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CONCEITO

DE CIÊNCIA EM PSICOLOGIA
Ronalisa Torman1
O homem adquiriu conhecimentos seguros e úteis acerca de seu meio muito antes do surgi-
mento do pensamento científico moderno e isso é o que podemos denominar de senso comum.
Em um meio sociocultural em que a Psicologia popular e o senso comum podem ter per-
cepções incorretas sobre o funcionamento cognitivo, tornam-se matéria importante de análise
psicológica, cabendo aos psicólogos explicar os processos mentais e os esquemas ou as repre-
sentações que as pessoas usam para formular juízos, interagir com os outros e perceber o meio
que as rodeiam.
O homem, de modo geral, realiza avaliações sobre diversos assuntos, na medida em que a

sobrevivência da espécie humana depende de uma interpretação adequada das reações dos
nossos semelhantes quando interagimos uns com os outros. A percepção correta de como as
pessoas agem e se comportam é uma vantagem considerável nas interações sociais. Em geral,
de Psicologia todos sabemos um pouco, do mesmo modo que julgamos saber de educação, ges-
tão, futebol e televisão. Mas, de onde nos vem esse conhecimento psicológico?
Diariamente somos bombardeados com novelas, músicas, canções, programas de TV, con-
ferências e debates, livros, revistas e jornais que tratam de assuntos ligados à Psicologia, ao
comportamento, a dificuldades de relacionamento, a tragédias, ao sucesso e à felicidade. Por
muito desatenta que uma pessoa possa ser, algumas dentre essas informações acabarão por

1
Psicóloga (UNISINOS), Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional (Universidade Feevale), Mes-
tre em Ciências Sociais Aplicadas (UNISINOS), Professora e Supervisora do Curso de Psicologia (Universidade
Feevale), Coordenadora do Curso de Especialização em Teoria Psicanalítica da Universidade Feevale 1ª edição
(2012/2013) e atual Coordenadora do Projeto de Extensão Tecendo Histórias de Vida: bem-estar da mulher
e da pessoa idosa (Universidade Feevale). E-mail: ronalisa@feevale.br.
transitar ou serem absorvidas. No que se refere à Psicologia, o problema não está no pouco
que sabemos, ou no muito que julgamos saber, mas antes em julgar que sabemos o suficiente
e de modo preciso e correto. Estará fundamentado o que julgamos saber? Será que podemos
aplicar os conselhos gerais ao nosso caso? Será que também sabemos de outras áreas, como a
Física ou a Química?
No dia a dia não é habitual utilizarmos um procedimento científico para determinadas ações,
como, por exemplo, utilizar um termômetro, instrumento de precisão para medir a tempera-
tura, para sabermos o momento em que o fogo deve ser apagado quando um alimento estiver
supostamente cozido. Pois bem, se conhecimentos úteis puderam ser adquiridos mediante
somente o emprego de uma observação do senso comum, qual é a vantagem que se obtém ao

aplicar os procedimentos rigorosos do método científico?


Um dos objetivos dos sistemas científicos é evitar a grande confusão que pode ocasionar
a falta de precisão relativa à linguagem e à diversidade de procedimentos que se utilizam no
momento de relatar algum conhecimento adquirido.
De uma forma ampla, concebemos o fazer ciência como produzir conhecimentos que te-
nham por objetivo chegar a novas descobertas. Para tanto, no caso específico da Psicologia,

A nova disciplina da psicologia precisava desenvolver ma-


neiras mais precisas e objetivas de tratar o seu objeto de
estudo. Boa parte da história da psicologia, depois de sua se-
paração da filosofia, é a história do contínuo aprimoramento
de instrumental, técnicas e métodos de estudo voltados para
alcançar uma precisão e uma objetividade maiores tanto no
âmbito das perguntas como no das respostas (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009, p. 15).

