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05 PRaTICAS E PoeTICAS

O ESTÁGIO EM ESPAÇOS CULTURAIS NA FORMAÇÃO INICIAL DOCENTE EM ARTES


VISUAIS: PERFIS DE EXPERIÊNCIAS

Brisa Caroline Gonçalves Nunes - UFPA


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Resumo

O presente artigo aborda diferentes perfis de experiências da disciplina de Estágio em Ensino das Artes Visuais –
Espaços Culturais (102h), da Licenciatura em Artes Visuais da UFPA. A primeira parte relata experiências minhas en-
quanto estudante de graduação, no estágio, ocorridas no Museu de Arte Sacra (Belém/PA) no ano de 2010, em que
foi possível explorar os caminhos teóricos e práticos da mediação cultural. Na segunda parte, relato uma experiência
enquanto docente responsável por coordenar os Estágios Curriculares na mesma faculdade, orientando alunos no
mencionado estágio, lotados na E.E.E.M. Vilhena Alves. Tal experiência apresenta um delineamento diferente do an-
terior, em face de alterações no cenário das articulações da universidade, que alteram enormemente a vivência dos
futuros professores. As reflexões perpassam dificuldades e enfrentamentos entre universidade, educação básica e
espaços culturais, no contexto do ensino-aprendizagem em artes visuais.
Palavras-chave: Estágio em Espaços Culturais. Educação não formal. Ação educativa.

Introdução

O Estágio em Espaços Culturais faz parte do quadro de disciplinas da Licenciatura em Artes


Visuais da Universidade Federal do Pará. Configura-se como a última etapa do estágio curricular
obrigatório, sendo precedido respectivamente pelos Estágios em Ensino das Artes Visuais, divi-

1  Mestre em Artes pelo Programa de Pós Graduação em Artes da Universidade Federal do Pará (UFPA), ilustradora
e graduada em Artes Visuais - Bacharelado e Licenciatura pela UFPA (2012), desenvolveu estudos sobre museu,
ensino de artes e ilustrações para livro infantil. Atualmente é professora substituta da UFPA, pelo ICED (Instituto de
Ciências da Educação), ministrando disciplinas de Arte Educação e Estágio em Ensino das Artes Visuais. E-mail:
brisailustracao@gmail.com
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didos entre o Ensino Fundamental (anos iniciais e finais) e Ensino Médio. Ao concluir este último,
o estudante de graduação muitas vezes questiona: mais um estágio para quê?
O quarto e último estágio fora então idealizado por volta dos anos 1996, pelas professoras
Mestres Ana Del Tabor Vasconcelos Magalhães, Janice Souza Lima e Sandra Christina Santos ,
2

a fim de que os discentes pudessem vivenciar práticas pedagógicas em espaços de educação


não formal, norteada por um processo formativo de estágio. Assim, os futuros professores teriam
uma noção ampla e diversificada em contextos e práticas, que lhes permitiriam atuar na sala de
aula e para além dela. Com o passar do tempo, mudanças no cenário das relações institucionais
atribuíram a esta prática contornos diferentes, na tentativa de manter a proposta de estabelecer
encontros entre a educação formal e não formal.

A educação formal e não-formal

Pensar em vivências pedagógicas formativas para o ensino de artes visuais nos leva a um
grande desafio: como levar a complexidade das experiências artísticas que estão no mundo para
a sala de aula? O campo da arte-educação tem se esforçado para responder essa pergunta de
grande abrangência, para a qual surgem diferentes caminhos metodológicos, propostas e revi-
sões curriculares.
Um dos caminhos já apontados é o de promover encontros entre a sala de aula e o mundo
externo, uma vez que o fenômeno artístico se encontra multifacetado pelas diversas nuances da
vida humana em interação com o mundo. Sobre esse assunto, o campo da educação não formal
articula-se com essa proposta de trocas entre a sala de aula e os diferentes espaços educativos
das cidades. Segundo Gohn:

2  Na época integravam um núcleo de estudos e propostas pedagógicas para Prática de Ensino, na Universidade
da Amazônia – UNAMA.
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A educação não formal é um processo sócio político, cultural e pedagógico de formação


para a cidadania, entendendo o sócio político como a formação do indivíduo para interagir
com o outro em sociedade. Ela designa um conjunto de práticas de aprendizagem e pro-
dução de saberes, que envolve organizações/instituições, atividades, meios e formas varia-
das, assim como uma multiplicidade de programas e projetos sociais (GOHN, 2015, p. 16).

