Você está na página 1de 48

TSP

AULA 3: a Psicologia como ciência

PROFESSOR THOMAZ RIBEIRO


A ciência é um empreendimento social multifacetado
que desafia uma descrição completa. O produto
acabado é um corpo de conheci­mentos que foram
adquiridos através do uso de métodos científicos
aplicados com uma atitude científica.
Diz-se frequentemente que a ciência procura
fatos. Com uma frequência quase idêntica,
também ouvimos dizer que a ciência implica
desenvolvimento de uma teoria. As conotações
usuais dessas palavras incluem um elevado grau
de certeza para os fatos e um baixo grau para as
teorias.
Existem muitas maneiras legítimas de tentar
conhecer e compreen­der o mundo. A maneira
científica é apenas uma entre várias. O que é
que distingue a ciência de outros tipos de
atividade? A ciência tem muitas características e
cada uma delas foi selecionada, em algum mo­
mento, como única, isto é, como
exclusivamente peculiar da ciência.
FINALIDADE. A finalidade geral da ciência consiste
em propor­cionar uma explicação objetiva, fatual e
empírica do mundo. Está, pois, em contraste com os
modos artístico, literário e religioso de pensar.
OBJETO DE ESTUDO. Diz-se correntemente que a
ciência tem um objeto de estudo que é diferente do que
interessa à não ciência. Isto só é verdade em parte. Os
cientistas são propensos a tratar de assuntos que se
situam perto da zona de transição entre o saber e a
ignorância.
CONCLUSÕES. Tem sido dito que as conclusões da
ciência são mais finais, mais corretas ou mais exatas
do que as conclusões alcan­çadas por outras disciplinas.
Os poetas, entre outros, podem indignar­-se, por vezes,
a tal respeito (Newman, 1957).
O cientista só pode olhar para a frente, num contínuo
pro­cesso de revisão dos fatos presentes.

Um psicólogo com uma inclinação filosófica disse isto


de uma forma admirável (Turner, 196 7 ) : "Cada novo
avanço emite uma centelha de certeza e, depois, a
certeza desa­parece" ( pág. 7).
PREVISÃO E CONTROLE. Diz-se, por vezes, que a
ciência se dis­tingue pela sua preocupação com a
previsão e controle de acontecimen­tos.

A mãe, tanto quanto o psicólogo, procura prever e con­


trolar o comportamento de crianças. Assim, esse
gênero de controle não distingue a ciência da não
ciência.
TEORIA versus APLICAÇÕES. A ciência não está
necessariamente interessada na teoria, como oposto às
aplicações. Um cientista pode trabalhar
exclusivamente com um ou outro desses aspectos, ou
com ambos.
TERMINOLOGIA. A terminologia do cientista não é
necessaria­mente mais exclusiva ou mais rigorosa, em
seu significado, do que a linguagem de outras pessoas.

Por vezes, os cientistas podem usar novas palavras


esotéricas e, outras vezes, dão novos significados a
velhas pa­lavras.
EXATIDÃO. Afirma-se frequentemente que a exatidão
e a precisão, especialmente na medição, distinguem o
cientista.

Mas tampouco a exatidão e a precisão constituem


propriedades exclusivas dos cientistas.
Contudo, acreditamos que a distinção essencial mais
adequada entre ciência e não ciência é uma
característica da metodologia científica.

É essa característica - o princípio de controle - a que


está mais pró­xima, entre todos os empreendimentos
humanos, de pertencer exclu­sivamente à ciência.
O controle é um método usado pelo cientista
numa tentativa para identificar as "razões" ou
"causas" do que ele observa ou, por outras
palavras, para identificar as fontes de variação
em suas observações.
Uma teoria é um grupo de leis dedutivamente liga­das"
Neste sentido, uma lei científica é uma hipótese que foi
comprovada, que foi amplamente aceita e cujas
implicações foram confirmadas sem falhas pela
observação.

As nossas teorias psicológicas, infelizmente, nem


sempre consistem em leis; em psicologia, as hipóteses
nem sempre são incorporadas às teorias mediante
provas que as corro­borem e, quando têm uma ligação
dedutiva, é apenas no mais lato senso da palavra.
Kuhn ( 1962) enfatiza um elemento muito importante
que foi até aqui deixado de lado em nosso exame da
ciência. A ciência normal, disse ele, progride mediante
o trabalho que se desenrola dentro da mol­dura de um
"paradigma". Um paradigma inclui leis e teorias que
suge­rimos serem partes importantes da ciência.
Toda e qualquer ciência passa por uma fase mais
primitiva durante a qual existem escolas concorrentes e
nenhum paradigma se torna predominante. A
psicologia pode estar atualmente nessa fase e, sem
dúvida, esteve nessa fase no passado.

