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DA EDUCAÇÃO I
AUTORA
Adriana Moreira da Rocha Veiga
LICENCIATURA EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO I
AUTORA
Adriana Moreira da Rocha Veiga
1ª Edição
UAB/NTE/UFSM
Santa Maria | RS
2018
©Núcleo de Tecnologia Educacional – NTE.
Este caderno foi elaborado pelo Núcleo de Tecnologia Educacional da
Universidade Federal de Santa Maria para os cursos da UAB.
MINISTRO DA EDUCAÇÃO
Mendonça Filho
PRESIDENTE DA CAPES
Abilio A. Baeta Neves
REITOR
Paulo Afonso Burmann
VICE-REITOR
Luciano Schuch
PRÓ-REITOR DE PLANEJAMENTO
Frank Leonardo Casado
PRÓ-REITOR DE GRADUAÇÃO
Martha Bohrer Adaime
DIRETOR DO NTE
Paulo Roberto Colusso
COORDENADOR UAB
Reisoli Bender Filho
DIRETOR DO NTE
Paulo Roberto Colusso
ELABORAÇÃO DO CONTEÚDO
Adriana Moreira da Rocha Veiga
REVISÃO LINGUÍSTICA
Camila Marchesan Cargnelutti
Maurício Sena
APOIO PEDAGÓGICO
Carmen Eloísa Berlote Brenner
Caroline da Silva dos Santos
Keila de Oliveira Urrutia
EQUIPE DE DESIGN
Carlo Pozzobon de Moraes – Ilustrações
Juliana Facco Segalla – Diagramação
Matheus Tanuri Pascotini – Capa e Ilustrações
Raquel Bottino Pivetta – Diagramação
PROJETO GRÁFICO
Ana Letícia Oliveira do Amaral
CDU 37.015.3
Ministério da
Educação
APRESENTAÇÃO
Prezado (a) acadêmico (a)!
E
ste material didático é apresentado ao (a) estudante do curso de Licenciatu-
ra em Ciências da Religião, como o primeiro material de pesquisa da disci-
plina de Psicologia da Educação (I), elaborado para a compreensão da área
de estudo e da sua importância para a formação docente, agregando importantes
saberes para o exercício da docência. Na mesma direção, os conhecimentos com-
partilhados neste texto permitirão o conhecimento do ser humano em sua dimen-
são biopsicossocial e do seu desenvolvimento e aprendizagem ao longo da vida.
Tomando como referência a disciplina de Psicologia da Educação, a narrativa
foi desenvolvida de modo que contemplasse as variantes teóricas e sua interface
com as questões educacionais. Você também terá acesso ao Moodle, como am-
biente virtual de ensino e aprendizagem, encontrando ali outras oportunidades
formativas ao longo da disciplina, tais como vídeos, propostas de debate e a indi-
cação de outras leituras pertinentes à disciplina. Uma das atividades priorizadas
no Moodle e que se articula ao material didático é o “Diário” onde o (a) estudante
será orientado (a) a ir escrevendo gradualmente o seu memorial de formação em
relação aos saberes que vão sendo construídos com o apoio desta disciplina.
Deste modo, na Unidade I, você encontrará noções introdutórias sobre a cons-
tituição do campo da Psicologia da Educação e sua importância na formação do
educador. A unidade II, primeiramente, em um capítulo introdutório, traz con-
ceitos importantes que definem as bases epistemológicas das diferentes aborda-
gens do desenvolvimento humano e aprendizagem e o estudo das abordagens
em Psicologia da Educação. Em seguida, serão estudadas as três primeiras for-
ças em Psicologia e suas implicações no campo da Educação, a saber: Comporta-
mentalismo, Psicanálise e Humanismo. Fica para o segundo livro de Psicologia da
Educação outras abordagens do desenvolvimento humano e aprendizagem, tais
como o Construtivismo e abordagens emergentes no Século XX e XXI.
O propósito deste livro, agregado aos outros materiais disponibilizados ao lon-
go do semestre, é contribuir para a sua trajetória formativa. É um primeiro passo,
o qual exigirá leitura atenta e desejo de aprender na busca das informações.
Desejo que a sua caminhada seja rica em aprendizagens significativas, mas
também no caminhar para si, na construção da sua autoformação.
Introdução ·10
1.1 Contextualização: Psicologia da Educação
e os saberes docentes ·11
1.2 A Psicologia da Educação mobilizando
saberes indispensáveis ao professor ·13
1.3 Conhecendo as bases filosóficas e biológicas da Psicologia ·14
1.4 A interface entre Psicologia e Educação ·20
Atividades de reflexão ou fixação·22
Introdução ·25
2.1 Hereditariedade versus ambiente ·26
2.2 Corrente inatista ·28
2.3 Corrente ambientalista ·30
2.4 Corrente interacionista ·34
2.5 Forças do desenvolvimento humano ·36
Atividades de reflexão ou fixação ·37
Introdução ·40
▷ REFERÊNCIAS ·100
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1.1
CONTEXTUALIZAÇÃO: PSICOLOGIA
DA EDUCAÇÃO E OS SABERES
DOCENTES
Os saberes docentes vêm adquirindo importância desde a década de 80, incen-
tivados pelos Estados Unidos e o Canadá (SHULMAN, 2004; TARDIF, 2002; TARDIF;
LESSARD, 2005). O tema pressupõe a existência de uma base de conhecimentos
para o ensino. As pesquisas possibilitam investigar e sistematizar esses saberes,
compreendendo a genealogia da atividade docente e reconstituindo um corpus
de saberes mobilizados pelo professor. Este campo investigativo qualifica a for-
mação de professores e inicia um processo de profissionalização que traz legitimi-
dade à profissão, superando o senso comum de que a docência se encontra ligada
a um fazer vocacionado.
Lee Shulman (2004) analisa que existe consenso em que as bases do conheci-
mento (saberes) constituem um corpo de compreensões, conhecimentos, habili-
dades e disposições necessárias ao docente para efetivar a sua prática de ensino
e, portanto, indispensáveis à educação do professor, estruturando os processos
formativos e consequentemente, as práticas de formação.
Trazemos essa compreensão acerca dos saberes docentes e as propostas for-
mativas decorrentes das investigações na área, por mobilizarem a investigação do
lugar e do papel da Psicologia da Educação na formação dos professores, justifi-
cável por três fatores:
(1) as relações históricas entre a Psicologia e a Educação, sendo esta disciplina
obrigatória nos cursos de formação de professores;
(2) a Psicologia da Educação constituir-se a partir de teorias do desenvolvimen-
to humano e da aprendizagem, permitindo analisar os fenômenos educativos;
(3) o ensino de Psicologia da Educação como componente na proposta curri-
cular no curso de formação, incluindo o perfil do profissional a ser formado, os
saberes a serem mobilizados e consequentemente, as inter-relações entre teoria e
prática, disciplina formativa e prática profissional.
O ato educativo é complexo, sendo natural que questionemos como as Ciên-
cias da Educação, dentre elas a Psicologia da Educação, podem contribuir diante
das situações de sala de aula e da própria escola. O desafio é para que esta dis-
ciplina não se fixe em um conteúdo abstrato e longe da realidade dos futuros
professores e de seus alunos, provocando a reflexão crítica sobre as implicações
éticas e educacionais.
Os conhecimentos das Ciências da Educação constituem uma base teórica
para o professor ensinar e tomar decisões e não se restringe à mera assimilação
de conceitos, princípios e teorias. Deve promover vivências em situações do coti-
diano escolar, trazendo possibilidades de mobilização dos conhecimentos acadê-
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1.2
A PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
MOBILIZANDO SABERES
INDISPENSÁVEIS AO PROFESSOR
Você escolheu o curso de Licenciatura em Ciências da Religião, o qual está im-
pregnado de conhecimentos acerca do humano. Como já mencionado, a Psico-
logia da Educação é um componente curricular que em sua base formadora de
conhecimentos possibilita a compreensão dos processos de desenvolvimento hu-
mano e aprendizagem do aprendente.
Para Anastasiou (2003) o processo de ensinagem é uma maneira dinâmica de
ensinar e apreender, em que ensinantes e aprendentes interagem estrategica-
mente com objetivos comuns de formação. Conhecer como se dá a ensinagem e o
apreender contribui para o êxito na docência.
A base dos conhecimentos sobre o desenvolvimento humano e aprendizagem
também contribuem na formação do professor, no desenvolvimento de habilida-
des e competências, além de atitudes e valores vitais à prática docente.
Estes elementos teóricos desenvolvem a capacidade de o professor investigar a
própria prática docente e, por meio da reflexão-ação (FREIRE, 1979) redimensionar
os seus saberes e fazeres.
A construção do conhecimento configura o objetivo central do processo edu-
cativo, portanto, as melhores ações precisam ser mobilizadas para o sucesso indi-
vidual e coletivo. Com os aportes da Psicologia da Educação podemos encontrar
possíveis respostas a algumas questões, típicas dos educadores:
14 ·
da capacidade de apreensão do mundo pelo homem. De acordo com o seu pen-
samento, como todo conhecimento advém, em suma, dos sentidos, as coisas e
os fenômenos somente podem ser captados em sua superfície, sendo impossível
chegar a suas às causas primordiais.
Os sentidos forneceriam o material do qual surgiriam ideias simples que, uma
vez combinadas, formariam as ideias mais complexas. O conhecimento seria, en-
tão, "concordância ou discordância entre as ideias".
Vejamos o que o pensamento de Locke traz para a psicologia e para a educação
acerca das crianças. As crianças não seriam, segundo ele, dotadas de motivação
natural para o aprendizado. Então, o conhecimento deveria ser apresentado a elas
de modo convidativo, mediante jogos, por exemplo. Embora teoricamente o filó-
sofo considerasse as sensações, não as percebia como uma função didática. As-
sim, educar com prêmios e punições seria estimular nas crianças e jovens o está-
gio mais primário do entendimento humano. Por outro lado, far-se-ia necessário
levar as crianças e jovens a pensar, rompendo com a dependência dos sentidos.
Embora a existência da possibilidade de castigos, inclusive físicos, Locke consi-
derava o seu uso inadequado, pois resultariam em que as crianças se tornassem
adultos frágeis e medrosos.
