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NEUROAPRENDIZAGEM , INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS

E MINDFULNESS NO PROCESSO DE APRENDIZADO

1
SUMÁRIO

FACULESTE ............................................................................................ 2

Introdução ................................................................................................ 3

Desenvolvimento cognitivo e aprendizagem ........................................ 4


A relação entre desempenho escolar e aprendizagem ..................... 6

Elementos da teoria das inteligências múltiplas de Howard Gardner. 11


Elementos da teoria mindful learning de Ellen Langer ....................... 16
Práticas Meditativas: contribuição à aprendizagem ........................... 27
REFERÊNCIAS ..................................................................................... 35

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FACULESTE

A história do Instituto FACULESTE, inicia com a realização do sonho de


um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para
cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a FACULESTE,
como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A FACULESTE tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas


de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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Introdução

A neuroaprendizagem é o que podemos definir como o ato de aprender,


tendo como base as funções cerebrais. Em outras palavras, tudo que seja
referente ao aspecto cognitivo, entre eles: a linguagem, a capacidade de
raciocinar, memorizar, tomadas de decisão, concentração, entre outros.

Embora complexo, é importante frisar que todo esse mecanismo do


cérebro acontece de maneira minuciosamente conectada com todos os
comandos necessários para a aprendizagem. Para começo de conversa, a
primeira coisa que podemos falar é sobre a perfeição na sincronia das conexões
neurais para o armazenamento da informação, considerando as diferentes
partes do cérebro.

A próxima etapa é o acionamento da múltipla memória, além das várias


vias neuronais, para dar o significado aos novos dados que foram recebidas pelo
indivíduo. Tudo isso armazenado no cérebro da pessoa. É interessante ressaltar
aquilo que chamamos de plasticidade cerebral que, em outras palavras, significa
a capacidade do cérebro em modificar todo o processo de aprendizagem:
funcionamento, reorganização e adaptação de acordo com os estímulos
vivenciados pela pessoa.

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Desenvolvimento cognitivo e aprendizagem

O desenvolvimento cognitivo foi estudado por Piaget com foco voltado


para a infância, período que ele aponta como compreendido entre o nascimento
e os onze anos de idade, e também por Vygotsky, embora esse não se refira a
uma cronologia de desenvolvimento numericamente tão precisa.

De acordo com WOOLFOLK (1996) apud CASAS (1999), o


desenvolvimento cognitivo é dependente do desenvolvimento humano, ou seja,
constrói-se sobre as bases biológicas dos seres humanos.

O conceito de desenvolvimento, porém, não se aplica a todas as


mudanças pelas quais passa o ser humano ou ser cognitivo, mas somente
àquelas que se dão de forma ordenada e por um lapso de tempo significativo.
Compreende-se também que “as mudanças que podem ser qualificadas como
desenvolvimento seriam as que resultam em uma conduta mais adaptativa,
organizada, efetiva e complexa”

Para CASAS (1999), as mudanças biológicas são as que nos conduzem


ao desenvolvimento e têm os seguintes aspectos observáveis: 1) Seqüência: é
a ordem cronológica em que as mudanças ocorrem; 2) Ritmo: a velocidade com
que as mudanças ocorrem; 3) Forma: é o aspecto resultante ou aparência
externa causada pela mudança. Ele destacou que:

O conceito de desenvolvimento humano compreende os seguintes


aspectos gerais: 1) Físico: referente às mudanças que ocorrem no corpo; 2)
Pessoal: relativo às mudanças na personalidade do indivíduo; 3) Social: os que
dizem respeito às mudanças que se apresentam nas interações do indivíduo com
os outros; 4) Cognitivo: referentes às mudanças das capacidades de
aprendizagem e de pensamento do indivíduo.

De acordo com os trabalhos de WOOLFOLK (1996) apud CASAS (1999),


o desenvolvimento cognitivo apresenta três características: 1) ocorre em ritmos

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distintos de uma pessoa para outra; 2) segue a mesma seqüência em todos os
indivíduos, independentemente da pessoa; 3) ocorre sempre de modo gradual,
ou seja, passa por transições lentas.

A linguagem, outro fator-chave para o desenvolvimento cognitivo,


apresenta aspectos estruturais, que é o conhecimento dos elementos da frase
(a gramática), bem como pressupõe conhecimentos sobre como combiná-los (a
sintaxe); e aspectos funcionais, que se referem aos usos que a criança faz da
linguagem para comunicar-se, pensar e resolver problemas.

Enquanto Piaget propôs que o pensamento precedia a linguagem,


VIGOTSKI (1999) concebeu o contrário: para ele, a linguagem desempenha o
aspecto cognitivo mais crítico no processo de aprendizagem. A linguagem
precederia o pensamento e contribuiria para sua formação. Além de a linguagem
originar o próprio pensamento, ela é também vista por Vygotsky como um
elemento constitutivo do humano, ou seja, sua concepção é tal que a linguagem
cria o humano.

De acordo com trabalhos de GOOD e BROPHY (1997) apud CASAS


(1999), a aprendizagem é um conceito-chave para os estudos da cognição,
podendo dar-se de seis maneiras:

a) Intencional: é a aprendizagem conscientemente direcionada para


um objetivo. Por exemplo, quando o indivíduo quer aprender sobre instalações
elétricas e procura fazê-lo objetivamente.

b) Incidental: a que ocorre geralmente de maneira passiva, quando


não há uma intenção prévia e deliberada de aprender.

c) Memorística: é a aprendizagem que ocorre quando a pessoa não


elabora ou relaciona o conteúdo aprendido com outros conteúdos prévios;
apenas o retém, isolado, na memória.

d) Significativa: a que ocorre quando o indivíduo constrói


coerentemente seu aprendizado através de raciocínio sobre o conteúdo
aprendido, ao invés de somente memorizá-lo.

e) Por recepção: quando o conhecimento apresentado é retido em


sua forma final, tipicamente através de instruções a serem seguidas.

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f) Por descoberta: a que ocorre quando os estudantes estão
empenhados em uma pesquisa, por meio de explorações e experiências, que os
conduzem à descoberta de conceitos ou princípios-chave.

