mesmo por conta
da apresentação da prestação como caução ou cessão, sabendo
destas situações o devedor não poderá realizar o pagamento ao
credor, mas apenas ao beneficiado da medida judicial.

4. Dos elementos objetivos


A análise do pagamento pode ser dividida no estudo de
dois elementos gerais, quais sejam os subjetivos e os objetivos.
Até este ponto foram apresentados e analisados os elementos
subjetivos do pagamento, que são justamente as pessoas
envolvidas neste instituto, o solvens e o accipiens. Vistas as pessoas,
este estudo deve prosseguir analisando os elementos objetivos
do pagamento, que são objeto do pagamento, lugar do pagamento

133
CHAVES, Antonio. In Rizzardo, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de
10.01.2002. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 311.

186
e tempo do pagamento. Estas questões objetivas vão tratar
justamente dos pontos sobre a prestação propriamente dita, a
forma como ela é entregue, quando pode ser entregue e onde.

4.1 Objeto do pagamento


a) Inalterabilidade e indivisibilidade da prestação
Os artigos do Código Civil que retratam a questão do
objeto do pagamento utilizam o princípio da pacta sunt servanda
como base de suas imposições, veja o que os mesmos expõem:
Art. 313. O credor não é obrigado a receber prestação
diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa.

Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto


prestação divisível, não pode o credor ser obrigado a
receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim
não se ajustou.

A codificação impõe regras que a sociedade como um


todo abraça, o princípio é basilar: o que foi prometido deve ser
cumprido. O art. 313 expõe não apenas a exigência ao devedor
de entregar o que foi combinado, mas a possibilidade do credor
recusar algo mais valioso no lugar do originalmente combinado.
Exemplificando, em uma obrigação que o devedor tem que
entregar 1 Kg de prata, este tenta impor ao credor que receba 1
Kg de ouro, neste caso o credor pode se negar a receber a
prestação diferente da combinada.
O art. 314 expõe a indivisibilidade da prestação pactuada,
não se fala aqui da natureza do objeto que deve ser entregue,
mas da própria prestação pactuada. Por exemplo, caso um
devedor seja obrigado a entregar 30 kg de feijão, este pode ser
dividido em frações menores, sem perder sua essência, na
realidade este saco pode ser dividido até a menor parcela, que
seria apenas grãos. No entanto, a parcela combinada foram os
30 kg e assim apesar do feijão ser divisível, a prestação
combinada era de uma quantidade de quilos, que o devedor deve
respeitar e entregar ao credor. Não pode o devedor exigir o
parcelamento de sua dívida.

187
Interessante alteração legal ocorreu no processo executivo,
possibilitando a quebra deste princípio obrigacional, fazendo
surgir uma exceção às regras supra estabelecidas, veja o Código
de Processo Civil:
Art. 745-A. No prazo para embargos, reconhecendo
o crédito do exeqüente e comprovando o depósito de
30% (trinta por cento) do valor em execução, inclusive
custas e honorários de advogado, poderá o executado
requerer seja admitido a pagar o restante em até 6
(seis) parcelas mensais, acrescidas de correção
monetária e juros de 1% (um por cento) ao mês.

A legislação processual, assim, possibilita a quebra da


indivisibilidade da prestação, mas este é um caso de intervenção
judicial, provavelmente, como uma forma de que a execução
ocorra de forma menos gravosa ao executado. Em todo caso,
nota-se que há o rompimento da necessidade da prestação ser
entregue conforme o pactuado. Uma pequena ressalva sobre este
favor legal, o mesmo não é obrigatório, é uma possibilidade
apresentada ao devedor, veja trecho de acórdão do STJ:
3. Não obstante, o parcelamento da dívida não é
direito potestativo do devedor, cabendo ao credor
impugná-lo, desde que apresente motivo justo e de
forma fundamentada, sendo certo que o juiz poderá
deferir o parcelamento se verificar atitude abusiva
do exequente, uma vez que tal proposta é-lhe bastante
vantajosa, a partir do momento em que poderá
levantar imediatamente o depósito relativo aos 30%
do valor exequendo e, ainda, em caso de
inadimplemento, executar a diferença, haja vista que
as parcelas subsequentes são automaticamente
antecipadas e é inexistente a possibilidade de
impugnação pelo devedor, nos termos dos §§ 2º e 3º
do art. 745-A.134

134
REsp 1264272 / RJ. Recurso Especial 2010/0039413-9. Relator Ministro Luis
Felipe Salomão (1140). Quarta Turma. Data do Julgamento: 15/05/2012. Data da
Publicação/Fonte: DJe 22/06/2012, In http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/
toc.jsp, em 16/07/2012.

188
Tepedino, Barboza e Moraes135 listam outros casos de
quebra da indivisibilidade, in verbis:
A doutrina assinala que a regra da indivisibilidade
sofre várias exceções: i) quando o contrário for
convencionado, estipulando-se que a dívida seja paga
por partes; ii) quando o devedor tem motivos e
exceções a opor a uma parte do crédito e oferece a
solução da parte que não pretenda impugnar; iii)
quando a obrigação é dividida entre os herdeiros do
devedor; iv) quando se verifica a compensação de
parte da dívida; v) quando, existindo várias dívidas,
o pagamento é imputado por lei a uma delas; vi)
quando o débito for, em parte, ilíquido; vii) quando
resultar do contrato que prevê o pagamento em
diversos lugares, ou a pessoas diversas, indicadas de
maneira conjuntiva ou disjuntiva, ainda que
residentes no mesmo lugar, por isso a diversidade da
época do vencimento das obrigações, acarreta a
necessidade de dividir o pagamento; viii) quando os
co-fiadores, para excluir a solidariedade, reservam o
benefício da divisão; ix) quando os credores
concorrentes, na falência ou no concurso de credores,
são levados a receber pagamentos parciais; x) quando
a divisão do pagamento é um efeito dos prazos de
favor.

A regra geral é que o pagamento não pode ser parcelado


ou dividido, no entanto, pelas situações transcritas, observa-se
que existem exceções, algumas vezes por vontade das partes e
outras pela própria imposição legal, em todo caso se nota o
interesse de propiciar a extinção da relação obrigacional.

b) Do valor nominal da prestação


O art.315, Código Civil, dispõe que as “dívidas em
dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente
e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subsequentes”.

Tepedino, Gustavo. Barboza, Heloisa Helena. Moraes, Maria Celina Bodin de.
135

Código civil interpretado conforme a Constituição da República. 2 ed. Rio de Janeiro:


Renovar, 2007. Pag. 611.

189
As dívidas em dinheiro deverão ter seu adimplemento mediante
a entrega de moeda corrente, no caso o Real, ao credor. Este é
conhecido como o princípio do nominalismo.
Valor nominal é o valor expresso, se refere ao disposto na
relação obrigacional como a prestação em dinheiro, este valor
até a data de pagamento não sofrerá acréscimos. Sua antítese
seria o valor real, que trata justamente da conservação do poder
de compra da moeda.
Hoje tal debate ficou em segundo plano, mas durante os
anos 70, 80 e início dos 90, tal questão gerava diversos conflitos
ao judiciário. O Brasil, neste período, atravessou forte crise
econômica que gerou uma situação inflacionária altíssima
(hiperinflação), deixando o sistema financeiro caótico. Para se
ter uma ideia, neste período os produtos tinham seus preços
remarcados diariamente, as pessoas realizavam contratos fugindo
a normatização e utilizando indexadores para tentar manter o
valor real das prestações pactuadas, um dos principais
indexadores neste período era o Dólar (moeda dos EUA), mas
também se utilizava o salário mínimo.
Neste período há forte busca no sentido de manter o valor
real da prestação, observa-se que não eram respeitados os valores
nominais em razão da grande perda proporcionada pela inflação.
Hoje, a imposição é de que não se aplique estas correções, a lei
impõe que até a data do cumprimento o devedor pagará apenas
o valor exato pelo qual se obrigou. Caso o devedor atrase,
conforme se verificará em capítulo posterior, o credor terá o
direito de tentar manter o valor real da prestação por meio da
aplicação de correção monetária e juros. Interessante
jurisprudência fornece o STJ136 sobre esta questão, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ECONÔMICO.
EXECUÇÃO DE SENTENÇA. CORREÇÃO

136
REsp 1240963/RS; Recurso Especial: 2011/0045054-2; Relator Ministro TEORI
ALBINO ZAVASCKI (1124); Primeira Turma; Data do Julgamento: 16/08/2011.
Data da Publicação/Fonte DJe: 24/08/2011. In http://www.stj.jus.br/SCON/
jurisprudencia/doc.jsp?livre=valor+nominal+real&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&
i=7,em 16/07/12.

190
MONETÁRIA. IGP-M. ÍNDICES DE
DEFLAÇÃO. APLICABILIDADE, QUANDO
NÃO IMPORTEM REDUÇÃO DO VALOR
NOMINAL ORIGINAL.
1. A correção monetária nada mais é do que um
mecanismo de manutenção do poder aquisitivo da
moeda, não devendo representar, consequentemente,
por si só, nem um plus nem um minus em sua
substância. Corrigir o valor nominal da obrigação
nada mais representa do que manter, no tempo, o
seu poder de compra original, alterado pelas
oscilações inflacionárias positivas e negativas
ocorridas no período. Atualizar a obrigação levando
em conta apenas oscilações positivas importaria
distorcer a realidade econômica produzindo um
resultado que não representa a simples manutenção
do primitivo poder aquisitivo, mas um indevido
acréscimo no valor real. Nessa linha, estabelece o
Manual de Orientação de Procedimento de Cálculos
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal que, não
havendo decisão judicial em contrário, “os índices
negativos de correção monetária (deflação) serão
considerados no cálculo de atualização”, salvo “se a
atualização implicar redução do principal”, hipótese
em que “deve prevalecer o valor nominal”. 2.
Recurso especial provido. (grifo nosso)

O valor nominal será respeitado, não podendo haver variação


do mesmo de forma que prejudique o equilíbrio contratual, exceto
na situação já mencionada que trata da atualização dos valores, em
razão do não pagamento na data convencionada. Outras medidas
que se tem como forma de alterar o valor nominal estão dispostas
nos artigos 316 a 318, Código Civil.

c) Aumento progressivo da prestação


Em razão da questão envolvendo valor real e valor
nominal da prestação, observa-se que o tempo é um fator atuante
e que gera certas consequências à obrigação e ao seu próprio
cumprimento, a obrigação cumprida em sua data não sofrerá
qualquer tipo de acúmulo financeiro, mas aquelas que forem

191
cumpridas em data posterior ao combinado sofreram aumento,
no sentido de se manter o valor e a utilidade da prestação
pactuada.
Ocorre que algumas obrigações tem sua execução diferida,
não tendo cumprimento imediato, em razão disto e por se
perfazerem em períodos de tempo maior, verifica-se a perda real
do valor da prestação. Nesta obrigação o credor estaria preso a
um valor fixo, o que acarretaria a perda da utilidade da prestação.
Por exemplo, um contrato de locação, pelo prazo de 5 anos. Ao
final do primeiro ano, com certeza o valor deste aluguel já teria
perdido seu poder de compra, imagine ao final de 5 anos.
Em decorrência de tal situação o Código Civil diz que é
“lícito convencionar o aumento progressivo de prestações
sucessivas” (art. 316). Permite-se, assim, que sejam inseridas
cláusulas no contrato que amenizem a aplicação do nominalismo,
podendo ocorrer aumentos periódicos, capazes de manter o
equilíbrio contratual. Farias e Rosenvald137 apresentam a cláusula
de escala móvel da seguinte forma:
Essa cláusula representa uma exceção ao princípio
do nominalismo, ao permitir a revisão das prestações
com base em índices fixados pelas partes, mas que
não ultrapassem limites de ordem pública,
entendendo-se aí a boa-fé objetiva e a função social
do contrato.
[...]
A correção monetária não se insere de forma alguma
no art. 316 do Código Civil. Ela não se confunde
com a cláusula móvel, pois independe de convenção
para ser aplicada, é fruto automático do
inadimplemento da obrigação.

Tem-se, assim, a possibilidade de impor uma cláusula na


obrigação. Esta permitirá que as partes convencionem o aumento
do valor da prestação nos contratos de trato sucessivo, por meio
de índices convencionados e dispostos pelos poderes públicos.

137
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 348/349.

192
Este aumento tem o condão de manter o valor real da prestação,
ressalvado o disposto na Lei n.º 10.192 de 2001138.

d) Teoria da imprevisão
O equilíbrio da relação obrigacional é tratado, também,
no art. 317, Código Civil. Não apenas a cláusula de escala móvel
manterá o equilíbrio contratual, mas o citado artigo positivou a
teoria que visa proteger diretamente ao devedor e evitar que
ocorra o enriquecimento sem justa causa do credor.
O citado artigo diz que quando “por motivos
imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor
da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o
juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto
possível, o valor real da prestação”, aqui se tem a situação em
que a obrigação se torna desproporcional a ponto do devedor
não conseguir cumpri-la.
O condão desta teoria é de manter o equilíbrio contratual,
diminuindo as consequências do agravamento da posição
contratual, mediante requerimento judicial. O Código Civil de
1916 nada dispôs sobre esta, restando à doutrina e a
jurisprudência realizar a construção capaz de possibilitar a
aplicação deste instituto nos contratos.
A origem da teoria da imprevisão, conforme Gonçalves139:
A teoria da imprevisão resultou da antiga cláusula
rebus sic stantibus que, na Idade Média, era admitida
tacitamente nos contratos de trato sucessivo e
equivalia a estarem as convenções dessa natureza

138
Art. 1º As estipulações de pagamento de obrigações pecuniárias exeqüíveis no
território nacional deverão ser feitas em Real, pelo seu valor nominal.
Parágrafo único. São vedadas, sob pena de nulidade, quaisquer estipulações de:
I - pagamento expressas em, ou vinculadas a ouro ou moeda estrangeira, ressalvado o
disposto nos arts. 2º e 3º do Decreto-lei nº 857, de 11 de setembro de 1969, e na parte
final do art. 6º da Lei nº 8.880, de 27 de maio de 1994; II - reajuste ou correção
monetária expressas em, ou vinculadas a unidade monetária de conta de qualquer
natureza; III - correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais
ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados, ressalvado
o disposto no artigo seguinte.
139
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 275.

193
dependentes da permanência da situação fática
existente na data de sua celebração. A sua adoção
relaciona-se com a preocupação moral e jurídica de
evitar injustiças nos casos em que, ao tempo de
cumprimento de avença de execução diferida, as
obrigações assumidas tornaram-se excessivamente
onerosas pela superveniência de fatos extraordinários
e imprevisíveis à época do ajuste.

Complementa Nonato140:
A teoria da imprevisão considera implícita no
contrato uma cláusula rebus sic stantibus e outorga ao
magistrado podêres, mais ou menos discretos ou mais
ou menos dilatados, para transformar a convenção,
temperando, assim, pela equidade, a rigidez e o
inflexível do pacta sunt servanda.141

A teoria da imprevisão surge como uma forma de revisão


contratual, sendo requisitos para esta revisão, segundo Tartuce142:
a) O contrato deve ser bilateral (sinalagmático) e
oneroso (presente a remuneração).
b) O contrato deve ser comutativo, aquele em que as
partes já sabem quais são as prestações, não sendo
possível rever contrato aleatório, pois o risco é da
essência do negócio. Entretanto, é possível rever a
parte comutativa de um contrato aleatório (v.g.,
prêmio de um seguro).
c) O contrato deve ser de execução diferida ou
continuada (trato sucessivo), não sendo possível, em
regra, rever o contrato instantâneo de execução
imediata.
d) Presença de um motivo imprevisível.
e) Presença de uma desproporção negocial,
onerosidade excessiva ou quebra do ponto de
equilíbrio do sinalagma obrigacional.

140
NONATO, Orosimbo. Curso de obrigações. Volume I, segunda parte. 1 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1960, p 171.
141
Rebus sic stantibus, tem como tradução: “estando assim as coisas”. In NEVES, Iêdo
Batista. Vocabulário prático de tecnologia jurídica e de brocardos latinos. Rio de
Janeiro: APM Editora, 1987.
142
TARTUCE, Flávio. Direito civil, v.2: direito das obrigações e responsabilidade
civil. 5 ed. São Paulo: método, 2010, p 146/147.

194
Observadas estas condições torna-se possível a aplicação
da regra da imprevisão, podendo a parte requerer que o poder
judiciário reestabeleça o equilíbrio contratual.
No recente passado brasileiro tem-se um caso de
aplicação da teoria da imprevisão, aconteceu ao final da década
de 90. Nesta época era comum a utilização de contratos de
leasing143 para adquirir veículos. Os bancos informavam que os
recursos utilizados para a aquisição dos veículos eram
provenientes do exterior, logo podia ocorrer a utilização do dólar
como parâmetro para a prestação. Ocorre que em 1999, a moeda
Real sofreu forte desvalorização frente ao Dólar, para se ter uma
ideia o Dólar em 04/01/1999, valia para compra R$ 1,20, em
29 do mesmo mês valia R$ 1,98144.
A situação das prestações dos contratos com base nesta
operação cambiária tornou-se insuportável, em razão da
onerosidade excessiva impossibilitou-se o cumprimento dos
mesmos, houve um aumento de 60% nas prestações de Leasing.
Apesar de nesta época não existir a regra da imprevisão (Código
Civil apenas entrou em vigor em 2003), os tribunais pátrios
receberam diversos pedidos de revisão contratual com base na
teoria da imprevisão e assim responderam145:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS
COMO AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO
ESPECIAL. ARRENDAMENTO MERCANTIL
(LEASING). CORREÇÃO MONETÁRIA.
REAJUSTE. VARIAÇÃO. MOEDA
ESTRANGEIRA. RECURSOS. CAPTAÇÃO NO
EXTERIOR. PROVA. REEXAME. SÚMULA N.
7-STJ. TEORIA DA IMPREVISÃO.
APLICABILIDADE. PARCIAL PROVIMENTO.

143
Leasing é “um contrato pelo qual uma empresa adquire um bem, entregando-o para
uso e proveito de um terceiro, que paga prestações correspondentes ao preço do bem
e mais encargos, com possibilidade de opção de compra ao final”, In: RIZZARDO,
Arnaldo. Contratos. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p 1.240.
144
Fonte: http://www4.bcb.gov.br/pec/taxas/port/PtaxRPesq.asp?idpai=TXCOTA
CAO,em 16/07/2012.
145
Fonte:https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&s
Seq=18548929&sReg=200500625825&sData=20111116&sTipo=5&formato=PDF,
em 18/08/2012.

195
1. É imune ao crivo do recurso especial a conclusão
pelas instâncias ordinárias no sentido de que há prova
da captação dos recursos no exterior para aplicação,
no Brasil, em contratos de arrendamento mercantil,
a teor do enunciado n. 7, da Súmula do STJ.
2. Em razão da maxidesvalorização do Real frente ao
Dólar no alvorecer do ano de 1999, admite-se a
aplicação da teoria da imprevisão a permitir a revisão
de contratos com cláusula de correção monetária pela
variação cambial de moeda estrangeira.
3. “Índice de reajuste repartido, a partir de 19.01.99
inclusive, eqüitativamente, pela metade, entre as
partes contratantes, mantida a higidez legal da
cláusula, decotado, tão somente, o excesso que
tornava insuportável ao devedor o adimplemento da
obrigação, evitando-se, de outro lado, a total
transferência dos ônus ao credor, igualmente
prejudicado pelo fato econômico ocorrido e também
alheio à sua vontade.” (REsp 473.140/SP, Rel.
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES
DIREITO, Rel. p/ Acórdão Ministro ALDIR
PASSARINHO JUNIOR, SEGUNDA SEÇÃO,
julgado em 12/02/2003, DJ 04/08/2003, p. 217) 4.
Embargos de declaração recebidos como agravo
regimental a que se dá parcial provimento. (EDcl no
REsp 742.717/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL
GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 08/
11/2011, DJe 16/11/2011) (sem grifo no original)

A teoria da imprevisão foi positivada pelo art. 317,


Código Civil, que possibilita a quebra do nominalismo
(obediência ao valor nominal pactuado) e da pacta sunt servanda
(alteração das regras dispostas no contrato). A regra da
imprevisão, conforme o próprio nome deixa claro, é uma forma
de se revisar os contratos, mas que só pode acontecer nos casos
de forte alteração contratual, que gere onerosidade excessiva à
parte, sem que esta possa prever a mudança.
Toda a exposição demonstra a necessidade de se cumprir
alguns requisitos, a fim de se requerer judicialmente a alteração
contratual com base na teoria da imprevisão, veja que é essencial
demonstrar que ao tempo em que foi realizado o contrato não

196
havia possibilidade de prever a mudança, esta mudança deve ser
brusca e impossibilitar o devedor de cumprir o que foi pactuado,
pois há grande desproporção entre o pactuado e a prestação a
ser entregue, importante lembrar que estas situações não ocorrem
nos contratos de execução instantânea, o valor do mesmo já foi
pago e está concluído, bem como nos gratuitos.

e) Pagamento em moeda
O art. 318, Código Civil, complementa a regra de
pagamento das obrigações pecuniárias com a moeda nacional,
vez que proíbe a aplicação da antiga cláusula ouro (por esta, o
solvens poderia realizar o pagamento pecuniário com ouro e/ou
outros bens). A lei expressa que são “nulas as convenções de
pagamento em ouro ou em moeda estrangeira, bem como para
compensar a diferença entre o valor desta e o da moeda nacional,
excetuados os casos previstos na legislação especial”.
Os pagamentos de obrigações pecuniárias devem
obedecer à moeda nacional em vigor, este tipo de imposição
tem um forte apelo econômico, visa evitar a desvalorização da
moeda com a utilização de outros meios para pagamento das
obrigações. Quando não se prioriza a moeda nacional observa-
se grande desvalorização da mesma e perda do poder de compra.
A adoção desta proibição nasceu com o Decreto n.º
23.501/33, assinado por Getúlio Vargas, que apesar de um longo
texto de considerações expressava simplesmente146:
Decreta:
Art. 1º É nula qualquer estipulação de pagamento
em ouro, ou em determinada espécie de moeda, ou
por qualquer meio tendente a recusar o urestringir,
nos seus efeitos, o curso forçado do mil réis papel.
Art. 2º A partir da publicação dêste decreto, é vedada,
sob pena de nulidade, nos contratos exequiveis no
Brasil, a estipulação de pagamento em moeda que
não seja a corrente, pelo seu valor legal.

146
Fonte: http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=98480,
em 17/07/2012.

197
Art. 3º O presente decreto entrará em vigor na data
de sua publicação, devendo seu texto ser transmitido
aos interventores para publicação imediata,
revogadas as disposições em contrário, incluídas as
de caráter constitucional.

Assim nasceu, no Brasil, a restrição à cláusula ouro, que


impôs a nulidade de pagamento em ouro ou em qualquer outra
moeda que não o Réis (moeda utilizada no Brasil neste período).
Em 1969 surge o Decreto-lei n.º 857, este manteve a proibição,
no entanto possibilitou exceções, segundo as quais as partes
inseridas em uma relação obrigacional poderiam realizar
pagamentos com meios que não a moeda nacional, sem sofrer o
risco de nulidade, in verbis147:
Art 1º São nulos de pleno direito os contratos, títulos
e quaisquer documentos, bem como as obrigações
que exeqüíveis no Brasil, estipulem pagamento em
ouro, em moeda estrangeira, ou, por alguma forma,
restrinjam ou recusem, nos seus efeitos, o curso legal
do cruzeiro.
Art 2º Não se aplicam as disposições do artigo
anterior:
I - aos contratos e títulos referentes a importação ou
exportação de mercadorias;
II - aos contratos de financiamento ou de prestação
de garantias relativos às operações de exportação de
bens de produção nacional, vendidos a crédito para o
exterior;
III - aos contratos de compra e venda de câmbio em
geral;
IV - aos empréstimos e quaisquer outras obrigações
cujo credor ou devedor seja pessoa residente e
domiciliada no exterior, excetuados os contratos de
locação de imóveis situados no território nacional;
V - aos contratos que tenham por objeto a cessão,
transferência, delegação, assunção ou modificação das
obrigações referidas no item anterior, ainda que ambas
as partes contratantes sejam pessoas residentes ou
domiciliadas no país.
Fonte: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0857.htm, em 17/
147

07/2012.

198
Parágrafo único. Os contratos de locação de bens
móveis que estipulem pagamento em moeda
estrangeira ficam sujeitos, para sua validade a registro
prévio no Banco Central do Brasil.

As exceções apresentadas à nulidade da cláusula ouro


foram mantidas nas diversas alterações de moedas a que o Brasil
se submeteu. No plano Real a lei n.º 10.192 de 2001, em seu
art. 1º, mantem o disposto no citado Decreto-lei, possibilitando
nos casos supra expressos que o pagamento seja feito em moeda,
que não o Real. Tal situação está expressa justamente ao final
do art. 318, Código Civil, quando o mesmo afirma que
“excetuados os casos previstos na legislação especial”, que indica
a obediência às exceções transcritas148.

148
DIREITO CIVIL E COMERCIAL. CONTRATAÇÃO EM MOEDA
ESTRANGEIRA. PAGAMENTO MEDIANTE CONVERSÃO EM MOEDA
NACIONAL. INDEXAÇÃO DE DÍVIDAS PELA VARIAÇÃO CAMBIAL DE
MOEDA ESTRANGEIRA. CONTRATO CIVIL DE MÚTUO. ALEGAÇÃO DE
AGIOTAGEM. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA DE REGULARIDADE
JURÍDICA DAS RESPECTIVAS OBRIGAÇÕES.
- O art. 1º do Dec. 23.501/33 proíbe a estipulação de pagamentos em moeda estrangeira,
regra essa mantida pelo art. 1º do DL 857/69 e pelo art. 1º da Lei 10.192/01 e, mais
recentemente, pelos arts. 315 e 318 do CC/02. A vedação aparece, ainda, em leis
especiais, como no art. 17 da Lei 8.245/91, relativa à locação. A exceção a essa regra
geral vem prevista no art. 2º do DL 857/69, que enumera hipóteses em que se admite
o pagamento em moeda estrangeira.
- A despeito disso, pacificou-se no STJ o entendimento de que são legítimos os contratos
celebrados em moeda estrangeira, desde que o pagamento se efetive pela conversão em
moeda nacional.
- O entendimento supra, porém, não se confunde com a possibilidade de indexação de
dívidas pela variação cambial de moeda estrangeira, vedada desde a entrada em vigor
do Plano Real (Lei 8.880/94), excepcionadas as hipóteses previstas no art. 2º do DL
857/69.
- Quando não enquadradas nas exceções legais, as dívidas fixadas em moeda estrangeira
não permitem indexação. Sendo assim, havendo previsão de pagamento futuro, tais
dívidas deverão, no ato de quitação, ser convertidas para moeda nacional com base na
cotação da data da contratação e, a partir daí, atualizadas com base em índice de
correção monetária admitido pela legislação pátria.
- Não obstante o art. 3° da MP 1.965-14/00, cuja última reedição se deu sob o nº
2.172-32/01, impute ao credor ou beneficiário de contratos civis de mútuo o ônus de
provar a regularidade jurídica das correspondentes obrigações, a inversão do ônus da
prova é vinculada à demonstração, pelo devedor, da verossimilhança de suas alegações.
Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 804.791/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 03/09/2009, DJe 25/09/2009)Fonte: https://ww2.stj.jus.br/
revistaeletronica/ita.asp?registro=200502097750&dt_publicacao=25/09/2009, em
17/07/2012.

199
f) Da prova do pagamento
Observadas as questões envolvendo o nominalismo e suas
exceções, o Código Civil passa a tratar da questão da prova do
pagamento, de fundamental importância ao devedor, segundo
Diniz149:
Se o devedor não pagar a dívida, ficará sujeito às
consequências do inadimplemento da obrigação; daí
a necessidade de se provar o cumprimento da
prestação. Assim, uma vez solvido o débito, surge o
direito do devedor, que o paga, de receber do credor
um elemento que prove o que pagou, que é a quitação
regular; [...]

Assim a “quitação é o meio robusto de prova do


adimplemento”150, esta é a declaração do credor de que nada
mais existe a ser entregue pelo devedor. O papel da quitação é
liberatório e possibilita ao devedor saber que nada será alegado
contra ele em razão da obrigação cumprida. “O devedor que
paga tem direito a quitação regular, e pode reter o pagamento,
enquanto não lhe seja dada” (art. 319, Código Civil), verifica-se
a apresentação da quitação como direito do devedor, note o
quanto é importante este instituto, pois é concedido ao devedor
o direito de reter a própria prestação caso o credor se recuse a
oferecer a quitação da prestação.
A quitação é fundamental ao devedor, sua prova é
importante no sentido de mostrar que houve o pagamento e
liberação, por exemplo, caso Rubens tenha locado seu carro a
Felipe, pela importância de R$ 10.000,00. No dia do pagamento
da prestação Rubens apenas recebe os valores de Felipe e não
expede a quitação. Caso Rubens resolva cobrar judicialmente o
débito, Felipe não tem como provar a quitação do mesmo,
correndo o risco de pagar novamente a prestação, conforme esta
jurisprudência:

149
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2: Teoria geral das
obrigações. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p 257.
150
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4 ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 354.

200
95302093 - CERCEAMENTO DE DEFESA.
Provas documentais constantes dos autos aptas ao
julgamento da causa Cumprimento, pelo Magistrado,
da sua obrigação de solucionar rapidamente o litígio
Cerceamento inocorrente Preliminar rejeitada.
MONITÓRIA Cheques Alegação de emissão em
garantia do pagamento de materiais de construção
Quitação do débito à suposta credora originária dos
títulos não comprovada pelo réu Arts. 319 e 321 do
Código Civil Impertinência da prova exclusivamente
testemunhal Falta de higidez das cambiais não
demonstrada Pagamento devido Sentença mantida
Recurso improvido. (TJ-SP; APL 9163522-
41.2009.8.26.0000; Ac. 5534089; Campinas;
Décima Quarta Câmara de Direito Privado; Rel. Des.
Ligia Araujo Bisogni; Julg. 09/11/2011; DJESP 06/
12/2011)151(grifo nosso)

A quitação é essencial, pois evita os acontecimentos


narrados, caso o credor se recuse a fornecer, pode o devedor
reter a prestação, até que ela seja fornecida. No entanto, não
pode o devedor se esquivar indefinidamente do cumprimento
da prestação com esta alegação, o mesmo deve utilizar da
consignação em pagamento e se desvincular da relação
obrigacional.
A quitação deve ser comprovada, e a forma que a lei
dispõe é por meio de documento escrito, público ou particular, e
neste necessariamente deverá constar o valor e a espécie da dívida
quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo
e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu
representante, conforme art. 320, Código Civil. Esta
comprovação recebe o simples nome de recibo.
Apesar destas exigências formais quanto ao recibo, o
parágrafo único de art. 320, permite que ainda “sem os requisitos
estabelecidos neste artigo valerá a quitação, se de seus termos
ou das circunstâncias resultar haver sido paga a dívida”, assim
mesmo sem a prova formal, podem ser utilizados outros meios

151
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

201
de comprovação, por exemplo um comprovante de depósito em
conta bancária, que apesar de não possuir as exigências da lei,
demonstra a disponibilização de recursos em favor do credor.
Cagliano e Pamplona Filho152 muito bem expressam esta questão:
Quem atua no interior do País sabe que o
conhecimento das leis é, na generalidade dos casos,
raridade. Por isso, o cidadão humilde não poderia ser
alijado do seu direito à quitação pelo simples fato de
não haver exigido o recibo com todos os requisitos
exigidos pela lei. Se o juiz concluir, pelas
circunstâncias do caso posto a acertamento, que o
devedor pagou, deverá declarar extinta a obrigação.
Essa é a melhor solução, em respeito, inclusive, ao
princípio da boa-fé.

A aplicação do princípio da boa-fé àquele que paga e não


recebe o documento formal de quitação, converte-se em uma
real medida de justiça, mesmo como forma de evitar o
enriquecimento sem causa do credor.

g) Presunção de pagamento
O pagamento é um ato de entrega material da prestação,
no entanto existem situações em que se revela a presunção de
pagamento, ou seja, mesmo sem a quitação expressa, entende-
se que a prestação foi devidamente entregue pelo devedor.
Um exemplo corriqueiro deste tipo de presunção de
pagamento é o decorrente de dívidas representadas por um título
de crédito, veja as sacoleiras que realizam vendas de joias de
porta em porta ou em repartições públicas. Quando alguém
realiza uma compra com esta vendedora, o débito será
representado por uma nota promissória, que fica em poder da
vendedora. Na data do pagamento da prestação devida, a
vendedora não emite um recibo, simplesmente devolve a nota
promissória.
Esta é uma prática comum, o ato de devolver o título é

152
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito
civil, volume 2: obrigações. 13 ed. Rev. Atual. Ampl. São Paulo: Saraiva, 2012, p 163.

202
encarado como quitação, vez que a credora não teria mais
documento hábil a comprovar a existência do débito e tentar
cobrança judicial do mesmo.
Infelizmente o título que serve de base para a negociação
pode ser extraviado, neste caso “poderá o devedor exigir, retendo
o pagamento, declaração do credor que inutilize o título
desaparecido” (art.321), ou seja, o devedor de boa-fé que insiste
em cumprir com seus compromissos não se omitirá de realizar
o pagamento, no entanto ele não pode arriscar-se a ser cobrado
posteriormente pela mesma dívida, o que impõe ao credor, que
quer receber este pagamento, emitir uma declaração na qual
informe que houve o pagamento e que o título não mais tem
validade, mesmo que misteriosamente reapareça nas mãos do
próprio credor, ou de terceiros estranhos à presente relação.
Ressalvados, logicamente, os casos de cessão devidamente
notificada ao devedor.
Outra presunção apresentada pelo Código Civil impõe que
quando “o pagamento for em quotas periódicas, a quitação da
última estabelece, até prova em contrário, a presunção de estarem
solvidas as anteriores”(art. 322). O devedor que tem uma sequência
de prestações a pagar ao credor, tem a presunção que a última
paga indica que todas as anteriores também foram pagas.
Lembre-se, este é um caso de presunção, a lei não afirma
dizendo que sempre que houver prestações periódicas o fato de
pagar a última implica que todas as demais automaticamente
seriam consideradas quitadas, o que existe é uma presunção em
favor do devedor, não uma certeza absoluta, mesmo porque cabe
ao credor exigir, quando do recebimento de uma prestação o
acerto das anteriores, bem diz Oliveira153:
Ela se aplica de modo irrestrito quando a prestação é
paga diretamente ao credor, pois ao receber
determinada parcela cabe-lhe verificar a pendência
de alguma prestação anterior, caso em que deve

153
OLIVEIRA, James Eduardo. Código civil anotado e comentado: doutrina e
jurisprudência. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 269.

203
ressalvá-la. Isso, todavia, não se verifica quando as
prestações periódicas constam de carnê que é entregue
ao devedor e cujos pagamentos são feitos por meio da
rede bancária, inclusive mediante transferências
eletrônicas. A toda evidência, a instituição financeira
não indaga ao devedor que efetua o pagamento de
determinada prestação, através de boleto
correspondente, se eventualmente existem prestações
anteriores pendentes.