Em sua obra “Alguns Pensamentos Referentes à Educação”, Locke afirma
que é possível conduzir a alma das crianças em qualquer direção, assim como
a água. Formar um aluno, sob o aspecto A formação, intelectual ou moral, seria
resultado exclusivo da ação dos educadores – pais e professores, a quem caberia
sobretudo dar o exemplo de como pensar e se comportar, treinando a criança
para agir adequadamente.
Para o filósofo, o aprendizado deveria ser feito por meio de atividades, pelas
quais o hábito levaria a criança ao entendimento do que está fazendo. A educação
ideal seria promovida em casa, por um preceptor/professor, papel que ele próprio
desempenhou para os filhos de alguns amigos.
O conteúdo educativo incluía a formação do governante; a conduta e a ética
do gentleman (o cavalheiro burguês), incluindo as boas maneiras, com prioridade
sobre a instrução, a saúde e o autocontrole do corpo, preconizando certo endu-
recimento físico para facilitar a autodisciplina e o domínio das paixões. A frase
de Lorenzo Madrid, em Contos Homeopáticos, Estórias que a história não conta
– traduz este sentido: “Como perfeito cavalheiro inglês, Wellington era contido,
moderado e dono de uma enorme rigidez de caráter”.
O modelo básico de educação proposto por Rousseau rompe com a educação tra-
dicional, pois esta desenvolvia na criança a formação do intelecto em detrimento
da educação física, do caráter moral e da natureza própria de cada indivíduo.
Leia, no excerto em destaque, o que pensava Rousseau sobre a natureza boa
do homem:
O Bom Selvagem
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um único homem podia criar, e a artes que não solicitavam
o concurso de várias mãos, viveram tão livres, sadios, bons e
felizes quanto o poderiam ser por sua natureza, e continuaram
a gozar entre si das doçuras de um comércio independente;
mas, desde o instante em que um homem sentiu necessida-
de do socorro de outro, desde que se percebeu ser útil a um
só contar com provisões para dois, desapareceu a igualdade,
introduziu-se a propriedade, o trabalho tornou-se necessário
e as vastas florestas transformaram-se em campos aprazíveis
que se impôs regar com o suor dos homens e nos quais logo se
viu a escravidão e a miséria germinarem e crescerem com as
colheitas (ROUSSEAU, 1978, p. 270-271).
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ancestral comum.
2. O mecanismo pelo qual os seres vivos mudam e evoluem é
a seleção natural: os indivíduos mais adaptados ao meio am-
biente conseguem melhores resultados na luta pela sobrevi-
vência. (ARAÚJO, 2017).
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mensional, é indispensável para a docência.
O ser aprendente não é um ser abstrato, nem um modelo a ser descrito, mas uma
pessoa que tem necessidades, preocupações, interesses, desejos, especificidades e
que delas dependem a efetivação de aprendizagens. Um ser que tem uma história
que antecede e que sucederá o contexto escolar. É isto que podemos compreender
com o auxílio das Ciências da Educação, dentre elas a Psicologia da Educação.
O ensinante é o que media o processo de aprender, desenvolvendo uma pro-
posta de ensino coerente com as necessidades do aprendente. Por meio da propo-
sição de atividades significativas para a experiência de aprendizagem vai median-
do o que o aprendente já sabe e pode colocar no jogo do aprender tudo o que ele
já tem condições de saber, porém precisa de mediação. Seja esta uma explicação,
uma informação, ou então um novo desafio que instiga o aprendente a explorar os
materiais disponíveis e construir a sua aprendizagem.
As atividades tornam-se significativas a medida em que se constituem desa-
fios passíveis de resolução, ou seja, o aprendente terá condições de apreender os
meandros do desafio e chegar às melhores respostas. Sejam atividades lúdicas, de
estudo ou de interação mediada por computador, o princípio é o mesmo.
Nessas interações as subjetividades vão sendo produzidas. Sentir, pensar e agir
constituem-se a base da natureza aprendente do ser humano. Nisso consiste a beleza
do conhecimento que a interface entre Psicologia e Educação nos permite acessar.
No tocante ao papel dos computadores, em suas diferentes formas (tablete,
computador pessoal, celular, ...), este é um produto do avanço cultural da humani-
dade, portanto, podemos afirmar que seja um instrumento cultural que poderá me-
diar aprendizagens, como também o fazem os livros, os brinquedos, dentre outros.
As atividades de aprendizagem mediadas pelas tecnologias imprimem novos
motivos nos processos de aprendizagem. As tecnologias cognitivas atuam como
“instrumentos de mediação sociocultural” (VIGOTSKY, 1989, 1993) e oferecem múl-
tiplas possibilidades à educação e aos educadores. Ou seja, podemos aprender
com as tecnologias de modo mais profundo e significativo, disponibilizando-as
em suas possibilidades criadoras como instrumentos socioculturais.
Os estudos de Psicologia da Educação nos permitem compreender que vive-
mos em uma Era Digital, no entanto a nossa aprendizagem não deve se reduzir
às experiências tecnológicas. As novas gerações já nascem imersas no universo
digital. Carecem de outro tipo de informação e de experiências. A tecnologia não
pode assumir toda a infância.
Quanto mais jovem, mais há necessidade de explorar o mundo de modo na-
tural. É primordial promover vivências que colocam a criança em contato com
diferentes possibilidades de expressão. O aprender em atividades que envolvam
as artes, o movimento e as diversas linguagens são parte essencial desse caminho.
Adiante vamos conhecer diferentes abordagens da Psicologia da Educação que
irão elucidando estes e outros aspectos do desenvolvimento e da aprendizagem,
tendo como campo experiencial a educação. Vamos passo a passo compreen-
dendo o desenvolvimento e aprendizagem do aprendente, mas também a nossa,
como ensinantes-aprendentes, pois com nossos estudantes também trilhamos os
caminhos do desenvolvimento e da aprendizagem.
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BASES EPISTEMOLÓGICAS DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO
E DA APRENDIZAGEM
INTRODUÇÃO
N
esta unidade você irá compreender conceitos importantes que definem
as bases epistemológicas das diferentes abordagens do desenvolvimento
humano e aprendizagem. Ou seja, as bases em que esse conhecimento foi
construído. Isto irá ajudá-lo (a) a entender porque cada teórico aborda estas ques-
tões de maneira diferente e no que consistem estas diferenças.
A proposição é trazer à reflexão a questão:
– O que define o desenvolvimento humano, a natureza herdada ou o ambiente?
Esta é uma reflexão que perpassa a filosofia e chega aos teóricos do desenvolvi-
mento humano e da aprendizagem desde o final do Século XIX, passando pelo Sé-
culo XX até ao XXI, deixando no caminho um ser humano fragmentado pela ciência.
Na Psicologia não foi diferente. Uma das causas é a especialização a que nos
conduz o método científico, ou seja, ao definir o objeto de estudo, o cientista deli-
mita o campo, reduzindo o seu problema e colocando em “suspenso” aspectos que
não estariam ligados diretamente ao problema. Assim, temos diferentes sujeitos:
o da cognição, o epistêmico, o do desejo, o sociocultural, dentre outros. Cabe-nos
então, conhecermos estas diferentes abordagens e cotejarmos o principal de cada
uma para compreendermos o “sujeito da educação”, ou seja, o sujeito que aprende
e o faz com todo o seu ser, este ser que é biopsicossocial, complexo e ainda desco-
nhecido em sua totalidade.
Sugiro que você continue realizando as atividades de leitura dirigida e o ficha-
mento, sinalizando os tópicos principais para aprofundar o estudo em outras fon-
tes. Aguce a sua curiosidade e busque saber mais, a partir da bibliografia indicada
no final deste livro. Também curta o momento cinematográfico, trazendo em cada
história, o conteúdo estudado como base reflexiva.
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das nessas três bases de sustentação filosófica. Este é o ponto de encontro entre
filosofia, psicologia e educação, na medida em que a primeira permite validar o
quê, como e por quê se dizem diferentes coisas sobre diferentes objetos nas teo-
rias que dão sustentação à psicologia da educação. Isso permitirá explicarmos as
diferenças nas tantas abordagens que estudaremos neste capítulo – O Compor-
tamentalismo/Behaviorismo não possui a mesma epistemologia, ontologia nem
metodologia da Psicanálise, e do mesmo modo o Humanismo.
Isto posto, vamos à reflexão. Em sua opinião, o que define o desenvolvimento
humano:
– A hereditariedade (fatores endógenos) ou o ambiente (fatores exógenos)?
Na perspectiva de abordar a problemática em questão, torna-se interessante a
explicitação dos conceitos, hereditariedade e ambiente.
Ambiente é “aquilo que cerca ou envolve os seres vivos ou as coisas; meio ambien-
te”. (FERREIRA, 1986, p. 101-102).
Mas o Deus que vos modelou, àqueles dentre vós que eram ap-
tos para governar, misturou-lhes ouro na sua composição, moti-
vo por que são mais preciosos; aos auxiliares, prata; ferro e bron-
ze aos lavradores e demais artífices. (Platão, em A República).
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mitissem comparar os comportamentos esperados para certa faixa etária. Com
isso o desenvolvimento passou a ser entendido como um processo de padroniza-
ção, isto é, uma sequência de respostas definitivas que envolvem uma sequência
fixa de padrões de crescimento físico e correspondem a um período da evolução
inerente ao organismo humano.
Ao pensar em hereditariedade ou herança genética (cor dos olhos, cabelo, tipo
sanguíneo...), os teóricos da concepção inatista-maturacionista observam que,
assim como os traços determinados geneticamente quando nascemos, as apti-
dões individuais e a inteligência são características herdadas dos pais. Os dados
coletados e constatados pelos pesquisadores de que os fatores inatos são deter-
minantes nas aptidões individuais permitiram que fossem estabelecidas compa-
rações entre as pessoas. A partir disto, pessoas com uma aptidão especial teriam
em sua família alguém que apresentasse o mesmo tipo de aptidão. Ainda com
base nessa concepção homens e mulheres apresentariam diferenças de aptidões,
assim como crianças brancas e negras apresentariam diferenças no desempenho
de determinadas tarefas em razão da herança genética de suas raças.