Considerando a formação do professor de Artes Visuais, o contato com as práticas de


aprendizagem e produção de saberes, em espaços de educação não formal são de fundamental
importância, pois configuram um possível campo de aprendizados e atuação profissional. En-
tretanto, observamos ainda um acanhado espaço para essa proposta nos currículos oficiais das
graduações. Compreendemos que a regulamentação nacional prevê a realização dos Estágios
Supervisionados nos cursos de graduação , enfatizando a vivência do licenciando na educação
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Básica e portanto, no contexto da educação formal. Para Gadotti (2005), a educação formal “[...]
é representada principalmente pelas escolas e universidades. Ela depende de uma diretriz edu-
cacional centralizada como o currículo, com estruturas hierárquicas e burocráticas, determinadas
em nível nacional, com órgãos fiscalizadores dos ministérios da educação”.
A disciplina de Estágio em Espaços Culturais da UFPA propõe um caminho medianeiro en-
tre os contextos formal e não formal, dedicando certa carga horária para o contato do licenciando
com os diversos espaços da cidade, especificamente Belém do Pará: museus, galerias, centros
culturais, associações comunitárias, coletivos, as próprias escolas e etc. A disciplina propõe o
planejamento e realização de ações educativas para o público escolar, sob a supervisão dos pro-
fessores da escola e da universidade, favorecendo assim, a troca de saberes entre os lugares de
cultura e a Educação Básica.

3  Normatizada pela Resolução Nº 2 de 1º de julho de 2015, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos
de segunda licenciatura) e para a formação continuada.
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A experiência no Museu de Arte Sacra

Nessa seção, revisito minha experiência enquanto estudante de licenciatura, matriculada na


disciplina de Estágio em Espaços Culturais, lotada no Museu de Arte Sacra, no ano de 2010. Des-
te episódio resultou o artigo intitulado “O museu e a arte educação: sensibilização e identidade
cultural” (2010), publicado no XX CONFAEB – Indivíduos, Coletivos, Comunidades, Redes – em
Goiânia no mesmo ano. São abordados o papel da medição cultural, ações educativas, memória
e identidade cultural dos indivíduos, sensibilização do olhar e interseções com outras áreas do
conhecimento.
Para contextualizar o locus de estágio, o museu de Arte Sacra de Belém envolve espaços da
Igreja de Santo Alexandre e do Palácio Arquiepiscopal, reunindo um complexo de grande riqueza
arquitetônica em estilo Barroco, além de uma coleção de imagens sacras e objetos litúrgicos. A
igreja possui um considerável valor histórico, por estar entre as mais antigas de Belém e preser-
var a memória da religiosidade local. As imagens de santos e adornos arquitetônicos expressam
os efeitos do choque entre as culturas europeia e indígena, uma vez que, pela catequização, mis-
sionários jesuítas utilizaram a mão de obra indígena na construção da igreja e na feitura de escul-
turas sacras, resultando em um estilo muito peculiar do ponto de vista estético e antropológico.
Naquele ano, um dado importante a considerar era o convênio firmado entre a UFPA e o
Sistema Integrado de Museus (SIM), vinculado à Secretaria Estadual de Cultura. Este vínculo
permitiu o diálogo entre as instituições e a lotação de estagiários via setor educativo do SIM,
responsável pela coordenadoria de educação de todos os museus de Belém ligados ao Sistema.
O encaminhamento dos alunos se deu a partir de ofícios emitidos pela profª coordenadora do
estágio, à semelhança do que ocorre para as escolas.
Buscamos o setor educativo e tivemos uma primeira conversa sobre o estágio, sobre o
Museu escolhido, carga horária, atividades a serem desenvolvidas, objetivos. Particularmente,

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escolhi o Museu de Arte Sacra por ter sido um local que visitei quando criança, em um passeio
escolar que nunca esqueci; retornar a esse lugar como membro da equipe de mediação foi gra-
tificante, sendo possível participar do deslumbramento provocado pelo lugar a outros visitantes.
O termo “mediação” ainda não era utilizado naquele contexto. Chamava-se “monitoria” a
equipe de atendimento ao público, que faz até hoje visitas guiadas individuais ou em grupo, aten-
dendo ao agendamento gratuito de escolas, organizado pela coordenação do museu. Haviam
monitores de outras áreas, como turismo e história. Martins e Picosque iluminam o significado de
mediação como algo mais profundo, que amplia repertórios, provoca inquietações e reverbera-
ções internas. Para as autoras:

A mediação cultural como facilitadora do encontro entre arte e fruidor, precisa ser pensada
como uma ação específica, como uma área de estudo singular. [...] Na tessitura de sua
construção, não se pode esquecer que mediar implica o sujeito-fruidor como um todo. Isso
significa que não se pode provocar apenas sua face cognitiva, conscientizando-o de todas
as nuances presentes na obra ou em sua relação com ela; mas, acima de tudo é preciso
promover um contato que deixe canais abertos para sensações, sentidos e sentimentos
despertados, para a imaginação e a percepção, pois a linguagem da arte também fala por
sua própria língua e é por ela mesma que se a lê. Talvez seja este o espaço do silencio
externo com falas internas nem sempre traduzíveis (MARTINS; PICOSQUE, 2012, p. 25).

A preparação para a mediação cultural teve início com um estudo do acervo local, uma pe-
quena biblioteca própria do museu reúne livros e publicações sobre a igreja, as obras, a fundação
do museu, o viés antropológico e histórico. Soma-se a isso as conversas com o pessoal atuante,
as trocas de experiências e relatos insubstituíveis, ajudaram a construir o aspecto cognitivo da
mediação que as autoras comentam. Concluindo esta etapa, foi realizado um seminário com
todos os estagiários, incluindo os que estavam lotados em outros museus, para apresentar os
espaços e propostas de ações educativas para o público escolar.

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Das experiências apreendidas, sem dúvida a mais marcante foi a interação direta com o
público. Quando passamos a fazer parte de um lugar, transforma-se também a relação com o
ambiente, as obras e a equipe de trabalho, substituindo o olhar de estranhamento pelo de fami-
liaridade. O público geralmente nos devolve o olhar de estranhamento, nos leva a ver com outros
olhos aquilo que já estava fixado. Entra em cena a face sensível da mediação cultural, registrada
por esta autora em estudo anterior:

A mediação cultural forneceu situações bastante diversas, amostras variadas de comporta-


mento do público [...]. Apesar de haver um roteiro pré estabelecido de trajeto e até mesmo
de informações a serem comunicadas ao visitante, mudanças podem ocorrer de acordo
com o enfoque e o nível de interesse de quem visita. Há visitantes interessados em contem-
plar o espaço. Outros preferem escutar e interagir com a fala dos monitores, outros mais re-
ligiosos frequentam para fazer pedidos às imagens dos santos [...]. É importante respeitar
o interesse, as opiniões, as críticas e as informações que os visitantes tem a compartilhar,
para que assim ocorra uma troca válida de conhecimentos (NUNES, 2010, p. 05).

A realização da ação educativa ocorreu após o período de estudo, observação e mediação


cultural. Consultamos o agendamento de escolas e propusemos a ação educativa para alunos
de 5ª série, na qual pudéssemos abordar de forma crítica as questões levantadas no estudo bi-
bliográfico. Primeiro houve o contato com a professora responsável dias antes por telefone, para
que a atividade fosse autorizada e confirmada.
A proposta da disciplina era que as ações educativas seguissem um roteiro diferente do
que normalmente os mediadores trabalham, de modo que o estudo, a reflexão crítica e a oportu-
nidade de executar a mediação foram fundamentais. A autora Aglay Fronza-Martins esclarece o
significado do termo ação educativa:

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[...] no contexto dos museus, a ação educativa pode apresentar-se como facilitadora e
provedora de um processo prazeroso de ensino e aprendizagem, inserido dentro de uma
ação cultural mais ampla. O termo Ação Educativa refere-se, segundo Teixeira (1997), às
ações de ensino e aprendizagem, que são centradas na interação entre os visitantes e os
objetos que se articulam em uma exposição, mediados por ações educacionais (FRONZA-
-MARTINS, 2006, p. 73).

