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Söering vs UK
Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
Ano 2016/2017
Questão de facto
Questão de direito
Pactos de Extradição
Ao longo deste acórdão são falados no seu decorrer de dois grandes pactos de
extradição, primeiramente entre o Reino Unido e os E.U.A; e entre o Reino Unido e a
República Federal Alemã.
Entre o Reino Unido e os E.U.A vemos o Extradition Treaty of 1972, com o
Supplementary Treaty de 25 de junho de 1982, incorporado na “Orders in Council”, no
qual o seu art. 1º indica que cada Parte Contratante deve proceder à extradição, nas
circunstâncias e matérias específicas neste tratado, de qualquer pessoa que se encontre no
território e que esteja a ser acusada e arguida de qualquer ofensa (caracterizada neste
tratado e incluindo o crime de homicídio) e, que seja cometida na jurisdição nessa Parte
Contratante, em que vincula os dois estados a uma relação de aproximação, sendo este
tratado baseado no Extradition Act of 1870 que irá influenciar o tratado mais recente em
muitas das vias processuais.
Assim, esta extradição tem lugar após uma avaliação de um magistrado que indique
que as provas presentes em certos casos que sejam prejudiciais tanto no Reino Unido,
como também, nos E.U.A e se demonstre a culpa do agente este poderá dar o deferimento
e assim proceder à extradição, podendo existir algumas alterações nos prazos caso ocorra
um pedido de habeas corpus ou quando o próprio arguido se rende e se entrega às
autoridades.
Continuando neste ato de extradição, verificamos algumas situações específicas
quanto às situações relativas ao crime de homicídio no qual o país que faz o pedido de
extradição e a pena que pretende aplicar face ao ilícito praticado seja a pena de morte, o
país que terá de proceder à extradição caso não tenha a pena de morte como uma das
penas a aplicar poderá recusar o pedido de extradição feito, com a ressalva caso a parte
requisitora assegure que após a extradição do agente não será aplicada a pena de morte.
Caso ocorra uma situação em que é pedido a uma das Partes a extradição de um
agente ou pela mesma ofensa ou por ofensa diversa cabe à Parte requisitada decidir a
quem entregará o agente com base no ART. X do Extradition Treaty entre o Reino unido
e os E.U.A, ponderando aspetos como o território em que o crime ocorreu, como a
nacionalidade do agente e até mesmo o sistema penal nos países envolventes devido à
aplicação da sanção em cada um dos Estados.
Quanto às relações internacionais entre o Reino Unido e a República Federal Alemã,
verificamos a existência do Treaty of 14 may 1872, realizado entre o Reino Unido e as
duas Repúblicas que dividem a Alemanha, que controla a matéria “Mutual Surrender of
Fugitive Criminals”, ou seja todos os casos em que os agentes que se declarem culpados
e se entreguem às autoridades após uma fuga posterior ao crime, sendo reforçado pelo
“Exchange of Notes 25 and 27 september, 1978 que se incide apenas na República Federal
Alemã. Sendo, assim inserido na lei inglesa no Orders in Council e na própria República
Federal Alemã na Order, 1978 S.I.
Dado isto, com os dados fornecidos dentro dos pactos de extradição, cabe o papel
de decisão ao Reino Unido, de extraditar o agente para o país que melhor responda ao
caso e que garanta de melhor forma os direitos do agente.
No caso em concreto, a decisão é tomada a favor dos E.U.A, após a garantia que a
pena de morte não seria aplicada, segundo o art.10 do pacto de extradição, no entanto
após a transferência do arguido, este iria ser inserido no centro hospitalar em que os
condenados à morte são internados, de modo a preparar o individuo para a morte.
