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BASES NEUROBIOLÓGICAS DA

APRENDIZAGEM
SUMÁRIO

NOSSA HISTÓRIA ......................................................................................................... 3

APRENDIZAGEM, EDUCAÇÃO INCLUSIVA E NEUROCIÊNCIA ......................... 4

REVENDO CONCEITOS IMPORTANTES ................................................................... 4

MATURAÇÃO NERVOSA ............................................................................................ 6

NEUROPSICOLOGIA INFANTIL ................................................................................. 9

NEUROPSICOLOGIA DA MEMÓRIA HUMANA..................................................... 11

AMNÉSIA DO LOBO TEMPORAL MEDIAL ............................................................ 12

SÍNDROME AMNÉSICA, AMNÉSIA GLOBAL OU AMNÉSIA ORGÂNICA ........ 13

A ESTRUTURA CRÍTICA: O HIPOCAMPO? ............................................................ 15

AMNÉSIA DIENCEFÁLICA ........................................................................................ 16

AMNÉSIA DO LOBO TEMPORAL E AMNÉSIA DIENCEFÁLICA: UMA ÚNICA


ENTIDADE? .................................................................................................................. 18

QUANTOS TIPOS DE MEMÓRIA EXISTEM? .......................................................... 19

ESTRUTURAS CEREBRAIS ENVOLVIDAS COM MEMÓRIA IMPLÍCITA ......... 22

PERSPECTIVAS ........................................................................................................... 24

EDUCAÇÃO, INCLUSIVA E LEGISLAÇÃO ............................................................. 24

O DESPREPARO PARA PRÁTICA INCLUSIVA ...................................................... 26

PRÁTICAS INCLUSIVAS NAS ESCOLAS ................................................................ 29

A REDEFINIÇÃO DO OLHAR SOBRE A EDUCAÇÃO ESPECIAL ....................... 30

O QUE A ESCOLA PODE FAZER PARA DAR RESPOSTAS ÀS NECESSIDADES


........................................................................................................................................ 32

A INTEGRAÇÃO DE ALUNOS NEE (NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS)


NAS ESCOLAS REGULARES ..................................................................................... 33

REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 40

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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APRENDIZAGEM, EDUCAÇÃO INCLUSIVA E NEUROCIÊNCIA

REVENDO CONCEITOS IMPORTANTES

Este texto tem o intuito de discutir a aprendizagem, por meio de um estudo das
funções neurais no processamento das informações. Com isso, pretende-se abordar a
aprendizagem sob a óptica neuropsicológica. Não é intenção discutir especificamente os
distúrbios da aprendizagem, porém, é inevitável não efetuar tais correlações.
Para melhor compreender a aprendizagem, sob o ponto de vista da maturação
nervosa, é necessário saber como o comportamento acontece, a fim de investigar os
processos neurais de sua mudança.
A neuropsicologia é a ciência que tem por objeto o estudo das relações entre as
funções do sistema nervoso e o comportamento humano1.
A neuropsicologia pretende inter-relacionar os conhecimentos da psicologia
cognitiva com as neurociências, desvendar a fisiopatologia do transtorno e, sobre esta
base, encarar racionalmente a estratégia de tratamento2.
Entende-se como neuropsicologia o estudo dos distúrbios das funções superiores
produzidos por alterações cerebrais, investigando, especificamente, os distúrbios dos
comportamentos adquiridos, pelos quais cada homem mantém relações adaptadas com o
meio. Somente há pouco mais de cem anos é que se passou a conhecer o funcionamento
ao nível do córtex cerebral, por meio do estudo das lesões espontâneas localizadas e
ressecções parciais do cérebro, que permitiram demonstrar que as diversas partes
hemisféricas não possuem a mesma função e que existe uma organização cerebral
semelhante em todos os indivíduos3.
A neuropsicologia entende a participação do cérebro como um todo, no qual as
áreas são interdependentes e inter-relacionadas, funcionando comparativamente a uma
orquestra, que depende da integração de seus componentes para realizar um concerto.
Isso se denomina sistema funcional. Dessa maneira, sabe-se que, a partir do conhecimento
do desenvolvimento e funcionamento normal do cérebro, pode-se compreender alterações
cerebrais, como no caso de disfunções cognitivas e do comportamento resultante de
lesões, doenças ou desenvolvimento anormal do cérebro4.

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É através da neuropsicologia que podemos compreender os processos mnêmicos,
perceptivos, de aprendizado e de solução de problemas, dentre outras atividades
cognitivas5.
Quando falamos de aprendizagem estamos nos referindo a um processo global de
crescimento, pois toda aprendizagem desencadeia, em algum sentido, crescimento
individual ou grupal6.
Às vezes, os termos aprendizagem e conhecimento são utilizados como
sinônimos, porém, é por meio do processo de aprendizagem que se adquire conhecimento,
no entanto, o conhecimento resultante do processo não pode ser confundido com
aprendizagem. Em alguns manuais de psicologia da aprendizagem, a aprendizagem é
definida como "uma mudança de comportamento resultante de prática ou experiência
anterior"7. Já, para outros autores, a aprendizagem é a mudança de comportamento
viabilizada pela plasticidade dos processos neurais cognitivos8.
A aprendizagem é um processo contínuo, que opera sobre todos os dados que
alcançam um umbral de significação, dependendo, essencialmente, da memória e da
atenção. A capacidade de especialização cerebral em armazenar dados ('engramas') para
a sua utilização posterior permite, mediante a memória, codificar e decodificar
informação; existem vários tipos de memória (sensorial, curto prazo ou de trabalho, e
longo prazo) que podem trabalhar, não só sequencialmente, mas também em paralelo,
dependente basicamente da plasticidade sináptica. Atenção permite focalizar atividades
conscientes dependentes de sistemas e subsistemas anátomo-funcionais, que trabalham
como redes em paralelo, permitindo uma atuação simultânea e interativa nas tarefas
cognitivas9.
Os transtornos de aprendizagem representam a consequência de um transtorno na
organização funcional do sistema nervoso central, em geral de caráter leve, mas com
consequências de considerável importância para o futuro social da criança, já que
perturbam a conduta pedagógica esperada de acordo com sua inteligência normal. Desde
o ponto de vista etiopatogênico, estes transtornos se inserem dentro das alterações
funcionais (disfunções), porém sua base é evidentemente orgânica9.
Dificuldades, transtornos, distúrbios e problemas de aprendizagem são expressões
muito usadas para se referir às alterações que muitas crianças apresentam na aquisição de
conhecimentos, de habilidades motoras e psicomotoras, no desenvolvimento afetivo e
outras10.

5
Há alunos com dificuldades para aprender, cuja afecção mais evidente é a
deficiência de aprendizagem, apesar de adequadas inteligência, visão, audição,
capacidade motora e equilíbrio emocional. Estudos sobre a neuropsicologia da
aprendizagem demonstram que, nesse grupo, a generalizada integridade orgânica convive
com a deficiência na aprendizagem. Esta pode se manifestar como dificuldades motoras
ou psicomotoras, de atenção, memorização, compreensão, desinteresse, escassa
participação e problemas de comportamento10.

MATURAÇÃO NERVOSA

A noção de maturação nervosa é uma das mais fundamentais para se explicar o


processo de aprendizagem11. Psicólogos acreditam que os comportamentos não podem
ser externados até que seu mecanismo neural tenha se desenvolvido12.
A aprendizagem infantil, no que tange ao processo escolar em geral, está
intimamente relacionada ao desenvolvimento da criança, às figuras representativas desta
aprendizagem (escola, professores), ambiente de aprendizagem formal, condições
orgânicas, condições emocionais e estrutura familiar. Qualquer intercorrência em um ou
mais destes fatores pode influenciar, direta ou indiretamente, o processo de aquisição da
aprendizagem6.
Um dos aspectos fundamentais envolvidos com a aprendizagem é a valorização
dos processos neurais, além do fato de diferentes formas de aprendizagem envolverem
não só circuitos neurais diferentes, mas diversos mecanismos fundamentais, que devem
ser ressaltados13.
O cérebro humano é um sistema complexo que estabelece relações com o mundo
que o rodeia por meio de fatores significativos como: a especificidade das vias neuronais,
que da periferia levam ao córtex informações provenientes do mundo exterior; e, a
especificidade dos neurônios, que permitem determinar áreas motoras, sensoriais,
auditivas, ópticas, olfativas, etc, estabelecendo inter-relações funcionais exatas e ricas
que são de extrema importância para o aprendizado13.
O processo de aprendizagem exige um certo nível de ativação e atenção, de
vigilância e seleção das informações. A ativação, por meio da vigilância, conecta-se com
a atenção no sentido da capacidade de focalização da atividade. São elementos
fundamentais de toda atividade neuropsicológica, essenciais para manter as atividades
cognitivas, inibindo o efeito de muitos neurônios que não interessam à situação. Sem uma
organização cerebral integrada, intra e interneurossensorial, não é possível uma

6
aprendizagem normal. Os processos de codificação e decodificação são de extrema
importância, quando se abordam problemas de aprendizagem. A linguagem, oral e escrita,
receptiva ou expressiva, faz parte com toda sua especificidade, do sistema cognitivo.
Distinguindo a dimensão de percepção e gnose, como sendo o reconhecimento modal
específico por meio de analisadores visuais, auditivos e somestésicos do processamento
conceptual e ação, como pensamento e resposta (verbal ou não-verbal), a linguagem é um
dos componentes fundamentais na organização cognitiva e nos processos complexos da
aprendizagem. Os componentes cognitivos e as regiões cerebrais, que os processam,
constituem um todo interconexo3.
A aprendizagem resulta da recepção e da troca de informações entre o meio
ambiente e os diferentes centros nervosos. Desta forma, a aprendizagem inicia com um
estímulo de natureza físico-química advindo do ambiente que é transformado em impulso
nervoso pelos órgãos dos sentidos11.
Prestar atenção, compreender, aceitar, reter, transferir e agir são alguns dos
componentes principais da aprendizagem. Assim, a informação captada é submetida a
contínuo processamento e elaboração, que funciona em níveis cada vez mais complexos
e profundos, desde a extração das características sensoriais, a interpretação do significado
até, finalmente, a emissão da resposta13.
As áreas de projeção estão relacionadas com a sensibilidade, a motricidade, e as
áreas de associação e de sobreposição estão relacionadas com funções psíquicas
complexas: gnosias, linguagem, esquema corporal, memória, emoções, etc14.
O aprender implica em certas integridades básicas, que devem estar presentes,
quando oportunidades são oferecidas para a realização da aprendizagem. Essas
integridades são caracterizadas em três níveis:
• Funções psicodinâmicas - à medida que o organismo internaliza o observado ou
o experienciado, começa a assimilar hierarquicamente, pelos processos psíquicos,
devendo, portanto, existir controle e integridade psicoemocional para que ocorra
a aprendizagem;
• Funções do sistema nervoso periférico - responsáveis pelos receptores sensoriais,
que são canais principais para aprendizagem simbólica. Uma subcarga sensorial
implicaria em privação do cérebro de estimulação básica, para o crescimento e
amadurecimento dos processos psicológicos;