Já o conceito de conhecimento pode ser entendido como o resultado que


se obtém do processo de aprendizagem. É com ele que o pensamento trabalha,
e são três os tipos de conhecimentos:

a) declarativos: que são os conhecimentos intelectuais, o


conhecimento “do quê”, dos fatos e conceitos, e que resultam do
armazenamento de proposições verbais que refletem um conceito ou um fato;

b) procedurais: que são os conhecimentos “do como”, ou seja, as


instruções de como realizar tarefas e solucionar problemas;

c) condicionais: que são os conhecimentos referentes a “onde e


porque”, para que o indivíduo tenha o discernimento que utiliza para aplicar os
outros dois tipos de conhecimentos.

Pouco adianta para uma pessoa deter apenas conhecimentos


declarativos, se ela não tiver conhecimentos procedurais sobre como aplicá-los,
e também se não tiver conhecimentos condicionais que regulem essas
aplicações.

A relação entre desempenho escolar e aprendizagem


Muito se fala em desempenho escolar, mas poucos autores o definem. De
acordo com Chowdhury e Pati (1997), o desempenho escolar se refere em
particular à aprendizagem em um determinado ambiente, o escolar. Tal
desempenho é definido a partir de avaliações e seus resultados. Assim, o
sucesso escolar dependeria da capacidade dos alunos em tirar boas notas.

Por sua vez, o mau desempenho escolar seria um rendimento abaixo do


esperado para determinada idade, habilidades cognitivas e escolaridade
(SIQUEIRA; GURGEL-GIANNETTI, 2010). Está relacionado ao aprendizado de
habilidades e comportamentos que são aplicados a um determinado ambiente,
o acadêmico. Portanto, não é correto afirmarmos que uma criança com mau
desempenho escolar não aprende, pois

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A aprendizagem é o processo de aquisição de novas informações que
serão retidas na memória e é esse processo que nos permite orientar o nosso
comportamento e pensamento (LENT, 2010). É através da aprendizagem que
conseguimos transferir ou estender o que foi aprendido em um contexto para
novos contextos (COCKING; BRANSFORD; BROWN, 2007).

As informações fornecidas pelo meio serão processadas pelo indivíduo


através da entrada de informações pelas vias aferentes – visão, audição,
gustação, olfato, tato e demais sentidos. Em seguida essas informações serão
processadas, selecionadas, organizadas e armazenadas no córtex cerebral por
meio da integração com áreas subcorticais (tronco encefálico, cerebelo, medula
espinhal) o que gera uma resposta às informações recebidas (SIQUEIRA;
GURGEL- GIANNETTI, 2010; COSENZA; GUERRA, 2011).

O processo de aprendizagem depende de atividade cerebral que envolve


diversas funções cognitivas - atenção, memória, função executiva, emoção,
regulação emocional, interação social, percepções, sensações, linguagem,
raciocínio lógico matemático, visioconstrução, motricidade, entre outras
(COCKING; BRANSFORD; BROWN, 2000; COSENZA; GUERRA, 2011).

No processo de aprendizagem podem-se destacar algumas funções


cognitivas que são de grande importância para o aprendiz. Dentre elas está a
atenção, que possibilita a seleção dos estímulos mais relevantes e significativos
em meio a tantos outros fornecidos pelo ambiente. Essa função cognitiva é
mobilizada por informações muito novas ou por aquelas que pertencem ao
arquivo de experiências dos alunos, relacionadas ao seu cotidiano e focos de
interesse. A dificuldade em sustentar a atenção por longos períodos exige uma
mudança frequente de atividade ou intervalos entre elas para recuperar a
capacidade de focar a atenção (COCKING; BRANSFORD; BROWN, 2000;
GUERRA, 2011).

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Outra função cognitiva fundamental para o aprendizado é a memória. A
memória está diretamente ligada à atenção, sendo consolidada durante o sono,
momento em que o cérebro reorganiza as sinapses, fortalecendo aquelas mais
importantes para o cotidiano do indivíduo e eliminando as de menor importância.
A memória de longa duração são os registros mais definitivos, selecionados pelo
cérebro e consolidados por meio da neuroplasticidade como informações ou
experiências importantes para o indivíduo. Por isso o processo de repetição e
um bom sono são importantes para a consolidação da memória (COCKING;
BRANSFORD; BROWN, 2000; GUERRA, 2011).

Mas todo o processo de aprendizagem está intimamente relacionado com


a emoção. “Aprendemos aquilo que nos emociona” (GUERRA, 2011), pois
neurônios das áreas cerebrais que regulam as emoções (medo, ansiedade,
raiva, prazer) mantêm conexões importantes com neurônios de áreas envolvidas
na formação de memórias. Assim, o desencadeamento de emoções favorece o
estabelecimento de memórias, sejam elas positivas ou não (COCKING;
BRANSFORD; BROWN, 2000; GUERRA, 2011).

Dentre as funções cognitivas, as funções executivas também são


importantes para a aprendizagem. Tais funções são os processos mentais que
nos permitem planejar, concentrar a atenção, recordar instruções e organizar
tarefas (MOURÃO JÚNIOR, 2011; ZELAZO; CARLSON; KESEK, 2008). As
funções executivas são imprescindíveis para priorizar tarefas, definir e atingir
metas e controlar os impulsos.

Dentre os diversos aspectos das funções executivas relevantes para o


aprendizado, podem-se destacar três:

1) memória de trabalho, que possibilita manter e manipular


informações/ experiências durante um período curto de tempo;

2) flexibilidade mental, que ajuda a sustentar ou desviar a atenção em


resposta a diferentes situações ou aplicar regras diferentes em diversos
contextos;

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3) autocontrole, que permite a definição de prioridades e o controle de
ações ou respostas impulsivas (MOURÃO JÚNIOR, 2011; ZELAZO CARLSON;
KESEK, 2008).

A aprendizagem é um processo de reorganização cerebral que depende


de fatores genéticos e também de fatores ambientais que ativam redes neurais
e produzem atividade cerebral, neuroplasticidade e organização de novas e/ou
diferentes redes neurais (COCKING; BRANSFORD; BROWN, 2000; LENT,
2010; COSENZA; GUERRA, 2011).

O processo de aprendizagem ocorre o tempo todo, possibilitando a


reorganização das redes neurais a partir dos estímulos que recebemos,
constantemente, dos ambientes em que convivemos.

Esse processo sofre a influência de fatores intrínsecos e extrínsecos ao


indivíduo.

Há os fatores intrínsecos, que são individuais e de ordem orgânica, que


se relacionam com problemas na aquisição e no desenvolvimento de funções
cerebrais envolvidas no processo de aprendizagem.