Acreditamos, com Kuhn, que o conceito de um


paradigma é importante para a compreen­são do
progresso da ciência.
PROBLEMAS HERDADOS PELA PSICOLOGIA

O Problema Mente-Corpo

Se o homem tem uma mente e um corpo, então surge,


natural­mente, a seguinte pergunta: "Qual é a relação
entre as duas partes?“
Theodor Fechner, começou a trabalhar no problema.
Era sua intenção encontrar equações que descrevessem
as relações fun­cionais entre os domínios psíquico e
físico.
Passemos agora do nosso exame dos desenvolvimentos
científicos pré-psicológicos a um estudo dos
primórdios da Psicologia.

Parece natural que a psicologia seja experimental,


fisiológica e interessada em problemas de sensação e
percepção. Como nasceu da filosofia, também seria de
esperar que se interessasse em problemas
epistemológicos.
A fisiologia desempenhou um papel direto muito
pequeno. Embora Wundt chamasse à sua psicologia
uma psicologia fisiológica experimental, não havia
quase experimentação fisiológica de espécie alguma

Wundt era um fisiolo­gista. Contudo, a psicologia


necessitava, primordialmente, do nome de fisiologia.

A fisiologia era frequentemente invocada para ilustrar


a respeitabilidade científica da psicologia.
Wundt pôde justificar-se por não fazer experimentação
fisiológica, em virtude da sua posição filosófica no
problema mente-corpo. Ele acreditava que a mente e o
corpo seguiam rumos paralelos mas que era impossível
afirmar que eventos corporais causavam os eventos
men­tais; simplesmente, os acontecimentos externos
davam origem a certos processos corporais e, ao
mesmo tempo, a processos mentais paralelos.
Ele pensava que a tarefa primordial da psicologia era
descobrir os elementos dos processos conscientes, a
maneira como interligavam e as leis que determinavam
essa conexão.

Como a mente e o corpo seguiam rumos paralelos, a


maneira mais simples de realizar essa tarefa, segundo
Wundt, era proceder a um estudo direto dos eventos
mentais, através do método da introspeção.
"Ciência da experiência consciente", assim descreveu
sobre sua nova psicologia. Para ele o método de
observação devia utilizar a introspecção para que se
obtenha um melhor resultado, porque "somente o
indivíduo que passa pela experiência é capaz de
observá-la" (Schultz, 2016, p. 72). Tal método era
chamado de Percepção Interna por Wundt.
• Wundt incorporou à psicologia uma espécie de
problema de dualismo. Também incorporou uma forte
convicção na necessidade de empregar o método
experimental.

• As suas pesquisas se baseavam na inrospeção em


laboratório. Ele pretendia excluir da psicologia a
especulação metafísica.
O laboratório de Leipzig, oficialmente fundado em 1879,
também se encarregou de muitos problemas específicos
que estavam aguardando uma psicologia.
O problema do tempo de reação.
Os problemas da sensação e percepção foram herdados de
Helmholtz, Fechner e outros.
Objeto de estudo da psicologia moderna

Não existe uma forma de definir o objeto de estudo da


psicologia de uma maneira que agrade a todos os
psicólogos.

Em primeiro lugar, há um acordo praticamente universal


em que a psicologia estuda o comportamento do
organismo.

A ciência (e a psicologia, como parte dela) estuda


relações. O que é, pois, que a psicologia estuda, em
relação a reações? A resposta parece ser esta: "Quase tudo
o que pode ser relacionado."
Bessel interessou-se nas relações temporais entre estímulo
e reação e iniciou os experimentos sobre o tempo de
reação.

Uma rudimentar definição inicial de Psicologia poderia


ser esta: Psicologia é a ciência que estuda as relações entre
acontecimentos ou condições, antecedentes, e o
comportamento consequente dos organismos. Isto é,
reconhecidamente, uma e definição muito ampla mas a
Psicologia também se tornou um campo muito vasto.
Uma definição mais estreita poderia separar, com maior
cla­reza, a Psicologia do resto do corpo da Ciência, mas
nós achamos que ela não deve ser separada.

Assim como, inicialmente, os fisiologistas se viram


estudando problemas psicológicos, também o psicólogo
estuda problemas fisiológicos para entender melhor a
psicologia.

Alguns dos primeiros estudos psicológicos eram


psicofísicos.
São igual­mente importantes e igualmente impressionantes
as sobreposições no outro extremo da escala, com a
sociologia e a antropologia. Felizmente, os psicólogos não
dão provas de conhecerem a definição de sua ciência.
Psicologia: e Uma Hierarquia da Ciência

A ciência do comportamento, que inclui a psicologia como


exemplo principal, está imediatamente interpolada entre as
ciências biológicas e as ciências sociais.

Todas estas disciplinas se ocupam dos organismos vivos,


em diversos graus de relacionamento e de complexidade.

Se a psicologia tem suas raízes plantadas na biologia, as


suas regiões superiores estendem-se claramente pelo mais
complexo domínio da ciência social.
A hierarquia das ciências poderia ser igualmente disposta
num círculo, em vez de se dispor ao longo de uma linha.
Não pode ser traçada uma linha firme entre os cientistas
puros e aplicados.