A presunção admite prova em contrário, caso ocorra a


situação mencionada poderá o credor comprovar que os
pagamentos na realidade não foram efetuadas e a obrigação
continua em aberto.
Outro cuidado com a presunção surge com prestações
mensalmente pagas, mas que não representam uma obrigação
única de pagamento diferido. O pagamento desta obrigação é
por meio de quotas periódicas, mas cada cota representa um
determinado período, elas representam prestações envolvendo
o uso mensal de um determinado serviço ou despesas gerais
mensais, neste caso, segui-se a corrente da seguinte jurisprudência:
64219403 - AGRAVO RETIDO. PAGAMENTO
DAS TAXAS CONDOMINIAIS. PRESUNÇÃO
DE QUITAÇÃO. INAPLICABILIDADE DO ART.
943 DO ANTIGO CÓDIGO CIVIL. DECISÃO
MANTIDA. DESPROVIMENTO. As taxas de
condomínio não geram a presunção do art. 943 do
antigo Código Civil (atual art. 322 do CC/02),
porquanto, tendo as cotas por finalidade custear as
despesas mensais do condomínio, são elas autônomas
e independentes entre si. Apelação cível. Ação de
consignação em pagamento. Dívida daantiga
proprietária -taxas condominiais vencidas e
vincendas. Recusa injustificada do credor
demonstrada. Depósito suficiente. Sentença mantida.
Recurso desprovido. Mostra-se legítima a ação
consignatória movida pelo comprador contra o
condomínio que, injustificadamente, recusa o
recebimento das cotas condominiais vincendas em
razão de débitos deixados pela vendedora. (TJ-SC;
AC 2008.012995-7; São José; Terceira Câmara de
204
Direito Civil; Rel. Des. Fernando Carioni; DJSC 30/
06/2008; Pág. 169) (sem grifo no original)

O art. 322 refere-se àqueles pactos bilaterais, nos quais a


pessoa identificada como credora, entregou o bem ou serviço ao
devedor e este parcelou o pagamento em diversos meses. Serviços
de água, energia elétrica e taxas de condomínio referem-se a uma
única prestação pelo que foi utilizado naquele mês.
Adiante será estudada a aplicação dos juros à prestação,
como forma de ressarcir o atraso no pagamento. Os juros são
cobrados pelo credor, sua exigência depende da desídia do
devedor, em decorrência do mesmo não cumprir com a obrigação
na data pactuada. Surge aqui outra presunção em favor do
devedor, pois caso na data de pagamento de uma prestação
atrasada houver a “quitação do capital sem reserva dos juros,
estes presumem-se pagos”(art. 323).
O credor que oferecer a quitação do pagamento e não se
acautelar, informando ao devedor que futuramente ele irá pagar,
também, os juros devidos pelo período de atraso, não terá o
direito de fazer isto posteriormente, entendendo-se que os juros
foram pagos. Por ser presunção, pode o credor comprovar por
outras formas que o pagamento foi aceito, mas o devedor deveria
pagar os juros em outra data. No entanto, fica muito complicada
a situação do credor para cobrar futuramente estes juros, se o
mesmo tiver emitido recibo de quitação, sem uma única
observação sobre a cobrança futura dos juros.
O art. 324, Código Civil, retorna a questão já retratada,
onde se demonstrou a existência de quitação naqueles casos em
que ocorre a devolução do título. Esta é uma prática notória, o
mero ato de devolver o título gera ao devedor a presunção de
que a prestação foi paga, a jurisprudência explica claramente:
53174021 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO
MONITÓRIA. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO
PRINCIPIO DA DIALETICIDADE.
INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA.
PAGAMENTO DA DÍVIDA ESTRIBADA EM
CHEQUE PRESCRITO. ART. 324 DO CÓDIGO

205
CIVIL. ENTREGA DO TÍTULO AO DEVEDOR.
PRESUNÇÃO DE PAGAMENTO, QUE É
RELATIVA. ÔNUS DO DEVEDOR DE
DEMONSTRAR A INEXISTÊNCIA DA
OBRIGAÇÃO A SER CUMPRIDA. ART. 333, II,
DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. JUROS DE
MORA. TERMO INICIAL. CITAÇÃO.
PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA. RECURSO PROVIDO
PARCIALMENTE. Embora a peça recursal possa
se assemelhar com a exordial dos embargos e
memoriais, não há falar em ofensa ao principio da
dialeticidade quando o recorrente traz os fundamentos
de fato e de direito hábeis a embasar o seu
inconformismo com a sentença. Nos termos do art.
324 do Código Civil, a entrega do título ao devedor
firma a presunção do pagamento, sendo esta, no
entanto, relativa, cabendo a ele o ônus de demonstrar
a inexistência da obrigação a ser cumprida, nos
termos do art. 333, inciso II, do Código de Processo
Civil. Na ação monitória fundada em cheque
prescrito, os juros de mora são contados a partir da
data da citação, conforme a jurisprudência iterativa
do Superior Tribunal de Justiça. (TJ-MS; AC-Ex
2010.029605-9/0000-00; Campo Grande; Primeira
Turma Cível; Rel. Des. Joenildo de Sousa Chaves;
DJEMS 28/03/2011; Pág. 27) 154(grifo nosso)

O ato de entregar o título ao devedor gera a quitação de


sua dívida, no entanto a lei estipula que mesmo com o título a
quitação pode ser declarada nula. O parágrafo único do art. 324,
Código Civil, impõe que ficará “sem efeito a quitação assim
operada se o credor provar, em sessenta dias, a falta do
pagamento”, ao que parece esta situação visa desconstituir a
quitação nos casos de posse ilícita do título por parte do devedor,
situações como furto de documento ou apropriação indébita do
mesmo. Em todo caso, o cuidado nestas situações deve partir
do credor, que deve ajuizar medida judicial capaz de desconstituir
a quitação e declarar, ainda, a existência da dívida.

154
Fonte DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

206
h) Despesas com o pagamento
As despesas com o pagamento ficam a cargo do devedor,
conforme estipulação do art. 325, Código Civil. Claro que tal
imposição admite convenção entre devedor e credor no sentido
do credor assumir tais despesas, ou até terceiros.
A presunção segue como regra nos casos em que os
sujeitos da relação obrigacional nada convencionarem sobre este
tipo de despesa, agora, esta presunção sofre uma exceção, no
caso de ocorrer aumento da despesa para entrega da prestação
por culpa do credor.
Por exemplo, em contrato João compra um carro de Paulo,
este mora em Brasília, e o carro deve ser entregue em Goiânia,
ocorre que quando da entrega da prestação Paulo é informado
que o carro deve ser entregue em Londrina, nesta situação ocorre
aumento das despesas para a entrega e estas ficarão a cargo de
João, credor da prestação.

i) Presunção da medida ou peso


Os pesos e medidas são importantes para possibilitar a
negociação dos mais diversos produtos. Sabendo disso e de
possíveis desacertos o Código Civil determina que se “o
pagamento se houver de fazer por medida, ou peso, entender-se-
á, no silêncio das partes, que aceitaram os do lugar da execução”
(art. 326).
O artigo é claro, em caso de silêncio entre as partes sobre
uma medida a ser utilizada ou peso, será aplicada a medida
utilizada na região em que foi realizado o negócio. Por exemplo,
em algumas regiões do nordeste são feitos algumas transações
de compra e venda com uma medida que chamam de lata.
Ocorre que em alguns mercados são utilizadas latas que cabem
18 litros de líquido, enquanto em outros utilizam como medida
uma lata de 900 mililitros, pense no negociante da região
acostumado com a lata maior, caso ele nada combine e realize
transação com alguém em um local que utiliza a menor medida,
a medida adotada pelas partes será a lata de 900 mililitros.
Em tempos modernos este conflito é muito limitado, pois
207
o sistema métrico decimal é aplicado em todas as regiões do
país, sendo padronizado e respeitado. Afora o exemplo citado,
os doutrinadores sempre citam a questão do alqueire (unidade
de medida de terras), em que se têm medidas diferentes em São
Paulo e Minas Gerais, também esta situação tem sido por demais
restringidas. A aferição de extensão de terras tem sido feita pelo
padrão métrico do hectare e não bastasse isto, equipamentos
modernos como o GPS155 informam a posição exata do imóvel
e são capazes de mapeá-los com maior exatidão do que
anteriormente.

4.2 Lugar do pagamento


Outro elemento objetivo do pagamento é o lugar onde
deve acontecer a entrega da prestação (pagamento), as regras
envolvendo o lugar da prestação são encontradas nos arts. 327 a
330, Código Civil.
A maior problemática, deste elemento objetivo do
pagamento, é saber exatamente onde deverá ser entregue a
prestação. Para isto, necessário se faz explicar que a doutrina
classifica o pagamento como quesível e ao portador. Quesível
será o pagamento realizado no domicílio do devedor, o credor é
quem deve buscar a satisfação de seu crédito, para tanto irá onde
estiver o devedor para receber a prestação.
Por sua vez, ao portador será aquele tipo de pagamento
em que o devedor entregará a prestação aonde o credor
determinar, este estipula as regras sobre onde o devedor deve
cumprir o pagamento. Nas palavras de Lopes156 tem-se:
Dívidas “quérable” e “portable’. Pelo princípio geral
de que, na falta de convenção, prevalece o domicílio
do devedor, segue-se que a dívida é, em regra, quérable
isto é, cabe ao credor procurar o devedor em seu
domicílio para receber a prestação, pois, para que
fôsse considerada portable, mister seria disposição

Global Positioning System (Sistema de Posicionamento Global).


155

156
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil – obrigações em geral.
Volume II. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1955, p 239.

208
contratual em contrário. Entretanto, por fôrça de
circunstâncias posteriores, a dívida pode transformar-
se de quérable em portable e vice-versa.157

O pagamento será efetuado “no domicílio do devedor,


salvo se as partes convencionarem diversamente, ou se o
contrário resultar da lei, da natureza da obrigação ou das
circunstâncias” (art. 327, Código Civil), assim a regra geral
brasileira é que o pagamento é quesível, devendo ser efetuado
no domicílio do devedor. A imposição de que o pagamento
deverá ocorrer no domicílio do devedor não é absoluta e o art.
327 transcreve situações em que pode ocorrer o pagamento
em local diverso. Essa mudança pode ocorrer por vontade das
partes, quando credor e devedor convencionam local diferente
para o pagamento.
Haverá, também, mudança do local do pagamento se a
lei assim exigir, por exemplo, a transmissão de um imóvel
depende de seu devido registro em cartório, caso uma pessoa
que reside em Teresina-PI venda um imóvel de sua propriedade
em Fortaleza-CE, a entrega do imóvel será realizada em Fortaleza
e não no domicílio do devedor do imóvel que é Teresina,
conforme art. 167, número 9 e art.169, da Lei n.º 6015/73158.

157
44011963 - CIVIL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM
PAGAMENTO. OBRIGAÇÃO PORTÁVEL. AUSÊNCIA DE BOLETO PARA
PAGAMENTO DAS PARCELAS. OBRIGAÇÃO TRANSFORMADA EM
QUESÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.
IMPOSSIBILIDADE. 1) Em razão do banco não ter enviado ao apelante, a segunda a
via dos boletos, mesmo após contato telefônico, a obrigação prevista no item 8.2.1 do
contrato, torna a dívida quesível, ex vi do art. 327 do Código Civil; 2) A ausência do
pagamento autorizava ao banco, manejar da ação consignatória, nos termos do art.
335, incisos I e II do Código Civil, não havendo que se falar, portanto, em falta de
interesse processual do apelante, com a extinção do feito, sem resolução do mérito, tal
como decidiu o magistrado. 3) Apelo conhecido e parcialmente provido. (TJ-AP; APL
0026706-13.2010.8.03.0001; Câmara Única; Rel. Des. Luiz Carlos; Julg. 11/10/
2011; DJEAP 21/10/2011; Pág. 32) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio
2012.
158
Art. 167. No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos:
9) dos contratos de compromisso de compra e venda de cessão deste e de promessa de
cessão, com ou sem cláusula de arrependimento, que tenham por objeto imóveis não
loteados e cujo preço tenha sido pago no ato de sua celebração, ou deva sê-lo a prazo,
de uma só vez ou em prestações; Art. 169. Todos os atos enumerados no art. 167 são
obrigatórios e efetuar-se-ão no cartório da situação do imóvel, salvo:

209
As circunstâncias a que as partes submetem a relação
obrigacional podem alterar o local também, por exemplo,
Raimundo, que mora em São Luiz - MA, resolve contratar um
cantor com domicílio em Porto Alegre – RS, a fim de realizar
show no dia de seu aniversário, sendo que a festa se realizará na
cidade dos pais de Raimundo em Natal - RN, a prestação será
paga em domicílio outro que não o dos sujeitos da relação
obrigacional.
Por fim, a natureza da obrigação pode alterar o local de
seu pagamento, atualizando um exemplo do mestre Barros159,
João irá enviar uma encomenda (computador de última geração)
utilizando o serviço de SEDEX dos correios, origem (onde teria
de ser pago o serviço) Foz do Iguaçu-PR, destino Belém-PA, no
entanto João fará o envio utilizando SEDEX a cobrar, ou seja, o
serviço não será pago em sua origem, mas apenas em seu destino.
A dúvida do local de pagamento pode acontecer em razão
da apresentação de mais de um local para pagamento da
prestação, nesta situação a solução é apresentada pelo parágrafo
único do art. 327, Código Civil, que afirma que designados “dois
ou mais lugares, cabe ao credor escolher entre eles”, assim, se
há a opção de local, esta será realizada pelo credor. Este
dispositivo pode provocar discussões, pois caso o credor não
haja de boa-fé e demore a realizar a escolha, provocaria mora do
devedor, ou até seria capaz de escolher o local que mais onere a
entrega.
No entanto, a boa-fé objetiva tem explícita aplicação neste
caso, o credor tem o dever de lealdade e respeito ao devedor,
caso ele escolha com o intuito supramencionado poderá o
devedor tomar providências legais, a fim de podar o excesso de
direito do credor, bem como ser ressarcido por eventuais
despesas ocorridas por culpa do accipiens.
Em algumas situações o local de pagamento já é
determinado pelo próprio Código Civil, veja o art. 328, dispõe

159
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, volume 5, direito das
obrigações – 1ª parte. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p 258.

210
que se “o pagamento consistir na tradição de um imóvel, ou
em prestações relativas a imóvel, far-se-á no lugar onde situado
o bem”, nada tendo a se acrescentar sobre o texto. No entanto,
ao analisar a parte do dispositivo que trata das prestações
relativas a imóvel, deve-se entender que estas “não significam
aluguéis, mas são referentes a serviços só realizáveis no local
do imóvel, como reparações de cerca, retificações de curso de
córregos, mudança de servidão etc”, conforme bem ensina
Venosa160.
As partes, como já citado, podem realizar a escolha do
local, no entanto este local escolhido não será intocável e
imutável, o Código Civil de 2002, entende que ocorrendo
“motivo grave para que se não efetue o pagamento no lugar
determinado, poderá o devedor fazê-lo em outro, sem prejuízo
para o credor” (art. 329). A possibilidade apresentada não decorre
de mero interesse do devedor, a fim de ocorrer esta mudança
deve haver um motivo justificável, que impossibilite o pagamento
onde foi marcado originalmente. Segundo Rizzardo161, tem-se
como grave “o motivo quando resultante de doença, ou de outra
impossibilidade, como a prisão, a falta de transporte coletivo, a
assistência a familiar doente, impedindo o afastamento”, assim
fatos alheios à vontade das partes é que imporão o novo local a
ser utilizado para pagamento da prestação.
Existe outra situação em que o local de pagamento será
alterado, no caso de reiteradamente este ser feito em local diverso
do combinado. Este pagamento, repetidamente feito em local
diferente, faz presumir renúncia do credor relativamente ao
previsto no contrato, conforme art. 330, Código Civil. Veja
jurisprudência neste sentido:
22522555 - AGRAVO DE PETIÇÃO. ACORDO.
INCIDÊNCIA DO ARTIGO 330 DO CC. Ainda
que ajustado o pagamento das parcelas acordadas na

160
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil : teoria geral das obrigações e teoria geral
dos contratos. Volume II. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003, p 195.
161
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 326.

211
conta-corrente do procurador do reclamante, o
reiterado pagamento feito mediante depósito em
conta judicial fez presumir renúncia do reclamante
relativamente ao previsto no acordo, qual seja,
pagamento na conta-corrente do seu advogado.
Inteligência do artigo 330 do Código Civil. Agravo
de petição interposto pelo reclamante a que se nega
provimento. (TRT 04ª R.; AP 0039000-
78.2009.5.04.0026; Nona Turma; Rel. Des. João
Alfredo Borges Antunes de Miranda; Julg. 17/02/
2011; DEJTRS 25/02/2011; Pág. 56)162

O credor aceita tacitamente um novo local para o


pagamento, por conta das diversas vezes que este pagamento
foi realizado em local diverso do combinado. O previamente
estabelecido será destituído em prol do reiteradamente utilizado,
caso o credor tente voltar à situação original, não poderá em
razão da renúncia presumida.

4.3 Tempo do pagamento


Enfim, o último elemento objetivo do pagamento: o
TEMPO. As obrigações, normalmente, têm definido o momento
em que devem ser cumpridas, excetuadas as submetidas à
elementos acidentais. Logo, devedor e credor submetem-se a
aguardar este momento para que ocorra a extinção da obrigação.
O credor apenas pode tomar qualquer atitude contra o devedor
(exigir o cumprimento da prestação) depois de decorrido o
momento previamente acordado, estipulado ou imposto para que
seja realizado o pagamento.
A regra geral, apresentada pelo art. 331, Código Civil, é
de que tenha ocorrido o ajuste da época do pagamento, no
entanto, o mesmo artigo impõe que caso “não tendo sido
ajustada época para o pagamento, pode o credor exigi-lo
imediatamente”. Impõe-se a possibilidade da dívida ser exigida
imediatamente, restando ao devedor o dever de cumprir a
obrigação cobrada.

162
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

212
Por exemplo, Salim emprestou R$ 20.000,00 para Danilo.
Nesta data foi assinado um termo de confissão de débito por
parte de Danilo, no entanto em nenhum momento, expressa ou
tacitamente, foi estipulada a data de pagamento do mútuo. Se
Salim resolver cobrar a dívida 3 semanas depois, poderá fazê-lo,
vez que não tendo sido ajustado o tempo de pagamento, a
cobrança da mesma pode ser imediata. Complementando este
exemplo, veja a jurisprudência:
11747506 - RECURSO ESPECIAL. MONITÓRIA.
EXIGIBILIDADE DA DÍVIDA. REQUISITO
NECESSÁRIO. VENCIMENTO ESTABELECIDO
MEDIANTE CONDIÇÃO PURAMENTE
POTESTATIVA. INVALIDADE. DÍVIDA À
VISTA. NOTIFICAÇÃO. CONSTITUIÇÃO EM
MORA. REGULARIDADE DO
PROCEDIMENTO. 1. A exigibilidade da dívida é
requisito indispensável para a propositura de qualquer
ação que objetive o respectivo pagamento. 2. O
estabelecimento, em confissão de dívida, de cláusula
que determina que o vencimento da obrigação se dará
por acordo entre as partes deve ser reputada sem efeito,
porquanto consubstancia condição puramente
potestativa. 3. Reputada inexistente a disposição que
regula o vencimento, a dívida deve ser considerada,
nos termos do art. 331 do CC/02, passível de ser
exigida à vista. 4. Para cobrança de dívidas à vista,
basta ao credor que notifique o devedor para constituí-
lo em mora, nos expressos termos do art. 397, parágrafo
único, do CC/02. 5. Tomadas todas essas providências
pelo credor, a cobrança do crédito pela via da ação
monitória é regular. 6. Recurso Especial não provido.
(Superior Tribunal de Justiça STJ; REsp 1.284.179;
Proc. 2011/0195511-1; RJ; Terceira Turma; Relª Minª
Nancy Andrighi; Julg. 04/10/2011; DJE 17/10/
2011) 163 (grifo nosso)

O devedor não pode considerar uma vantagem a ausência


de estipulação do tempo de pagamento, na realidade tal situação
pode representar sério risco ao mesmo, à medida que será direito
163
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

213
do credor exigir a imediata satisfação de seu crédito. A outra
situação em que não é convencionado o vencimento trata das
obrigações condicionais, elas dependem do acontecimento de
evento futuro e incerto.
As obrigações condicionais dependem exclusivamente da
ocorrência desta condição, enquanto esta não ocorrer o credor
nada pode alegar. Por exemplo, Romário reside no Condomínio
Luar. Há o compromisso de não se criar cães neste condomínio,
sob pena de pagar uma multa de R$ 20.000,00. Há aqui uma
obrigação de não fazer, que descumprida gera uma multa, esta
multa pode ser considerada uma obrigação condicional, vez que
ela é submetida a evento futuro e incerto, logo o condomínio só
poderá cobrar essa multa, caso o evento ocorra, neste caso
Romário passar a criar um cão em seu apartamento164.
Nesta situação se aplica que as “obrigações condicionais
cumprem-se na data do implemento da condição, cabendo ao
credor a prova de que deste teve ciência o devedor”(art. 332,
Código Civil). Não há dúvidas sobre a situação deste tipo de
obrigação e o momento em que pode ser exigido seu
cumprimento, no entanto o credor apenas pode cobrar o

Veja entendimento neste sentido do STJ:


164

AÇÃO COMINATORIA CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO.


MULTA ESTIPULADA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO DE
OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. OBRIGAÇÃO CONDICIONAL. A MULTA
PREVISTA EM CORRESPONDENCIA HAVIDA ENTRE AS PARTES
APRESENTA-SE COM SEMELHANÇA A UMA CLAUSULA PENAL, MAS É
NA REALIDADE UMA OBRIGAÇÃO CONDICIONAL: EM HIPOTESE DE
DESCUMPRIMENTO DO COMPROMISSO ASSUMIDO DE NÃO PRODUZIR
IMITAÇÕES, TOTAL OU PARCIALMENTE, DAS ETIQUETAS CONCEBIDAS
PELA AUTORA, A RÉ PAGARIA AQUELA A QUANTIA EQUIVALENTE A
10.000 SALARIOS MINIMOS. EMBORA SE TRATE DE UMA OBRIGAÇÃO
CONDICIONAL, A ELA APLICA-SE A NORMA DO ART. 920 DO CODIGO
CIVIL. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, EM PARTE, E PROVIDO PARA
LIMITAR A MULTA AO VALOR DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL, NO CASO, A
IMPORTANCIA CORRESPONDENTE AS CONSEQUENCIAS DO
DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER, A SER
DETERMINADA EM LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO. (REsp 37.191/SP,
Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro
BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 14/03/1995, DJ 05/06/
1995, p. 16670) Fonte: https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/ita/abreDocumento.jsp
num_registro=199300208535&dt_publicacao=05-06-1995&cod_tipo_documento=1,
em 18/07/2012.

214
pagamento se o devedor tiver ciência que o evento aconteceu,
cabendo ao credor provar que prestou esta informação.
O prazo para cumprimento da relação obrigacional deve
ser respeitado, não podendo o credor tomar qualquer atitude antes
da ocorrência do mesmo. No entanto, o art. 333, Código Civil,
enumera 03 (três) situações nas quais pode ocorrer a cobrança
da prestação antes de seu vencimento, estas são: I - no caso de
falência do devedor, ou de concurso de credores; II - se os bens,
hipotecados ou empenhados, forem penhorados em execução
por outro credor e III - se cessarem, ou se se tornarem
insuficientes, as garantias do débito, fidejussórias, ou reais, e o
devedor, intimado, se negar a reforçá-las.
O primeiro caso apresenta as situações nas quais o devedor
não consegue entregar a prestação (realizar pagamento) e não
dispõe de bens suficientes para proporcionar o cumprimento da
obrigação, nestes casos ele poderá ser submetido ao processo
falimentar165 ou ao concurso de credores166. O credor terá o direito
de exigir imediatamente o cumprimento da obrigação, pois se
este aguardar o vencimento correrá o risco de não se habilitar no
concurso de credores, e posteriormente nem uma parte
proporcional do que sobrou de bens do devedor ele terá acesso.
Na segunda situação se dispõe o caso dos bens hipotecados
ou empenhados, que forem penhorados em execução por outro
credor. Estes bens são indicados como garantia de que o devedor
irá cumprir a prestação, caso não cumpra a obrigação os bens dados
em garantias serão exigidos pelo credor que os recebeu, a fim de
possibilitar justamente o pagamento.
Agora, em uma situação envolvendo bens fornecidos em
garantia, o credor A descobre que estes mesmos bens foram
penhorados por processo executivo contra o devedor, proposto
pelo credor B, cabe ao credor A, que recebeu os bens dados em
garantia, exigir o pagamento antecipado, mesmo como forma
de evitar que os bens do devedor sejam exauridos e nada reste

165
Ver Lei 11.101/2005.
166
Ver arts. 955 a 965 do Código Civil.

215
para o credor A167.
Por fim, entende-se que haverá o vencimento antecipado na
situação de perda ou insuficiência de garantia de pagamento
apresentada ao credor, exemplificando, o devedor realiza um contrato
de mútuo e dá seu carro em garantia ao credor, se o devedor sofrer
um acidente com este veículo e este se perder, a garantia não existirá
mais. Poderá o credor exigir que o devedor apresente novo bem
como garantia, caso não seja apresentada a nova garantia, o credor
terá o direito de declarar que o vencimento da dívida foi antecipado
e a cobrará imediatamente.
Ao tempo que há a possibilidade de vencimento antecipado
da parcela devida, o parágrafo único do art. 333, Código Civil,
apresenta uma exceção a estas situações de antecipação. O fato de
um dos devedores solidários ser submetido a um dos casos do art.
333, não impõe que a prestação está vencida para todos, o credor
apenas poderá antecipar a cobrança do débito contra aquele devedor
que se enquadra nas situações do art. 333, os demais devedores
solidários têm a manutenção do vencimento originalmente
determinado.
As situações expressas são favores legais ao credor e apenas
este as utilizará, não existe uma situação semelhante favorável ao
devedor, mas o credor, por sua vontade, pode conceder uma
prorrogação de prazo ao devedor, esta prorrogação recebe o nome
de período de graça.
Farias e Rosenvald168 o chamam de termo de graça, que
seria uma concessão de mais tempo ao devedor, a fim de que ele se
reabilite e possa pagar dignamente suas contas, justamente em razão
dessa prorrogação de seu prazo. A situação em que se dispõe essa
prorrogação é encontrada apenas na lei de falência (lei n.º 11.101/
2005) e beneficiará apenas às pessoas jurídicas em situação de
insolvência, mas não às pessoas físicas em situação similar.

167
25054430 - PENHORA SOBRE IMÓVEL HIPOTECADO. POSSIBILIDADE.
Inexiste norma legal que diga da impenhorabilidade de imóvel hipotecado; ao contrário,
o art. 333, II, do Código Civil admite essa possibilidade. (TRT 07ª R.; RO 106500-
40.2009.5.07.0007; Segunda Turma; Rel. Des. Paulo Régis Machado Botelho;
DEJTCE 21/02/2011; Pág. 23) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/maio 2012.
168
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4 ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 367.

216
XI
DOS PAGAMENTOS ESPECIAIS

Apresentada a extinção da relação pelo simples


pagamento, a preocupação do estudo da relação obrigacional
passa a se debruçar justamente por aquelas situações
consideradas como pagamentos especiais. A obrigação pode não
ser cumprida conforme as determinações iniciais e por conta
disto, credor e devedor tem que se valer de outros institutos, a
fim de verificar a extinção da relação obrigacional.
A obrigação deve ser finalizada, pois sua perpetuação
indefinida nada trás de proveitoso às partes ou à sociedade. Um
devedor que não consegue efetivar um pagamento terá riscos de
perda de patrimônio futuro em decorrência da mora. Da mesma
forma o credor que não consegue receber seu crédito, terá injusta
redução de suas riquezas.
São diversas as formas de pagamento especial, em
algumas situações se verificará causa extintiva satisfatória da
relação obrigacional, vez que ocorrerá pagamento, no entanto
existem outras situações que a doutrina chama de causa extintiva
não satisfatória, em razão de não ocorrer o pagamento, mas há
extinção da obrigação. Veja cada uma:

1. Do pagamento em consignação
1.1 Noções gerais
Quando foram explicadas as noções iniciais do
pagamento, expôs-se os seus elementos: vínculo, solvens, accipiens
e animus solvendi. Na forma de pagamento, agora apresentada,
se nota grande influência do elemento animus, vez que aqui há
um claro interesse do devedor em entregar a prestação, mesmo
contra a vontade do credor ou por outras dificuldades
apresentadas pela vida.
217
A consignação é o tipo de pagamento especial no qual o
devedor busca a satisfação de seu direito na relação obrigacional,
qual seja a quitação, mesmo ocorrendo dificuldades diversas para
realizar a entrega da prestação. Esta forma de pagamento causa
certa estranheza, pois nela se expõe uma situação não usual, a
de um credor que não quer receber a prestação por displicência
ou motivos mais escusos.
Por exemplo, Carlos deve R$ 10.000,00 a Paulo. Esse
procurou Paulo para pagar a conta, no entanto não o encontrou
e soube que ele resolveu fazer uma viagem de 6 meses para os
EUA. Caso Carlos deixe de pagar o débito, seu contrato prevê
acréscimo de juros de 1% por mês de atraso, multa de 2 % e
correção monetária. Um credor que não tenha necessidade
imediata deste valor terá maior vantagem com o atraso do
devedor, assim a consignação surge como a forma de proteção
ao devedor.
O art. 334, Código Civil, expõe que se considera
“pagamento, e extingue a obrigação, o depósito judicial ou em
estabelecimento bancário da coisa devida, nos casos e forma
legais”, a medida de consignação é apresentada como a forma
de pagar o débito e conseguir a extinção da relação obrigacional.
O objetivo apresentado pela consignação é liberar o devedor do
vínculo obrigacional, uma vez realizada a devida entrega da
prestação, mesmo contra a vontade do credor, nada mais este
poderá exigir do devedor, seja a prestação ou encargos.

1.2 Possibilidades da consignação


Não apenas por culpa do credor pode ocorrer esta forma
de pagamento, a leitura do art. 335, Código Civil, apresenta outras
situações nas quais é possível o pagamento por meio de
consignação. Em vários casos apresentados no presente estudo,
poder-se-ia identificar situações de cabimento da consignação,
mas a fim de evitar repetição, siga os incisos do art. 335.
O inciso primeiro trata justamente do exemplo
supramencionado, vez que o credor não pode, ou, sem justa
causa, recusa receber o pagamento, ou mesmo entregar a quitação
218
na devida forma169. O devedor exige ou busca a extinção da
relação (entrega da quitação), mas sem motivos plausíveis há
recusa do credor, ou simplesmente este não é localizado.
No inciso segundo há complementação do inciso
primeiro, pois neste se verifica a situação de cumprimento de
obrigação quesível e o credor não busca e nem manda alguém
receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos. O devedor
não pode ficar a mercê do credor, aguardando a boa vontade
deste em querer receber seu crédito, assim, ao devedor restará
realizar a consignação, por medida judicial ou bancária.
Na terceira situação, disposta no art. 335, há
impossibilidade de se entregar a prestação ao próprio credor,
inclusive em decorrência de sua incapacidade, por exemplo, Luís
é locatário de um ponto comercial na Av. Paulista, em São Paulo,
e este aluguel é devido a Huguinho, um jovem de apenas 15 anos,
o fato do credor ser incapaz impossibilita a devida quitação, assim
Luís só obterá quitação se pagar ao tutor do adolescente e no caso
de desconhecer o representante deverá realizar consignação.
Ademais, o citado inciso não precisa de maiores
explicações, pois afirma ser cabível a consignação nos casos em
que o credor “for desconhecido, declarado ausente, ou residir
em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil”170.

169
47049744 - AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. AQUISIÇÃO DE
MERCADORIAS. AUSÊNCIA DE CONTRATO. CORREÇÃO MONETÁRIA DO
DÉBITO. POSSIBILIDADE. RECUSA INJUSTA DO CREDOR. APELAÇÃO
CONHECIDA MAS IMPROVIDA. 1. A consignação em pagamento, além de outras
hipóteses, tem lugar quando for injusta a recusa do credor em receber o pagamento (art.
335, I, do Código Civil). 2. Na espécie, a ausência de contrato ou avença entre as partes
para delimitar a correção do débito torna injusta a recusa do credor em receber o
pagamento de forma diversa prevista no Código Civil. 3. Assim, cabível a utilização do
instituto da consignação em pagamento. 4. Apelação conhecida mas improvida. Sentença
mantida. (TJ-CE; APL 7-86.2003.8.06.0149/1; Sexta Câmara Cível; Relª Desª Sérgia
Maria Mendonça Miranda; DJCE 13/05/2011; Pág. 73) Fonte: DVD Magister. Ed.
43. Abril/Maio 2012.
170
95343607 - AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. A MORA DO
DEVEDOR NÃO O IMPEDE DE QUITAR O DÉBITO POR AÇÃO
CONSIGNATÓRIA, UMA VEZ VERIFICADA UMA DAS SITUAÇÕES
PREVISTAS NO ART. 335, DO CC, E QUANDO O VALOR FOR DEVIDAMENTE
ATUALIZADO E NÃO SE MOSTRAR INÚTIL. A ação de consignação em pagamento
é via adequada para a declaração de extinção de débito relativo a cheque devolvido
sem pagamento, por falta de provisão de fundos, lastreada em alegação de residir o

219
Outra situação que pode acontecer, quando do pagamento,
é justamente a dúvida do devedor sobre a quem deve realizar a
entrega da prestação, que acarreta o medo de pagar à pessoa
errada e ter que pagar novamente. Bem explica a seguinte
jurisprudência, os temores do devedor171:
91973386 - APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS
AGRÁRIOS. PRELIMINAR REJEITADA. AÇÃO
DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.
DÚVIDA SOBRE QUEM DEVA
LEGITIMAMENTE RECEBER O PAGAMENTO.
HONORÁRIOS ADVOACTÍCIOS. A decisão atacada
encontra-se perfeitamente fundamentada, não havendo
mácula, quanto a sua fundamentação. Em tendo sido
observada a exegese do artigo 93, IX da Constituição
Federal de 1988, não há que se falar em declaração de
nulidade da decisão hostilizada. Ação de consignação
em pagamento proposta com fundamento no art. 335,
IV, do Código Civil - Ocorrência de dúvida sobre quem
deva legitimamente receber o objeto do pagamento -,
sendo o valor depositado inferior ao que disposto no
contrato havido entre as partes. No caso dos autos, é
natural a dúvida surgida no âmbito da autora dessa
ação de consignação acerca de a quem deveria pagar,
pois, como bem salienta em seu apelo, “quem paga
mal, paga no mínimo duas vezes” (fl. 386). Refira-se,
ademais, que vantagem nenhuma lograria a autora com
a presente consignação. Ao contrário, desde o depósito
da verba em juízo, a mesma já saiu da esfera patrimonial
da autora, de modo que não teria ela, diga-se, benefício
algum com o manejo desse recurso durante o período
de discussão judicial acerca da titularidade do crédito.

credor em local incerto, hipótese prevista no art. 335, III, do CC/2002 Reconhecimento
da suficiência do depósito e a satisfação do débito relativo ao cheque objeto da ação,
com o depósito da oferta e respectiva complementação Declaração de extinção da
obrigação da autora em relação ao pagamento do cheque e determinados o cancelamento
do respectivo protesto e a exclusão de sua inscrição em cadastro de inadimplentes.
Deferido o pedido de antecipação de tutela, fica autorizada, quando e se requerido pelo
apelante, a extração de carta de sentença, para esse fim. Recurso provido. (TJ-SP; APL
0014617-38.2008.8.26.0566; Ac. 5685599; São Carlos; Vigésima Câmara de Direito
Privado; Rel. Des. Rebello Pinheiro; Julg. 13/02/2012; DJESP 05/03/2012) Fonte:
DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
171
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

220
Redistribuídos os ônus da sucumbência. Honorários
advocatícios fixados em R$ 1.500,00 (um mil e
quinhentos reais). Preliminar rejeitada. Apelo
parcialmente. Provido. Unânime. (TJ-RS; AC 551975-
48.2010.8.21.7000; Pelotas; Nona Câmara Cível; Relª
Desª Iris Helena Medeiros Nogueira; Julg. 14/12/
2011; DJERS 16/12/2011) (sem grifo)

São diversas as situações que podem gerar dúvidas sobre


o credor legítimo a receber uma prestação, veja os casos de cessão
de crédito, herdeiros sem a devida abertura de inventário, sucessão
de advogados em processo judicial, rompimento de sociedades
de fato, entre outras. Novamente se busca proteger ao devedor e
evitar que o mesmo seja surpreendido ao ter que pagar duas
vezes a mesma conta, em razão de ter pago a primeira vez a
alguém que não tinha legitimidade para receber o débito.
Por fim, e não menos importante, caso o objeto do
pagamento esteja envolvido em algum tipo de litígio, também
pode acontecer riscos ao devedor. Importante lembrar que aqui
não há debate sobre as pessoas envolvidas na relação obrigacional,
a discussão gira sobre a própria prestação. Há dúvidas sobre o
que deve ser entregue, quanto a sua espécie ou quantidade,
ocorrendo esta dúvida há necessidade de posicionamento judicial,
a fim de determinar a coisa devida. O devedor, caso tenha razão,
e a fim de evitar os efeitos da mora, realiza a consignação e o
bem fica depositado durante o debate, novamente se ampara na
jurisprudência172:
94033011 - AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM
PAGAMENTO. DEPÓSITO DOS VALORES
INCONTROVERSOS. POSSIBILIDADE. OBJETO
DO PAGAMENTO DISCUTIDO EM JUÍZO.
INTERESSE DE AGIR PRESENTE. SENTENÇA
ANULADA Existe interesse processual quando a
parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a
tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela
jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do

172
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

221
ponto de vista prático - Diante da existência de ação
em que se pleiteia a revisão do contrato firmado entre
as partes, discutindo-se a ilegalidade de encargos
financeiros incidentes sobre o débito, é cabível a ação
de consignação em pagamento objetivando depositar
os valores tidos como incontroversos. Aplicação do
artigo 335, V, do Código Civil. (TJ-MG; APCV
0164969-40.2011.8.13.0024; Belo Horizonte; Rel.
Des. Veiga de Oliveira; Julg. 13/09/2011; DJEMG
23/09/2011)

Um lembrete, esta relação de situações em que se utiliza


a consignação não é taxativa, possuindo a legislação outros casos
em que é cabível a consignação em pagamento. Vê-se que o
objetivo do devedor é proteger-se, assim ao depositar a parcela
que ele entende devida, busca que ao menos parte dos efeitos de
uma possível mora não seja por ele sentida.