Para Arnold Gesell, o desenvolvimento seria o desdobramento natural de um
plano biológico, em que a experiência não interessa. O autor incentiva os pais a
deixarem as crianças desenvolverem-se sozinhas, acreditando que sem a ajuda
dos adultos, comportamentos como falar, brincar e raciocinar surgiriam com a
naturalidade da idade.
Ainda, Gesell é responsável pela produção de escalas de desenvolvimento,
divididas em quatro dimensões: motora, verbal, adaptativa e social, fazendo
parte da teoria da maturação.
Alfred Binet (1857-1911), pedagogo e psicólogo francês, ficou conhecido pela
sua contribuição na área da psicometria, sendo o inventor em parceria com Te-
odore Simon, da primeira escala para a medida da inteligência geral, conhecida
como TESTE DE QI. Assim como Gesell, acreditava que a inteligência e o desen-
volvimento psíquico da criança eram biologicamente determinados. Da mesma
forma, Binet procurou descrever habilidades e comportamentos típicos de cada
faixa etária, especialmente a mensuração da inteligência por meio de testes.
Existiria relação entre o desenvolvimento biologicamente determinado com
o processo de aprendizagem?
O inatismo sustenta que as pessoas naturalmente carregam certas aptidões,
habilidades, conceitos, conhecimentos e qualidades em sua bagagem hereditá-
ria. Tal concepção motivou um tipo de ensino que acredita que o educador deve
interferir o mínimo possível, apenas trazendo o saber à consciência e organizan-
do-o. Fernando Becker, no seu livro “Educação e Construção do Conhecimento”
escreve: "Em resumo, o estudante aprenderia por si mesmo".
Mesmo que a noção de aprendizado como reminiscência não encontre susten-
tação na ciência contemporânea, algumas ideias inatistas ainda são observadas
nas salas de aula. Ainda vemos muitos docentes explicando o baixo rendimento
escolar de certos estudantes porque eles "não têm habilidade para aprender" (so-
bretudo os de "lares desestruturados" ou que tenham algum comportamento fora
do “modelo escolar”).
30 ·
causalidade é uma relação entre ideias e, portanto, não verdadeira. Tudo o que
pensamos ser verdadeiro é imaginação.
Na psicologia, consequentemente na psicologia da educação, o determinismo
ambientalista assume a base da abordagem comportamentalista (Ivan Pavlov) e
behaviorista (Watson, Skinner), a qual já vimos estudando.
Esta abordagem define o homem mediante tipos de estruturas bem definidas
que o forçam a reagir de determinadas maneiras ao nascimento, ocorrendo de
maneira comum a todos os membros da espécie humana e formando um grupo
de reações de comportamento inato ou não adquirido. Porém, não existiria nada
a que se pudesse chamar de instinto. O que se habituou a chamar de instinto faz
parte dos comportamentos adquiridos ou aprendidos após a experiência.
Quanto às características de personalidade, não existiria herança de capaci-
dade, talento, temperamento, constituição mental e caracteres, pois estes depen-
dem do treinamento dirigido desde muito cedo, ainda no berço, respondendo
pelo desempenho do homem adulto.
O homem seria um organismo passivo, governado por estímulos fornecidos
pelo ambiente externo. O homem é manipulável, seu comportamento é controlá-
vel através do controle dos estímulos ambientais. As leis que governam o homem
são iguais às leis que governam todos os fenômenos naturais.
A espécie humana parece ser produto de uma seleção natural, como as de-
mais espécies: assim nos permite compreender os estudos darwinianos. A com-
plexidade dos organismos envolveria diferentes aspectos de um sistema vivo,
dentre eles a área denominada comportamento. E este envolveria, definitiva-
mente, o ambiente. Para este enfoque não existiria herança de capacidade, ta-
lento, temperamento, constituição mental e caracteres, pois estes dependeriam
do treinamento, ocorrendo principalmente no berço: “um determinado tipo de
estrutura, somado a um treinamento dirigido desde cedo, responde pelo desem-
penho do homem adulto” (SAHAKIAN, 1980, p. 20).
A orientação comportamentalista define o homem como um organismo
passivo, governado por estímulos fornecidos pelo ambiente externo. O com-
portamento do homem seria manipulável por meio do controle dos estímulos
ambientais. As leis que governam o homem seriam iguais às leis que governam
todos os fenômenos naturais.
Quanto ao condicionamento clássico, Ivan Petrovich Pavlov (1849-1936), fisió-
logo russo, deixou claro o controle comportamental através dos estímulos dirigi-
dos. Embora aceitasse alguns reflexos inatos ou absolutos que formam o processo
básico de todo o comportamento não aprendido, considerava-os necessários, po-
rém não suficientes para a unidade do organismo com o mundo externo.
John Broadus Watson (1878-1958), psicólogo estadunidense, considerado o
fundador do comportamentalismo ou simplesmente behaviorismo, apoiou a
posição ambientalista de que a natureza humana estaria fortemente sujeita às
mudanças e que não haveria limites para o que o homem possa vir a ser. Wat-
son negou a herança de quaisquer aptidões mentais, traços de personalidade
ou predisposições determinadas. Herdaríamos apenas a nossa estrutura física
e alguns poucos reflexos. Todas as nossas diferenciações seriam originadas na
aprendizagem (MILHOLLAN; FORISHA, 1978).
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da natureza nem contra a natureza. A natureza nos confere a
capacidade de recebê-las, e essa capacidade é aprimorada e
amadurecida pelo hábito. (ARISTÓTELES, L. II, 1, § 1).
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rentes abordagens, conforme o interesse de estudo. Assim as abordagens enfatizam:
• Evolutiva,
• Histórica e
• Ontogenética.
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ATIVIDADES – Unidade 2
A seguir, você encontrará algumas questões dirigidas para o estudo. Procure
responder as questões com suas próprias palavras (sem copiar e colar do texto):
“A Maçã” (1998).
Sinopse: Este é um filme verídico que narra a história
inusitada de duas irmãs gêmeas, Massoumeh e Zahra, criada
pelos pais, uma senhora cega e um desempregado, sem
sair de casa durante 11 anos, o que provocou um atraso no
desenvolvimento global. A atitude paterna era justificada
por uma passagem do Alcorão, segundo o qual as jovens são
como pétalas, que fenecem ao contato do sol e não podem ser
tocadas por homens.
Disponível em: <https://youtu.be/buhLlfTVPwI> Acesso em:
setembro de 2017.
N
Nesta terceira e última unidade, você será apresentado a teóricos de rele-
vância na constituição da ciência psicológica. São precursores do que se
tornou conhecido como “as três forças em Psicologia”, cujo alvorecer se
deu do início à metade do Século XX. Sem dúvida, como saberes docentes, vincula-
remos cada uma dessas forças às contribuições que trazem à educação.
A primeira força em Psicologia é conhecida como Comportamentalismo,
Behaviorismo ou ainda Psicologia Comportamental. Preconizada pelo russo Ivan
P. Pavlov, traz a noção de que seria possível prever o comportamento humano ou
animal, pois este é sempre determinado por uma série de variáveis controláveis.
Traz também a noção de que o ser humano é condicionado, ou seja, o seu com-
portamento é aprendido, tendendo a repeti-lo quando recebe uma recompensa
por sua ação e a abandoná-lo quando não recebe nada em troca ou quando rece-
be uma punição. A influência na educação veio principalmente do estadunidense
B. F. Skinner. Para esta abordagem, aprendizagem é mudança efetiva de compor-
tamento, podendo ser conduzida por sistemas de recompensa, comum na meri-
tocracia. O professor conduz o estudante pelo caminho que deve aprender, fazen-
do-o seguir rigorosamente a trajetória traçada.
A segunda força em Psicologia é a Psicanálise, criada por Sigmund Freud, em
torno de 1900. A grande inovação trazida por Freud foi introduzir na psicologia a
noção do inconsciente. Segundo a visão psicanalítica, a mente humana é com-
posta por uma parte consciente, que contém todos os conhecimentos e informa-
ções que utilizamos: pensamentos, emoções conhecidas, memórias, reflexões e
devaneios. Mas essa é apenas uma parte muito pequena da mente. A outra parte,
o inconsciente, é muitas vezes maior que a parte consciente. Normalmente não
temos acesso a essa parte, mas ela funciona e governa nossos comportamentos,
independente de nossa vontade. Enquanto essa parte desconhecida governa nos-
so comportamento, não temos controle pleno sobre nossos atos. Os conteúdos
inconscientes devem ser trazidos à consciência, de modo que tenhamos a pos-
sibilidade de tomar decisões mais de acordo com nossa vontade consciente. No
processo de aprendizagem, o conteúdo inconsciente pode vir a represar a libido/
desejo presente no ato de aprender.
A Psicologia Humanista, terceira força em Psicologia, surgiu entre as décadas
de 1950 e 1960, como reação e crítica às duas forças anteriores, Behaviorismo e Psi-
canálise, à época dominando o cenário. Não há um fundador ou teórico que iniciou
essa abordagem, mas normalmente considera-se Abraham Harold Maslow o pai da
Psicologia Humanista, principalmente pelo seu papel como articulador e organi-
zador do movimento. Ao mesmo tempo, Maslow afirmava que a Psicologia Huma-
nista era apenas o berço de uma escola mais abrangente, a Psicologia transpessoal.
Nesta unidade, dado às peculiaridades de cada abordagem, serão propostos
mais filmes, desdobrando o momento cinematográfico em quatro sessões, orien-
tada ao final de cada capítulo.
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3.1
COMPORTAMENTALISMO/
BEHAVIORISMO
Apontamentos iniciais
O comportamentalismo é uma das abordagens que mais influenciaram a educa-
ção no Século XX e ainda tem raízes fortes em algumas práticas educativas tradi-
cionais. Refiro-me tanto à educação escolar quanto à educação familiar e à própria
sociedade ocidental, cujo determinismo já fora descrito por B. F. Skinner (1958) em
sua obra Walden Two: uma sociedade do futuro, representando o controle social
absoluto. Imagine você viver em uma sociedade em que todos os seus atos fossem
planejados e controlados por cientistas? O autor sugere, em uma perspectiva utó-
pica, em que o conhecimento sobre o comportamento humano levasse a um am-
biente social profícuo a vidas produtivas e criativas, como modelo a ser seguido
por outros possíveis indivíduos com potencial produtivo e criativo.