A ciência, portanto, não surge do nada, ela sempre emerge de contextos sociais específicos
e com características determinadas, em íntima interação com os fenômenos históricos e movi-
mentos filosóficos, criados e vividos pelos homens. O processo de criação de uma nova ciência
é muito complexo, “[...] é preciso mostrar que ela tem um objeto próprio e métodos adequados
ao estudo desse objeto, que ela é, enfim, capaz de firmar-se como uma ciência independente
das outras áreas de saber” (FIGUEIREDO; SANTI, 2000, p. 14).
O psicólogo britânico William McDougall definiu a Psicologia, ao que parece, pela pri-
meira vez em 1908, como sendo a “ciência do comportamento” e, dessa forma, por volta
do começo do século XX, a psicologia americana conseguia a sua independência em relação
à Filosofia. Desenvolvia laboratórios nos quais aplicar os métodos científicos formavam
sua própria associação científica e definia-se formalmente como ciência: a ciência do com-
portamento (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
Não é simples apresentarmos a relação entre Psicologia e a ciência. Isso porque, como
revela até mesmo uma rápida análise da história da Psicologia, não há uma única relação,
mas muitas relações e muitas interpretações do que a ciência significa para a Psicologia.
Ainda hoje, após mais de cem anos de esforços para se criar uma Psicologia científica, os
estudos psicológicos mantêm relações estreitas com muitas ciências naturais e sociais (FI-
GUEIREDO; SANTI, 2000).
O processo desenvolvido para se considerar a Psicologia como uma ciência foi extre-
mamente moroso, e o principal empecilho para que isso acontecesse foi o seu objeto de
estudo: a psyché, entendida como sendo a mente, pois ela não se apresenta como objeto
observável, não se enquadrando, portanto, nas exigências do Positivismo de Augusto Com-
te (1798-1857), vigente na época de seu surgimento.
Quatro cientistas estão apontados como responsáveis diretos pelas primeiras aplicações
do método experimental ao objeto de estudo da Psicologia: Hermann Von Helmholtz, Ernst
Weber, Gustav Theodor Fechner e Wilhelm Wundt. Os quatro estudiosos eram alemães,
estudavam Fisiologia e eram conhecedores dos impressionantes desenvolvimentos dessa
área de conhecimento e da ciência havidos na metade do século XIX (SCHULTZ; SCHULTZ,
2009).

Hermann Von Heimholtz

Hermann Von Heimholtz (1821-1894): prolífico


pesquisador no campo da Física e da Fisiologia, foi
um dos maiores cientistas do século XIX. A Psicologia
estava em terceiro lugar entre as áreas de suas contri-
buições científicas; contudo, o seu trabalho, ao lado
do de Fechner e Wundt, foi decisivo para a fundação
da nova Psicologia (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
Gustav Theodor
Fechner

Gustav Theodor Fechner (1801-1887):


filósofo, físico e psicólogo alemão, foi
considerado o fundador da Psicofísica
e, portanto, da Psicologia Experimen-
tal. Nasceu em Gross Särchen, na Baixa
Lusatia. Estudou Medicina e Física nas
Universidades de Dresden e de Leipzig,
onde viveu a maior parte de sua vida.
Foi professor de Física na Universida-
de de Leipzig de 1834-1839. Devido a
uma doença não inteiramente diagnos-
ticada, que ameaçou deixálo cego, ficou
impossibilitado de lecionar, situação que favoreceu empregar sua inteligên-
cia e sua criatividade no campo da Filosofia e da investigação psicológica.
Preocupou-se com a relação existente entre mente e corpo, físico e psí-
quico, adotando a ideia de paralelismo psicofísico, ou seja: os fenômenos
mentais correspondem a fenômenos orgânicos. Fechner considerava que as
sensações somente poderiam ser testadas a partir do método das Ciências
Exatas, nesse caso, através dos estímulos. Dessas experiências nasceram
os métodos psicofísicos, experimentais e quantitativos que constituíram a
sua maior e mais importante contribuição para a nova ciência denominada
Psicologia. Em virtude disso, Fechner é considerado o pai da Psicometria.
Era um pensador de interesses intelectuais notavelmente diversos no de-
correr de uma ativa carreira de mais de setenta anos. Foi fisiologista por
sete anos, físico durante quinze, psicofísico por catorze, esteticista experi-
mental durante onze e filósofo por quarenta anos. Dentre esses empreendi-
mentos, a obra de Psicofísica foi a que lhe conferiu mais fama, embora ele
não quisesse ser lembrado pela posteridade como tal.
Foi principalmente devido à pesquisa psicofísica de Fechner que Wilhelm
Wundt concebeu o plano de sua Psicologia Experimental. Os métodos de
Fechner mostraram ser aplicáveis a uma gama de problemas psicológicos
muito mais ampla do que ele poderia imaginar, sendo usados ainda hoje na
pesquisa psicológica, com apenas poucas modificações. Fechner possibili-
tou à Psicologia aquilo que toda disciplina que deseja ser uma ciência tem
de possuir: técnicas de medida precisas (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
Ernst Weber
Ernst Weber (1795-1878): filho de um profes-
sor de Teologia, nasceu em Wittenberg, Alema-
nha. Recebeu o seu doutorado na Universida-
de de Leipzig em 1815, onde também lecionou
Anatomia e Fisiologia de 1817 até a sua apo-
sentadoria, em 1871. Seu principal interesse de
pesquisa foi a fisiologia dos órgãos sensoriais,
área em que forneceu duradouras contribuições
(SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).

