Você está na página 1de 18

O currículo como construção social:

a "nova sociologia da educação"

A crítica do currículo na Inglaterra, di- sociologia era chamada, pelos críticos, de


ferentemente do que ocorria nos Estados "aritmética".A principal crítica que a NSE
Unidos, dava-se a partir da sociologia. O fazia a essa sociologia aritmética era que
livro Knowledge and contrai, publicado em ela se concentrava nas variáveis de entrada
1971, marca o início dessa crítica, através (classe social, renda, situação familiar) e nas
daquilo que passaria a ser conhecido como variáveis de saída (resultados dos testes
"Nova Sociologia da Educação" (NSE). Este escolares, sucesso ou fracasso escolar),
livro, organizado por Michael Young, que deixando de problematizar o que ocorria
seria, reconhecidamente, o líder desse entre esses dois pontos. Mais particular-
"movimento", reunia, além de um ensaio mente, a antiga sociologia não questionava
do próprio MichaelYoung,ensaios escritos a natureza do conhecimento escolar ou o
por Pierre Bourdieu e Basil Bernstein, bem papel do próprio currículo na produção
como ensaios de outros autores, vários daquelas desigualdades. O currículo tra-
deles ligados ao Instituto de Educação da dicional era simplesmente tomado como
Universidade de Londres. dado e, portanto, como implicitamente
Se nos Estados Unidos a crítica tinha aceitável. O que importava era saber se
como referência as perspectivas tradi- as crianças e jovens eram bem-sucedidos
cionais sobre currículo, na Inglaterra a ou não nesse currículo. Nos termos da NSE,
referência era a "antiga" sociologia da a preocupaçao era com o processamento
educação. Essa sociologia seguia uma de pessoas e não com o processamento
tradição de pesquisa empírica sobre os do conhecimento.
resultados desiguais produzidos pelo A NSE, entretanto, implicitamente
sistema educacional, preocupando-se, também desafiava uma outra tradição do
sobretudo, com o fracasso escolar das pensamento educacional britânico, aquela
crianças e jovens da classe operária. Por representada pela filosofia educacional
sua ênfase empírica e estatística, essa analítica de autores como P. H. Hirst e

65
R. S. Peters. Esses autores defendiam camente coincidiria com a sociologia mais
uma posição basicamente racionalista do geral do conhecimento.
currículo, argumentando em favor de um A tarefa mais imediata de Knowledge and
currículo que estivesse centrado no de- control consistia, entretanto, em delinear
senvolvimento do pensamento conceituai. as bases de uma "sociologia do currículo".
Para essa finalidade, o currículo deveria Young critica, na introdução, a tendência a se
se centrar em "formas de compreen- tomar como dadas, como naturais, as cate-
são" que, embora não fossem definidas gorias curriculares, pedagógicas e avaliativas
exatamente em termos das disciplinas utilizadas pela teoria educacional e pelos
acadêmicas, coincidiam, em grande parte, educadores. A tarefa de uma sociologia do
com elas.A perspectiva de Hirst e Peters currículo consistiria precisamente em colo-
centrava-se num conhecimento universa- car essas categorias em questão, em desna-
lista, conceptual e abstrato. Ao enfatizar turalizá-las, em mostrar seu caráter histórico,
o caráter arbitrário daquilo que passa por social, contingente, arbitrário. Diferentemen-
conhecimento, a NSE colocava em ques- te de uma filosofia do currículo centrada em
tão também essa concepção filosófica da questões puramente epistemológicas,a ques-
educação e do currículo. tão, para a NSE, não consiste em saber qual
O programa da NSE, tal como formu- conhecimento é verdadeiro ou falso, mas em
lado por Michael Young, na introdução ao saber o que conta como conhecimento. Em
livro Knowledge and contrai, tomava como contraste com a psicologia da aprendizagem,
ponto de partida o desenvolvimento de a NSE tampouco está preocupada em saber
uma sociologia do conhecimento.A tarefa como se aprende. Como argumenta Schaffer,
de uma sociologia do conhecimento, nessa citado por Young, a "questão de saber como
visão, consistiria em destacar o caráter so- as crianças aprendem matemática pressupõe
cialmente construído das formas de consci- respostas à questão prévia de quais são as
ência e de conhecimento, bem como suas bases sociais daquele conjunto de significados
estreitas relações com estruturas sociais, que são designados pelo termo 'matemática'."
institucionais e econômicas. Nesse sentido, Ao contrário de perspectivas críticas mais
no quadro teórico traçado por Young, a propriamente pedagógicas sobre o currículo,
sociologia do conhecimento escolar prati- a NSE tampouco se preocupará em elaborar

