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Camila Távora e Érica Batalha EMERGÊNCIA

AULA 03: AVALIAÇÃO E TRATAMENTO DA DOR ABDOMINAL

INTRODUÇÃO

EPIDEMIOLOGIA .
● Queixa comum
● Representa ~8% das consultas na emergência nos EUA
● Diagnóstico desafiador
● Sintomas variáveis
● Intensidade NÃO está correlacionada com a gravidade
● >40% dos pacientes apresentam diagnóstico de “dor não específica”
Atenção! Valorizar a queixa e atenção especial a idosos, imunocomprometidos e mulheres em idade fértil

CLASSIFICAÇÃO .
1. QUANTO À FISIOPATOLOGIA
VISCERAL
● Conduzida por fibras C autonômicas aferentes não mielinizadas bilaterais
● Etiologia: Distensão de cápsulas ou vísceras ocas (dor em “cólica”)
● Características:
Dor difusa, instalação lenta e difícil caracterização
Intermitente, cólicas, contrações, abdômen “dolorido”
● Sintomas sistêmicos: Náuseas, vômitos, diaforese e taquicardia
● Localização de acordo com a origem embrionária

Tipos de cólicas para órgãos abdominais.


Observe que a intensidade pode variar, mas o padrão de períodos
de melhora e piora é constante → caráter em cólica (“vai e volta”)

PARIETAL OU SOMÁTICA
● Conduzida por fibras C e A delta mielinizadas unilaterais (inervação da parede abdominal)
● Etiologia: Irritação peritoneal
● Características:
Início agudo, bem localizada
Constante, intensa, caráter em pontada
● Localização de acordo com os dermátomos da parede acometida

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REFERIDA
● Paciente refere dor longe da origem causadora
● Causada por inervação comum de diferentes órgãos/regiões que leva à interpretação cerebral “errada”
● “De fora para dentro” → foco de dor é fora do abd, mas é sentida NO abd (Ex: IAM gerando dor
epigástrica)
● “De dentro pra fora” → origem da dor é no abd, paciente sente em outro local (Ex: sinal de Kehr → dor na
ponta do ombro na presença de sangue irritando cavidade peritoneal)
2. QUANTO À ANATOMIA
INTRA-ABDOMINAL x EXTRA-ABDOMINAL

ETIOLOGIA

DOR DIFUSA .
● Peritonite ● Gastroenterite
● Pancreatite aguda ● Dissecção ou ruptura de aneurisma de aorta
● Anemia falciforme ● Obstrução intestinal
● Fase inicial da apendicite aguda ● Cetoacidose diabética
● Trombose mesentérica ● Porfiria intermitente aguda

DOR NO QUADRANTE SUPERIOR DIREITO .


● Vesícula biliar (cólica, infecção) ● Apendicite retrocecal
● Fígado (hepatomegalia, hepatite, abscesso) ● Herpes-zóster
● Úlcera duodenal perfurada ● Isquemia miocárdica
● Pancreatite aguda (dor também afeta ● Pneumonia base direita
quadrante esquerdo) ● Abscesso subdiafragmático

DOR NO QUADRANTE SUPERIOR ESQUERD0 .


● Dispepsia ● Herpes zóster
● Pancreatite ● Isquemia miocárdica
● Baço (aumento, ruptura, abscesso) ● Pneumonia de base esquerda
● Abscesso subdiafragmático

DOR NO QUADRANTE INFERIOR DIREITO .


● Apendicite ● Síndrome de Mittelschmerz ou dor da
● Afecções de íleo distal (tuberculose, linfoma, ovulação
doença de Crohn) ● Endometriose
● Divertículo de Meckel ● Cálculo ureteral
● Diverticulite cecal ● Abscesso de psoas
● Hematoma de parede abdominal ● Adenite mesentérica
● Gravidez ectópica rota ● Hérnia inguinal
● Torção ou ruptura de cisto de ovário ● Infecção urinária
● Doença inflamatória pélvica (DIP) ● CA de cólon

DOR NO QUADRANTE INFERIOR ESQUERDO .