Wilhelm Wundt
Wilhelm Wundt (1832-1920): fundador da
Psicologia como disciplina acadêmica formal. A
primeira pessoa na história da Psicologia a ser
designada, adequada e irrestritamente, como
psicólogo. Wundt fundou o primeiro laboratório
de Psicologia Experimental do mundo em Leip-
zig, na Alemanha, em 1879, e foi o responsável
pela formação de muitos psicólogos. Editou a
primeira revista e deu início à Psicologia Experi-
mental como ciência. As áreas que ele investigou
— incluindo a sensação e a percepção, a atenção,
o sentimento, a reação e a associação — se tor-
naram capítulos básicos em manuais que ainda
não haviam sido escritos. O fato de uma parte
tão grande da história da Psicologia depois de
Wundt consistir numa oposição à sua concep-
ção de Psicologia não diminui as suas realiza-
ções e contribuições como fundador (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2009).
Para Wundt, o objeto de estudo da Psicologia era a experiência imediata dos sujeitos,
definida como ‘’[...] a experiência tal como o sujeito a vive antes de se pôr a pensar so-
bre ela, antes de comunicála, antes de conhecê-la. É, em outras palavras, a experiência
tal como ela é’’ (FIGUEIREDO; SANTI, 2000, p. 58).
Wilhelm Wundt reconhecia elementos ou conteúdos da consciência, mas a sua aten-
ção se concentrava primordialmente na organização ou síntese desses elementos em
processos cognitivos de nível superior, mediante o princípio da percepção. Para ele, a
mente tinha o poder de sintetizar espontaneamente elementos, uma posição que con-
trariava a noção mecânica e passiva da associação favorecida pela maioria dos empi-
ristas e associacionistas britânicos (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
Ao definir a Psicologia como ciência da experiência imediata, Wundt pretendia ata-
car uma concepção de Psicologia muito comum em sua época, que tratava a mente
como se fosse uma substância ou entidade, seja espiritual (espiritualismo) ou material
(materialismo). Para ele, essa forma de fazer Psicologia estaria equivocada porque se
baseava em hipóteses metafísicas que extrapolavam toda a possibilidade de experiên-
cia.
Como sua intenção era fundar uma nova Psicologia - autônoma e independente de
teorias metafísicas -, a única alternativa era recusar por completo essas concepções
metafísicas acerca do objeto da Psicologia e propor uma outra, que se atinha à expe-
riência psicológica propriamente dita. Na Psicologia wundtiana, só há aquilo que é
dado na experiência, entendida sempre como um conjunto de processos interligados
(ARAÚJO, 2007).
É importante enfatizar que, também de acordo com a definição apresentada por
Wundt, não há uma diferença essencial de natureza entre o mundo interno e o exter-
no, uma vez que a experiência é um todo organizado que abrange ambos, mas apenas
uma diferença na maneira de abordá-los. Por isso, a relação entre a Psicologia e as Ci-
ências da Natureza deve ser de complementaridade. Elas se complementam na medida
em que fornecem relatos diferentes da mesma experiência, sem que haja a possibili-
dade de haver uma subordinação ou redução de uma à outra.
No século XIX, portanto, Wundt estruturou seus estudos no comportamento e com a
experimentação e o uso de metodologia científica de base positivista. Foi dessa forma
que esses estudos adquiriram o status de ciência. No entanto, com o passar dos anos,
evidenciou-se a necessidade de instrumentos capazes de propiciar medidas mais con-
fiáveis das habilidades humanas. Assim, no início do século XX, esse pensamento foi
representado pela Psicometria2, com seus testes de inteligência, fazendo surgir uma
nova área de pesquisa.
Já em meados do século XX, surgiram trabalhos com estratégias observacionais, em
que a preferência era um meio natural para a realização dos estudos, salientando a
importância dos sujeitos na pesquisa. Esses estudos foram os etológicos e trouxeram
a necessidade de ampliar as pesquisas para além dos laboratórios, negando o rigor de
controle de variáveis e valorizando a observação e o ambiente natural (BIASOLI-ALVES
apud BIASOLI-ALVES e ROMANELLI, 1998).
Nas últimas décadas do século XX, sob a influência de outras áreas do conhecimen-
to, tais como a Sociologia, a Educação, a Antropologia e a História, a Psicologia passou
a conceber o homem como o seu objeto de estudo, sendo ele um ser histórico e social.
Para Bock, Furtado e Teixeira (2009), o status da Psicologia como ciência foi con-
quistado quando, através de estudos rigorosos, foram elaboradas formas de investi-
gação científica, objetos de estudo, delimitação dos campos de estudo e métodos para
estudar os objetos e as teorias de conhecimento.
Podemos afirmar que foi então a partir dos estudos de Wundt que surgiram as pri-
meiras escolas teóricas da Psicologia: o Estruturalismo, o Funcionalismo, o Associa-
cionismo, o Behaviorismo e a Psicanálise. Neste capítulo serão aprofundadas as três
primeiras escolas teóricas.