Podemos citar como fatores intrínsecos, os fatores genéticos que


contribuem para a estrutura e função do sistema nervoso, fatores sistêmicos que
afetam funções de diferentes sistemas orgânicos com impacto sobre o
funcionamento do sistema nervoso (anemia, hipotireoidismo), alterações nos
órgãos dos sentidos, transtornos psiquiátricos (epilepsia, depressão),
transtornos neurológicos como dislexia, discalculia, Transtorno de Déficit de
Atenção e Hiperatividade (TDAH), além de diversas síndromes e condições
neurobiológicas que podem influenciar o processo de aprendizagem (SIQUEIRA;
GURGEL-GIANNETTI, 2010).

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Os fatores ambientais, extrínsecos, também afetam de forma relevante a
aprendizagem. Assim, fatores relacionados à escola (inadequações
pedagógicas, avaliações, falta de motivação, baixa autoestima), à família
(condições socioculturais desfavoráveis ou pouco estimuladoras) e ao mundo
contemporâneo (estresse, processos seletivos, comportamentos
desencadeados pelo ambiente) são extrínsecos ao indivíduo, e não implicam em
comprometimento orgânico (BORUCHOVITCH, 1999; SIQUEIRA; GURGEL-
GIANNETTI, 2010).

O meio em que o indivíduo vive fornece as informações que geram o


aprendizado, por isso as condições socioeconômicas, o ambiente e a estrutura
familiar, a motivação, os recursos didáticos adotados, a qualificação dos
professores, o nível educacional dos pais, as más condições sanitárias e de
alimentação podem influenciar o desempenho escolar (BORUCHOVITCH, 1999;
SIQUEIRA; GURGEL-GIANNETTI, 2010).

Assim, podemos inferir que o processo de aprendizagem ocorre


constantemente e depende de fatores intrínsecos e extrínsecos que o
influenciam e podem contribuir para o bom ou mau desempenho escolar.

Diante de tantos fatores extrínsecos que podem influenciar o desempenho


escolar, muitas escolas têm buscado novos métodos e alternativas para interferir
em alguns desses fatores, buscando gerar mais motivação e menos estresse,
recursos didáticos diferenciados, melhor qualificação para os professores, meios
para melhorar a autoestima dos alunos, entre outros (REMPEL, 2012).

Com o intuito de melhorar alguns aspectos citados anteriormente,


escolas, em várias partes do mundo, têm buscado incluir em seu currículo
atividades de prática meditativa, já que muitos estudos apontam para um

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possível impacto das mesmas em funções cognitivas consideradas importantes
para a aprendizagem e, consequentemente, para o desempenho escolar.

Elementos da teoria das inteligências múltiplas de Howard


Gardner

Gardner interessou-se pelos trabalhos de Piaget e, no início dos anos 80,


publicou suas primeiras conclusões sobre sua teoria, na qual ele nega que a
inteligência humana seja uma entidade única e a propõe como tendo, pelo
menos, oito tipos de instâncias independentes.

Ele define inteligência como um potencial biopsicológico que o indivíduo


tem para processar informações, que pode ser ativado em um determinado
contexto para resolver problemas ou criar produtos que são valorizados em um
ou mais ambientes culturais.

De acordo com os trabalhos de GARDNER (1995), os oito tipos de


inteligências são:

1) lingüística: capacidade para as linguagens falada e escrita, para


aprender idiomas e usar a linguagem a fim de atingirem objetivos;

2) lógico-matemática: capacidade para analisar e resolver problemas


logicamente, utilizando matemática e princípios científicos;

3) musical: habilidade para compor e/ou executar músicas,


reconhecer padrões sonoros, tons, ritmos, que são, segundo Gardner,
habilidades estruturalmente paralelas à inteligência lingüística;

4) corpóreo-cinestésica: que se manifesta por meio da facilidade no


uso do próprio corpo, para expressar-se e/ou resolver problemas;

5) espacial: reconhecida por meio da facilidade que o indivíduo tem


em reconhecer e usar áreas espaciais;

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6) inter-pessoal: capacidade que o indivíduo tem de entender
intenções, motivações e desejos de outras pessoas, facilitando o seu
relacionamento com os outros;

7) intra-pessoal: capacidade que o indivíduo tem de entender a si


mesmo, seus sentimentos, medos, motivações e, desse modo, manter
equilibrada sua própria vida;

8) naturalística: capacidade de distinguir entre elementos da natureza,


favorável à sobrevivência de nossa espécie;

Na TAB. 11 é apresentado um sumário das características das oito


inteligências propostas por Gardner:

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Gardner utilizou oito critérios para distinguir os tipos de inteligências e
para caracterizá-las, que são:

1) o isolamento de cada tipo de inteligência dentro do cérebro, que é


detectado quando, por exemplo, alguém sofre danos físicos cerebrais que
afetam um tipo de inteligência enquanto outros tipos permanecem intactos;

2) a hipótese da colaboração de cada tipo de inteligência no processo


evolucionário humano, como, por exemplo, ao se analisar como a inteligência
espacial colaborou para as migrações de grupos humanos, ao longo de sua
história, colaborando com sua sobrevivência;

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3) a idéia da presença de um núcleo central de operações inerente a
cada tipo de inteligência, como no caso da inteligência lingüística, cujas
operações centrais são o reconhecimento e a discriminação de fonemas, o
comando da sintaxe e a aquisição dos significados das palavras;

4) a observação de cada tipo dentro de sistemas simbólicos, como,


por exemplo, a linguagem escrita ou os símbolos matemáticos;

5) a descoberta do diferente ritmo de evolução de cada tipo de


inteligência dentro da espécie humana e mesmo dentro de cada indivíduo;

6) a constatação de que existem pessoas que são, ao mesmo tempo,


limitadas para certos tipos de inteligência e bem dotadas em outros tipos;

7) evidências suportadas pela psicologia experimental, como a vista


em autistas, que exibem notável domínio de números e estatísticas, por exemplo,
sem compreender seus significados;

8) evidências encontradas pela psicometria, como, por exemplo,


diferentes resultados em observações sobre se a realização de determinadas
atividades do indivíduo depende do uso de uma ou mais inteligência.