1.3 Requisitos
A questão envolvendo o que o devedor entende devido,
deve ser analisada com bastante cuidado, veja que a consignação
não abre a possibilidade de um devedor efetuar depósito de apenas
parte do débito, como uma espécie de punição ao credor por
não buscar seu crédito. O depósito deve ser feito da PARCELA
DEVIDA.
“Para que a consignação tenha força de pagamento, será
mister concorram, em relação às pessoas, ao objeto, modo e
tempo, todos os requisitos sem os quais não é válido o
pagamento” (art. 336, Código Civil), não há que se falar em
pagamento sem a obediência a seus requisitos, lógico que o
mesmo deve ocorrer na consignação. O devedor cumprirá todas
as exigências do negócio jurídico para poder obter os efeitos da
consignação e ver extinta a relação obrigacional.
A consignação deve obedecer aos requisitos do
pagamento, conforme já estudado alhures. O accipiens tem que
possuir legitimidade para receber, o pagamento deve ocorrer no
local e tempos determinados, bem como a prestação obedece
ao combinado.

222
Estes requisitos são simples, no entanto algumas
observações devem ser feitas. A primeira envolve a questão do
tempo, a consignação muitas vezes não tem como ser realizada
na exata data do vencimento da obrigação, mesmo porque o
devedor toma conhecimento da impossibilidade nesta data, mas
a consignação não pode ter um lapso temporal que não condiga
com sua utilidade e demonstre o interesse do devedor em arcar
com a prestação em seu vencimento.
Como se torna impossível realizar a consignação na data
do vencimento, a jurisprudência pátria entende que estaria
preenchido o requisito do tempo, quando o depósito se realizar
imediatamente após o vencimento, só assim não se poderia falar
em mora do pagamento173.
Outra observação envolve à própria prestação, esta deve
obedecer ao objeto pactuado e sua integralidade. Um pagamento
apenas gera a extinção da obrigação quando o devedor entrega
exatamente o que foi acordado, não podendo mudar o objeto
(mesmo que mais valioso) e muito menos dividir a entrega deste
objeto se assim não foi acordado.
Por conta desta exigência, caso o devedor deposite
prestação diferente da pactuada incabível é a extinção da relação
obrigacional, não se podendo dar a quitação ao débito. O mesmo
se fala quando ocorre consignação de apenas parte da prestação,

173
14352088 - PROCESSUAL CIVIL E SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO.
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. REVISÃO CONTRATUAL.
INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL. TEMPO. ARTIGO 336 CÓDIGO CIVIL.
1. A ação de consignação em pagamento constitui via inadequada à revisão de cláusulas
contratuais, tendo em vista que não se presta para a obtenção de tutela constitutiva e
condenatória e nem para impingir à parte ré obrigações de fazer. 2. O especial
procedimento da consignação em pagamento exige que a ação seja ajuizada imediatamente
após o vencimento da obrigação, a fim de que a quitação possua validade, conforme
preceitua o artigo 974 do Código Civil de 1916, com idêntica redação no Código Civil
de 2002 (artigo 336). 3. Compulsando os autos, verifica-se que os autores, quando do
ajuizamento da consignação, em 15 de março de 2002, encontravam-se com prestações
em aberto desde agosto de 2001 (planilha de evolução do financiamento. fls. 371). 4.
Não tendo efetuado o pagamento tempestivamente, mesmo que em consignação, ficou
caracterizada a mora dos mutuários, obstando o manejo do procedimento especial da
consignação em pagamento após um longo período de impontualidade. 7. Recurso
desprovido. (TRF 02ª R.; AC 0004215-79.2002.4.02.5101; Oitava Turma
Especializada; Rel. Des. Fed. Poul Erik Dyrlund; Julg. 01/02/2012; DEJF 07/02/
2012; Pág. 196) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

223
neste caso haverá pagamento parcial, sendo mantida a relação
obrigacional quanto ao restante não depositado, conforme bem
expressa esta jurisprudência:
95301560 - DESPESAS DE CONDOMÍNIO.
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.
EXCLUSÃO DA DESPESA COM CARTÓRIO
COBRADA DO CONDÔMINO. DESPESA QUE
ELE MESMO DEU CAUSA AO NOTIFICAR O
CONDOMÍNIO ATRAVÉS DE CARTÓRIO
EXTRAJUDICIAL. PREVISÃO NA
CONVENÇÃO DE COBRANÇA DAS DESPESAS
QUE O CONDÔMINO DER CAUSA. DEPÓSITO
INSUFICIENTE. IMPROCEDÊNCIA. NÃO
PODE O DEVEDOR IMPOR AO CREDOR UM
PAGAMENTO PARCIAL, TAMBÉM NÃO
PODE REQUERER A CONSIGNAÇÃO A NÃO
SER PELO VALOR INTEGRAL DA
PRESTAÇÃO DEVIDA. Para validade da
consignação exige, pois, a Lei que o depósito judicial
compreenda o mesmo objeto que seria preciso prestar
para que o pagamento pudesse extinguir a obrigação.
Recurso desprovido. (TJ-SP; APL 0150075-
47.2006.8.26.0000; Ac. 5541257; Presidente
Prudente; Vigésima Sétima Câmara de Direito
Privado; Rel. Des. Gilberto Leme; Julg. 08/11/
2011; DJESP 05/12/2011)174

Por fim, a consignação só é possível se houver liquidez


do débito, bem ensina Caio Mário175:
No tocante à integralidade do depósito, cumpre
salientar que é indispensável tratar-se de obrigação
líquida e certa. Se não está apurado o quantum, não
cabe o depósito. Neste particular, já se diz que a
consignação em pagamento é uma execução invertida.
Da mesma forma que o credor, para valer-se da ação
executiva, tem de fazer citar o devedor para pagar
uma soma precisa, pois, se não é líquida e certa a

Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.


174

PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil. Volume II. Teoria
175

Geral das Obrigações. 22 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 205.

224
obrigação, é mister se acerte e liquide pelas vias
ordinárias, também o devedor, para que tenha o
direito de promover a execução da obrigação, por via
da oferta real, terá de convocar o credor com o
oferecimento de uma quantia que seja a devida, sem a
necessidade de prévio acertamento, o qual somente
teria cabida nas vias ordinárias.

Não há que se falar na aplicação deste procedimento


quando ainda se debate o que deve ser entregue, quando há
dúvidas quanto à própria prestação, as vias ordinárias
apresentadas por Caio Mário são justamente as ações em que
ainda se discute qual prestação deve ser entregue. É uma questão
simples, um devedor que não sabe nem o que vai entregar, não
tem como propor a consignação e convocar o credor, a fim de
receber este bem. A consignação tem papel aplicável às situações
em que se sabe exatamente o que deverá ser entregue.

1.4 Lugar da consignação


O caput do art. 337 estipula regra do local, a consignação
deverá ser proposta no lugar do pagamento da obrigação, como
já explicado. Obedecidos estes requisitos, o Código Civil
apresenta o primeiro dos efeitos da consignação, que é justamente
o de cessar “para o depositante, os juros da dívida e os riscos,
salvo se for julgado improcedente”, leitura da parte final do citado
art. 337.
A busca da extinção da relação obrigacional, pelo
devedor, tem a finalidade de evitar os juros e quaisquer outros
riscos com a prestação. Ela evitará que o devedor assuma juros
sobre o período, bem como os riscos de perecimento da coisa.
Claro que, julgada improcedente a consignação, o devedor deverá
arcar com os eventuais acréscimos sobre a prestação.

1.5 Aceitação do depósito e seu levantamento


A respeito do depósito e do arrependimento do devedor,
o Código Civil os retrata nos arts. 338 a 340. Nestes são dispostas
regras para a possibilidade do devedor resolver não seguir com a

225
demanda e pedir a devolução do que foi depositado em favor do
credor.
O art. 338, Código Civil, diz que enquanto “o credor não
declarar que aceita o depósito, ou não o impugnar, poderá o
devedor requerer o levantamento, pagando as respectivas
despesas, e subsistindo a obrigação para todas as conseqüências
de direito”, o dispositivo possibilita que o devedor levante os
valores depositados, no entanto apenas nas situações em que o
credor ainda não aceitou o depósito ou não impugnou a
consignação, sendo que neste caso o devedor deverá arcar com
todas as despesas decorrentes do pedido de consignação.
Superado esse momento inicial da consignação, o Código
Civil impõe que julgado “procedente o depósito, o devedor já
não poderá levantá-lo, embora o credor consinta, senão de acordo
com os outros devedores e fiadores” (art. 339). Este dispositivo
protege o devedor, veja que o citado artigo fala de julgamento
procedente, logo o pedido de consignação foi deferido pelo
judiciário, assim o entendimento favorável ao devedor implica
dizer que a relação obrigacional foi declarada extinta, não
podendo ocorrer o levantamento do depósito, pois acarretaria
manter a existência da obrigação.
A doutrina entende poder ocorrer o levantamento do
depósito, caso ocorra aceite do credor e este levantamento não
origine prejuízo a terceiros, que por ventura tenham algum tipo de
ligação às partes da relação obrigacional. É a situação determinada
no art. 340, Código Civil, e muito bem explicada por Gama176:
Caso já tenha sido oferecida resposta na ação de
consignação em pagamento ou sido aceito o depósito,
o devedor somente poderá levantá-lo se o credor
concordar com tal levantamento, caso em que perderá
a garantia e a preferência que tinha em relação à coisa
ou quantia consignada, desobrigando os co-devedores
e fiadores que não tenham anuído com o
levantamento.

176
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo:
Atlas, 2008, p 257.

226
Novamente se trata a possibilidade do devedor desistir
da consignação e realizar o levantamento do que foi depositado.
Após a aceitação deste depósito pelo credor ou sua impugnação,
é possível realizar o levantamento, desde que ocorra aceite do
credor, ficando este ciente que perderá a preferência e qualquer
garantia dada em respeito à coisa consignada. Ademais, caso
seja uma relação obrigacional que envolva outros devedores e
fiadores, estes ficarão desobrigados.

1.6 Consignação de bens


A consignação não trata apenas de dinheiro, ela também
envolve bens imóveis e os de corpo certo (aquele bem
devidamente identificado e individualizado, por exemplo o carro,
modelo X, Marca Y, chassis números). Estes bens, diferente do
erário, não têm como simplesmente serem entregues perante
uma instituição financeira, devendo possuir um procedimento
de entrega diferenciado.
As despesas, tais como manutenção, vigilância da mesma
e outras, ficam a cargo de quem está responsável pelo bem, fora
o fato de que a própria entrega com atraso pode acarretar multas
contratuais. Por exemplo, um imóvel locado, caso o locatário
apenas manifeste a intenção de desocupar o imóvel, não implica
que houve entrega do imóvel ao proprietário, a restituição apenas
ocorre com a devolução das chaves e restabelecimento dos
poderes do locador quanto ao bem, enquanto isto não acontecer
todas as despesas com o imóvel serão do locatário.
O art. 341 diz que se “a coisa devida for imóvel ou corpo
certo que deva ser entregue no mesmo lugar onde está, poderá o
devedor citar o credor para vir ou mandar recebê-la, sob pena de
ser depositada”, a palavra poderá propicia a ideia de faculdade
oferecida ao devedor, no entanto é de fundamental importância
a realização desta citação do credor, para proteger o devedor da
mora. Caso o devedor não realize o chamamento do credor, a
fim de que compareça e receba a prestação, posteriormente o
mesmo credor alegará que quem causou a mora foi o devedor e
este não terá como provar o contrário. Nas Palavras de Tepedino,
227
Barboza e Moraes177:
No sistema atual, contudo, pode-se considerar que o
exercício da faculdade concedida ao devedor seja
indispensável para que se possa alegar a mora do
credor, sendo razoável interpretar tal expediente
como manifestação da boa-fé objetiva, de maneira a
sopitar a indefinição quanto à entrega da coisa. Se o
devedor tem a faculdade legal de intimar o credor e
não o faz, não poderá invocar a mora accipiendi,
incorrendo, ao contrário, ele próprio, em mora
solvendi caso vença a obrigação sem pagamento.

O devedor deve convocar o credor para formalizar,


mesmo que simbolicamente a entrega da prestação (imóvel ou
corporal). Há a necessidade de obedecer à lealdade a que todos
estão submetidos nos negócios, e o devedor estaria agindo de
má-fé, podendo ser punido pelos danos causados178, caso não
informe a situação ao credor.

1.7 Prestações indeterminadas


Existem obrigações, conforme anteriormente estudado,
em que ocorre indeterminação inicial da prestação, a indecisão
decorre da própria natureza destas relações (obrigações de dar
coisa incerta e as obrigações alternativas). Nestes tipos poderia
até se pensar na inaplicabilidade do pagamento por consignação,
em decorrência da iliquidez da prestação, no entanto tais
prestações apenas são ilíquidas em um momento inicial, antes

177
TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin
de. Código civil interpretado conforme a Constituição da República. 2 ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2007, p 638.
178
48406956 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.
DESPEJO. ENTREGA DAS CHAVES OU CONSIGNAÇÃO JUDICIAL. ÔNUS
DO LOCATÁRIO. ART. 61, LEI DE LOCAÇÃO. PRAZO. TERMO INICIAL.
CITAÇÃO. I - Constitui ônus do locatário a efetiva entrega das chaves ao desocupar o
imóvel ou sua consignação judicial, sob pena de arcar com os alugueres e encargos
advindos do contrato. II - Conforme prescrito no art. 61 da Lei de Locação, o termo
inicial do prazo de seis meses para entrega do imóvel é a data da citação, e não a da
juntada do respectivo mandado aos autos. III - Agravo de instrumento improvido. (TJ-
DF; Rec 2011.00.2.021922-4; Ac. 562.258; Sexta Turma Cível; Relª Desª Vera
Andrighi; DJDFTE 03/02/2012; Pág. 179) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/
Maio 2012.

228
de a mesma ser cumprida deve ocorrer a concentração (escolha).
Quando a escolha é efetuada pelo devedor não há
problemas, mas a escolha pode ser exercida pelo credor e este
pode se negar a exercer seu direito, o que acarretaria a dificuldade
do devedor em cumprir a prestação, em razão dele não saber a
prestação a ser entregue. Nesta situação, quando a escolha da
coisa indeterminada cabe ao credor, ele será citado para exercer
seu direito, caso ele não a realize perderá este direito, e será
depositada a coisa que o devedor escolher (art. 342, Código
Civil).

1.8 Despesas
A consignação pode gerar custos, por exemplo: o devedor
tem que entregar um cavalo da raça puro sangue inglês, o credor
se recusa a recebê-lo. Este semovente poderá, a mando da justiça,
ser depositado em haras local até final julgamento do processo.
Enquanto o cavalo estiver neste haras, existem várias despesas
com o mesmo, tais como aluguel do espaço, tratador, veterinário,
alimentação e remédios. O problema que se apresenta é definir
quem assumirá as despesas.
As “despesas com o depósito, quando julgado procedente,
correrão à conta do credor, e, no caso contrário, à conta do
devedor” ( art. 343, Código Civil), a solução é simples, caso o
credor tenha dado causa ao pedido de consignação ele deverá
arcar com as despesas supervenientes. Caso seja julgada
improcedente, as despesas serão do devedor que provocou o
judiciário requerendo a consignação e a ele não cabia razão.

1.9 Obrigação litigiosa


A consignação visa a extinção da relação e evitar futuras
alegações quanto ao pagamento, se foi no vencimento, se foi no
valor correto, se foi à pessoa com legitimidade para receber,
dentre outras. Como já mencionado, existe a máxima de que
quem paga mal paga duas vezes, com o intuito de evitar este
agravamento da situação do devedor, quando houver obrigação
litigiosa (várias pessoas se apresentam como credor, com direito
229
a receber a prestação) a consignação é utilizada, a fim de exonerar
a prestação, “mas, se pagar a qualquer dos pretendidos credores,
tendo conhecimento do litígio, assumirá o risco do pagamento”
(art. 344, Código Civil), assim impõe a lei.
Neste caso, imagine a situação de Arthur, devedor de
aluguéis a Lancelot. Infelizmente este veio a óbito, e antes de
abertura do inventário, os 3 herdeiros de Lancelot lançaram-se
em disputas pelo direito de receber os aluguéis, neste caso a quem
Arthur deverá pagar? A fim de evitar prejuízo futuro, Arthur
deverá consignar os aluguéis conforme seu vencimento, e
aguardar a decisão do judiciário.

1.10 Quando o credor requer a consignação


Em toda a exposição ficou demonstrado que
normalmente quem propõe a consignação em pagamento é o
devedor, assim o credor é quem seria convocado a responder a
consignação. No entanto há exceção, a lei determina um caso
em que o credor fará as vezes de autor da consignação em
pagamento, pois se “a dívida se vencer, pendendo litígio entre
credores que se pretendem mutuamente excluir, poderá qualquer
deles requerer a consignação” (art. 345, Código Civil). Neste
caso quem requererá a consignação é o próprio credor, exigindo
ao juízo que seja notificado o devedor a depositar a parcela devida
em favor do juízo em que os credores discutem o direito de
receber o pagamento.
Por exemplo, o Banco A propôs ação judicial contra a
Financeira S, por conta de esta haver cedido diversos contratos
ao Banco A, no entanto não notificou aos devedores e estes
continuam pagando à própria financeira. O Banco A propõe ação
judicial contra a Financeira S, na qual se discute a legalidade e
efetividade da cessão. Paulo é devedor da financeira em um destes
contratos cedidos. O Banco requer ao juízo a consignação do
débito de Paulo, perante a vara cível em que litigam (financeira
e banco), como forma de ao final da ação o valor ser entregue a
quem de direito.

230
2. Sub-rogação.
2.1 Noções gerais
A palavra sub-rogação significa substituição, neste tipo de
pagamento especial ocorre a interferência de uma terceira pessoa
no vínculo original da relação obrigacional. O estudo inicial deste
tipo de pagamento pode levar o leitor a confundi-lo com uma
cessão. Veja que aqui, assim como na cessão, existe uma
substituição no polo ativo, o credor original recebe o pagamento
de um terceiro e este passa a ocupar a posição de credor.
Mas deve se observar que na cessão há transferência de
situação creditória e aqui um terceiro paga a própria prestação, o
que acarreta a extinção do vínculo do credor original. Na cessão
ocorre uma negociação sobre o crédito, o cedente recebe uma
vantagem do cessionário, mas não o próprio valor da prestação.
Na sub-rogação há pagamento do próprio débito, ademais,
diferente da cessão em que há apenas que se obedecer aos
requisitos do negócio jurídico, a sub-rogação é determinada por
dispositivos legais. Melhor expõe Serpa Lopes179:
No pagamento por sub-rogação, observa-se essa
singularidade: trata-se efetivamente de um
pagamento, mas que, diferentemente da forma
comum, não acarreta a extinção do débito. Pelo
contrário. Satisfeito o credor originário pelo terceiro
que o efetuou, a dívida se conserva como se
pagamento não houvesse sido feito, assumindo o
solvente a posição do credor, uma vez dêle recebida a
quitação. Por conseguinte, no pagamento por sub-
rogação, dois pontos ficam fora de qualuer(sic)
dúvida: de um lado, o efeito da realização do direito
do credor; de outro, a subsistência, com plena vida,
da obrigação do devedor.

A sub-rogação vai ser aquele tipo de pagamento especial


em que um terceiro interfere diretamente na relação obrigacional,
pagando o débito ao credor original e encerrando a obrigação

179
Lopes, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil – obrigações em geral. Volume
II. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1955, p 257.

231
em relação a este, restando ao terceiro ocupar a posição de credor,
podendo exigir todos os direitos dispostos no vínculo original
contra o devedor.
A doutrina classifica a sub-rogação em dois tipos, primeiro
quanto ao objeto, dividindo-a em real e pessoal. No tipo real
tem-se a substituição de coisas, situações nas quais se troca um
bem por outro dentro de uma relação180. Já a sub-rogação pessoal
será aquele tipo em que ocorre a substituição de um dos sujeitos
inseridos na relação. Este tipo se subdivide em duas subespécies,
quais sejam a sub-rogação legal e a sub-rogação convencional181,
que passarão a ser estudas detidamente.

180
62083486 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO
EXTRAJUDICIAL. ARREMATAÇÃO DE BEM HIPOTECADO. CREDOR
HIPOTECÁRIO REGULARMENTE INTIMADO E QUE NÃO SE MANIFESTOU.
SUBSISTÊNCIA DO DIREITO DE PREFERÊNCIA SOBRE O PRODUTO DA
ARREMATAÇÃO. Embora a arrematação seja causa de extinção da hipoteca nos
termos do art. 1.499 do CC, o direito de preferência do credor hipotecário subsiste
sobre o produto da arrematação, porquanto o ônus sobre o bem se transfere para o
preço, em razão da sub-rogação real. Direito de preferência mantido. Desnecessidade
de se instalar o concurso de credores, afeto apenas aos credores quirografários. Reforma
da decisão. Conhecimento e provimento do recurso. (TJ-RJ; AI 2009.002.01205;
Sexta Câmara Cível; Rel. Des. Rogerio de Oliveira Souza; Julg. 08/04/2009; DORJ
27/04/2009; Pág. 162) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
181
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SUB-ROGAÇÃO PESSOAL. CONCEITO.
MODALIDADES: LEGAL E CONVENCIONAL. TERCEIRO INTERESSADO.
IRRELEVÂNCIA NA SUB-ROGAÇÃO CONVENCIONAL. TRANSFERÊNCIA
EXPRESSA DE DIREITOS CREDITÓRIOS. AUSÊNCIA DE JUSTO MOTIVO
DO DEVEDOR. RECURSO ESPECIAL. REEXAME DOS FATOS. VEDAÇÃO.
ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. RECURSO DESACOLHIDO.
I - A sub-rogação pessoal é a substituição nos direitos creditórios, operada em favor de
quem pagou a dívida ou para isso forneceu recursos. Em outras palavras, na sub-
rogação se dá a substituição de um credor por outro, permanecendo todos os direitos
do credor originário(sub-rogante) em favor do novo credor(sub-rogado). Dá-se, assim,
a substituição do credor, sem qualquer alteração na obrigação do devedor.
II - Existem dois tipos de sub-rogação pessoal: a legal(art. 985, Código Civil) e a
convencional(art. 986, idem). A primeira decorre ipso iure, enquanto a segunda tem
origem em acordo de vontades.
III - Diversamente da legal(CC, art. 985), na sub-rogação convencional(art. 986) não
se questiona a existência de interesse do terceiro que efetuou o pagamento para outrem,
mas apenas a existência de contrato que transfira expressamente os direitos creditórios
e a ausência de justo motivo do devedor para recusar o pagamento.
IV - O recurso especial não se presta ao reexame dos fatos da causa, a teor do enunciado
n. 7 da súmula/STJ. (REsp 141.971/PR, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO
TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 27/04/1999, DJ 21/06/1999, p. 160)
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012

232
2.2 Sub-rogação legal
A sub-rogação legal, conforme a própria denominação,
decorre da imposição da lei, não havendo interferência de
qualquer das partes envolvidas na relação obrigacional, vez que
não há manifestação de vontade para sua formação. Neste tipo
de sub-rogação a norma dispõe as situações em que ocorrido o
pagamento por pessoa que não o credor, este terceiro
imediatamente se sub-roga na posição de accipiens. São dispostos
no art. 346, Código Civil, três casos em que ocorre este tipo de
sub-rogação, in verbis:
I - do credor que paga a dívida do devedor comum;
II - do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a
credor hipotecário, bem como do terceiro que efetiva
o pagamento para não ser privado de direito sobre
imóvel;
III - do terceiro interessado, que paga a dívida pela
qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte.

A primeira situação, fala do devedor comum, que tem


ao mesmo tempo dois ou mais credores, cada um com vínculo
próprio. Nesta circunstância um dos credores paga a dívida
perante o outro credor e passa a poder cobrar, também esta
dívida do devedor comum, como exemplo veja a
jurisprudência:
94063709 - EMENTA. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. BUSCA E APREENSÃO.
VEÍCULO RETIDO EM PÁTIO DO DETRAN.
RETIRADA. DESPESAS E TAXAS
ADMINISTRATIVAS. ÔNUS DA INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA PROPRIETÁRIA. Como
proprietária e interessada pela liberação do veículo,
cabe à instituição financeira arcar com as despesas e
taxas administrativas cobradas pelo órgão
administrativo competente, podendo, caso lhe seja
conveniente, buscar ressarcimento em ação própria
contra o devedor, nos termos do art. 346, I, do
Código Civil. Recurso não provido. (TJ-MG; AGIN
0678260-25.2011.8.13.0000; Patos de Minas;
Décima Segunda Câmara Cível; Rel. Des. Nilo
233
Lacerda; Julg. 25/01/2012; DJEMG 06/02/
2012)182

O sujeito passivo ocupa a posição de devedor perante


duas instituições (um devedor, e duas obrigações). Sabe-se que a
intenção da Financeira é liberar o veículo, ela paga o débito do
devedor junto ao DETRAN (taxas, multas...), efetivado este
pagamento, o quadro é simples: em relação ao DETRAN há
extinção do vínculo, em relação à Financeira, esta o substitui e
passa a poder cobrar os valores antes devidos ao órgão de trânsito,
bem como os valores originais do financiamento.
A segunda hipótese de sub-rogação legal retrata a
negociação de imóvel hipotecado, como já explicado a hipoteca
é um tipo de garantia em que um imóvel fica ligado a quem
forneceu crédito ao devedor e caso este não pague sua obrigação
pode vir a perder o próprio imóvel.
Nesta sub-rogação verificam-se duas situações, a primeira
diz respeito ao comprador de um imóvel hipotecado, ele paga
diretamente ao credor da hipoteca, restando a este comprador o
direito de exigir que o devedor cumpra a hipoteca ou entregue o
imóvel. Na outra situação, tem-se o caso de alguém que utiliza o
citado imóvel hipotecado, sabendo que o devedor não cumpriu
a prestação este terceiro conhece o risco de não mais poder utilizar
este bem, assim ele se apresenta ao credor, paga a hipoteca e
sub-roga-se nos direitos da relação obrigacional, podendo exigir
a prestação do devedor183.
182
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
183
94019448 - APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO. ESCRITURA PÚBLICA.
ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL. VENDEDOR. QUITAÇÃO DO DÉBITO
HIPOTECÁRIO. OBRIGAÇÃO NÃO CUMPRIDA. INEXIGIBILIDADE DO
TÍTULO. PAGAMENTO CREDOR HIPOTECÁRIO. COMPRADOR. SUB-
ROGAÇÃO. COMPENSAÇÃO. Pagamento - Em observância ao princípio da exceção
do contrato não cumprido, é inexigível a obrigação de uma das partes enquanto não
adimplir a sua cota, a parte ex adversa. - Forte no art. 346, II, do Código Civil, o
adquirente de imóvel gravado com hipoteca que paga ao credor hipotecário o débito
respectivo sub-roga-se, de pleno direito, nos direitos creditícios atinentes ao gravame,
podendo utilizar tais direitos como forma de compensação para adimplir eventual
débito em aberto do contrato de compra e venda. (TJ-MG; APCV 0020462-
57.2010.8.13.0141; Carmo de Minas; Décima Primeira Câmara Cível; Relª Desª
Selma Marques; Julg. 05/10/2011; DJEMG 17/10/2011) Fonte: DVD Magister.
Ed. 43. Abril/Maio 2012.

234
Por fim, a última hipótese apresentada pelo art. 346 diz
respeito ao terceiro interessado que paga a dívida, em decorrência
de poder ser responsabilizado pela mesma. Por exemplo,
Agostinho tem seu carro danificado em um acidente causado
por Tomás. Agostinho tem seguro e exige da seguradora o
pagamento pelo conserto do veículo. Na realidade quem deveria
pagar o conserto seria Tomás, que praticou o ato ilícito, no
entanto a seguradora paga os reparos. Aqui se tem credor original,
Agostinho; devedor, Tomás; pagamento pela seguradora,
extinção do vínculo entre Agostinho e Tomás. Transferência do
direito de exigir a reparação de Tomás para a Seguradora184.
A legislação enumera outras situações de sub-rogação,
veja o Código Civil:
Art. 259. Se, havendo dois ou mais devedores, a
prestação não for divisível, cada um será obrigado
pela dívida toda.
Parágrafo único. O devedor, que paga a dívida, sub-
roga-se no direito do credor em relação aos outros
coobrigados.
Art. 786. Paga a indenização, o segurador sub-roga-
se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações
que competirem ao segurado contra o autor do dano.
Art. 831. O fiador que pagar integralmente a dívida
fica sub-rogado nos direitos do credor; mas só poderá
demandar a cada um dos outros fiadores pela
respectiva quota.
Art. 1478. Se o devedor da obrigação garantida pela
primeira hipoteca não se oferecer, no vencimento,
para pagá-la, o credor da segunda pode promover-lhe

184
94077055 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO.
SEGURADORA. SUB-ROGAÇÃO Reembolso de valores pagos no reparo de veículo
segurado - Condutor do veículo causador do acidente - Dever de indenizar - Ônus
sucumbenciais - Princípio da causalidade. - a seguradora se sub-roga nos direitos do
segurado, quando efetiva ao beneficiário o pagamento do valor do veículo sinistrado,
nos termos permissivos do artigo 346, inciso III, do Código Civil/02. - patente o dever
de indenizar, se devidamente comprovada a prática de ato ilícito, o dano e o nexo de
causalidade. - não poderão os ônus da sucumbência ser suportados por quem não deu
causa ao ajuizamento da ação. (TJ-MG; APCV 5862342-73.2007.8.13.0024; Belo
Horizonte; Nona Câmara Cível; Rel. Des. José Antônio Braga; Julg. 14/02/2012;
DJEMG 05/03/2012) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

235
a extinção, consignando a importância e citando o
primeiro credor para recebê-la e o devedor para pagá-
la; se este não pagar, o segundo credor, efetuando o
pagamento, se sub-rogará nos direitos da hipoteca
anterior, sem prejuízo dos que lhe competirem contra
o devedor comum.

Para outros exemplos, veja também o art. 13, do Código


de Defesa do Consumidor e o art. 12, da lei n.º 8.245/91, estes,
os transcritos e os indicados, são casos em que ocorre a sub-
rogação legal.

2.3 Sub-rogação convencional


A outra espécie de sub-rogação pessoal é a convencional,
neste tipo de pagamento se verifica a expressão de vontade das
partes envolvidas na relação obrigacional. Segundo o art. 347,
Código Civil, são duas as situações da sub-rogação convencional:
I - quando o credor recebe o pagamento de terceiro e
expressamente lhe transfere todos os seus direitos;
II - quando terceira pessoa empresta ao devedor a
quantia precisa para solver a dívida, sob a condição
expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos
do credor satisfeito.

Quanto ao inciso primeiro o mesmo é muito bem


explicado por Gonçalves185:
O terceiro interessado já se sub-roga,
automaticamente, nos direitos do credor. Não
necessita, pois, dessa transferência feita pelo credor.
Cuida o dispositivo, pois, da hipótese de terceiro não
interessado. Mesmo o que não tem interesse direto
no pagamento e cumpre a prestação no lugar do
devedor pode ficar sub-rogado nos direitos do credor,
desde que preenchidos os seguintes requisitos: a) que
haja uma transferência expressa dos direitos do credor;
b) que a transferência seja efetuada até o momento
em que recebe a prestação.

185
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 312/313.

236
Nesta sub-rogação há acordo entre o credor original e o
terceiro que se apresenta para pagar a conta, por este acordo são
expressamente transferidos ao novo credor todos os direitos sobre
a obrigação, não havendo consulta ao devedor se aceita ou não
este pagamento.
A doutrina apresenta esta situação e a semelhança que a
mesma tem com a cessão, na realidade a forma de solução desta
sub-rogação utilizará as regras da cessão, mas se sabe que na
sub-rogação há um pagamento da prestação e não uma transação
negocial, veja a jurisprudência:
57411514 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE
COBRANÇA. CONDOMÍNIO. LEGITIMIDADE
ATIVA. Empresa que adianta o valor das cotas de
condôminos inadimplentes. Sub-rogação
convencional configurada. Sentença escorreita.
Recurso desprovido por maioria de votos. A
prestadora de serviço contratada que antecipa o
pagamento de prestações de condôminos
inadimplentes, sub-roga-se nos direitos, ações,
privilégios e garantias do credor primitivo, na forma
dos artigos 347 e 349 do Código Civil. (TJ-PR; ApCiv
0765307-6; Curitiba; Décima Câmara Cível; Rel.
Des. Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima; DJPR
11/08/2011; Pág. 368)186

A sub-rogação convencional vai decorrer deste acordo


entre o credor original e o terceiro que se apresenta e paga a
conta, com a condição essencial de que o credor original transfira
todos seus direitos expressamente ao novo credor. A solução da
sub-rogação convencional será igual à de uma cessão, conforme
aplicação do art. 348 (Na hipótese do inciso I do artigo
antecedente, vigorará o disposto quanto à cessão do crédito este
tipo de sub-rogação)187.

186
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
187
60028633 - CIVIL E PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO
DE EXECUÇ ÃO. ESCRITURA DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. CESSÃO DE
CRÉDITO. SUBSTITUIÇÃO DO CREDOR. Transferência dos direitos creditórios
ao ora agravante, a teor do que dispõem os arts. 347, I, e 348 do Código Civil. Direito
do cessionário ao prosseguimento da execução. Inteligência do art. 567, II, do CPC.