7
• Funções do sistema nervoso central - responsável pelo armazenamento,
elaboração e processamento da informação, resultante da resposta apropriada do
organismo15.
Considerando a aprendizagem humana como processamento de informações,
veremos que os processos "centrais" são modificações e combinações que ocorrem nas
estruturas cognitivas. Na verdade, o aprendiz é concebido como um manipulador
inteligente e flexível, que busca a informação e trata de organizá-la, integralizá-la,
armazená-la e recuperá-la, quando necessário, de forma ativa e ajustada às estruturas
cognitivas de que dispõem internamente16.
O modelo neuropsicológico aplicado aos transtornos de aprendizagem assume que
estes constituem a expressão de uma disfunção cerebral específica, causada por fatores
genéticos ou ambientais que alteram o neurodesenvolvimento17.
A investigação neuropsicológica permite conhecer a estrutura interna dos
processos psicológicos e da conexão interna que os une. Ela também nos possibilita
realizar um exame pormenorizado das alterações que surgem nos casos de lesões
cerebrais locais, assim como as maneiras pelas quais os processos psicológicos são
alterados por essas lesões. Esse exame também se estende ao processo ensino-
aprendizagem em geral, pois nos permite estabelecer algumas relações entre as funções
psicológicas superiores (linguagem, atenção, memória, etc.) e a aprendizagem simbólica
(conceitos, escrita, leitura, etc.), ou seja, o modelo neuropsicológico das dificuldades da
aprendizagem se preocupa em reunir uma amostra de funções mentais superiores
envolvidas na aprendizagem simbólica, as quais estão, obviamente, correlacionadas com
a organização funcional do cérebro. Sem essa condição "sine qua non", a aprendizagem
não se processa normalmente e, neste caso, podemos nos deparar com uma disfunção ou
lesão cerebral1.
Muitos procedimentos de aprendizagem se apoiam precisamente em um marco de
referência que inclui a noção clássica de psicomotricidade, o conhecimento implícito que
o sujeito possui de seu próprio corpo, estático e em movimento, e sua relação com os
objetos externos. O desenvolvimento da somatognosia, normalmente, se realiza posterior
ao uso dos diversos componentes corporais: assim, por exemplo, uma criança de cinco
anos possui uma notável capacidade manipulativa, entretanto, suas gnosias digitais se
mostram bastante imaturas18.
Em geral, os testes que seguem a orientação neuropsicológica apresentam algumas
diferenças com os que se utilizam habitualmente em psicopedagogia. A neuropsicologia

8
explora funções pontuais da mente que correspondem, por sua vez, a áreas e circuitos
bem identificados do cérebro. Mas, na realidade, a diferença na abordagem que propõe a
neuropsicologia não se apoia tanto no tipo de teste utilizado, mas, sim, no reconhecimento
das síndromes e quadros clínicos caracterizados sobre as bases anátomo-funcionais do
cérebro19.
No processo ensino-aprendizagem, a avaliação global das funções psicológicas
deve levar em conta todo o mecanismo cerebral, nos seus níveis sucessivos de evolução.
Sendo assim, a avaliação neuropsicológica é a única forma possível de se avaliar uma
determinada função, posto que somente quando a mesma é colocada à prova (mediante
testes específicos), podemos observar sua integridade ou comprometimento20.
A exploração neuropsicológica na infância pode ser dividida em dois grandes
grupos:
• a investigação mais rigidamente conduzida sob a forma de uma bateria
sistematizada, levando-se em conta, na inclusão de cada item, os mecanismos
subjacentes à função examinada;
• o exame menos sistemático decorrente da re-leitura neuropsicológica do próprio
psicodiagnóstico clássico e de toda produção escolar dos dados da anamnese, bem
como da observação do comportamento21.

NEUROPSICOLOGIA INFANTIL

Para identificar precocemente alterações no desenvolvimento cognitivo e


comportamental, a neuropsicologia infantil se tornou um dos componentes essenciais das
consultas periódicas de saúde infantil, sendo necessária a utilização de instrumentos
adequados a esta finalidade (testes neuropsicológicos e escalas para a avaliação do
desenvolvimento). A importância desses instrumentos reside, principalmente, na
prevenção e detecção precoce de distúrbios do desenvolvimento/aprendizado, indicando
de forma minuciosa o ritmo e a qualidade do processo e possibilitando um "mapeamento"
qualitativo e quantitativo das áreas cerebrais e suas interligações (sistema funcional),
visando a intervenções terapêuticas precoces e precisas4.
A contribuição da avaliação neuropsicológica da criança é extensiva ao processo
de ensino-aprendizagem, pois nos permite estabelecer algumas relações entre as funções
corticais superiores, como a linguagem, a atenção e a memória, e a aprendizagem
simbólica (conceitos, escrita, leitura, etc.). O modelo neuropsicológico das dificuldades

9
da aprendizagem busca reunir uma amostra de funções mentais superiores envolvidas na
aprendizagem simbólica, as quais estão, obviamente, correlacionadas com a organização
funcional do cérebro. Sem essa condição, a aprendizagem não se processa normalmente4.
As disfunções cerebrais, bem como as lesões, interferem no processamento das
informações: recepção (ocasiona problemas perceptuais); integração (surgem
dificuldades na retenção-memória e elaboração); e expressão (surgirão distúrbios na
ordenação, sequencialização, planificação e execução), sendo essas informações
envolvidas pelo aprendizado5.
As funções psicológicas e o funcionamento cerebral são descritos, considerando
o cérebro como um sistema inter-relacionado a partir de três unidades funcionais:
• unidade para regular o tono, a vigília e os estados mentais (área de projeção que
abrange a formação reticular);
• unidade para receber, analisar e armazenar informações (área de projeção que
abrange parietal, occipital e temporal primários; área de associação que abrange
parietal, occipital e temporal secundários);
• unidade para programar, regular e verificar a atividade (área de sobreposição que
abrange as áreas pré-frontais e frontais)22.
Cada unidade funcional compreende, portanto, um conjunto de órgãos ou de áreas
corticais que, em termos interdependentes, constituem o grande sistema neuropsicológico
da aprendizagem humana23.
A maturação cognitiva e comportamental é consequente à estrutural e à fisiológica
e está se produz de maneira diferente, cronológica e qualitativamente, nas distintas
regiões cerebrais24.
De certa forma, a aprendizagem é fruto do desenvolvimento dessas unidades
funcionais que estão organizadas verticalmente e se estabelecem geneticamente da
primeira unidade (reflexos) à terceira unidade (intenções), passando pela segunda unidade
(experiências e ações multissensoriais). Assim, por exemplo, as aprendizagens
complexas, como a leitura, assentam sobre aprendizagens compostas, como a
discriminação e identificação perceptiva, que, por sua vez, decorrem de aprendizagens
simples, como a aquisição de postura bípede e das aquisições preensivas na primeira
idade1.
A leitura, um dos processos mais complexos da aprendizagem, compreende a
discriminação visual de símbolos gráficos (grafemas) por meio de um processo de
decodificação que se passa na segunda unidade, só possível com um processo de atenção

10
seletiva regulada pela primeira unidade. Posteriormente, e ainda na mesma unidade, há
que selecionar e identificar os equivalentes auditivos (fonemas) por meio de um processo
de análise e transdução, de síntese e comparação, a fim de edificar a busca da significação
(conjectura) e avaliar os níveis de compreensão latentes. A partir daqui, surgirá uma nova
operação de equivalência que compreende a codificação, ou seja, a rechamada dos
articulemas que são executados e verificados na área da Broca, isto é, na terceira unidade.
Dos motoneurônios superiores frontais, a linguagem interior se transformará em
linguagem expressiva, por meio da oralidade, ou seja, da produção de sons articulados. É
este o todo funcional que caracteriza a aprendizagem da leitura. É dentro desse conjunto
funcional que se pode verificar um distúrbio ou disfunção neuropsicológica que pode, por
consequência, redundar numa dificuldade de aprendizagem23.
No que se refere aos problemas de aprendizagem, tem sido assinalado que
reprovações escolares têm múltipla etiologia, justificando, portanto, múltiplo enfoque21.
A relevância da abordagem neuropsicológica da aprendizagem está no
reconhecimento dos quadros clínicos caracterizados sobre as bases anátomo-funcionais
do cérebro, e não no tipo de teste utilizado.
Ao fornecer subsídios para investigar a compreensão do funcionamento
intelectual da criança, a neuropsicologia pode instrumentar diferentes profissionais, tais
como médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos, promovendo uma
intervenção terapêutica mais eficiente.
Somente dessa forma é que as dificuldades de aprendizagens serão melhor
compreendidas e, principalmente, tratadas.

NEUROPSICOLOGIA DA MEMÓRIA HUMANA

O termo neuropsicologia refere-se, originalmente, a investigações de desordens


de percepção o, memória, linguagem, pensamento, emoção o e ação em pacientes
neurológicos (Shallice, 1988), ampliado para abarcar o resultado de numerosos estudos
complementares em animais de laboratório, como se depreende do uso que dele fazem
Squire e Butters (1984). No seu uso original ele designava o trabalho conjunto de
psicólogos, neurologistas e neurocirurgiões, e no seu uso mais generalizado -e este é o
aspecto fundamental que necessita ser destacado - ele continua a refletir o trabalho em
cooperação o de psicólogos, neurologistas, neurocirurgiões, neuroanatomistas,

11
neurofísiologistas e outros neurocientistas. É nossa crença que somente este trabalho
cooperativo pode fazer avançar o conhecimento a respeito do cérebro e do
comportamento. O que se segue é uma tentativa de resumo de resultados obtidos nas
últimas duas ou três décadas num campo particular da neuropsicologia, a neuropsicologia
da memória humana, que neste período conheceu um crescimento espetacular.