De acordo com trabalhos de SMITH (2002), são premissas básicas da


teoria das inteligências múltiplas:

a) todas os indivíduos possuem todas as oito inteligências, em


diferentes graus de intensidade;

b) cada indivíduo tem um perfil único de inteligência (com um


percentual específico de cada uma);

c) processos educacionais podem ser implantados tomando-se por


base os diferentes tipos de inteligência;

d) cada inteligência ocupa uma região diferente do cérebro (pacientes


com danos em diferentes regiões cerebrais mostram conseqüências diferentes
em seus tipos de inteligência);

e) as inteligências podem operar em conjunto com as outras ou


independentemente;

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f) as inteligências, reunidas, definem as características globais da
espécie humana.

GARDNER (1995) argumentou que os seres humanos podem aprender


de diferentes maneiras: por meio da exploração do ambiente com suas mãos e
seus sentidos, por meio da observação das outras pessoas, de conversações,
de leituras, desenvolvendo e utilizando uma infinidade de símbolos, ou pintando,
dançando, enfim, por meio de uma longa lista de modos e meios de captação e
de expressão de significados.

GILES (2007) definiu a expressão “estilo de aprendizagem” como a


característica composta por fatores cognitivos, afetivos e psicológicos, que
servem de indicadores sobre como um aprendiz percebe, interage com e
responde a um ambiente de aprendizagem, que é usado em vários campos
educacionais e decorre da aplicação da teoria das inteligências múltiplas.

Na TAB. 12 são apresentados os quatro estilos de aprendizagem


propostos por ele:

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Elementos da teoria mindful learning de Ellen Langer

O trabalho desenvolvido por Ellen Langer e seus colaboradores focalizou


inicialmente pesquisas sobre as limitações do que ela denominou aprendizagem
desatenta (mindlessness learning), que se refere à aprendizagem (com
características quase behavioristas) que se dá quando da aquisição de hábitos,
que se desenrola e se consolida no indivíduo desacompanhada de uma reflexão
e da consciência de que a aprendizagem está ocorrendo.

LANGER (1989) apontou que “quando nós seguimos cegamente rotinas


ou executamos ordens desatentamente, nós estamos agindo como autômatos,
com potenciais graves conseqüências para nós e para os outros.”

Segundo seus trabalhos, o pensamento desatento (mindless thought)


pode ser caracterizado inicialmente pela presença de três fatores observáveis
no indivíduo:

a) comprometimento com categorias pré-existentes: usualmente


parte-se de conceitos e categorias pré-existentes, criadas anteriormente para
compreender o mundo; o pensar desatento ocorre quando se prende
rigidamente às categorias já criadas no passado, o que nos impede de ampliar
nossos conceitos e idéias.

b) comportamento automático: tendência das pessoas em agir


conforme hábitos antigos, ou seja, dado um determinado estímulo, já conhecido,
a pessoa reage de determinado modo, repetidas vezes utilizado. Dessa forma,
as pessoas respondem desatentamente a um contexto familiar ao invés de
prestar atenção ao conteúdo de uma situação.

c) agir a partir de uma perspectiva única: age-se normalmente sem


introduzir variações nas ações, sem considerar alternativas que poderiam
ser mais eficazes dependendo da situação que se apresenta; se alguém pede
determinado tipo de ajuda, procura-se oferecer exatamente o que está sendo
pedido, sem agregar expertise ao assunto.

Na TAB. 13 estão resumidas essas características:

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Para LANGER (1989), há diferentes raízes para o pensar
desatentamente, que nos conduzem a fazê-lo sob a influência de um ou mais
dos fatores restritivos enumerados por ela e que são:

a) repetição: a execução freqüente das mesmas tarefas pode nos


conduzir a pensar desatentamente em qualquer profissão; as pessoas
incorporam os procedimentos e os executam sem qualquer esforço cognitivo; os
novatos podem perceber melhor pequenas modificações feitas em tarefas muito
repetidas do que aqueles que as executam rotineiramente.

b) comprometimento cognitivo prematuro: o indivíduo desatento é


normalmente comprometido com um modo pré-determinado e único de pensar,
fazer algo ou usar uma informação; não explora variações possíveis nos usos de
objetos, conhecimentos ou aplicações das mesmas informações com as quais
lida; o modo com que inicialmente assimilou a informação (se foi atenta ou
desatenta) determina com ele vai utilizá-la no futuro.

c) aprendizagem desatenta e inconsciência: se se aprende algo


desatentamente, não nos ocorrerá pensar a respeito posteriormente, e nem
mesmo cogitar que isso deva ser feito; porém se formos alertados para isso,
aceita-se sem dificuldades novas perspectivas sobre assuntos antigos.

d) crença na limitação dos recursos: cria-se categorias rígidas,


mutuamente exclusivas, e limita-se a classificação de fatos a essas
categorias; com isso, restringe-se as possibilidades de descobertas e de novas
soluções.

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e) noção linear do tempo: concepção restritiva do recurso tempo, que
nos conduz a desperdiçar possíveis esforços devido à falsa noção de que o
tempo não pode ser compartilhado entre diferentes atividades.

f) educação para os resultados: desde o ensino fundamental, o foco


da escolarização é colocado nos resultados, ao invés de nos processos por meio
dos quais eles são obtidos; essa concepção conduz a apresentar os fatos
incondicionalmente, o que contribui para um pensar desatento.

g) o poder do contexto: o modo como se age tem forte influência do


contexto e nossa mentalidade determina como se interpreta cada contexto;
além disso, a idéia de contexto é formada continuamente por nós; o contexto
não existe como uma realidade externa, independente das pessoas, o que
provoca constantes confusões: muitas pessoas assumem que as motivações e
intenções das outras pessoas são as mesmas delas, embora o mesmo
comportamento possa ter diferentes significados.

Em oposição à aprendizagem desatenta, LANGER (1989) apresentou as


características da aprendizagem atenta (mindfulness), que são:

a) criação de novas categorias: processo natural que as crianças têm


de categorizar e re-categorizar, rotular e re-rotular os fatos e fenômenos do
mundo freqüentemente, sobrevivendo de modo adaptativo e dinâmico.

b) abertura para novas informações: de modo semelhante à


capacidade para criar novas categorias, uma mentalidade atenta percebe novos
estímulos, nota as variações no contexto e nos detalhes, tornando sua
aprendizagem mais efetiva.

c) percepção de mais de uma perspectiva: ter diferentes perspectivas


sobre determinado ponto tem um efeito libertador da criatividade, aumentando
nossas opções de ações.