Lamentavelmente, alguns colegas lotados em outros museus tiveram dificuldades para rea-
lizar suas propostas, seja por falta de sintonia com a equipe educativa do museu, seja por esbar-
rar em normas internas enrijecidas, que acabam por limitar essa relação do público com as obras.
Para nós, foi possível ainda desenvolver um material didático: folder contendo um breve tex-
to sobre o espaço, com cruzadinha e caça palavras. A ideia era que as crianças ficassem atentas,
pois as respostas para a cruzadinha estavam nas nossas explicações ao longo da visita. Tivemos
momentos de descontração, percebemos o interesse e a aprovação das crianças e da equipe do
museu sobre nossa atividade, revelando assim a importância de ações como essa para a cons-
trução de identidades, senso crítico e estético.

Experiência entre a Escola Vilhena Alves e o Parque da Residência

Em 2017, como professora substituta, coordenei a disciplina de Estágio em Espaços Cul-


turais para uma turma de alunos concluintes. Diferentemente do contexto anterior, o convênio
firmado entre a Universidade e o SIM não existia mais, vetando, desse modo, o acesso de esta-
giários aos museus vinculados à SECULT, nos moldes legais de um estágio curricular. A perda
desse convênio atribui-se a alterações na legislação estadual, que passou a permitir somente os
estágios remunerados e formalizados pelo órgão administrativo do Estado.
Esse dado transformou bastante a concepção da disciplina. Se antes era realizada no pró-
prio espaço cultural, um ambiente educativo diferente, o estagiário tornou a ser lotado na escola,

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devendo propor junto ao professor supervisor uma ação educativa em algum espaço cultural.
Esse arranjo é diferente do que eu havia vivenciado na graduação e fora a alternativa encontrada
pela professora que me antecedeu. Escolhi a experiência de dois estagiários, com o intuito de
avaliar alguns pontos positivos e negativos dessa política.
A vivência aconteceu na Escola Estadual de Ensino Médio Vilhena Alves, que de acordo
com Mônica Pereira (2017, p. 4), trata-se de um “[...] perímetro bem localizado em meio ao centro
da cidade, envolto de comércio, prédios históricos e apartamentos luxuosos, contexto bastante
diferente dos alunos que frequentam as salas de aula.”
Orientei que conversassem sobre a proposta da ação educativa desde o primeiro dia de
estágio, para que o professor supervisor pudesse se planejar com antecedência. A ação deveria
partir do plano de curso do professor, aliado às percepções das demandas dos alunos e condi-
ções reais de visitação. Neste ponto, muitos estagiários relatam problemas, pois os professores
alegam grandes dificuldades em conseguir horários na semana, a permissão dos pais e o trans-
porte dos estudantes.
A participação dos licenciandos no Grupo de Estudos de Arte Pública4 lhes familiarizava com
leituras e discussões sobre a dinâmica das cidades e relação das pessoas com os espaços públi-
cos, especificamente com os objetos artísticos, buscando provocar vivências e intervenções na rea-
lidade. Assim, o lugar escolhido para a ação educativa fora o Parque da Residência, que segundo
Pereira é muito frequentado pelos alunos devido à proximidade com a escola, além de um:

[...] espaço luxuoso, que abriga esculturas, orquidário, estação gasômetro, um restaurante
para a elite, entre outros pontos, mas a cima disso tudo, é um lugar que conta uma grande
história dentro da cidade de Belém. E hoje em dia é um lugar de vivência e afetos entre os
estudantes do Vilhena Alves.

4  Coordenação do Prof. Dr. Ubiraélcio da Silva Malheiros / UFPA.


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A nova proposta seria, por tanto, em linhas gerais, uma tentativa de fazer os alunos pen-
sarem nesse local como um lugar histórico, compreendendo sua fundação e espaços e
obras presentes nele, além disso, tendo em vista que os alunos são de classe mais humil-
de dos que frequentam esse ambiente e consomem dele, eles teriam a oportunidade de
apresentar suas memórias nesse esse local, expondo fotografias que revelassem sobre
seus dias e seus desejos, deixando de serem pessoas invisíveis para a sociedade, que
não querem ver os problemas enfrentados pelos adolescentes na contemporaneidade
(PEREIRA, 2017, p. 8).