Amnésia do lobo temporal medial

A década de 50 foi um marco na história da neuropsicologia da memória. Em 1954


o neurocirurgião Scoville descreveu o caso do paciente H.M., por ele operado em 1953,
o qual começou a apresentar uma grave e inesperada deficiência de memória logo após a
ablacão bilateral do lobo temporal medial. Brenda Milner e colaboradores publicaram
vários trabalhos relatando os resultados obtidos em testes formais de memória e
inteligência executados neste paciente (Milner, Corkin & Teuber, 1968; Scoville &
Milner, 1957). Estes resultados confirmaram amplamente os relatos informais de seus
familiares, de médicos e de pesquisadores, os quais constataram que H.M. não conseguia
recordar nenhum evento pessoal ou público ocorrido após a cirurgia (amnésia
anterógrada), além de sempre subestimar a própria idade e não reconhecer amigos aos
quais havia sido apresentado após o ano de 1953.
Apesar deste profundo e persistente quadro amnésico, o paciente H.M. tinha uma
inteligência superior, era capaz de estabelecer diálogos normalmente, desde que não fosse
distraído, e tinha preservada sua memória para eventos remotos, sendo, porém, incapaz
de lembrar com acuidade eventos ocorridos até cerca de três anos antes da cirurgia
(amnésia retrógrada). Em testes de percepção o seu desempenho era normal, indicando
que o prejuízo observado não era devido à incapacidade de registrar novas informações
(Milner et al., 1968; Scoville & Milner, 1957). A memória de curto prazo de H.M. achava-
se preservada (Milner et al., 1968), assim como a sua capacidade de adquirir novas
habilidades motoras e cognitivas (Corkin, 1968). Além disso, ele também conseguia
aprender, e reter na memória por algum tempo, o trajeto de labirintos visuais e tácteis
muito simples (onde o número de pontos de escolha a serem lembrados não excedesse a
capacidade da memória de curto prazo), embora a aquisição o destas tarefas de labirinto
fosse extremamente lenta (Milner et al., 1968). Foi demonstrado também que H.M. era
capaz de se beneficiar do efeito de pré-ativação (Corkin, 1984), efeito no qual a
performance do indivíduo pode ser facilitada ou enviesada por informações apresentadas
previamente, sem que o sujeito se dê conta disso. O paradigma básico dos estudos de pré-

12
ativação (priming) é aquele imaginado por Warrington e Weiskrantz (1970), que consiste
em apresentar uma lista de palavras e subsequentemente testar os sujeitos através de dois
testes. Um dos testes é de reconhecimento, no qual a tarefa é identificar no meio de várias
palavras quais foram apresentadas anteriormente. O outro teste é de completamente de
palavras, no qual são dadas as letras iniciais para que se forme a palavra completa. H.M.,
assim como outros amnésicos, tipicamente completava as palavras de acordo com a lista
apresentada previamente, mas não conseguia reconhecer as palavras que constavam desta
lista. O paciente H.M. foi exaustivamente estudado ao longo dos anos e muito se sabe
sobre as características de sua amnésia, mas o seu não é, de modo algum, o único caso
descrito na literatura. Em 1958 Penfield e Milner descreveram vários casos de cirurgia de
ablação unilateral do lobo temporal medial, que incluía a amígdala e boa parte do
hipocampo. Destes pacientes, dois desenvolveram um quadro amnésico semelhante ao
observado em H.M.. Estudos post-mortem mostraram que o hipocampo do hemisfério
cerebral não operado se apresentava necrótico e provavelmente inoperante (Penfield &
Mathieson, 1974). Portanto, a síndrome amnésica só aparecia quando havia
comprometimento bilateral desta estrutura. Estes achados mostraram um claro
envolvimento do hipocampo no processamento de informações mnemônicas, o que já
havia sido sugerido em 1900 por Bechterew, que descreveu alterações neuropatológicas
no lobo temporal medial de uma pessoa que havia apresentado problema de memória
durante a sua vida (citado por Zola-Morgan, Squire & Amaral, 1986). Síndrome amnésica
semelhante pode ser observada em pacientes pós-encefalíticos, nos quais há lesões
extensas do lobo temporal medial, incluindo hipocampo, amígdala e uncus (Damasio,
Eslinger, Damasio, Van Hoesen & Cornell, 1985). O hipocampo também tem sido
responsabilizado pela amnésia que se manifesta após oclusão da artéria cerebral posterior
(Benson, Marsden & Meadows, 1974) ou após isquemia cerebral (Volpe & Hirst, 1983).

Síndrome amnésica, amnésia global ou amnésia orgânica

A síndrome amnésica é definida por algumas características positivas - das quais


a mais importante é uma severa amnésia anterógrada - concomitantes e ausência de outros
déficits cognitivos (linguagem, raciocínio, capacidade intelectual, habilidades sociais,
percepção, etc). Amnésia retrógrada pode aparecer, porém em graus variados e restrita
aos anos, meses ou dias que antecederam o agente amnésico. A memória para eventos
remotos se conserva intacta, todavia. Pacientes com amnésia do lobo temporal medial
apresentam capacidade preservada de aprender tarefas que envolvam apenas habilidades

13
motoras, perceptuais ou cognitivas (como as tarefas de perseguição o de um ponto
giratório, de traçado bimanual, e de escrever ou ler palavras invertidas por um espelho,
ou como solucionar o jogo da Torre de Hanói e congêneres), ou seja, que não exijam a
lembrança de eventos específicos. Um bom exemplo para ilustrar esta dissociação
apresentada por pacientes amnésicos encontra-se no experimento realizado por Cohen e
Squire (1980), no qual os sujeitos liam tríades de palavras invertidas como num espelho,
durante três dias. Com o treino, o tempo de leitura, tanto de sujeitos normais como de
amnésicos, caía igualmente, revelando que a habilidade de ler palavras invertidas estava
sendo bem aprendida. Esta habilidade persistiu por três meses, pelo menos. Porém, testes
de reconhecimento revelaram que os amnésicos se esqueciam muito mais rapidamente
das palavras específicas que foram apresentadas durante o treino. A esta dissociação o os
autores chamaram sugestivamente de " saber como" e " saber o quê".
O condicionamento clássico da resposta de piscar o olho é outro exemplo de
aprendizagem e retenção de longo prazo preservados em pacientes amnésicos
(Weiskrantz & Warrington, 1979).
A memória de curto prazo, avaliada através do desempenho em testes de
capacidade (span) de memória ou através do efeito de recência em testes de recordação
livre de palavras, também não é afetada nestes pacientes (Baddeley & Warrington, 1970;
Brooks & Baddeley, 1976).
A síndrome amnésica não se restringe a uma modalidade sensorial específica, nem
à qualidade do material apresentado (verbal, seja escrito ou falado, e não-verbal), sendo,
por isso mesmo, também chamada de amnésia global (Cohen, 1984; Rozin, 1976; Squire,
1982b). No entanto, lesões focais do lobo temporal direito (não-dominante) e do esquerdo
revelaram, respectivamente, que o hipocampo direito desempenha papel crítico na
memorização do material difícil de verbalizar (como rostos e sons não-familiares, padrões
visuais abstratos) e de material disposto espacialmente, e que o hipocampo esquerdo está
mais relacionado com a memória de material verbal (Jones-Gotman, 1986; Jones-Gotman
& Milner, 1978; Smith & Milner, 1981).
A síndrome amnésica ou amnésia global é também conhecida como amnésia
orgânica. Este termo refere-se ao fato da amnésia provir de uma alteração orgânica
resultante de cirurgia, ruptura de aneurismas, anóxia, tumores cerebrais, infecções, lesões
cerebrais por penetração, traumatismo craniano, etc.

14
A estrutura crítica: o hipocampo?

Desde o trabalho pioneiro de Scoville e Milner (1957) o hipocampo tem sido


considerado a estrutura crítica no desencadeamento da síndrome amnésica associada ao
lobo temporal medial, pois observa-se uma correlação entre o grau de prejuízo e a
magnitude do comprometimento do hipocampo. Alguns autores, no entanto,
questionaram a conclusão de que a ausência do hipocampo seria necessária e suficiente
para causar o quadro amnésico e lançaram algumas explicações alternativas. Horel (1978)
propôs que a estrutura crítica para as funções mnemônicas seria o pedúnculo temporal
(um sistema de fibras que conectam a amígdala e o córtex temporal a outras estruturas
subcorticais). Segundo o autor, esta região necessariamente seria atingida no
procedimento cirúrgico utilizado para remover o lobo temporal medial. Estudos com
primatas não-humanos comprovaram posteriormente que a lesão do pedúnculo temporal
não provoca prejuízo em testes de memória. Aparentemente este tipo de lesão leva a um
déficit de aprendizagem em tarefas onde se exige a discriminação entre padrões visuais
diferentes (Zola-Morgan & Squire, 1984; Zola-Morgan, Squire & Mishkin, 1982). Este
déficit provavelmente se deve a um problema no processamento de informações visuais
e não de memória propriamente (Zola-Morgan & Squire, 1984).
Mishkin (1978, 1982), por sua vez, não nega a importância do hipocampo, mas
sustenta que o extraordinário déficit de memória observado em pacientes como H.M. é
devido a lesões conjuntas de hipocampo e amígdala. Mishkin verificou, em macacos, que
a lesão bilateral conjunta de hipocampo e amígdala produz um prejuízo maior que lesões
bilaterais de qualquer uma destas duas estruturas feitas isoladamente. Macacos com este
tipo de lesão conjunta apresentavam prejuízos em tarefas nas quais pacientes amnésicos
também mostravam dificuldades (Squire, Zola-Morgan & Chen, 1988; Zola-Morgan &
Squire, 1985).
Zola-Morgan, Squire e Amaral (1989), entretanto, puseram em dúvida as
conclusões tiradas por Mishkin em relação à contribuição da amígdala na gênese da
síndrome amnésica. Segundo estes autores, lesões controladas em macacos, que
realmente só atinjam a amígdala, poupando o cortéx adjacente (conseguidas através de
técnicas estereotóxicas), não apenas não produzem efeito em várias tarefas de memória,
como também não potencializam os efeitos da lesão hipocampal. Eles sugeriram, então,
que o prejuízo observado por Mishkin deve-se ao fato de que as lesões produzidas por ele
atingiram, além da amígdala, áreas corticais adjacentes (córtex perirrinal, giro para-

15
hipocampal), e apontam uma provável contribuição destas áreas no prejuízo de memória.
E realmente a lesão conjunta bilateral do hipocampo e destas áreas corticais (poupando a
amígdala, porém) produziu um efeito deletério maior em testes de memória do que a lesão
apenas do hipocampo (Squire & Zola-Morgan, 1991).
Revendo as evidências disponíveis na literatura sobre casos de lesões na amígdala,
além de estudos de registro e estimulação desta estrutura em seres humanos, Sarter e
Markowitsch (1985) propuseram um papel mais restrito para a amígdala: ela seria
responsável pelos eventos mnemônicos que têm um significado emocional para o sujeito.
O caso do paciente R.B. foi o primeiro relatado no qual uma lesão restrita ao
hipocampo produziu amnésia anterógrada, sem sinais de outros déficits cognitivos ou de
amnésia retrógrada significativa. Este paciente ficou amnésico devido a um episódio
isquêmico, e após sua morte o exame histológico do cérebro mostrou que havia lesão
bilateral restrita ao campo CA1 do hipocampo (Zola-Morgan, Squire & Amaral, 1986).
É importante notar, entretanto, que o déficit observado no paciente R.B. não era tão severo
quanto o observado no paciente H.M.
Estes achados indicam que a formação hipocampal (entendida como o conjunto
que inclui o giro denteado, o corno de Amon, o subículo e o córtex entorrinal) e mais o
córtex perirrinal e para-hipocampal desempenham papel de fundamental importância na
memória, presumivelmente devido às conexões recíprocas entre estas estruturas e o
neocórtex associativo posterior. Em consonância com esta ideia está o relato de perda de
memória em primatas devida à desconexão entre o córtex intertemporal (área TE) e o
sistema límbico (Mishkin, 1982).