237
O segundo tipo de sub-rogação convencional é mais fácil
de ser identificada, nesta haverá a confluência de vontades entre
o novo credor (terceiro) e o devedor, vez que ocorre quando o
terceiro empresta ao devedor a quantia precisa para solver a dívida
sendo condicionado, este empréstimo, à sub-rogação dos direitos
do credor satisfeito.
Assim ensina Orlando Gomes188:
A outra é um contrato forçado. Neste caso, a sub-
rogação resulta da vontade do devedor. A fim de se
desobrigar, o devedor pede a outrem que lhe empreste
a quantia devida, estipulando que o mutuante se sub-
rogará nos direitos do credor satisfeito. Troca
vantajosamente de credor. Não é preciso que este
consinta. Uma vez satisfeito, pouco lhe importa que
o devedor passe a dever a outrem por ter feito
empréstimo para lhe pagar.

O credor original não tem como interferir, vez que seu


maior interesse é receber a prestação, assim ele sai da relação (a
obrigação é extinta em relação ao credor original) e o terceiro
que emprestou o dinheiro passa a ocupar a posição de credor e o
devedor continua em sua posição na relação obrigacional.

2.4 Efeitos da sub-rogação


“A sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos,
ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida,
contra o devedor principal e os fiadores” (art. 349, Código Civil),
este é o resumo do que acontece na sub-rogação, o novo credor
poderá exercer todos os direitos do credor original, inclusive
aqueles necessários para o exercício e recebimento da prestação.
Orlando Gomes189, completando o raciocínio sobre a sub-
rogação, afirma:

Conhecimento e provimento do recurso. (TJ-RN; AI 2010.009848-4; Natal; Segunda


Câmara Cível; Rel. Des. Cláudio Santos; DJRN 21/12/2010; Pág. 60) Fonte: DVD
Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
188
Gomes, Orlando. Direitos reais. Rio de Janeiro, Forense, 1995, 11 ed. Pag. 141.
189
GOMES, Orlando. Direitos reais. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p 141.

238
Legal ou convencional, a sub-rogação produz duplo
efeito: liberatório e translativo. O devedor desobriga-
se para com o credor primitivo, mas os direitos destes
se transferem para quem pagou. Em última análise
passa a dever a outra pessoa.

A sub-rogação possibilita ao terceiro, que paga a prestação


ao credor original, realizar todos os atos que seriam deste. O
novo credor passa a ocupar a posição do primitivo, quando ocorre
isto é direito deste novo credor executar as garantias, exigir o
cumprimento da prestação, bem como que quaisquer multas por
descumprimento do pacto sejam a ele pagas. Bem expõe as
jurisprudências190:
57411514 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE
COBRANÇA. CONDOMÍNIO. LEGITIMIDADE
ATIVA. Empresa que adianta o valor das cotas de
condôminos inadimplentes. Sub-rogação
convencional configurada. Sentença escorreita.
Recurso desprovido por maioria de votos. A
prestadora de serviço contratada que antecipa o
pagamento de prestações de condôminos
inadimplentes, sub-roga-se nos direitos, ações,
privilégios e garantias do credor primitivo, na forma
dos artigos 347 e 349 do Código Civil. (TJ-PR; ApCiv
0765307-6; Curitiba; Décima Câmara Cível; Rel.
Des. Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima; DJPR
11/08/2011; Pág. 368) CC, art. 347 CC, art. 349

67030978 - FIANÇA. LOCAÇÃO. ALUGUEL E


ENCARGOS. COBRANÇA. SUB-ROGAÇÃO NO
CRÉDITO. LEGITIMIDADE PASSIVA. PESSOA
JURÍDICA OCUPANTE DO IMÓVEL LOCADO
E SEU SÓCIO. RECONHECIMENTO. A sub-
rogação de que tratam os artigos 985, III, e 988 do
Código Civil/1916 (artigos 346, III, e 349 do Código
Civil/2002), produz efeitos não somente contra o
devedor principal e os fiadores, mas, também, contra
quaisquer outros terceiros, em face dos quais o credor
primitivo tivesse ação para o recebimento do crédito,

190
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

239
a qualquer título que fosse. São eles, pois, que
permitem ao fiador que pagou o locador, por sub-
rogação e a título de reparação do dano que sofreu,
cobrar as pessoas que de fato sucederam a locatária
afiançada na ocupação do imóvel locado. (TACSP 2;
AI 875.383-00/2; Décima Segunda Câmara; Rel.
Des. Palma Bisson; Julg. 27/01/2005) CC, art. 988
CC, art. 349

Como se vê, ocorrida a sub-rogação e inserido um novo


credor na relação, este passa a deter toda proteção legal sobre
seu direito ao crédito, podendo utilizar todos os meios para recebê-
lo, excetuadas, logicamente, quaisquer medidas ilegais. O direito
de poder exigir a prestação por inteiro sofre uma limitação legal
vez que na “sub-rogação legal o sub-rogado não poderá exercer
os direitos e as ações do credor, senão até à soma que tiver
desembolsado para desobrigar o devedor” (art 350). Assim é
imposto um teto para a cobrança do novo credor, veja o
entendimento do STJ:
SEGURADOR. SUB-ROGAÇÃO. CONTRATO
DE TRANSPORTE. NÃO ADIMPLINDO O
TRANSPORTADOR SUA OBRIGAÇÃO DE
ENTREGAR A CARGA NO DESTINO,
DEVERA, PARA FORRAR-SE DA OBRIGAÇÃO
DE INDENIZAR, ALEGAR E PROVAR QUE A
FALTA SE DEVEU A FORÇA MAIOR. O
SEGURADOR QUE PAGA A INDENIZAÇÃO
SUB-ROGA-SE NOS DIREITOS DO
SEGURADO, PODENDO EXIGIR
INDENIZAÇÃO DO TRANSPORTADOR, NOS
MESMOS TERMOS EM QUE AQUELE O
PODERIA, NOS LIMITES DO QUE HOUVER
PAGO. (REsp 88.745/PE, Rel. Ministro
EDUARDO RIBEIRO, TERCEIRA TURMA,
julgado em 03/02/1998, DJ 04/05/1998, p. 151)191

Tem-se que nas situações abraçadas pela sub-rogação


legal, o terceiro (novo credor) só poderá exigir do devedor até o

https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo=&num_
191

registro=199600106410&dt_publicacao=04/05/1998 , em 25/07/2012.

240
limite do que efetivamente pagou ao credor original. Por
exemplo, em um contrato de seguro, o credor original tem direito,
em sua apólice, a receber R$ 10.000,00 da seguradora. Ocorre
que o evento danoso causou prejuízos da ordem de R$ 15.000,00.
Tendo o credor original exigido o pagamento pela seguradora,
esta apenas pagará R$ 10.000,00. E este é o valor que a seguradora
(novo credor/sub-rogada) poderá cobrar do devedor, vez que a
sub-rogação tem como limite o valor efetivamente pago pelo
sub-rogado ao sub-rogante (credor original).
E caso ocorra sub-rogação parcial, o “credor originário, só
em parte reembolsado, terá preferência ao subrogado, na cobrança
da dívida restante, se os bens do devedor não chegarem para saldar
inteiramente o que a um e outro dever” (art. 351, Código Civil),
veja que nos casos em que houve pagamento de apenas parte da
prestação, restando ainda valores devidos ao credor original, este
terá preferência sobre o sub-rogado (novo credor).
Veja o exemplo de Monteiro192:
[...], a dívida era de CR$ 20.000,00; o terceiro pagou
CR$ 10.000,00 e sub-rogou-se na aludida quantia.
Executado o devedor, seus bens produziram apenas
CR$ 15.000,00. O sub-rogante, isto é, o credor
primitivo, embolsará ainda os CR$ 10.000,00 que
faltavam para complementar o respectivo pagamento,
e o sub-rogado receberá apenas o remanescente,
deduzidas as custas e outras despesas.

Na sub-rogação parcial fica claro que o sub-rogante terá


preferência em receber a parte que não foi paga inicialmente,
restando ao sub-rogado aguardar os bens remanescentes do
devedor, a fim de vislumbrar a satisfação de seu crédito.

3. Imputação do pagamento
3.1 Noções gerais
Imputar significa indicar, neste tipo de pagamento ocorre
indicação de qual obrigação será adimplida. O estudo é centrado
192
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, volume 5, direito das
obrigações – 1ª parte. 27 ed. São Paulo, Saraiva, 1994, p 284/285.

241
em um tipo de pagamento no qual o devedor desenvolveu diversas
relações obrigacionais com o mesmo credor, mas infelizmente
ele não possui recursos suficientes para adimplir todas as
obrigações, só algumas. Quando o devedor entrega os recursos
para pagar as prestações, deverá ocorrer a indicação de quais
relações obrigacionais se extinguirão com o que foi entregue.
Segundo Rodrigues193:
Quando o devedor tem para com o credor diversas
dívidas, todas de coisas fungíveis entre si, todas
vencidas e líquidas, surge o problema de saber em
qual se imputará o pagamento, quando a prestação
oferecida, sendo suficiente para extinguir mais de
uma, não basta para extinguir todas as dívidas.

A imputação ocorre por conta da existência de diversas


dívidas entre o credor e o devedor e a falta de liquidez deste, por
exemplo, veja a Loja Só Ferrugem, esta fez três compras de
mercadorias para seus estoques em seu fornecedor Metais
Pesados Ltda.. A primeira de R$ 10.000,00, com vencimento
em 01º de janeiro do corrente ano, a segunda de R$ 15.000,00,
com vencimento em 03 de janeiro, também deste ano e a última
de R$ 7.500,00, com vencimento em 10 de janeiro do mesmo
ano. Passadas as datas de vencimento, a Loja Só Ferrugem dispõe
de R$ 12.000,00 para pagar suas dívidas. Como o valor não é
suficiente para pagar todas as obrigações, só poderá escolher uma
ou algumas para quitar, restando em aberto as demais.

3.2 Requisitos da imputação


A doutrina apresenta 05 requisitos para se identificar a
existência de imputabilidade: a) identidade subjetiva; b) diversas
dívidas; c) todas fungíveis e de igual gênero; d) dívidas vencidas
e líquidas e e) quantum insuficiente.
Atacando os requisitos, tem-se que para ocorrer
imputação devem existir diversas dívidas, todas com prestações

193
RODRIGUES, Silvio. Direito civil – Parte geral das obrigações. Volume II. 20 ed.
São Paulo: Saraiva, 1991, p 217.

242
fungíveis e de mesmo gênero (por exemplo, todas as dívidas se
referem a pagamentos em dinheiro ou todas as dívidas referem-
se a sacas de café); o credor e devedor são iguais em todas as
obrigações, sendo que o devedor não possui a quantidade
combinada de cada dívida, apenas parte das prestações e por
fim as dívidas tem que estar vencidas (o credor não pode exigir
dívida que ainda irá vencer). Ainda, necessária a liquidez dos
débitos, não se pode indicar a expectativa do valor que o débito
ficará. Em outras palavras a “pessoa obrigada por dois ou mais
débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de
indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos
e vencidos” (art. 352, Código Civil).

3.3 Quem imputa


Explicado o que é imputação em pagamento, surge a
questão de quem fará a indicação de qual dívida deve ser paga
ou abatida. Veja que dependendo do valor e da data de
vencimento, as dívidas terão reflexos financeiros diferenciados,
uma com valor maior poderá ser menos onerada com juros, ao
contrário de outra dívida que tem valor menor, mas por ser
vencida a mais tempo gera maior correção.
Por regra geral o direito de indicar em qual dívida deverá
ocorrer a imputação pertence ao DEVEDOR, conforme se
subtrai do já falado art. 352194. Logo, quando o devedor entregar

194
93160275 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. As
provas trazidas pelo agravante não demonstram a sua alegada impossibilidade absoluta
de pagar os alimentos executados. Eventual necessidade de redução da verba alimentar
deverá ser postulada em ação revisional e não na presente via executiva processada
pelo rito do art. 733 do CPC. Não são as alegações da parte exequente - De que o
executado estaria tentando fraudar a execução - Que determinam o rito da execução,
mas a natureza das prestações alimentares cobradas e o pedido da parte exequente. No
caso dos autos, tanto as prestações cobradas são atuais, quanto o pedido é expresso para
que a execução se processe pelo rito coercitivo do art. 733 do CPC. Logo, não há
irregularidade do rito executivo. A pessoa obrigada por dois ou mais débitos da mesma
natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se
todos forem líquidos e vencidos (art. 352 do Código Civil). Logo, o executado tem o
direito de dizer se está pagando a dívida mais pretérita e sem atualidade ou a mais atual,
que está sendo cobrada nesta execução. Caso em que o pagamento realizado pelo
executado deve ser descontado do débito cobrado da presente execução que se processa
pelo rito coercitivo da prisão. Agravo parcialmente provido. Em monocrática. (TJ-RS;

243
a prestação insuficiente, já poderá indicar em qual das dívidas
esta será abatida.
Caso não ocorra esta indicação, apresenta-se a regra do
art. 353, segundo a qual não “tendo o devedor declarado em
qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento,
se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar
contra a imputação feita pelo credor, salvo provando haver ele
cometido violência ou dolo”, assim caso o devedor realize o
pagamento e silencie quanto à imputação, esta passa a ser de
direito do credor, que indicará a sequência das prestações que
devem ser abatidas com os valores entregues.
A única ressalva será nas situações em que o credor a fez
mediante violência ou dolo contra o devedor, sabendo que
dependendo da sequência da imputação as prestações que
continuarem sem o pagamento podem gerar mais juros, o credor
pode, por egoísmo ou pura maldade, impor violentamente que o
devedor aceite a sequência dele. Obvio, que fora a própria lei
impor a impossibilidade desta situação, a boa-fé objetiva estaria
sendo desmerecida, caso fosse aceita esta situação195.

AI 54654-10.2012.8.21.7000; Porto Alegre; Oitava Câmara Cível; Rel. Des. Rui


Portanova; Julg. 15/02/2012; DJERS 17/02/2012) Fonte: DVD Magister. Ed. 43.
Abril/Maio 2012.
195
53179779 - EMBARGOS A EXECUÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA
SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. ALEGAÇÃO REJEITADA. O
indeferimento da dilação probatória não configura cerceamento de defesa quando o
magistrado assim procede por reputar estarem presentes nos autos elementos suficientes
para a formação de seu convencimento e, ainda mais, quando a produção das provas
somente serviria para tumultuar o regular andamento do feito. Preliminar rejeitada.
EMBARGOS À EXECUÇÃO - COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA
EXIGIBILIDADE E LIQUIDEZ DO TÍTULO REPRESENTADA PELAS NOTAS
FISCAIS DE ENTREGA DA MERCADORIA - POSSIBILIDADE. O contrato
particular de compra e venda de safra futura, firmado entre as partes na presença de
duas testemunhas, torna possível a execução do valor, comprovada a entrega das
mercadorias. Especificada nas notas fiscais o valor líquido devido pela SAFI, não há
que se falar em iliquidez do título executivo, mormente no caso de cana-de-açúcar, cujo
preço é de fácil acesso a todos. COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS ENTRE DEVEDOR
E TERCEIRO ESTRANHO À LIDE - IMPOSSIBILIDADE - PAGAMENTOS
PARCIAIS - IMPUTAÇÃO AO PAGAMENTO NÃO REALIZADA PELA
EXECUTADA NO MOMENTO DO PAGAMENTO - INVIABILIDADE DE
OPOSIÇÃO EM EMBARGOS À EXECUÇÃO - RECURSO IMPROVIDO -
SENTENÇA MANTIDA. Inviável a compensação de dívidas quando inexiste identidade
entre credor e devedor ex vi do art. 368 do Código Civil. Quem tem o dever de pagar

244
Caso “o devedor não fizer a indicação do art. 352, e a
quitação for omissa quanto à imputação, esta se fará nas dívidas
líquidas e vencidas em primeiro lugar. Se as dívidas forem todas
líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a imputação far-se-á na
mais onerosa” (art. 355, Código Civil). O Código Civil estabelece
uma sequência de quem pode imputar a dívida, primeiro o
devedor, este não o fazendo o credor, caso este também silencie,
a lei faz a indicação.
O Código Civil utilizou como parâmetro o vencimento,
nesta situação as dívidas com os vencimentos mais antigos
(primeiras a vencer) seriam as primeiras a sofrerem o abatimento
do valor fornecido pelo devedor, vez que em tese as mais antigas
sofrem maiores acréscimos por conta do atraso. Nesta mesma
lógica, caso algumas dívidas possuam o mesmo vencimento, as
que primeiro seriam abatidas seriam justamente aquelas com
maiores valores, novamente a questão da onerosidade é utilizada,
por exemplo, uma dívida de R$ 10.000,00 e outra de R$
15.000,00, com certeza esta última teria maiores acréscimos em
decorrência do atraso.
Por fim, o Código Civil, no art. 354, afirma que havendo
“capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros
vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou
se o credor passar a quitação por conta do capital”, é a imposição
simples de que sejam primeiro abatidos os juros, para só após
abater o valor do capital ou principal196.

pode exigir do credor o recibo que, se não lhe é dado, não o obriga ao pagamento,
podendo retê-lo, na forma do artigo 320 do CC de 2002. Se houver recusa injusta, ao
devedor cabe consignar o valor devido, para obter o efeito liberatório pretendido. Se o
devedor, no momento do pagamento, não declara a qual dívida se quer imputar o
pagamento, não tem o direito de reclamar quanto à imputação feita pelo credor, ex vi
dos arts. 352 e 353 do Código Civil. Recurso conhecido e improvido. (TJ-MS; AC-Ex
2011.003287-4/0000-00; Nova Alvorada do Sul; Quarta Turma Cível; Rel. Des.
Dorival Renato Pavan; DJEMS 26/05/2011; Pág. 19) Fonte: DVD Magister. Ed. 43.
Abril/Maio 2012.
196
16664093 - PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE
ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. CHEQUE ESPECIAL.
JUROS SOBRE JUROS. LAUDO PERICIAL. ACOLHIMENTO. 1. Hipótese em
que no cálculo da descapitalização mensal dos juros, deve ser observada a regra da
imputação do pagamento (artigo 933 do CC/1916 e 354 do CC/02), ou seja, havendo
capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos e depois no

245
4. Dação em pagamento
Forma de extinção da relação obrigacional com
pagamento ocorrido mediante acordo, pelo qual o credor aceita
receber objeto diferente da prestação pactuada. Este pagamento
atinge a sua finalidade, qual seja a de extinguir a relação
obrigacional, no entanto é entregue prestação diversa da pactuada.
Veja o conceito de Varela197:
A dação em cumprimento (datio in solutum),
vulgarmente chamada pelos autores de dação em
pagamento, consiste na realização de uma prestação
diferente da que é devida, com o fim de, mediante
acordo do credor, extinguir imediatamente a
obrigação.

Neste tipo de cumprimento da obrigação existe a entrega


de um objeto diferente do pactuado, mas não ocorre a extinção
da relação obrigacional apenas pela entrega deste bem, necessário
e essencial que haja a concordância (aceite) do CREDOR,
conforme art. 356, Código Civil, se este não anuir com a troca
da prestação a obrigação não será extinta.
Por exemplo, Reginaldo comprou de Sarah, três medalhas
de ouro, pela importância de R$ 1.500,00. Na data combinada
Reginaldo não dispõe do dinheiro, mas diz a Sarah que pagaria
seu débito com a entrega de 01 aparelho de ar-condicionado de
48.000 BTU’s. Para a obrigação ser extinta, Sarah deverá
concordar com a troca da prestação, se ela não concordar, a
obrigação continua a existir e Sarah deverá procurar amparo
jurisdicionar para receber a prestação originalmente pactuada.

capital. 2. Em todos os meses em que o correntista-autor permaneceu com saldo devedor


diário negativo, sem que tivesse efetuado qualquer depósito em sua conta, o depósito
dos juros do mês seguinte sobre aquele saldo devedor diário é que deve ser refutado,
porquanto foi ali em que ocorreu capitalização mensal de juros, em face de amortização
negativa. 3. Deve ser acolhido o laudo pericial, pois observou as cláusulas do contrato
e a regra da imputação do pagamento, fazendo controle diário dos juros capitalizados,
amortizando-o com os depósitos que foram sendo realizados na conta. (TRF 04ª R.;
AC 2007.70.16.001346-7; PR; Terceira Turma; Rel. Des. Fed. Fernando Quadros da
Silva; Julg. 18/01/2012; DEJF 03/02/2012; Pág. 244) Fonte: DVD Magister. Ed.
43. Abril/Maio 2012.
197
VARELA, João de Matos Antunes. Das obrigações em geral. Volume II. 7 ed.
Coimbra: Edições Almedina, 2006, p 171.

246
Ocorre a dação em pagamento, quando o devedor entrega
objeto diferente do pactuado, com animus de pagar a dívida
(lembrar que esta entrega de um bem não é doação) e o credor
aceita receber o bem, dando quitação à obrigação. Como se trata,
na maioria das vezes, de entrega de uma coisa valorada
economicamente e há a necessidade de ser transmitida a
propriedade deste bem, o Código Civil impõe que determinado
“o preço da coisa dada em pagamento, as relações entre as partes
regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e venda”, assim
a transmissão deste bem, dado em pagamento, deverá obedecer
as regras inerentes ao contrato de compra e venda, conforme
arts. 481 e seguintes do Código Civil.
Esta imposição de obediência às regras da compra e
venda gera maior cuidado na transferência de imóveis, lembre-
se que a transferência de bens móveis pode ser realizada pela
mera declaração das partes. O risco ocorre com bens imóveis,
que tem formalidades a serem cumpridas, assim este artigo
cuida destas exigências quanto aos bens imóveis, que devem
obedecer às regras instituídas no Código Civil e em legislação
própria198.
Cuidado semelhante ocorre com a transferência de
direitos, o art. 358, Código Civil, impõe que transferência
importará em cessão. Por exemplo, um credor aguarda a entrega
de R$ 10.000,00 e seu devedor não dispõe destes valores, mas
diz que quer entregar ao credor várias Notas Promissórias de

198
PROCESSUAL CIVIL. FRAUDE À EXECUÇÃO. EMBARGOS DE TERCEIRO.
ALIENAÇÃO DO IMÓVEL, POR DAÇÃO EM PAGAMENTO, NA PENDÊNCIA
DE EXECUÇÃO. CPC, ART. 593, II. INEXISTÊNCIA DE INSCRIÇÃO DA
PENHORA. BOA-FÉ PRESUMIDA. LEI N. 8.953/94. CPC, ART. 659.
I. Nos termos do art. 659 do CPC, na redação que lhe foi dada pela Lei n. 8.953/94,
exigível a inscrição da penhora no cartório de registro imobiliário para que passe a ter
efeito erga omnes e, nessa circunstância, torne-se eficaz para impedir a venda a terceiros
em fraude à execução. II. Caso em que a alienação, mediante dação em pagamento, é
eficaz, pois antecedeu aquele ato, ainda que estivesse em curso execução movida por
outrem contra o devedor, em face de sub-rogação de dívida, autorizando o uso pelos
adquirentes de embargos de terceiro, em defesa do domínio sobre o imóvel. III.
Recurso especial conhecido e provido. (REsp 509.062/MT, Rel. Ministro ALDIR
PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 23/03/2004, DJ 17/05/
2004, p. 230) Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=2003004
55358&dt_publicacao=17/05/2004, em 30/07/2012.

247
clientes de sua loja, capazes de cobrir o valor dos R$ 10.000,00.
Neste caso, o credor adotará as regras da cessão de crédito, no
que diz respeito ao comportamento entre as partes e os títulos
entregues, conforme arts. 286 e seguintes do Código Civil199.
Neste tipo de pagamento se observa a aplicação de regras
envolvendo a transmissão de um bem, não se poderia deixar de
se tratar a possibilidade de evicção sobre o bem utilizado em
pagamento. Assim, se “o credor for evicto da coisa recebida em
pagamento, restabelecer-se-á a obrigação primitiva, ficando sem
efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros” (art.
359, Código Civil). Primeiro a dúvida, o que é evicção? segundo
Diniz200:

199
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA EM LINHA
TELEFÔNICA. CESSÃO DE DIREITOS ANTERIOR AO EXECUTIVO FISCAL.
INEXISTÊNCIA DE REGISTRO EM CARTÓRIO. DESNECESSIDADE, IN
CASU. INOCORRÊNCIA DE FRAUDE. TRANSAÇÃO VÁLIDA. SÚMULA Nº
84/STJ. PRECEDENTES. 1. Recurso especial oposto contra acórdão confirmatório
de sentença que julgou procedentes embargos de terceiro para determinar o
levantamento de penhora efetivada sobre linha telefônica, ainda que não registrada
no Registro de Títulos e Documentos, por não caracterizada fraude à execução, visto
que o direito de uso do bem havia sido cedido antes da propositura do executivo
fiscal. 2. O art. 129, § 9º, da Lei nº 6.015/73, dispõe que: “Art. 129. Estão sujeitos
a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a
terceiros: § 9º Os instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e de
dação em pagamento”. 3. Todavia, sobrelevando a questão de fundo sobre a questão
da forma, a jurisprudência desta Casa Julgadora, como técnica de realização da
justiça, tem imprimido interpretação finalística à Lei de Registros Públicos. Tal
característica está assente na Súmula nº 84/STJ: “É admissível a oposição de embargos
de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e
venda de imóvel, ainda que desprovido do registro”. 4. “É admissível a oposição de
embargos de terceiro fundados na alegação de posse advinda de cessão do direito de
uso de linha telefônica, desprovida de registro, posto evidenciada a ausência de má-
fé do embargante. Cessão efetivada antes mesmo da inscrição do débito em dívida
ativa” (REsp nº 438544/RN, 1ª Turma, DJ de 11/11/2002, Rel. Min. LUIZ FUX).
5. Não ocorre fraude à execução quando verificado que os direitos de uso da linha
telefônica foram transferidos antes da inscrição do débito na dívida ativa. 6. “Ante a
validade da cessão de direitos, deve-se afastar, com a eqüidade que o caso merece,
quaisquer outras exigências burocráticas, tais como registro na companhia telefônica
ou em cartório” (acórdão recorrido). 7. Precedentes desta Corte Superior. 8. Recurso
especial não provido. (REsp 626.731/PE, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/05/2004, DJ 05/08/2004, p. 197)
Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200302352395&dt_
publicacao=05/08/2004, em 30/07/2012.
200
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 3: Teoria das
obrigações contratuais e extracontratuais. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 148.

248
[...] vem a ser a perda da coisa, por força de decisão
judicial, fundada em motivo jurídico anterior, que a
confere a outrem, seu verdadeiro dono, com o
reconhecimento em juízo da existência de ônus sobre
a mesma coisa, não denunciado oportunamente no
contrato.

Esta situação, também poderá ocorrer na dação em


pagamento. Pense no seguinte caso: Joãozinho deve a importância
de R$ 1.000,00 a Zezinho, como Joãozinho não dispõe dos citados
valores, oferece a Zezinho um aparelho de televisão de plasma de
40 polegadas, Zezinho aceita. Neste caso ocorre a extinção da
relação obrigacional e a quitação da dívida. Infelizmente 15 dias
após este pagamento, chega a casa de Zezinho oficial de justiça,
com ordem judicial para que Zezinho devolva o aparelho, em razão
de Juquinha ser o verdadeiro proprietário do aparelho. Pensando
na situação supra, em que ocorreu evicção, a lei estabelece que a
quitação dada por Zezinho perde a sua validade, ou seja Joãozinho
continuará devendo a prestação inicial ao credor201.
Importante lembrar que a posição do terceiro, envolvido
nesta relação, não será restabelecida, conforme expresso ao final
do dispositivo legal, exceto, caso as partes tenham disposto neste
sentido, com o aceite expresso do próprio terceiro. Veja o art.
838, Código Civil202, é um exemplo claro desta situação, pela
qual o fiador não é automaticamente restabelecido nos casos de
evicção.

201
DAÇÃO EM PAGAMENTO. Nulidade. Decretada a nulidade do ato de dação em
pagamento, feito por terceiros em favor do devedor, permanece o crédito contra este.
HIPOTECA. Cancelamento. Nova inscrição.
A nova inscrição da hipoteca somente valerá depois da sua renovação, daí a necessidade
de se comprovar a inexistência de outros registros porventura feitos entre o cancelamento
e a restauração. Recursos não conhecidos. (REsp 222.815/SP, Rel. Ministro RUY
ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 07/10/1999, DJ 16/11/
1999, p. 216)
Fonte: https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo=
&num_registro=199900618955&dt_publicacao=16/11/1999, em 30/07/2012.
202
No Código Civil:
Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:
III - se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente do devedor objeto
diverso do que este era obrigado a lhe dar, ainda que depois venha a perdê-lo por
evicção.

249
5. Da novação.
5.1 Considerações gerais
É a forma de se extinguir a relação obrigacional sem que
ocorra a entrega da prestação ou de qualquer outro item, é o
instituto que o devedor consegue a quitação da relação
obrigacional, em decorrência do surgimento de uma nova
obrigação, que extingue a relação original.
Na novação ocorre o surgimento de uma nova obrigação,
Orlando Gomes203 afirma que “é a extinção de uma obrigação
pela formação de outra, destinada a substituí-la”, note que a
intenção é criar uma nova relação e assim destituir totalmente a
obrigação original. Por exemplo, Ricardo deve ao Banco Só Juros,
a importância de R$ 10.000,00, dívida vencida. A fim de quitar
a mesma, o Banco fornece uma linha de crédito a Ricardo de R$
11.000,00. Assim o Banco cria uma nova obrigação com Ricardo
e extingue a relação anterior.
Surge uma nova relação e a antiga por ter sido quitada
não existe mais, isto mediante o nascimento de novo vínculo
com o credor. Gama204 enumera 4 requisitos essenciais para se
afirmar que ocorre novação: a) consentimento dos sujeitos
obrigacionais; b) existência da antiga obrigação; c) validade da
nova obrigação e d) ânimo de criar nova obrigação de modo a
extinguir a anterior (animus novandi).
Sem os requisitos apresentados por Gama seria impossível
falar de novação, esta surge para extinguir uma relação anterior,
deve ter validade no mundo jurídico (obedecer aos requisitos do
negócio jurídico) e ter consentimento das partes envolvidas,
mesmo porque uma nova obrigação, nestes moldes, apenas surge
em decorrência da vontade das partes.
Quanto ao último requisito (animus novandi), note que
para ocorrer a novação deve ser caracterizada a intenção de
novar, que corresponde a vontade das partes de constituírem
uma nova relação obrigacional, capaz de extinguir a anterior.
203
GOMES, Orlando. Direitos reais. 11 ed. Rio de Janeiro, Forense, 1995, p 163.
204
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo:
Atlas, 2008, p 283.

250
Lembre-se que não se está falando em um mero acordo, mas
sim em uma situação em que as partes envolvidas realizam uma
nova obrigação. Por exemplo205:
92085313 - EXECUÇÃO FISCAL. ADESÃO A
PROGRAMA DE PARCELAMENTO DO
DÉBITO. EFEITOS. SUSPENSÃO DA
EXIGIBILIDADE. O art. 360, inc. I, do Código Civil
dispõe que ocorre a novação quando o devedor contrai
com o credor nova dívida para extinguir e substituir
a anterior. É imperativo que haja, portanto, o animus
novandi na assunção de nova dívida. Na hipótese do
parcelamento de dívida ativa da união, não há a
assunção de nova dívida, mas apenas a renegociação
do prazo para pagamento do débito apurado. Dessa
forma, não se há falar em novação, sendo aplicável o
art. 151, inc. VI, do Código Tributário Nacional,
que expressamente estabelece que o parcelamento
implica na suspensão da exigibilidade do crédito
fiscal. Recurso de revista de que se conhece a que se
dá provimento. (Tribunal Superior do Trabalho TST;
RR 82200-12.2007.5.03.0034; Quinta Turma; Rel.
Min. João Batista Brito Pereira; DEJT 24/02/2012;
Pág. 1694) (sem grifo no originial)

13507896 - CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA


HABITAÇÃO. RENEGOCIAÇÃO DO
CONTRATO. A renegociação e consolidação de nova
dívida caracterizam a novação quando o novo
contrato, além de estabelecer novos prazos, agrega
elementos novos, suficientes à caracterização do
animus novandi, revelando uma descontinuidade da
relação anterior (AC 2006.34.00.002697-2/DF, TRF
1ª região, 6ª turma, relator desembargador federal
daniel paes Ribeiro, e-djf1 p. 86, 30.05.2011) apelação
da Caixa Econômica Federal provida. (TRF 01ª R.;
Proc. 58079819994014000; PI; Quarta Turma
Suplementar; Rel. Juiz Fed. Grigorio Carlos dos
Santos; Julg. 13/12/2011; DJF1 03/02/2012; Pág.
1210) (grifo nosso)

205
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

251
A primeira jurisprudência demonstra a manutenção do
pacto original, ocorrendo apenas uma renegociação com
parcelamento do débito original, em nada mudando a relação
obrigacional, vez que nada é alterado, apenas se revela a
continuidade do vínculo por meio de um acordo de
fracionamento do débito. A segunda jurisprudência expõe o
animus novandi, pelo qual se demonstra a formação de uma
obrigação que altera uma situação original, não havendo simples
continuidade da relação original e sim extinção da primeira
obrigação.
Não “havendo ânimo de novar, expresso ou tácito mas
inequívoco, a segunda obrigação confirma simplesmente a
primeira”( art. 361, Código Civil). Mostra-se a necessidade de
haver este interesse, esta vontade em inovar e fazer uma nova
obrigação, não ocorrendo o animus mantém-se a obrigação
original, servindo o novo acerto como mera prova confirmatória
de sua existência.
O leitor pode questionar qual o cunho prático desta
novação. Pense o seguinte, quando foi feita a obrigação original
foram dadas garantias e prazos que o devedor não cumpriu, caso
este e o credor resolvam fazer uma nova obrigação, a fim de
extinguir a original, estes prazos não mais existiriam, bem como
as garantias seriam extintas junto com a obrigação original206,
tais mudanças diminuem os ônus a serem impostos contra o
devedor, o que pode possibilitar menores dificuldades para
cumprir uma prestação, bem como a própria desoneração do
devedor, que não está mais vinculado a uma dívida vencida.

67034598 - NOVAÇÃO. REQUISITO. ANIMUS NOVANDI. INEXISTÊNCIA.


206

INOCORRÊNCIA. A novação é forma indireta de extinção de uma obrigação porque


outra a substitui. Na novação objetiva é o objeto ou a causa da obrigação que se
modifica, isto é, do conteúdo ou da causa debendi. Além disso, deve existir o animus
novandi (artigo 1000, Código Civil 1916) que, no artigo 361 do Código Civil 2002,
vem afirmando: “não havendo ânimo de novar, expresso ou tácito mas inequívoco, a
segunda obrigação confirma simplesmente a segunda”. (TACSP 2; Ap. s/ Rev. 660.122-
00/5; Décima Primeira Câmara; Rel. Juiz Artur Marques; Julg. 27/01/2003) Fonte:
DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

252
5.2 Dos tipos de novação
A doutrina classifica a novação em dois tipos, a objetiva
e a subjetiva. Na novação objetiva a formação do novo vínculo
obrigacional decorre da estipulação de uma nova prestação, que
forma uma nova dívida e extingue a original. Na novação
subjetiva se verificará a alteração em um dos polos da relação
obrigacional, havendo a formação de uma nova relação
obrigacional, que extinguira o vínculo em relação ao credor ou
devedor original.
O Código Civil apresenta o art. 360, com os seguintes
casos de novação:
Art. 360. Dá-se a novação:
I - quando o devedor contrai com o credor nova dívida
para extinguir e substituir a anterior;
II - quando novo devedor sucede ao antigo, ficando
este quite com o credor;
III - quando, em virtude de obrigação nova, outro
credor é substituído ao antigo, ficando o devedor
quite com este.