Recurso à Comissão Europeia
Com a sua possível transferência para os E.U.A, Söering apercebe-se que está
prestes a ser condenado à morte e, como tal indica que o incumprimento por parte dos
E.U.A em relação do art.10 do tratado de extradição com o Reino Unido e o tratamento
em que se encontra sujeito, sendo este desumano e degradante vai contra o Art. 3 da
Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), referente à proibição de tortura,
no qual ninguém poderá ser submetido a nenhum tipo de tortura e condenado a penas
consideradas desumanas e degradantes; o art. 6, nº3 c), no qual cada pessoa tem o direito
de se defender ou ter a assistência de um defensor à sua escolha e, caso não possa pagar
um defensor terá que lhe ser atribuído um defensor oficioso caso os interesses de justiça
os exijam, o que acontece nesta situação demonstra uma grande violação dos E.U.A para
com esta norma pois o auxílio para os arguidos no Estado de Virginia exigem diversos
procedimentos de apelo e, por último a violação do disposto do art. 13 que implica um
direito a recurso numa instância nacional quando os seus direitos e liberdades
reconhecidos pela Convenção se verifiquem violados.
Por sua vez, no texto do art. 3, o arguido recorre à Comissão devido à (não) atuação
do Reino Unido, mostrando consentimento das práticas feitas pelos E.U.A posteriormente
à sua extradição.
Assim, após o pedido de avaliação por parte da Comissão, das normas indicadas por
Söering, esta declara uma violação do art. 3, contudo não é verificado nenhuma violação
do art. 13 e do disposto do art.6, nº 3 c).
Relativamente ao art.3 da Convenção, o arguido invoca a violação desta disposição
por parte do Reino Unido, após a decisão do Secretário de Estado que o decide entregar
aos E.U.A, assim levará à tal violação deste disposto, que implica a proibição à tortura e
tratamento que firam a dignidade humana, ao internar o arguido no centro hospitalar
indicado para a preparação para a morte, usando o termo “death row phenomenon”.
Como tal, é necessário verificar a aplicabilidade do art.3 da Convenção em casos de
extradição assim, como ainda agora foi referido, verifica-se uma violação deste artigo
com o “death row phenomenon”, procedimento de preparação para quem irá enfrentar
uma pena de morte sendo uma conduta que desrespeita por completo a dignidade da
pessoa humana fora a tortura que é incitada no agente.
Não obstante, à violação direta, o arguido fez um bom trabalho ao alegar uma
violação indireta do disposto em causa, isto no sentido de que quando as partes
contratantes da própria Convenção sujeitarem um indivíduo a um ambiente propício ou
certo de que maus tratos e torturas irão ocorrer, tal comportamento levará à violação, a
que o Reino Unido responde baseando-se que caso a violação decorra após a extradição
do agente, não se deve responsabilizar a ação de um país estrangeiro que pode não fazer
parte da própria Convenção, pois a própria extradição deverá limitar as responsabilidades
do país que entrega o criminoso, pois este já não terá algum controlo do que poderá
acontecer na jurisdição de um outro país.
No entanto, com estas alegações, recorrendo ao art.5, nº1 f) da Convenção, que nos
remete para o direito à liberdade e à segurança, exceto certas ocasiões, sendo uma delas
os casos em que ocorrem processos de extradição e de expulsão de um dado território, no
qual todas as exigências da Convenção para com uma parte contratante passarão para o
país que recebe o extraditado, daí que as violações para com o art.3º serão aplicadas para
com o país que extraditou o agente, sendo este o Reino Unido, isto porque dentro dos
próprios pactos de extradição a parte contratante poderá não proceder à entrega do agente
caso não sejam cumpridas as exigências para com os direitos da Convenção e da própria
jurisdição do país. Por outro lado, caso a extradição se realize por existirem garantias de
que os direitos do indivíduo serão salvaguardados mas caso a ação do Estado de Virginia
não seja a adequada, visto que pode não respeitar o disposto do pacto de extradição com
o Reino Unido e assim violar o art. da Convenção em causa. Posto isto, não se poderá
absolver o Reino Unido das consequências advindas da extradição que provocou.
Quanto a esta mesma disposição, de modo a perceber melhor a sua própria
aplicabilidade, cabe avaliar a situação do caso em concreto, de modo a entender até que
ponto poderá ocorrer uma violação ou não do art.3.
Primeiramente é necessário avaliar este disposto no sentido da existência de um
risco real de uma sentença de morte e consequências conseguidas de um “death row
phenomenon”.