A crença absoluta é de que o comportamento humano pode ser modificado
pela aprendizagem; assim, tanto o estudante quanto o professor podem modificar
o seu comportamento – pelo mesmo sistema de controle de variáveis. Nesse sen-
tido, a “formação” pressupõe realmente a ideia de “forma” ou ainda de “formatar”.
Também poderíamos inferir a modificabilidade do comportamento frente aos
preceitos religiosos, ao supor-se que o ser humano encontra gratificação em ser
obediente às orientações dos sacerdotes de sua Igreja, desenvolvendo o seu sen-
timento de pertença àquela congregação. Também pode sentir-se gratificado por
obedecer ao seu sacerdote, percebido como “representante de Deus”. A ideia de um
deus narcisista que deseja ser adorado para distribuir bênçãos aos seus adoradores.
Estes exemplos trazem comportamentos estimulados por determinados mo-
tivos, os quais são alimentados em uma cadeia Estímulo (E) – Resposta (R), “E-R”,
ou, em inglês, Stimulus (S) – Response (R), “S-R”.
A maior parte dos Teóricos “E-R” supõem a existência de um estímulo que an-
tecede a uma resposta, valorizando muito o processo de aprendizagem por en-
saio-erro e acerto acidental, variando conforme a natureza do exercício ou da
aprendizagem. As teorias do Condicionamento em Pavlov, Watson, Thorndike e
Skinner formulam que o comportamento ocorre em uma sequência de Estímulos
[E], de Respostas [R] e pela relação (reflexo), Estímulo-Resposta [E-R]. O compor-
tamento humano estaria condicionado a sinais-estímulos, provocadoras de res-
postas condicionadas, reflexo.
É importante registrar que no âmbito da relação saudável entre mãe e bebê,
a estimulação infantil é crucial e, até certo ponto, implica em imitação do com-
portamento do outro, seja adulto ou criança. A criança necessita de estimulação
para sua organização geral, inclusive a organização do córtex cerebral. A esti-
mulação é essencial para a manutenção, o desenvolvimento e a maturação dos
sistemas neuronais.
42 ·
processo várias vezes, notando que a saliva aparecia quando a campainha era to-
cada sem que a comida fosse apresentada ao animal.
Em outra experiência, Pavlov condicionou o alimento a uma luz circular. Mos-
trando igualmente uma luz elíptica, sendo que nesse momento o animal não re-
cebia alimento. Em pouco tempo, o cão só salivaria quando aparecia a luz circular.
Aos poucos Pavlov foi arredondando a luz elíptica, até torná-la quase circunferên-
cia, de modo que o animal não mais pudesse distinguir as duas figuras, ficando
sem saber quando receberia comida. Essa confusão levou o cão a tal nervosismo
que começou a correr em círculo e a uivar. Então, Pavlov descobriu que era possí-
vel descondicionar o animal e curá-lo do colapso nervoso.
A abordagem do desenvolvimento conhecida como Behaviorismo nasceu da
perspectiva comportamentalista baseada nos estudos de Pavlov, os quais enfatiza-
vam a importante participação dos ambientes na modelagem do comportamento.
A ideia básica de Pavlov já havia sido proposta no Século XVII por John Locke ao
afirmar que o conhecimento tinha por base as associações. Contudo, Pavlov foi
além da filosofia, descobrindo vários princípios da associação mediante experi-
mentos empíricos. O comportamento, para o cientista russo, é resultante efetivo
da aprendizagem ou de respostas condicionadas para determinados estímulos.
Não há interesse, por parte dos comportamentalistas, de um modo geral, pelas
variáveis inconscientes do comportamento. A aprendizagem é vista como uma
consequência de estágios, muito mais do que relacionado a um processo contí-
nuo de desenvolvimento, como geralmente abordado nas teorias do desenvolvi-
mento humano e aprendizagem.
Nas pesquisas acerca da salivação em cães, já mencionadas, Pavlov observou
que estes poderiam salivar não somente ao avistar a comida, mas também com
o som e com a aproximação do atendente. O cão observado iniciou a associa-
ção do som da aproximação do atendente com o fornecimento da comida. Essa
constatação inicial desencadeou outra série de experiências para verificar o que
ocorria. Finalmente, os resultados formais de sua observação evidenciaram que o
som precedente à alimentação provocou respostas imediatas em torno de meio
segundo.
O condicionamento clássico ou respondente foi descrito pelo fisiologista por
meio do pareamento de um estímulo incondicionado com um estímulo neutro
(luz, som, cheiro) de forma que este último também se torna "eliciador" da res-
posta induzida pelo estímulo incondicional (BAUM, 2006).
Esse tipo de aprendizagem, ocorrida por meio de associação, denomina-se
condicionamento clássico. Na aprendizagem por associação, o condicionamento
clássico, ou respondente, envolve uma série de estímulos e respostas, apresentan-
do-se do seguinte modo:
44 ·
Em 1913, Watson publicou o artigo "A Psicologia como um behaviorista a vê",
onde apresenta os fundamentos da sua teoria. Este episódio inaugurou o Beha-
viorismo (behavior = comportamento), tendo como objeto o comportamento.
Isto deu a Psicologia o status de ciência por ter um objeto de estudos observável,
mensurável, permitindo experimentos reproduzidos em laboratório, em diferen-
tes condições e em diferentes sujeitos.
A perspectiva preconizada por John B. Watson demarcou o rompimento da Psi-
cologia com a Filosofia. Antes de a Psicologia adquirir o status de ciência, conside-
rando a versão positivista do termo, tinha por objeto o estudo da alma, portanto
tratavam-se de estudos filosóficos. Watson, em uma versão funcionalista, assumiu
que o estudo do comportamento deveria ser relacionado às variáveis do meio. Fi-
cou conhecido por afirmar que não havia diferença entre as pessoas ao nascerem
e o que se tornaram era fruto do que elas vivenciaram.
Os organismos ajustam-se aos ambientes por meio de fatores hereditários e
da formação dos hábitos, em que determinados estímulos dirigem determinada
resposta. Os estudos behavioristas tiveram impacto nos Estados Unidos por causa
da sua aplicabilidade prática: a alma não seria observável nem mensurável; o fato
psicológico, de modo concreto, ocorreria a partir do comportamento (behavior).
Skinner afirmaria, em 1963 que “a objeção aos estados interiores não é a de que eles
não existem, mas a de que não são relevantes para uma análise funcional” (p. 28).
No entanto, o objeto de estudos dessa corrente psicológica foi sendo ampliada
para além do comportamento. O Behaviorismo compreende o comportamento
como uma interação entre o que o sujeito faz e o ambiente no qual ele se en-
contra, dedicando-se ao estudo dessas interações entre o indivíduo e o ambiente,
entre as ações do indivíduo (suas respostas) e o ambiente (as estimulações). Os
termos “resposta” e “estímulo” definem para os behavioristas o que o organis-
mo faz e também as variáveis ambientais que interagem com o sujeito. Enfim, o
comportamento pode ser definido como interação indivíduo-ambiente, sendo o
foco descritivo inicial para uma ciência do comportamento. Consequentemente,
o homem é estudado a partir da sua interação com o ambiente, sendo produto e
produtor dessa mesma interação.
46 ·
satisfatórias. Assim, essas respostas se tornam cada vez mais eficientemente li-
gadas ao estímulo na gaiola de quebra-cabeça e provavelmente ocorrerão na
próxima vez em que o animal for colocado na gaiola.
(1) A lei do exercício – as ligações E-R são fortalecidas pela prática ou pela re-
petição até a perfeição.
(2) A lei do efeito – as ligações ou conexões E-R são também fortalecidas pela
recompensa ou satisfação.
• Respostas com recompensa são aprendidas e repetidas.
• Respostas com consequências desagradáveis tendem a não se repetir.
Thorndike definiu as recompensas (ou aquilo que satisfaz como ele as chamou)
como situações das quais um organismo se aproxima voluntariamente ou não faz
nada para evitar. Ele poderia ter parado neste ponto e a sua influência poderia ter
sido mais profunda. No entanto, Thorndike abordou também os efeitos “punido-
res”, os quais acreditava que enfraquecessem ou quebrassem as conexões E - R. Ou-
tros estudos demonstrariam que a punição não opera absolutamente desta forma
e frequentemente apresenta efeitos indesejáveis para a cognição e a afetividade.
Entretanto, a influência de Thorndike na prática educacional foi significativa,
influenciando muitas gerações de professores a aceitaram suas teorias como se
elas fossem naturais, em vez de leis estabelecidas por um teórico, o qual afirmava
que a repetição era uma chave para a aprendizagem. Contrariamente, a punição
seria a chave para enfraquecer ou apagar respostas não apropriadas. Esta acaba
tornando-se uma abertura para que as crianças recitassem suas lições de mate-
mática e ciências, continuamente pressionadas pela ameaça de uma palmatória.
Por outro lado, as investigações pioneiras de Edward Lee Throndike nos
campos da aprendizagem humana estão entre as mais influentes na história da
Psicologia e da Psicologia da Educação. Em 1912, foi reconhecido por suas pes-
quisas, sendo eleito como o presidente da Associação Psicológica americana.
Ressaltamos, também, que ele estabeleceu, com a lei dos efeitos, as bases para o
Behaviorismo radical de Skinner, já citado nesta unidade e que a seguir comen-
taremos com maior profundidade.
Muitas teorias têm sido propostas para explicar como ocorre o desenvolvimento
humano e a aprendizagem a partir de hábitos e de experiências sociais. Talvez, o
teorista que mais avançou na abordagem Behaviorista, preconizada por J. Watson,
foi Burrhus Frederic Skinner. A posição mais sistematicamente ambientalista e
determinista encontra-se em Skinner, o qual considera que o estudo do compor-
tamento não depende de conclusões sobre o que se passa dentro do organismo.
Para Skinner (1984, p. 182), as interações entre um organismo e seu ambiente
envolvem um contexto no qual ocorreu a resposta, a própria resposta e as contin-
gências de reforço. Estas propriedades do ambiente apontam para inter-relações
mais complexas do que a simples fórmula estímulo-resposta (E-R), e também mais
produtivas. O comportamento gerado por um conjunto dado de contingências de
reforço evidencia o nível de significância do estímulo. Ao analisar o comportamen-
to sob contingências conhecidas de reforço, podemos perceber o que ocorre na
vida cotidiana. O comportamento e o ambiente não são coisas ou eventos separa-
dos, mas inter-relacionados. Para Skinner, o homem é em grande parte responsá-
vel pelo ambiente em que vive, estando engajado em um amplo exercício de auto-
controle, através do qual chegou a realizar cada vez mais do seu potencial genético.