A classificação adotada pela doutrina é claramente


expressa neste artigo, veja que o inciso primeiro trata da novação
objetiva, na qual há formação de uma nova dívida, em
detrimento da original. Esta é a situação mais comum de
novação.
O inciso II trata de novação subjetiva passiva, surge um
novo devedor que estipula nova obrigação com o credor, esta
nova obrigação impõe a extinção do vínculo obrigacional original
com o devedor primitivo, restando apenas a nova obrigação entre
o novo devedor e o credor original. Por exemplo, Luiz sabendo
que sua esposa deve ao Banco Alegria, se apresenta ao citado
Banco e formaliza uma obrigação em que o mesmo passa a dever
o saldo negativo de sua esposa e esta tem seu vínculo com o
Banco extinto.
Neste tipo de novação a “substituição do devedor pode
ser efetuada independentemente de consentimento deste” (art.
362, Código Civil), logo, não há necessidade de aceite do devedor

253
original para ocorrer a novação, bastando o novo devedor e o
credor firmarem o novo pacto.
Uma questão que pode surgir nesta situação: E se o novo
devedor for insolvente?
Apesar do primeiro pensamento de anular o negócio por
conta desta insolvência, o Código Civil impõe que tendo o credor
aceitado a novação ele não poderá desfazer a nova obrigação,
afirma inclusive que o credor não teria ação regressiva contra o
devedor original, devendo ser mantida a novação e a extinção
da obrigação original, conforme art. 363.
No entanto, é cabível uma exceção a esta regra, quando
o devedor primitivo (primeiro devedor) obter por má-fé a
substituição (art. 363, in fine), neste caso pode o credor exigir o
regresso contra o devedor original, vez que este agiu com a
intenção de obter vantagem ilicitamente, provocando prejuízos
ao credor, muito bem explica este possibilidade Gonçalves207:
A má-fé deste tem, pois, o condão de reviver a
obrigação anterior, como se a novação fosse nula.
Traduz-se a mala fides pelo emprego de quaisquer
expedientes tendentes a desfigurar a realidade da
situação, criando aparências ilusórias, ou destruindo
ou sonegando quaisquer elementos que pudessem
esclarecer o delegado, visto que o princípio da boa-fé
objetiva, como princípio orientador do direito
obrigacional, impõe ao delegante o dever de informar.
Pode ela apresentar-se, pois, sob a forma de ação
(positiva ou comissiva) ou de omissão (negativa ou
omissiva).208

No último tipo de novação (art. 360, III, Código Civil)


ocorre a formação de uma nova obrigação na qual o credor
original verifica a extinção de sua relação obrigacional, em
decorrência da formação de uma nova obrigação entre o devedor
e um novo credor, assim ocorre novação subjetiva ativa.

207
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 345.
208
Mala fides: Má intenção.

254
Farias e Rosenvald209 chamam a atenção para o fato da
novação subjetiva ativa ser muito semelhante à cessão e à sub-
rogação convencional, e ao mesmo tempo afirmam que aquele
“que deseja ingressar na posição de novo credor preferirá os
mecanismos da cessão ou da sub-rogação, eis que preservará os
privilégios e garantias originais”, certa a posição dos eméritos
mestres, vez que o credor nem sempre buscará a forma mais
razoável de receber a prestação, mas quase sempre buscará a
que forneça mais garantias e facilidades ao cumprimento da
obrigação.

5.3 Efeitos da novação


O rompimento da obrigação original faz com que a
novação extinga “os acessórios e garantias da dívida, sempre
que não houver estipulação em contrário” (art. 364, caput, Código
Civil), logo a obrigação original não pode ser mantida em partes,
qualquer acessório ou garantia está extinta, exceto nos casos de
estipulação das partes pela manutenção da garantia.
E mais, não poderá o credor “ressalvar o penhor, a
hipoteca ou a anticrese, se os bens dados em garantia pertencerem
a terceiro que não foi parte na novação” (art. 364, in fine, Código
Civil), em respeito à posição do terceiro que forneceu os bens
em garantia é exigida a anuência deste, a fim de que qualquer
delas passe a integrar o novo contrato, caso contrário extinguem-
se junto com a obrigação original210.
Por exemplo, Paulo deve R$ 10.000,00 ao Banco Feliz
Somos Nós e apresentou Flávio como garantidor, este hipotecou

209
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p 413.
210
AGRAVO RETIDO Adequação do recurso interposto contra decisão interlocutória
A modalidade de instrumento é exceção, e não a regra Depósito judicial efetuado em
cumprimento à sentença que rescindiu contrato de venda e compra e condicionou a
medida de reintegração à restituição de percentual pago Extinção do feito pela sentença
que reconheceu a novação e a impossibilidade de viabilizar a reintegração, porquanto
substituído o contrato originário Pedido de levantamento da quantia depositada
indeferido Pretensão do credor que deve ser acolhida Uma vez reconhecido não mais
ser cabível a reintegração, a restituição também não é devida Agravo provido.
EXTINÇÃO DO FEITO com fulcro no art. 794, II, do CPC Pretensão a honorários
advocatícios devidos em razão da impugnação Inocorrência Mera extinção do feito à

255
imóvel seu. O Banco e Paulo resolveram formar novo pacto, no
qual Paulo passa a dever R$ 11.000,00 ao Banco, no contrato
existe cláusula mantendo a garantia. Como ocorreu novação,
esta manutenção da garantia só terá validade se Flávio aceitar,
caso contrário não poderá ser exigida a garantia.
A novação pode ocorrer nas relações obrigacionais
solidárias passivas, lembre que neste tipo de obrigação existem
diversos devedores, todos responsáveis pelo pagamento integral
da prestação. Caso ocorra “a novação entre o credor e um dos
devedores solidários, somente sobre os bens do que contrair a
nova obrigação subsistem as preferências e garantias do crédito
novado” (art. 365, caput). Neste tipo de obrigação, ocorrendo a
novação com um dos devedores, apenas contra este que realizou
a nova obrigação poderá o credor exigir o cumprimento da
relação, mesmo porque os “outros devedores solidários ficam
por esse fato exonerados” (art. 365, in fine). Assim explica Caio
Mário211
Sendo extintiva da obrigação, a novatio põe termo,
por inteiro, à relação obrigacional. Não importa a
causa da novação, ou o processo de que resulta. Desde
que opere a extinção do vínculo, os co-devedores
solidários estão liberados.

Outro efeito que o Código Civil impõe diz respeito ao


fiador, pois este fica exonerado nos casos de novação, exceto se
concordar em se manter como fiador na nova obrigação,
conforme leitura do art. 366, Código Civil.
Um dos requisitos apresentados como exigência para a
novação é a existência de uma obrigação anterior (antiga), quando

notícia da ocorrência de novação Mandado de reintegração de posse expedido em


cumprimento a r. sentença Credor que não provocou formalmente a fase do
cumprimento de sentença (art. 475-J do CPC) Princípio da causalidade Litigância de
má-fé afastada Recurso desprovido. (Apelação 0038067-96.2008.8.26.0602; Relator(a):
Percival Nogueira; Órgão julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento:
26/07/2012; Data de registro: 28/07/2012)
Fonte: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6053452&vlCaptcha
=TcHHz, em 31/07/2012.
211
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil. Volume II. Teoria
Geral das Obrigações. 22 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p 242.

256
se fala em existência logicamente será a validade da relação
antiga. A obrigação antiga deve ter validade e existir no mundo
jurídico, aqui se denota os requisitos de validade de qualquer
negócio jurídico (objeto lícito, determinado ou determinável e
forma prescrita ou não defesa em lei).
Apenas verificada a validade da obrigação original se
poderá realizar novação, “não podem ser objeto de novação
obrigações nulas ou extintas”(art. 367, in fine), por exemplo
Ricardo deve 20 selos “olhos de boi” a Paulo. Ocorre que Penny,
sabendo da dívida, entregou a prestação a Paulo. Este, em um
extremo ato de “caridade cristã”, resolve formalizar uma nova
obrigação com Ricardo, segundo a qual Ricardo ficaria devendo
apenas 15 selos “inclinados”, pelo que teria a quitação da relação
anterior. Este é um caso em que a obrigação anterior está extinta,
não podendo originar novação212.

212
98015434 - EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL. NULIDADE DA SENTENÇA.
CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO. PROVA SUFICIENTE
NOS AUTOS. AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. FIXAÇÃO DA PROVA. PERÍCIA
DISPENSADA. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO PROCURADOR DA
PARTE. PRECLUSÃO. PERDA DO DIREITO À PRODUÇÃO DA PROVA.
IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DOS CONTRATOS ANTERIORES.
CRÉDITO FORMALIZADO PERFEITAMENTE. EXISTÊNCIA DE TÍTULO
LÍQUIDO, CERTO E EXIGÍVEL. NOVAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO DE UMA
OBRIGAÇÃO POR OUTRA. HIGIDEZ FORMAL DO TÍTULO RECONHECIDA.
1. Não procede a alegação de cerceamento de defesa, por não ter sido autorizada a
produção de prova pericial, quando a execução encontra-se devidamente aparelhada,
com a cédula de crédito comercial que contém os dados essênciais do título de crédito,
como o valor do débito, termos inicial e final de vigência, taxa de juros e demais
encargos financeiros de contratação, porquanto eventual excesso na execução pode ser
depurado mediante cálculo do Contador quando da liquidação final do débito, e,
ainda, quando a própria parte quedou-se silente quando a questão foi decidida em sede
de audiência preliminar na qual o juiz a quo indeferiu a produção daquela prova e
contra aquela decisão não houve qualquer recurso no momento processual oportuno,
operando-se a preclusão consumativa. Art. 473 do CPC. 2. Ocorrendo novação
mediante programa especial de refinanciamento de capital de giro à empresas comerciais,
industriais e prestadoras de serviço lastreado em cédula de crédito comercial, fica
extinto o débito anterior e cria-se um novo, que se forma através de um outro título de
crédito, sendo admissível a análise dos contratos originários tão-somente se houver
requerimento específico nesse sentido, pois as obrigações nulas não podem ser validadas
pela novação. CC/1916, art. 1.007 e CC/2002, art. 367. Enunciado N. 07 do Grupo
de Estudos do TAPR. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TA-PR; AC
0213119-3; Ac. 19701; Barracão; Segunda Câmara Cível; Rel. Des. Edgard Fernando
Barbosa; Julg. 26/05/2004) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012

257
Esta regra tem uma exceção, conforme se verifica no caput
do art. 367, nas obrigações simplesmente anuláveis pode ocorrer
a novação. Rizzardo213 bem explica esta possibilidade:
Como em qualquer contrato ou ato negocial admite-
se a ratificação, torna-se perfeitamente admissível a
novação. As partes assumem a eventualidade de não
valer a obrigação, mas cientes de que torna-se possível
a plena convalidação. Nesta ordem, aquela assinada
por pessoa relativamente capaz, com a clara evidência
de uma posterior ratificação, como viabiliza a
primeira parte do art. 367 (art. 1008 do diploma civil
de 1916).

Neste caso existe a possibilidade de invalidade do negócio


jurídico, no entanto as próprias partes, envolvidas na relação
obrigacional, por meio de seu discernimento e interesse em
manter a novação é que demonstraram o interesse em manter a
validade deste tipo de pagamento especial. Veja que não se trata
de uma obrigação nula, mas de uma obrigação anulável, que
possui vício, mas o mesmo pode ser superado pelas partes.

6. Compensação
6.1 Noções gerais
A compensação é um instituto muito conhecido na
sociedade, o equilíbrio entre os débitos viabiliza o cumprimento
da obrigação, tornando desnecessário que as prestações fiquem
sendo transferidas entre o credor e devedor, Carvalho de
Mendonça 214 em sua obra de obrigações apresenta todo o
apanhado histórico deste instituto que tem seu nascimento no
Direito Romano e acaba se transformando nesta forma de
encontro de contas, segundo ele a compensação é:
É a applicação ao direito do principio de economia
política que exige que as trocas sejam feitas com a

213
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 393.
214
MENDONÇA, Manoel Ignacio Carvalho de. Doutrina e pratica das obrigações ou
tratado geral dos direitos de credito. 3 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1938, p 577.

258
menor circulação possivel de moeda. A compensação
é, em uma palavra, um meio de excluir pagamentos
inversos que se succedederiam sem necessidade. É a
extinção total ou parcial de dividas até a concurrente
quantia; um verdadeiro encontro de creditos. (sic)

Modernamente, segundo Neves 215, tem-se o seguinte


entendimento:
O modo normal de extinção das obrigações é o
pagamento, como se viu. Porém, quando duas pessoas
são, ao mesmo tempo, credora e devedora uma da
outra, não há sentido em exigir que ambos os
pagamentos sejam feitos para se considerarem extintas
as obrigações recíprocas. O encontro das obrigações
acarreta o mútuo cancelamento, o que evita um
circuito inútil de pagamentos. Aliás, a compensação
tem imensa utilidade nas atividades bancárias.

A compensação vai ser aquele tipo de pagamento que


ocorre em razão da identidade subjetiva de duas ou mais relações
obrigacionais, nas quais, ocorre um encontro de contas com o
abatimento entre créditos e débitos. O Código Civil
simplesmente impõe: se “duas pessoas forem ao mesmo tempo
credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-
se, até onde se compensarem” (art. 368).
Interessantemente, seja o conceito clássico ou o moderno,
ambos autores apresentam a maior vantagem deste tipo de
pagamento, qual seja a economia, pois esta forma evita a
formalidade excessiva de realizarem-se vários pagamentos,
quando no final basta uma simples subtração que expõe um valor
final a favor de um dos sujeitos.

6.2 Requisitos
A compensação tem seus requisitos dispostos nos arts.
368 e 369, Código Civil. Nestes dispositivos define-se que se
“duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da

NEVES, Murilo Sechieri Costa. Direito civil, direito das obrigações. Coleção curso
215

& concurso. São Paulo: Saraiva, 2005, p 87.

259
outra”, sendo estas dívidas líquidas, vencidas e de coisas
fungíveis, as duas obrigações extinguem-se, até onde se
compensarem. Assim os requisitos para que ocorra a
compensação são: identidade subjetiva com reciprocidade de
polos, dívida líquida e vencida e a fungibilidade.
A reciprocidade de polos parte da identidade entre
credores e devedores, na qual as posições são invertidas entre
uma obrigação e outra. Por exemplo, João recebeu R$ 200,00
emprestados de Paulo. Paulo, dois meses antes de emprestar
este dinheiro, tinha comprado um livro de João pela importância
de R$ 150,00. Existem duas obrigações, na primeira (de mútuo)
Paulo é credor e João devedor, enquanto que na segunda
obrigação (compra e venda), João passa a ser credor e Paulo o
devedor. Esta é a reciprocidade que deve existir na
compensação.
O art. 376, Código Civil, estipula a regra de que se
obrigando “por terceiro uma pessoa, não pode compensar essa
dívida com a que o credor dele lhe dever”, assim existe a
obediência do requisito da reciprocidade, bem como a
impossibilidade de terceiro que assume a obrigação de exigir
compensação, Gonçalves216 exemplifica:
Assim, quem se obriga (seguradora, p. ex.) em favor
de terceiro (beneficiário) não lhe paga o que lhe
prometeu, mas sim o que prometeu ao estipulante
(contratante). É em virtude da obrigação contraída
com este que a seguradora realiza o pagamento ao
terceiro. Não há, pois, reciprocidade entre a
seguradora e o beneficiário.

Como exposto, não há reciprocidade e sim a obrigação


de um terceiro com o devedor, na qual aquele assumirá a
prestação, não podendo tentar compensar.
As dívidas devem ser líquidas e vencidas. A liquidez
parte de um pressuposto simples, para se compensar é

216
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 351.

260
necessário saber o quantum exato que vai ser apresentado por
cada uma das partes envolvidas nas obrigações. No exemplo,
tem-se que Paulo e João sabem exatamente o valor que vai ser
diminuído entre crédito e débito, o que possibilita a diferença
de R$ 50,00 a favor de Paulo.
A questão da liquidez pode ser um impedimento à
compensação, caso a obrigação não tenha essa exatidão. Veja
esta jurisprudência217:
95295651 - APELAÇÃO LOCAÇÃO DE IMÓVEL
COMERCIAL. DESPEJO POR FALTA DE
PAGAMENTO CUMULADO COM COBRANÇA
DE ALUGUÉIS. AUSÊNCIA DE PURGAÇÃO DA
MORA. INADIMPLEMENTO
INCONTROVERSO. Incabível a compensação de
alugueres por suposta prestação de serviços de
arquitetura realizada pela locatária pelos alugueres
em atraso. Ausência de provas. Compensação não
aplicável para dívida ilíquida, conforme previsto no
art. 369 do Código Civil. Sentença mantida. Recurso
desprovido. (TJ-SP; APL 9298810-
92.2008.8.26.0000; Ac. 5542984; Santos; Vigésima
Sétima Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Claudio
Hamilton; Julg. 08/11/2011; DJESP 28/11/2011)

No presente caso existia a reciprocidade de polos, no


entanto a segunda dívida não foi apresentada com a devida
liquidez, não se sabe o quantum do serviço de arquitetura, o que
inviabiliza a compensação de créditos. Os aluguéis serão cobrados,
devendo a parte que prestou os serviços de arquitetura propor a
competente ação de cobrança pelos serviços prestados, a fim de
receber seu crédito.
A dívida deve está vencida para ocorrer a compensação,
tal determinação gera proteção a um dos devedores, pois impede
que aquele que seja mais forte na relação tente impor sua vontade.
Lembre-se, a obrigação apenas pode ser exigida quando de seu
vencimento, não podendo a data ser antecipada por mera vontade

217
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

261
de um credor. Este dispositivo impede que o credor tente impor
unilateralmente sua vontade, de forma a forçar que uma dívida
seja compensada com seu crédito. No entanto, nada impede que
as partes realizem a compensação entre as dívidas, mesmo que
ainda não vencidas, por deliberação e vontade de ambas.
Em se falando de dívida vencida, necessário se faz
lembrar a possibilidade dos atos de tolerância por parte do
credor, que em decorrência de sua boa vontade, concede ao
devedor prorrogação do prazo para pagar a obrigação. Nesta
situação, sem exigir acréscimos ou qualquer tipo de ônus ao
devedor, o credor espera por mais tempo do que o inicialmente
acordado, este maior lapso de tempo é conhecido como prazo
de favor.
Este prazo “a mais”, conforme o próprio nome já indica,
é um obséquio que favorece a posição do devedor, no entanto
não vincula o credor. Assim, estes “prazos de favor, embora
consagrados pelo uso geral, não obstam a compensação” (art.
372, Código Civil). Esta regra determina que mesmo ocorrendo
a concessão do prazo de favor, a prorrogação não impede a
compensação.
Esta regra evita que uma das partes seja beneficiada pelo
gesto de boa vontade. Por exemplo, Will é credor de Tommy da
importância de R$ 10.000,00 com vencimento em 02 de janeiro
deste ano, ocorre que a obrigação não foi cumprida na data e
Will concedeu, de favor, um aumento de 1 mês no prazo para
pagamento. Ao mesmo tempo, Tommy é credor de R$ 8.000,00
de Will, com vencimento em 15 de janeiro do mesmo ano.
Tommy, a fim de evitar a compensação poderia tentar cobrar o
seu crédito (R$ 8.000,00) nesta data, no entanto a regra do art.
372, Código Civil, impede esta tentativa de Tommy e as
prestações sofrerão compensação, mantendo a obrigação final
de Tommy em pagar os R$ 2.000,00 do encontro de contas.
Por fim, o requisito da fungibilidade. Ela apresenta uma
ligação entre as prestações devidas, ou seja, a possibilidade de
substituição das prestações. Não está se falando que a prestação
é fungível no sentido de ser substituída por qualquer outro item,
262
mas se apresenta que esta prestação é fungível por ser substituída
pela prestação da outra obrigação que se quer compensar,
Carvalho de Mendonça218 explica:
Na expressão “cousas fungiveis” como requisito da
compensação não assume o papel mais importante o
conceito de cousas que se consomem pelo uso, mas
tão somente de cousas da mesma espécie, homogêneas,
que possam se substituir perfeitamente nos
pagamentos. E´, em summa, o contraposto de corpo
certo e determinado, portanto insubstituivel,
heterogeneo.

A fungibilidade é apresentada entre as prestações a serem


compensadas, como visto no exemplo de João e Paulo, a
prestação é em dinheiro, que tem a mesma qualidade, podendo
uma ser abatida da outra. Agora, em outra situação, na qual
Camillo é credor de Gonzalez, de 20 sacas de arroz tipo 1, para
exportação. Enquanto que Gonzalez é credor de Camillo, de 15
sacas de café. Tem-se que apesar da reciprocidade de polos e da
liquidez, não há como se falar em compensação, vez que não
obedecida a fungibilidade.
Pode ocorrer a situação de que mesmo sendo “do mesmo
gênero as coisas fungíveis, objeto das duas prestações, não se
compensarão” em razão de diferirem na qualidade, desde que
especificado no contrato (art. 370). O Código Civil estabelece
que as partes possam impor que para ocorrer a compensação as
prestações deverão ter a mesma qualidade, por exemplo, só pode
haver compensação entre prestação de sacas de arroz, se todas
forem tipo 1 para exportação, não sendo aceita a compensação
neste caso por arroz de qualidade inferior.

6.3 Exceção à reciprocidade de polos


Os requisitos para a existência da compensação são claros,
sendo o mais importante a reciprocidade entre credores e

218
MENDONÇA, Manoel Ignacio Carvalho de. Doutrina e pratica das obrigações ou
tratado geral dos direitos de credito. 3 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1938, p 590/
591.

263
devedores, não havendo esta identidade, nem se cogita a análise
dos demais requisitos. A regra é simples, apenas pode haver a
compensação se credor e devedor forem os mesmos, com
posições alteradas nas obrigações, isto acarreta a regra de que o
“devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe
dever” (art. 371, caput), logo, na compensação, não é permitida
a interferência de terceiros.
A esta regra se apresenta uma exceção, segundo a qual o
“fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao
afiançado” (art. 371, in fine), por esta exceção, nas situações
envolvendo fiança, o fiador pode exigir a compensação contra o
credor do crédito afiançado. Bem explica Diniz219:
Por exemplo, se o locador, que é devedor do locatário,
acionar diretamente o fiador, exigindo pagamento de
aluguel atrasado, o fiador poderá invocar a
compensação. Trata-se de exceção à regra de que só
caberá compensação entre pessoas que são, entre si,
reciprocamente credor e devedor. A lei possibilitou
tal compensação para evitar vários pagamentos
simultâneos, atendendo à circunstância de que o fiador
é terceiro interessado.

Assim, apesar da regra geral de que apenas entre credor e


devedor ocorrerá compensação, nesta situação poderá um
terceiro interessado impor a compensação contra o credor,
novamente se impõe a busca pela economia e praticidade das
relações, ao se evitar diversos pagamentos.

6.4 Exceções à compensação


Os requisitos apresentados são determinantes para a
existência da compensação e a mesma tem imensa aplicabilidade,
no entanto, existem exceções apontadas pela lei, a primeira foi
apresentada quando da leitura do art. 370 (convenção das partes),
veja as outras, conforme art. 373:

219
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2: Teoria geral das
obrigações. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p 333.

264
Art. 373. A diferença de causa nas dívidas não impede
a compensação, exceto:
I - se provier de esbulho, furto ou roubo;
II - se uma se originar de comodato, depósito ou
alimentos;
III - se uma for de coisa não suscetível de penhora.

O primeiro inciso trata de impossibilidade de ordem


moral, pois não seria aceitável a pessoa que obtém um item de
um credor seu, por meio ilícito, conseguir posteriormente
compensar o bem obtido com a obrigação. Por exemplo, o
esbulho é um ato violento pelo qual uma pessoa é retirada da
posse daquilo que lhe pertence, veja a situação de Owen que
esbulhou um imóvel de Luke. Este esbulho gerou uma
indenização a favor de Luke, no importe de R$ 15.000,00. Caso
Owen seja credor de Luke, da importância de R$ 10.000,00,
não pode ocorrer compensação em razão de uma das obrigações
decorrer da reparação de ato ilícito.
O segundo inciso trata do comodato, depósito e dos
alimentos. Os institutos do comodato e do depósito são tipos
contratuais em que há a individualização da prestação, não
podendo esta ser trocada. O credor de um contrato de comodato
ou de depósito exigirá exatamente o bem entregue, não havendo
espaço para compensações sobre estes bens. Assim ensina
Lôbo 220:
[...] o comodato é contrato unilateral, como
empréstimo gratuito, não podendo o comodatário
compensar seu dever de restituição da coisa com outro
débito que o comodante tenha com ele. O depósito,
ainda quando oneroso, caracteriza-se pelo direito do
depositante de pedir de volta a coisa depositada
sempre que desejar; gera apenas para o depositante o
direito de retenção, nunca compensação.

A própria natureza dos contratos supramencionados gera


a impossibilidade de compensar, o mesmo ocorre com a figura

220
LÔBO, Paulo. Direito civil: obrigações. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 218.

265
dos alimentos, estes são o instituto pelo qual se garante a
subsistência da pessoa que os recebe. Alimentos tem o
importante caráter de manter a vida de seu credor, assim são os
alimentos fornecidos ao filho de 10 anos de idade, sem estes o
filho não teria como se manter, havendo o risco de perder a
própria vida. Em decorrência da importância desta parcela, fica
impossibilitada a compensação de alimentos, a fim de evitar o
prejuízo ao sustento do credor.
Melhor exemplificando, Maria, ex-mulher de Raimundo,
recebe mensalmente a importância de R$ 1.000,00, como
alimentos. Raimundo havia emprestado R$ 3.000,00 a Maria.
Veja que se ocorrer a compensação o sustento e a subsistência
de Maria estariam prejudicados, assim fica proibida a hipótese
de compensação entre Maria e Raimundo.
Por fim, o Código Civil proíbe a compensação com coisa
não suscetível de penhora. A penhora é a forma de apreensão de
bens do devedor, a fim de garantir a execução e pagar o credor.
O Código de Processo Civil estipula em seu art. 649221 vários
bens que não podem ser penhorados. É proibida a utilização

221
Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do
executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um médio padrão de vida;
III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de
elevado valor;
IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de
aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de
terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador
autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste
artigo;
V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens
móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; VI - o seguro de vida;
VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela
família;
IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória
em educação, saúde ou assistência social;
X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta
de poupança.
XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido
político.

266
destes para pagamento, sendo também proibida a compensação
de contas com a utilização destes bens222.
Mas não apenas nestas situações fica excluída a
compensação, também não “haverá compensação quando as
partes, por mútuo acordo, a excluírem, ou no caso de renúncia
prévia de uma delas” (art. 375, Código Civil), claramente o
código estabelece situação a ser convencionada entre as partes.
Estas, por sua vontade, estabelecem que nos débitos existentes
entre eles não haverá a figura da compensação.

6.5 Compensação e cessão


A compensação, também, sofre restrições em decorrência
da cessão de crédito, vez que o “devedor que, notificado, nada
opõe à cessão que o credor faz a terceiros dos seus direitos, não
pode opor ao cessionário a compensação, que antes da cessão
teria podido opor ao cedente”(art. 377, caput, Código Civil).
Para aclarar a situação veja este exemplo: Obama é
credor de Dilma, da importância de R$ 30.000,00, referente à
negociação de um carro. Dilma, ao mesmo tempo é credora de
Obama da importância de R$ 40.000,00, representado por uma
Nota Promissória. Há clara possibilidade de compensação. No
entanto, Dilma cede seu crédito de R$ 40.000,00 a Inácio.
Ocorre uma cessão na qual Dilma é a cedente, Obama o cedido

222
18334761 - PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO CONTRA A
FAZENDA PÚBLICA. COMPENSAÇÃO ENTRE CRÉDITO TRIBUTÁRIO E
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS (ART. 100, PARÁGRAFOS 9º E 10, DA CF/
88). IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA ALIMENTÍCIA DA VERBA.
PRECEDENTES. 1. Impossibilidade de se efetivar a compensação, em sede de execuçã
o contra a Fazenda Pública, dos débitos inscritos em dívida ativa com os créditos
relativos aos honorários advocatícios, vez que a verba honorária “têm natureza alimentar,
pessoal, sendo, portanto, intransferível e, mais ainda, impenhorável, consoante já decidiu
o eg. Superior Tribunal de Justiça (REsp 865469/SC, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, j. 05/08/2008, DJe 22/08/2008)”.
Precedentes: (TRF-5ª R. AGTR 108085/CE. 2ª T. Rel. Des. Fed. Paulo Gadelha. DJe
13.01.2011; TRF5, AG 00042978820114050000, Desembargador Federal Francisco
Barros Dias, 2ª T., DJE. Data::19/05/2011; TRF5, AG 00098306220104050000,
Desembargador Federal Francisco Wildo, TRF5. Segunda Turma, DJE. Data::13/01/
2011). 2. Agravo de instrumento improvido. (TRF 05ª R.; AGTR 0015252-
81.2011.4.05.0000; AL; Segunda Turma; Rel. Des. Fed. Francisco Barros Dias; DEJF
16/12/2011; Pág. 130) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

267
(também devedor) e Inácio o cessionário. Agora, se Inácio
cuidou de notificar Obama (devedor e cessionário) dois
caminhos podem ser seguidos, o primeiro é o do silêncio, caso
Obama nada fale, a cessão será efetiva e este nada poderá alegar
na tentativa de compensar seu crédito. Na outra situação
Obama não aceita a cessão, assim, uma vez notificado ele
deverá alegar a possibilidade da compensação de seu crédito
com de Dilma.
Veja que a situação exemplificada depende do
conhecimento da cessão, se “porém, a cessão lhe não tiver sido
notificada, poderá opor ao cessionário compensação do crédito
que antes tinha contra o cedente” (art. 377, in fine, Código Civil),
o dispositivo civil impõe a possibilidade do devedor opor a
compensação em momento posterior à cessão, normalmente esta
situação ocorre no vencimento. Este é o momento em que o
devedor se apresenta para pagar a prestação, como o mesmo
não foi notificado, ele poderá de imediato alegar que há
compensação a ser realizada, perdendo a validade, em relação a
ele, a cessão.
No exemplo apresentado, seria o caso de Obama não ter
sido notificado da Cessão, quando do vencimento aparece, em
sua porta, Inácio. Este alega que Dilma cedeu o crédito a ele
(Inácio) e este poderia receber o valor devido por Obama. Como
apenas neste momento Obama tomou conhecimento da cessão,
aqui ele poderá alegar a compensação, nada pagando a Inácio223
e fazendo o encontro de contas com Dilma.
A compensação é uma forma especial de pagamento e
deve obedecer a certos princípios gerais, entre eles o que diz
respeito às despesas, estas se presumem a cargo do devedor,
conforme art. 325, Código Civil. Pode acontecer das dívidas

91966498 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.


223

COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS. Pedido de reserva de honorários advocatícios


indeferido. Cessão de crédito. Art. 377 do Código Civil. Inoponibilidade da
compensação pelo cessionário do crédito sem devida notificação do devedor. Agravo
de instrumento desprovido. (TJ-RS; AI 480555-46.2011.8.21.7000; Canoas; Nona
Câmara Cível; Relª Desª Marilene Bonzanini Bernardi; Julg. 07/12/2011; DJERS
12/12/2011) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

268
terem locais de pagamento diferenciados, assim para ocorrer a
compensação deve ocorrer a dedução das despesas referente ao
recebimento da prestação, conforme leitura do art. 378, Código
Civil.

6.6 Imputação na compensação


Outra situação apresentada lida com a existência não de
apenas duas obrigações compensáveis, mas diversas. Por
exemplo, Dirceu é credor de Roberto da importância de R$
5.000,00, ao mesmo tempo Roberto é credor de Dirceu, em uma
obrigação representada por um cheque de R$ 3.000,00; em outra
obrigação representada por uma Nota Promissória de R$
4.000,00 e em uma terceira obrigação representada por outro
cheque de R$ 2.000,00.
Neste caso pode surgir a dúvida de como realizar a
compensação, com o fito de evitar dúvidas na realização da
compensação serão aplicadas as regras da imputação em
pagamento, havendo uma sequência a que os créditos serão
submetidos, conforme ordem legal do art. 379.

6.7 Terceiros
Por fim, há comando legal que busca evitar prejuízos a
terceiro, estes podem acontecer por meio de manobras do
devedor em acordo com o credor que visem burlar penhora. A
lei impõe que não “se admite a compensação em prejuízo de
direito de terceiro. O devedor que se torne credor do seu credor,
depois de penhorado o crédito deste, não pode opor ao exeqüente
a compensação, de que contra o próprio credor disporia”(art.
380), o dispositivo ataca a situação em que um devedor se torna
credor do credor original e assim busca a compensação para evitar
uma penhora.
Novamente apela-se para um exemplo, Beethoven é
credor de Mozart, da importância de R$ 15.000,00. Ocorre que
Beethoven é devedor de Wagner, da importância de R$
20.000,00. Wagner, sabendo que Beethoven tem a seu favor um
crédito junto a Mozart, requer e consegue a penhora do mesmo.
269
Vendo esta situação, por mais que houvesse boa-fé em uma
compensação, seria muito estranho apenas após a penhora
aparecer uma obrigação entre Beethoven e Mozard, na qual
Mozard é credor. Assim, para evitar fraudes, a ordem legal proíbe
esta situação após a penhora sobre o crédito224.

6.8 Compensação fiscal


Um pequeno apêndice deve ser apresentado ao encerrar
os comentários sobre a compensação, havia dispositivo que
tentava impor a aplicação das regras da compensação civil no
âmbito tributário, este era o art. 374, que expressava: “A matéria
da compensação, no que concerne às dívidas fiscais e parafiscais,
é regida pelo disposto neste capítulo”.
Este dispositivo tentou impor que nas dívidas
provenientes de obrigações tributárias, o fisco deveria adotar
todas as regras da compensação imposta pelo Direito Civil, apesar
deste servir de fonte e fundamentação ao Direito Tributário, tal
artigo poderia ocasionar prejuízos ao âmbito fiscal. Haveria
incompatibilidades entre as normas, veja o art. 170, Código
Tributário Nacional:
Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias
que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à
autoridade administrativa, autorizar a compensação de
créditos tributários com créditos líquidos e certos,
vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a
Fazenda Pública.

224
DIREITO CIVIL. COMPENSAÇÃO. DÍVIDA VENCIDA. EMBARGOS DE
TERCEIRO. PENHORA DE DIREITO DE CRÉDITO. DÍVIDA QUITADA POR
COMPENSAÇÃO INICIADA ANTES DA PENHORA.
1. O escopo do art. 1.024 do CC/1916 (atual art. 380) é coibir a utilização da
compensação como forma de esvaziar penhora preexistente. 2. No caso dos autos,
havia dívida vencida e operava-se a compensação há tempos, quando foi ajuizada a
execução e determinada a penhora dos créditos decorrentes do arrendamento. Não
houve o prejuízo a direito de terceiro que o art. 1024 do Código de 1916 busca
preservar. 3. Dissídio não demonstrado. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 402.972/DF, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA
TURMA, julgado em 27/03/2012, DJe 10/04/2012)
Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200200024145&dt_
publicacao=10/04/2012, em 02/08/2012.

270
Assim, a fim de evitar o choque entre as normas, a Lei nº
10.677, de 22.5.2003, revogou o citado art. 374. Não podendo
as regras estudadas sobre compensação serem aplicadas
diretamente no âmbito tributário.