● Diverticulite de sigmoide ● Endometriose
● Hematoma de parede abdominal ● Cálculo ureteral
● Gravidez ectópica rota ● Abscesso de psoas
● Torção ou ruptura de cisto de ovário ● Hérnia inguinal
● DIP ● Infecção urinária
● Síndrome de Mittelschmerz ● Doença inflamatória intestinal (DII)

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ABORDAGEM DA DOR ABDOMINAL

Anamnese
Exame físico
Estabilização (estável x instável)
Definição de necessidade de cirurgia
Diagnóstico
Tratamento

ANAMNESE .
CARACTERIZAÇÃO DA DOR → FAZER “QILTE F2 ADC”
● Qualidade da dor
● Intensidade (escala 0-10)
● Localização
● Tempo de instalação e duração
● Extensão
● F2: fatores de piora e fatores de melhora
● Associação com outros sintomas (vômitos, febre, parestesia…)
● Dimensão: impacto da dor nas atividades de vida
● Contexto: Idade do paciente, sexo, etnia, de que forma surgiu (contexto em que o paciente está inserido)
Hey! Quando mais rápida a instalação e menor a duração (quadro agudo) → mais chances de ser cirúrgica.

QUESTIONAR
● Uso de medicamentos
● Cirurgias prévias
● Patologias prévias
● Traumas recentes
● Viagens
● Uso de drogas ilícitas

Hey! Se dor recorrente, normalmente é não cirúrgica. Pensar nos 3P’s: pancreatite, porfiria, psiquiátrica.

EXAME FÍSICO .
SINAIS VITAIS
● Febre ou hipotermia
● Taquicardia
● Hipotensão
● SatO2

EXAME FÍSICO
EXAME FÍSICO GERAL
● Ectoscopia
● Exame cardiopulmonar
● Exame dorsal (sinal de Giordano)
● Extremidades

EXAME FÍSICO ABDOMINAL


● Inspeção → Ausculta → Palpação superficial e profunda → Percussão
● Rigidez abdominal: defesa voluntária ou involuntária?

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● Toque retal → Realizar quando: hemorragias, obstrução, necessidade de avaliar próstata e exame
perirenal
● Sinal de Blumberg (dor à descompressão brusca no ponto de McBurney → pronto que liga o terço lateral
ao terço médio de uma linha imaginária entre cicatriz umbilical e crista ilíaca dividida em 3)

● Sinal de Rovsing: palpação do quadrante inferior esquerdo do abd levando à dor no abdômen direito (na
prática, utiliza-se a mão com punho fechado para deslocar o ar do cólon descendente pro ascendente
retogradamente)

● Sinal do Obturador: dor provocada por rotação interna passiva da coxa flexionada (“joelho pra dentro, pé
pra fora”) → sinal de irritação do m. obturador interno, pode sugerir apendicite aguda

● Sinal do Psoas: dor provocada à extensão passiva do quadril, com o paciente em decúbito lateral

● Sinal de Murphy: interrupção da inspiração à palpação do ponto cístico

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● Teste de Carnett: avalia a resposta da dor quando o paciente tensiona os músculos da parede abdominal
tentando levantar a cabeça da maca (útil para diferenciar origem da dor):
Se piora da dor → teste positivo → origem na parede abdominal
Se melhora da dor → teste negativo → provável origem visceral (causa da dor é intraabdominal)

EXAME PÉLVICO E GENITAL


● Dor à mobilização do útero
● Sinais de torção testicular, epididimite
● Hérnias inguinais

ABDOME AGUDO .
DEFINIÇÃO
“Dor abdominal intensa de etiologia pouco clara, com duração de várias horas, podendo indicar uma
condição intra-abdominal progressiva que ameaça a vida ou é capaz de causar morbidade grave. A admissão
hospitalar é geralmente necessária e a cirurgia operatória é o resultado mais provável.”