66
propostas alternativas de curriculo. Seu pro- gêneas. Enquanto as contribuições do pró-
grama está centrado na crítica sociológica e prio Young, de Bourdieu e Bernstein eram
histórica dos currículos existentes. claramente estruturalistas, os ensaios de
A NSE, no breve programa traçado Geoffrey Esland e Neil Keddie inspiravam-
por Young na introdução ao livro Know- se, sobretudo, na fenomenologia sociológica
ledge and contrai, deveria começar por e no interacionismo simbólico. Essa divisão
ver o conhecimento escolar e o currículo iria se resolver, posteriormente, em favor
existentes como invenções sociais, como da vertente mais estruturalista que se tor-
o resultado de um processo envolvendo naria, aliás, crescentemente neomarxista.
conflitos e disputas em torno de quais A perspectiva derivada da fenomenologia
conhecimentos deviam fazer parte do e do interacionismo simbólico iria perder
currículo. Ela deveria perguntar como importância e visibilidade, embora conti-
essa disciplina e não outra acabou en- nuasse presente como, por exemplo, no
trando no currículo, como esse tópico e trabalho, inspirado no interacionismo
não outro, por que essa forma de organi- simbólico, de Peter Woods.
zação e não outra, quais os valores e os Young demonstra, em seu próprio
interesses sociais envolvidos nesse proces- ensaio, como se poderia desenvolver
so seletivo. De forma mais geral e abstrata, uma sociologia do currículo inspirada nas
a NSE busca investigar as conexões entre, concepções de Marx, Weber e Durkheim.
de um lado, os princípios de seleção, or- Embora ressalte, na introdução ao livro, as
ganização e distribuição do conhecimen- conexões entre os princípios de distribui-
to escolar e, de outro, os princípios de ção de poder e as várias fases do processo
distribuição dos recursos econômicos e de construção curricular (seleção, organi-
sociais mais amplos. Em suma, a questão zação, distribuição, avaliação), Young con-
básica da NSE era a das conexões entre centra-se nas formas de organização do
currículo e poder, entre a organização do currículo. A questão, para Young, consiste
conhecimento e a distribuição de poder. em analisar quais os princípios de estra-
As perspectivas apresentadas pelos tificação e de integração que governam
diferentes autores reunidos em Knowledge a organização do currículo. Por que se
and contrai estavam longe de serem homo- atribui mais prestígio a certas disciplinas
67
do que a outras? Por que alguns currículos ra a "intencionalidade e a expressividade da
são caracterizados por uma rígida separa- ação humana e todo o complexo processo
ção entre as diversas disciplinas enquanto de negociação intersubjetiva dos significa-
outros permitem uma maior integração? dos; ela disfarça como dado um mundo que
Quais são as relações entre esses princí- tem que ser continuamente interpretado".
pios de organização e princípios de poder? Esland desenvolve o argumento de que
Quais interesses de classe, profissionais o currículo não pode ser separado do en-
e institucionais estão envolvidos nessas sino e da avaliação. Fundamentando-se na
diferentes formas de estruturação e orga- sociologia fenomenológica de Mead, Schutz
nização? Mexer nessa organização significa e Luckmann, Esland concentra-se na forma
mexer com o poder. É essa estreita relação como o conhecimento é construído inter-
entre organização curricular e poder que subjetivamente na interação entre professor
faz com que qualquer mudança curricular e alunos na sala de aula. Tal como ocorre
implique uma mudança também nos em outros locais, a "realidade" é constituída
princípios de poder. daqueles significados que são intersubjeti-
Em contraste com essa análise estru- vamente construídos na interação social. É
tural de Young, os ensaios de Geoffrey por isso que uma pessoa de "fora" sente-se
Esland e Nell Keddie adotam uma postura como um estrangeiro. Assim, na situação
mais fenomenológica. De acordo com educacional, qualquer mudança curricular
a tradição fenomenológica, Esland ataca "objetiva" deve passar por esse processo
a visão objetivista do conhecimento que de interpretação e negociação em torno
está pressuposta nas perspectivas tradicio- dos significados em que estão envolvidos
nais sobre o currículo. Para a perspectiva professores e alunos na sala de aula. É na
objetivista, na qual se baseia a divisão do descrição e explicação desse conhecimento
currículo em matérias ou disciplinas, o intersubjetivo que, na opinião de Esland,
conhecimento está organizado em "zonas" deveria se concentrar uma sociologia do
que correspondem a tipos diferentes de currículo. Embora Esland destaque a irn·
objetos que teriam existência independen- portância de se analisar as visões subjetivas
te dos indivíduos cognoscentes. Na análise tanto dos professores quanto dos alunoS,
fenomenológica de Esland, essa visão igno- ele se concentra, nesse ensaio, no conhe·
68
cimento dos professores. O problema para grupos dominantes. Da mesma forma, pro-
ele consiste em tentar compreender quais curaria desafiar as formas de estratificação
são as perspectivas, entendidas aqui como e atribuição de prestígio existentes, como,
"visões de mundo", que os professores tra- por exemplo, a que divide as ciências e
zem para a sala de aula, bem como aquelas as artes. Além disso, um currículo que se
que eles aí desenvolvem. fundamentasse nos princípios da NSE de-
Dentre os estudos aqui mencionados, veria transferir esses princípios para o seu
o de Neil Keddie é o único que tem uma interior, isto é, a perspectiva epistemológi-
base empírica. A partir de uma perspectiva ca central do conhecimento envolvido no
fenomenológica, Keddie argumenta que o currículo deveria ser, ela própria, baseada
conhecimento prévio que os professores na ideia de "construção social".
têm dos alunos determina a forma como eles O prestígio e a influência da NSE, que
irão tratá-los. A capacidade intelectual dos tinham sido excepcionalmente grandes até
alunos tal como avaliada pelos professores o início da década de oitenta, diminuiu bas-
acaba sendo determinada pela tipificação que tante a partir daí. Por um lado, o programa
os professores fazem deles. Essa tipificação mais "forte" de uma "pura" sociologia do
é determinada, em grande parte, pela classe currículo cedeu lugar a perspectivas mais
social dos alunos. Em sua pesquisa, Keddie ecléticas que misturavam análises socioló-
chega a conclusões similares àquelas que gicas com teorizações mais propriamente
foram desenvolvidas pelas chamadas "teorias pedagógicas. Por outro, a teorização crítica
da rotulação". da educação que nesse momento se con-
Embora a NSE não estivesse preocupa- centrava em torno da NSE iria se dissolver
da em desenvolver as implicações pedagó- numa variedade de perspectivas analíticas e
gicas de seu programa sociológico, essas teóricas: feminismo; estudos sobre gênero,
implicações são, entretanto, evidentes. Em raça e etnia; estudos culturais; pós-moder-
primeiro lugar, uma perspectiva curricular nismo; pós-estruturalismo. Além disso, o
inspirada pelo programa da NSE buscaria contexto social de reforma educacional e
construir um currículo que refletisse as de democratização da educação que tinha
tradições culturais e epistemológicas dos constituído a inspiração da NSE transfor-
grupos subordinados e não apenas dos mava-se radicalmente, com o triunfo das