Em uma citação original de 1969, ele antevê avanços na área da genética:
48 ·
ambiente, mas ele agora alcançou o ponto a partir do qual
pode examinar o processo e fazer algo a respeito. Ele pode
mudar o curso de sua própria evolução mediante reprodução
seletiva, e num futuro não muito distante, bastante provavel-
mente ser-lhe-á possível mudá-lo mediante alteração de seus
cromossomos (SKINNER, 1984, p. 210).
Comportamentalismo radical
Skinner foi um rigoroso behaviorista que acreditava em uma psicologia que poderia
dispensar qualquer referência aos estados mentais inatingíveis e limitou-se a estu-
dar o comportamento observável. Rejeitou a noção de que a maioria dos compor-
tamentos humanos é regida por impulsos biológicos ou outros motivos internos.
Como Watson, Skinner foi um ambientalista e, embora reconhecesse que orga-
nismos chegam ao mundo com dotes genéticos, interessou-se primeiramente em
como os ambientes controlam o comportamento. Porém, ao contrário de Watson,
o modelo de Skinner não foi Pavloviano.
Em relação às respostas que Pavlov estudava, Skinner afirmava serem melhor
conceituadas como respondentes, isto é, respostas que são automaticamente pro-
vocadas por um estímulo conhecido. Afirmava que a maioria dos hábitos que as
crianças adquirem são respostas que constroem a personalidade e que são ope-
rantes, livremente emitidas, e se tornam mais ou menos prováveis quanto aos re-
sultados de suas consequências.
Nessa direção, Skinner propôs que o comportamento é motivado mais por
estímulos externos, reforços ou eventos punitivos, que por forças internas e, é
diretivo ou instintivo. Na teoria de Skinner, a resposta emitida livremente pelo
estímulo é chamada de operante e o estímulo é chamado de reforço. Os eventos
que suprimem as respostas ou diminuem as possibilidades dessas ocorrências
são chamadas de punição.
50 ·
• Ensinar a utilizar, com proveito, materiais organizados de nossa cultura: má-
quinas, técnicas, roteiros, esquemas, em tempos de Educação a Distância,
uso da internet e outros instrumentos audiovisuais.
Reforça;
Revisa a aprendizagem;
Avalia;
Evita o castigo.
Atividades:
Nas situações de ensino-aprendizagem:
• Máquinas de ensinar;
• Instrução programada;
• Preenchimento de sentenças e lacunas;
• Questões de escolha;
• Questionários em que as perguntas contêm as respostas;
• Repetição de perguntas e respostas.
Na avaliação da aprendizagem:
• O estudante avalia-se com critérios externos mediante o modelo previsto pe-
los objetivos do ensino (tipos de tarefas programadas);
• O estudante será avaliado mediante critérios pré-estabelecidos pelo pro-
fessor e grupos de decisão;
• Avaliação é a mera constatação de que o complemento de um programa es-
tudado devidamente é garantia, por si só, de que o estudante aprendeu e
dominou o objetivo;
A questão do controle
Uma análise científica do comportamento deve, creio eu, supor
que o comportamento de uma pessoa é controlado mais por
sua história genética e ambiental do que pela própria pessoa
enquanto agente criador, iniciador; todavia, nenhum outro as-
pecto da posição behaviorista suscitou objeções mais violen-
tas. Não podemos evidentemente provar que o comportamen-
to humano como um todo seja inteiramente determinado, mas
a proposição torna-se mais plausível à medida que os fatos se
acumulam e creio que chegamos a um ponto em que suas im-
plicações devem ser consideradas a sério. Subestimamos ami-
úde o fato de que o comportamento humano é também uma
forma de controle. Que um organismo deva agir para controlar
o mundo a seu redor é uma característica da vida, tanto quanto
a respiração ou a reprodução. Uma pessoa age sobre o meio e
aquilo que obtém é essencial para a sua sobrevivência e para
a sobrevivência da espécie. A Ciência e a Tecnologia são sim-
plesmente manifestações desse traço essencial do comporta-
mento humano. A compreensão, a previsão e a explicação, bem
como as aplicações tecnológicas, exemplificam o controle da
natureza. Elas não expressam uma “atitude de dominação” ou
“uma filosofia de controle”. São os resultados inevitáveis de
certos processos de comportamento. Sem dúvida cometemos
erros. Descobrimos, talvez rápido demais, meios cada vez mais
eficazes de controlar nosso mundo, e nem sempre os usamos
sensatamente, mas não podemos deixar de controlar a nature-
za, assim como não podemos deixar de respirar ou de digerir o
que comemos. O controle não é uma fase passageira. Nenhum
místico ou asceta deixou jamais de controlar o mundo em seu
redor; controla-o para controlar-se a si mesmo. Não podemos
escolher um gênero de vida no qual não haja controle. Pode-
mos tão-só mudar as condições controladoras.
Contra-controle
Órgãos ou instituições organizadas, tais como governos, reli-
giões e sistemas econômicos e, em grau menor, educadores e
psicoterapeutas, exercem um controle poderoso e muitas ve-
zes molesto. Tal controle é exercido de maneiras que reforçam
de forma muito eficaz aqueles que o exercem e, infelizmente,
isto via de regra significa maneiras que são ou imediatamen-
52 ·
te adversativas para aqueles que sejam controlados ou os ex-
ploram a longo prazo. Os que são assim controlados passam a
agir. Escapam ao controlador — pondo-se fora de seu alcance,
se for uma pessoa; desertando de um governo; apostasiando
de uma religião; demitindo-se ou mandriando — ou então
atacam a fim de enfraquecer ou destruir o poder controlador,
como numa revolução, numa reforma, numa greve ou num
protesto estudantil. Em outras palavras, eles se opõem ao con-
trole com contracontrole”. (SKINNER, 1982, p. 56).
CONDICIONAMENTO
CONDICIONAMENTO CONEXIONISTA OPERANTE OU
CLÁSSICO INSTRUMENTAL
APRENDIZAGEM
54 ·
era, ao mesmo tempo, sujeito no tratamento e objeto de estudo. Atualmente é
possível percorrer estes caminhos com certa independência. É pertinente, para
caracterizarmos o cunho da abordagem teórica, denominá-la não como teoria
psicanalítica, mas como teoria psicodinâmica do desenvolvimento da personali-
dade. Enquanto Psicanálise, compreendemos como sendo um método para o tra-
tamento psicoterápico.
Deste modo, com a intenção de compreender o obscuro e aparentemente ina-
tingível da vida mental, FREUD (1981), propõe uma teoria e uma terapia, cujas es-
pecificidades delineiam-se como procedimentos investigatórios, método terápico e
elaborações teóricas a partir das informações, emergentes de tais procedimentos e
métodos. Emerge daí uma original disciplina científica, com a intenção de liberar
conteúdos inconscientes para apreendê-los e, consequentemente, lidar com eles
de modo consciente. As lembranças dos anos iniciais da infância, trazidas à cons-
ciência, conduzem a pessoa a liberar-se das inibições inconscientes, fortalecendo
o ego, tornando-se mais independente do superego e expandindo-se através das
novas partes apropriadas do Id. A vida torna-se mais satisfatória, quando as pes-
soas são ajudadas a relembrar, recuperar e reintegrar materiais inconscientes.
Tendo como foco analítico a explicação do desenvolvimento humano, busca-
remos as contribuições de Sigmund Freud, em um plano básico de compreensão
de seus conceitos principais, da estrutura e dinâmica da personalidade e das fases
psicossexuais do desenvolvimento da personalidade. Ao mesmo tempo, procura-
remos trazer as contribuições de correntes neofreudianas que consideramos per-
tinentes no presente contexto, enfatizando as contribuições de Erikson, no que se
refere às fases psicossociais do desenvolvimento da personalidade.
56 ·
A vida, disse Freud, não é senão um meio para se chegar à
morte. Perturbada em sua existência estável, a matéria orgâni-
ca procura retornar ao estado de quietude. O desejo de morte
no ser humano é a representação psicológica do princípio da
constância. O impulso agressivo é um importante derivativo
dos instintos de morte. A agressividade é a autodestruição
voltada contra objetos substitutivos. Uma pessoa luta contra
outra e torna-se destruidora, porque seu desejo de morte é
bloqueado por forças dos instintos de vida e por outros obs-
táculos em sua personalidade que resistem aos instintos de
morte. A primeira guerra mundial convenceu Freud de que a
agressão era um motivo tão dominante quanto o sexo (HALL;
LINDZEY, 1973, p. 54-55).
58 ·
reativo padronizado, formatado nos jogos de poder e funções e por sua mecânica
técnica, intelectual e cultural.
O id é o subsistema original que contém tudo o que se traz ao nascer e que é psi-
cologicamente herdado. É um reservatório de energia física que aciona os outros
sistemas, dominado pelo princípio do prazer. Encontra-se exposto tanto às exi-
gências somáticas do corpo quanto aos efeitos do ego e superego. Embora seja a
estrutura original, a partir da qual as outras se desenvolvem, é caótico e desorga-
nizado, sem um princípio lógico condutor. Impulsos contrários coexistem sem
que se anulem. Sendo um reservatório energético de toda a personalidade, seus
conteúdos, no entanto, são quase todos inconscientes, originalmente presen-
a) com relação aos acontecimentos externos, ele desempenha esta tarefa arma-
zenando na memória as experiências sobre os estímulos externos, evitando estí-
mulos excessivamente internos mediante a fuga, lidando com os estímulos mode-
rados mediante a adaptação e aprendendo a produzir modificações convenientes
no mundo externo através da atividade, em seu próprio proveito;
b) com relação aos acontecimentos internos o ego busca a autopreservação em
relação ao id, obtendo controle sobre as exigências dos instintos, deliberando so-
bre sua satisfação ou não, adiando-a ou suprimindo suas excitações.
O ego esforça-se pelo prazer, evitando o desprazer, por isso dirige sua atividade
para a redução das tensões produzidas pelos estímulos. Quando estas elevam-se a
níveis excessivos, causam desprazer.