A orientação seguinte era a de que fizessem uma visita prévia a lugar, não somente para
definir os espaços da ação, mas também para verificar a necessidade de formalização através de
ofícios, junto ao planejamento. Considerando o conteúdo de fotografia que vinha sendo ministra-
do, elegeram junto ao professor, a turma do 1º ano do Ensino Médio Integral e elaboraram uma
proposta intitulada “Ressignificando os espaços vizinhos: a memória que ninguém conhece”. O
discente Dávison Miranda descreveu as seguintes etapas metodológicas:

• Realização de oficina de fotografia com celular [na própria escola];


• Visita guiada com os alunos do 1°ano do ensino médio integral, no Parque da residência;
• Realizar a leitura dos elementos artísticos e culturais do espaço;
• Solicitar aos alunos que realizem fotografias que retratem seus espaços de convivência,
seus territórios de afetos;
• Realizar uma curadoria em conjunto com os alunos das fotografias feitas por eles;
• Criação de divulgação da ação, juntamente com os alunos;
• Montagem e organização das obras no espaço do Parque da Residência para a intervenção;
• Após a intervenção, momento de reflexão com os alunos sobre prática realizada (MIRANDA,
2017, p. 6).
Ao solicitar que os estudantes fotografassem seus territórios de afetos, buscavam precisa-
mente a oportunidade de ressignificar sua relação com os mesmos. Martins e Picosque (2012,

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p. 10) comparam a visitação a um espaço cultural com uma viagem a um novo território, uma
vez que “Mesmo para quem já o conhece, penetrar em suas obras cria a oportunidade de novos
encontros estéticos [...] porque é sempre possível ter novos insights e experiências ao ver as
mesmas obras ou objetos.”
Percebemos também os eixos da Proposta Triangular elaborada por Barbosa (2012), ao ar-
ticular a leitura visual, a contextualização histórica e o fazer artístico, conectada ao planejamento
do professor, à vida cotidiana dos estudantes do Ensino Médio. Essa proposta, assim como a de
outros estudantes lotados em outras escolas foram socializadas em um seminário.
Por sua vez, essa ação educativa não pôde ser realizada integralmente. Na escola, poucos
alunos demonstraram interesse em participar, pois o professor supervisor tornou a atividade no
Parque como optativa, somente realizando na escola a oficina de fotografia com o celular, para
expor o resultado em uma Feira Cultural. Tal fato nos leva a questionar: até que ponto a falta
de recursos materiais nas escolas públicas é responsável pela ausência de ações mais enga-
jadas? O Parque localiza-se praticamente ao lado da escola, dispensando ônibus e oferecendo
segurança dentro de suas dependências.
A violência urbana foi grandemente apontada como causa de inviabilização de ações em
espaços culturais externos, violência tal que ameaça tanto o “fora” quanto o “dentro” das escolas.
O relato dos estagiários revela a presença do tráfico, crimes, tensões e insegurança emocional,
completadas com inexistência de atitudes mais enfáticas do corpo escolar e do próprio Estado.
Há ainda relatos que narram as dificuldades das turmas de EJA, por se passarem em horários no-
turnos, quando a maior parte dos espaços culturais da cidade já estão fechados, sem considerar
a possibilidade de realização em outros horários.
Muitos outros estagiários tiveram dificuldades em executar ações educativas em espaços
externos, mesmo que planejadas com antecedência, levando-os ao plano “B” de executá-las no

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interior da própria escola, com mudanças de última hora. Nas palavras de Gohn, a educação não
formal não deve substituir a educação formal, entretanto:

Poderá ajudar na complementação desta última, via programações específicas, articulando


escola e comunidade educativa localizada no território de entorno da escola; ou mesmo
dentro da própria escola, articulando saberes curriculares normatizados e atividades ex-
traclasses, usualmente vistas como complementares na formação do educando.” (GOHN,
2015, p.19)

Algumas ações educativas ocorridas dentro das escolas ocuparam espaços como os sa-
lões, bibliotecas, áreas verdes, muros, quadras, corredores, enquanto espaços expositivos para
as produções artísticas dos alunos, ou enquanto cenário para diversas atividades, que segura-
mente despertaram novos olhares e relações com tais espaços.