69
políticas neoliberais de Ronald Reagan, nos Leituras
Estados Unidos, e de Margareth Thatcher, FORQUIN, Jean-Claude. Escola e cultura. As bas
na Inglaterra. Na verdade, até mesmo o sociais e epistemológicas do conhecimento escoar.
Ies
Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
principal teórico da NSE, Michael Young,
abandonava gradualmente suas pretensões KEDDI_E,_ Nell. "O saber na sala de aula". ln Sér~o
sociológicas anteriores para adotar uma Gracro e Stephen Stoer (orgs.). Sociologia da
educação. v. li. A construção social das práticos
posição cada vez mais técnica e burocrá-
educativas. Lisboa: Horizonte, 1982: p.205-244.
tica. A ideia inicial da NSE, representada
na noção de "construção social", conti- MOREIRA, Antonio Flávio 8. "Sociologia do currí-
culo: origens, desenvolvimento e contribuições."
nua, entretanto, atual e importante. Ela
Em aberto, 1990, 46, p. 73-83.
encontra continuidade, por exemplo, nas
análises do currículo que hoje são feitas YOUNG, Michael. "Uma abordagem do estudo
dos programas enquanto fenômenos do co•
com inspiração nos Estudos Culturais e nhecimento socialmente organizado". ln Sér~o
no pós-estruturalismo. Grácio e Stephen Stoer (orgs.). Sociologia da
educação. v. li. A construção social das práticas
educativas. Lisboa: Horizonte, 1982: p.1 S1-187.
YOUNG, Michael. "A propósito de uma sociologia
crítica da educação". Revista brasileira de estudos
pedagógicas, 67( 157), 1986: p.532-37.

70
Códigos e reprodução cultural: Basil Bernstein

No contexto da sociologia crítica da conhecimento, e a avaliação define o que


educação que se desenvolveu na Inglaterra conta como realização válida desse conhe-
a partir dos anos setenta, a obra de Basil cimento de parte de quem é ensinado".
Bernstein ocupa uma posição singular. Na Embora alguns de seus primeiros ensaios
verdade, embora o terceiro volume de seu tenham se concentrado especificamente
livro C/ass, codes and contrai, onde ele reúne no currículo, este não é, entretanto,
os ensaios teóricos que desenvolvem as seu foco . Na verdade, Bernstein vai
bases de sua sociologia da educação, só crescentemente deixando de mencionar
tenha sido publicado em 1975, ele vinha o termo "currículo", embora ele esteja
desenvolvendo as atividades que deram implícito em várias das fases de sua teoria
origem a esse livro desde o início da dos "códigos".
década de sessenta. Nesses anos todos, Sua teoria é, entretanto, ao menos em
Bernstein se manteve fiel ao seu projeto de parte, uma teoria sociológica do currícu-
desenvolver uma sociologia da educação lo. Mas Bernstein não está preocupado
que girasse em torno de alguns conceitos com o "conteúdo" propriamente dito
que ele considera fundamentais. Tudo o do currículo. Ele não pergunta por que
que ele tem feito é refinar esses conceitos, se ensina esse tipo específico de conhe-
tornando sua teoria cada vez mais comple- cimento e não outro, nem tampouco
xa e sofisticada. por que esse conhecimento particular é
Para Bernstein, o conhecimento edu- considerado válido e aquele outro não.
cacional formal encontra sua realização Ele está mais preocupado com as relações
através de três sistemas de mensagem estruturais entre os diferentes tipos de
- o currículo, a pedagogia e a avaliação: conhecimento que constituem o currículo.
"o currículo define o que conta como Bersntein quer saber como o currículo
conhecimento válido, a pedagogia define está estruturalmente organizado. Além
o que conta como transmissão válida do disso, ele pergunta como os diferentes
71
Códigos e reprodução cultural: Basil Bernstein