O superego, por sua vez, desenvolve-se a partir do ego, atuando como juiz ou
censor de suas atividades e pensamentos. Representante interior dos valores e ideais
da sociedade, o superego é a arma moral da personalidade, tendendo à perfeição.
O superego tem três funções, descritas por Freud (1981):
60 ·
O superego de uma criança é construído segundo o modelo do superego de
seus pais, havendo uma identificação de conteúdo veicular da tradição e dos jul-
gamentos de valor transmitidos de geração em geração.
Existe uma interrelação entre os três subsistemas, sendo a meta fundamental
da psique manter e recuperar um nível aceitável de equilíbrio, maximizando o
prazer e minimizando o desprazer. A energia acionadora da dinâmica nasce no
id, de natureza instintiva. O ego, emergindo do id, lida realisticamente com as
pulsões básicas do id e também é mediador entre as forças operativas no id e no
superego e as exigências da realidade externa. O superego, emergindo do ego, atua
como um freio moral ou força contrária aos interesses práticos do ego. Suas nor-
mas definem e limitam a flexibilidade do ego. Quanto aos níveis de inconsciência,
o id é totalmente inconsciente, enquanto grande parte dos conteúdos do ego e
superego são normalmente inconscientes, sendo necessário despender esforço
para torná-los conscientes.
A grande inovação trazida por Freud foi introduzir na psicologia a noção do in-
consciente, também chamado de ID em que ficam armazenados os traumas do
passado, as lembranças reprimidas. Ele age pelo princípio do prazer.
• Inconsciente:
– Processo primário – submetidos ao princípio do prazer;
– Nem negação, nem certeza, atemporal;
– Traços mnêmicos; Representação de coisa;
– Onde age a primeira censura;
– Concretude.
Os instintos
62 ·
não distingue a imagem subjetiva da realidade objetiva: ao captar a imagem de
um objeto é o mesmo que captar o próprio objeto. Como a imagem mental não
é suficiente para satisfazer a necessidade, a pessoa é forçada a distinguir entre o
mundo mental e o mundo externo, entre a memória ou ideia objetal e a impres-
são sensorial ou perceptiva de um objeto presente. A satisfação da necessidade
exigirá associar a representação mental com a realidade física. Uma vez que o id
não distingue os conteúdos mentais, torna-se fundamental a catexis para que se
forme uma percepção realista, para que se concretize a imagem memorativa do
desejo. Deste modo, “a energia passa dos processos psicológicos puramente autís-
ticos do id para os processos ideadionais, realistas e lógicos do ego” (p. 56). Tanto
no id quanto no ego, a energia é usada para objetivos estritamente psicológicos.
Porém, se no id não existe distinção entre representação simbólica e referência fí-
sica, o ego procura fazer com que o símbolo represente a realidade com a máxima
segurança. Assim, a identificação permite que o processo secundário substitua o
processo primário e, gradualmente, pela eficiência do processo secundário em
reduzir tensões, cada vez mais formam-se catexis do ego, levando-o a estabelecer
o monopólio virtual de toda a energia disponível. Por outro lado, o ego, apossan-
do-se da energia necessária, aplica-a em diferentes propósitos que vão além da
gratificação de instintos, por meio do processo secundário.
No entanto, este monopólio é relativo, porque quando o ego não é capaz de sa-
tisfazer os instintos, o id volta a comandar. Uma vez que o id se torne ameaçador,
o ego levanta defesas contra ele. Estas defesas exigem uma energia mantenedora,
que servem também para resistir às pressões do superego.
As forças de restrição do ego são chamadas de anticatexis, distinguindo-as
das forças de impulsão ou catexis. Elas exercem a importante função de restrin-
gir a ação impulsiva e irracional do id. Parte significativa de energia é dispendida
pelo ego para tais propósitos.
Parte dessa energia é usada para elevar o nível de desenvolvimento de vários
processos psicológicos, tais como a percepção, a memória, o julgamento, a discri-
minação, a abstração, a generalização e o raciocínio.
Pode também ser deslocada para formar novas catexis de objeto, permitindo a
formação egoica de um sistema complexo de interesses, atitudes e preferências, po-
dendo não satisfazer diretamente as necessidades básicas do organismo, mas rela-
cionando-se com os objetos que satisfazem essas necessidades. Este desdobramen-
to de catexis em aplicações diretas e derivadas deve-se à plasticidade emergente da
eficiência do ego em cumprir sua tarefa primordial de gratificação dos instintos.
O mecanismo de identificação é responsável pela ativação do sistema do supe-
rego. Sua formação principia nas primeiras catexis de objeto da criança, entre as
quais encontram-se as catexis dos pais. Aparecem cedo e fixam-se porque a crian-
64 ·
crença profunda na razão não nos parece contagiante, neste final de século em
que se expõe tão cruamente as mazelas humanas. A soberania de uma razão
absoluta encontra-se estremecida em suas bases, não se autossustenta, diante
da profunda complexidade do mundo contemporâneo. A coexistência de forças
restritivas e realizativas parecem apontar para um princípio dialético que englo-
ba todas as forças, produzindo uma terceira, cujo caráter transcende o bem e o
mal, o positivo e o negativo, o possível e o impossível.
O Desenvolvimento da Personalidade
66 ·
As fases pré-genitais, oral, anal e fálica, as quais são seguidas por um período de
latência, após o qual a fase genital é definida (HALL; LINDZEY, 1973).
A fase oral
A fase anal
Comumente surge no período entre dois a quatro (02-04) anos e está relacionado
com os esfíncteres. A expulsão das fezes remove a fonte de desconforto e produz
uma sensação de alívio. Quando se dá o início do controle dos esfíncteres, por vol-
ta do 2º ano de vida, a criança tem sua primeira experiência decisiva com o con-
trole externo de um impulso instintivo. Ela aprende a adiar o prazer oriundo do
alívio das tensões anais. Métodos rigorosos de indução da criança ao controle dos
esfíncteres podem levar a um caráter obstinado e avarento, centrado em traços de
crueldade e destrutividade. Já o método que envolve elogios excessivos constitui
base da criatividade e produtividade.
A fase fálica
Transcorre entre o terceiro e quarto (03-04) ano de vida, período em que surgem
sensações sexuais e de agressividade, associadas ao funcionamento dos órgãos
genitais. Caracteriza-se por fálica porque é o período em que a criança percebe
seu pênis ou a falta de um. É a primeira consciência das diferenças sexuais. A ati-
vidade auto-erótica é acompanhada de experiências de masturbação e fantasias
da criança, encaminhando-se para o Complexo de Édipo, sendo este considerado
por Freud uma de suas maiores descobertas (HALL; LINDZEY, 1973, p. 69).
O Complexo de Édipo significa o direcionamento (catexis) da energia sexual ao
progenitor do sexo oposto e um afastamento (anticatexis) do progenitor do mes-
mo sexo. Esses sentimentos aparecem nas fantasias infantis no ato masturbatório
com e na alternância de amor e ódio em relação aos pais. A operação do Comple-
xo de Édipo domina o comportamento da criança neste período e, embora sofra a
Cristina Romualdo (2003) conta-nos que por muito tempo predominava a in-
tensa preocupação com a sexualidade e sua repressão, em que a masturbação
deveria ser evitada a qualquer custo, até mesmo com o uso de trajes adaptados
para encobrir os genitais, dificultando a prática. Segundo o filósofo francês Mi-
chel Foucault, citado pela autora, ressaltou que no século XVIII a Igreja Católica
foi cedendo, gradativamente, o seu lugar ao saber médico e o corpo humano
tornou-se objeto de novas técnicas de controle. Então, o saber dominante além
de culpabilizar pela manipulação dos próprios genitais, ameaçava com os mais
terríveis prognósticos a respeito da saúde física e mental. Romualdo lembra ain-
da que no Dicionário das Ciências Médicas, de Serrurier, considerado obra de
referência do início do século XIX, “o jovem masturbador” era descrito como um
ser de “pele terrosa, língua vacilante, olhos cavos, gengivas retraídas e cobertas
de ulcerações que anunciavam uma degeneração escorbútica. Para ele, a morte
era o termo feliz de seus longos padecimentos”.
Em síntese, a concepção de que a vida mental é a ação recíproca de forças de
68 ·
impulsão e repressão é, para Freud, a própria definição da psicanálise. Ele buscou
uma abordagem psicodinâmica, envolvendo teoria, método e procedimentos.
A psicanálise elucida o universal na experiência individual, podendo, por isso,
romper a coisificação em que as relações humanas se petrificaram (MARCUSE,
1980, p. 213). Em uma dimensão mais profunda, a abordagem freudiana, cuja base
sustentadora é biológica, tem um caráter social que deve ser desvelado, não em
uma mistificação das relações sociais, mas no âmbito de uma teoria do homem,
em dois planos: um, ontogenético, traçando a evolução do indivíduo reprimido,
desde o útero materno a sua existência social consciente e outro, filogenético, tra-
çando a evolução da civilização repressiva, desde os primórdios à civilização ple-
namente constituída (MARCUSE, 1980).
A desnaturalização do humano para Freud não é um fato transitório. Para ele,
o organismo não está direcionado para a evolução, mas manifesta-se de modo
diferenciado nos impulsos persistentes para o alívio da tensão. Há um duradouro
valor de verdade das necessidades instintivas, que devem ser dissolvidas para que
o ser humano possa expandir-se em relações interpessoais – a elucidação deste
aspecto foi o trabalho básico de Freud.
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As teorias humanistas foram construídas pela observação de pessoas com
saúde mental excelente, ou pessoas autorrealizadas, como ele as denominou. O
considerado “normal” em psicologia é na verdade a psicopatologia da média, ge-
ralmente não percebida Ele acreditava que a ciência mecanicista (behaviorismo)
estivesse limitada demais para servir como uma filosofia geral ou abrangente.
Estudaremos a Abordagem Humanista em seus dois expoentes, Abraham Ha-
rold Maslow e Carl Ransom Rogers, cuja visão humanista surgiu por meio do tra-
tamento terapêutico de pessoas emocionalmente perturbadas. Rogers desenvol-
veu, de modo semelhante ao de Maslow, o conceito de tendência atualizante, ou
seja, a tendência da pessoa em atualizar as suas capacidades e talentos.
