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Faculdade de Veterinária
Departamento de Patologia Clínica Veterinária Relatório de Caso Clínico
Disciplina de Bioquímica e Hematologia Clínica (VET03121)
http://www6.ufrgs.br/bioquimica
IDENTIFICAÇÃO
Caso: 2013/1/03 Procedência: HCV-UFRGS No da ficha original: 69647
Espécie: felina Raça: SRD Idade: 5 anos Sexo: macho Peso: 4,5 kg
Alunos(as): Lucas Vogel, Michelle Petersen, Monalisa Rosa e Raquel Kubaski Ano/semestre: 2013/1
Residentes/Plantonistas:
Médico(a) Veterinário(a) responsável: Guilherme Carvalho
ANAMNESE
Felino macho não castrado chegou ao HCV-UFRGS no dia 12/03/2013 com relatos de polidpsia (mais de 500
ml/H2O/dia), poliúria, polifagia e com impossibilidade de subir obstáculos altos. O animal apresenta histórico
de fraturas nos membros torácicos há aproximadamente dois anos. Em 2012, foi atendido em uma clínica
particular, por apresentar sinais de tosse, onde foi diagnosticado com linfoma e começou o tratamento com
Predsim Gotas (anti-inflamatório: fosfato sódico de predinisolona) que se estendeu até o dia 12/03/2013. Há
um mês fraturou novamente o membro torácico e aguarda por cirurgia.
EXAME CLÍNICO
Animal agressivo, não foi possível fazer o exame clínico.
EXAMES COMPLEMENTARES
URINÁLISE
Método de coleta: cistocentese Obs.:
Exame físico
cor consistência odor aspecto densidade específica (1,020-1,040)
Amarelo claro Fluida Límpido 1038
Exame químico
pH (6,0-7,0) corpos cetônicos glicose pigmentos biliares proteína hemoglobina sangue nitritos
6,0 - ++ - ++ - - -
Sedimento urinário (no médio de elementos por campo de 400 x)
Células epiteliais: 1 Tipo: transição Hemácias: 1
Cilindros: Tipo: Leucócitos:
Outros: Tipo: Bacteriúria: ausente
n.d.: não determinado
BIOQUÍMICA SANGUÍNEA
Tipo de amostra: soro Anticoagulante: Hemólise da amostra: ausente
Proteínas totais: 92,0 g/L (54-78) Glicose: 362 mg/dL (73-160) FA: 82 U/L (0-93)
Albumina: 47,5 g/L (21-33) Colesterol total: 137 mg/dL (74-130) ALT: 26 U/L (0-83)
Globulinas: 44,5 g/L (26-50) Uréia: 47 mg/dL (43-64) CPK: U/L (0-125)
BT: mg/dL (0,15-0,5) Creatinina: 0,7 mg/dL (0,8-1,8) Frutosamina: 381,6 mmol/L (219-347)
BL: mg/dL (-) Cálcio: mg/dL (6,2-10,2) Triglicerídeos: 102,3 mg/dL (25-133)
BC: mg/dL (-) Fósforo: mg/dL (4,5-8,1) : ( )
BT: bilirrubina total BL: bilirrubina livre (indireta) BC: bilirrubina conjugada (direta)
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HEMOGRAMA
Leucócitos Eritrócitos
Quantidade: 10.400/L (5.000-19.500) Quantidade: 7,10 milhões/L (5-10)
Tipo Quantidade/L % Hematócrito: 37,0 % (24-45)
Mielócitos 0 (0) 0 (0) Hemoglobina: 11,8 g/dL (8-15)
Metamielócitos 0 (0) 0 (0) VCM (Vol. Corpuscular Médio): 52 fL (40-60)
Bastonetes 0 (0-300) 0 (0-3) CHCM (Conc. Hb Corp. Média): 31,8 % (31-35)
Segmentados 8.944 (2.500-12.500) 86 (35-75) RDW (Red Cell Distribution Width): % (17-22)
Basófilos .0 (0) 0 (0) Observações: Anisocitose
Eosinófilos 312 (0-1.500) 3 (2-12)
Monócitos 416 (0-850) 4 (1-4)
Linfócitos 728 (1.500-7.000) 7 (20-55)
Observações: Plaquetas
Quantidade: /L (200.000-630.000)
Observações: Agregação plaquetária
TRATAMENTO E EVOLUÇÃO
21/03/2013:
Retornou para coleta de sangue, urina e realização de raio-X torácico para pesquisa de linfoma.
11/04/2013:
Retornou para reconsulta, relatando polifagia e poliúria. O proprietário não soube informar a precisão de
ingestão hídrica, e afirmou que o animal tem apresentado menos tosse. Ainda apresentava dificuldades para
transpor obstáculos com altura. Se mantem dócil em casa. No exame clínico a auscuta cardiopulmonar não
foi possível, pois o animal estava ronronando, as mucosas estavam normocoradas à hipocoradas, os
linfonodos não apresentavam alterações, constatou-se a presença de doença periodontal na cavidade oral e
o animal estava aparentemente hidratado. A terapêutica prescrita foi Lantus1 2 UI duas vezes ao dia, ração
exclusiva para diabéticos (52 g disponível durante o dia), interromper o uso de corticóide e monitorar a
glicemia em casa.
05/06/2013:
O proprietário relata polidipsia, polifagia (comendo ração para diabéticos) sem controle da quantidade, fezes
volumosas e “perambula” (sic) de maneira diferente. No exame clínico foi observado má qualidade do pelo e
da pele, com presença de seborréia e oleosidade, andar plantígrado com os membros posteriores e glicemia
ambulatorial de 551 mg/dL. A terapêutica adotada foi a mesma da consulta anterior.