No contexto da sociologia crítica da conhecimento, e a avaliação define o que


educação que se desenvolveu na Inglaterra conta como realização válida desse conhe-
a partir dos anos setenta, a obra de Basil cimento de parte de quem é ensinado".
Bernstein ocupa uma posição singular. Na Embora alguns de seus primeiros ensaios
verdade, embora o terceiro volume de seu tenham se concentrado especificamente
livro Class, codes and contrai, onde ele reúne no currículo, este não é, entretanto,
os ensaios teóricos que desenvolvem as seu foco . Na verdade, Bernstein vai
bases de sua sociologia da educação, só crescentemente deixando de mencionar
tenha sido publicado em 1975, ele vinha o termo "currículo", embora ele esteja
desenvolvendo as atividades que deram implícito em várias das fases de sua teoria
origem a esse livro desde o início da dos "códigos".
década de sessenta. Nesses anos todos, Sua teoria é, entretanto, ao menos em
Bernstein se manteve fiel ao seu projeto de parte, uma teoria sociológica do currícu-
desenvolver uma sociologia da educação lo. Mas Bernstein não está preocupado
que girasse em torno de alguns conceitos com o "conteúdo" propriament~ dito
que ele considera fundamentais. Tudo o do currículo. Ele não pergunta por que
que ele tem feito é refinar esses conceitos, se ensina esse tipo específico de conhe-
tornando sua teoria cada vez mais comple- cimento e não outro, nem tampouco
xa e sofisticada. por que esse conhecimento particular é
Para Bernstein, o conhecimento edu- considerado válido e aquele outro não.
cacional formal encontra sua realização Ele está mais preocupado com as relações
através de três sistemas de mensagem estruturais entre os diferentes tipos de
- o currículo, a pedagogia e a avaliação: conhecimento que constituem o currículo.
"o currículo define o que conta como Bersntein quer saber como o currículo
conhecimento válido, a pedagogia define está estrutura/mente organizado. Além
o que conta como transmissão válida do disso, ele pergunta como os diferentes
71
currículo interdisciplinar, em contraste,
tipos de organização do currículo estão
seria fracamente classificado.
ligados a princípios diferentes de pod~r
e controle. Por exemplo, nos seus pri- Bernstein insiste, entretanto, que não
meiros ensaios, Bernstein distinguia dois se pode separar questões de currículo de
tipos fundamentais de organização estru- questões de pedagogia e avaliação. Não se
tural do currículo: o currículo tipo coleção pode separar, em outras palavras, a análise
e o currículo integrado. No currículo tipo do que constitui uma organização válida do
coleção, as áreas e campos de conheci- conhecimento daquilo que constituem for-
mento são mantidos fortemente isolados, mas válidas de transmissão e avaliação do
separados. Não há permeabilidade entre conhecimento. Ele concede particular aten-
as diferentes áreas de conhecimento. ção à questão da pedagogia, à questão da
No currículo integrado, por sua vez, as transmissão. Independentemente da forma
distinções entre as diferentes áreas de como o conhecimento é organizado - se
conhecimento são muito menos nítidas, de uma forma mais classificada ou menos
muito menos marcadas.A organização do classificada - há variações na forma como
currículo obedece a um princípio abran- ele é transmitido. O estudante pode ter
gente ao qual se subordinam todas as áreas maior ou menor controle sobre o ritmo
que o compoem. da transmissão, por exemplo. Os objetivos
Bernstein cunhou um termo para a serem atingidos podem ser mais ou me-
se referir ao maior ou menor grau de nos explícitos. A divisão do espaço pode
isolamento e separação entre as diversas ser mais ou menos rígida. Os critérios de
áreas de conhecimento que constituem o avaliação podem ser mais ou menos explí-
currículo: "classificação". Quanto maior citos. Podemos imaginar uma sala de aula
o isolamento, maior a classificação. A tradicional, por exemplo. Aqui, o professor
classificação é uma questão de fronteiras. decide o que ensinar, quando ensinar, em
A classificação responde, basicamente, à que ritmo; decide os critérios pelos quais
questão: que coisas podem ficar juntas? se pode dizer se o estudante aprendeu ou
Um currículo do tipo tradicional, marcada- não. O espaço da transmissão é também
mente organizado em torno de disciplinas rigidamente limitado. Comparemos essa
acadêmicas tradicionais, seria, no jargão situação com uma sala de aula centrada-
de Bernstein, fortemente classificado. Um no-aluno, com uma sala de aula construti-
72
vista, por exemplo. Aqui, a organização do As noções de poder e de controle de