Na TAB. 14 estão resumidas as características do pensamento atento


(mindfulness):

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O pensar desatento é caracterizado pela aceitação e prática de ideias
baseadas em pequenos comprometimentos cognitivos prematuros, e acaba
formando uma mentalidade negativa que interfere diretamente nas ações da
pessoa. Pensar de modo atento impede que prevaleçam as limitações
decorrentes da aceitação de comprometimentos cognitivos prematuros.

Existem sete mitos penetrantes (do inglês pervasive) que se agregam


negativamente em todos os aspectos da vida cognitiva da pessoa,
enfraquecendo aspectos da aprendizagem, sufocando a criatividade, silenciando
eventuais questionamentos e reduzindo a auto-estima.

De acordo com LANGER (1989), esses mitos são:

1) os assuntos básicos têm que ser aprendidos tão bem a ponto de


tornarem-se automáticos para a pessoa: esse aspecto pode ser melhor
compreendido desdobrando-o em:

1a) aprender muito cedo pode tornar-se um problema para a pessoa, na


medida em que ela pode consolidar uma forma de pensar e agir inadequada para
toda a vida, adquirida sob uma visão parcial da coisa aprendida.

1b) se a aprendizagem ocorrer de forma incondicional, o aprendiz pode


perder (ou reduzir sensivelmente) sua capacidade futura de vislumbrar e testar
alternativas para o assunto aprendido, tornando-se refém de pseudo-verdades
que, dessa forma, podem lhe parecer imutáveis e absolutas. A aprendizagem
ocorrida em momento mais maduro certamente envolverá incertezas, o que se
constitui em uma aprendizagem mais aderente à realidade.

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1c) o aprendiz precisa manter sua capacidade de aprendizagem aberta
às novidades, alerta para eventuais distinções, sensível à possibilidade de
mudança para outros contextos.

1d) o aprendiz precisa manter sua consciência, explicita ou implícita, das


múltiplas perspectivas envolvidas em cada assunto, bem como uma orientação
para o momento presente dos fatos, ou seja, deve estar ciente de que a solução
encontrada pode ser a melhor até agora, mas pode não valer
indeterminadamente no futuro.

2) prestar atenção significa permanecer focado em uma coisa de cada


vez: essa é, para Langer, uma verdade altamente discutível, uma vez que a
atenção do indivíduo pode ser positivamente desviada para outro fato ou
conceito, que se interpõe com mais urgência para ela, e que merece ser levado
em conta antes que ela retorne ao assunto inicial. LANGER (1997) destacou em
seus trabalhos que:

Ao mesmo tempo, prestar atenção a vários fatos e fenômenos


simultaneamente não é visto como uma desvantagem em outras situações. Pelo
contrário, é considerado absolutamente normal, como quando se está dirigindo,
ouvindo rádio, lendo outdoors, vendo os outros carros e a rodovia, conversando
com alguém, tudo simultâneo e sem distração aparente.

Realizam-se várias ações simultaneamente e sempre, e essa é uma


característica positiva de aparelho cognitivo humano, mas, por razões ainda
pouco explicadas, comportar-se assim em salas de aulas tradicionais é encarado
como um problema. Para LANGER (1989), as pessoas estão sempre em busca
de novidades, daí a necessidade de uma aula variar os focos de atenção, seja
para um novo objeto, seja para um novo assunto, para que a atividade seja bem
sucedida.

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Ela também argumenta que se espera dos alunos, erroneamente, um
estado de hipervigilância ideal, havendo grandes problemas relacionados à
síndrome de deficit de atenção e hiperatividade (ADHD), um distúrbio de
comportamento detectado em até 7% das crianças e até 4% dos adultos,
problemas esses que podem ser minimizados por meio adoção de uma
perspectiva atenta (mindful) nas atividades de ensino e aprendizagem;

3) é importante retardar as gratificações: ela explica que trabalhar e


estudar são vistos normalmente como atividades desagradáveis, e que são
acompanhados também da idéia da gratificação ocorrendo apenas no futuro; a
idéia normalmente presente é que, caso a pessoa aceite exercer agora
atividades áridas ou árduas, tais como estudar ou trabalhar, uma recompensa
virá no futuro, imediato ou remoto. O comportamento de buscar recompensas,
gerado nas crianças, pode ser altamente decepcionante para elas, uma vez que
é baseado em expectativas de que elas vão receber o que merecem, em um
mundo que não se caracteriza por ser previsível.

Um exemplo é o de que, quando alguém se aproxima de uma atividade


caracterizada como um jogo, o faz em geral de modo não avaliativo e mais
agradável. E o que torna a atividade mais agradável é exatamente o processo
de ir do desconhecido para o conhecido. Quanto mais opções existirem para
percorrer esse caminho, mais agradável e atraente torna-se o jogo. Por outro
lado, quando a mesma atividade é encarada como trabalho, tende a ser
encarada como tediosa e, consequentemente, tende a ser rejeitada.

4) memorizar é necessário em educação: esse mito é altamente


prejudicial para atividades de ensino e aprendizagem e para a vida como um
todo: estudantes pensam em passar em provas e testes desse modo, mas são
incapazes de contextualizar o conteúdo aprendido por esse meio. E
contextualizar é imprescindível. LANGER (1997) destacou em seus trabalhos
que:

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A escolha do caminho da memorização, no entanto, parece sobreviver
nas escolas por diferentes razões:

a) os professores preferem avaliar seus alunos com base em material


memorizado porque facilita suas avaliações;

b) acredita-se que certos assuntos (os considerados básicos)


precisam ser aprendidos (memorizados) antes que outros;

c) há um sentido geral de que a aceitação das verdades básicas do


mundo é necessária para manter a situação de estabilidade do mundo, o que
quer que isso venha significar;

d) os atuais professores também foram ensinados por meio de


memorizações, portanto consideram-na naturais, e tendem a ensinar do mesmo
modo como foram ensinados.

