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AULA

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CRIAÇÃO DE UM
AMBIENTE PARA
O APRENDIZADO
GESTÃO DE AMBIENTES DE APRENDIZAGEM
CRIAÇÃO DE UM AMBIENTE PARA O APRENDIZADO
Há muitos anos na educação existe um paradigma sobre a
figura do professor que o coloca como o centro da sabedo-
ria, com papel de autoridade perante a sala de aula. Porém
com as transformações sociais, profissionais e familiares
inclusive, atualmente o professor passa a adotar um papel
de mentor e não mais apenas de um transmissor de informa-
ção (LIBÂNEO, 2013). Logo é importante refletir “ O que vem
a ser um bom professor? ”. Para muitos alunos este é aquele
que se mostra atencioso, que respeita e apoia, remetendo
invariavelmente ao ato de cuidar, mas ao longo das semanas
| AUTORIA durante o processo de ensinar, o discurso do cuidar começa
a desparecer quando o professor adota atitudes de controle,
Prof. Rafael Fortes disciplina e até penalidades, surgindo assim papéis distintos
do professor “bonzinho” e do professor mais “duro”.
| AULA
Segundo Cohen e Lotan, 2017, uma das maneiras de mostra
Criação de um Ambiente para o Aprendizado aos estudantes que você é atencioso, é assumindo a respon-
sabilidade por manter a ordem, fazendo com que os estudan-
tes trabalhem duro, obedeçam normas e regras e acima de
| TÓPICOS ABORDADOS tudo, trate todos com consideração, a fim de atingir o máximo
• Cinco funções do ambiente de sala de aula de equidade no ambiente de ensino.

• O professor como planejador do ambiente: arranjo físico Ao considerar padrões da profissionalização docente, inevi-
da sala de aula tavelmente deve-se considerar que criar e manter ambien-
tes efetivos para a aprendizagem é um ponto chave para
• Regras e normas como ferramenta prática para a sala de o engajamento do aluno, ou seja, organizar o ambiente,
aula construir e comunicar normas, procedimentos e rotinas é
uma das etapas para uma aprendizagem significativa.
| OBJETIVOS DA AULA Dominar estratégias de gestão e organização da sala de aula
torna possível a criação de um ambiente capaz de sustentar
I. Refletir sobre a relação entre a sua concepção de educação
oportunidades de aprendizagem desafiadoras e equitativas.
e a maneira como organiza e faz a gestão da sua sala de aula.

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De acordo com Weinstein e Novodvorsky, 2015, a gestão da
II. Organizar o ambiente físico da sala de aula adequadamen-
sala de aula tem dois propósitos distintos:
te para contribuir com o alcance dos objetivos pedagógicos
da aula. “...ela não apenas procura estabelecer e manter um ambien-
te ordenado e atencioso no qual os alunos possam engajar-se
G E STÃO D E A M B I E N T E S D E A P R E N D I Z AG E M

III. Criar normas, rotinas e regras que estabeleçam relações em aprendizado significativo, mas também almeja estimular o
crescimento emocional e social dos estudantes”.
de respeito, cuidado e que contribuam com o aprendizado
efetivo. Tornar-se um gestor de sala de aula eficiente, exige reflexão,
trabalho duro e tempo. Uma das nossas principais responsa-
bilidades como professor é ajudar nossos alunos a aprender.
É difícil aprender em ambientes caóticos e subsequentemen-
te, somos desafiados diariamente a criar e manter uma sala
de aula positiva e produtiva com uma atmosfera propícia à
aprendizagem. (BARBETTA, NORONA E BICARD, 2005)