espaço é muito mais livre. Os estudantes Bernstein são bastante distintas daquelas
têm um grau muito maior de controle sobre de outras perspectivas críticas sobre o
0 tempo e o ritmo da aprendizagem. Em currículo, sobretudo as marxistas. Elas
compensação, os objetivos a serem alcan- estão, em um certo sentido, mais próximas
çados e os critérios para saber se esses da noção de poder de Foucault. Para Ber-
objetivos foram alcançados são muito nstein, o poder não é algo que distorce o
menos explícitos. Essa característica do currículo ou a pedagogia (a transmissão).
processo de transmissão é designada por Essa noção do poder como um fator de dis-
um outro termo especializado do jargão torção implica vislumbrar uma situação de
de Bernstein: "enquadramento". Quanto não poder e, portanto, não distorcida, não
maior o controle do processo de trans- espúria. Na concepção de Bernstein, trata-
missão por parte do professor, maior é se simplesmente de diferentes princípios
o enquadramento. Assim, o ensino tra- de poder e controle. Um currículo com
dicional tem um forte enquadramento, fraca classificação, por exemplo, no qual
enquanto o ensino-centrado-no aluno é as fronteiras entre os diferentes campos
fracamente enquadrado. são pouco nítidas não significa ausência de
Bernstein faz uma importante distin- poder, mas simplesmente que está organi-
ção entre poder e controle. O poder zado de acordo com princípios diferentes
está essencialmente ligado à classificação. de poder. Do mesmo modo, não se pode
Como vimos, a classificação diz o que é dizer que numa forma de transmissão em
legítimo ou ilegítimo incluir no currículo. que os estudantes têm um poder maior de
A classificação é uma expressão de poder. decisão sobre as diversas dimensões da pe-
Se estamos falando de coisas que podem dagogia (ritmo, tempo, espaço) o controle
e coisas que não podem, estamos falando esteja ausente. Simplesmente estão em
de poder. Por outro lado, o controle ação outros princípios de controle, mais
diz respeito essencialmente à forma da sutis, mas nem por isso menos eficazes. Na
transmissão. O controle está associado ao verdade, na medida em que implicam uma
enquadramento, ao ritmo, ao tempo, ao maior visibilidade de estados subjetivos do
espaço da transmissão. educando, podem até ser mais eficazes.
73
Agora, a questão crucial para Berns- jar, ali não), sabiam quais eram as formas
tein é: como se aprendem as posições de de beijo apropriadas em cada contexto
classe? Como as estruturas de classe se e sabiam como expressá-las em cada um
traduzem em estruturas de consciência? É desses contextos. Elas tinham o código:
aqui que entra o importantíssimo conceito um conjunto de regras implícitas.
de "código". O código é precisamente a É, pois, o código que faz a ligação en-
gramática da classe. O código é a gramá- tre as estruturas macrossociológicas da
tica implícita e diferencialmente adquirida classe social, a consciência individual e as
pelas pessoas das diferentes classes - uma interações sociais do nível microssocio-
gramática que lhes permite distinguir entre lógico. Bernstein não tem uma definição
os diferentes contextos, distinguir quais muito clara do conceito de classe social.
são os significados relevantes em cada Seu conceito de classe social está muito
contexto e como expressar publicamente ligado ao conceito de divisão social do
esses significados nos contextos respecti- trabalho de Durkheim. A classe social é
vos. Numa conferência dada em Santiago simplesmente a posição que as pessoas
do Chile, Bernstein fornece um exemplo ocupam na divisão social do trabalho: se é
bastante ilustrativo do conceito de có- mais especializada ou menos especializada,
digo. Embora seu exemplo não se refira se está mais ligada à produção material ou
propriamente a um código de classe, mas à produção simbólica... Mas o importante
a um código nacional, podemos facilmente é que a posição ocupada na divisão social
imaginar um exemplo similar ligado à clas- determina o tipo de código aprendido. O
se. Bernstein dá o exemplo do ritual de tipo de código determina, por sua vez, a
beijar a face nos encontros sociais. Como consciência da pessoa, o que ela pensa e,
estrangeiro no Chile, ele achava muito portanto, os significados que ela realiza ou
difícil saber quando beijar, quem beijar, produz na interação social. Nessa base,
como beijar. Beijar só mulheres ou homens Bernstein distingue entre dois tipos de
também? Em quais situações beijar? Quais código: o código elaborado e o código res-