AMNÉSIA DIENCEFÁLICA

A síndrome descrita primeiramente por Korsakoff no século passado (citações em


Lhermitte & Signoret, 1972; Victor, Adams & Collins, 1971), é outra patologia que
apresenta a perda de memória como um de seus sinais mais marcantes. Esta síndrome é
causada por deficiência de tiamina, geralmente secundária a desnutrição associada com
alcoolismo crônico, com possível contribuição dos efeitos tóxicos do álcool per
se (Butters, 1985; Lishman, 1981; Victor et al., 1971). Em pacientes portadores desta
doença constatou-se, através de autópsia, que o lobo temporal medial se apresenta intacto.
A lesão cerebral centra-se principalmente em estruturas do diencéfalo, sendo que as mais
atingidas são o núcleo medial dorsal do tálamo e os corpos mamilares no hipotálamo
(Mair, Warrington & Weiskrantz, 1979; Victor et al., 1971).

16
Pacientes de Korsakoff apresentam amnésia global anterógrada persistente,
semelhante à encontrada em pacientes com lesão bilateral do lobo temporal medial
(Butters, 1985; Mair et al., 1979; Parkin, 1984). Amnésia retrógrada também é uma
característica marcante, sendo mais difícil para os pacientes se lembrarem de eventos que
ocorreram logo antes do início da doença do que de eventos mais remotos, como por
exemplo da infância (Butters, 1985; Shimamura & Squire, 1986). Testes formais de
amnésia retrógrada, como o teste de personalidades famosas de Albert, comprovaram a
existência deste gradiente de dificuldade (Albert, Butters & Levin, 1979). Além da
amnésia anterógrada e retrógrada, os pacientes com Korsakoff apresentam alguns outros
déficits cognitivos, principalmente em tarefas que envolvam resolução de problemas,
atribuídos geralmente a atrofia de regiões neocorticais (Butters, 1985). Assim como a
amnésia do lobo temporal, a amnésia diencefálica também é de natureza seletiva, pois
estes pacientes são capazes de se beneficiarem do efeito de pré-exposição (Shimamura,
1986) e de aprenderem habilidades percepto-motoras (Brooks & Baddeley, 1976), apesar
da severa amnésia anterógrada.
Não existe consenso na literatura a respeito do comprometimento da memória de
curto prazo na síndrome de Korsakoff. Baddeley e Warrington (1970) e Brooks e
Baddeley (1976) notaram que, em vários testes de memória de curto prazo, estes pacientes
não apresentaram alteração. Entre estes testes estava a tarefa de memória de curto prazo
de Brown-Peterson, na qual Baddeley e Warrington (1970) observaram um esquecimento
normal em seus pacientes amnésicos. Cermak, Butters e Good-glass (1971) e Butters,
Lewis, Cermak e Goodglass (1973) obtiveram em tarefa semelhante resultados opostos
ao de Baddeley e Warrington (1970). Butters e Cermak (1974) atribuíram este resultado
conflitante principalmente ao fato de que os outros autores utilizaram pacientes de
diversas etiologias (não apenas com a doença de Korsakoff), e também ao fato de que a
metodologia por eles empregada permitia que os pacientes tivessem um tempo para
repetir mentalmente a informação apresentada, facilitando, assim, a execução da tarefa.
Pacientes com lesões penetrantes confirmam o envolvimento de estruturas do
diencéfalo na memória. O paciente N.A. ficou amnésico após sofrer um acidente com um
florete em miniatura que penetrou em sua narina e atingiu estruturas do diencéfalo.
Depois do acidente, ele não conseguia relembrar a maioria dos eventos correntes pouco
tempo após eles terem acontecido (amnésia anterógrada), e nem de eventos que ocorreram
logo antes da lesão (amnésia retrógrada). Sua amnésia não era acompanhada de qualquer
outro déficit intelectual ou perceptual (Teuber, Milner & Vaughan, 1968). Inicialmente

17
achava-se que a lesão se restringia ao núcleo medial dorsal esquerdo do tálamo (Squire
& Moore, 1979), porém, dez anos após, Squire, Amaral, Zola-Morgan, Kritchevsky e
Press (1989) verificaram, através de exames com ressonância magnética nuclear, que
outras estruturas como os corpos mamilares, o trato mamilotalâmico esquerdo, entre
outras, também foram atingidas.
Outro paciente (B.J.) tornou-se amnésico após um acidente com um taco de bilhar
que, à semelhança de N.A., penetrou por sua narina atingindo o cérebro. Ressonância
magnética nuclear mostrou que a lesão atingiu principalmente os corpos mamilares,
permanecendo o tálamo intacto. A amnésia apresentada por este paciente, entretanto,
restringia-se a materiais verbais (Dusoir, Kapur, Byrnes, Mackinstry & Hoare, 1990).
Embora seja comum atribuir o prejuízo de memória observado em pacientes com
a doença de Korsakoff a lesões de estruturas como o núcleo medial dorsal do tálamo e/ou
corpos mamilares (Mair, Warrington & Weiskrantz, 1979; Victor, Adams & Collins,
1971), outros autores sugerem que, mais importante que a destruição das massas
nucleares mencionadas, seria a lesão do trato mamilotalâmico e da lâmina medular interna
do tálamo (Cramon, Hebel & Schuri, 1985; Graff-Radford, Tranel, Van Hoesen & Brant,
1990; Markowitsch, 1988). O trato mamilotalâmico conecta os corpos mamilares aos
núcleos do grupo anterior do tálamo. Pela lâmina medular interna trafegam fibras que
conectam o núcleo medial dorsal do tálamo ao córtex prefrontal, córtex cíngulado anterior
e amígdala. A dificuldade em se chegar a uma conclusão definitiva a respeito de qual
estrutura diencefálica seria crítica no desenvolvimento da síndrome amnésica reside no
fato de que a maioria das lesões observadas não se restringe a um determinado grupo de
fibras ou núcleos (Markowitsh, 1988).
Em resumo, do ponto de vista neuroanatômico, dois grandes tipos de amnésia
global estão amplamente documentados: a amnésia temporal e a amnésia diencefálica.
Controvérsias a respeito das estruturas envolvidas no primeiro caso parecem
satisfatoriamente resolvidas; na amnésia diencefálica ainda não.

Amnésia do lobo temporal e amnésia diencefálica: uma única entidade?

Dada a interconexão entre o hipocampo e os corpos mamilares através da fímbria-


fórnix, entre os corpos mamilares e núcleos do grupo anterior do tálamo através do trato
mamilotalâmico e entre a amígdala e o núcleo medial dorsal do tálamo, alguns
pesquisadores consideram que qualquer interrupção bilateral deste circuito provoca a

18
síndrome amnésica, que seria única em essência (Baddeley & Warrington, 1970;
Warrington & Weiskrantz, 1974; Weiskrantz, 1987).
A identidade entre a amnésia do lobo temporal medial e a amnésia diencefálica é
controversa, porém. Embora existam muitas semelhanças entre os dois quadros, algumas
diferenças também foram observadas. Por exemplo: ao contrário dos pacientes com lesão
de lobo temporal medial, pacientes com Korsakoff geralmente não percebem que têm
problemas de memória e confabulam; também a amnésia retrógrada apresentada por estes
últimos parece ser mais notável (Parkin, 1984). Diferença importante apontada por vários
autores (Lhermitte & Signoret, 1972; Parkin, 1984; Rozin, 1976; Squire, 1982a) é que
pacientes com a síndrome de Korsakoff freqüentemente apresentam sintomas que são
tópicos de danos ao lobo frontal. Estas diferenças, segundo Parkin (1984), sugerem que a
amnésia do lobo temporal e a amnésia diencefálica são entidades distintas. Advogando a
favor da identidade entre amnésia do lobo temporal e diencefálica, porém, Squire (1982a)
argumenta que os déficits cognitivos adicionais apresentados pelos pacientes com
Korsakoff não são essenciais para a caracterização da síndrome amnésica, mas,
influenciam a forma final do quadro apresentado. Em especial, este autor realça o
comprometimento do lobo frontal nestes pacientes. Alguns outros autores, porém,
acreditam na existência de mais uma diferença entre a amnésia temporal e a diencefálica,
diferença está que dificilmente poderia ser atribuída a outro déficit cognitivo que não ao
problema de memória. Mais especificamente estes dois tipos de amnésia difeririam
quanto à velocidade de esquecimento de materiais armazenados na memória de longo
prazo. A velocidade de esquecimento de pacientes com lesão de diencéfalo, como N.A. e
doentes de Korsakoff seria normal, enquanto que pacientes com lesão do lobo temporal
medial esqueceriam anormalmente rápido (Lhermitte & Signoret, 1972; Mayes &
Meudell, 1984; Parkin, 1982). Entretanto, em trabalho recente, Mckee e Squire (1992)
não observaram diferenças estatisticamente significativas nas curvas de esquecimento de
pacientes com lesão de lobo temporal medial e pacientes com lesão de diencéfalo.

Quantos tipos de memória existem?