LANGER (1997) argumentou que a memorização é uma tentativa de se


aprender informações consideradas irrelevantes pelas pessoas, e defende que
tornar as informações relevantes para a pessoa removeria a necessidade de
memorização: assim elas seriam naturalmente incorporadas ao acervo de
conhecimentos do aluno;

5) esquecer é um problema: há uma verdade geralmente aceita de


que esquecer algo é negativo e deve ser evitado. Para LANGER (1997),
esquecer algo nos dá o prazer de re-experenciá-lo, e esquecer detalhes leva os
indivíduos a recriá-los, às vezes com melhorias, a partir de cenários novamente
concebidos. Mas também o “lembrar” pode ocorrer de dois modos:

a) atentamente (mindfully): caso em que a pessoa se habilita a ser


sensível ao contexto e a notar as particularidades das circunstâncias presentes:

22
b) desatentamente (mindlessly): caso em que, por aceitar os fatos e
fenômenos de modo desatento ou por tê-los apenas memorizado, tem-se mais
dificuldades em encará-las como livres do contexto apresentado.

A questão da memorização (e do esquecimento) tem ainda outra


conotação negativa na mentalidade vigente: esquecer é visto como uma falha,
como falta de inteligência ou como sinal de envelhecimento. Porque se aceita
que o envelhecimento leva a condições orgânicas degradadas que conduzem
ao esquecimento, o que é mais uma mentalidade do que uma verdade
cientificamente comprovada. E, ela observa, as mentalidades são assim: uma
vez aceito como tal, um fato dificilmente retorna para um processo de
reconsideração e de reavaliação.

As rígidas mentalidades que se aceita sobre si mesmo afetam os


desempenhos das pessoas, e as informações que lhes dão forma são aceitas
por elas despercebidamente em um período de suas vidas em que elas parecem
ser irrelevantes para suas preocupações imediatas. De acordo com trabalhos de
LANGER (1997):

6) inteligência é conhecer o que já existe (ou conhecer os fatos como


eles são): há um consenso de que se pode medir a inteligência pelo
conhecimento que a pessoa tem sobre o que já está colocado, ou seja, pelo seu
conhecimento da realidade externa já estabelecida. Muitas teorias da inteligência
(senão todas) assumem que há uma realidade absoluta colocada, e, portanto,

23
tanto maior a inteligência de alguém quanto maior sua consciência (ou
adaptação) sobre essa realidade. LANGER (1997) afirmou que:

A inteligência humana, vista por ela sob uma perspectiva evolucionária, é


uma habilidade de reter e organizar percepções, que aumenta nossas chances
de sobrevivência, e que as perspectivas impostas à nossa percepção não são
construtos arbitrariamente criados, mas uma resposta adaptativa determinada
pela evolução natural. Quanto mais nossos mapas conceituais correspondem às
contingências de nosso meio ambiente, maiores nossas chances de
sobrevivência.

Segundo trabalhos de LANGER (1997):

7) somente há respostas corretas ou erradas: isso decorre da crença


generalizada de que existem claramente o certo e o errado, de que a inteligência
repousa na ênfase de que há experts que sabem tudo e que respondem
sucintamente a qualquer pergunta. Há teóricos que assumem que o objetivo do
processo educacional é equipar os estudantes para que atinjam uma meta pré-
estabelecida e pré-especificada, o que é um equívoco, já que as metas
dependem dos contextos, e um bom resultado em um determinado contexto
pode não sê-lo em outro.

O mais importante é ensinar ao aluno um perfil de aprender a aprender, e


que essa meta-habilidade pode ser percebida no estudante por meio de sua
velocidade em aprender novas tarefas e sua habilidade em transferir um
aprendizado específico para outras tarefas relacionadas.

24
Na TAB. 15 estão resumidas as diferenças entre inteligências e
mindfullness:

O pensamento flexível é a essência da abordagem atenta (mindufulness),


flexibilidade essa que também pode ser considerada uma qualidade do
pensamento inteligente. Para ela, a inteligência consistiria em identificar as
estratégias e procedimentos que refletem otimamente o contexto de um
problema em particular, e a resposta de alguém a um problema não é uma
tentativa de realizar a melhor escolha entre várias opções disponíveis, mas de
criar opções.

Os métodos de ensino tradicionais valorizam a resolução de problemas,


ao invés de valorizarem a aquisição da meta-habilidade de aprender-a-aprender.
Testes de inteligência continuam a ser aplicados com foco concentrado
primeiramente nas habilidades de seccionar linhas ou avaliar diferentes volumes
e, mais tarde, aplicá- los à solução de problemas, mas melhor seria se
enfatizassem a habilidade em adquirir novas habilidades.

Quando estudantes são avaliados dessa forma, não tem a oportunidade


de escolher seus próprios objetivos, nem são autorizados a explorar processos
que estão fora do repertório de processos apresentados pelos experts.

25
LANGER (1997) destacou que o processo de decisão atento (mindful), em
oposição à tomada de decisões feita passivamente baseada em dados
montados por outros, é um processo ativo de auto-definição, evitando as
categorias fixas pré- estabelecidas por experts.

O processo atento (mindful) acolhe as incertezas, para aumentar as


chances de pensamento criativo, ao contrário dos processos de ensino
tradicionais, nos quais os estudantes são ensinados a ver os fatos como
imutáveis, representantes de verdades incondicionais.

Na TAB. 16 estão resumidas características dos sete mitos penetrantes


prejudiciais à cognição:

A teoria mindful learning considera ainda que há três características


inerentes a uma abordagem desatenta (mindless, no original), comumente
presente em atividades de ensino e aprendizagem, prejudicando-as, e que
devem ser combatidas. Também considera que há três características inerentes
a uma abordagem atenta (mindful, no original) que são altamente desejáveis em
atividades de ensino e aprendizagem, favorecendo-as, e que devem ser
estimuladas.

Essas características são relacionadas na TAB. 17.

26
Práticas Meditativas: contribuição à aprendizagem

Ao pensarmos em prática meditativa nos vem à mente a imagem de uma


pessoa sentada com as pernas cruzadas, as mãos sobre os joelhos, os olhos
cerrados e um ar de tranquilidade.

As práticas meditativas são frequentemente associadas à Índia e podem


ser encontradas em várias religiões e culturas como, por exemplo, no taoismo,
nas diversas yogas, na cabala, no islamismo e no budismo (SHAPIRO; WALSH,
2006; REMPEL 2012).

As práticas meditativas são tradicionais nas culturas orientais, mas a partir


da década de 1960 elas passaram a ganhar força no Ocidente e, sobretudo, nos
últimos 15 anos, quando inúmeras pesquisas passaram a indicar os efeitos
benéficos, para a saúde e o bem-estar, da realização constante dessas práticas
(MENEZES; DELL’AGLIO, 2009; REMPEL, 2012).