72 ·
parte, universal na espécie.
3. É possível estudar cientificamente essa natureza interna e descobrir a sua
constituição (não inventar, mas descobrir).
4. Essa natureza interna, até onde nos é dado saber hoje, parece não ser intrin-
secamente, ou primordialmente, ou necessariamente, má. As necessidades básicas
(de vida, de segurança, de filiação e de afeição, de respeito e de dignidade pessoal,
e de individuação ou autonomia), as emoções humanas básicas e as capacidades
humanas básicas são, ao que parece, neutras, pré-morais ou positivamente “boas".
1. A visão integrada (holística) do organismo deve ser uma das principais pedras
da teoria da motivação.
2. A fome (ou qualquer outra unidade fisiológica) foi rejeitada como ponto
central do modelo para uma teoria definitiva da motivação, por ser uma unidade
somaticamente baseada e localizável, portanto é atípica na motivação humana.
3. Essa teoria deve enfatizar e centralizar-se em objetivos finais ou básicos,
em fins e não em meios para esses fins, implicando um lugar mais central para
motivações inconscientes.
4. Os desejos conscientes, específicos, locais e culturais não são tão fundamen-
tais na teoria da motivação como os objetivos mais básicos e inconscientes.
5. Qualquer comportamento motivado, preparatório ou consumatório, deve
ser entendido como um canal pelo qual muitas necessidades básicas podem ser
simultaneamente expressas ou satisfeitas. Normalmente, um ato tem mais de
uma motivação.
6. Praticamente todos os estados organísmicos devem ser entendidos como
motivados e motivadores.
7. As necessidades humanas se organizam em hierarquias de pré-potência. Ou
seja, a aparência de uma necessidade geralmente se baseia na satisfação prévia de
outra necessidade mais pré-potente. O homem é um animal perpétuo. Além disso,
nenhuma necessidade pode ser tratada como se estivesse isolada ou discreta; cada
unidade está relacionada ao estado de satisfação ou insatisfação de outras unidades.
8. A listagem de necessidades não leva a lugar algum, por vários motivos te-
óricos e práticos. Além disso, qualquer classificação de motivações deve lidar
com o problema dos níveis de especificidade ou generalização dos motivos a
serem classificados.
9. As classificações das motivações devem basear-se em metas e não em im-
pulsos ou comportamentos motivados.
10. A teoria da motivação deve ser centrada no ser humano em vez de ser
centrada em animais.
11. A situação ou campo em que o organismo reage deve ser levado em conta,
mas o campo sozinho raramente pode ser uma explicação exclusiva para o com-
portamento. Além disso, o campo em si deve ser interpretado em termos do orga-
nismo. A teoria do campo não pode substituir a teoria da motivação.
74 ·
12. Não só a integração do organismo deve ser levada em consideração, mas
também a possibilidade de reações isoladas, específicas, parciais ou segmenta-
res. Desde então, tornou-se necessário adicionar a essa outra afirmação. (MASLOW,
1943, p. 371-372, tradução nossa).
As necessidades básicas
Os indivíduos em quem certa necessidade sempre foi satisfeita estão melhor pre-
parados para tolerar a privação dessa necessidade no futuro e, além disso, aqueles
que foram privados no passado reagirão de forma diferente às satisfações atuais
do que aqueles que nunca foram privados.
Na observação de bebês e crianças, essas necessidades fisiológicas são muito
mais óbvias. Os bebês não inibem esta reação, enquanto adultos culturalmente
foram ensinados a inibi-la. Assim, mesmo quando os adultos sentem a sua segu-
rança ameaçada, talvez não observemos isto na superfície.
76 ·
Os bebês reagirão de forma total e como se estivessem em pe-
rigo, se eles são perturbados ou soltos de repente, assustados
por ruídos altos, luz intermitente ou outra estimulação sen-
sorial incomum, por manipulação brusca, por perda geral de
apoio nos braços da mãe, ou por um apoio inadequado. (MAS-
LOW, 1943, p. 377).
78 ·
grupo são exemplos de pré-condições para satisfações básicas
de necessidades. A frustração dessas liberdades será reagida
como uma ameaça ou resposta de emergência. Essas condi-
ções não são fins em si mesmas, mas são quase isso, uma vez
que estão tão intimamente relacionadas com as necessidades
básicas, sendo aparentemente os únicos fins em si mesmos.
Estas condições são defendidas porque, sem elas, as satisfa-
ções básicas são bastante impossíveis, ou pelo menos, muito
gravemente ameaçadas de extinção. (MASLOW, 1943, p.384).
Tendemos a pensar nessa hierarquia como se fosse uma ordem fixa, mas na ver-
dade não é tão rígida. A maioria das pessoas estudadas por Maslow pareciam ter
essas necessidades básicas em torno da ordem indicada, com várias exceções:
80 ·
segurança, 50 por cento em suas necessidades de amor, 40 por
cento em suas necessidades de autoestima e 10 por cento em
suas necessidades de autorrealização. (MASLOW, 1943, p.389).
• Força de vontade;
• Tolerância;
• Aptidão para resolver problemas;
• Desejo de enfrentar situações novas;
• Poder de iniciativa;
• Capacidades criativas;
• Espírito aberto;
82 ·
• Coragem para assumir riscos;
• Firmeza de caráter;
• Compreensão dos problemas;
• Autocrítica;
• Aptidão para escolher o que é importante e oportuno.
Todos esses atributos revelam nesse tipo de pessoa alto grau de maturidade emo-
cional e postura existencial que demonstra espiritualidade, conduzindo a vida
84 ·
para as dimensões existenciais mais profundas. Pessoas que se destacam no cam-
po da espiritualidade, com ações de bondade e compaixão, vivendo seus valores
transcendentais, são pessoas autoatualizadoras.
As pessoas autoatualizadoras estudadas por Maslow não eram perfeitas. Como
pessoas comuns tinham culpa, ansiedade etc. O autor, confiando nas potencia-
lidades do ser humano, revela seu otimismo ao afirmar que não existem seres
humanos perfeitos, embora possamos encontrar pessoas realmente muito boas.
Para evitar a desilusão com a natureza humana, devemos antes de mais nada
abandonar nossas ilusões a este respeito.
Maslow (1993) discute oito modos pelos quais uma pessoa se autoatualiza, res-
saltando que a autoatualização “não é apenas um estado final, mas também o
processo de atualização constante de suas potencialidades”.
86 ·
conhecimentos que, uma vez postos em prática, ajudariam a
diminuir as tensões suscitadas nas relações inter-raciais, in-
dustriais e internacionais, que se manifestam no momento
presente. Espero que se torne evidente que esses conhecimen-
tos, aplicados preventivamente, poderão ajudar no desenvol-
vimento de pessoas maduras, não-defensivas e compreensivas
que possam enfrentar de uma maneira construtiva as tensões
que se lhes depararem no futuro. Se eu conseguisse tornar pa-
tentes, para um número significativo de pessoas, os recursos
por utilizar dos conhecimentos já disponíveis no domínio das
relações interpessoais, considerar-me-ia amplamente recom-
pensado. (ROGERS, 1974, XXXIII).
Carl Ransom Rogers nasceu no dia 8 de janeiro de 1902 em Oak Park, Illinois nos
Estados Unidos da América. Aos 12 anos foi morar em uma fazenda, interessan-
do-se nessa experiência campesina por agricultura científica e borboletas notur-
nas. Influenciou-se de tal modo que, inicialmente, estudou Agricultura no Liceu
de Wisconsin, transferindo-se para o curso de história por ter estreito interesse no
estudo de religião.
Em 1922, participou de um congresso da Federação Mundial dos Estudantes
Cristãos, na China, apaixonando-se por Helen Elliot. Em agosto de 1924 estavam
casados. Da união, nasceram David Elliot Rogers (1926) e Natalie Rogers (1928).
Em 1924, já Bacharel em História, cursou dois anos o Union Theological Semi-
nary em Nova Iorque.
Em 1927, trabalhando no Institute for Child Guidance, N.Y, interessou-se pela
obra de Sigmund Freud. No ano seguinte, começou o seu trabalho em Rochester,
onde permaneceria por 12 anos.
Em 1930 desenvolveu a sua tese, tendo como tema a medição da personalidade
nas crianças, obtendo o doutoramento em 1931 na Universidade de Colúmbia.
Em 1938, criou, o Rochester Guidance Center, um centro independente de psi-
copedagogia.
Em 1940, tornou-se professor efetivo de Psicologia na Universidade de Ohio,
lecionando técnicas de tratamento e aconselhamento. Dedicou-se a atividades de
assistência social, sendo nomeado, em 1944, presidente da American Association
for Applied Psychology.
Em 1955, recebeu a medalha de prata Nicholas Murray Butler da Universidade
88 ·
decisões que surgirão de modo ainda mais livre, inclusive mudando o rumo da
vida. De modo geral, no desenrolar desse desenvolvimento, as escolhas deixam de
ser fragmentadas e passam a concorrer para a busca de uma vida plena.
Esse processo é também o processo de aceitação cada vez maior de experiên-
cias. Também de diminuição de atitudes defensivas. Quando a pessoa aceita o seu
Self real e se desenvolve, passa a ter menos medo de acontecimentos que venham
a retratar o seu Self ideal e, portanto, a diminuir a defesa dos outros porque, em
suas experiências, sente-se capaz de agir mais de acordo ao modo como o seu ego
ideal está organizado. Aumenta, notadamente, a autoconfiança.
Congruência e incongruência
Carl Rogers define “Congruência” como sendo o grau de exatidão entre a experi-
ência da comunicação e a tomada de consciência, relacionando-se às discrepân-
cias entre vivenciar e tomar consciência. O alto grau da congruência significa que
ocorre quando a comunicação (o que se está expressando), a experiência (o que
está ocorrendo em nosso campo) e a tomada de consciência (o que se está perce-
bendo) são todas semelhantes.
A incongruência, ao contrário, ocorre quando há discrepância entre a comuni-
cação, a experiência e a tomada de consciência. Esta define-se como inabilidade de
perceber com precisão e também como incapacidade de uma comunicação precisa.