Seja única ou múltipla em sua origem, a síndrome amnésica é de natureza seletiva,


pois, embora os pacientes amnésicos, tanto diencefálicos como temporais, não consigam
se lembrar da maioria dos eventos que experienciam no dia-a-dia, muitas funções de
aprendizagem e memória estão preservadas, como por exemplo, a capacidade de
adquirirem habilidades motoras, cognitivas e perceptuais e a capacidade de se

19
beneficiarem do efeito de pré-exposição. Este fato levanta a questão fundamental a
respeito da existência de diferentes sistemas de memória. Existiria pelo menos um
segundo sistema de memória, independente de estruturas como o lobo temporal medial e
o diencéfalo, através do qual seriam processadas aquelas funções preservadas. Vários
pesquisadores, de fato, têm argumentado a favor da existência de múltiplos sistemas de
memória (Cohen, 1984; Poulos & Wilkinson, 1984; Squire, 1986; Squire & Zola-Morgan,
1988;Tulving, 1983).
A noção de que a memória poderia ser dividida em componentes é antiga. Ainda
no século passado William James1 (citado por Waugh & Norman, 1965) definiu, por
introspecção, os conceitos de memória primária e memória secundária. A memória
primária se estenderia por um curto prazo de tempo e dela fariam parte eventos
pertencentes ao "presente psicológico" que após serem percebidos ainda não deixaram a
consciência. A memória secundária pertenceria ao "passado psicológico" e já esteve
ausente da consciência. Posteriormente estes conceitos evoluíram em memória de curto
prazo (ou memória imediata) e memória de longo prazo, respectivamente. Atualmente
existe alguma evidência experimental que permite diferenciar memória de curto prazo
(retenção de itens por apenas alguns segundos) de memória de longo prazo (retenção de
itens por intervalos maiores) (Baddeley & Warrington, 1970). A memória de curto prazo
tem capacidade limitada (máximo de sete a nove itens) e o material nela armazenado
apresenta uma taxa de esquecimento bem rápida (em torno de segundos). Apesar desta
rápida taxa de esquecimento, a informação pode ser mantida por mais tempo na memória
através de reverberação (rehearsal) (Atkinson & Shiffrin, 1971). Estudos
neuropsicológicos têm confirmado e estendido a noção de memória de curto prazo, sob a
rubrica de memória operacional (working memory) (Baddeley, 1986). Na síndrome
amnésica, aparentemente, a memória de curto prazo encontra-se preservada, embora
alguma discussão ainda exista com relação ao possível déficit deste tipo de memória
apresentado por pacientes com Korsakoff.
Além da distinção tradicionalmente feita entre memória de curto e longo prazo,
os estudos com pacientes amnésicos, relatados acima, levaram à distinção entre memória
declarativa e memória de procedimento, dissociadas tanto funcionalmente como
anatomicamente (Cohen, 1984; Squire, 1986).
A memória declarativa é a habilidade de armazenar e recordar ou reconhecer
conscientemente fatos e acontecimentos; a lembrança pode ser declarada, isto é, trazida à
mente verbalmente como uma proposição, ou não verbalmente como uma imagem (Saint-

20
Cyr, Taylor & Lang, 1988; Squire, 1986). Seria este tipo de memória que estaria afetada
em pacientes amnésicos.
A memória de procedimento é a capacidade de adquirir gradualmente uma
habilidade percepto-motora ou cognitiva através da exposição repetida a uma atividade
específica que segue regras constantes. Esta capacidade é implícita e independe da
consciência, só podendo ser aferida através do desempenho do paciente (Saint-Cyr et al.,
1988; Squire, 1986). Pacientes amnésicos teriam este tipo de memória preservada.
A aprendizagem de novas habilidades é um exemplo do que Schacter (1987a,
1987b) denomina memória implícita, isto é, conhecimento que para ser demonstrado não
requer referência explícita a um episódio particular. A memória implícita contrapõe-se à
memória explícita, que implica na recordação consciente de experiências vividas. O
termo memória implícita, por ser mais genérico que memória de procedimento, permite
acomodar melhor, nesta categoria, o efeito de pré-ativação que se apresenta intacto em
pacientes amnésicos e pode ser observado após uma única exposição ao estímulo. Cohen
(1984) considera a memória declarativa e a de procedimento mais ou menos como
sinônimos de memória explícita e memória implícita, respectivamente.
Para Mishkin e Petri (1984) o produto do sistema de memória de procedimento é
um hábito, e não uma memória propriamente dita, produto, esta última, do sistema
declarativo. Com esta distinção entre hábito e memória pretendem estes autores remeter
o sistema de aprendizagem de procedimento aos estudos clássicos do behaviorismo
(aprendizagem de estímulo-resposta). Lembremo-nos de que no sistema de Hull o
conceito de hábito ocupa posição central em sua teoria da aprendizagem (Hilgard, 1975).
Tulving (1983) propôs ainda uma outra distinção conceituai entre o que ele chama
de memória episódica e memória semântica. O termo memória episódica refere-se ao
armazenamento de informações pessoais que permite ao indivíduo se lembrar de eventos
dos quais participou no passado. A memória semântica capacita o indivíduo a adquirir
conhecimento factual do mundo, ou seja, conhecimento impessoal de fatos relevantes.
Estas diversas variantes de conceituação e principalmente de terminologia têm
gerado certa confusão na literatura. Uma tentativa de estabelecer uma taxonomia para a
memória, tentando acomodar várias destas divisões em um sistema coerente levou ao
seguinte quadro, modificado de Squire (1986):
A memória declarativa ou explícita incluiria as memórias episódica e semântica.
A memória de procedimento ou implícita incluiria habilidades (motoras, perceptuais e
cognitivas), efeito de pré-ativação, condicionamento clássico, habituação, sensitização e

21
tudo que foi aprendido mas que só pode ser aferido através do desempenho (Squire,
1986). Estes diversos tipos de memória pertenceriam à memória de longo prazo. Este
quadro, entretanto, não é universalmente aceito. Mishkin e Petri (1984), por exemplo,
consideram que o seu sistema de memória estaria relacionado com memória episódica ou
declarativa e utilizam os termos memória semântica e de procedimento como
pertencentes a um mesmo sistema: ao sistema de hábito. Parte pelo menos das
dificuldades deste sistema de classificação deriva da ambiguidade dos conceitos de
memória episódica e memória semântica.

ESTRUTURAS CEREBRAIS ENVOLVIDAS COM MEMÓRIA IMPLÍCITA

As estruturas cerebrais envolvidas na memória implícita certamente abarcam


regiões muito mais extensas do sistema nervoso e ainda não foram bem identificadas.
Além disso, o conceito de memória implícita engloba vários tipos de memória que,
embora satisfaçam todos os critérios de independência da consciência, são
dessemelhantes entre si em outros aspectos.
O envolvimento do corpo estriado na memória de procedimento foi sugerido por
Mishkin, Malamut e Bachevalier (1984). Segundo eles, o neoestriado, principalmente o
núcleo caudado, teria um papel importante no estabelecimento do que ele chama
de hábito. Por suas conexões anatômicas, o neoestriado seria uma estrutura apropriada
para promover ligação entre estímulos e ações, pois recebe projeções de várias áreas do
córtex, incluindo áreas sensoriais, e envia fibras a estruturas subcorticais que fazem parte
do sistema de controle dos movimentos (Mishkin & Appenzeller, 1987).

22
Algumas evidências diretas deste envolvimento já existem. Na tentativa de melhor
caracterizar demências de etiologias diversas, Martone, Butters e Payne (1984)
compararam o desempenho de pacientes portadores do mal de Huntington, de Korsakoff
e indivíduos normais no teste de leitura de palavras invertidas, no qual tríades de palavras
eram apresentadas de forma que parecessem projetadas em um espelho. O procedimento
foi determinado de forma que os indivíduos fossem submetidos a uma tarefa de
aprendizagem de habilidade perceptual (teste de memória de procedimento) e a uma
tarefa de reconhecimento de palavras já vistas (teste de memória declarativa). Na primeira
tarefa os experimentadores mediam o tempo que o indivíduo demorava para ler cada
tríade. Na segunda tarefa, os sujeitos deviam apontar, no meio de uma lista, as palavras
apresentadas anteriormente. Os resultados mostraram uma dupla dissociação no
desempenho de pacientes com Huntington e Korsakoff, ou seja, os pacientes com
Korsakoff tiveram um desempenho pobre na tarefa de reconhecimento mas aprenderam
tão eficientemente quanto indivíduos normais a tarefa de ler as palavras invertidas. O
desempenho dos indivíduos com Huntington foi inferior ao desempenho dos controles
normais nesta última tarefa. Na tarefa de reconhecimento, entretanto, seu desempenho foi
normal. O mal de Huntington é uma doença transmitida geneticamente que resulta em
uma atrofia progressiva dos gânglios da base. Os sintomas mais comuns são a presença
de movimentos coreiformes e de um processo de demenciação. Martone et al. (1984)
sugeriram então que pacientes cuja demência é resultado de atrofia nos gânglios da base,
têm problemas mais relacionados à aquisição de conhecimento procedimental.
Entretanto, a patologia apresentada por estes pacientes é complexa e os prejuízos
cognitivos não se restringem à memória de procedimento. Em verdade, estes pacientes
não apresentam desempenho normal em alguns testes de memória declarativa que
envolvem recordação livre, mas apresentam, se não desempenho normal, pelo menos
próximo ao normal, em tarefas de reconhecimento (Butters, 1985). É possível entretanto
que alguns prejuízos observados em pacientes com Huntington sejam devidos a alterações
corticais também presentes nestes indivíduos (Saint-Cyr, Taylor & Lang, 1988). Saint-
Cyr et al. (1988) encontraram em pacientes com a doença de Parkinson - portadores,
portanto, de disfunção dos gânglios basais - prejuízo seletivo numa tarefa cognitiva tida
como exemplo de aprendizagem de procedimento (torre de Hanoi simplificada), enquanto
que o desempenho em testes de memória declarativa permanecia intacto.
Segundo Squire (1986), o efeito de pré-ativação encontra-se reduzido em doentes
de Alzheimer, o que pode ser uma pista para envolver o córtex cerebral com este

23
fenômeno. Alguns outros estudos apontam para o córtex posterior como uma das
estruturas responsáveis pela pré-ativação, independentemente de regiões límbico-
diencefálicas essenciais para a memória declarativa (Cave & Squire, 1992).
O papel essencial do cerebelo no condicionamento clássico de respostas motoras
(piscar o olho) foi estabelecido claramente por Thompson e seus colaboradores,
trabalhando com coelhos (Thompson, 1986). Em seres humanos o cerebelo parece
desempenhar papel semelhante, pois uma lesão na circuitaria cerebelar de uma paciente
provocou um grande déficit na aquisição de condicionamento clássico da resposta de
piscar (Solomon, Stowe & Pendlbeury, 1989).

Perspectivas

Estudos neuropsicológicos têm conseguido fazer a identificação de estruturas e


conexões cerebrais importantes para a memória, ou mais precisamente, para as memórias,
pois a existência de múltiplos sistemas de memória vem sendo atestada por tais estudos.
Em que pese o grande progresso ocorrido na área, muito resta por descobrir e
muitos pontos polêmicos precisam ser esclarecidos, como a questão da identidade ou não
da amnésia do lobo temporal medial e da amnésia diencefálica.
Grande empenho está sendo colocado atualmente na identificação de estruturas
relacionadas ao processamento de informações dos tipos abarcados pelo conceito de
memória implícita.
O papel de cada estrutura, isto é, o que cada uma delas faz para tornar possível as
funções psicológicas abrangidas sob a rubrica geral de memória, continua quase
inteiramente um mistério. Outra questão pouco tocada ainda refere-se à s interações entre
as diversas estruturas envolvidas.