A prática meditativa pode ser definida de diversas formas, mas pode ser
caracterizada, basicamente, como práticas de autorregulação focadas no
treinamento da atenção e consciência, a fim de promover maior controle
voluntário pelo indivíduo, permitindo o desenvolvimento de capacidades como a

27
calma, a clareza e a concentração, focando sua atenção em um propósito, no
momento presente e sem julgamentos (SHAPIRO; WALSH, 2006; MENEZES;
DELL’AGLIO, 2009; REMPEL, 2012).

Dessa forma, ao nos referirmos ás práticas meditativas, estamos


englobando práticas como yoga e Tai Chi que incorporam meditação. No
entanto, essas práticas também incluem elementos adicionais, tais como a
respiração controlada e posturas corporais (yoga), ou movimento do corpo e a
manipulação de energia (Tai Chi) (SHAPIRO; WALSH, 2006).

Apesar de terem características comuns, as práticas meditativas diferem


em termos de: a) foco de atenção (objeto, respiração, som interno); b) relação
com processos cognitivos (observação dos pensamentos ou tentativa também
de modificá-los); e c) objetivo (fomento ao desenvolvimento mental e sua
melhoria, concentração, amor, sabedoria) (SHAPIRO; WALSH, 2006).

De acordo com Menezes e Dell’Aglio (2009), a prática meditativa pode ser


dividida em duas formas principais:

Segundo Stevens (2010), existe dois tipos de prática meditativa: ativa e


passiva. Na meditação passiva você se senta por algum tempo e pratica alguma
forma de contemplação ou introspecção, como ocorre na Meditação
Transcendental (MT), Siddha Yoga, Raja Yoga e em inúmeras práticas
meditativas. O objetivo da meditação passiva é ajudar a acalmar a mente e torná-
la atenta.

Já a meditação ativa é quando o meditador continua em suas atividades


diárias e começa a desenvolver sua autoidentidade, incluindo, no seu cotidiano,
a prática constante da consciência plena em suas ações (STEVENS, 2010).

28
As práticas meditativas mais pesquisadas atualmente são Meditação
Mindfulness (MM) e Meditação Transcendental (MT), ambas são meditações
passivas.

Mindfulness é uma prática meditativa de tradição budista que consiste em


manter a atenção de forma plena e intencional no momento presente e sem
julgamentos (REMPEL, 2012). De acordo com Napoli et al. (2005), os principais
elementos de MM incluem o foco na respiração, a capacidade de entrar em
sintonia com os eventos que ocorrem dentro do corpo e da mente e o ato de ser
um testemunho da sua própria experiência.

Meditação Transcendental é uma técnica simples, sem esforço, que não


envolve concentração ou controle da mente, não é uma religião e não requer
nenhuma alteração no estilo de vida. Consiste apenas em se sentar
confortavelmente com os olhos fechados durante 20 minutos duas vezes ao dia
com a recitação mental de um mantra (ORNE-JOHNSON et al., 2001).

Os estudos sobre práticas meditativas investigam os seus efeitos em


diversos contextos, como na saúde mental e física, incluindo o impacto dessas
sobre os processos cognitivos.

As pesquisas mostram que cada uma dessas práticas produz efeitos


diferentes, mas, de maneira geral, são observadas melhoras em quadros de
distúrbios cardiovasculares, asma, diabetes tipo 2, fibromialgia, na função
imunológica em pacientes com câncer, entre outros (SHAPIRO; WALSH, 2006).

As práticas meditativas também apresentaram efeitos psicoterapêuticos


benéficos sobre a insônia, alimentação, ansiedade, pânico e fobias (SHAPIRO;
WALSH, 2006).

No campo da cognição, os estudos têm apontado que a prática meditativa


pode influenciar positivamente alguns sistemas cognitivos e estilos de
pensamento.

29
Orne-Johnson et al. (2001) desenvolveram três experimentos aleatórios
sobre os efeitos longitudinais das técnicas de MT na cognição. Nesses,
observou-se uma série de mudanças fisiológicas durante essa prática meditativa
que prediz melhoria cognitiva, tais como o aumento do fluxo sanguíneo no
cérebro e o efeito sobre parâmetros do eletroencefalograma que estão
correlacionados à melhoria cognitiva.

Nesse estudo também foi observada, durante a meditação e após a


meditação, uma redução do hormônio cortisol, que é liberado em situações de
estresse. A relevância dessa redução de cortisol para a cognição é que vários
estudos têm mostrado que o aumento do nível desse hormônio prejudica a
memória, e o prolongado nível de cortisol elevado pode induzir atrofia
hipocampal associada com déficits nas tarefas de memória dependente do
hipocampo.

Assim, as práticas meditativas geram alterações que envolvem ações no


Sistema Nervoso Autônomo/Hipotálamo com repercussões sobre várias funções
cerebrais/cognitivas.

A respiração é um elemento chave do processo que envolve práticas


meditativas (NAPOLI et al., 2005; ZYLOWSKA et al., 2007). Estudos mostram a
sua importância para regular o sistema nervoso autônomo, focar a mente e
aumentar o autoconhecimento, pois a capacidade de focar a atenção na
respiração é uma forma simples e efetiva de ativar concentração, consciência e
relaxamento, alterando os padrões de funcionamento cerebral e corporal
(RICHHART; PERKINS, 2000; NAPOLI et al., 2005).

30
O estresse não é um fenômeno circunscrito ao cotidiano dos adultos. As
crianças e adolescentes têm experimentado, cada vez mais e mais cedo, o
estresse (RICHHART; PERKINS, 2000; BARNES et al., 2003; NAPOLI et al.,
2005;

ZYLOWSKA et al., 2007). Crianças e adolescentes convivem


constantemente com inúmeras informações e estímulos visuais, sonoros e
sensoriais que, além de contribuírem para o estresse, podem influenciar na
atenção e aprendizado desses indivíduos (RICHHART; PERKINS, 2000;
BARNES et al., 2003; NAPOLI et al., 2005).

Barnes et al. (2003) sugerem que a alta prevalência de comportamentos


negativos na escola é devida à maior exposição ao estresse psicossocial crônico,
recursos econômicos inadequados, desintegração familiar, sobrecarga de
informação e violência da mídia. Esses fatores em conjunto resultam no aumento
da raiva e da violência em crianças e adolescentes, correlacionados com um
aumento nos níveis de ansiedade e estresse.