Após o disposto do Governo da RFA, no qual indica que todo o procedimento de
extradição ocorrido viola o art.3º, devido ao facto de não haver garantias de que o arguido
seria tratado dentro de um sistema minimamente digno de um ser humano e,
consequentemente, por não existir uma garantia de que a pena de morte não seria aplicada.
Em resposta, o governo do Reino Unido evidencia quatro pontos de modo a
demonstrar que este disposto não sofre algum desrespeito caso se proceda à extradição:
O próprio agente, não tem conhecimento do seu grau de culpa, facto importante e
necessário para haver uma determinação e aplicação de pena de morte;
Após a leitura dos ensaios psicológicos feitos a Söering, é certo que este sofre de
distúrbios psicológicos o que cria uma defesa perante a lei do Estado de Virginia;
O agente nunca poderá ter noção do tipo de homicídio que cometeu em correlação
com a pena a aplicar, pois quem o irá definir será o júri após a verificação dos factos do
crime e, por conseguinte da sua idade, estado psíquico, antecedência criminal;
A garantia dada ao Governo do Reino Unido tem de ser tida em conta até ao último
de modo a diminuir o risco da ação e, por sua vez a decisão da pena a aplicar;
Ainda é mais dito, no que toca à pena de morte, isto porque esta só é aplicada para
além das razões anteriormente ditas, é necessário que exista uma crença de maldade de
perigosidade no agente para que a morte seja a sentença a aplicar.
Por fim, quanto a este ponto, o defensor do arguido vem referir que todas as razões
apresentadas pelo Governo do Reino Unido poderão não surtir o efeito pretendido,
principalmente ao facto do júri não ter o conhecimento entre os acordos de extradição
entre os dois países e da garantia feita pelos E.U.A para a não aplicação da pena de morte,
o que leva a todos a aplicação do “death row phenomenon” não protegendo assim o
arguido de qualquer maneira.
De seguida, cabe agora verificar até que ponto expor o agente ao “death row
phenomenon” será uma violação ao art.3 da Convenção. Numa maneira geral, a maneira
de como se deve tratar este artigo deve assentar numa severidade mínima, que varia com
as diversas circunstancias dos casos como os factos que o constituem, como a gravidade,
idade das vítimas, estado mental do agente entre outros. Contudo, este fenómeno advém
de uma preparação para a aplicação da pena de morte, no qual é possível segundo o
disposto do art.2, nº1 da Convenção, o que implica que a violação para com o art.3 não
seja assim tão visível, visto que os riscos para com a pena de morte não são motivo direto
para que se apreciem estes dois artigos, contudo a Amnistia Internacional indica, após
assinatura de toda a zona ocidental europeia, que estes países consideram a pena de morte
um castigo desumano e degradante para os seres humanos e como tal esta deve ter em
conta o art.3 ao ser aplicada.
Relativamente às circunstâncias particulares ao caso, Söering alega a violação
deste disposto devido ao grande trauma psicológico que poderá adquirir após o
internamento no centro prisional de Mecklenburg, onde espera ser vítima de violência e
abusos sexuais, devido à sua nacionalidade, cor de pele, idade entre outros aspetos o que
o leva a realizar um pedido de deportação ou extradição para o seu país natal.
Uma vez mais, a República Federal Alemã defende a ideia que todo este processo e
a própria pena de morte são comportamentos desumanos para qualquer pessoa. Por outro
lado, o Reino Unido defende a ideia de que o art.3 mais não se encontra violado,
apresentando este último razões que o justifiquem nas circunstâncias presentes no caso.
i) em primeiro, referem-se do tempo de detenção até ao tempo de execução, no
qual indicam que o tempo de detenção e de preparação para a execução de pena
demora entre 6 a 8 anos no qual o arguido poderá suspender através de vários
mecanismos presentes na lei do Estado de Virginia;
ii) em segundo, no que toca ao centro prisional e ao “death row phenomenon” este
não implica uma tortura para o agente devido à sua grande qualidade de serviços e
prestação médica que apoiam os condenados para uma aceitação mais composta da
pena que serão aplicadas, apesar do grande risco de abusos que o arguido poderá ser
alvo, ainda assim este apoio poderá ser benéfico nesse ponto.
