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Conflitos aparentes de normas

penais
Ocorre conflito aparente de normas penais quando a uma única conduta (fato)
vislumbra-se a possibilidade de aplicação de dois ou mais tipos penais.
Portanto, para a ocorrência do conflito deve haver:

1. Unidade de fato.

2. Pluralidade de leis ou normas penais de mesma hierarquia e vigentes à


época do fato.

Finalidades da solução do conflito aparente

1. Evitar o bis in idem - duas normas distintas sendo aplicadas ao mesmo fato.

2. Manter a coerência do Direito Penal - evitar a insegurança jurídica.

Princípios para solução do conflito aparente de normas penais

Consumação

Alternatividade

Subsidiariedade

Especialidade

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→ Os mais cobrados

DA ESPECIALIDADE (lex specialis derrogart legi generali)

Afasta-se a aplicação da lei penal geral para que se aplique a lei penal especial,
a qual possui elementos especializastes.

O tipo especial possui todos os elementos do tipo geral, além, obviamente,


dos elementos que o tornam específico. Como decorrência lógica, o inverso não
ocorre, ou seja, o tipo geral não possui todos os elementos do tipo especial.

Não se leva em consideração a gravidade da lei penal. O tipo especia pode


ser punido de maneira mais branda ou mais grave que a norma geral. A
gravidade da norma não será relevante para aplicação do princípio da
especialidade.

A análise de qual norma é especial é feita em caráter abstrato. Não se faz


necessária a análise do caso concreto para determinar qual será a norma
especial e a norma geral.

Exemplos da aplicação do princípio da especialidade:

Homicídio simples Infanticídio

Art. 123 - Matar, sob a


influencia do estado puerperal,
Art. 121 - Matar alguém: Pena - o próprio filho, durante o parto
reclusão, de 06 a 20 anos ou logo após (fatores
especializantes):Pena -
detenção, de 02 a 06 anos.
NORMA ESPECIAL, nesse
NORMA GERAL
caso, mais branda que a geral

Contrabando Tráfico de drogas (Lei 11.343/06)

Art. 334-A - Importar Art. 33 - Importar, exportar. […] drogas (tipo específico de
ou exportar mercadoria proibida), ainda que gratuitamente, sem
mercadoria proibida: autorização ou em desacordo com determinação lega ou
Pena - reclusão, de regulamentar: Pena - reclusão de 05 a 15 anos e multa de 500 a
02 a 05 anos 1500 dias-multa.
NORMA ESPECIAL, nesse caso, mais grave que a norma
NORMA GERAL
geral

Difamação Calúnia

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Art. 139 - Difamar alguém, imputando- Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe
lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena falsamente fato definido como crime: Pena -
- detenção, de 03 meses a 01 ano. detenção, de 06 meses a 02 anos, e multa.

NORMA ESPECIAL, nesse caso, mais grave


NORMA GERAL
que a norma geral.

DA SUBSIDIARIEDADE (lex primária derogat legi subsidiariedade)

Norma primária, mais grave, deve prevalecer sobre a norma subsidiária, mais
branda;

A norma subsidiária está inserida na norma principal; nesse caso, a norma


principal é que possui mais elementares;

É diferente do principio da especialidade porque, nesse caso, só se aplica a


norma mais grave, apenas subsidiariamente se aplicando a norma mais
branda;

A NORMA SUBSIDIÁRIA SEMPRE SERÁ MAIS BRANDA!

A norma subsidiária age como “soldado de reserva”, devendo ser aplicada


quando não estiverem presentes todas as elementares da norma principal;

Ao contrário do princípio da especialidade, a aplicação do princípio da


subsidiariedade se dará mediante análise do caso concreto;

Aqui está outra diferença com a especialidade;

Só se aplica a norma subsidiaria se não for possível aplicar a norma principal;


busca-se aplicar ao agente a norma mais grave;

Tipos de subsidiariedade:

1. Subsidiariedade expressa a lei declara EXPLICITAMENTE a subsidiariedade


da norma.

a. Exemplos:

Perigo para a vida ou saúde de outrem


Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:
Pena - detenção, de 03 meses a 01 ano, se o fato não constitui crime mais
grave.

exemplo de crime que também traz perigo a vida de outrem e que é mais
grave: artigo 251 - crime de explosão - Pena: reclusão, de 03 a 06 anos.