21/06/2013:
Retornou para nova avaliação, relatando apatia, polidpsia, comendo menos do que nas consultas anteriores,
mas sem controle da ingesta. Informou a interrupção do uso de corticóide desde a consulta anterior e
oscilação na glicemia, medida em casa. No exame clínico observou-se abdome aumentado (suspeita de
cistite) e glicemia ambulatorial de 276 mg/dL. Foi coletado urina e sangue para exames laboratoriais.
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Insulina glargina com duração prolongada
NECRÓPSIA (e histopatologia)
Patologista responsável:
DISCUSSÃO
Hemograma (21/03/2013):
Eritrograma:
A agregação plaquetária pode ocorrer pelo fato de felinos estarem predispostos a essa formação, ou por
complicações no momento da coleta ou por manejo inadequado das amostras [5].
O aumento das proteínas plasmáticas totais pode indicar que o animal estava em uma situação de
desidratação, que pode ser observada pelos sintomas de poliúria e polidpsia [1]. A anisocitose é um
indicador de anemia regenerativa, porém não havia outras alterações que comprovassem esse distúrbio
hematológico devido à desidratação que provoca hemoconcentração mascarando normalidade do
hematócrito [1].
Leucograma:
O animal apresentava linfopenia, que pode ser atribuída ao tratamento prolongado com glicocorticoides que
são medicamentos que causam imunossupressão [3].
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Hemograma (21/06/2013):
Eritrograma:
O animal ainda se apresenta desidratado (constatado pelo aumento das proteínas plasmáticas totais de 98
g/L) [1]. Não houveram outras alterações significativas.
Leucograma:
Eosinofilia (2321 /uL), neutrofilia (14348 /uL), leucocitose (21100 /uL). Pode ser uma leucocitose reativa,
devida a uma inflamação ou neoplasia (não de origem hematopoietica). Neste caso pode ser atribuído a
suspeita de cistite ou de linfoma. Esse tipo de leucocitose ocorre por alterações na produção, distribuição e
uso de leucócitos e normalmente ocorre neutrofilia e eosinofilia [4].
Urinálise (21/03/2013):
A glicosúria deve-se ao aumento do teor de glicose circulante que ultrapassa o limiar de reabsorção tubular
renal (320 mg/dl para gatos) sendo detectável na urina, sendo a glicose uma substancia higroscópica essa
perda exerce uma ação osmótica, levando à poliúria e desidratação e estas à polidipsia [2].
São vários os efeitos da hiperglicemia sobre a função renal, um deles é a oclusão dos capilares glomerulares
tanto pela formação de proteínas glicosiladas que se depositam no endotélio de vasos, resultando na
obstrução de vasos de menor calibre quanto pela expansão das células mesangiais estimuladas por fatores
liberados por macrófagos após a ligação com frutosaminas [2]. A hiperglicemia também causa uma ruptura
na membrana basal glomerular, todos esses fatores contribuem com excreção de proteínas pela urina. [2]
A diabetes mellitus, é um distúrbio endócrino caracterizado pela má absorção de glicose pelos tecidos
periféricos normalmente devido à diminuição na taxa de produção de insulina pelas células β-pancreáticas,
ou pela diminuição da sensibilidade das células dos tecidos a esse hormônio [7]. Em felinos observa-se
maior prevalência em machos castrados adultos e idosos. Dentre os principais fatores predisponentes,
destacam-se dieta rica em carboidratos, obesidade, pancreatite, castração, avanço da idade, inatividade
física e tratamento prolongado com glicocorticoides e progestágenos [6].
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O histórico de fratura de membros torácicos, que pressupõe menor atividade física, bem como os
tratamentos prolongados à base de glicocorticoides, poderiam justificar o diagnóstico. Isso devido ao fato de
que os glicocorticoides atuam nas células, deixando-as refratárias à insulina, ao mesmo tempo em que
estimulam a gliconeogênese no fígado, gerando assim um quadro de hiperglicemia que induz as células β-
pancreáticas a produzirem uma maior quantidade de insulina, levando-as à exaustão, se a exposição a esse
hormônio for prolongada [7].
CONCLUSÕES
Baseando-se nos sinais clínicos e nos resultados dos exames laboratoriais, o diagnóstico é compatível com
Diabetes Mellitus e o paciente segue em tratamento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] BUSH, B.M. Interpretação de Resultados Laboratoriais para clínicos de pequenos animais.
Oxford: Blackwell Publishing Ltd, 1991.
[2] CORREIA, M.N; GONZALEZ, F.H; SILVA, S.C. Transtornos Metabólicos nos Animais Domésticos.
Pelotas: Universitária, 2010.
[3] GONZALEZ, F.H; SILVA, S.C. Patologia Clínica Veternária: texto introdutório. Porto Alegre:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2008
[4] MEYER, D.J; HARVEY, J.W. Veterinary Laboratory Medicine: interpretation and diagnosis.
Philadelphia: W. B. Saunders, 2nd ed. 1998.
[5] REBAR, A.H et al. Guia de Hematologia para Cães e Gatos. São Paulo: Roca, 2003.
[6] REUSCH, C. Diabete melito felino. Veterinary Focus, Boulogne, v.21, n.1, p.9-16, 2011.
[7] THRALL, M.A et al. Hematologia e Bioquímica clínica veterinária. São Paulo: Roca, 2007.