Educação, Inclusiva e Legislação

Constituição Federal, através do artigo 205, garante o direito à educação a todos


os indivíduos. Quando a constituição se refere ao termo “todos os indivíduos”, subtende-
se que não há distinção. No artigo 206 é ressaltada a igualdade de condições para acesso
e permanência na escola. Observa-se então que, a constituição garante a todos o direito
de a educação sem distinção de raça, sexo, cor, origem ou deficiência. Fica claro que não
é permitido nenhum tipo de discriminação ou impedimento da matrícula do indivíduo
com deficiência na rede regular de ensino. A Conferência Mundial em Educação Especial,
organizada pelo governo da Espanha na cidade de Salamanca, em cooperação com a

24
UNESCO, em 1994, ressalta que o direito de cada criança a educação é proclamado na
Declaração Universal de Direitos Humanos e foi fortemente reafirmado pela Declaração
Mundial Sobre Educação para Todos. Na Declaração de Salamanca ficou estabelecido
que:
Toda criança tem direito fundamental a educação, e deve ser dada a oportunidade
de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem” e “toda criança possui
características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagens que são únicas.
Qualquer pessoa portadora de deficiência tem o direito de expressar seus desejos com
relação à sua educação, tanto quanto estes possam ser realizados. Pais possuem o direito
inerente de serem consultados sobre a forma de educação mais apropriada às
necessidades, circunstâncias e aspirações de suas crianças. (MEC/SEESP, 2006:33)
A inclusão requer mais que integração, mas respeito à individualidade de cada um,
considerando as necessidades e desejos apresentados pelo indivíduo com deficiência e a
opinião da Família em relação ao sujeito incluído.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9.394/96),
o Atendimento Educacional Especializado, Assegurado no artigo 58,
§ 1º e § 2º, ressalta que: 7§ 1º. Haverá, quando necessário, serviço de apoio
especializado, na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela de Educação
Especial. § 2º. O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços
especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for
possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. (LDB 9.394/96).
O artigo da LDB assegura o serviço de apoio especializado, ou atendimento
educacional especializado, aos indivíduos com deficiência sempre que for necessário para
atender as necessidades de cada aluno. Quando não for possível a integração do aluno nas
classes comuns de ensino regular, poderá ocorrer o atendimento educacional através do
serviço de apoio especializado.
A lei Nº 10.845, de 5 de março de 2004, institui o programa de Complementação
ao Atendimento Educacional Especializado às pessoas com Deficiência e ressalta no
artigo 1º que:
Fica instituído, no âmbito do Fundo Nacional de desenvolvimento da Educação –
FND, programa de complementação ao Atendimento Educacional Especializado às
Pessoas Portadoras de deficiências – PAED, em cumprimento do disposto no inciso III
do artigo 208 da Constituição, com os seguintes objetivos:

25
I – garantir a universalização do atendimento especializado de educandos
portadores de deficiência cuja situação não permita a integração em classes comuns de
ensino regular;
II – garantir, progressivamente, a inserção dos educandos portadores de
deficiência nas classes comuns de ensino regular.” (MEC/SEESP, 2006: 190).
A lei citada destaca a necessidade de garantir às crianças com necessidades
especiais nas escolas inclusivas, apoio e suporte extra que assegurem uma educação
efetiva evitando-se o encaminhamento dessas crianças a escolas, classes ou seções
permanentes de Educação Especial, salvo exceções, quando há incapacidade do aluno
frequentar a classe regular de ensino.
Há estruturas de ação em Educação Especial, adotadas pela Conferência Mundial
em Educação Especial, que se compõe de aspectos que visam à implementação de
políticas, recomendações e ações governamentais que visão aspectos de melhoria para a
Educação Especial, dentre eles estão incluídos os serviços externos de apoio à Educação
Especial.
De acordo com a LDB (artigo 58), existe a possibilidade do Atendimento
Educacional Especializado, ocorrer fora do ambiente escolar, entretanto, o ensino regular
não deve ser substituído, e sim, apoiado através de intervenções que visem o aprendizado
e o desenvolvimento do aluno. A importância do apoio ou suporte ao professor que possui
em sala de aula um aluno com deficiência é percebida através da dificuldade que o
educador apresenta em alfabetizar esse aluno, visto que, normalmente as salas de aula do
ensino regular público, onde a inclusão ocorre de forma mais efetiva, normalmente
apresentam problemas de superlotação. Tal fato impossibilita o professor de desenvolver
com este aluno, um trabalho mais específico que atenda suas reais necessidades.
Para crianças com necessidades educacionais especiais uma rede contínua de
apoio deveria ser providenciada, com variação desde a ajuda mínima na classe regular até
programas adicionais de apoio à aprendizagem dentro da escola e expandindo, conforme
necessário, à provisão de assistência dada por professores especializados e pessoal de
apoio externo. (MEC/SEESP, 2006:335)

O DESPREPARO PARA PRÁTICA INCLUSIVA

O despreparo e o medo do desconhecido ainda pairam sobre as salas de aula frente


à inclusão. Incluir um aluno na escola regular vai muito além de permitir a frequência e

26
participação do mesmo nas aulas sem dá-lo condições para aprender. A inclusão requer
participação ativa no processo de ensino e aprendizagem, socialização e vivência. Para
que isto ocorra de forma efetiva é necessário que a escola se organize funcionalmente e
estruturalmente para receber este aluno e incluí-lo. O currículo deve ser adaptado às
necessidades dos alunos, promovendo oportunidades que se adéquem as habilidades e
interesses diferenciado na intenção de promover a inclusão de todos.
A Educação Especial deve fazer parte do cotidiano da escola, abrangendo a
educação básica e o ensino superior, na intenção de garantir aos alunos que necessitem
de apoio especializado e de intervenção pedagógica adequada, uma maior eficiência no
processo de ensino e aprendizagem, dentro do contexto no qual está inserido.
O movimento nacional para incluir todas as crianças na escola e o ideal de uma
escola para todos vêm dando novo rumo às expectativas educacionais para os alunos com
necessidades especiais.
Esses movimentos evidenciam grande impulso desde a década de 90 no que se
refere à colocação de alunos com deficiência na rede regular de ensino e têm avançado
aceleradamente em alguns países desenvolvidos, constatando-se que a inclusão bem-
sucedida desses educandos requer um sistema educacional diferente do atualmente
disponível. Implicam a inserção de todos, sem distinção de condições linguísticas,
sensoriais, cognitivas, físicas, emocionais, étnicas, socioeconômicas ou outras e requer
sistemas educacionais planejados e organizados que deem conta da diversidade dos
alunos e ofereçam respostas adequadas às suas características e necessidades.
A inclusão escolar constitui, portanto, uma proposta politicamente correta que
representa valores simbólicos importantes, condizentes com a igualdade de direitos e de
oportunidades educacionais para todos, em um ambiente educacional favorável. Impõe-
se como uma perspectiva a ser pesquisada e experimentada na realidade brasileira,
reconhecidamente ampla e diversificada.
Ao pensar a implementação imediata do modelo de educação inclusiva nos
sistemas educacionais de todo o país (nos estados e municípios), há que se contemplar
alguns de seus pressupostos. Que professor o modelo inclusivista prevê? O professor
especializado em todos os alunos, inclusive nos que apresentam deficiências?
O plano teórico-ideológico da escola inclusiva requer a superação dos obstáculos
impostos pelas limitações do sistema regular de ensino. Seu ideário defronta-se com
dificuldades operacionais e pragmáticas reais e presentes, como recursos humanos,
pedagógicos e físicos ainda não contemplados nesse Brasil afora, mesmo nos grandes

27
centros. Essas condições, a serem plenamente conquistadas em futuro remoto, supõe-se,
são exequíveis na atualidade, em condições restritamente específicas de programas-
modelos ou experimentais.
O que se afigura de maneira mais expressiva ao se pensar na viabilidade do
modelo de escola inclusiva para todo o país no momento, é a situação dos recursos
humanos, especificamente dos professores das classes regulares, que precisam ser
efetivamente capacitados para transformar sua prática educativa. A formação e a
capacitação docente impõem-se como meta principal a ser alcançada na concretização do
sistema educacional que inclua todos, verdadeiramente.
É indiscutível a dificuldade de efetuar mudanças, ainda mais quando implicam
novos desafios e inquestionáveis demandas socioculturais. O que se pretende, numa fase
de transição onde os avanços são inquietamente almejados, é o enfrentamento desses
desafios mantendo-se a continuidade entre as práticas passadas e as presentes,
vislumbrando o porvir; é procurar manter o equilíbrio cuidadoso entre o que existe e as
mudanças que se propõem.
Observe-se a legislação atual. Quando se preconiza, para o aluno com
necessidades especiais, o atendimento educacional especializado preferencialmente na
rede regular de ensino, evidencia-se uma clara opção pela política de integração no texto
da lei, não devendo a integração – seja como política ou como princípio norteador – ser
penalizada em decorrência dos erros que têm sido identificados na sua operacionalização
nas últimas décadas.
O êxito da integração escolar depende, dentre outros fatores, da eficiência no
atendimento à diversidade da população estudantil. Como atender a essa diversidade?
Sem pretender respostas conclusivas, sugere-se estas, dentre outras medidas: elaborar
propostas pedagógicas baseadas na interação com os alunos, desde a concepção dos
objetivos; reconhecer todos os tipos de capacidades presentes na escola; sequenciar
conteúdos e adequá-los aos diferentes ritmos de aprendizagem dos educandos; adotar
metodologias diversas e motivadoras; avaliar os educandos numa abordagem processual
e emancipadora, em função do seu progresso e do que poderá vir a conquistar.
Alguns educadores defendem que uma escola não precisa preparar-se para garantir
a inclusão de alunos com necessidades especiais, mas tornar-se preparada como resultado
do ingresso desses alunos. Indicam, portanto, a colocação imediata de todos na escola.
Entendem que o processo de inclusão é gradual, interativo e culturalmente determinado,
requerendo a participação do próprio aluno na construção do ambiente escolar que lhe

28
seja favorável. Embora os sistemas educacionais tenham a intenção de realizar
intervenções pedagógicas que propiciem às pessoas com necessidades especiais uma
melhor educação, sabe-se que a própria sociedade ainda não alcançou níveis de integração
que favoreçam essa expectativa.