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O ambiente físico da sala de aula serve a uma série de funções Ao planejar o arranjo das carteiras é necessário pensar em
básicas como segurança e abrigo, contato social, instru- quanta interação você deseja, seja entre os alunos ou entre
mentalidade de tarefas, identificação simbólica e prazer. A o professor e os alunos. A figura 1 representa um arranjo
segurança física é uma pré-condição a ser satisfeita, porém, horizontal e orienta os estudantes na direção do professor,
infelizmente, em algumas situações, essa função básica não esse arranjo pode ser bem utilizado para apresentações
é preenchida e os estudantes ficam sujeitos a barulho, mau ou revisão do dever de casa. Porém é possível um arran-
tempo, calor ou frio, etc. jo horizontal onde as carteiras são dispostas em duas filei-
ras voltadas umas para as outras, com um corredor largo no
A interação entre os alunos é fundamental e esse contato meio da sala de aula, permitindo que os alunos vejam uns
social pode ser pensado ao planejar o arranjo das cartei- aos outros e interajam mais facilmente (figura 2). Esse arran-
ras, promovendo contato visual direto entre os estudantes e jo é utilizado no ensino de línguas ou estudos sociais, por
molhar interação entre o professor e os alunos. O ambiente exemplo.
adequado, também nos ajuda a levar adiante as tarefas que
precisamos realizar, por exemplo, os alunos irão trabalhar Nas salas de aula em que as carteiras estão dispostas em
sozinhos ou cooperativamente, você utilizará o quadro ou um fileiras, geralmente o professor interage, principalmente, com
projetor, ou seja, a instrumentalidade das tarefas que você estudantes sentados à frente. É possível arranjar as carteiras
propõe depende do manejo do ambiente em que a aula irá para a promoção de discussões entre os alunos, como mostra
ocorrer. A função de identificação simbólica revela quem são a figura 3, e em turmas pequenas o suficiente, é possível
as pessoas que usam o espaço e está relacionada à persona- trabalhar em círculo.
lização da sua sala de aula.

Por isso é importante que os alunos achem a sala de aula


atraente e agradável, pois Figura 1. Arranjo horizontal

“...estudos adicionais demonstram que ambientes esteticamen-


te agradáveis podem influenciar o comportamento,...estudos
de ensino superior indicaram que salas de aula atraentes tem
um efeito positivo no comparecimento e sentimento de união
do grupo e na participação nas discussões em sala de aula”.
(HOROWITZ E OTTO, 1973; SOMMER E OLSON, 1980 apud.
WEINSTEIN E NOVODVORSKY, 2015)”.

Portanto, a personalização da sala de aula associada a um


ambiente que facilite a realização das tarefas, favorece o
engajamento do aluno. O quadro 1, apresenta dicas práticas
de como organizar uma sala de aula de maneira funcional.

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Quadro1. Dicas para organizar uma sala de aula funcional

PRÁTICA OBJETIVO
G E STÃO D E A M B I E N T E S D E A P R E N D I Z AG E M

Materiais usados com frequência durante a aula, Isso irá minimizar o tempo gasto preparando as Fonte: WEINSTEIN E NOVODVORSKY, 2015
devem ser acessíveis aos estudantes atividades e a limpeza
Os percursos ao longa da sala devem ser plane- Percursos adequados permitem a inclusão de
jados a fim de evita congestionamento e distração alunos com necessidades especiais
A disposição dos assentos deve permitir aos estu- Favorece a ergonomia e interação entre alunos e
dantes clara visão das aulas expositivas entre professor e alunos
Decida onde guardar seus suprimentos e mate- Se você se desloca de uma sala para outra, é fun-
riais auxiliares de ensino damental esta organização para otimizar o tempo
e ter seus instrumentos sempre a mão
Fonte: Próprio autor, 2020

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Figura 2. Arranjo horizontal com fileiras voltadas Para que o ambiente em sala de aula seja organizado e ao
umas as outras, com corredor largo no meio da sala mesmo tempo produtivo, além das estratégias já discutidas,
um ponto fundamental é construir normas e regras que visem
o respeito mútuo entre estudantes e professor que promo-
vam uma aprendizagem efetiva.

Algumas considerações devem ser feitas em relação ao


ensino efetivo, para ROGERS, 2008:
“Efetivo, em qualquer sentido significativo, também precisa
incluir os valores que subjazem o que aspiramos em um “ensino
efetivo”. Os valores principais como respeitar todos os alunos
(até mesmo o respeito cívico e básico) e a igualdade de trata-
mento (justiça) são aceitos universalmente pelos alunos de
qualquer idade como indicadores de um ensino efetivo”.

Ao considerar suas expectativas sobre o comportamento do


aluno, é necessário decidir quais serão as regras de conduta
geral dos estudantes, como será a rotina e os procedimentos
Fonte: WEINSTEIN E NOVODVORSKY, 2015
comportamentais que você e os alunos seguirão em situa-
ções específicas (normas) (WEINSTEIN E NOVODVORSKY,
2015). Ao refletir sobre regras de conduta geral, considere os
Figura 3. Arranjo que visa fomentar discussões quatro princípios apresentados no quadro 2.

