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Assistência Social
Autoras: Profa. Cristiane Gonçalves de Oliveira
Profa. Giselle Viegas Dantas Rodrigues
Profa. Silmara Cristina Ramos Quintana
Colaboradoras: Profa. Amarilis Tudella
Profa. Tânia Sandroni
Professoras conteudistas: Cristiane Gonçalves de Oliveira /
Giselle Viegas Dantas Rodrigues / Silmara Cristina Ramos Quintana
Assistente social graduada pela Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e pedagoga graduada pela Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). Atuante na área de serviço social, na política de assistência social, desde sua
formação. É mestra em sociologia da educação pela Universidade de São Paulo. Desde 1997 atua como assistente
social na Prefeitura Municipal de Campinas e desde 2014 é docente do curso de Serviço Social na Universidade Paulista
(UNIP), Campus Campinas.
Graduada em serviço social e mestra em serviço social, políticas públicas e desenvolvimento pela Universidade
Federal do Pará (UFPA). Especialista em gestão de políticas sociais (2019) pela UNIP. Desenvolve pesquisas nas
áreas de trabalho, direitos humanos e seguridade social. Atua como docente do curso de Serviço Social da UNIP, no
município de Campinas, São Paulo. Possui experiência profissional em ambientes corporativos e em organizações da
sociedade civil (OSCs).
Mestra em adolescentes em conflito com a lei pela Universidade Bandeirantes de São Paulo (Uniban); especialista
em psiquiatria e psicologia de adolescentes pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); especialista em
orientação e encaminhamento ao mundo do trabalho pelo Centro Brasileiro para Infância e Juventude (CBTIJ) e em psicodrama
pedagógico pela Animus. Assistente social graduada pela Faculdade de Serviço Social de Araraquara e pedagoga
graduada pela Unitelos. Atua, desde 2013, como coordenadora e professora do curso de Serviço Social da UNIP Campus
Campinas/Swift. Coordenadora do curso de pós‑graduação em Gestão de Políticas Públicas e professora‑adjunta do
curso de graduação em Serviço Social da UNIP Interativa, campus Cidade Universitária.
CDU 362
U503.47 – 19
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Bruno Barros
Juliana Muscovick
Sumário
Política Setorial - Assistência Social
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7
Unidade I
1 CONCEITUALIZAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL............................................................................................. 11
2 DA LEI DOS POBRES À SEGURIDADE SOCIAL........................................................................................ 14
3 CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMO SISTEMA AFIANÇADOR DE PROTEÇÃO SOCIAL................... 24
4 POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL............................................................................................................ 34
Unidade II
5 EIXOS ESTRUTURANTES DO SUAS............................................................................................................. 64
6 NÍVEIS DE PROTEÇÃO SOCIAL PELO SUAS............................................................................................. 79
6.1 Proteção social básica......................................................................................................................... 92
6.1.1 Cras‑Paif...................................................................................................................................................... 92
6.1.2 Serviço de convivência e fortalecimento de vínculos.............................................................. 97
6.1.3 Serviço de proteção social básica no domicílio para pessoas com
deficiência e idosas............................................................................................................................................ 98
6.2 Proteção social especial...................................................................................................................... 99
6.2.1 Creas/Paefi................................................................................................................................................101
6.2.2 Tipos de violências e violações de direitos..................................................................................106
6.3 Proteção social especial de média complexidade..................................................................116
6.3.1 Serviço especializado em abordagem social............................................................................... 116
6.3.2 Serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de liberdade assistida e de prestação de serviços à comunidade................. 116
6.3.3 Serviço de proteção social especial para pessoas com deficiência,
idosas e suas famílias......................................................................................................................................117
6.3.4 Serviço especializado para pessoas em situação de rua........................................................ 117
6.4 Proteção social especial de alta complexidade.......................................................................118
6.4.1 Acolhimento institucional..................................................................................................................118
6.4.2 Serviço de proteção em situações de calamidades públicas e de emergências.......... 123
Unidade III
7 GESTÃO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL.................................................................................130
7.1 Gestão do Suas.....................................................................................................................................130
7.2 Gestão do trabalho.............................................................................................................................132
7.3 Vigilância socioassistencial.............................................................................................................140
7.4 Instrumentos de gestão....................................................................................................................154
8 ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL............................165
APRESENTAÇÃO
Este livro‑texto visa contribuir para a formação do aluno, tendo como objetivo refletir sobre a
evolução e trajetória da política de assistência social no Brasil e seus desdobramentos para a ação
profissional dessa área.