7. Da confusão.
A relação obrigacional é composta de 4 elementos: credor,
devedor, vínculo e prestação. É necessária a interação destes
elementos para se verificar a existência de uma relação
obrigacional, nas diversas formas estudadas de extinção da relação
obrigacional se verificou a mudança de sujeitos, extinção do
vínculo ou mesmo interferências na própria prestação.
Nessa se verifica a mudança nos sujeitos da relação
obrigacional, ocorre que esta mudança, gera, sem trocadilhos,
uma confusão na figura dos sujeitos. Em decorrência da mudança
do sujeito, surge a situação de que devedor e credor se confundem
na mesma pessoa, o que acarreta a impossibilidade do sujeito
cobrar de si mesmo a prestação.
A confusão gera o fim da relação obrigacional, em
decorrência desta unificação de credor e devedor em uma só
pessoa, pois extingue-se “a obrigação, desde que na mesma
pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor” (art.
381, Código Civil). Washington de Barros225 enumera situações
em que ocorre confusão, bem como a exemplifica:
A confusão resulta de herança, legado, cessão de
crédito, casamento pelo regime da comunhão
universal e sociedade. Comumente, porém, promana
da herança, quando o credor vem a ser herdeiro do
devedor, ou vice-versa. Assim, A é credor de B;
entretanto, B é herdeiro de A; morto este, a herança
respectiva, de que faz parte o crédito, se transmite a
B. Opera-se nesse caso a confusão das duas qualidades
de credor e devedor, desaparecendo a obrigação.

225
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, volume 5, direito das
obrigações – 1ª parte. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p 324.

271
A confusão ocorre quando devedor e credor se
confundem na mesma figura, impossibilitando a cobrança e
acarretando a extinção da própria obrigação226. “A confusão pode
verificar-se a respeito de toda a dívida, ou só de parte dela” (art.
382, Código Civil), este dispositivo classifica a confusão em dois
tipos, a total e a parcial. Na total os exemplos já apresentados
demonstram que a extinção é de todo o débito já que a confusão
realiza esta igualdade na posição de credor e devedor.
Quanto à confusão parcial, Paulo Nader227 exemplifica
da seguinte forma:
Se “A” e “B” adquirem, por herança, o crédito do
qual “A” é o devedor, ter-se-á, como resultado do ato
negocial, uma confusão parcial, pois “A” será devedor
de “B” pela metade do débito original.

Como visto, existe a confusão de apenas uma parte do


débito, não podendo se alegar total extinção da relação
obrigacional. Na parcial, apesar de ocorrer a confusão, uma parte
do débito ainda será paga normalmente, à medida que não se
confunde com o direito do outro credor envolvido na relação.
Outro dispositivo que trata da confusão parcial é o art.
383, Código Civil, que afirma que a “confusão operada na pessoa

226
48407002 - PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO.
HONORÁRIOS. CONFUSÃO. EXTINÇÃO. I. A defensoria pública e o dftrans/DF
são entidades integrantes do estado, não sendo possível a execução da condenação em
honorários, diante da confusão entre credor e devedor, e, por consequência, da extinção
da obrigação, nos termos do art. 381 do Código Civil. II. Deu-se provimento ao
recurso. (TJ-DF; Rec 2010.01.1.215456-8; Ac. 561.772; Sexta Turma Cível; Rel.
Des. José Divino de Oliveira; DJDFTE 03/02/2012; Pág. 189) Fonte: DVD Magister.
Ed. 43. Abril/Maio 2012.
53204683 - APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER CONDENAÇÃO DA
FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA IMPOSSIBILIDADE.
CONFUSÃO. RECURSO PROVIDO. Segundo entendimento já pacificado no Superior
Tribunal de Justiça (Súmula nº 421), o Estado não pode ser condenado ao pagamento
de honorários advocatícios a ele vinculada, tendo em vista o instituto da confusão (art.
381, do Código Civil). (TJ-MS; AC-Or 2011.032328-7/0000-00; Miranda; Quinta
Câmara Cível; Rel. Des. Vladimir Abreu da Silva; DJEMS 07/03/2012; Pág. 38)
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
227
NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 2: obrigações. Rio de Janeiro:
Forense, 2008, p 377.

272
do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação até a
concorrência da respectiva parte no crédito, ou na dívida,
subsistindo quanto ao mais a solidariedade”, deve ser respeitada
a solidariedade, não é pelo fato do devedor, torna-se devedor/
credor que toda a relação solidária será extinta.
Por exemplo, João, José e Valdemar Júnior conseguem
um empréstimo com Valdemar no valor de R$ 90.000,00, o pacto
de mútuo inclui cláusula de solidariedade. Valdemar morre alguns
dias antes de cobrar o valor emprestado. Valdemar Júnior, único
herdeiro, assume a posição de credor da relação, mas como
também é devedor haverá confusão quanto ao crédito, mas não
sobre todos os R$ 90.000,00, apenas sobre a fração ideal de
Valdemar Júnior, dentro da relação interna. Haverá a extinção
de R$ 30.000,00 da dívida, restando a João e José pagar os R$
60.000,00 restantes.
O Código Civil preocupa-se, também, com a possibilidade
da confusão ser desfeita, e ser restabelecida a relação original,
ou seja, o credor/devedor passar a ocupar apenas uma das
posições dentro da relação obrigacional, assim cessando “a
confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios,
a obrigação anterior” (art. 384, Código Civil). Caio Mário228
muito bem exemplifica:
O exemplo clássico da doutrina é este: o devedor é
instituído, em testamento, herdeiro de seu credor;
confundem-se por força da sucessão, na sua pessoa,
as qualidades de credor e devedor, e, ipso facto,
extingue-se a obrigação; mas, ulteriormente,vem o
testamento a ser anulado, e logo cessa a confusão. A
obrigação restaura-se retroativamente, com todas as
suas conseqüências, inclusive as garantias, como se
nunca tivesse havido confusão.

A confusão pode ter seus efeitos cessados, conforme


explicado e exemplificado. Neste tipo de situação há o retorno
ao estado original da relação obrigacional, bem como a

228
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil. Volume II. Teoria
Geral das Obrigações. 22 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p 261.

273
manutenção das próprias garantias existentes no vínculo original,
como se nunca tivesse ocorrido a extinção da obrigação.

8. Remissão das dívidas


O Código Civil trata da remissão a partir do art. 385,
esta é a forma de extinção do vínculo obrigacional por vontade
do credor, vez que ele declara não mais ter interesse no
recebimento da prestação, desta forma liberando o devedor de
seu ônus.
Na Lição de Carlos Alberto Bittar229
Remissão é, portanto, negócio jurídico por meio do
qual o credor se despe de seus direitos creditórios,
livrando-se, com isso, o devedor do pagamento.
Propicia, pois, a cessação do vínculo sem
cumprimento da prestação, possui caráter de
gratuidade e põe fim à obrigação (CC, arts. 385 e
segs.), com a anuência do devedor (cuja a declaração
a integra).

A extinção da obrigação, por remissão, é graciosa e


liberatória, impossibilita a cobrança do débito e finaliza a
obrigação, salvo as imposições legais. A doutrina classifica a
remissão em dois tipos a expressa e a tácita. A expressa ocorre
de um ato liberatório claro, no qual normalmente há declaração
do credor expondo suas intenções ao devedor. Já a tácita, não é
revestida de formalidades, tendo apenas algum tipo de ato que
caracterize a liberação, sem a necessidade da declaração do credor,
por exemplo, o credor que simplesmente devolve o cheque,
comprovante de um débito, ao devedor.
Tem-se, assim, este tipo de extinção da relação
obrigacional, que na maioria dos casos existe por puro altruísmo
do credor. No entanto, a mente moderna e cheia de vícios, pode
em algumas situações utilizar esta extinção da obrigação para
obter vantagem futura, ou mesmo situações inusitadas nas quais

229
BITTAR, Carlos Alberto. Direito das obrigações. Rev. Atual. Amp. de acordo com
o novo Código Civil por Carlos Alberto Bittar Filho. 2ed. Rio de Janeiro, Forense
universitária, 2004, p 145.

274
se simula a remissão como forma de burlar obrigações com
terceiros, como será visto adiante.
A remissão para ocorrer, primeiro se faz necessário
observar a capacidade da parte, não pode haver perdão se o credor
não tiver a capacidade para exercer este ato, por exemplo, um
adolescente (15 anos de idade) perdoar uma dívida a que tinha
direito. Além da capacidade, deve ser observados, também, como
requisitos da remissão: a vontade de perdoar, demonstrado pelo
ato de liberação; aceitação do devedor e a ausência de prejuízo a
terceiros.
A expressão de vontade do credor é essencial, sem ela
não há como se falar no perdão. Não havendo a mesma, expressa
ou tácita, haveria vício na vontade, o que tornaria sem validade
a extinção da obrigação. Este perdão deve ser demonstrado de
alguma forma, podendo este ato ser público ou privado
(declaração de vontade, escritura pública...), que são as formas
expressas de remissão.
Mas, também, pode ser por meio de um mero ato como
a devolução da Nota Promissória que comprova o débito (tácita).
Assim, tem-se que a “devolução voluntária do título da obrigação,
quando por escrito particular, prova desoneração do devedor e
seus co-obrigados, se o credor for capaz de alienar, e o devedor
capaz de adquirir” (art. 386, Código Civil), note que o artigo
transcrito trata da devolução do título, mas chama a atenção
para a capacidade, que se faz necessária para ter validade a
remissão230.

230
66052883 - ADVOGADO CC ART. 386 EXECUCAO POR TITULO JUDICIAL
MINISTERIO PUBLICO ALIMENTOS REPRESENTACAO PROCESSUAL
INDENIZACAO HOMOLOGACAO TRANSACAO ACORDO NOVOCODIGO
CIVIL EXECUÇÃO POR TÍTULO JUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO
UNICAMENTE EM RELAÇÃO À SEGURADORA. Pretensão dos réus de
homologação total do acordo, com relação às outras partes, já que estão todos
devidamente representados por advogados e o menor pela mãe - Ação indenizatória
proposta pela esposa e filho, decorrente da morte do pai em acidente automobilístico -
Homologação da transação que representa vulneração do artigo 386 do Código Civil
revogado, re dação repetida pelo artigo 1.691 do novo estatuto civil, ainda que a mãe
esteja representando o menor - Impossibilidade dos pais contraírem, em nome dos
filhos, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração do patrimônio
destes - Possibilidade somente em circunstâncias especiais com autorização do juiz e

275
Quanto aos demais requisitos, são muito bem expressos
no trecho legal que diz que a “remissão da dívida, aceita pelo
devedor, extingue a obrigação, mas sem prejuízo de terceiro”
(art. 385, Código Civil), veja que se torna essencial para a
remissão tanto o aceite do devedor, como a ausência de prejuízos.
Quanto ao aceite, a possibilidade desta exigência causa
estranheza em alguns leitores, mas lembre-se que mesmo obtendo
uma vantagem, o devedor não é obrigado a aceitá-la. Bem
exemplifica Mr. Pothier231 que nas doações apenas ocorre a
efetivação da mesma se o donatário aceitar receber o item doado,
não podendo ser diferente na remissão, assim para o perdão ter
validade, necessário se faz o aceite do devedor, este não o
aceitando deverá providenciar o pagamento da prestação devida.
Não menos importante é o requisito da ausência de
prejuízo a terceiros, não pode ocorrer a remissão se a mesma
gera prejuízo a pessoas indiretamente interessadas no pagamento
da prestação. Por exemplo, Ronaldo é credor de Romário da
importância de R$ 20.000,00. Mas, ao mesmo tempo Ronaldo
deve a Rogério R$ 15.000,00. Caso Ronaldo resolva remir a
dívida de Romário, Rogério teria o prejuízo de não localizar um
bem ou crédito capaz de pagar a dívida de Ronaldo, haveria
prejuízo a esse credor, não se discute se o ato foi ou não de má-
fé, verificado o prejuízo a terceiro a remissão não terá validade.
Questão interessante aparece no art. 387, que trata do
penhor , este é uma forma de garantia na qual o devedor entrega
232

bem ao credor, a fim de que se não for paga a prestação o bem

supervisão pelo Ministério Público - Inadmissibilidade da homologação do acordo em


relação a todos, porque implicaria notória redução de direitos do menor, que se
consubstanciam em alimentos - Transação que envolveu redução da parte cabente ao
menor, que ficou inviabilizada - Impossibilidade de seu acolhimento - Seguimento do
feito, para o recebimento do restante, envolvendo as recorrentes - Recurso desprovido.
(TACSP 1; Proc. 1273386-3; Quinta Câmara; Rel. Des. Manoel Mattos Faria; Julg.
22/09/2004) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
231
Mr. POTHIER. Tratado das obrigações pessoaes e recíprocas nos pactos, contractos,
convenções, &c. Trad. por José Homem Correa Telles. Tomo II. Lisboa: Typographia
de Antonio José da Rocha, 1849, p 97.
232
Código Civil. Art. 1431. Constitui-se o penhor pela transferência efetiva da posse
que, em garantia do débito ao credor ou a quem o represente, faz o devedor, ou alguém
por ele, de uma coisa móvel, suscetível de alienação.

276
arque com a prestação, por exemplo, Rosanne é credora de Jéssica
da importância de R$ 1.000,00, Jéssica entregou a Rosanne um
colar de diamantes para garantir a prestação, caso Jéssica não
pague, o colar cumprirá o papel de garantia e será utilizado para
pagar a prestação.
Agora, dado este exemplo, caso Rosanne resolva
simplesmente devolver a garantia a Jéssica, poderia esse ato ser
considerado remissão? A resposta é não, a “restituição voluntária
do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real,
não a extinção da dívida” (art. 387, Código Civil), neste caso há
manutenção da dívida, sem garantia.
Por fim, uma questão já tratada na solidariedade, lembre
que a “remissão concedida a um dos co-devedores extingue a
dívida na parte a ele correspondente; de modo que, ainda
reservando o credor a solidariedade contra os outros, já lhes não
pode cobrar o débito sem dedução da parte remitida” (art. 388,
Código Civil).
Havendo solidariedade passiva, caso o credor perdoe a
dívida de um dos codevedores, apenas a cota parte deste deixa
de fazer parte da obrigação, podendo a diferença ser cobrada.
Por exemplo, Flávio é credor de Paulo, Carlos e Raimundo, do
importe de R$ 30.000,00, representado por contrato de mútuo
com cláusula de solidariedade. Caso Flávio perdoe Paulo, a cota
interna deste é excluída do débito, restando a Flávio cobrar R$
20.000,00 de Carlos e/ou Raimundo. Na solidariedade será
mantida a dívida, abatida a cota que representa o codevedor
remido.

9. Da transação e do compromisso.
O Código Civil de 1916 fazia referência a mais duas
formas de extinção da relação obrigacional, quais sejam a
transação e o compromisso. Ambas são instrumentos para as
partes extinguirem a obrigação, são formas de se buscar o fim da
relação obrigacional. O Código Civil de 2002 resolveu tratar
destes dois institutos no capítulo destinado às várias espécies de
contrato.
277
Assim a transação é tratada nos arts. 840 e seguintes,
enquanto que o compromisso nos arts. 851 e seguintes. Ambos
retratam instrumentos a serem utilizados pelas partes com o fito
de extinguir a relação obrigacional, no entanto devem ser melhor
estudados quando da leitura sobre os contratos em espécie.

278
XII
INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO

1. Noções gerais
O fim da relação obrigacional foi apresentado em sua
forma natural, com a extinção pelo simples pagamento (devedor
entregando ao credor, a prestação na forma, data e local acordados
na obrigação). Foi visto, também, que os sujeitos podem utilizar
de formas alternativas para verificar a execução da obrigação,
ou mesmo formas impostas pela lei para chegar ao mesmo
objetivo, o adimplemento.
Infelizmente, podem ocorrem situações que
impossibilitem o cumprimento da obrigação, voluntárias ou não
estas situações acarretam o inadimplemento. A obrigação não é
devidamente cumprida, o que gera a insatisfação ao credor e o
direito deste exigir a obrigação e reparação por conta do não
pagamento.
Para Nader233 “inadimplemento é descumprimento, total
ou parcial, de uma obrigação de dar, fazer ou não fazer; é o não
pagamento de dívida nas condições fixadas em negócio jurídico”.
Em razão da possibilidade do inadimplemento, o Código Civil
estipula regras, com o fito de reparar a ausência de pagamento,
favorecendo ao credor, bem como proteger o devedor contra
possíveis excessos do credor, conforme se vislumbra nos arts.
389 e segs.
O inadimplemento se divide em dois tipos: o voluntário
e o involuntário. Este decorre daquelas situações em que não há
interferência da vontade do indivíduo envolvido na relação
obrigacional (caso fortuito, força maior ou interferência de
terceiros), e acarreta o não cumprimento da obrigação. Maria

233
NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 2: obrigações. Rio de Janeiro:
Forense, 2008, p 396.

279
Helena Diniz234 apresenta o inadimplemento involuntário como
a inexecução da obrigação por fato inimputável ao devedor. Neste
tipo de inadimplemento vê-se que a falta de pagamento não
decorre de atos decorrentes da vontade do devedor, existe algum
fato externo à relação obrigacional que ocasiona a inexecução
da obrigação (inadimplemento).
Quanto ao inadimplemento voluntário, tem-se a situação
na qual o atraso ou o não cumprimento da obrigação é causado
pelo devedor, ou como diz Diniz a ele imputado. Nesta situação
surgem as consequências pelo inadimplemento que acarretam
acréscimos na prestação. Um detalhe que por vezes fica esquecido,
esta ausência ou atraso do pagamento, pode sim ser causada pelo
credor. Este causando o inadimplemento será responsabilizado e
poderá ressarcir o devedor de eventuais prejuízos.
O inadimplemento voluntário acarreta dois tipos de
inexecução da obrigação, a absoluta e a relativa. Na absoluta
verifica-se uma situação em que a prestação se perde e não mais
pode ser entregue ao credor, por exemplo, Mariazinha marcou a
festa de casamento para as 22:00 horas, exigindo que a firma
Confeitos Doces entregue o bolo às 21:00 horas. Ocorre que a
firma apenas entrega o bolo às 4:00 da madrugada, por conta do
grande número de pedidos que a mesma tinha que cumprir.
Apesar da entrega do bolo, a prestação não cumpre o papel a
que era destinada, o que acarreta o inadimplemento total.
O segundo tipo de inadimplemento é o relativo, pelo qual
a prestação ainda consegue cumprir seu papel, mas não é entregue
na data ou momento combinado. Este tipo de inadimplemento
é muito bem caracterizado no atraso do pagamento da fatura do
cartão de crédito, em que o devedor paga dez dias após a data de
vencimento. Apesar do atraso, a prestação foi cumprida.
São impostas diversas consequências ao inadimplemento
da obrigação, assim não “cumprida a obrigação, responde o
devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária
segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários
234
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2: Teoria geral das
obrigações. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 403.

280
de advogado” (art. 389, Código Civil), a lei civil estabelece as
quatro consequências supra transcritas como penalidade pelo
inadimplemento.
O texto legal não deixa claro em que tipo de
inadimplemento serão utilizados estes acréscimos, mas cuida a
doutrina em lembrar que a interpretação do Código Civil é
sistemática e não isolada por artigo. Logo, por outros dispositivos
apresentados se sabe que esta situação não será aplicada ao
inadimplemento involuntário e haverá nuances ao ser aplicado
ao inadimplemento voluntário absoluto.
Tratando do inadimplemento, lembre que nas “obrigações
negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em
que executou o ato de que se devia abster” (art. 390, Código
Civil), esta regra não é novidade, quando se tratou da obrigação
de não fazer (obrigação negativa) foi explicado que esta obrigação
se caracteriza pela conduta omissiva do devedor e caso ele realize
o ato que havia se comprometido não fazer, estaria descumprindo
a obrigação235.
Outra questão, anteriormente tratada, é a regra de que
pelo “inadimplemento das obrigações respondem todos os bens
do devedor” (art. 391, Código Civil). Uma vez descumprida a

235
11723311 - PROCESSO CIVIL. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. ASTREINTES.
EXIGIBILIDADE. MOMENTO. EXEQUIBILIDADE. DEMONSTRAÇÃO. ÔNUS.
RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CARÁTER INDENIZATÓRIO.
DESCABIMENTO. 1. A exigibilidade das astreintes depende da apuração, no plano
do direito material, do inadimplemento do devedor no cumprimento da ordem judicial
a ele dirigida. 2. Em se tratando especificamente de obrigação de não fazer, o devedor
será dado por inadimplente a partir do momento em que realizar o ato do qual deveria
se abster - nos exatos termos do art. 390 do CC/02 -, fazendo surgir automaticamente
o interesse processual do credor à medida coercitiva, ou seja, a prática do ato proibido
confere certeza, liquidez e exigibilidade à multa coercitiva, possibilitando a sua cobrança.
3. A demonstração da exequibilidade das astreintes constitui ônus do credor. 4. Não
podem retroagir os efeitos das astreintes, de modo que alcancem obrigação imposta em
decisão proferida anteriormente, sem estipulação de multa cominatória. 5. A natureza
jurídica das astreintes - medida coercitiva e intimidatória - não admite exegese que a
faça assumir um caráter indenizatório, que conduza ao enriquecimento sem causa do
credor. O escopo da multa é impulsionar o devedor a assumir um comportamento
tendente à satisfação da sua obrigação frente ao credor, não devendo jamais se prestar
a compensar este pela inadimplência daquele. 6. Recurso Especial a que se nega
provimento. (Superior Tribunal de Justiça STJ; REsp 1.047.957; Proc. 2008/0079258-
7; AL; Terceira Turma; Relª Minª Fátima Nancy Andrighi; Julg. 14/06/2011; DJE
24/06/2011) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

281
obrigação e não ocorrendo a entrega da prestação, o patrimônio
do devedor arcará com as consequências por este ato, o credor
buscará a quantidade de bens suficientes do devedor para cobrir
os valores da prestação devida e dos acréscimos legais.
Oportuno lembrar que a legislação processual civil aponta
exceções a esta regra. O art. 649, do Código de Processo Civil,
estabelece em seus incisos uma lista de bens que recebem o
título de impenhoráveis, vez que não se pode exigir a entrega
deles como forma de forçar o pagamento da obrigação236.

2. Responsabilidade pelo inadimplemento


Quanto à responsabilidade pelo inadimplemento, o Código
Civil adota que nos “contratos benéficos, responde por simples
culpa o contratante, a quem o contrato aproveite, e por dolo
aquele a quem não favoreça. Nos contratos onerosos, responde
cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em
lei” (art. 392), vê-se a divisão da responsabilidade pelo
inadimplemento, assim o direito a reparação em decorrência da
não execução da obrigação vai depender dos fatos imputáveis
ao devedor/credor e do tipo de contrato.
A lei divide esta responsabilidade com base nos contratos
gratuitos e contratos onerosos. No primeiro tipo de contrato
apenas uma das partes obterá vantagem, inclusive com aumento
de seu patrimônio, por exemplo, no contrato de doação237 o

236
13513196 - PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL.
EXECUÇÃO FISCAL. ART. 557 DO CPC. APLICABILIDADE. DESBLOQUEIO
DE ATIVOS FINANCEIROS. PENHORA DE VALORES DEPOSITADOS EM
CONTAS DESTINADAS À PERCEPÇÃO DE SALÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE.
ART. 649, INCISO IV, DO CPC. 1. Nos termos do art. 557 do CPC, poderá o relator
negar provimento ou seguimento a recurso manifestamente improcedente, prejudicado,
deserto, intempestivo ou contrário à jurisprudência dominante do respectivo tribunal,
do Supremo Tribunal Federal ou de tribunal superior. Preliminar afastada. 2. Os
vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria e
pensões são absolutamente impenhoráveis, a teor do art. 649, inciso IV, do código de
processo civil, com a redação dada pela Lei nº 11.382/2006. 3. Agravo regimental
desprovido. (TRF 01ª R.; AgRg-AI 2008.01.00.059370-5; RO; Oitava Turma; Rel.
Des. Fed. Leomar Barros Amorim de Sousa; Julg. 16/12/2011; DJF1 17/02/2012;
Pág. 728) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
237
Código Civil: Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por
liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.

282
doador transmite a propriedade de determinado bem ao donatário,
assim quem doa não tem nenhuma vantagem, ao contrário de
quem recebe. Nesta situação o atraso causado por mera culpa
por quem obtém a vantagem da doação poderá gerar
consequências pelo inadimplemento da obrigação. Enquanto que,
para quem oferece a vantagem (doa o bem) apenas ocorrerá
qualquer acréscimo, em razão de inadimplência, caso tenha agido
com dolo (vontade de causar o atraso).
Veja este exemplo, o contrato de transporte é um tipo de
contrato oneroso, no qual uma parte se compromete a transportar
um objeto para outra, mediante contraprestação. Se João
promete transportar uma caixa de taças de cristal italiano, como
favor para Paulo, este será gratuito. João toma todos os cuidados
ao dirigir o veículo, no entanto um motorista embriagado não
obedece à sinalização e abalroa o veículo de João quebrando os
cristais. Tem-se neste caso, uma situação de inadimplemento
absoluto, o contrato não poderá ser cumprido, no entanto este
era de “favor”, o transporte era sem ônus para Paulo, como não
há culpa de João, ele não responderá pelo inadimplemento.238
Agora, no mesmo exemplo, imagine que Paulo não
embalou devidamente as taças de cristal, por conta disto, antes
mesmo de sair do estacionamento a caixa se rasgou e várias
taças quebraram, sujando todo o carro de João, bem como o
machucando. Neste caso, mesmo sem ter ocorrido a vontade de
Paulo para haver inadimplemento do contrato, o mesmo arcará
com as consequências por seu ato, bem como deverá ressarcir
João por seus prejuízos.
A estipulação sobre a responsabilidade contratual é
expressa quanto aos contratos onerosos, nos quais há ampla
negociação entre as partes e não há gratuidade. Nestes, não há
necessidade de dolo para se exigir as consequências pelo
inadimplemento, bastando ser demonstrado que o mesmo não
foi cumprido por qualquer ato imputável a uma das partes
238
STJ. Súmula nº 145. No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador
só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em
dolo ou culpa grave. (DJ 17/11/1995)

283
envolvidas no contrato, a parte inocente terá o direito de exigir
as perdas e danos, juros, correção monetária e honorários
advocatícios da parte culpada.

3. Caso fortuito e força maior


Nas relações obrigacionais existem excludentes de
culpabilidade (apossando-se de termo Penal), segundo as quais
não haveria como exigir as consequências pelo inadimplemento.
Já se falou que a interferência de terceiros pode acarretar a
ausência de responsabilidade, justamente por conta dessa
impossibilitar que o inadimplente seja imputado como causador
do atraso.
O devedor, também, não responderá pelos prejuízos
resultantes de caso fortuito239 ou força maior240, conforme já

239
11784102 - AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE COLETIVO ASSALTO. CASO
FORTUITO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. PRECEDENTES.
DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. IMPROVIMENTO. 1.- O entendimento desta
Corte é firme no sentido de que, em caso de transporte coletivo de passageiros, “o
transportador só responde pelos danos resultantes de fatos conexos com o serviço que
presta” (RESP 468.900/RJ, Rel. Min. ARI Pargendler, DJ 31.3.2003) e que havendo
“assalto com arma de fogo no interior do ônibus, presente o fortuito, os precedentes da
Corte afastam a responsabilidade do transportador” (RESP 286.110/RJ, Rel. Min.
Carlos Alberto Menezes DIREITO, DJ 1.10.2001). 2.- O Agravo não trouxe nenhum
argumento novo capaz de modificar a conclusão alvitrada, a qual se mantém por seus
próprios fundamentos. 3.- Agravo Regimental improvido. (Superior Tribunal de Justiça
STJ; AgRg-AREsp 116.672; Proc. 2012/0007744-1; RJ; Terceira Turma; Rel. Min.
Sidnei Beneti; Julg. 27/03/2012; DJE 17/04/2012) Fonte: DVD Magister. Ed. 43.
Abril/Maio 2012.
240
14354088 - ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. IBGE. TAXA DE
INSCRIÇÃO. PAGAMENTO FORA DO PRAZO. FORÇA MAIOR. 1. A autora
não efetuou o pagamento da taxa de inscrição relativa a concurso público para o cargo
de Recenseador do IBGE, em 06/04/2010, em razão do caos urbano que se instalou
na cidade do Rio de Janeiro, acometida por fortes chuvas, fato reconhecido pelas rés e
amplamente divulgado e noticiado pelos meios de comunicação. 2. Tal fato caracteriza
força maior (art. 393 da Lei nº 10.406/2002), a ensejar o pagamento da taxa de
inscrição fora do prazo previsto no Edital. IBGE Nº 01/2010, como determinado na
decisão que antecipou os efeitos da tutela, confirmada pela sentença. 3. Não obstante a
Administração Pública esteja vinculada ao princípio da legalidade, não se pode olvidar
que a razoabilidade também norteia a atividade administrativa, tendo a autora
apresentado razão plausível para o pagamento da inscrição fora do prazo assinalado no
edital. 4. Apelações e remessa necessária improvidas. (TRF 02ª R.; Proc. 0006449-
53.2010.4.02.5101; Sétima Turma Especializada; Rel. Des. Fed. Luiz Paulo S. Araujo
Filho; Julg. 29/02/2012; DEJF 13/03/2012; Pág. 180) Fonte: DVD Magister. Ed.
43. Abril/Maio 2012.

284
amplamente narrado. Sendo este caso fortuito ou de força maior
uma situação na qual há fato necessário em que não é possível
evitar ou impedir seus efeitos (art. 393 e Parágrafo único, Código
Civil). Nessas situações, em decorrência desta interferência
estranha à relação, não haverá responsabilidade pelo
inadimplemento. No entanto, as partes podem pactuar que
mesmo havendo caso fortuito ou força maior a parte prejudicada
receba reparação.
Por exemplo, Arthur empresta a Vitor uma geladeira, neste
contrato fica expresso que qualquer situação que ocasione a perda
da geladeira será de responsabilidade de Vitor, inclusive os casos
fortuito e/ou força maior. Caso ocorra uma tempestade elétrica,
e raio atinja a geladeira, apesar de Vitor não ter culpa, ele deverá
reparar o valor da geladeira a Arthur.

285
XIII
DA MORA

1. Conceito
O início do estudo da inexecução da prestação apresentou
a classificação do inadimplemento em absoluto e relativo. No
inadimplemento absoluto foi estudada a impossibilidade da
entrega da própria prestação, no relativo se vislumbra a situação
em que ocorre atraso, no entanto a prestação ainda cumpre o
seu papel. A demora na entrega da prestação causa desconforto
e prejuízo a uma das partes da relação obrigacional, bem como
o dever de reparar, na lição de Nonato241:
Considera-se em mora o devedor que, por culpa, deixa
de efetuar o pagamento no tempo, lugar e forma
convencionados e o credor que recusa receber o
pagamento no tempo, lugar e forma convencionados.

O Código Civil impõe o que a doutrina a muito já


conceituou, vez que se considera “em mora o devedor que não
efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo,
lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer” (art. 394).
Assim, tem-se que mora é o atraso na entrega da prestação,
ocorrido por interferência do credor ou do devedor, que gerará
acréscimos na prestação original, em favor da parte prejudicada
pelo atraso.

2. Consequências da mora
Os acréscimos decorrem da inexecução da obrigação, a
não entrega da prestação no tempo, lugar e forma acordada
gerarão consequências à parte que der causa à mora. O Código

241
NONATO, Orosimbo. Curso de obrigações. Volume I, segunda parte. 1 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1960, p 282.

287
Civil estipula separadamente as consequências pelo
descumprimento, primeiro ele trata do devedor e diz que este
responderá “pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros,
atualização dos valores monetários segundo índices oficiais
regularmente estabelecidos, e honorários de advogado” (art. 395).
As situações em que o devedor causar o atraso da
obrigação geram o dever de pagar a prestação acrescida de
reparação, juros, correção monetária e honorários. Esta regra do
art. 395 representa a mora (inadimplemento relativo). No entanto,
existem situações em que a mora acarreta inadimplemento
absoluto, ou seja, o atraso na prestação causa a perda de sua
utilidade. A mesma não mais atinge o objetivo a que se propõe,
por exemplo, Manoelzinho adquire 50 Kg de sementes de milho
para plantar, o pacto diz que a firma que vendeu as sementes, as
entregará no início do mês das chuvas, quando deve ser realizado
o plantio. A firma apenas entrega as sementes dois meses depois,
aqui ocorreria a inexecução absoluta, vez que a prestação teria
perdido sua utilidade.
Quando a prestação “se tornar inútil ao credor, este poderá
enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos” (art. 395,
parágrafo único). No exemplo dado, Manoelzinho não receberá
as sementes e exigirá a devida reparação pelos danos causados
pela firma que vendeu as sementes.
Ao se tratar do inadimplemento foram estipuladas as
questões envolvendo a culpa das partes, o art. 396, deixa expresso
que não “havendo fato ou omissão imputável ao devedor, não
incorre este em mora”, assim para o devedor incidir em mora,
necessário se faz que esta tenha ocorrido por conta de conduta
diretamente atribuída ao devedor, caso contrário não há que falar
da aplicação dos acréscimos em decorrência da mora.

3. Constituição da mora
Não basta o credor afirmar que o devedor está atrasado,
há a necessidade de ser devidamente constituída a mora, mesmo
porque a partir deste momento é que se acrescentam as
consequências pelo atraso. “O inadimplemento da obrigação,
288
positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em
mora o devedor” (art. 397, Código Civil), o texto legal impõe
que o devedor será considerado em mora, apenas se não entregar
a prestação na data que foi acordada.
A mora só surge se for descumprido o dia em que a
prestação deve ser entregue, não há que se falar em mora, se o
devedor entrega a prestação no último segundo de seu prazo. A
questão que pode gerar maiores dúvidas nesta constituição da
mora, surge naquelas obrigações em que não há termo definido,
por exemplo, Flávio empresta a Ricardo R$ 10.000,00, no entanto
ninguém acorda quando deverá ocorrer o pagamento. Caso Flávio
solicite o pagamento, não poderá afirmar que Ricardo esta em
mora desde o primeiro dia do empréstimo.
Para evitar este conflito, a mora será constituída mediante
interpelação judicial242 ou extrajudicial243 (art. 397, parágrafo
único, Código Civil), Flávio deverá formalizar que a partir daquela
data quer o pagamento do empréstimo. Feito este aviso, a partir
deste dia incidirá a mora, caso Ricardo não entregue a prestação
aguardada.

4. Mora no ato ilícito


Uma situação que pode trazer dificuldades para se
constituir a mora, envolve a obrigação por ato ilícito ou
extracontratual. Veja que este estudo se concentrou nas

242
Veja o Código de Processo Civil. Art. 867 ao art. 873.
Art. 867. Todo aquele que desejar prevenir responsabilidade, prover a conservação e
ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal, poderá fazer
por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e requerer que do mesmo se intime
a quem de direito.
243
67029806 - ARRENDAMENTO MERCANTIL. LEASING. REINTEGRAÇÃO DE
POSSE. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONSTITUIÇÃO EM MORA.
OCORRÊNCIA. ESBULHO. CARACTERIZAÇÃO. CABIMENTO. A Apelada fez
encarte nos autos da Ação de Reintegração de Posse, de cópia do instrumento de contrato
de arrendamento mercantil. Igualmente em relação à respectiva interpelação extrajudicial
para efeito de comprovar a constituição da Apelante em mora. O esbulho está caracterizado
porque, resolvido o contrato em face do inadimplemento, o bem não foi devolvido,
estando a empresa arrendante autorizada a postular, a partir daí, a devolução do bem
arrendado do qual é locadora e proprietária. (TACSP 2; Ap. s/Rev. 685.079-00/4;
Décima Câmara; Rel. Juiz Irineu Pedrotti; Julg. 24/11/2004) Fonte: DVD Magister.
Ed. 43. Abril/Maio 2012.