2
De acordo com Pasquali (2009, p. 993): “[...] Etimologicamente, psicometria representa a teoria e a
técnica de medida dos processos mentais, [...] a psicometria consistia na medida do comportamento do
organismo por meio de processos mentais”.
O Estruturalismo
O fundador do Estruturalismo foi Edward Brad-
ford Titchener (1867-1927), discípulo de Wundt e
responsável pelo desenvolvimento, pela sistema-
tização e pela divulgação da sua obra nos Estados
Unidos. Foi estabelecida como a primeira escola
americana de pensamento no campo da Psicolo-
gia (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
Titchener aceitou o foco empirista e associacio-
nista sobre os elementos ou conteúdos mentais e
sua ligação mecânica através do processo da as-
sociação. Descartou a ênfase wundtiana na per-
cepção e concentrou-se nos elementos que com-
põem a estrutura da consciência. Segundo esse
cientista, a tarefa fundamental da Psicologia era
descobrir a natureza das experiências conscien-
tes elementares, ou seja, analisar a consciência
em suas partes separadas e, assim, determinar a
sua estrutura. Para tanto, Titchener modificou o
método introspectivo de Wundt.

Assim, o objeto de estudo da Psicologia, para o Estruturalismo, era a consciência


constituída por unidades básicas, como as sensações, as imagens e os afetos. Para
estudá-la, Titchener propôs o método das Ciências Naturais: a observação e a experi-
mentação.
A Psicologia, afirmava o cientista, como todas as ciências, depende da observação,
mas da observação da experiência consciente. A forma de auto-observação de Titche-
ner, ou introspecção, era realizada por observadores bem treinados que tinham de re-
aprender a perceber para que pudessem descrever seu estado consciente, e não o estí-
mulo. Titchener percebeu que todos aprendem a descrever a experiência em termos do
estímulo e, na vida cotidiana, isso é benéfico e necessário. No laboratório, entretanto,
essa prática tinha de ser
desaprendida mediante um treinamento intensivo.
Titchener não excluía o estudo das funções da consciência, mas destacava que a es-
trutura é mais importante que a função, e não se poderia compreender nenhuma das
funções da mente se antes não fosse revelada a sua estrutura.
Acreditava estar estabelecendo o padrão básico da Psicologia, não medindo esforços
para tanto, mas seus estudos demostraram ser somente uma fase na história dessa
ciência. A era do Estruturalismo acabou quando ele morreu. O fato de ter se mantido
por tanto tempo é um tributo efetivo à sua pessoa. Titchener desenvolveu sua escola
psicológica preocupado em estruturar o corpo teórico da psicologia pura, não se preo-
cupando com sua aplicabilidade (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
O Funcionalismo