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Portanto, se alguém gera perigo para a vida de outrem por meio de colosso,
a pessoa responderá pelo artigo 251.

Nesse caso, o artigo 251 é a norma principal (por ser mais grave) e o
artigo 132 é a norma subsidiária.

Falsa identidade
Art. 307 - Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter
vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem: Pena -
detenção, de 03 meses a 01 ano, ou multa, se o fato não constitui elemento
de crime mais grave.

Exemplo de crime mais grave: artigo 304 - uso de documento falso -


Pena: reclusão, de 02 a 06 anos.

Portanto, se alguém faz uso de documento falso, responderá pelo artigo


304.

2. Subsidiariedade tácita o fato típico mais grave é aplicado em detrimento do


fato típico menos grave, o qual integra a descrição típica do primeiro.

a. Exemplos:

Constrangimento ilegal Extorsão

Ar. 146 - Constranger alguém, mediante


Art. 158 - Constranger alguém, mediante
violência ou grave ameaça, ou depois de lhe
violência ou grave ameaça, e com intuito de
haver reduzido, por qualquer outro meio, a
obter para si ou para outrem indevida
capacidade de resistência, a não fazer o que a
vantagem econômica, a fazer, tolerar que
lei permite, ou a fazer o que ela não manda:
se faça ou deixar de fazer alguma coisa:
Pena - detenção, de 03 meses a 01 ano, ou
Pena - reclusão, de 04 a 10 anos, e multa.
multa.

NORMA PRINCIPAL, aqui há um fator


NORMA SUBSIDIÁRIA específico (vantagem econômica) e que
agrava a pena.

o constrangimento ilegal também é norma subsidiária em relação ao estupro,


sendo que neste último há intuito de obter conjunção carnal ou prática de outro
ato libidinoso com a vitima

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DA ALTERNATIVIDADE
→ Tipos penais que possuem várias condutas (verbos), conhecidos como tipos
mistos alternativos, de ação múltipla ou de conteúdo variado.

muitos doutrinadores acreditam que não se trata de conflito aparente de normas


penais, mas sim de uma característica de um tipo penal (tipos mistos
alternativos)

Não seria um princípio de solução de conflito aparente.

Exemplos:

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito


próprio o alheio, coisasse sabe ser produto de crime, ou influir para que
terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.

Art. 33 da Lei de Drogas - Importar, exportar, remeter, preparar,


fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito,
transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a
consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização
ou em desacordo com determinação lega ou regulamentar.

O princípio da alternatividade esta dizendo que, por exemplo, se o agente


importa drogas, depois produz drogas, depois oculta essa droga e depois a
exporta, ou seja, ele comete vários verbos do artigo. Nesse caso, poderia se
pensar que deveria se aplicar um crime para cada verbo praticado, mas o
principio da alternatividade diz que não: nesse conflito, ele não vai responder
4 vezes por trafico por ter praticado 4 verbos distintos do dispositivo legal,
mas vai responder por uma somente.

Por mais que sejam verbos que configuram condutas distintas, se o agente
comete vários deles no mesmo contexto fático, ele praticou somente 1
crime.

DA CONSUNÇÃO OU ABSORÇÃO (lex consumens derogat legi comsumptae)


Formas de aplicação:

A norma mais grave e abrangente absorve a norma menos grave e abrangente;

O crime fim absorve o crime meio;

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Afaste-se o bis in idem, uma vez que o fato menos amplo seria punido
separadamente do fato mais amplo, do qual é integrante;

1a hipótese em que se aplica o princípio da consunção = CRIMES


COMPLEXOS

ROUBO = furto + ameaça ou lesão corporal → soma de dois tipos penais


distintos.

EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO = sequestro ou cárcere privado +


extorsão → soma de dois tipos penais distintos.

Porque não se aplica um mais outro? Porque o próprio código previu


um tipo penal que já vai abranger os dois tipos penais.

O crime complexo pode ser mais grave que a soma dos dois tipos
penais que o formam.

Os tipos são absorvidos pelo tipo complexo.

OBS.: parte da doutrina discorda que o crime complexo seja uma hipótese de
princípio da consunção, uma vez que não há conflito se a própria lei criou um tipo
penal específico, resultante da fusão de dois ou mais tipos penais.

2a hipótese em que se aplica o princípio da consunção = CRIME


PROGRESSIVO (crimes de ação de passagem)

o dolo do agente é voltado para um resultado que, necessariamente, passa


por outro tipo penal. O ato final (dolo) consome os atos anteriores.

Exemplo: João utiliza uma arma de cortejara ceifar a vida de José. Assim, o
golpeia repetidas vezes na região do tórax, até que consegue alcançar seu
objetivo.

Qual crime João queria cometer? Homicídio.

Qual crime ele praticou? Homicídio consumado.

Por qual crime ele vai responder? Crime de homicídio.

Mesmo assim, durante a execução do crime, João praticou também


o crime de lesão corporal (art. 129). No entanto, o artigo 129 (lesão
corporal) não se aplica porque o agente responderá pelo resultado
que causou, bem como pelo dolo (intenção).

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O homicídio é um crime progressivo - para ser praticado
necessariamente o agente vai ter que comter uma lesão corporal. A
lesão corporal é meio para que o homicídio seja consumado.

3a hipótese em que se aplica o princípio da consunção = PROGRESSÃO


CRIMINOSA

O dolo do agente é voltado para um crime menor. Todavia, após consumá-


lo, substitui seu dolo para alcançar um resultado mais grave.

Exemplo: João pretende gerar lesões corporais em José e, para tanto,


desfere sócios em sua face. Após alcançar seu intento, altera seu dolo e
continua desferindo socos com a finalidade de tirar sua vida.

Houve progressão criminosa, uma vez que João alterou seu dolo (de
lesionar para matar)

Por qual crime ele responderá? Somente pelo crime de homicídio,


uma vez que houve progressão criminosa, sendo que o crime fim
absorve o crime meio.

4a hipótese em que se aplica o princípio da consunção = FATOS IMPUNÍVEIS

O crime meio é absorvido pelo crime fim. O agente só responde pelo dolo
que tinha ao cometer a conduta.

Exemplo: Furto em interior de residência (art. 155) absorve o crime de


violação de domicílio; Lesões corporais leves suportadas por uma mulher
vítima de estupro são absorvidas por este delito.

Obs. SÚMULA 17, DO STJ: quando o falso (falsidade documental - crimes contra a
fé pública) se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este
absorvido.

Isso quer dizer que quando o agente falsifica documentos públicos com a
finalidade de cometer estelionato, o estelionato absorverá essa falsidade
documental.

Aqui há uma impropriedade já que o crime mais brando está absorvendo o


crime mais grave.

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5a hipótese em que se aplica o principio da consunção = PÓS-FATOS
IMPUNÍVEIS

Nova ofensa praticada contra o MESMO bem jurídico, mas que fazia parte
do dolo inicial do agente. Pode ser considerado um exaurimento do crime
praticado e, por isso, não será punido.

Exemplo: João subtrai um aparelho celular com a finalidade de vendê-lo e


obter lucro. Assim, após o furto, anuncia e consegue vender o referido
aparelho.

Nesse caso, ele só praticou o crime de furto, a venda (estelionato) já


fazia parte do dolo inicial de João;

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