lados da face beijar? Quantas vezes? As trito. No código elaborado, os significados
pessoas chilenas sabiam distinguir entre
realizados pela pessoa - o "texto" que ela
os diferentes contextos (aqui cabe bei-
produz - são relativamente independentes
74
do contexto local.Ao contrário, no código de forma implícita, ao se viverem as estru-
restrito, o "texto" produzido na interação turas sociais em que o código se expressa.
social é fortemente dependente do con- No caso da educação, essas estruturas se
texto. Podemos imaginar, por exemplo, expressam através do currículo, da peda-
dois grupos de crianças descrevendo uma gogia e da avaliação. No caso do currículo,
gravura qualquer. Um grupo de crianças não se aprende o código através do conte-
tende a dar descrições da gravura que údo explícito das áreas de conhecimento
dependem do fato de a gravura (o contex- ou de sua ideologia. O código é implici-
to) estar presente para serem intelígiveis. tamente aprendido através da maior ou
Elas podem dizer, por exemplo, que "a menor classificação do currículo ou através
criança está lá embaixo" ou "ela está do do maior ou menor enquadramento da
lado dela". Outro grupo, entretanto, ten- pedagogia. É a estrutura do currículo ou
de a descrever a gravura de uma forma da pedagogia que determina quais modali-
que pode prescindir de sua presença. Elas dades do código serão aprendidas.
podem dizer, por exemplo, que a "criança A pesquisa inicial de Bernstein esta-
está embaixo de uma grande árvore" ou "a va muito ligada às temáticas centrais da
criança mais velha está ao lado da criança reforma educacional dos anos sessenta.
mais nova". Nos termos de Bernstein, o De um lado, estavam as preocupações
primeiro grupo de crianças está utilizando com o fracasso educacional das crianças
um código restrito, enquanto o segundo e jovens de classe operária. De outro, a
está utilizando um código elaborado. Não época era de reformas educacionais que
existe, na argumentação de Bernstein, procuravam diminuir as divisões entre o
nenhuma hierarquia entre os dois códigos. ensino acadêmico tradicional, dirigido às
Trata-se, simplesmente, de códigos cultu- classes dominantes, e o ensino de caráter
rais diferentes. mais profissionalizante, destinado à classe
Como isso se liga ao currículo e à operária. Nesse contexto, o esforço de
pedagogia? Na perspectiva de Bernstein, Bernstein consistia em compreender quais
aprende-se o código em diversas instâncias as razões daquele fracasso, bem como
em compreender o papel das diferentes
sociais, dentre elas a família e a escola.
pedagogias no processo de reprodução
Aprende-se o código, entretanto, sempre
75
cultural - sobretudo o papel daquilo que sem uma perspectiva sociológica. Afinal
ele chamou de "pedagogia invisível".Atra- uma teorização crítica da educação nã;
vés do desenvolvimento dos conceitos pode deixar de se perguntar qual o papel
de código elaborado e código restrito, da escola no processo de reprodução cul-
Bernstein queria chamar a atenção para tural e social. É evidente que o currículo
a discrepância entre o código elaborado ocupa um papel central nesse processo.A
suposto pela escola e o código restrito das sociologia da educação de Bernstein nos
crianças de classe operária, o que poderia ajuda precisamente a compreender melhor
estar na origem de seu fracasso escolar. em que consiste esse papel.
Além disso, indo em direção contrária
ao pensamento educacional considerado
"progressista", a teorização de Bernstein Leituras
colocava em dúvida o papel supostamente DOMINGOS, Ana M. et alii. A teoria de Bernstein
"progressista" das pedagogias-centradas- em sociologia da educação. Lisboa: Fundação
na criança então em voga. Para ele, essas Calouste Gulbenkian, 1986.
pedagogias simplesmente mudavam os BERNSTEIN, Basil. "Classes e pedagogia: visível e invi-
princípios de poder e controle no interior sível". Cadernos de pesquisa, 49, 1984: p. 26-42.
do currículo, deixando intactos os princí- BERNSTEIN, Basil. Poder, educación y conciencia.
pios de poder da divisão social. Santiago: CIDE, 1988.
A teorização de Bernstein não teve o BERNSTEIN, Basil. A estruturação do discurso peda-
impacto que talvez merecesse em parte gógico. Petrópolis:Vozes, 1996.
por causa de sua linguagem complexa e BERNSTEIN, Basil. Pedagogía, contro/ simbólico e
relativamente obscura. Sua teorização foi identidad. Madri: Morata, 1998.
se tornando cada vez mais formal ao longo
dos anos, tornando-se quase matematiza-
da. Se conseguimos ir além dessa aparente
impenetrabilidade, entretanto, há muito
0 que aprender com ela. Ela continua nos