💀👀SINAIS DE ALARME
● Início súbito de intensidade máxima desde o início ou rápida progressão
● Sinais de má perfusão periférica ou instabilidade hemodinâmica
● Dor que precede vômitos
● Febre
● >65 anos → sintomas vagos, apresentações atípicas e tardias e manutenção de sinais vitais inalterados
inicialmente
● Imunossupressão → sintomas vagos, apresentações atípicas e tardias
● Etilismo → aumenta o risco de pancreatite, hepatite e cirrose
● DCV → pode indicar comprometimento arterial em artérias mesentéricas ou aneurisma de aorta
● Cirurgia abdominal recente → risco de perfuração ou obstrução
● Início de gravidez → risco de gravidez ectópica
● Sinais de irritação peritoneal

CAUSAS CIRÚRGICAS X NÃO CIRÚRGICAS DE DOR ABDOMINAL

DIAGNÓSTICO .

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EXAMES LABORATORIAIS
● BhCG → para TODA mulher em idade fértil (identifica gravidez tópica e ectópica, mola hidatiforme)
● Sumário de urina: hematúria, piúria*
● Hemograma:
Hemoglobina: alterada na hemorragia digestiva e sangramento intracavitário (normal na fase inicial)
Leucograma: pode elevar em patologias inflamatórias e infecciosas. Valor normal não as exclui.
Plaquetas: podem estar diminuídas no sangramento agudo
● Eletrólitos e função renal
● Gasometria e Lactato → avalia má perfusão e isquemia mesentérica
● Coagulograma → Coagulopatia, hepatopatia, hemorragia digestiva
● Glicemia → Cetoacidose diabética, estado hiperosmolar hiperglicêmico, pancreatite
● Enzimas hepáticas
● Lipase e amilase → pancreatite (lipase preferível a amilase)
● ECG e marcadores de lesão miocárdica → SCA, TEP, alterações hidroeletrolíticas

Atenção! Para todo paciente com dor acima da cicatriz umbilical → solicitar ECG

EXAMES DE IMAGEM
● RX de abdome em ortostase → Obstrução intestinal, corpo estranho, calcificações anômalas

Pneumoperitônio X Nível hidroaéreo evidenciando obstrução intestinal


● RX de tórax → Perfuração
● TC de abdome*
Exceção: cólica biliar, causas obstétricas → solicitar USG abdominal
Estudo dos vasos → COM contraste
● Exames endoscópicos
● US a beira do leito
Aneurisma de aorta abdominal
Líquido livre (ascite, hemorragia, pus, conteúdo entérico)
Vias biliares, vesícula e colelitíase
Hidronefrose
Variação da veia cava (status volêmico)
Complementação do exame físico

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

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ESTABILIZAÇÃO

1. DESCARTAR AS SEGUINTES CONDIÇÕES


● Sepse em idosos e pacientes imunossuprimidos
● Hipovolemia nos casos de diarreia, vômitos
● Sangramentos intracavitários → solicitar USG a beira leito

2. MANEJO
● Estabilização clínica
● Diagnóstico
● Tratamento sintomático e da causa base
● Referenciar se necessário

3. TRATAMENTO
CONTROLE DOS SINTOMAS
● Analgésicos + AINES → de acordo com a intensidade de dor que relatada PELO paciente
Evitar AINES em casos de sangramento
● Antiemético
● Antiácidos, antiespasmódicos → em casos de úlceras
ANTIBIÓTICO
● Polimicrobiano
● Opções:
Cefalosporina de 3ª geração (ceftriaxona) ou Quinolona + Metronidazol
B-lactâmico com inibidor de b-lactamase
SE antibioticoterapia recente → cefepime (cefalosporina de 4ª) ou carbapenêmico

ALGORITMO 1 → ABORDAGEM DA DOR ABDOMINAL AGUDA .

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ALGORITMO 2 → ABORDAGEM DA DOR ABDOMINAL AGUDA .

ALGORITMO 3 → ABORDAGEM DA DOR ABDOMINAL AGUDA .