Quadro 2. Quatro princípios para planejar regras de sala de aula

PRINCÍPIO REFLEXÃO
As regras devem ser razoáveis e necessárias Há uma boa razão para a regra? Elas são apro-
priadas para esse nível educacional?
As regras devem ser claras e compreensíveis A regra é muito abstrata para que os alunos com-
preendam?
Até que nível eu quero que meus alunos partici-
pem do processo de tomada de decisões?
Regras devem ser consistentes com os objetivos Essa regra facilitará ou dificultara o aprendizado
educacionais do aluno?
As regras de sala de aula devem ser coerentes Quais são as regras da instituição de ensino?

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com as regras da instituição onde se trabalha
Fonte: Adaptado de WEINSTEIN E NOVODVORSKY, 2015

Muitas vezes regras e normas são compreendidas e aceitas,


Fonte: WEINSTEIN E NOVODVORSKY, 2015 mais facilmente, quando os alunos participam do processo
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de tomada de decisão na criação de um “contrato pedagó-


gico”.

||||| PARE PARA PENSAR ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||


Trata-se de “um conjunto de comportamentos (específi-
cos) do professor que são esperados pelos estudantes, e
Você já deve ter lecionado em salas de aula mais atraentes e um conjunto de comportamentos do estudante que são
confortáveis do que outras. Pense sobre quais características esperados pelo professor” mediados pelo saber, ou seja, um
específicas fizeram destas salas um ambiente agradável para conjunto de fatores referentes à relação didática que procura
aprender e reflita: Quais características estão sob o controle do definir as responsabilidades e os comportamentos que cada
professor? sujeito deve ter perante o outro nas práticas que possibilitam
a apropriação do saber. Essas responsabilidades/comporta-

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mentos são legitimadas por meio de regras específicas e, Tanto as regras quanto as normas estipuladas em um contrato
principalmente, por meio de regras explícitas, construídas pedagógico, devem estar sempre aparentes aos estudantes,
historicamente e interpretadas no contexto de sala de aula, seja em um mural ou entregues (folheto) no início do perío-
que se instituem no âmbito da relação didática com a inten- do letivo. Quando um professor deixa claro suas expectati-
ção de orientar o processo de ensino e aprendizagem, de vas quanto ao comportamento dos alunos, ele se torna um
potencializar as interações entre os conteúdos e os sujeitos gestor eficiente e minimiza comportamentos mais propensos
da relação didática (estudantes e professores) e de dar subsí- a provocar problemas como gritos, movimentos pela sala e
dios ao trabalho docente em sala de aula (BELTRÃO, SOUZA, interações aluno-aluno, a famosa “conversa paralela”.
SILVA, 2010).
De acordo com Lemov, 2011, só existe um percentual adequa-
Beltrão, Souza e Silva, 2010, enfatizam que as interações do de alunos seguindo uma instrução dada em sala de aula:
didáticas (Figura 4) se estabelecem entre os vértices profes- 100%. Se você não atinge esse percentual, sua autoridade
sor, aluno e saber com vistas à organização dos papéis, dos está sujeita a interpretações, circunstâncias e motivações. Os
lugares e das funções de cada um dos elementos humanos alunos vão se sentir à vontade para perguntar-se: “Será que é
num sistema de tarefas e de obrigações recíprocas. para fazer mesmo? Todo mundo? Não sei se hoje estou a fim
de fazer o que o professor manda”. Este padrão 100% pode
parecer uma utopia, mas para o mesmo autor, professores
excelentes desmistificam esta percepção. Eles conduzem a
busca pelo Padrão 100% com um tom positivo e caloroso.
São firmes e sistemáticos e os alunos seguem as orientações
sem nem parecer pensar sobre isso.

Para atingir as expectativas de bom comportamento, para


exercer o poder com justiça de maneira firme, você preci-
sa estar atento a como os alunos respondem à sua orienta-
ção, para isso, é preciso reparar neles (observância). Há três
princípios básicos para garantir uma observância consistente
na sala de aula: usando a intervenção menos invasiva possí-
vel, confie na delicadeza firme e calma e enfatize a obser-
vância que você pode ver. O quadro 3 resume quais podem
ser as intervenções a partir da observância para busca do
comportamento adequado em sala de aula. (LEMOV, 2011)

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||||| PARE PARA PENSAR (REFLITA) |||||||||||||||||||||||||||||||

Considere as seguintes expectativas e decida se elas são regras


ou normas: 1 – na última aula do dia, os alunos devem aguardar
você lhes dizer que a aula está encerrada, para então serem
liberados; 2 – os alunos devem estar preparados; 3 – escute
respeitosamente quando as pessoas estiverem falando; 4 –
durante o trabalho em grupo, os alunos podem falar com os
outros membros do grupo em voz baixa.