mostrando, sobretudo, que é impossível


compreender o currículo (e a pedagogia)

76
Quem escondeu o currículo oculto?

Embora não constitua propriamente vés de rituais, gestos e práticas corporais


uma teoria, a noção de "currículo oculto" do que através de manifestações verbais.
exerceu uma forte e estranha atração em "Aprendia-se" a ideologia através dessas
quase todas as perspectivas críticas iniciais práticas: uma definição que se aproxima
sobre currículo. A noção de currículo bastante da definição de currículo oculto.
oculto estava implícita, por exemplo, na Na teorização de Bernstein, por exemplo,
análise que Bowles e Gintis fizeram da é através da estrutura do currículo e da
escola capitalista americana. Aqui, através pedagogia que se aprendem os códigos
do "princípio da correspondência", eram de classe. Mas é claro que o conceito de
as relações sociais na escola, mais do que currículo oculto se estendeu para muito
seu conteúdo explícito, que eram res- além desses exemplos, sendo utilizado
ponsáveis pela socialização de crianças e por praticamente toda perspectiva crítica
jovens nas normas e atitudes necessárias de currículo em seu período inicial.
para uma boa adaptação às exigências Apesar dessa utilização crítica, o
do trabalho capitalista. Mesmo que não conceito tem sua origem no campo mais
diretamente relacionada à escola, a noção conservador da sociologia funcionalista. O
de ideologia desenvolvida por Althusser conceito foi talvez utilizado pela primeira
na segunda parte de seu famoso ensaio, vez por Philip Jackson, em 1968, no livro
A ideologia e os aparelhos ideológicos de es- U(e in c/assrooms. Nas palavras de Jackson,
tado, apontava, de certa forma, para uma "os grandes grupos, a utilização do elogio
noção que tinha características similares às e do poder que se combinam para dar um
que eram atribuídas ao "currículo oculto". sabor distinto à vida de sala de aula coleti-
Como lembramos,Althusser fornecia uma vamente formam um currículo oculto, que
definição de ideologia que destacava sua cada estudante (e cada professor) deve
dimensão prática, material. A ideologia, dominar se quiser se dar bem na escola".
nessa definição, expressava-se mais atra- Caberia a Robert Dreeben, num livro inti-

77
L.
tulado On what is /earned in school, ampliar educação, na medida em que moldam as
e desenvolver essa definição funcionalista crianças e jovens para se adaptar às injus-
de "currículo oculto". Esses autores fun- tas estruturas da sociedade capitalista. o
cionalistas já destacavam a determinação exemplo mais claro é talvez o da análise de
estrutural do currículo oculto. Eram as Bowles e Gintis. Aqui, a escola, através da
características estruturais da sala de aula correspondência entre as relações sociais
e da situação de ensino, mais do que o que ela enfatiza e as relações sociais pre-
seu conteúdo explícito, que "ensinavam" dominantes no local de trabalho, ensina às
certas coisas: as relações de autoridade, a crianças e jovens das classes subordinadas
organização espacial, a distribuição do tem- como se conformar às exigências de seu
po, os padrões de recompensa e castigo. papel subalterno nas relações sociais de
O que iria distinguir a utilização fun- produção.
cionalista do conceito daquela feita pelas Mas o que é, afinal, o currículo oculto?
perspectivas críticas seria, essencialmente, O currículo oculto é constituído por to-
a desejabilidade ou não dos comportamen- dos aqueles aspectos do ambiente escolar
tos que eram ensinados, de forma implícita, que, sem fazer parte do currículo oficial,
através do currículo oculto. Nessa visão, explícito, contribuem, de forma implícita,
os comportamentos assim ensinados eram para aprendizagens sociais relevantes. Pre-
funcionalmente necessários para o bom fun- cisamos especificar melhor, pois, quais são
cionamento da sociedade e, portanto, desejá- esses aspectos e quais são essas aprendiza-
veis. Na análise de Dreeben, por exemplo, a gens. Em outras palavras, precisamos saber
escola, através do tratamento impessoal que, "o que" se aprende no currículo oculto e
em contraste com a família, ela proporciona, através de quais "meios". Para a perspecti·
ensina a noção de universalismo necessária va crítica, o que se aprende no currículo
ao perfeito funcionamento das sociedades oculto são fundamentalmente atitudes,
"avançadas". Em direção contrária, nas comportamentos, valores e orientações
análises críticas, as atitudes e comporta- que permitem que crianças e jovens se
mentos transmitidos através do currículo ajustem da forma mais conveniente às
oculto são vistos como indesejáveis, como estruturas e às pautas de funcionamento,
uma distorção dos genuínos objetivos da consideradas injustas e antidemocráticas
78
e, portanto, indesejáveis, ~a sociedad~ vés dos quais as crianças e jovens apren-
capitalista. Entre outras coisas, o curri- dem certos comportamentos sociais: o
culo oculto ensina, em geral, o confor- espaço rigidamente organizado da sala de
mismo, a obediência, o individualismo. Em aula tradicional ensina certas coisas; o
particular, as crianças das classes operárias espaço frouxamente estruturado da sala
aprendem as atitudes próprias ao seu papel de aula mais aberta ensina outro tipo de
de subordinação, enquanto as crianças das coisas. Algo similar ocorre com o ensino
classes proprietárias aprendem os traços do tempo, através do qual se aprende
sociais apropriados ao seu papel de do- a pontualidade, o controle do tempo, a
minação. Numa perspectiva mais ampla, divisão do tempo em unidades discretas,
aprendem-se, através do currículo oculto, um tempo para cada tarefa etc. O currículo
atitudes e valores próprios de outras es- oculto ensina, ainda, através de rituais,
feras sociais, como, por exemplo, aqueles regras, regulamentos, normas. Aprende-
ligados à nacionalidade. Mais recentemen- se também através das diversas divisões
te, nas análises que consideram também as e categorizações explícitas ou implícitas
dimensões do gênero, da sexualidade ou próprias da experiência escolar: entre os
da raça, aprende-se, no currículo oculto, mais "capazes" e os menos "capazes", en-
como ser homem ou mulher, como ser tre meninos e meninas, entre um currículo
heterossexual ou homossexual, bem como acadêmico e um currículo profissional.
a identificação com uma determinada raça Finalmente, é importante saber o que
ou etnia. fazer com um currículo oculto quando
Agora, quais são os elementos que, no encontrarmos um. Na teorização crítica,
ambiente escolar, contribuem para essas a noção de currículo oculto implica, como
aprendizagens? Como já vimos, uma das vimos, na possibilidade de termos um
fontes do currículo oculto é constituída momento de iluminação e lucidez, no qual
pelas relações sociais da escola: as rela- identificamos uma determinada situação
ções entre professores e alunos, entre a como constituindo uma instância de currícu-
administração e os alunos, entre alunos e lo oculto. A ideia é que uma análise baseada
alunos.A organização do espaço escolar é nesse conceito permite nos tornarmos • 1/