Os cien­tistas puros são pessoas interessadas,


primordialmente, na descoberta de novos fatos e no
desenvolvimento de teorias, sem qualquer interesse
imediato na sua aplicação. Os cientistas aplicados são
pessoas que tem interesse imediato na aplicação dos
conhecimentos.
PROBLEMAS ESPECIAIS RELACIONADOS COM
O OBJETO DE ESTUDO DA PSICOLOGIA

Controles

Enfatizamos o fato de que o controle é essencial ao


desenvolvi­mento da ciência. Só através de medições
adequadas podemos estar certos de que as relações
presumidas entre variáveis são realmente válidas.

Fundamentalmente, a Psicologia não difere de qualquer


outra ciência no tocante à sua necessidade de controle.
Tem na sua capacidade de impor os necessários controles,
especialmente quando o objeto de nossa curiosidade é o
comportamento humano.

É óbvio que existem limites às manipulações que


podemos efetuar com sujeitos humanos.
Quantificação

A Psicologia ainda não foi tão bem sucedida quanto as


ciências mais antigas em suas tentativas de aplicar um
tratamento matemático aos seus problemas.

Mas, importantes esforços estão sendo feitos e um


substancial progresso já foi conseguido nessa direção.

O objeto de estudo da Psicologia prestar-se-á à medição


tradicional e à matemática tradicional ou são necessários
alguns sistemas simbólicos diferentes?
Subjetivismo

A Psicologia envolve o estudo frequentemente de pessoas.


Parece ser mais difícil adotar atitudes científicas isentas de
preconceitos em relação a esse objeto de estudo do que em
relação a qualquer outro.

Dificuldade de aceitar a ideia básica de que o


comportamento humano possa ser cientificamente
estudado.
O próprio psicólogo tem dificuldade em conseguir
objetividade, no que se refere ao seu domínio.

Os objetos de es­tudo psicológico parecem especialmente


receptivos à projeção das nossas próprias ideias.
Complexidade

O grau de complexidade que se atribui a um objeto de


estudo pode depender da fase de desenvolvimento da
ciência que se ocupa dessa matéria.

No começo, o objeto de estudo pode parecer simples.


Contudo, à medida que se coletam os fatos, os problemas
desenvolvem­-se e o campo começa a ter um aspecto bem
mais complexo.
O objeto de estudo da Psicologia parece ser mais
complexo que o de muitas ciências.

O biologista poderia argumentar que o seu campo é


igualmente complexo nesse aspecto.

E o sociólogo argumentaria que o seu campo é ainda mais


complexo, pois a compreen­são dos indivíduos seria
presumivelmente necessária para entender o
comportamento social.
O argumento usual de que o objeto de estudo da
Psicologia é mais complexo do que de outras ciências não
assenta em bases completamente firmes.

Não obstante, os psicólogos estão de acordo em que o


objeto de estudo é suficientemente complexo para eles e
alguns casos, confuso.
A Psicologia não tem ainda o número suficiente de anos
para resolver todos os seus problemas. A fraqueza que
iremos encontrar nos seus sistemas e teorias existe, em
parte, por essa razão.
RESUMO E CONCLUSÕES

Muitas ideias científicas tiveram que se desenvolver


dentro da ciência antes que a Psicologia pudesse surgir:
• explicação de um evento deve ser procurada dentro do
mesmo sistema em que o evento ocorreu;
• a observação é o árbitro da verdade científica e que o
ser humano é uma parte da ordem natural;
• o comportamento humano pode ser cientificamente
estudado para determinar as leis que governam esse
comportamento.
A Psicologia herdou certos problemas, por causa da sua
pré-his­tória imediata, dentro da ciência e da filosofia:

• relação entre os aspectos mental e físico do ser


humano;
• a explicação da fisiologia da percepção e dos
conteúdos perceptuais;
• a determinação da base para a descrição da equação
pessoal;
• a análise das diferenças individuais e da
hereditariedade.

Os efeitos desses pro­blemas sobre a psicologia experimental, tal


como foi concebida pelo seu fundador, Wilhelm Wundt, foram
examinados sucintamente.
A Psicologia herdou certos problemas, por causa da sua
pré-his­tória imediata, dentro da ciência e da filosofia:

• relação entre os aspectos mental e físico do ser


humano;
• a explicação da fisiologia da percepção e dos
conteúdos perceptuais;
• a determinação da base para a descrição da equação
pessoal;
• a análise das diferenças individuais e da
hereditariedade.

Os efeitos desses pro­blemas sobre a psicologia experimental, tal


como foi concebida pelo seu fundador, Wilhelm Wundt, foram
examinados sucintamente.
O objeto de estudo da psicologia moderna foi definido em
termos amplos e com certos problemas científicos:

• a dificuldade das condições de controle;


• problema da quantificação tornou-se mais difícil;
• objeto de estudo dispõe o psicólogo ao subjetivismo e
o mesmo objeto de estudo cresce em complexidade.

Estes problemas não são exclusivos da Psicologia mas


parecem agravar-se nela.
REFERÊNCIAS

MARX, M; HILLIX, W. Sistemas e teorias. In: ______. Sistemas e


Teorias em Psicologia. São Paulo: Cultrix, 2001, 1-83.

Você também pode gostar