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| MATERIAL PARA ESTUDO AVANÇADO

Quadro 3. Intervenções a partir da observância, para busca do bom comportamento em sala de aula
• BOYNTON, M.; BOYNTON, C. Prevenção e resolução de
problemas disciplinares: guia para educadores. 1ª edição,
Porto Alegre, Artmed. 2008
PRINCÍPIOS DE INTERVENÇÕES EXEMPLO
OBSERVÂNCIA • LEMOV, D. Aula nota 10 2.0: 62 técnicas para a gestão
da sala de aula. 2ª edição, Porto Alegre, editora. Penso,
Gesto ou contato visual com alunos que não estão
2018
Intervenção não
trabalhando, ao mesmo tempo em que você faz outra
verbal
coisa, de preferência ensinar os demais alunos. • WEINSTEIN, Carol Simon. The classroom as a social
context for learning. Annual Review of Psychology, vol. 42,
Correção positiva Rápido lembrete verbal ao grupo sobre o que os alunos pp. 493-525, 1991. Disponível em: https://www.annualre-
do grupo devem fazer e não sobre o que eles não devem fazer:
views.org/doi/abs/10.1146/annurev.ps.42.020191.002425
Rápido lembrete verbal ao grupo, parecido com a
Correção individual correção positiva do grupo, com a diferença de que a
anónima correção individual anónima deixa claro que nem todo | REFERÊNCIAS
mundo está onde deveria estar
Passe ao lado da carteira do aluno que não está na BARBETTA, P. M.; NORONA, K. L.; BICARD, D. F. Classroom Behavior
tarefa. Incline-se para chegar o mais perto possível
Correção individual
dele ou dela, usando um tom de voz que garanta Management: A Dozen Common Mistakes and What to Do Instead.
privativa
a maior privacidade possível, diga ao aluno o que April 2005; Preventing School Failure 49(3):11-19. Disponível em:
fazer rápida e calmamente https://www.researchgate.net/publication/254347091_Classroom_
Ao fazer isso seu objetivo deve ser evitar expor o Behavior_Management_A_Dozen_Common_Mistakes_and_What_to_
aluno por alguma coisa negativa que ele fez e se Do_Instead
Use a forma de Correção-
intervenção menos
concentrar em dizer a esse aluno como fazer certo.
relâmpago em
invasiva possível Assim, em vez de dar uma bronca ou explicar o que
público
ele fez de errado, você exalta o comportamento BELTRÃO R. C.; SOUZA C. M. P.; SILVA C. P. S. Contrato Didático e Suas
positivo da maioria da classe. Influências na Sala de Aula. Educ. Matem. Pesq. 2010;12(2):335-
Encontre maneiras de tornar mais fácil ver quem 353. Disponível em: http://revistas.pucsp.br/index.php/emp/article/
seguiu sua orientação. Peça aos alunos para viewFile/2812/3309.
Invente jeitos fazerem coisas visíveis. Pedir que olhem para você
de maximizar a é melhor do que pedir que prestem atenção.
visibilidade LEMOV, Doug. Aula nota 10: 49 técnicas para ser um professor
campeão de audiência. São Paulo: Da Boa Prosa, 2011.
A cada poucos minutos, dê uma olhada na sala
Mostre que está toda com um sorriso calmo estampado no rosto
de olho neles para se assegurar de que tudo está como deveria LIBÂNEO, J. C. Adeus professor, adeus professora? : novas exigências
estar. Quando você dá uma orientação, lembre-se educacionais e profissão docente. [Livro eletrônico] 1ª ed. São Paulo,

A U L A 01 | C R I AÇ ÃO D E U M A M B I E N T E PA R A O A P R E N D I Z A D O
de fazer uma pausa e dar uma olhada na sala toda. Cortez, 2013.
Não se trata apenas de seus alunos fazerem o que
Evite observância
lhes foi pedido; trata-se de fazer direito. Alguns ROGERS, Bill. Gestão de relacionamento e comportamento em sala
marginal
deles só vão completar uma tarefa se você deixar de aula. Trad. Gisele Klein. Porto Alegre: Artmed, 2008.
G E STÃO D E A M B I E N T E S D E A P R E N D I Z AG E M

claro que quer a tarefa completa

Fonte: Próprio autor, 2020.

Portanto, refletir sobre a relação entre a sua concepção de educação e a maneira


como organiza e faz a gestão da sua sala de aula, passa a ser uma estratégia para
lidar com comportamentos desafiadores dos alunos, além de contribuir para a
aprendizagem eficaz.

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