289
obrigações decorrentes da expressão de vontade entre as partes,
no entanto, existem obrigações que decorrem da prática de atos
ilícitos, por exemplo, o dever do motorista de reparar um
transeunte que fora atropelado por seu carro.
Como fonte de uma obrigação, este ato ilícito gerará uma
prestação, surgindo um problema, desde quando o devedor está
em mora? Nestas obrigações o devedor está em mora desde que
praticou o ato ilícito, conforme art. 398, Código Civil.
Assim, no caso de Isaías ter atropelado Moisés, houve
um ato ilícito, que originará a obrigação de reparar os danos
sofridos por Moisés, estes danos são R$ 20.000,00 de despesas
médicas, hospitalares e com próteses (danos materiais). Neste
exemplo, sabe-se que há mora, vez que Moisés nada pagou, a
questão é saber desde quando pode ser considerado o causador
do dano em mora e a lei responde ao impor que há mora desde
que cometeu o ato ilícito, assim os acréscimos devem incidir ou
começar a contar da data que ocorreu o acidente244.

5. Mora e perda da prestação


Outra situação que pode acarretar consequências ao
devedor é a que envolve a perda da prestação durante a mora,
pois o “devedor em mora responde pela impossibilidade da
prestação, embora essa impossibilidade resulte de caso fortuito
ou de força maior, se estes ocorrerem durante o atraso; salvo se
provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria ainda quando
a obrigação fosse oportunamente desempenhada” (art. 389,
Código Civil).
O devedor responderá pela reparação de eventuais
prejuízos se a prestação tiver se perdido durante a mora, mesmo
que em caso fortuito ou de força maior. Veja que a lei estabelece
que nos casos em que não haveria responsabilidade do devedor,
como o mesmo estava em mora deverá reparar a perda da
prestação.

244
STJ. Súmula nº 54. Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de
responsabilidade extracontratual. (DJ 1/10/1992)

290
Por exemplo, Neto recebeu um livro emprestado de
Marcos, ficando de entregar este livro em dois dias. Ocorre que
Neto passou mais 15 dias com o livro, no final destes dias a
mais, uma chuva inundou o estacionamento onde Neto guarda
seu carro. O livro estava dentro do carro e se perdeu, sendo
obrigação de restituir a regra é de que a perda seria contra o
dono do bem, no caso Marcos, no entanto como Neto está em
mora, este é quem deve assumir o prejuízo e reparar o prejuízo
de Marcos.
No entanto, o final do art. 389 releva a situação do
devedor em mora, caso ele demonstre que mesmo que tivesse
cumprido sua obrigação o bem se perderia. Por exemplo, Paulo,
vizinho de Flávio, tem que devolver a este um aparelho televisor
de 52’, na segunda-feira, mas não a entrega e na quinta-feira ocorre
um incêndio que destrói os dois apartamentos. A regra é que
Paulo deve reparar a perda da televisão, vez que em mora. No
entanto, pelo art. 389, in fine, Paulo pode se eximir da
responsabilidade alegando que mesmo que tivesse entregado a
televisão esta se perderia, por conta do incêndio que afetou
ambos os apartamentos.

6. Mora do credor
Até este momento apenas se tratou da mora do devedor,
no entanto já se demonstrou que a mora pode ser causada
também pelo credor. Independentemente dos motivos que o
levem a provocar a mora da prestação, não poderia o devedor
ser penalizado por atos praticados pelo credor. Assim a “mora
do credor subtrai o devedor isento de dolo à responsabilidade
pela conservação da coisa, obriga o credor a ressarcir as despesas
empregadas em conservá-la, e sujeita-o a recebê-la pela estimação
mais favorável ao devedor, se o seu valor oscilar entre o dia
estabelecido para o pagamento e o da sua efetivação” (art. 400,
Código Civil).
Um credor incidir em mora é um fato inusitado, ao que
parece muito difícil de ocorrer vez que a intenção do credor é de
receber a prestação devida. Neste caso, quando ocorre esta
291
demora que prejudica ao devedor, o maior remédio para evitar
as consequências desfavoráveis já foi apresentado, é a
consignação em pagamento, como forma de pagamento especial
a consignação evita que o devedor tenha prejuízos por culpa do
credor.
Ademais, o próprio art. 400, Código Civil, reconhece a
mora do credor e as consequências a que este se submeterá por
conta de sua conduta: a) responsabilidade pela conservação da
coisa; b) Ressarcir despesas por conservar a coisa e c) em caso
de oscilação de valor, receberá pela estimação mais favorável ao
devedor.
Como anteriormente exposto, nos casos de perda da
prestação na constância da mora do devedor, este deveria reparar
o prejuízo ao credor. Isto não ocorre na mora causada pelo credor,
nesta situação o devedor não é responsável pela conservação da
coisa, ocorrendo a perda anteriormente exemplificada, não
havendo má-fé e dolo por parte do devedor, este não será mais
responsabilizado por esta situação.
Caso o devedor tenha alguma despesa com a conservação
do bem, deverá ser ressarcido pelo credor que deu causa à mora.
Por exemplo, o devedor entregaria na data de hoje um cavalo ao
credor, este resolve atrasar o recebimento da prestação e
desaparece. No período em que este ficou sumido, o cavalo
originou despesas, com o haras, com alimentação, vitaminas e
veterinário. Estas despesas deverão ser ressarcidas ao devedor
pelo credor, em razão da mora provocada por este.
E por fim, a oscilação do valor da coisa a ser entregue,
muito bem explica Rizzardo245:
Outro aspecto que merece a análise prende-se à
estimativa do valor da coisa. Consistente a
mercadoria em bens comerciáveis, como cereais ou
produtos agrícolas, valerá a estimativa do dia da
entrega. Assim deve ser, dada a constante variação
do preço na bolsa de valores de certos produtos, como

RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.


245

Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 488.

292
quanto a soja. Se o produto tem o preço majorado
quando da efetiva entrega, relativamente ao dia
marcado, o último preço é que prepondera. Situação
comum nas transações entre produtores e
cooperativas intermediárias. Se prevista a entrega até
certa data, pela cotação que imperava quando da
entrega, mas recusando-se o credor ou adquirente a
receber, e somente aceitando tempo depois, valerá o
preço da data marcada para o recebimento. Não pode
submeter-se a parte ao jogo especulativo do
comerciante mais forte.

A parte mais fraca na transação não pode se submeter às


vontades do credor, que tenta impor o recebimento do bem
apenas quando o preço estiver melhor estimado a ele, assim a lei
impõe o equilíbrio contratual. Caso o credor tenha agido para
causar a mora e tentar obter alguma vantagem, deverá receber a
prestação pelo valor mais favorável ao devedor.

7. Purgação da mora
O atraso no pagamento poderá ser eliminado de forma
que não mais existirá suas consequências, quando isto ocorre
tem-se a purgação a mora. Nesta não se fala mais no atraso, eis
que a obrigação poderá ser extinta. O Código Civil expõe:
Art. 401. Purga-se a mora:
I - por parte do devedor, oferecendo este a prestação
mais a importância dos prejuízos decorrentes do dia
da oferta;
II - por parte do credor, oferecendo-se este a receber
o pagamento e sujeitando-se aos efeitos da mora até a
mesma data.

Pode ser finalizada a mora, pelo devedor, se este


apresentar a prestação devidamente acrescida das reparações por
conta de sua conduta, assim receberia o credor a prestação e as
reparações246.

95338324 - CONTRATO. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA TERRENO


246

LOTEADO VENDIDO EM PRESTAÇÕES. RESCISÃO C.C. REINTEGRAÇÃO


DE POSSE FUNDADA NO INADIMPLEMENTO DOS PROMISSÁRIOS

293
Para o credor, sua mora encerra quando ele se propõe a
receber a prestação e não impor dificuldades para tanto,
possibilitando ao devedor que cumpra a obrigação, com a devida
entrega do acordado.

COMPRADORES RÉUS QUE, CITADOS, PURGARAM A MORA,


DEPOSITANDO O VALOR DAS PRESTAÇÕES EM ATRASO VALOR
CONFERIDO POR CONTADOR JUDICIAL DEFICIÊNCIA SUPRIDA
POSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA A QUALQUER MOMENTO.
Pagamento útil ao credor e indenizados os prejuízos deste, através da multa contratual
incluída no depósito Art. 401 do Código Civil Pedidos de rescisão contratual e
reintegração de posse prejudicados Hipótese em que cabe apenas julgar purgada a mora
Sentença corrigida de ofício Ônus sucumbenciais mantidos Impossibilidade de causar
prejuízo ao apelante. Recurso desprovido, com correção de erro material de ofício.
(TJ-SP; APL 9084775-77.2009.8.26.0000; Ac. 5672374; Guarulhos; Primeira Câmara
de Direito Privado; Rel. Des. Rui Cascaldi; Julg. 07/02/2012; DJESP 27/02/2012)
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

294
XIV
DOS ACRÉSCIMOS

Ocorrido o inadimplemento, o Código Civil, em dois


momentos, impõe as consequências pelo não pagamento da
prestação. Nestes dispositivos são expostos os acréscimos de
perdas e danos, juros, correção monetária e honorários
advocatícios. As consequências pelo atraso são as formas de
tentar recuperar a posição inicial, bem como ressarcir os prejuízos
daquele que não deu causa ao inadimplemento.
O inadimplemento pode gerar diversos prejuízos ao credor
ou ao devedor, devendo indenizar estes prejuízos quem os deu
causa. Veja que o não pagamento da prestação na data marcada,
ou a própria perda da mesma, impossibilita a extinção da relação.
No caso do devedor, o atraso provocado pelo credor, impõe a
este a conservação da coisa e sua manutenção, por isso a
necessidade de protegê-lo de ações do credor neste sentido.
Estes atos causadores da mora podem gerar vários tipos
de prejuízos, assim estas consequências são aplicadas como
forma, primeiro de coibir a mora, lembre-se que todas as pessoas
que realizam pagamento podem fazê-lo pelo animus de pagar,
mas sempre lembram os acréscimos que podem acontecer na
prestação nos casos de mora.
Em segundo lugar, estes acréscimos visam reparar
eventuais prejuízos causados ao sujeito que busca a extinção da
relação obrigacional, bem como a própria conservação do valor
original da prestação. Por exemplo: César é credor de Augusto
da importância de R$ 10.000,00. Caso Augusto demore 6 meses
para pagar a conta, com certeza a prestação não terá mais o
mesmo poder de compra, o valor inicial não consegue comprar
os mesmos itens que compraria seis meses antes, isto acarreta
prejuízo ao credor. Não bastasse isto, o desconforto a que ele foi

295
submetido, o capital que ficou parado e estagnado, incapaz de
gerar outros frutos, geram prejuízos a serem reparados pelos
acréscimos legais adiante estudados.

1. Da atualização monetária
O Código Civil trata da atualização monetária como um
acréscimo sobre as parcelas em mora, no entanto não deixa claro
que tipo de acréscimo é este. Veja que o instituto utiliza o termo
monetária, logo já se sabe que a aplicação deste acréscimo será
sobre as prestações em dinheiro.
A atualização monetária será a atualização feita sobre a
prestação em dinheiro, como forma de tentar manter o poder de
compra do credor igual à época em que a obrigação deveria ser
paga. O cálculo da correção é feito com base em índice que
calcula a inflação do Brasil, este instituto visa a manutenção do
valor financeiro devido, logo ele tenta recompor o que o valor
real do dinheiro teria perdido pela inflação do período em que a
parcela esteve em atraso.
Vários são os órgãos e institutos que calculam o valor da
inflação, estipulando índices de correção aptos a fornecer a devida
atualização monetária a uma prestação em dinheiro, por exemplo,
o INPC (índice nacional de preços ao consumidor) do IBGE,
que estipula a variação de preços dos bens de consumo, aferindo
o quanto os mesmos aumentaram em um período e o reflexo
deste aumento nos salários (inflação), existe, também, o INCC-
M (índice nacional de custo da construção do mercado) da FGV,
entre outros.
Todos estes índices servirão para tentar recompor os
valores perdidos pelo credor, em decorrência do atraso no
pagamento da prestação financeira, tentando, assim, manter o
equilíbrio contratual e evitando possíveis perdas patrimoniais.
A correção monetária quebra o princípio do nominalismo, à
medida que vencida a prestação o devedor não mais pagará
apenas o valor nominal do débito, a correção possibilita que
ocorra a correção e a prestação seja paga por seu valor real.

296
2. Das perdas e danos
2.1 Noções gerais
Diversas são as consequências que surgem por conta do
inadimplemento da obrigação, a parte pode perder o próprio bem
ou sofrer alguns prejuízos pelo atraso na entrega destes bens.
Quem causa este tipo de prejuízo é responsável por uma
reparação, esta visa restaurar a situação inicial entre o devedor e
o credor, buscando o equilíbrio e que não haja prejuízo ou lucro
astronômico.
Por exemplo, Carlos pactuou que entregaria um
“software” de controle de estoque para a Loja Barato & Bom,
este programa deveria ser instalado no dia 20 de agosto, ocorre
que Carlos apenas realizou seu trabalho em 25 de agosto, por
mero descaso. A loja ficou durante estes 5 dias sem poder
funcionar, em razão de não mais poder utilizar seu antigo
programa. Esta situação gera prejuízos de uma ordem maior,
que não podem ser recompostos apenas com juros e correção
monetária, eis a reparação por perdas e danos.
A reparação por perdas e danos surge de dois tipos de
responsabilidade, a contratual e a extracontratual (aquiliana). A
contratual decorre do vínculo existente entre as partes da relação
obrigacional, qualquer ato que por ventura acarrete
descumprimento do contrato ou o inadimplemento do mesmo
é de responsabilidade de quem deu causa e possibilita a reparação
por danos. Já a responsabilidade extracontratual ou aquiliana
decorre do dever de indenizar qualquer ato ilícito que cause
prejuízo a alguém, o termo decorre da Lei Aquilia (Lex Aquilia
de damno). Este tipo de responsabilidade nasceu no Direito das
Obrigações, mas modernamente existe ramo próprio do Direito
Civil que cuida de seu estudo, qual seja a cadeira de
Responsabilidade Civil, veja art. 186 e os arts. 927 e seguintes
do Código Civil.
Aqui se cuidará do estudo da responsabilidade contratual
e sua reparação por perdas e danos. O Código Civil estabelece
que salvo “as exceções expressamente previstas em lei, as perdas
e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele
297
efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar” (art.
402, Código Civil), tem-se aqui a regra basilar da reparação e
seus dois importantes institutos: os danos emergentes e os lucros
cessantes.

2.2 Danos emergentes


No art. 402, Código Civil, apresentam-se os dois tipos
de dano, quais sejam: dano emergente e lucro cessante. A primeira
figura cuida do tipo de dano efetivamente causado, ele depende
da situação ou posição econômica original do indivíduo que sofre
o dano, vez que este tipo de reparação busca reestabelecer a
situação original do contratante.
Por exemplo, João emprestou seu cavalo quarto de milha
para Zezinho participar de uma vaquejada, ocorre que Zezinho
não cuidou devidamente do cavalo e este morreu. A situação
original de João é ter em seu patrimônio o citado semovente,
este foi perdido, assim gera para Zezinho o dever de reparar o
dano e se restabelecer o status inicial de João.
O dano emergente será o prejuízo efetivamente sofrido,
seu cálculo depende do que a parte perdeu, em razão da prestação
não ter mais o mesmo valor inicialmente acordado (seja pelo
desaparecimento ou depreciação).

2.3 Lucro cessante


O lucro cessante, nas lições de Villaça Azevedo247:
Lucro cessante, por outro lado, é o que se deixou de
auferir, em razão do evento danoso. É a vantagem
patrimonial, que não chega a ingressar no patrimônio
do que sofreu a lesão.

Tudo que o indivíduo, por conta de evento danoso, deixar


de lucrar ou acrescentar a seu patrimônio é conceituado como
lucro cessante. Por exemplo, Galvão alugou, da firma Festa Fria,
dois freezers a serem colocados em seu bar durante o período da

247
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de direito civil: teoria geral das obrigações. 5 ed,
rev e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1990, p 227.

298
Copa do Mundo de Futebol (o movimento em seu
estabelecimento triplica nesta época). Ocorre que a firma não
entregou o objeto de locação e Galvão, apesar do grande
movimento, não aumentou seus lucros. Assim, o que Galvão
deixou de faturar é tido como lucro cessante248.
A parte teria um aumento de patrimônio, não se
materializando este aumento em razão do não cumprimento do
contrato pela outra parte, assim o lucro cessante será todo o
acréscimo ou vantagem que aconteceria ao sujeito da obrigação
e acaba não sendo somado em sua esfera jurídica, por conta da
conduta da parte culpada.

2.4 Prejuízos efetivos


Este tipo de perda implica a materialidade do prejuízo,
apenas se pode exigir a reparação pelo que foi efetivamente perdido,
não pode haver pedido de reparação por danos aparentes. O
comando legal é de que ainda “que a inexecução resulte de dolo
do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e
os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo
do disposto na lei processual” (art. 403, Código Civil).
Mesmo que o causador do dano o tenha provocado por
sua vontade (dolo), não fará diferença na valoração da reparação,

64410771 - RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZATÓRIA. DANO MORAL


248

E LUCROS CESSANTES. CAMINHÃO SEGURADO QUE FOI OBJETO DE


FURTO. NEGATIVA DE COBERTURA PELA SEGURADORA, AO
ARGUMENTO DE SUSPEITA DE FRAUDE. AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE
O SEGURADO HAJA PARTICIPADO DO CRIME. INJUSTIFICADA
RENITÊNCIA QUANTO AO NÃO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO
SECURITÁRIA. MANUTENÇÃO DA VERBA FIXADA A TÍTULO DE LUCROS
CESSANTES. MONTANTE INDENIZATÓRIO POR DANO MORAL
MINORADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Se o caminhão furtado
dedicava-se ao transporte de mercadorias, imperioso concluir que a indisponibilidade
do cargueiro, em razão do furto, gerou ao seu dono efeitos patrimoniais negativos,
impondo-se, pois, à seguradora, o dever de indenizar o segurado pela renda que deixou
de auferir (art. 1.059 e 1.060 do CC/1916, atuais arts. 402 e 403 do CC/2002). 2. Se
por ação da seguradora, o proprietário do veículo foi intensamente investigado pela
polícia como suposto autor da subtração, fato esse que se revelou comprovadamente
danoso à sua condição profissional e anímica, cumpre à empresa envolvida na trama
indenizar-lhe por dano moral. (TJ-SC; AC 2008.046503-5; Joinville; Quarta Câmara
de Direito Civil; Rel. Des. Eládio Torret Rocha; Julg. 04/08/2011; DJSC 29/08/
2011; Pág. 180) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

299
eis que a mesma seria igual à reparação em caso de mera culpa.
Para a reparação não fará diferença a intenção do causador do
dano, o que se protege é o interesse da vítima.
A parte que sofreu o prejuízo deve demonstrar
exatamente o quantum que seu patrimônio foi reduzido, para
assim, poder exigir e receber a reparação, o mesmo se fala do
lucro cessante, tem que ser devidamente demonstrado aquilo
que a parte deixará de lucrar, por conta do ato causador de
dano249. Bem explica Gonçalves250:
Trata-se de aplicação da teoria dos danos diretos e
imediatos, formulada a propósito da relação de
causalidade, que deve existir, para que se caracterize
a responsabilidade do devedor. Assim, o devedor
responde tão só pelos danos que se prendem a seu ato
por um vínculo de necessariedade, não pelos
resultantes de causas estranhas ou remotas.251

249
62086841 - DIREITO CIVIL. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. Resolução
do contrato, ante o reconhecimento de culpa de uma das partes contratantes, devendo-
lhe ser imposto o ônus de restituir todos os prejuízos causados à outra parte, desde que
efetivamente comprovados. Lucros cessantes. Art. 403 do CC/02. Somente se faz
devida indenização pelos lucros cessantes, quando comprovada a relação direta e
imediata com a inexecução culposa do negócio jurídico. Recursos conhecidos e
desprovidos. (TJ-RJ; APL 2009.001.06867; Duque de Caxias; Décima Sétima Câmara
Cível; Rel. Des. Luisa Bottrel Souza; Julg. 14/04/2009; DORJ 14/05/2009; Pág.
174) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.
250
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2: teoria geral das
obrigações. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p 401.
251
57355488 - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. Contrato de
prestação de serviços de perfuração de rochas nulidade do processo por defeito de
representação não é o caso de nulidade do processo por defeito de representação
regularizado após a sentença na situação em que a determinação judicial para sanar o
defeito ocorre no mesmo momento em que publicada a sentença inexecução de obrigação
contratual e direito a indenização a empresa contratante está obrigada a indenizar a
contratada quando evidenciado inadimplemento da obrigação de fornecimento de
máquina perfuratriz com condições técnicas de realizar as metas de perfuração
estabelecidas o dever de indenizar decorre do constante no contrato e na legislação
civil na medida em que a contratante se trata de empresa de economia mista que
desenvolve atividade de exploração e produção de petróleo que não pode ser equiparada
a prestação de serviço público para fins de incidência de responsabilização objetiva
fixação do montante da indenização o direito a indenização por lucros cessantes deve
considerar nexo de causalidade estabelecido mediante elementos objetivos de prejuízos
potenciais diretos e imediatos resultantes do inadimplemento - Apurados os danos
diretos e imediatos decorrentes do inadimplemento o valor da indenização deve ser
reduzido de R$ 8.132.538,75 para R$ 1.103.670,49 com correção monetária pelo
IPC/FIPE e juros de mora de 12% ao ano indenização por danos morais não é devida

300
A Teoria citada faz a ligação entre causa do dano e os
efeitos (prejuízos) que deverão ser reparados, não adianta exigir
a mais por conta de entender que “merece ser mais indenizado”.
A legislação estabelece para este tipo de reparação um teto, que
corresponde ao dano efetivamente causado.

2.5 Acréscimos às perdas e danos


O sujeito com o dever de arcar com as perdas e danos fará
o pagamento destas com alguns acréscimos impostos pelo Código
Civil, logo a reparação “nas obrigações de pagamento em dinheiro,
serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais
regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários
de advogado, sem prejuízo da pena convencional” (art. 404). Fica
estabelecido que junto com as perdas e danos, o culpado deverá
assumir acréscimos nos valores de reparação.
Quanto as estes acréscimos deve ser observado que nas
situações em que o devedor diretamente se apresenta para pagar
as perdas e danos, sem intervenção do Poder Judiciário,
desnecessário será o pagamento de custas, vez que estas são as
despesas ligadas à propositura de um ação judicial. O mesmo se
fala do valor de honorários advocatícios, logicamente, estão
atrelados à contratação de um advogado, o credor não pode exigir
uma parcela que não é destinada a ele.
Os juros e correção irão obedecer algumas imposições
jurisprudenciais. Já se sabe que os mesmos são devidos, mas
devem ser observadas as seguintes súmulas, do Superior Tribunal
de Justiça:

indenização por danos morais quando não evidenciado no conjunto probatório que do
inadimplemento contratual tenha resultado lesão a direito de reputação ou de imagem
da pessoa jurídica - Honorários advocatícios na situação de decisão preponderantemente
condenatória o valor dos honorários advocatícios deve ser majorado para o mínimo de
dez por cento do valor da condenação corrigido - Interpretação e aplicação do disposto
nos art. 30, 173 e 175 da constituição, arts. 1058 e 1060 do Código Civil de 1916, art.
52, 389 e 403 do Código Civil atual do Código Civil e art. 13 e 20 § 3. º do código de
processo civilrecursos conhecidos e parcialmente providos. (TJ-PR; ApCiv 0536156-
0; São Mateus do Sul; Oitava Câmara Cível; Rel. Juiz Conv. Francisco Cardozo
Oliveira; DJPR 14/04/2010; Pág. 150) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio
2012.

301
Súmula nº 54. Os juros moratórios fluem a partir do
evento danoso, em caso de responsabilidade
extracontratual. (DJ 1/10/1992)

Súmula nº 362. A correção monetária do valor da


indenização do dano moral incide desde a data do
arbitramento. (DJe 3/11/2008)

O cálculo das atualizações seguirá as interpretações dos


tribunais, bem explica a jurisprudência da lavra do
Desembargador Paes Landim Filho, do Tribunal de Justiça do
Estado do Piauí:
59010418 [...] É pacífico o entendimento
jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça
quanto à incidência dos juros moratórios, no sentido
de que, tratando-se de responsabilidade contratual,
os juros moratórios incidem a partir da citação (art.
405 do CC) e na responsabilidade extracontratual, a
teor da Súmula nº 54, a partir do evento danoso. No
tocante à correção monetária, tratando-se de dano
material, incidirá a partir da data do efetivo prejuízo,
na forma da Súmula nº 43, já no caso de indenização
do dano moral, a correção ocorrerá desde a data do
arbitramento, na forma da Súmula nº 362. 3.
Tratando-se de indenização por dano material
decorrente de responsabilidade contratual, deverá
incidir, consoante jurisprudência do STJ, juros de
mora a partir da citação (art. 405 do CC) e correção
monetária a partir da data do efetivo prejuízo (Súmula
nº 43). Precedentes deste Tribunal. [...] devendo, no
cálculo da atualização do valor da condenação, incidir
juros de mora a partir da citação (art. 405 do CC),
correção monetária a partir do efetivo prejuízo
(Súmula nº 43 do STJ) e serem calculados os
honorários advocatícios em 20% (vinte por cento)
sobre o valor da causa, conforme arbitrado na
sentença. (TJ-PI; AI 07.001775-1; Terceira Câmara
Especializada Cível; Rel. Des. Francisco Antônio
Paes Landim Filho; DJPI 11/11/2011; Pág. 15)252

252
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

302
Assim, quando do cálculo dos acréscimos nas perdas e
danos, o operador legal deve tomar cuidado com os parâmetros,
primeiro identificar se a responsabilidade é contratual ou
extracontratual, após se há danos morais, e assim, no cálculo
realizar a correta aplicação conforme exarado anteriormente.
Ademais, o art. 404 faz ressalva sobre a pena convencional,
segundo o qual a cobrança das perdas e danos com seus
acréscimos não será prejudicada pela existência de multa
contratual (pena convencional).
Uma novidade fora acrescentada ao Código Civil por
meio do parágrafo único do art. 404, uma vez provado “que os
juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena
convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização
suplementar”, os juros aplicados às perdas e danos, conforme a
jurisprudência tem natureza indenizatória, assim se os mesmos
não conseguirem reparar o dano de forma que o patrimônio da
vítima possa ser considerado recuperado, este dispositivo legal
possibilita a um magistrado que determine indenização
complementar, como forma de reequilibrar as posições das
pessoas envolvidas na relação obrigacional.
Muito bem expõe esta situação Tepedino, Barboza e
Helena , veja:
253

O dispositivo atual estabelece que se os juros de mora


não forem suficientes para cobrir o prejuízo e se não
houver pena convencional [...], o juiz poderá conceder
ao credor indenização suplementar. Assim, p. ex.,
alguém que, confiando no pagamento de certa quantia
em dinheiro no prazo determinado, de conhecimento
do devedor (v. art. 397.), planeje uma viagem, faça
gastos, recuse serviços e, no dia do pagamento, tem
frustrada pelo devedor sua expectativa de receber a
prestação ajustada, não teria os seus prejuízos
cobertos pelos juros legais[...]. O parágrafo único do
art. 404, permitirá ao juiz que, diante do caso

253
TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin
de. Código civil interpretado conforme a Constituição da República. 2 ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2007, p 739.

303
concreto, observe o princípio da restitutio in integrum,
que deve nortear a responsabilidade civil, e conceda
a indenização necessária para a restituição do
patrimônio ao status quo ante.

As perdas e danos e seus reflexos detém a ideia de punição


ao seu devedor, mas esse é um objetivo indireto, a natureza das
perdas e danos é indenizatória. Busca reparação dos prejuízos
causados bem como reestabelecer a posição patrimonial do
sujeito da relação obrigacional que foi vítima destes prejuízos.
Por fim, a aplicação do art. 405, que segundo o qual os
juros de mora são contados desde a citação inicial. Lógico que
este cálculo ocorre quando, para a cobrança da obrigação, se faz
necessário um pedido judicial. Este dispositivo está inserido no
capítulo de perdas e danos contratuais, o que leva ao
entendimento de que aplicação deste será feita nas perdas e danos
decorrentes de obrigações contratuais.
Como anteriormente exposto, várias são as imposições
legais e jurisprudências sobre a aplicação das atualizações e juros,
no que cabe a este dispositivo, nota-se que o mesmo tem aplicação
nas perdas e danos impostas ao descumprimento de obrigações
ilíquidas (a prestação não tem valor exato), bem como nas
obrigações sem termo, o que leva a necessidade da interferência
do judiciário para aferir o valor devido, bem como dá termo
inicial à cobrança. Lôbo254assim explica:
No Código Civil de 1916 havia regra parecida, apenas
incidente nas obrigações ilíquidas. Nas dívidas de
valor, os juros serão incidentes não a partir do
momento em que a dívida é exigível, ou da
condenação, cuja sentença fixa o valor da dívida, mas,
considerando este, contados desde a citação inicial
(data da juntada do mandado de citação efetivada).
Nas dívidas de dinheiro, que não dependem de
liquidação, a fluência dos juros a partir da citação
inicial não faz justiça ao credor. Todavia, a norma do
art. 405 é geral e supletiva, pois o termo inicial da
fluência dos juros será diferente, de acordo com a

254
LÔBO, Paulo. Direito civil: obrigações. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 255/256.

304
norma específica que o determinar, como vimos nos
exemplos acima referidos.

3. Dos juros
3.1 Noções gerais
A utilização de um bem por uma pessoa pode acarretar a
obrigação de pagar por este uso, como o aluguel de um vestido
para uma festa, a moça que o aluga pagará o valor pelo uso. Os
juros serão o pagamento pela utilização de capital (dinheiro),
sendo que este capital pode ser remunerado pelo simples
contrato entre devedor e credor, ou pelo atraso do devedor em
cumprir sua obrigação. O sujeito passivo da obrigação deverá
remunerar o valor da prestação que se encontra em seu poder.
Antunes Varela255 muito bem conceitua:
Os juros são os frutos civis, constituídos por coisas
fungíveis, que representam o rendimento de uma
obrigação de capital. São, por outras palavras, a
compensação que o obrigado deve pela utilização
temporária de certo capital, sendo o seu montante
em regra previamente determinado como uma fracção
do capital correspondente ao tempo de sua utilização.

Este fruto civil tem a função de ressarcir o credor pela


utilização de seu capital, seja por conta do período que por
vontade própria o credor deixou o capital à disposição do
devedor, ou pelo período que o devedor, contra a vontade do
credor, se manteve com o capital e não realizou a entrega da
prestação.
Este acréscimo ao valor da prestação será de dois tipos:
o compensatório e o moratório. Os juros compensatórios são os
juros decorrentes da disponibilização de valores pelo credor ao
devedor, são os juros do empréstimo. O credor receberá uma
compensação que tem como parâmetros o período em que os
valores ficaram com o devedor e a taxa percentual aplicada sobre
este valor.

255
VARELA, João de Matos Antunes. Das obrigações em geral. Volume I. 8 ed. Revista
e actualizada. Coimbra: Livraria Almedina, 1994, p 885/886.

305
Já os juros moratórios decorrem do descumprimento da
obrigação. O atraso é determinante para a cobrança de juros, a
obrigação possui uma data certa para que a prestação seja
devidamente cumprida, não sendo obedecido este prazo a
prestação será acrescida das parcelas determinadas pela lei, entre
elas os juros, que serão a forma de reparar o credor pelo atraso
do devedor. Os juros moratórios, por conta de seu caráter,
independem de prejuízo ao credor, o mero atraso no pagamento
da prestação acarretará a cobrança do mesmo.

3.2 Evolução dos juros


Diversas legislações trataram e tratam dos juros no Brasil.
O Código Civil de 1916, em seu art. 1.062, determinava que a
“taxa dos juros moratórios, quando não convencionados (art.
1.262), será de seis por cento ao ano”, por ser no período do
liberalismo se tem aqui a aplicação das regras de total liberdade
nos contratos e liberdade para pactuar o quantum dos juros.
O Decreto n.º 22.626 de 1933 determina em seu art. 1º,
que é “vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em
quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa
legal (Código Civil, art. nº 1.062)”, assim se verifica a limitação
à excessiva liberdade contratual, os juros foram submetidos a
um teto, com tipo penal para quem não cumprisse a
determinação.
A Lei n.º 4.595, de 1964, surgiu como a resposta requerida
e aclamada pelo sistema financeiro. Após a lei de usura o sistema
financeiro foi questionado em sua aplicação dos juros, os bancos
não aceitaram a imposição de um limite aos juros que estes
buscavam. Com esta lei, a legislação anterior não seria aplicada
contra o sistema financeiro, existe súmula do Supremo Tribunal
Federal que melhor explica: “Súmula nº 596. As disposições do
Decreto nº 22.626, de 1933, não se aplicam às taxas de juros e
aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por
instituições públicas ou privadas, que integram o sistema
financeiro nacional”.

306
Já o Código Tributário Nacional, instituiu que:
Art. 161. O crédito não integralmente pago no
vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual
for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da
imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de
quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou
em lei tributária. § 1º Se a lei não dispuser de modo
diverso, os juros de mora são calculados à taxa de 1%
(um por cento) ao mês.

Por conta desta legislação foi fixado um teto para a


cobrança de juros nas obrigações tributárias, sendo o mesmo de
1%, conforme o parágrafo supratranscrito.
A Constituição Federal de 1988 impôs um dispositivo
que limitava os valores dos juros a 12 %, veja:
art. 192. [...]
§ 3º. As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões
e quaisquer outras remunerações direta ou
indiretamente referidas à concessão de crédito, não
poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a
cobrança acima deste limite será conceituada como
crime de usura, punido, em todas as suas modalidades,
nos termos que a lei determinar.

Este dispositivo foi revogado, pela Emenda


Constitucional n.º 40 de 2003, mas ele inspirou diversos debates
judiciais. Enquanto esteve em vigor o STF entendeu que o
mesmo teria validade, mas dependeria de norma ordinária para
ter aplicabilidade. Infelizmente a legislação não surgiu e a Emenda
Constitucional cuidou de revogar este limite, que seria muito
importante para a sociedade, bem como evitaria muitos dos
excessos, que diariamente são testemunhados e sofridos pela
população, quando se fala na cobrança de juros.
Por fim, o Código Civil impõe os artigos 406 e 407.

3.3 As limitações dos juros e sua aplicação


O art. 406, do Código Civil, afirma:
Art. 406. Quando os juros moratórios não forem
307
convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou
quando provierem de determinação da lei, serão
fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a
mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda
Nacional.

Note que a legislação trata diretamente dos juros


moratórios, há estipulação da taxa a ser aplicada como se existisse
plena liberdade para impor o valor de juros que a parte entender
mais conveniente. Amparado neste raciocínio poderia se ter, por
exemplo, uma taxa de juros moratórios em uma relação privada
da ordem de 20%.
Com certeza a estipulação de uma taxa neste patamar
afetaria o equilíbrio contratual, bem como imporia ao devedor,
em mora, o sério risco de converter o inadimplemento relativo
em insolvência civil.
O texto legal estabelece a liberdade das partes de
pactuarem o valor dos juros moratórios, no entanto, existem
limites para esta estipulação, talvez o principal não decorra da
lei, mas da aplicação da boa-fé objetiva. Esta impõe uma série
de regras de conduta entre as partes envolvidas na relação
obrigacional, alguns autores chamam estas regras de “deveres
laterais”, mesmo não tendo sido expressamente acordados, as
partes os cumprem como forma de manter o equilíbrio contratual
e a lealdade que deve haver entre os contraentes.
Esta limitação ao valor dos juros moratórios induz as
partes a uma posição capaz de possibilitar que a prestação em
atraso seja cumprida com o acréscimo de juros, sem torná-la
insuportável ao devedor. Ademais, a Lei de usura não está
revogada, o que ainda possibilita um limite legal para os juros,
Rizzardo256 explica:
Há no art. 406 o regramento restritamente à taxa na
falta de convenção, ou de taxa na convenção, ou na
proveniência da lei. Se manifestada a convenção, ou

RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 5 ed.


