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BAIXAS VISUAIS CRÔNICAS

CATARATA ADQUIRIDA

Jailton Vieira Silva¹


Ana Luíza Torquato de Aquino²

OBJETIVOS DE APRENDIZADO

▪ Compreender a importância do cristalino para a visão;


▪ Conhecer os principais fatores de risco da catarata;
▪ Associar os tipos de cataratas às suas principais causas;
▪ Identificar sinais e sintomas;
▪ Entender os princípios do tratamento e suas complicações.


RELEVÂNCIA

Pequenas opacidades no cristalino são comuns e raramente interferem na visão. Em 2019, o número de pessoas
com alguma deficiência visual no mundo ultrapassava 2 bilhões, dos quais pelo menos 1 milhão de casos poderiam ter
sido evitados ou ainda não foram abordados. Dentre essas causas, a catarata é responsável por cerca de 80% dos casos
(OMS/2019), excluídas as ametropias. A prevalência em adultos é de 10%, aumentando progressivamente a partir dos
50 anos e alcançando 75% de prevalência em maiores de 75 anos. Nos próximos 20 anos, estima-se que a incidência de
catarata irá duplicar.

INFORMAÇÕES GERAIS

Catarata é definida como qualquer opacidade pela melhora da visão em pacientes previamente
no cristalino que afete a acuidade visual (OMS/1990). hipermétropes (segunda visão da idade).
Cerca de um terço do poder refrativo do olho é
proveniente do cristalino, podendo variar de 20D a 30D
pelo mecanismo de acomodação.
O cristalino é circundado por ligamentos
suspensores, ligados ao músculo ciliar e responsáveis
pela acomodação. O comprometimento desse sistema
causa presbiopia que ocorre em pacientes com mais de
40 anos de idade Anatomo-histologicamente, pode-se
dividir o cristalino em cápsula (formada por fibras
colágenas), epitélio subcapsular (produz as fibras do
cristalino), córtex (contém as fibras do cristalino) e
núcleo (fibras cristalinas antigas).
São as proteínas cristalinas que conferem
transparência ao cristalino. O estresse oxidativo
degenera as fibras, resultando, inicialmente no FIGURA 1. Catarata nuclear com esclerose moderada

aumento da sua fração aquosa do cristalino (maior


poder de refração) e, com a progressão da doença, Cortical. Há opacidades radiais periféricas que
desidratação e opacificação (catarata). se expandem e envolvem o cristalino. Frequentemente
é assintomática até que haja acometimento nuclear,
Curiosidade entretanto pode causar ofuscamento (glare) e algumas
vezes leve hipermetropia. Apresenta menor redução da
acuidade visual.
Fibras do cristalino

As fibras do cristalino são produzidas durante o período embrionário e


envelhecem com o olho, sem que haja renovação. São, portanto, as
células do corpo mais suscetíveis à degeneração.

Medidas preventivas

Acredita-se que o uso de óculos com proteção UV, antioxidantes,


abstinência ao tabaco e estrógeno (em mulheres pós menopausa) podem
retardar o aparecimento de catarata.

Classificação quanto a localização


Nuclear. É a forma mais frequente de


catarata. Há coloração amarelada do cristalino
central. Está associado à miopia inicial por
hidratação e à perda da diferenciação de cores
FIGURA 2. Catarata cortical
(perda de contraste). A miopia inicial é responsável

1. PROFESSOR DA DISCIPLINA DE OFTALMOLOGIA – UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ TEXTO REVISADO EM 25/03/2020.


2. ACADÊMICO DE MEDICINA – UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
S u b c a p s u l a r p o s t e r i o r . Pa c i e n t e s s ã o
prejudicados por condição que causa miose. Ocorre QUADRO 1. FATORES DE RISCO PARA CATARATA.
classicamente abaixo dos 50 anos, associada a diabetes Fator de risco Comentário
mellitus, trauma, radiação e esteroides. Caracteriza-se
por opacidade em forma de placa, mais bem Idade avançada Principal fator de risco pelo acúmulo de
visualizada por retroiluminação contra o reflexo exposição a outros fatores e pelo declínio de
antioxidantes.
vermelho. Ocorre adjacente à cápsula posterior. Tem
progressão rápida e o paciente pode apresentar queixas Uso de Associado à catarata pré-senil e ao tipo
de ofuscamento luminoso ou sensibilidade à luz. Em corticoides subcapsular posterior.
geral , esse é o tipo de catarata que baixa a visão mais
precocemente. Miopia Associada à catarata nuclear (aumento inicial
no índice de refração). Acredita-se que haja
associação entre a subcapsular posterior e
miopia axial.