PRÁTICAS INCLUSIVAS NAS ESCOLAS

Para incluir todas as pessoas, a sociedade deve ser modificada, devendo firmar a
convivência no contexto da diversidade humana, bem como aceitar e valorizar a
contribuição de cada um conforme suas condições pessoais.
A educação tem se destacado como um meio privilegiado de favorecer o processo
de inclusão social dos cidadãos, tendo como mediadora uma escola realmente para todos,
como instância sociocultural.
A prática escolar tem evidenciado o que pesquisas científicas vêm comprovando:
os sistemas educacionais experimentam dificuldades para integrar o aluno com
necessidades especiais. Revelam os efeitos dificultadores de diversos fatores de natureza
familiar, institucionais e socioculturais.
A maioria dos sistemas educacionais ainda baseia-se na concepção
médicopsicopedagógica quanto à identificação e ao atendimento de alunos com
necessidades especiais. Focaliza a deficiência como condição individual e minimiza a
importância do fator social na origem e manutenção do estigma que cerca essa população
específica. Essa visão está na base de expectativas massificadas de desempenho escolar
dos alunos, sem flexibilidade curricular que contemple as diferenças individuais.
Outras análises levam à constatação de que a própria escola regular tem
dificultado, para os alunos com necessidades especiais, as situações educacionais comuns
propostas para os demais alunos. Direcionam a prática pedagógica para alternativas
exclusivamente especializadas, ou seja, para alunos com necessidades especiais, a
resposta educacional adequada consiste em serviços e recursos especializados.
Tais circunstâncias apontam para a necessidade de uma escola transformada.
Requerem a mudança de sua visão atual. A educação eficaz supõe um projeto pedagógico
que enseje o acesso e a permanência – com êxito – do aluno no ambiente escolar; que
assume a diversidade dos educandos, de modo a contemplar as suas necessidades e
potencialidades. A forma convencional da prática pedagógica e do exercício da ação
docente é questionada, requerendo-se o aprimoramento permanente do contexto

29
educacional. Nessa perspectiva é que a escola virá a cumprir o seu papel, viabilizando as
finalidades da educação.
Em uma dimensão globalizada da escola e no bojo do seu projeto pedagógico, a
gestão escolar, os currículos, os conselhos escolares, a parceria com a comunidade escolar
e local, dentre outros, precisam ser revistos e redimensionados, para fazer frente ao
contexto da educação para todos. A lei nº 9.394 – de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – respalda, enseja e oferece elementos para a transformação requerida pela
escola de modo que atenda aos princípios democráticos que a orientam.

A REDEFINIÇÃO DO OLHAR SOBRE A EDUCAÇÃO ESPECIAL

A Educação Especial tem sido atualmente definida no Brasil segundo uma


perspectiva mais ampla, que ultrapassa a simples concepção de atendimentos
especializados tal como vinha sendo a sua marca nos últimos tempos.
Conforme define a nova LDB, trata-se de uma modalidade de educação escolar,
voltada para a formação do indivíduo, com vistas ao exercício da cidadania. Como
elemento integrante e indistinto do sistema educacional, realiza-se transversalmente, em
todos os níveis de ensino, nas instituições escolares, cujo projeto, organização e prática
pedagógica devem respeitar a diversidade dos alunos, a exigir diferenciações nos atos
pedagógicos que contemplem as necessidades educacionais de todos. Os serviços
educacionais especiais, embora diferenciados, não podem desenvolver-se isoladamente,
mas devem fazer parte de uma estratégia global de educação e visar suas finalidades
gerais.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais preconizam a atenção à diversidade da
comunidade escolar e baseiam-se no pressuposto de que a realização de adaptações
curriculares pode atender a necessidades particulares de aprendizagem dos alunos.
Consideram que a atenção à diversidade deve se concretizar em medidas que levam em
conta não só as capacidades intelectuais e os conhecimentos dos alunos, mas, também,
seus interesses e motivações.
A atenção à diversidade está focalizada no direito de acesso à escola e visa à
melhoria da qualidade de ensino e aprendizagem para todos, irrestritamente, bem como
as perspectivas de desenvolvimento e socialização. A escola, nessa perspectiva, busca
consolidar o respeito às diferenças, conquanto não elogie a desigualdade. As diferenças

30
vistas não como obstáculos para o cumprimento da ação educativa, mas, podendo e
devendo ser fatores de enriquecimento.
A diversidade existente na comunidade escolar contempla uma ampla dimensão
de características. Necessidades educacionais podem ser identificadas em diversas
situações representativas de dificuldades de aprendizagem, como decorrência de
condições individuais, econômicas ou socioculturais dos alunos:
• Crianças com condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais e sensoriais
diferenciadas;
• Crianças com deficiência e bem dotadas;
• Crianças trabalhadoras ou que vivem nas ruas;
• Crianças de populações distantes ou nômades;
• Crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais;
• Crianças de grupos desfavorecidos ou marginalizados.
A expressão necessidades educacionais especiais podem ser utilizadas para
referir-se a crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua elevada capacidade ou
de suas dificuldades para aprender. Está associada, portanto, a dificuldades de
aprendizagem, não necessariamente vinculada a deficiência(s). O termo surgiu para evitar
os efeitos negativos de expressões utilizadas no contexto educacional – deficientes,
excepcionais, subnormais, superdotados, infradotados, incapacitados etc. – para referir-
se aos alunos com altas habilidades/superdotação, aos portadores de deficiências
cognitivas, físicas, psíquicas e sensoriais. Tem o propósito de deslocar o foco do aluno e
direcioná-lo para as respostas educacionais que eles requerem, evitando enfatizar os seus
atributos ou condições pessoais que podem interferir na sua aprendizagem e
escolarização.
É uma forma de reconhecer que muitos alunos, sejam ou não portadores de
deficiências ou de superdotação, apresentam necessidades educacionais que passam a ser
especiais quando exigem respostas específicas adequadas.
O que se pretende resgatar com essa expressão é o seu caráter de funcionalidade,
ou seja, o que qualquer aluno pode requerer do sistema educativo quando frequenta a
escola. Isso requer uma análise que busque verificar o que ocorre quando se transforma
as necessidades especiais de uma criança numa criança com necessidades especiais. Com
frequência, necessitar de atenção especial na escola pode repercutir no risco de tornar-se
um portador de necessidades especiais. Não se trata de mero jogo de palavras ou de
conceitos.

31
O QUE A ESCOLA PODE FAZER PARA DAR RESPOSTAS ÀS
NECESSIDADES

Falar em necessidades educacionais especiais, portanto, deixa de ser pensar nas


dificuldades específicas dos alunos e passa a significar o que a escola pode fazer para dar
respostas às suas necessidades, de um modo geral, bem como aos que apresentam
necessidades específicas muito diferentes dos demais. Considera os alunos, de um modo
geral, como passíveis de necessitar, mesmo que temporariamente, de atenção específica
e poder requerer um tratamento diversificado dentro do mesmo currículo. Não se nega o
risco da discriminação, do preconceito e dos efeitos adversos que podem decorrer dessa
atenção especial. Em situação extrema, a diferença pode conduzir à exclusão. Por culpa
da diversidade ou de nossa dificuldade em lidar com ela?
Nesse contexto, a ajuda pedagógica e os serviços educacionais, mesmo os
especializados – quando necessários – não devem restringir ou prejudicar os trabalhos
que os alunos com necessidades especiais compartilham na sala de aula com os demais
colegas. Respeitar a atenção à diversidade e manter a ação pedagógica “normal” parece
ser um desafio presente na integração dos alunos com maiores ou menos acentuadas
dificuldades para aprender.
Embora as necessidades especiais na escola sejam amplas e diversificadas, a atual
Política Nacional de Educação Especial aponta para uma definição de prioridades no que
se refere ao atendimento especializado a ser oferecido na escola para quem dele
necessitar.
Nessa perspectiva, define como aluno portador de necessidades especiais aquele
que “... por apresentar necessidades próprias e diferentes dos demais alunos no domínio
das aprendizagens curriculares correspondentes à sua idade, requer recursos pedagógicos
e metodologias educacionais específicas.” A classificação desses alunos, para efeito de
prioridade no atendimento educacional especializado (preferencialmente na rede regular
de ensino), consta da referida Política e dá ênfase a:
• portadores de deficiência mental, visual, auditiva, física e múltipla;
• portadores de condutas típicas (problemas de conduta);
• portadores de Superdotação.

32
A educação especial pode ser oferecida em instituições públicas ou particulares.
As políticas recentes de educação especial têm indicado as seguintes situações para a
organização do atendimento:
• Integração plena na rede regular de ensino, com ou sem apoio em sala de
recursos.
• Classe especial em escola regular. Pelas dificuldades de integração dos alunos
em salas de ensino regular, algumas escolas optam pela organização de salas de aula
exclusivas ao atendimento de alunos com necessidades especiais.
• Escola especializada, destinada a atender os casos em que a educação integrada
não se apresenta como viável, seja pelas condições do aluno, seja pelas do sistema de
ensino.

A INTEGRAÇÃO DE ALUNOS NEE (NECESSIDADES EDUCATIVAS


ESPECIAIS) NAS ESCOLAS REGULARES

A integração dos portadores de necessidades educativas especiais no sistema de


ensino regular é uma diretriz constitucional (art. 208, III), fazendo parte da política
governamental há pelo menos uma década. Mas, apesar desse relativamente longo
período, tal diretriz ainda não produziu a mudança necessária na realidade escolar, de
sorte que todas as crianças, jovens e adultos com necessidades especiais sejam atendidos
em escolas regulares, sempre que for recomendado pela avaliação de suas condições
pessoais. A concepção da política de integração da educação especial na rede regular de
ensino abrange duas vertentes fundamentais:
• O âmbito social, a partir do reconhecimento das crianças, jovens e adultos
especiais como cidadãos e de seu direito de estarem integrados à sociedade o mais
plenamente possível;
• O âmbito educacional, tanto nos aspectos administrativos (adequação do espaço
escolar, de seus equipamentos e materiais pedagógicos) quanto na qualificação dos
professores e demais profissionais envolvidos. O ambiente escolar como um todo deve
ser sensibilizado para uma perfeita integração. Propõe-se uma escola integradora,
inclusiva, aberta à diversidade dos alunos, no que a participação da comunidade é fator
essencial.
Entre outras características dessa política, são importantes a flexibilidade e a
diversidade, quer porque o aspecto das necessidades especiais é variado, quer porque as

33
realidades são bastante diversificadas no país. Quanto às escolas especiais, a política de
inclusão as reorienta para prestarem apoio aos programas de integração.
Enquanto modalidade de ensino, a educação especial deve seguir os mesmos
requisitos curriculares dos respectivos níveis de ensino aos quais está associada. No
entanto, de modo a considerar as especificidades dessa modalidade de ensino e auxiliar
no processo de adaptação à nova política de integração, os sistemas de ensino contam
atualmente com o documento Adaptações curriculares. Esse documento define estratégias
para a educação de alunos com necessidades educativas especiais e orienta os sistemas de
ensino para o processo de construção da educação na diversidade.
Os currículos devem ter uma base nacional comum, conforme determinam os arts.
26 e 27 da LDBEN, a ser suplementada e complementada por uma parte diversificada,
exigida, inclusive, pelas características dos alunos.
Em casos muito singulares, em que o educando com graves comprometimentos
mentais e/ou múltiplos não puder beneficiar-se de um currículo que inclua formalmente
a base nacional comum, deverá ser proposto um currículo especial para atender suas
necessidades, com características amplas apresentadas pelo aluno.
O currículo especial – tanto na educação infantil como nas séries iniciais do ensino
fundamental – distingue-se pelo caráter funcional e pragmático das atividades previstas.
Alunos com grave deficiência mental ou múltipla têm, na grande maioria das
vezes, um longo percurso educacional sem apresentar resultados de escolarização
previstos no Inciso I do art. 32 da LDBEN: «o desenvolvimento da capacidade de
aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo».
Nesse caso, e esgotadas todas as possibilidades apontadas no art. 24 da LDBEN,
deve ser dada, a esses alunos, uma certificação de conclusão de escolaridade, denominada
«terminalidade específica». Terminalidade específica, portanto, é «uma certificação de
conclusão de escolaridade, com histórico escolar que apresenta, de forma descritiva, as
habilidades atingidas pelos educandos cujas necessidades especiais, oriundas de grave
deficiência mental ou múltipla, não lhes permitem atingir o nível de conhecimento
exigido para a conclusão do ensino fundamental, respeitada a legislação existente,
esgotadas as possibilidades pontuadas no art. 24 da Lei n.º 9.394/96 e de acordo com o
regimento e a proposta pedagógica da escola».
A referida certificação de escolaridade deve possibilitar novas alternativas
educacionais, tais como o encaminhamento para cursos de educação de jovens e adultos