outro dos componentes estruturais atra- conscientes de alguma coisa que até então
79
estava oculta para nossa consciência. A opacidade da vida cotidiana da sala de aula.
coisa toda consiste, claro, em desocultar o Ele como que tornava repentinamente
currículo oculto. Parte de sua eficácia resi- transparente aquilo que normalmente apa-
de precisamente nessa sua natureza oculta. recia como opaco. "Voilà, agora eu vejo...".
O que está implícito na noção de currículo Nesse sentido, o conceito continua sendo
oculto é a ideia de que se conseguirmos importante, apesar do predomínio de um
desocultá-lo, ele se tornará menos eficaz, pós-estruturalismo que enfatiza mais a
ele deixará de ter os efeitos que tem pela "visibilidade" do texto e do discurso que
única razão de ser oculto. Supostamente, a "invisibilidade" das relações sociais.
é essa consciência que vai permitir algu- O conceito tornou-se, entretanto,
ma possibilidade de mudança. Tornar-se crescentemente desgastado, o que, talvez,
consciente do currículo oculto significa, de explique seu declínio na análise educa-
alguma forma, desarmá-lo. cional crítica. Houve provavelmente uma
Obviamente, o conceito de "currículo certa trivialização do conceito. Algumas
oculto" cumpriu um papel importante análises limitavam-se a "caçar" instâncias
no desenvolvimento de uma perspectiva do currículo oculto por toda parte, num
crítica sobre o currículo. Ele expressa esforço de catalogação, esquecendo-se de
uma operação fundamental da análise suas conexões com processos e relações
sociológica, que consiste em descrever sociais mais amplos. Por outro lado, a ideia
os processos sociais que moldam nossa de "currículo oculto" estava associada ª
subjetividade como que por detrás de um estruturalismo que iria ser progressi-
nossas costas, sem nosso conhecimento vamente questionado pelas perspectivas
consciente. Ele condensa uma preocu- críticas. Se as características estruturais do
pação sociológica permanente com os currículo oculto eram tão determinantes,
,,. . , . ,,
processos mv1s1ve1s , com os processos não haveria muito a fazer para transformá·
que estão ocultos na compreensão comum -lo. O particípio passado - "oculto" - que
que temos da vida cotidiana. Nisso reside, adjetivava a palavra "currículo" indicava
talvez, precisamente sua atração. A noção que o ato de ocultação era resultado de
de "currículo oculto" constituía, assim, um uma ação impessoal, abstrata, estrutural.
í\ instrumento analítico de penetração na Ninguém, precisamente, era responsável
L!I 80
por ter escondido o currículo oculto. O
que tinha constituído sua força acabara por
decretar seu enfraquecimento como um
conceito importante da teorização crítica
sobre currículo. Finalmente, numa era
neoliberal de afirmação explícita da subje-
tividade e dos valores do capitalismo, não
existe mais muita coisa oculta no currículo.
Com a ascensão neoliberal, o currículo
tornou-se assumidamente capitalista.

Leituras
SANTOMÉ, Jurjo T. EI curriculum oculto. Madrid:
Morata, 1995.

SILVA, Tomaz T. da. "A economia política do


currículo oculto". ln Tomaz T. da Silva.
O que produz e o que reproduz em educa-
ção . Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.

81

Você também pode gostar