iii) em terceiro, é estudada a idade do agente e o estado da sua saúdas mental dois
factores importantes para o processo em si, no qual indicam a idade do agente na
altura do ilicit, sendo esta 18 anos o que leva a indicar o art.4 do American Convention
on Human Rights, 1969 que proíbe expressamente a pena de morte para pessoas
menores do que 18 anos na altura da prática do crime. Assim, os indivíduos que
tenham 18 anos ou mais poderão ser sentenciados com a pena de morte o que nada
vai contra ao disposto do art. 2º da Convenção Europeia, no entanto a juventude e o
estado mental, por sua vez pode prejudicar a concordância para com o art. 3º. Os dois
Estados, não descuidam estes fatos até porque o próprio Estado de Virginia, trata a
saúde mental dos arguidos e, além do mais, a própria saúde mental pode levar um júri
a considerá-la insanidade ou facto atenuante de pena o que impossibilita a aplicação
da pena de morte, o que leva a descrer a incompatibilidade para com o art.3º da
Convenção.
iv) por último, quanto à extradição ou deportação de Söering para a República
Federal Alemã, onde a pena de morte foi abolida, não é material suficiente para
realizar uma proposta, até porque o próprio Reino Unido criou garantias que ao
extraditar o arguido este teria garantias que os seus direitos inseridos na Convenção
Europeia dos Direitos do Homem seriam balançados perante todo o processo
realizado no Estado de Virginia.
Com estas razões, é dado como conclusão que a todos os condenados à morte, ao
longo do período entre a imposição e execução de pena, estes indivíduos são sujeitos a
um extremo stress e a condições mais intensas mas que são necessárias e inevitáveis.
Aqui a Comissão define que todo o sistema americano a que Söering se irá
submeter, não é um sistema arbitrário e sem fundamento, pois respeita todos os trâmites
exigidos pela lei de modo melhor fazer face a este mesmo sistema.
Por outro lado, devido ao grande período de espera e preparação para a execução da
pena promovem tratamentos de alto rico para o agente devido aos riscos evidentes dentro
do próprio centro prisional como também a um cenário negro para Söering que poderá
danificar imensamente todo o seu estado psicológico, o que leva a uma aceitação de uma
violação do art.3º da Convenção por parte dos E.U.A.
Quanto ao art.6 da Convenção para averiguar se existe ou não uma violação é feita
uma análise tanto dos procedimentos criminais dos E.U.A.
Aqui o arguido indica que caso retorne para os E.U.A não cria uma responsabilidade
para com o Governo do Reino Unido perante o art.6º, nº3 c) da Convenção, pois este
artigo concede a definição de um julgamento justo num espaço em que haja uma
democracia dominante e, juntamente com todos os factos apurados, é impossível alegar
que os E.U.A não procederão a um julgamento justo e digno para o agente.
Por último, quanto à alegação de uma violação do art.13º da Convenção, a Comissão
não apoia qualquer tipo de violação, como também o Governo do Reino Unido pois não
cabe alguma situação no caso para que este artigo venha ao de cima, isto porque não
existe nenhuma mudança entre o pacto de extradição entre o Reino Unido e os E.U.A.
que leve a uma violação deste artigo de natureza antecipada.
Assim, nada é dito contra com os argumentos do próprio Reino Unido, pois existem
algumas possibilidades de recursos e também o habeas corpus que permitem ao arguido
defender as suas liberdades e direitos.
Em suma, é decidido e definido que quanto ao artigo 3º da Convenção, ocorre uma
violação devido à decisão do Secretário de Estado extraditar o arguido para os E.U.A.
Não ocorre qualquer violação para com o art. 6º, nº3 c) nem para com o artigo 6º,
nº1 e nº3 d) devido a não existirem situações fácticas que as suportem.
E, por fim, quanto ao artigo 13º, mais uma vez como a razão anterior nada suporta
que possa ocorrer, ou que seja plausível proceder a uma violação. Cabendo assim, ao
Governo do Reino Unido pagar as custas processuais.
Conclusão