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A PRÁTICA DE TONGLEN

“Tonglen é uma prática que visa a criar espaço, a ventilar a atmosfera de nossa vida para que as
pessoas possam respirar livremente e relaxar. Sempre que encontramos o sofrimento, sob qualquer
forma, as instruções de tonglen nos dizem para inspirá-lo, com o desejo de que todos possam se libertar
da dor. Sempre que encontramos a felicidade, sob qualquer forma, devemos expirá-la, dirigi-la para
fora, com o desejo de que todos possam sentir alegria. Essa é uma prática que permite às pessoas
sentirem-se menos oprimidas, menos limitadas. Ela nos mostra como amar incondicionalmente.”
“A prática de tonglen reverte a lógica habitual de evitar o sofrimento e buscar o prazer. Nesse
processo, nós nos libertamos de padrões muito antigos de egoísmo. Começamos a sentir amor, tanto
por nós mesmos quanto pelos demais; passamos a cuidar de nós mesmos e dos outros. Tonglen
desperta nossa compaixão e nos faz conhecer uma visão muito mais ampla da realidade.”

“Quando praticamos tonglen como uma meditação formal, devemos seguir quatro passos:
1. Em primeiro lugar, descanse sua mente por alguns segundos em um estado de abertura ou
quietude. Esse estágio é tradicionalmente chamado de lampejo do bodhichitta absoluto, ou de súbita
abertura à amplidão e clareza fundamentais.
2. Em seguida, trabalhe com a textura. Inspire o calor, a escuridão e o peso — a sensação de
claustrofobia — e expire serenidade, claridade e leveza — a sensação de frescor. Inspire
profundamente, por todos os poros, e expire, irradie completamente, usando todos os poros de seu
corpo. Faça isso até que essas sensações estejam sincronizadas com sua inspiração e expiração.
3. No passo seguinte, trabalhe uma situação pessoal qualquer situação dolorosa que seja real para
você. Tradicionalmente, começa-se praticando tonglen por alguém com quem nos preocupamos e que
queremos ajudar. Entretanto, quando seus próprios problemas o impedem de prosseguir, você pode
realizar a prática pela dor que está sentindo e, simultaneamente, por todos aqueles que, como você,
passam pelo mesmo tipo de sofrimento. Por exemplo, se está se sentindo incapaz, inspire essa
sensação, por si mesmo e pelos outros que estão no mesmo barco, e exale confiança, sentimento de ser
capaz ou de alívio, da forma que desejar.
4. Finalmente, torne esse processo mais abrangente. Se você está praticando tonglen por alguém
que ama, estenda a prática a todos aqueles por quem nutre o mesmo sentimento. Se está praticando
por alguém que viu na televisão ou na rua, faça o mesmo por todos que estão em situação semelhante.
Não se limite a uma única pessoa. Talvez já seja suficiente praticar por todos aqueles que, como você,
estão dominados pela raiva, medo, ou por qualquer outro sentimento que também o aprisione.
Entretanto, em todos esses casos, você pode ir além. Você pode praticar tonglen por aqueles que
considera inimigos — aqueles que o ferem ou ferem alguém. Faça tonglen por eles, pense neles como
dominados pela mesma confusão e impotência que vê em si mesmo e naqueles que ama. Inspire a dor
deles, expire alívio.
A prática de tonglen pode ser infinitamente ampliada. À medida que pratica, gradualmente e ao
longo do tempo, verá que sua compaixão naturalmente se expande e o mesmo acontece com a
percepção de que as coisas não são tão sólidas quanto você pensava. À medida que pratica,
gradualmente e em seu próprio ritmo, ficará surpreso ao perceber-se cada vez mais capaz de ajudar os
outros, mesmo em situações que pareciam insolúveis.”

“Tonglen pode ser praticado como uma meditação formal, ou em qualquer lugar e a qualquer
momento. Estamos passando e vemos alguém em sofrimento — ali mesmo, começamos a inspirar essa
dor e a exalar alívio. Ou então, ao ver alguém sofrendo, podemos desviar o olhar. Esse sofrimento
desperta nosso medo ou raiva, nossa resistência e confusão. Portanto, naquele exato momento,
podemos praticar tonglen por todas as pessoas que, assim como nós, desejam ser compassivas, mas
sentem medo — que desejam ser corajosas, mas são covardes. Em vez de nos punirmos, podemos usar
nossos próprios entraves como o primeiro degrau para compreender o que outras pessoas, no mundo
inteiro, estão enfrentando. Inspirar por todos nós e expirar por todos nós. Usar o que parece veneno
como remédio.”

Pema Chödrön – adaptado do livro “Quando tudo se desfaz”

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