256

Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 519/520.

308
colocada a taxa, ou se não se originam da lei, revelou-
se omisso o Código. Nenhuma norma aportou
disciplinando a taxação. Daí manter-se vigente o
Decreto n.º 22.626, impondo a aplicação de seu art.
1º, porquanto insustentável defender em adotarem-
se taxas livres, mesmo que resultem em vantagem
extremamente desproporcional.

Agora, caso ocorra silêncio convencional ou legal, a lei


determina que os juros moratórios sejam aqueles que a fazenda
utiliza para a cobrança de suas dívidas em atraso. Durante um
pequeno período de tempo se debateu se os juros moratórios a
serem aplicados neste caso deveriam ser o da taxa
SELIC257(Sistema Especial de Liquidação e de Custódia, do
Banco Central do Brasil), ocorre que o debate doutrinário e
judicial concluiu que existe legislação própria a instituir o valor
destes juros. O Código Tributário Nacional (Lei n.º 5.172, de
1966) em seu art. 161, §1º, estipula que os juros de mora são
calculados à taxa de 1% (um por cento) ao mês.
Os tribunais e a doutrina tomaram o caminho da aplicação
deste dispositivo legal, veja a Súmula abaixo transcrita de lavra
do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:
Súmula nº 95. JUROS MORATÓRIOS - ART. 406 -
NOVO CÓDIGO CIVIL - CRITÉRIO DE
INCIDÊNCIA - CRITÉRIO DE FIXAÇÃO.
Os juros, de que trata o art. 406, do Código Civil de
2002, incidem desde sua vigência, e são aqueles
estabelecidos pelo art. 161, parágrafo 1º, do Código
Tributário Nacional. (DJERJ 16.1.2006)258

257
É a taxa apurada no Selic, obtida mediante o cálculo da taxa média ponderada e
ajustada das operações de financiamento por um dia, lastreadas em títulos públicos
federais e cursadas no referido sistema ou em câmaras de compensação e liquidação de
ativos, na forma de operações compromissadas. Esclarecemos que, neste caso, as
operações compromissadas são operações de venda de títulos com compromisso de
recompra assumido pelo vendedor, concomitante com compromisso de revenda
assumido pelo comprador, para liquidação no dia útil seguinte. Ressaltamos, ainda, que
estão aptas a realizar operações compromissadas, por um dia útil, fundamentalmente as
instituições financeiras habilitadas, tais como bancos, caixas econômicas, sociedades
corretoras de títulos e valores mobiliários e sociedades distribuidoras de títulos e valores
mobiliários. Fonte: http://www.bcb.gov.br/?SELICDESCRICAO, em 13/08/2012.
258
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

309
No campo doutrinário, veja o enunciado de origem nas
Jornadas de Direito Civil, promovidas pelo Centro de Estudos
Judiciários do Conselho da Justiça Federal, que confirma este
entendimento:
Nº 20.
Art. 406: a taxa de juros moratórios a que se refere o
art. 406 é a do art. 161, § 1º, do Código Tributário
Nacional, ou seja, um por cento ao mês. A utilização
da taxa SELIC como índice de apuração dos juros
legais não é juridicamente segura, porque impede o
prévio conhecimento dos juros; não é operacional,
porque seu uso será inviável sempre que se calcularem
somente juros ou somente correção monetária; é
incompatível com a regra do art. 591 do novo Código
Civil, que permite apenas a capitalização anual dos
juros, e pode ser incompatível com o art. 192, § 3º,
da Constituição Federal, se resultarem juros reais
superiores a doze por cento ao ano.259

A legislação, que trata da cobrança tributária, impõe o


valor de 1% para os juros de mora, assim esta é a taxa a ser
aplicada para as relações obrigacionais em que não foi
convencionado o valor dos juros moratórios.
O outro dispositivo legal que trata de juros afirma que
ainda “que se não alegue prejuízo, é obrigado o devedor aos juros
da mora que se contarão assim às dívidas em dinheiro, como às
prestações de outra natureza, uma vez que lhes esteja fixado o
valor pecuniário por sentença judicial, arbitramento, ou acordo
entre as partes” (art. 407, Código Civil). Como já dito não há
necessidade do credor alegar prejuízo decorrente do atraso para
exigir a correta reparação pelos juros de mora. Os juros têm papel
objetivo no adimplemento da prestação, seu fato gerador é o
mero atraso e uma vez ocorrido este deverá gerar o acréscimo
na prestação pactuada.

259
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

310
4. Dos honorários advocatícios
Alguns dos dispositivos apresentados tratam da
possibilidade de cobrança de honorários advocatícios, a forma
como o Código Civil trata esta parcela pode levar a incidência
de um erro, vez que os honorários são devidos ao advogado e
não ao credor.
O Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do
Brasil (Lei n.º 8.906, de 1994) institui:
Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura
aos inscritos na OAB o direito aos honorários
convencionados, aos fixados por arbitramento judicial
e aos de sucumbência.
[...]
Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por
arbitramento ou sucumbência, pertencem ao
advogado, tendo este direito autônomo para executar
a sentença nesta parte, podendo requerer que o
precatório, quando necessário, seja expedido em seu
favor.

Os honorários são os valores devidos ao advogado pela


prestação de seus serviços, estes têm caráter alimentar. Assim,
em uma relação obrigacional sujeita a acréscimos legais
decorrentes da mora (juros, atualização monetária, perdas e danos
e honorários advocatícios) a parcela de honorários é devida em
decorrência da interferência e atuação deste profissional e deve
ser paga ao causídico.
O credor não tem direito de exigir esta parcela, a pretexto
de futuros serviços a serem desempenhados por um advogado.
Caso o devedor, que incidiu em mora, negocie com o credor
antes da interferência de um advogado (para cobrança
administrativa ou judicial) não serão devidos os honorários.

5. Da cláusula penal
5.1 Noções gerais
A cláusula penal é a expressão da vontade das partes de
que caso ocorra inadimplemento o mesmo será punido
(pecuniariamente ou patrimonialmente) de forma a reparar o
311
prejuízo de um dos sujeitos envolvidos na obrigação. Diniz260
conceitua:
A cláusula penal (stipulatio poenae) vem a ser um pacto
acessório, pelo qual as próprias partes contratantes
estipulam, de antemão, pena pecuniária ou não, contra
a parte infringente da obrigação, como consequência
de sua inexecução completa culposa ou à de alguma
cláusula especial ou de seu retardamento (CC, art.
408), fixando, assim, o valor das perdas e danos, e
garantindo o exato cumprimento da obrigação
principal (CC, art. 409, 2ª parte)

A cláusula penal será a imposição feita na origem ou


durante a realização da obrigação, que estabelece perdas e danos
em caso de inadimplemento da obrigação, assim incorre “de
pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que,
culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em
mora” (art. 408). Veja que o caráter desta cláusula é duplo:
coercitivo e reparatório.
A coercibilidade existe por estabelecer a possibilidade do
aumento da prestação original, de forma que a punição teria um
caráter de impor o cumprimento da própria obrigação. Ao saber
desta, os sujeitos da relação evitariam o inadimplemento em
decorrência do acréscimo. E reparatório, pois tem o caráter de
ressarcir eventuais danos sofridos ou que pode sofrer a vítima
do inadimplemento, não sendo necessário, neste caso, que
efetivamente tenha ocorrido o dano, bastando o inadimplemento.

5.2 Aplicação na obrigação


A cláusula penal tem caráter acessório, vez que pode ser
“estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato
posterior” (art. 409, caput, Código Civil), e esta “pode referir-se
à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula
especial ou simplesmente à mora” (art. 409, in fine, Código

260
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2: Teoria geral das
obrigações. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p 454.

312
Civil)”, veja que existem três situações nas quais poderá se
pactuar a aplicação de cláusula penal por inadimplemento.
Ela pode ser imposta:
a) contra o inadimplemento total da obrigação, situações
em que há perda da prestação e a mesma não pode
mais ser entregue ao credor;
b) inadimplemento parcial, segundo o qual o contrato é
cumprido, mas apenas parte do objeto é
satisfatoriamente entregue, restando a ausência de parte
do que foi pactuado, por exemplo, a situação na qual é
feito um contrato de compra e venda para entrega de
10.000m² de área, mas o devedor só pode realizar a
efetiva entrega (transcrição em cartório) de 6.000m², e
c) o puro e simples atraso no pagamento.
Na primeira situação se estipula a cláusula penal no caso
de total inadimplemento da obrigação, nesta cabe ao credor exigir
o cumprimento da obrigação ou o pagamento da cláusula penal
(art. 410, Código Civil). A cláusula penal não é uma opção dada
ao devedor, essa tem como papel a imposição da necessidade
do devedor cumprir a obrigação caso não a cumpra sofrerá as
consequências. Não pode haver a cumulação de prestação
principal com a cláusula penal, o credor deverá optar entre a
prestação ou a reparação por meio da cláusula penal261.

261
98007696 - APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE
PRODUTO RURAL. ENTREGA DE COISA INCERTA. CLÁUSULA PENAL
COMPENSATÓRIA. EXCLUSÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 410 DO CÓDIGO
CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM A OBRIGAÇÃO
PRINCIPAL. PARTILHA DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS
ACERTADA, DIANTE DA SUCUMBÊNCIA DE AMBAS AS PARTES.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS POR EQÜIDADE COM FULCRO
NO ART. 20 § 3º DO CPC. RECURSO DESPROVIDO. Constata-se no título
extrajudicial exeqüendo, que a pena convencional foi ajustada para o caso de
inadimplência. Além disso, o credor não procedeu a opção entre o cumprimento
da obrigação principal ou da multa, mas sim exige pela via executiva o
adimplemento da prestação específica juntamente com a pena convencional,
sendo tal procedimento contrastante com o disposto no art. 410 do Código
Civil. A cláusula penal, constante na manifestação de vontade das partes, representa
uma sanção de 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor principal, ou seja, a exclusão
da referida cláusula foi importante na presente lide, diante do alto valor de sua incidência.
O art. 20, § 4º, do CPC, não determina que o valor seja arbitrado em referência ou
percentagem ao valor da causa, e sim consoante apreciação eqüitativa do juiz. (TA-PR;

313
Nas outras situações em que se pode aplicar a cláusula
penal, no caso de mora e em segurança especial de outra cláusula
determinada, o credor poderá exigir a satisfação da pena
cominada, juntamente com o desempenho da obrigação principal
(art. 411, Código Civil). Haverá opção do credor neste caso, ele
poderá exigir o cumprimento da obrigação em conjunto com a
cláusula penal262. A estipulação da cláusula penal tem dois papeis,
o primeiro, gerar o temor ao devedor que o descumprimento da
obrigação acarreta esta punição e o segundo o caráter reparatório,
por conta do não cumprimento da obrigação os danos que
porventura este inadimplemento acarretarem ao credor serão
cobertos por esta cláusula.

5.3 Limites de aplicação


A legislação impõe limites à aplicação da cláusula penal,
não podendo a onerosidade da pena convencionada impossibilitar
a própria vida e sustendo do devedor, assim o “valor da
cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da
obrigação principal” (art. 412, Código Civil). Não pode a cláusula
penal impor sanção superior ao valor da própria prestação
pactuada.
Não apenas o Código Civil impõe limites às penalidades
por descumprimento contratual, veja o Código de Defesa do
Consumidor (Lei n.º 8.078, de 1990), art. 52, § 1º, institui que a
multa por mora dever ser de no máximo 2% (dois por cento); O
Decreto nº 22.626, de 1933 (Lei de usura) em seu art. 9º; O
Decreto-lei nº 58, de 1937 (dispõe sobre loteamento e venda de

AC 0220476-4; Ac. 17592; São Miguel do Iguaçu; Oitava Câmara Cível; Rel. Des.
Dimas Ortêncio de Melo; Julg. 02/03/2004) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/
Maio 2012. (grifo nosso)
262
Veja a jurisprudência de origem trabalhista:
39018656 - AGRAVO DE PETIÇÃO. ACORDO JUDICIAL. ATRASO NA
QUITAÇÃO DAS PARCELAS. APLICAÇÃO DE CLÁUSULA PENAL. Embora
cumprido integralmente o acordo judicial, ficaram estipuladas datas específicas para
pagamento das parcelas avençadas. Além disso, a cláusula penal foi prevista para o caso
de mora, o que se verifica nos autos, sendo garantido ao credor sua satisfação, a teor do
art. 411 do Código Civil. (TRT 22ª R.; APet 0025900-77.2007.5.22.0106; Rel. Des.
Fausto Lustosa Neto; DEJTPI 30/11/2010) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/
Maio 2012.

314
terreno para pagamento em prestações), impõe cláusula penal
não superior a 10% (dez por cento), conforme art. 11, f. Estes
são alguns exemplos de limitações legais ao se impor a pena por
descumprimento, sempre se resguardando o equilíbrio contratual.

5.4 Da redução do valor da cláusula penal


Além de impor limites à cláusula penal, o Código Civil
proporciona, aos magistrados, a possibilidade de observar o
equilíbrio contratual e reduzir a punição em certos casos, quando
esta representar onerosidade excessiva, o texto legal diz:
Art. 413. A penalidade deve ser reduzida
eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal
tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da
penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se
em vista a natureza e a finalidade do negócio.

A legislação pátria busca evitar a carga excessiva de uma


cláusula penal ao devedor e possibilita aos magistrados o poder
de fiscalizar e rever estes valores. Os magistrados poderão estudar
a situação em que se impôs a cláusula penal e o próprio
cumprimento parcial da obrigação, buscando, assim, evitar
possíveis excessos. Gama263 expressa esta questão:
Tal norma é claro exemplo de aplicação acertada do
valor da eqüidade, devendo o magistrado analisar as
situações concretas para, se for o caso, reduzir o
quantum da cláusula penal. [...] Atualmente, inspirado
na eqüidade, o juiz deve dosar a diminuição da pena
convencional, levando especialmente em conta o
princípio da boa-fé objetiva, o que deve conduzi-lo a
avaliar as circunstâncias do negócio, entre outros
aspectos.

Este poder jurisdicional pode ser, inclusive, entendido


como um dever do magistrado em impor os limites à cláusula
penal, veja a jurisprudência:

Gama, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo, Atlas,
263

2008. Pag 398.

315
47045812 - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.
CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL
RESCISÃO CONTRATUAL ANTECIPADA.
CLÁSULA PENAL. REDUÇÃO EQUITATIVA.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 4º DA LEI Nº 8.245/
91 E DO ARTIGO 413 DO CÓDIGO CIVIL/02
(ANTIGO 924 CC/1916). 1. O artigo 4º da Lei nº
8.245/91 assim estabelece: “durante o prazo para
duração do contrato, não poderá o locador reaver o
imóvel alugado. O locatário, todavia, poderá devolvê-
lo, pagando a multa pactuada, segundo a proporção
prevista no art. 924 do Código Civil e, na sua falta, a
que for judicialmente estipulada”. 2. O artigo 924 do
Código Civil de 1916 preconizava: “quando cumprir
em parte a obrigação. Poderá o juiz reduzir
proporcionalmente a pena estipulada para o caso de
mora, ou de inadimplemento”. 3. O artigo 413 do
atual Código Civil dispõe: “a penalidade deve ser
reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação
principal tiver sido cumprida em parte, ou se o
montante da penalidade for manifestamente
excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade
do negócio”. 4. Desse modo, o novo Código Civil
altera a disciplina da cláusula penal, passando a ser
incisivo no sentido de que o magistrado tem o dever
e não a possibilidade de reduzir a penalidade
equitativamente, se a obrigação já tiver sido
cumprida em parte, ou se o montante da penalidade
for manifestamente excessivo. 5. Recurso conhecido
e improvido. Sentença confirmada. (TJ-CE; APL
21232-27.2003.8.06.0000/0; Quinta Câmara Cível;
Rel. Des. Francisco Barbosa Filho; DJCE 29/11/
2010)264 (sem grifo no original)

Interessante a interpretação dada ao dispositivo legal, vez


que seria não apenas uma possibilidade, mas um encargo imposto
aos magistrados. De qualquer forma o dispositivo visa manter o
equilíbrio das partes envolvidas na relação obrigacional, podendo

264
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

316
ser aplicado como forma de evitar a onerosidade excessiva
decorrente de uma cláusula penal.

5.5 Responsabilidade pela cláusula nas obrigações indivisíveis


e divisíveis
No estudo das obrigações indivisíveis se vislumbrou a
característica marcante da indivisibilidade nos casos de perda
da prestação, o art. 414 apenas ratifica o entendimento já
explicado nos art. 257 a 263, Código Civil.
Na obrigação indivisível, caso um dos devedores
provoque o inadimplemento, todos serão chamados a cumprir a
cláusula penal. A cobrança do valor integral da cláusula penal
será feita apenas contra o devedor que deu causa ao
inadimplemento, no entanto os demais podem ser demandados
pelo credor, a fim de arcarem com a porção ideal (quota) sobre o
valor da multa aplicada.
Exemplificando: Flávio, João e Paulo são devedores de
um quadro a Bernardo, no pacto há cláusula penal pela perda do
quadro, no valor de R$ 90.000,00, segundo esta cláusula a multa
é devida mesmo nos casos de força maior e caso fortuito. Ocorre
que Flávio se embriaga e joga o quadro em uma fogueira. Assim
Flávio deu causa à perda da prestação e o direito do credor exigir
a cláusula penal. O credor terá duas possibilidades, a primeira
exigir os R$ 90.000,00 apenas de quem deu causa ao
inadimplemento, no caso Flávio, a segunda é cobrar de cada
devedor o valor proporcional a sua quota de responsabilidade
dentro da obrigação o que acarretaria cobrar R$ 30.000,00 de
cada um dos devedores.
Importante lembrar que o parágrafo único, do art. 414,
Código Civil, ressalva que os não culpados terão direito a ação
regressiva contra aquele que deu causa à aplicação da pena, assim
no exemplo citado, os valores de R$ 30.000,00 pagos por João e
Paulo, ao credor da obrigação, poderão ser reembolsados a estes
dois, pois ambos cobrarão do verdadeiro culpado pelo
inadimplemento, no caso Flávio.
Já no trato das obrigações divisíveis, questão também já
317
explicitada, no caso de perda da prestação só incorre na pena o
devedor ou o herdeiro do devedor que a infringir, e
proporcionalmente à sua parte na obrigação (art. 415, Código
Civil). Logo o devedor que causou a aplicação da cláusula penal
apenas será punido até o valor proporcional de sua quota na
relação obrigacional.
Por exemplo: Johnnie, Jack e José são devedores de uma
caixa de vinho (com 12 garrafas) para Bernardo, no pacto há
cláusula penal pela perda das 12 garrafas, no valor de R$
9.000,00, segundo esta cláusula a multa é devida mesmo nos
casos de força maior e caso fortuito. Ocorre que José utiliza as
doze garrafas em uma festa. Sendo a culpa deste a cláusula penal
será aplicada contra na ordem de 1/3 das garrafas, sua quota,
assim ele deverá pagar a multa de R$ 3.000,00.

5.6 Desnecessidade de prejuízo e caráter compensatório


Por fim, a exigência da pena convencional poderá ser feita
sem que o credor alegue prejuízo, conforme entendimento do
art. 416, Código Civil, alhures mencionado. A doutrina, por meio
de vários autores, chama a atenção para as diferenças entre a
cláusula penal e alguns outros institutos do Direito Civil,
principalmente a multa moratória e as arras.
A cláusula penal visa reparar o inadimplemento do
contrato e possíveis prejuízos decorrentes deste inadimplemento,
está é sua principal característica, enquanto que a multa
moratória, conforme sua própria nomenclatura não está ligada a
reparação, mas a compensação pelo atraso do cumprimento da
obrigação. Veja a jurisprudência:
16665024 - ADMINISTRATIVO. AÇÃO
REVISIONAL. FIES. COMISSÃO DE
PERMANÊNCIA. TR COMO INDEXADOR.
AUSÊNCIA DE COBRANÇA.
INAPLICABILIDADE DO CDC.
CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. VEDAÇÃO.
REDUÇÃO DA TAXA. POSSIBILIDADE.
TABELA PRICE. APLICABILIDADE. PENA DE
MULTA MORATÓRIA E CONVENCIONAL.
318
MANUTENÇÃO DA ESTIPULAÇÃO. 1. Na
ausência de previsão contratual e inexistindo prova
da sua cobrança, não há falar em ( in) aplicabilidade
do TR como indexador, bem assim em ilegalidade da
cobrança de comissão de permanência, descabendo a
emissão de qualquer juízo acerca de sua legalidade
ou aplicação no presente contrato. 2. A hodierna
jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça está
assentada no sentido de que os contratos firmados no
âmbito do Programa de Financiamento Estudantil.
Fies. não se subsumem às regras encartadas no Código
de Defesa do Consumidor, dado que se está frente à
programa governamental, em benefício do discente,
sem conotação de serviço bancário, nos termos do
art. 3º, § 2º, daquele Codex. Precedentes. 3. Malgrado
se assegure constituir-se a Tabela Price em um sistema
para o cálculo do financiamento que não contempla a
utilização de juros compostos, ainda que mantida a
prestação constante, o fato é que as cláusulas
contratuais entabuladas atestam exatamente o
contrário, o que não encontra amparo nem na
legislação, tampouco na jurisprudência. 4. Na novel
sistemática introduzida pelo art. 543 - C do CPC,
determinou-se o afastamento completo de qualquer
capitalização, motivo pelo qual deve ser mantida a
aplicação desta forma de amortização, com o
banimento de eventual capitalização. 5. Capitalização
trimestral e mensal afastadas e taxa de juros reduzida,
a fim de coadunar-se com a novel legislação que rege
a matéria, quais sejam a Lei nº 12.202, de 14-01-
2010, e a Resolução nº 3.842, de 10 de março de
2010 do BACEN. 6. As cláusulas que determinam o
pagamento de multa moratória e convencional para
os casos de cobrança judicial ou extrajudicial do
crédito não estão inquinada de nulidade, visto não se
estar diante de cumulação indevida com outros
encargos contratualmente estipulados, contando com
finalidade diversa entre si, dada as naturezas de,
respectivamente, meio coercitivo de cobrança na
tentativa legítima de evitar o prolongamento do
inadimplemento e de cláusula penal, destinada a pré-
fixar as perdas e danos decorrentes da resolução da
obrigação. (TRF 04ª R.; AC 2008.71.00.005887-0;

319
RS; Terceira Turma; Rel. Juiz Fed. Nicolau Konkel
Junior; Julg. 25/01/2011; DEJF 09/02/2012; Pág.
256) 265 (sem grifo no original)

Logo, verifica-se a utilização destas cláusulas com


independência. Cada uma tem seu papel no mundo jurídico, não
podendo ser confundida a forma de utilização das mesmas,
quanto às arras, veja seu conceito e sua natureza, no próximo
item deste estudo.

265
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

320
XV
DAS ARRAS OU SINAL

As arras são uma garantia imposta à certas obrigações,


pela qual o credor tenta diminuir os riscos da conclusão do
negócio. É estranho tratar deste instituto na parte do Código
Civil destinada ao inadimplemento, no entanto a disposição das
arras neste momento é lógica, aqui se trata do inadimplemento
e de suas consequências. Em um contrato em que são instituídas
as arras, em caso de inadimplemento estas serão exigidas por
conta da inexecução contratual, assim o Código tratará deste
instituto, neste momento, por conta do mesmo ser intimamente
ligado ao inadimplemento contratual.
As arras serão pactuadas ao início da relação obrigacional,
de forma que um valor inicialmente entregue ao credor (sinal ou
entrada) servirá para garantir o cumprimento da relação
obrigacional. Este valor, inicialmente entregue, poderá ser perdido
a favor do credor, ou devolvido ao devedor, dependerá do tipo
de inexecução contratual. Melhor explicam, Farias e
Rosenvald266
Sorvendo a definição de SILVIO RODRIGUES, é
possível conceituar as arras, ou sinal, como a
importância em dinheiro ou a coisa dada por um
contratante ao outro, por ocasião da conclusão do
contrato, com o escopo de firmar a presunção de
acordo final e tornar obrigatório o ajuste; ou ainda,
excepcionalmente, com o propósito de assegurar, para
cada um dos contraentes, o direito de arrependimento.

Este instituto surge no momento em que nasce a relação


obrigacional, o bem dado em garantia aumenta a ligação entre

266
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 4ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 542.

321
as partes. A existência deste bem/dinheiro, dado em garantia,
demonstra o real interesse em que a obrigação seja cumprida,
bem como já proporciona a segurança de uma reparação, caso
ocorra inadimplemento.
Esta garantia de cumprimento da obrigação é classificada
pela doutrina de duas formas: confirmatória e penitenciais.

1. Das arras confirmatórias


As arras são um acessório a um contrato principal, que
visa garantir o cumprimento deste. A entrega do dinheiro ou
coisa visa demonstrar ao credor a seriedade da negociação, assim
as arras confirmatórias são aquelas que têm a finalidade de
demonstrar a intenção de que o negócio jurídico será respeitado
e cumprido, bem como podem servir de início de pagamento,
nos casos em que houver identidade de gênero entre as arras e o
objeto do contrato.
O acima exposto é corroborado pelo Código Civil que
diz: se “por ocasião da conclusão do contrato, uma parte der à
outra, a título de arras, dinheiro ou outro bem móvel, deverão as
arras, em caso de execução, ser restituídas ou computadas na
prestação devida, se do mesmo gênero da principal” (art. 417),
logo as arras servem de garantia, mas poderão ser computadas
na própria prestação.
As arras, apesar de garantia, têm uso determinado pela lei
e o contrato. Melhor explicando, um contrato de compra e venda
em que se apresenta em garantia uma caução bancária no valor de
metade do imóvel (o valor do negócio foi de R$ 1.000.000,00).
Neste tipo de garantia o credor não tem acesso ao valor depositado
em banco, este apenas poderá ser utilizado em caso de
inadimplemento contratual, este tipo de garantia possibilita
segurança ao credor, no entanto ele não tem acesso ao valor, bem
como o devedor mobiliza muito capital para obter o bem.
Agora, se no mesmo contrato foi pactuada a entrega de
arras no valor de R$ 200.000,00, este valor é dado na forma de
sinal ao credor, o mesmo já pode utilizar o sinal como bem lhe
convir e o devedor poderá abater o valor dado inicialmente sobre
322
o saldo do total devido, como visto, este instituto é mais prático
e atinge mais objetivamente o interesse das partes267.
As arras foram apresentadas como garantia, que protege o
inadimplemento bem como mostra o interesse na execução do
contrato, a forma de utilização da mesma é bem simples, se “a
parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-
lo por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu
as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir
sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária
segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, juros e
honorários de advogado” (art. 418, Código Civil).
As arras tem seu caráter reparatório configurado conforme
a parte que não executou o contrato. Por exemplo, Paulo realiza
contrato de compra de uma casa de Luis, o contrato tem valor
de R$ 500.000,00, o valor acordado e entregue nesta foi de R$
100.000,00, a título de arras. Não se realizando o contrato duas
serão as hipóteses quanto às arras, na primeira o devedor (Paulo)
não cumpre o acordado, pois não paga o restante, assim o valor
inicialmente dado será todo perdido em favor do Credor (Luis).

267
62080687 - AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE
ARRAS. LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. PAGAMENTO DE ARRAS. NÃO
CONCRETIZAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO. Legitimidade do 1º Réu, ora
apelante, para figurar no pólo passivo da demanda. A 2. Ré evidentemente agiu em
nome e por conta do locador, recebendo importância a título de arras com o fito de
assegurar o cumprimento da obrigação. O apelante é o proprietário do imóvel. A
corretora de imóveis apenas intermedeia as partes envolvidas no negócio jurídico, pelo
que não há que se falar em carência de ação nem em ilegitimidade passiva do apelante.
O sinal ou arras prestado em contrato de locação não residencial, com pagamento de
“luvas”, tem por fim assegurar às partes contratantes a realização do acordo final,
tornando, assim, obrigatório o contrato. O negócio jurídico não se concretizou em
virtude da exigência de nova fiança pelo apelante. Fiadores apresentados que não
possuem bens suficientes para cumprir a obrigação. O credor não pode ser obrigado a
aceitar fiador. Art. 825 do CC/02. Ambas as partes concorreram para o desfazimento
do negócio jurídico. A consequência é a Resolução da obrigação voltando as partes ao
status quo ante. A função principal das arras é a de princípio de pagamento (art. 417 do
CC/02), logo devem as mesmas serem restituídas, por não ter sido concretizado o
contrato, sob pena de enriquecimento sem causa do locador. Devolução simples.
Sucumbência recíproca. Art. 21, caput, do CPC. Provimento parcial do recurso.
Precedente citado: TJRJ AC 2006.001.61271, rel. Des. Antônio saldanha palheiro,
julgado em 28/02/06 e AC 255.001.23030, Rel. Des. Odete knaack de Souza, julgado
em 20/10/05. (TJ-RJ; AC 2007.001.23049; Capital; Relª Desª Helena Candida Lisboa
Gaede; Julg. 26/06/2007; DORJ 21/02/2008; Pág. 304) Fonte: DVD Magister. Ed.
43. Abril/Maio 2012.

323
Na segunda possibilidade Luis não entrega a casa, assim o negócio
será desfeito e ele deverá devolver em dobro o que recebeu a
título de arras, no exemplo R$ 200.000,00.

2. Das arras penitenciais


As partes quando perfazem um contrato tem a intenção
de vê-lo executado ou realizado, normalmente os contratos são
feitos em caráter irrevogável, assim as arras anteriormente
explicadas trabalham com esta hipótese, as partes apenas
demonstram seu interesse na realização do negócio. No entanto,
podem ocorrer situações em que as partes preferem realizar o
negócio jurídico com o direito de arrepender-se do mesmo,
podendo desfazê-lo, esta é a chamada cláusula de arrependimento.
As partes antecipam possibilidades, dificuldades ou
maiores lucros em outros negócios, por conta disto estipulam o
direito de arrepender-se do negócio e desfazer o mesmo. Por
exemplo, uma grande empresa de Pesca resolve comprar um
imóvel no litoral do Rio Grande do Norte, mas sofre problemas
com a exportação de alguns produtos para os EUA. Pensando
que pode sofrer dificuldades futuras, a empresa impõe no contrato
de compra e venda o direito de se arrepender do negócio e
desfazer a compra. Logo o vendedor sabe do risco que assumiu
e há uma possibilidade do negócio ser desfeito.
As arras penitenciais serão aquelas em que a parte
devedora do contrato entrega o sinal, mas sabe do direito de
arrependimento disponível tanto a ele quanto ao credor, sendo
estipulado no contrato as arras ou sinal terão função unicamente
indenizatória (art. 420, Código Civil)268. Neste tipo de arras, a
indenização por eventuais prejuízos com a inexecução contratual

268
62064781 - PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ARRAS.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO. INADIMPLEMENTO DOS VENDEDORES. 1. Se
no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as
arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. 2. Neste caso, quem as deu perdê
-las-á em benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente.
3. Aplicação do artigo 420 do Código Civil. 4. Desprovimento do recurso. (TJ-RJ; AC
2006.001.40557; Oitava Câmara Cível; Relª Desª Leticia de Faria Sardas; Julg. 09/
01/2007) Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

324
ficará restrita ao valor delas. Apenas lembrando, a forma da perda
das arras será a mesma estabelecida nas arras confirmatórias,
quem entregou o sinal e deu causa a inexecução as perde, quem
as recebeu e deu causa a inexecução as restitui em dobro.
Muito bem explica a situação das arras penitenciais a
súmula abaixo transcrita, redigida pelo Egrégio Supremo Tribunal
Federal:
Súmula nº 412. No compromisso de compra e venda
com cláusula de arrependimento, a devolução do
sinal, por quem o deu, ou a sua restituição em dobro,
por quem o recebeu, exclui indenização maior a título
de perdas e danos, salvo os juros moratórios e os
encargos do processo.

3. Do pedido de complementação
Demonstrada a forma de utilização das arras, verifica-se
que as mesmas devem reparar o prejuízo decorrente da extinção
contratual, observando que as penitenciais, por seu caráter
indenizatório, já cumprem inclusive o papel de perdas e danos.
No entanto as arras confirmatórias podem clamar por uma
reparação maior, neste tipo de arras a vítima da inexecução não
aguardava este acontecimento, logo pode ocorrer que só os
valores das arras sejam insuficientes para reparar os prejuízos.
Segundo o Código Civil, a “parte inocente pode pedir
indenização suplementar, se provar maior prejuízo, valendo as
arras como taxa mínima. Pode, também, a parte inocente exigir
a execução do contrato, com as perdas e danos, valendo as arras
como o mínimo da indenização” (art. 419), a legislação civil
possibilita que a parte que não deu causa a extinção do contrato
requeira complementação do valor devido, desde que consiga
demonstrar que o prejuízo causado é maior do que as arras
suportam. Veja este exemplo jurisprudencial:
48420546 - PROCESSO CIVIL. DEVOLUÇÃO DE
ARRAS. DANOS MORAIS E MATERIAIS.
PROVA. ÔNUS. AUTOR. NÃO OCORRÊNCIA
CERCEAMENTO DE DEFESA.

325
INOCORRENCIA. Nos termos do artigo 418 do
Código Civil de 2002, “Se a parte que deu as arras
não executar o contrato, poderá a outra tê-lo por
desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem
recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato
por desfeito, e exigir sua devolução mais o
equivalente, com atualização monetária, segundo
índices oficiais regularmente estabelecidos, juros e
honorários de advogado”. Se os documentos
colacionados aos autos são suficientes para a
formação do convencimento do julgador e o
conseqüente deslinde do litígio, não há que se falar
em cerceamento de defesa. O magistrado é o
destinatário da instrução probatória e cabe a ele
aferir a necessidade de outros elementos para julgar.
Nos termos do artigo 333, inciso I, do Código de
Processo Civil, é do autor o ônus de provar o fato
constitutivo de seu direito, trazendo ao processo
elementos convincentes sobre suas alegações, sob
pena de improcedência do pedido formulado nos
autos da ação. Para que haja o pagamento da
indenização suplementar disposta no artigo 419
do Código Civil deve a parte provar que a
indenização mínima do artigo 418 do Código Civil,
baseada no valor das arras, foi insuficiente para
reparar o dano gerado em decorrência do
desfazimento do negócio jurídico. A caracterização
dos danos morais demanda a comprovação de uma
situação tal que abale a honra ou ocasione abalo
psicológico considerável no indivíduo. Dessa forma,
meros aborrecimentos resultantes do
inadimplemento contratual, sem repercussões sobre
a honra da parte, não caracterizam danos morais. A
simples inexecução de contrato de compra e venda
de imóvel não caracteriza abalo psicológico a
justificar o pagamento de reparação por danos
morais. Recurso do autor conhecido e parcialmente
provido. Recurso do réu não provido. (TJ-DF; Rec
2009.01.1.021491-7; Ac. 579.378; Sexta Turma
Cível; Relª Desª Ana Maria Duarte Amarante Brito;
DJDFTE 20/04/2012; Pág. 228)269 (grifo nosso)

269
Fonte: DVD Magister. Ed. 43. Abril/Maio 2012.

326
Não é só uma questão de dizer que foi pouco, há a
necessidade da parte comprovar que o dano atingiu patamares
superiores ao que teria por base as arras, bem como deve haver o
cuidado de que qualquer indenização suplementar sofra a
diminuição do valor das arras. Esta situação demonstra a
possibilidade de pedido judicial de indenização suplementar, mas
no próprio contrato que institui as arras, as partes podem instituir
cláusula abraçando a ideia de que os prejuízos superiores ao valor
das arras podem ser indenizados.

327
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FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito das


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GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo


curso de direito civil: obrigações. 13. ed. Rev. Atual. e Ampl. São
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