Quando a incongruência está entre a tomada de consciência e a experiência,
é chamada repressão. A pessoa simplesmente não tem consciência do que está
fazendo. A psicoterapia trabalha sobre este sintoma apoiando as pessoas a se tor-
narem mais conscientes de suas ações, pensamentos e atitudes.
Quando a incongruência é uma discrepância, entre a tomada de consciência e
a comunicação, a pessoa não expressa o que está realmente sentindo, pensando
ou vivenciando. O indivíduo muitas vezes é percebido como mentiroso, inautên-
tico ou desonesto, mas nem sempre isto é verdadeiro, indicando uma inabilidade
em expressar-se ou até em tomar consciência.
Os sintomas da incongruência podem ser sentidos como tensão, ansiedade
ou, em circunstâncias mais extremas, como confusão interna. Um elevado grau
Autopercepção
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Cada indivíduo possui um campo de experiência ou "campo fenomenal" único,
contendo tudo o que se passa no organismo em qualquer momento, e potencial-
mente disponível à consciência. Inclui eventos, percepções, sensações e impactos
dos quais a pessoa não toma consciência, mas poderia tomar caso voltasse à aten-
ção para esses estímulos. Representa um mundo privativo e pessoal que pode ou
não corresponder à realidade objetiva. É o que a pessoa experimenta como seu
mundo, não na realidade comum.
O campo de experiência pessoal sofre restrições psicológicas e limitações bioló-
gicas. Geralmente, dirigimos a nossa atenção para perigos imediatos, ou experiên-
cias seguras e agradáveis, ao invés de aceitar todos os estímulos que nos rodeiam.
No campo de experiência encontra-se o Self. Este não é uma entidade estável,
embora à primeira vista pareça ser estável, porque nos detemos em parte da ex-
periência para observá-la. O Self não representa para Rogers uma acumulação de
inumeráveis aprendizagens e condicionamentos efetuados na mesma direção.
Essencialmente é uma Gestalt, ou seja, compreensão do todo para as partes, cuja
significação vivida é suscetível de mudar, sensivelmente e até de uma reviravolta,
como resultado da mudança de qualquer destes elementos. O Self significa uma
Gestalt organizada e consistente em processo constante de (trans) formar-se à me-
dida que as situações mudam.
Rogers usa o termo Self como o contínuo processo de reconhecimento. Esta
diferença, enfatizando a mudança e a flexibilidade fundamenta a sua teoria e a
sua concepção de que as pessoas são capazes de crescimento, mudança e desen-
volvimento pessoal.
Self ideal
O Self ideal é o conjunto das características que a pessoa mais gostaria de atribuir
como descritivas de si mesmo, sendo a exemplo do Self, uma estrutura móvel e
variável, redefinindo-se constantemente. A diferença entre o Self e o Self Ideal é o
grau de desconforto, insatisfação e dificuldades neuróticas. “Aceitar-se como se é
na realidade, e não como se quer ser”, indica saúde mental, também uma forma
de estar mais perto da realidade e de seu estado atual. A imagem do Self ideal,
diferenciando-se de modo claro do comportamento e dos valores reais de uma
pessoa torna-se obstáculo ao crescimento pessoal.
De modo coerente, a psicoterapia preconizada por Carl Ransom Rogers está vin-
culada à percepção do homem como pessoa, centrando o seu foco de atenção no
cliente. Naturalmente, por conceber a psique humana como saúde e bem-estar, não
seria adequado denominar “paciente” às pessoas com quem interagia. Este tipo de
terapia, centrada no cliente, dependerá da relação terapeuta-cliente e, sobretudo,
do cliente consigo mesmo. A aquisição de conhecimentos do terapeuta acerca do
seu cliente não será tão relevante quanto esta relação estabelecida entre eles.
92 ·
dente que não existem pontos fixos. Quando consigo abando-
nar-me completamente a esse processo, é claro que não pode
haver para mim nenhum sistema fechado de crenças, nenhum
campo imutável de princípios a que me agarrar. A vida é orien-
tada por uma compreensão e por uma interpretação variáveis
da minha experiência. A vida é sempre um processo de devir.
Penso que é possível agora ver claramente por que razão não
existe filosofia, crença ou princípios que eu possa encorajar ou
persuadir os outros a terem ou a alcançarem. Não posso fazer
mais do que tentar viver segundo a minha própria interpre-
tação da presente significação da minha experiência, e tentar
dar aos outros a permissão e a liberdade de desenvolverem a
sua própria liberdade interior para que possam atingir uma
interpretação significativa da sua própria experiência. Se exis-
te uma verdade, este livre processo individual deverá, assim o
creio, convergir para ela. E, dentro de certos limites, parece-me
ter sido isto o que vivi (ROGERS, 1974, p. 32).
Compreensão empática
O autor salienta a necessidade de o professor não ser repetidor dos livros de ou-
trem, oculto por uma máscara de neutralidade, sendo esta impossível. Ser o que
se é e oferecer-se desse modo verdadeiro ao estudante, generosamente, são carac-
terísticas indispensáveis de um facilitador – ou de um educador, isto é, de alguém
que assume a tarefa educativa sempre em transformação. O educador-facilitador
é alguém que está sempre educando a si mesmo.
O novo paradigma de educador-facilitador, preconizado por Rogers, tem al-
gumas demandas a fim de orientar aqueles que ousam se lançar nessa tarefa de
transformar a sua pedagogia. Não representa um modelo, mas características si-
nalizadoras que auxiliam o professor a capacitar-se, aceitar-se em suas limitações
94 ·
e transformar sua prática educativa, mesmo em contextos restritivos à prática da
educação como liberdade. Rogers (1973) lembra que "todo educador eficiente tem
o seu próprio estilo de facilitar a aprendizagem dos alunos. De certo, não há um
modo único de realizar isso" (p. 55).
As qualidades do educador-facilitador foram transferidas diretamente do mo-
delo de relação cliente-terapeuta, lembrando a compreensão empática, valori-
zando a experiência do estudante e o respeito mútuo. Vejamos a representação
desse movimento na figura 08, a seguir.
96 ·
ATIVIDADES – Unidade 3
1) Argumente com base no conteúdo estudado. Dando continuidade à intera-
tividade, escreva as suas reflexões no seu “Diário”, no Moodle:
O
caminho percorrido, correspondendo à disciplina de Psicologia da Edu-
cação I, reuniu informações importantes para o (o) professor (a) de Ci-
ências da Religião em formação e autoformação. O percurso favoreceu o
entendimento das bases filosóficas e epistemológicas da Psicologia e as relações
com a Educação. Da mesma forma, ao trazermos inicialmente as três forças em
Psicologia, estabelecemos um alicerce para os conteúdos que exploraremos em
Psicologia da Educação II. Do Behaviorismo, Psicanálise e Humanismo evoluire-
mos para a compreensão de outros paradigmas e teorias que permanecem elu-
cidativas neste Terceiro Milênio e que poderão agregar novos modos de pensar a
pessoa, seu desenvolvimento e aprendizagem. Assim, buscaremos avançar, estu-
dando autores que foram além das três forças em Psicologia.
As abordagens neobehavioristas trarão conceituações mais complexas e ela-
boradas sobre o desenvolvimento e a aprendizagem. Representam a transição
entre as abordagens Behavioristas e as Cognitivistas, incluindo aspectos não ob-
serváveis, como as intenções (motivações) e as expectativas. Uma contribuição
importante é a Aprendizagem Social ou Vicariante, de Albert Bandura. Para ele, a
aprendizagem é proveniente da interação social e da imitação. Comportamentos
ou competências são modeladas a partir: (1) das relações com os outros, median-
te a observação; (2) da imitação dos comportamentos (modelos) de outras pesso-
as ou (3) de instruções ou orientações para a produção de determinado compor-
tamento. A modelação é facilitada por aspectos afetivos e sociais, por isso não é
impingida à pessoa, pois que exige o seu consentimento.
Os psicanalistas neofreudianos foram seguidores de Sigmund Freud, no entan-
to, modificaram ou adaptaram incorporando novos pressupostos, ideias e teorias.
As ideias freudianas eram controversas em alguns pontos, embora tenha inúmeros
seguidores, concordando, por exemplo, com o conceito do inconsciente e sobre a
importância do enfoque na primeira infância. Em outros aspectos, discordaram ou
rejeitaram. Assim, estes estudiosos propuseram suas teorias exclusivas da persona-
lidade. Temos neste rol nomes, tais como Erik Erikson (Teoria Psicossocial da Per-
sonalidade); Alfred Adler (Psicologia Individual); Karen Horney (Teoria da Neurose);
Carl Jung (Psicologia Analítica); Erich Fromm (Teoria Humanística), dentre outros.
Em direção à psicologia transpessoal, anunciada por Abraham Harold Maslow
como a quarta força da psicologia, surgiu do encontro deste com Stanislav Grof
e outros importantes psicólogos nos EUA, em 1969. Esta perspectiva integra à psi-
cologia as vivências espirituais e as experiências “transpessoais”, mobilizadas em
um estado de consciência superior, de natureza transcendente, contendo todas
as experiências anteriores da pessoa. Abarca muitas escolas ocidentais de psico-
logia, bem como as tradições espirituais do Oriente e do ocidente. Seus principais
teóricos buscam construir abordagens psicológicas rigorosamente científicas,
portanto candidata a ingressar no seleto grupo das psicologias emergentes no fi-
nal do Século XX e início do Século XXI.
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Mas não nos esgotaremos aqui. Precisaremos ainda revisitar o conceito de in-
teligência e evoluirmos para o conceito de inteligências múltiplas, com Howard
Gardner. Ainda, apreendermos as ideias bioecológica de Urie Bronfenbrenner,
centradas a partir dos processos proximais e do sujeito, buscando o contexto de
desenvolvimento e o tempo transcorrido na vida individual e na vida social.
Seguiremos o caminho iniciado, tendo aguçado a nossa percepção e autoper-
cepção e também a sensibilidade para relacionar o aprendido com a educação.
A educação emerge na compreensão de que o processo de desenvolvimento hu-
mano é multidimensional e que se dá ao longo da vida; que cada indivíduo tem
o seu modo próprio de ser, mas interconecta-se com os demais seres humanos e
criaturas, influenciando e sendo influenciados. Eis o grande desafio, desde agora
apresentado aos professores e professoras em formação.
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