Radiação UV Associa-se aos tipos cortical e nuclear.

Diabetes mellitus Associa-se à catarata pré-senil e ao tipo nuclear.

Tabagismo Associa-se à catarata nuclear.

QUADRO 2. CAUSAS DE CATARATA.

Causas Comentário

Senil É a mais comum.

Traumática Pode ser por contusão, perfuração, choque elétrico


e radiação ionizante.
FIGURA 3. Catarata subcapsular posterior em retroilminação
Pressenil Principalmente por diabetes, distrofia
miotônica, dermatite atópica.

Medicamentosa Principalmente por esteroides, mióticos,


Catarata subcapsular anterior antipsicóticos.
Forma subcapsualar anterior é rara e geralmente compromete pouco a
visão. Secundária Uveite anterior crônica, tumor, glaucoma
agudo, doenças oculares degenerativas.

Endócrina/ Hipocalcemia, doença de Wilson, Sd. de Down,


metabólica diabetes.

ABORDAGEM AO PACIENTE


MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS (Sintomas)




 no índice de refração. Incialmente, pode ocorre
Os pontos mais importantes na avaliação de um melhora visual para perto com borramento para longe
paciente com catarata são a interferência da baixa (miopia por hidratação do cristalino).
visual na qualidade de vida da pessoa e a identificação Diplopia. Opacidades corticais podem causar
de comorbidades oculares, a fim de determinar o alterações refrativas localizadas, resultando em
quanto a catarata é responsável pela baixa visual. Seus diplopia monocular. Lembrar que catarata é uma das
efeitos na visão dependem do seu grau e da sua principais causas de diplopia monocular.
morfologia.
Borramento visual. O acometimento geralmente EXAME CLÍNICO (Sinais)
é bilateral, ocorrendo borramento visual progressivo,
indolor e levemente assimétrico. Acuidade visual. É o maior indicador de
Ofuscamento (glare). Mais comumente comprometimento funcional em pacientes com
catarata. A avaliação deve ser feita sempre com a
encontrado na catarata subcapsular posterior. Pode
melhor visão corrigida, uma vez que, nas fases iniciais,
necessitar de indicação cirúrgica precoce pela
a baixa visual da catarata pode ser melhorada com
dificuldade encontrada em dirigir a noite.
óculos.

Perda de contraste. Pacientes podem apresentar TRV (Teste do reflexo vermelho). A presença
dificuldade de enxergar em ambientes pouco de catarata pode ser vista como atenuação do brilho
iluminados por conta da redução na sensibilidade de
pupilar difusamente ou setorialmente e ainda de
contraste.
grande importância, observar assimetrias entre os
Alterações de cores. É mais observado na olhos.
c a t a r a t a n u c l e a r, c u j o n ú c l e o s e t o r n a Fundoscopia. Na catarata inicial, ainda é
progressivamente mais amarelado, absorvendo a luz possível se fazer o exame de fundo de olho. Contudo,
azul. Entretanto, como é uma modificação lenta, não com o avançar da doença, torna-se difícil a prática do
há percepção até a cirurgia. exame, sendo necessária a realização de outros
Miopia. Alterações nucleares induzem modificação métodos para avaliar a retina, como a ecografia ocular.
Exame especializado

Biomicroscopia

É o melhor exame para avaliar o cristalino. Permite diagnóstico e


classificação da catarata. Quanto a localização: nuclear, cortical,
subcapsular, ou quanto a maturação. É comum dois ou mais tipos
estarem presentes concomitantemente. Essa classificação tem
importância clínica uma vez que cada tipo está mais associado a
determinadas causas e podem manifestar sintomas diferentes.