Perfis de experiências: considerações finais

Atualmente, enquanto professora substituta na mesma graduação em que estudei, tenho a


oportunidade de contribuir e ressignificar o que aprendi, aprofundando em aspectos que antes
me passavam despercebidos. A experiência de coordenar estágios na licenciatura é muito desa-
fiadora, pois agora me vejo na posição de mediadora entre as problemáticas e os encantamentos
da educação básica, em diálogo com a academia e demais instituições que compõem o ambien-
te científico e cultural da cidade.
A partir destas experiências, é possível traçar perfis distintos, considerando os aspectos
gerais de ambas. O primeiro perfil, considerado aquele em que o estagiário é lotado no próprio
espaço cultural, permite o acesso a um ambiente de formação diferente, com normas internas
próprias, equipe de trabalho com diversas formações (educadores, técnicos, pesquisadores, ar-
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tistas, curadores, museólogos, restauradores, historiadores, turismólogos, etc.). Favoreceu tam-


bém o contato próximo com as obras, estrutura física do espaço e com o acervo documental,
além da articulação com professores das escolas.
A experiência de mediação cultural, embora iniciante, ajudou a trabalhar a sensibilidade e o
diálogo, diante da heterogeneidade do público, com suas diferenças de crenças, raças, gênero,
idade, formação e etc., que acabamos levando para a vida profissional e pessoal. É importante
frisar que sem a vinculação a um estágio curricular, essa atividade não é obrigatória na gradua-
ção, exceto quando o aluno busca se inserir, por iniciativa dele mesmo, em mediações e espaços
culturais sem vínculo com a universidade, podendo adquirir certificados e computar essas horas
como atividades complementares.
O segundo perfil de experiências, quando o estagiário é lotado na escola, revelou evidên-
cias nem sempre justificáveis, da resistência em não proporcionar a saída dos alunos – aspecto
que prejudicou a maior parte dos estagiários dessa turma, que não conseguiu executar a ativida-
de fora dos muros.
Dentre as possíveis causas, esbarramos na falta de vontade e interesse da escola e às ve-
zes, do próprio estagiário de realizar as ações. A escassez de recursos para transporte e ausência
de políticas públicas que favoreçam o acesso dos estudantes aos diversos espaços culturais, do
ponto de vista das secretarias de educação e das administrações dos espaços culturais, também
se ressaltam, pois poderiam flexibilizar os horários de funcionamento e condições de acesso.
Por outro lado, quando é possível realizar a ação, acontece uma interessante experiência
de articulação intelectual, em estudar o planejamento de aulas e relacioná-lo com os diversos
espaços da cidade. Articulação também entre o estagiário e o professor supervisor, os professo-
res de outras áreas, técnicos, direção, funcionários diversos. Há ainda a articulação logística: a
solicitação de ônibus, envio de ofícios aos espaços culturais, afinamento de interesses com os
mediadores dos espaços, observação das condições para que a visita aconteça.

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Mesmo nas ações educativas dentro das escolas, foi possível o exercício de estranhamento
sobre o ambiente já familiarizado, a possibilidade de ressignificá-lo e ativar o vínculo afetivo com
a escola. A experiência de simplesmente sair da sala de aula já se mostra bastante empolgante e
significativa para a aprendizagem.
Assim, os dois perfis de experiências com a disciplina de Estágio em Espaços Culturais
revelam nuances dos campos de atuação do professor de Artes Visuais, bem como os enfren-
tamentos e as políticas públicas de articulação entre a universidade, as escolas e os espaços
culturais. Esse estágio se mostra importante e necessário para a formação, pois aborda do ponto
de vista teórico e prático, as questões relativas ao patrimônio artístico-cultural da nossa cidade,
ampliando o conteúdo da sala de aula e fortalecendo o vínculo de identidade e pertencimento
com o lugar em que vivemos.

Referências bibliográficas

BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da Arte. São Paulo: Perspectiva, 2012. FRONZA-
-MARTINS, Aglay S. Da magia à sedução: a importância das atividades educativas não-
-formais realizadas em Museus de Arte. Disponível em: <http://fvcb.com.br/site/wp-content/
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em 25.03.18.

GADOTTI, Moacir. A questão da educação formal/não-formal. Disponível em:<http://www.


paulofreire.org/Moacir_Gadotti/Artigos> Acesso em 31 de Mar de 2006.

GOHN, Maria da Glória (Org.). Educação não formal no campo das artes. São Paulo: Cortez, 2015.

MARTINS, Miriam Celeste; PICOSQUE, Giza. Mediação cultural para professores andarilhos
na cultura. São Paulo: Intermeios, 2012.

MIRANDA, Davison Cirilo Queiros. Relatório de estágio em ensino das artes visuais - espaços

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PEREIRA, Monica Costa. Relatório de estágio em ensino das artes visuais - espaços cultu-
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