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CASOS CLÍNICOS

CASO 01
ID: Mulher, 45 anos, cozinheira.
HDA: Paciente refere episódios frequentes de dor abdominal em cólicas, de forte intensidade, em hipocôndrio
direito, que piora com alimentação copiosa e melhoram com buscopan. Há 1 dia, após crise semelhante, a dor
passou a ser de forte intensidade, constante, em andar superior do abdome, irradiando para a região do dorso,
associada a vômitos.
Ao exame:
EGR, aaa, fácies de dor, taquipneica, FR: 28irpm, PA: 130x70mmHg, FC: 110bpm. SatO2=98% em ar ambiente,
cooperativa
AC: RCR, 2T, BNF, S/S. AP: MVU +, s/RA
Abd: globoso por adiposidade, flácido, doloroso à palpação em andar superior, s/ VM
Ext PPP, sem edema

● Qual a sua hipótese diagnóstica?


Colecistite
Colelitíase → não dá dor contínua
Coledocolitíase
Pancreatite

● Que exames complementar é mais importantes no caso?


a) Exames laboratoriais
b) USG abdominal → capaz de fechar dx das principais hipóteses junto à clínica e influenciar na
terapia
c) TC de abdome sem contraste
d) TC de abdome com contraste

● Qual a sua conduta?


a) Analgesia e observação
b) Antibioticoterapia
c) Cirurgia eletiva
d) Cirurgia de emergência

CASO 02
Homem, 70 anos, mecânico, procedente de Fortaleza.
HDA: paciente apresentou quadro súbito de dor abdominal em região mesogástrica, contínua, de moderada
intensidade, associado a sensação importante de mal-estar, sendo trazido por familiares.
Ao exame:
EGC, aaa, fáceis agonizantes, FR: 24irpm, PA: 80x50mmHg, FC: 140bpm. SatO2=90% em ar ambiente,
gemente.
AC: RCI, 2T, BNF, S/S. AP: MVU+, s/RA
Abd: distendido, flácido, timpânico, doloroso à palpação difusamente, s/VM
Ext PPP, sem edema
● Hipótese diagnóstica?
Dissecção de aorta
Ruptura de aneurisma
Isquemia mesentérica

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● Que exame complementar é mais importante no caso?
a) Exames laboratoriais
b) USG abdominal
c) TC de abdome sem contraste
d) TC de abdome com contraste

● Qual a sua conduta?


a) Analgesia e observação
b) Antibioticoterapia
c) Cirurgia eletiva
d) Cirurgia de emergência

CASO 03
Mulher, 30 anos, vendedora, procedente de Fortaleza.
HDA: Paciente refere que há 2 dias vem apresentando dor em fossa ilíaca direita, contínua, de forte
intensidade, associado a hiporexia. Nega febre, vômitos ou diarreia. Refere uso irregular de ACO. Última
menstruação há 32 dias.
Ao exame: EGR, aaa, fáceis de dor, taquipneica, FR: 24 irpm, PA: 100x60mmHg, FC: 110bpm. SatO2=98% em ar
ambiente, cooperativa
AC: RCR, 2T, BNF, S/S. AP: MVU+, s/RA
Abd: plano, doloroso à palpação em andar inferior, com defesa espontânea à palpação de FID. s/VM
Ext PPP, sem edema
● Hipótese diagnóstica?
ITU
DIP
Endometriose
Gravidez tópica e ectópica
Torção de cisto ovariano
Cólica menstrual

● Que exames complementares são mais importantes no caso?


a) Exames laboratoriais → BhCG
b) USG abdominal
c) TC de abdome sem contraste
d) TC de abdome com contraste

● Qual a sua conduta?


a) Analgesia e observação → se cólica menstrual
b) Antibioticoterapia → se DIP, ITU
c) Cirurgia eletiva
d) Cirurgia de emergência → rotura ou torção de cisto ovariano, gravidez ectópica rota

Hey! Se gravidez tópica e paciente


estabilizada (analgesia) →
encaminhar ao ginecologista

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