Ultrassonografia ocular

Na impossibilidade de se realizar a fundoscopia, pode-se fazer


ultrassonografia ocular para detectar alterações do segmento posterior
como hemorragia vítrea e descolamento de retina associados.

DIAGNÓSTICO

Todo paciente com mais de 60 anos com miopia
recente ou baixa de acuidade visual progressiva não FIGURA 5. Catarata hipermadura com enrugamento da capsula anterior
refracional, deve ser avaliado para catarata. Paciente
diabéticos e/ou usuarios de corticoide crônicos com
baixa visual também devem ser avaliados para catarata
O diagnóstico definitivo deverá ser feito no
exame da lâmpada de fenda ou biomicroscopia do
cirstalino para confirmar, estadiar e traçar o plano
terapêutico da catarata.

QUADRO 3. CLASSIFICAÇÃO DA CATARATA QUANTO À MATURAÇÃO.

Fator de risco Comentário

Imatura O cristalino está turvo, contudo há reflexo vermelho.


Clinicamente, pode haver perda parcial da AV.

Madura Define-se por alterações densas o suficiente para


obscurecer o segmento posterior do olho. A pupila e
embranquecida (leucocoria). O paciente apresenta
grande déficit visual.
FIGURA 6. Catarata morganiana com liquefação do córtex e afundamento
Hipermadura O córtex liquefaz-se e vaza para fora do cristalino,
enrugando a capsula anterior. Po d e haver inferior do núcleo
desenvolvimento de glaucoma facolítico.

Morganiana O córtex torna-se totalmente liquefeito, com núcleo


solto dentro da cápsula. CONDUTA


O tratamento é cirúrgico e de caráter eletivo,


através de facectomia e implante de lente intraocular.
A cirugia de urgência se justifica, no entanto, nos
casos de glaucoma associado a catarata. Na maioria
dos casos, no entanto, deve ser feita quando o
paciente julgar que há limitação de suas atividades.
Em pacientes que precisam fazer fundoscopia seriada,
como nos pacientes com retinopatia diabética, a
cirurgia poderá ser indicada mais precocemente

A complicação mais comum é a opacificação da
cápsula posterior (até 50%); a capsula é preservada
durante a cirurgia para alojar a lente artificial que
substituirá o cristalino opacificado. Como persistem
células epiteliais do cristalino, as vezes estas
proliferam e opacificam a cápsula posterior. O
tratamento dessa complicação é simples e
ambulatorial, realizado com um laser que faz uma
pequena abertura na parte opacificada da cápsula
(leigos conhecem esse procedimento como limpeza da
lente). A complicação mais grave e mais temida é a
FIGURA 4. Catarata madura infeção intraocular conhecida como endoftalmite, que
felizmente é muito rara (0,12%). 

QUADRO 4. INDICAÇÕES DE FACECTOMIA

▪ Pacientes com incapacidade visual sintomática;

▪ Terapia cirúrgica de comorbidade ocular (uveite, glaucoma);

▪ Tratamento e monitoramento de comorbidade ocular (GPAA, RD).

FIGURA 8. Lente intraocular in situ no compartimento capsular

FIGURA 7. Lente intraocular

REFERÊNCIAS

1. KANSKI, J. J. Oftalmologia clínica. 8 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016


2. REY, L. Dicionário de Termos Técnicos de Medicina e Saúde . Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.

3. SCHOR, P.; CHAMON, W.; BELFORT-JUNIOR, R. Guias de medicina ambulatorial e hospitalar. Barueri: Manole, 2004.
4. EHLERS, J. P.; SHAH, C. P. Manual de Doenças oculares do Wills Eye Hospital: diagnóstico e tratamento no consultório e na emergência. Porto
Alegre: Artmed, 2009.
5. WEVILL, M. Epidemiology, pathophysiology, causes, morphology and visual effects of cataract. In: MYRON, Y.; DUKER, J. S. Ophthalmology. Saint
Louis: Elsevier, 2009.

6. WORLD REPORT ON VISION. World Health Organization, 2019. Disponível em: https://www.who.int/docs/default-source/infographics-pdf/
world-vision-infographic-final.pdf?sfvrsn=85b7bcde_2. Acesso em: 25 de março de 2020.

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