Os níveis aumentados de estresse resultam em ansiedade, depressão,


comportamentos de externalização, baixa autoestima e autoconfiança, podendo
influenciar negativamente o desempenho escolar e dificultando a aprendizagem
dos alunos. Quando crianças e jovens lidam com problemas relacionados à
saúde mental, eles estão mais suscetíveis a reagir a qualquer tipo de estímulo,
resultando no aumento da distração, na falta de organização e na falta de
capacidade de se concentrar em tarefas específicas (REMPEL, 2012).

Diante disso, o papel das escolas no mundo contemporâneo ultrapassa a


tarefa de ensinar disciplinas e conteúdos, incorporando a tarefa de fornecer
oportunidades para que seus alunos desenvolvam estratégias que lhes
possibilitem conviver e lidar no mundo em que vivem (REMPEL, 2012). Por isso
muitas escolas têm trabalhado em programas que visam promover a inteligência
emocional de seus alunos, deixando de focar apenas nos aspectos acadêmicos
do aprendizado.

Historicamente, as crianças são ensinadas a memorizar um conteúdo e


ver o que é apresentado na sala de aula pela perspectiva do professor. Essa
forma de ensinar torna os nossos alunos prisioneiros do hábito de ver as coisas

31
sempre da mesma forma, deixando de levar em conta parte da sua experiência
pessoal. Esse processo limita a integração de um novo conteúdo ao antigo,
limitando também o aprendizado de crianças e adolescentes. O que pode ser
mudado a partir das práticas meditativas, que propiciam a capacidade de
perceber outros aspectos. (RICHHART; PERKINS, 2000; MEIKLEJOHN et al.,
2012; REMPEL, 2012).

O estudo realizado por Napoli et al. (2005) indica que a incorporação de


práticas meditativas no currículo escolar está associada à melhoria do
desempenho acadêmico, da autoestima, do humor, da concentração e de
problemas de comportamento. Assim, o currículo escolar, que antes, em sua
maioria, sufocava a criatividade, a curiosidade e o entusiasmo através da
passividade e do aprendizado superficial, passa então a estimular a criatividade,
a flexibilidade, o uso e a retenção de informações, possibilitando um aprendizado
mais significativo (RITCHHART; PERKINS, 2000). As práticas meditativas
seriam uma das estratégias que podem contribuir para isso.

A atenção é das funções mentais fundamentais para outras funções


cognitivas e neuropsicológicas no nosso estilo de vida – aonde a multitarefa
tornou- se norma. As crianças também exercem multitarefas, enfrentando a
sobrecarga de informações, pois assistem a horas de televisão, navegam na
internet e jogam videogames – muitas vezes, simultaneamente (RITCHHART;
PERKINS, 2000). Pesquisas indicam que a atenção da criança para uma
informação específica depende da importância que coloca na informação e que
as crianças, em estados mais avançados de desenvolvimento, têm capacidade
maior de controlar a sua atenção seletiva (RITCHHART; PERKINS, 2000).

Napoli et al. (2005) apontam que as escolas que ensinam práticas


meditativas dão uma ênfase maior à influência recíproca entre alunos e
professores e exercitam mais essa parceria no processo de aprendizagem, o
que gera benefícios como o aumento da criatividade, maior flexibilidade
cognitiva, melhor utilização da informação, maior atenção e melhor retenção na
memória do que foi aprendido.

A prática de yoga demonstrou facilitar funções mentais como memória


visio espacial, atenção e concentração (MANJUNATH et al., 2001). O estudo

32
avaliou o desempenho no teste da Torre de Londres após treino de yoga com 20
meninas, com idade entre 10 e 13 anos, de uma escola residencial na Índia, e
verificou a influência dos dois componentes da yoga – aumento da atividade
física e instruções para relaxar – no desempenho do teste (MANJUNATH et al.,
2001).

O teste da Torre de Londres requer que o sujeito mova peças coloridas


em três eixos verticais para corresponder a um arranjo objetivo específico. Para
cada sujeito, objetivos cada vez mais complexos foram criados, de modo que um
sujeito tinha que completar três tarefas, o primeiro exigindo dois movimentos
para alcançar a meta, o segundo 4 movimentos, e o terceiro 5 movimentos. Os
indivíduos foram avaliados com base no tempo, o tempo de execução e número
de movimentos planejados.

Os resultados apontaram para uma diminuição significativa no tempo de


planejamento de movimentos, de execução e no número de movimentos no teste
da Torre de Londres. A melhoria no tempo de execução sugere que yoga
melhora o estado de alerta, como resultado de que um movimento errado foi
rapidamente percebido e um novo movimento feito sem muita demora
(MANJUNATH et al., 2001).

Os resultados encontrados nas pesquisas sugerem que as práticas


meditativas podem influenciar na redução do estresse, controle dos impulsos,
melhora da atenção, autoconfiança, autoestima, relacionamento com os outros
e desempenho cognitivo e acadêmico. Também podem ser observadas
alterações comportamentais relatadas pelos alunos e professores como maior
capacidade de relaxamento, controle do seu comportamento, foco e atenção e
melhoria do sono (REMPEL, 2012).

Assim, se os estudantes tiverem oportunidade de incorporar práticas


meditativas no seu cotidiano, eles poderiam regular melhor seu foco de atenção
e suas respostas a situações de estresse, estando mais presentes nas
oportunidades que a escola oferece para aprendizagem, aumentando a
qualidade de sua aprendizagem. Quando um aluno está mais atento sobre si e
seu meio, ele se torna capaz de abordar situações de aprendizagem a partir de

33
uma nova perspectiva ao refletir sobre informações de um material previamente
aprendido.

O uso de práticas meditativas como estratégia complementar ao processo


de aprendizagem pode possibilitar uma aprendizagem mais eficiente e mais
significativa, além melhorar as relações dentro do espaço escolar entre alunos e
professores, reduzindo o estresse e os comportamentos violentos.

Assim, a presente revisão integrativa possibilitará identificar como as


práticas meditativas têm sido incluídas no contexto escolar, os benefícios que
produzem no processo de aprendizagem e quais as lacunas e dificuldades
enfrentadas na inserção de tais práticas nas escolas.

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