O funcionalismo nasceu nos EUA e seu principal


pesquisador foi Wiliam James (1842-1910). Os psi-
cólogos funcionalistas definiam a Psicologia como
uma ciência biológica, interessada em estudar os
processos, as operações e os atos psíquicos (men-
tais) como formas de interação adaptativa, no sentido de descobrir sua função,
o que para o Funcionalismo não é conhecer, mas adaptar. O objeto de estudo da
Psicologia, para o Funcionalismo, era a consciência.
Na virada do século, a Psicologia assumira nos Estados Unidos um caráter
próprio, distinto do da Psicologia de Wundt e do Estruturalismo de Titchener,
que não se interessavam em estudar o propósito ou a função da consciência.
O foco para os funcionalistas era a operação dos processos conscientes, e não
a estrutura ou o conteúdo da consciência. O principal interesse dos psicólogos
funcionais era a utilidade ou o propósito dos processos mentais para o orga-
nismo vivo em suas permanentes tentativas de adaptar-se ao seu ambiente. Os
processos mentais eram considerados atividades que levavam a consequências
práticas, em vez de elementos componentes de alguma espécie de padrão.
A orientação prática do Funcionalismo levou inevitavelmente os psicólogos
a se interessarem pela aplicação da Psicologia aos problemas do mundo real.
Como atitude ou perspectiva geral, o Funcionalismo se tornou parte da prin-
cipal corrente da psicologia americana. Sua precoce e vigorosa oposição ao Es-
truturalismo teve um imenso valor para o desenvolvimento da Psicologia nos
Estados Unidos. Também foram significativas as consequências de longo prazo
da transferência da ênfase da estrutura para a função. Um dos resultados disso
foi que a pesquisa sobre o comportamento animal, que não fazia parte da abor-
dagem estruturalista, veio a ser elemento fundamental da Psicologia (SCHULT-
Z;SCHULTZ, 2009).
Portanto, para o Funcionalismo, a consciência é um mero produto da evolu-
ção. Desenvolveu-se como muitas outras funções, por um uso. O modo como se
formam os conceitos depende da pessoa que os concebe.
Hoje o Funcionalismo não existe como escola distinta de pensamento, mas
os funcionalistas deixaram marcas na psicologia americana contemporânea,
principalmente em sua ênfase na aplicação dos métodos e das descobertas da
Psicologia a problemas do mundo real (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
O Associacionismo
O principal representante do Associacionismo foi Edward Lee Thorndike (1874-
1949), discípulo de Willian James e considerado um dos mais importantes pesqui-
sadores no desenvolvimento da psicologia animal. Ele elaborou uma teoria objetiva
e mecanicista da aprendizagem, que se concentra no comportamento manifesto.
Acreditava que a Psicologia deveria estudar o comportamento, e não elementos
mentais ou experiências conscientes de qualquer espécie; assim, reforçou a tendên-
cia de uma maior objetividade, iniciada pelos funcionalistas.
Thorndike foi pioneiro no estudo da aprendizagem, entendendo-a não em ter-
mos subjetivos, mas em termos das conexões concretas entre estímulos e respostas
(SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
As obras de Thorndike e de Ivan Pavlov são um exemplo de descobertas simultâ-
neas independentes na história da Psicologia. Thorndike desenvolveu a Lei do Efeito
em 1898, e Pavlov fez uma proposta semelhante postulando a Lei do Reforço em
1902, mas foram necessários muitos anos até que essa semelhança conceitual fosse
percebida.
As investigações feitas por Thorndike sobre a aprendizagem humana e animal es-
tão entre as mais importantes da história da Psicologia. Suas teorias tiveram amplo
uso na educação, aumentando o envolvimento da Psicologia nessa especialidade.
Além disso, sua obra anunciou a ascensão da teoria da aprendizagem à proemi-
nência que ela alcançaria na psicologia americana. Embora teorias e modelos de
aprendizagem cada vez mais novos tenham surgido desde a época de Thorndike, o
significado de suas contribuições permanece
inalterado. Sua obra é um marco no Associacionismo, e a forma objetiva com que
conduziu suas pesquisas é uma relevante contribuição para o Comportamentalis-
mo. Com efeito, John B. Watson escreveu que as pesquisas de Thorndike assenta-
ram os alicerces do Comportamentalismo (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
Psicologia e seu estabelecimento como ciência
Ao revisar a literatura sobre a Psicologia e seu estabelecimento como ciência, percebe-
-se que o caminho trilhado por ela foi correlacionado com o paradigma das ciências nos
séculos XIX e XX, que se apoiavam no Positivismo e no rigor científico, os quais almejavam
o objetivismo, a neutralidade na relação com os sujeitos na pesquisa e o extremo controle
das variáveis nas situações empíricas.
No final do século XX, com os questionamentos sobre os paradigmas científicos, as Ci-
ências Humanas e a Psicologia passaram a adotar uma abordagem que enfatizou o homem
como um ser histórico e social, contextualizando-o em suas pesquisas, o que proporcionou
a ampliação dos estudos do comportamento, do psiquismo, das relações e dos significados
que o ser humano atribui às suas interações interpessoais e sociais.
Dessa forma, há a reflexão sobre a metodologia de pesquisa e das abordagens quantita-
tivas e qualitativas, que são relevantes nos estudos das Ciências Humanas.
As duas abordagens se diferem na organização e na explanação do problema: a pesquisa
quantitativa apresenta números para informar dados e opiniões, classificando os elemen-
tos, ou seja, utiliza-se de métodos estatísticos. Prodanov e Freitas (2009, p. 80) explicam:

Pesquisa quantitativa: considera que tudo pode ser quan-


tificável, o que significa traduzir em números opiniões e
informações para classificá-las e analisá-las. Requer o uso
de recursos e técnicas estatísticas (percentagem, média,
moda, mediana, desvio-padrão, coeficiente de correlação,
análise de regressão etc.).

Já a pesquisa qualitativa considera a relação entre o mundo, os sujeitos e os conheci-


mentos gerados com e a partir dessa dinâmica, tornando-se um estudo descritivo que se
preocupa com o processo. Os autores citados acima (2009, p. 81) completam:
Pesquisa qualitativa: considera que há uma relação di-
nâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo
indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do
sujeito que não pode ser traduzido em números. A inter-
pretação dos fenômenos e a atribuição de significados são
básicas no processo de pesquisa qualitativa.

Portanto, a pesquisa qualitativa estuda a origem dos fatos, a profundeza, o componente


mais relevante do caso. Demo (2000b) ainda acrescenta que esse estudo parte da etimolo-
gia da palavra, no latim, qualitas, que significa essência. Dessa forma, ela busca a compre-
ensão contextualizada da problemática, com a perspectiva de discutir as considerações e
ampliar as discussões.
Pesquisar, por conseguinte, é estudar sobre um assunto calcado no propósito de resolver
ou encontrar a melhor solução para o problema inicial. Demo (2000c, p. 20) complementa
que a pesquisa é entendida tanto como “[...] procedimento de fabricação do conhecimento,
quanto como procedimento de aprendizagem, sendo parte integrante de todo o processo
reconstrutivo de conhecimento”.
A pesquisa deve ser projetada para que possa encontrar respostas aos problemas. Não
existe verdade única e exata, pois todo estudo pode gerar novas possibilidades e descober-
tas. Para isso, o pesquisador tem importante função na execução da pesquisa: apresentar
os fatos, explicar com segurança as descobertas e buscar compreensão através do conhe-
cimento científico.
Mas, do que trata, afinal, a Psicologia como ciência? A Psicologia é o estudo científico do
comportamento e da organização mental. O objeto da Psicologia é analisado sob diferentes
perspectivas com o objetivo de se obter, um dia, uma perspectiva integradora. Estas pers-
pectivas são a biológica, a comportamental, a cognitiva, a sociocultural, a psicanalítica e a
fenomenológica.
Para finalizar, a psyché, parte do homem considerada como objeto de estudo da Psico-
logia, segue impossível de ser mensurada nos parâmetros das Ciências Naturais. Mesmo
assim, os pesquisadores dessa área de conhecimento seguem investigando sua estrutura
e suas características, desenvolvendo instrumentos e métodos para analisá-la psicologica-
mente. Há vários métodos de pesquisa em Psicologia e eles variam de acordo com a escola
teórica que fundamenta o estudo. Portanto, apontar simplesmente que o “homem” é objeto
da ciência psicológica ou das várias psicologias não é suficiente, porque essa designação
genérica, em princípio, é objeto comum a todas as ditas “ciências humanas” dedicadas ao
seu estudo. Resta-nos entender como essa disciplina desenha, a partir dessa abstração
ampla, seus sujeitos concretos e, para tanto, deve-se estudar como são construídos os ob-
jetos nesse campo, além de caracterizar o que singulariza o olhar das psicologias entre as
Ciências Humanas: este moderno olhar sobre o “psicológico”.

Referências
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