34
e de preparação para o trabalho, cursos profissionalizantes e encaminhamento para o
mercado de trabalho competitivo ou não.
A educação especial para o trabalho é uma alternativa que visa à integração do
aluno com deficiência na vida em sociedade, a partir de ofertas de formação profissional.
Efetiva-se por meio de adequação dos programas de preparação para o trabalho, de
educação profissional, de forma a viabilizar o acesso das pessoas com necessidades
educacionais especiais em cursos de nível básico, técnico e tecnológico, possibilitando o
acesso ao mercado formal ou informal. As adequações efetivam-se por meio de:
• Adaptação dos recursos instrucionais: material pedagógico, equipamento,
currículo e outros.
• Capacitação de recursos humanos: professores, instrutores e profissionais
especializados.
• Eliminação de barreiras arquitetônicas.
A educação especial para o trabalho pode ser realizada em escolas especiais,
governamentais ou não, em oficinas pré-profissionais ou oficinas profissionalizantes (de
forma protegida ou não), em escolas profissionais do sistema S (SESI, SENAI, SENAC,
etc.), em escolas agrotécnicas e técnicas federais ou em centros federais de educação
tecnológica e em outras congêneres.
Os arts. 3º e 4º do Decreto n.º 2.208/97 contemplam a inclusão de alunos em
cursos de educação profissional de nível básico, independentemente de escolaridade
prévia, além dos cursos de nível técnico e tecnológico. Assim, alunos com necessidades
especiais também podem, com essa condição, beneficiar-se desses cursos, qualificando-
se para o exercício de funções demandadas pelo mundo do trabalho.
A educação para o trabalho oferecida aos alunos com necessidades especiais que
não apresentarem condições de se integrar aos cursos profissionalizantes acima
mencionados deve ser realizada em oficinas profissionalizantes protegidas, com vista à
inserção não-competitiva no mundo do trabalho.
Sendo a educação especial uma modalidade de ensino que perpassa os diversos
níveis de ensino, o nível de formação exigido equivale aos requisitos para atuação nos
respectivos níveis de ensino aos quais está associada. Sendo assim, para atuação na
educação infantil e no primeiro segmento do ensino fundamental, exige-se formação
mínima em nível médio, na modalidade Normal. Para atuação no segundo segmento do
ensino fundamental e no ensino médio, exige-se formação em nível superior.

35
A partir de 2007, a formação mínima exigida para atuação nos respectivos níveis
de ensino e, portanto, na modalidade de educação especial será a licenciatura plena, obtida
em nível superior.
O Ministério da Educação, através da Secretaria de Educação Especial, também
desenvolve o Programa Nacional de Capacitação de Recursos Humanos, dirigido aos
profissionais que atuam no ensino regular. O Programa prevê atendimento gradual dos
municípios brasileiros, utilizando-se de recursos da educação à distância, de modo a
possibilitar maior oferta de atendimento aos alunos com necessidades educacionais
especiais.
O conhecimento da realidade da educação especial no país é ainda bastante
precário, porque não se dispõe de estatísticas completas nem sobre o número de pessoas
com necessidades especiais nem sobre o atendimento. Somente a partir do ano 2000, o
Censo Demográfico passou a oferecer dados mais precisos, permitindo análises mais
profundas da realidade.
A Organização Mundial de Saúde estima que em torno de 10% da população de
um país têm necessidades especiais de diversas ordens: visuais, auditivas, físicas,
mentais, múltiplas, distúrbios de conduta e, também, superdotação ou altas habilidades.
Se essa estimativa se aplicar ao Brasil, estima-se a existência de cerca de 15 milhões de
pessoas nessa condição.
A informação mais recente de que se dispõe, em âmbito nacional, foi obtida pelo
Censo Demográfico de 1991, que investigou a existência de pessoas portadoras de
cegueira, surdez, paralisia, falta de membros ou parte deles e deficiência mental, em uma
amostra com aproximadamente 10% dos domicílios do país. Apuradas as respostas, a
parcela de pessoas portadoras de deficiência foi calculada em 1,5% da população
brasileira, bem inferior, portanto, às estimativas dos organismos internacionais de saúde.
De qualquer forma, o atendimento nos estabelecimentos escolares mostra-se
muito inferior ao necessário. Em 1999, havia cerca de 311 mil alunos matriculados,
distribuídos da seguinte forma: 53,8% deficientes mentais; 12,6% com deficiências
múltiplas; 12,6% com deficiência auditiva; 4,9% com deficiência física; 4,6% com
deficiência visual; 2,7% com problemas de condutas típicas. Apenas 0,4% com altas
habilidades/superdotados e 8,5% com outro tipo de deficiência.
Assim como o movimento inclusivo exige mudanças estruturais para as escolas
comuns e especiais, ele também propõe que haja uma articulação entre os diferentes
profissionais envolvidos neste processo. O diálogo entre diversos profissionais é

36
necessário para o aprofundamento e melhor desempenho, seja do aluno, do professor ou
do especialista.
No entanto, o diálogo só acontece quando as partes que se respeitam mutuamente
e não assumem uma posição de superioridade de conhecimento e de dominação sobre o
outro. Desta forma, para que cada espaço se organize e cumpra com o que se propõe, sem
ocupar ou se sobrepor ao trabalho do outro, faz-se necessário destacar:
• Escola (sala comum): Espaço educacional responsável pela saída da vida
particular e familiar para o domínio público tem função social reguladora e formativa para
os alunos. A escola cabe ensinar a compartilhar o saber, introduzir o aluno no mundo
social, cultural e cientifico, ou seja, cabe a escola socializar o saber universal.
• Atendimento Educacional Especializado: Tem por objetivo ampliar o ponto de
partida e de chegada do aluno em relação ao seu conhecimento. Não se atém a solucionar
os obstáculos da deficiência, mas criar outras formas de interação, de acessar o
conhecimento particular e pessoal. É de caráter educacional, mas ao contrário da escola
que trabalha o saber universal, o AEE trabalha com o saber particular do aluno, aquilo
que traz de casa, de suas convicções visando propiciar uma relação com o saber diferente
do que possui ampliar sua autonomia pessoal, garantir outras formas de acesso ao
conhecimento (como por exemplo, através do BRAILLE, LIBRAS, uso de tecnologia,
uso de diferentes estratégias de pensamento, etc.)
• Atendimento Clínico: Preocupam-se com os sintomas específicos, as patologias
apresentadas em cada área, que são trabalhados de maneira a superar ou reabilitar o
indivíduo nas manifestações que ocorrem. Exemplo: o fonoaudiólogo trabalhará com a
dificuldade de linguagem expressiva ou receptiva, melhorando a condição da pessoa neste
aspecto, o fisioterapeuta buscará, por exemplo, melhorar os movimentos perdidos, etc.
Sabemos que a pessoa é um ser indivisível, em que cada uma de suas partes
interage com a outra, influenciando e determinando a condição do seu funcionamento e
crescimento como pessoa. Como exemplo, podemos citar o atendimento educacional
especializado, que na construção do conhecimento toca em questões subjetivas para o
aluno, o que fatalmente acarretará consequências no seu desenvolvimento global e
consequentemente na resposta ao atendimento clínico.
Se uma instituição especializada mantém o atendimento educacional e clínico,
esses especialistas devem interagir, embora cada um mantenha os limites de suas
especificidades. E mesmo naquelas escolas especiais e comuns que não têm o propósito
de desenvolver o atendimento clínico, o diálogo com os especialistas é fundamental. E

37
que esta interação não se estabeleça para encerrar as possibilidades do aluno em um
diagnóstico que contempla apenas as deficiências, mas para descobrir saídas conjuntas de
atuação em cada caso.
Todos esses três saberes: o clínico, o escolar e o especializado devem fazer suas
diferentes ações convergir para um mesmo objetivo, o desenvolvimento das pessoas com
deficiência. O atendimento educacional especializado foi criado para dar um suporte para
os alunos deficientes para facilitar o acesso ao currículo.
De acordo com o Decreto nº 6571, de 17 de setembro de 2008:
Art. 1o A União prestará apoio técnico e financeiro aos sistemas públicos de
ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na forma deste Decreto, com a
finalidade de ampliar a oferta do atendimento educacional especializado aos alunos com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação,
matriculados na rede pública de ensino regular.
§ 1º Considera-se atendimento educacional especializado o conjunto de
atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucionalmente,
prestado de forma complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino
regular. § 2o O atendimento educacional especializado deve integrar a proposta
pedagógica da escola, envolver a participação da família e ser realizado em articulação
com as demais políticas públicas.
O AEE é um serviço da Educação Especial que identifica, elabora e organiza
recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem barreiras para a plena participação
dos alunos, considerando suas necessidades específicas. Ele deve ser articulado com a
proposta da escola regular, embora suas atividades se diferenciem das realizadas em salas
de aula de ensino comum. (MEC, 2009).
Deve ser realizado no período inverso ao da classe frequentada pelo aluno e
preferencialmente, na própria escola. Há ainda a possibilidade de esse atendimento
acontecer em uma escola próxima. Nas escolas de ensino regular o AEE deve acontecer
em salas de recursos multifuncionais que é um espaço organizado com materiais
didáticos, pedagógicos, equipamentos e profissionais com formação para o atendimento
às necessidades educacionais especiais, projetadas para oferecer suporte necessário a
estes alunos, favorecendo seu acesso ao conhecimento. (MEC, 2007).
O atendimento educacional especializado é muito importante para os avanços na
aprendizagem do aluno com deficiências na sala de ensino regular. Os professores destas
salas devem atuar de forma colaborativa com o professor da classe comum para a

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definição de estratégias pedagógicas que favoreçam o acesso ao aluno ao currículo e a
sua interação no grupo, entre outras ações que promovam a educação inclusiva.
Quanto mais o AEE acontecer nas escolas regulares nas que os alunos com
deficiências estejam matriculados mais trará benefícios para esses, o que contribuirá para
a inclusão, evitando atos discriminatórios.

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