Essa obra permitirá ao aluno o desenvolvimento dos conhecimentos acerca dos processos
históricos e políticos que conduziram à elaboração da política de assistência social, da garantia de
proteção social básica e proteção social especial (afiançada por meio da cobertura de atendimento às
necessidades do cidadão e das famílias) e do trabalho do profissional na política de assistência social.
INTRODUÇÃO
Neste livro‑texto, veremos que a política de assistência social, existente desde a primeira metade do
século passado, teve um viés atrelado à benesse e à caridade, voltada aos pobres e desajustados.
Na segunda metade do século, iniciou‑se um movimento de ruptura com o caráter benemerente, até
que, em 1988, foi reconhecida como uma política pública pela Constituição Federal, inserindo‑a no tripé
da seguridade social, juntamente com as políticas de saúde e previdência social.
Desde então, a assistência social vem trilhando uma trajetória de luta pela afirmação como uma
política social de direito para todos e dever do Estado, embora no texto constitucional ainda esteja
direcionada “para quem dela necessitar” (BRASIL, 1988, art. 203).
Em 1993, temos a promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), por meio da Lei n. 8.742,
de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da política, firmando‑a como um direito do
cidadão e dever do Estado, como política de seguridade social não contributiva, que provê os mínimos
sociais, realizada por meio de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para
garantir o atendimento às necessidades básicas – Lei n. 8.742, art. 1º.
A Loas inicia um processo de inovação da assistência social ao propor que a política seja descentralizada
e participativa. Descentralizada porque divide com estados e municípios a responsabilidade do
planejamento e execução das ações voltadas à realidade de cada local, e participativa porque envolve a
participação da população nas esferas do planejamento e controle social.
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os direitos socioassistenciais dos seus usuários. Os debates são coletivos
com participação social mais representativa, assegurando momentos para
discussão e avaliação das ações governamentais e também para a eleição
de prioridades políticas que representam os usuários, trabalhadores e as
entidades de assistência social (BRASIL, 2014a, p. 53).
Como fruto das discussões e deliberações das conferências de assistência social, concretiza‑se em
2004 a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), que regulamenta a política até os tempos atuais.
A política nacional prevê sua organização de forma intersetorial, considerando “as desigualdades
socioterritoriais, visando ao seu enfrentamento, à garantia dos mínimos sociais, ao provimento de
condições para atender à sociedade e à universalização dos direitos sociais” (BRASIL, 2014a, p. 48).
A política nacional prevê a organização do Sistema Único de Assistência Social (Suas), que atribui
ao Estado, de forma descentralizada, a responsabilidade por organizar os serviços socioassistenciais no
Brasil, tendo como parâmetro as diretrizes nacionais e as realidades socioterritoriais de cada região.
O Suas, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), prevê
um modelo de gestão participativa, com responsabilidades dos três níveis/esferas de governo (União,
estados, municípios). Para integrar o sistema, estados e municípios precisam cumprir determinados
requisitos e responsabilidades, estando assim habilitados ao Suas.
A habilitação ao Suas prevê níveis de gestão e classificação por porte populacional para os
municípios, dependendo da realidade de cada um, o que possibilita justiça em termos de repasse de
recursos. Essas classificações estão normatizadas nas Normas Operacionais Básicas – NOB/Suas de 2005
e 2012, bem como as regras para o controle social, financiamento, vigilância socioassistencial, entre
outras necessárias para a organização do sistema.
Seguindo as diretrizes da política nacional, as ações da assistência social são organizadas por tipos
de proteção e níveis de complexidade denominados proteção social básica e proteção social especial,
sendo esta de nível de média complexidade e alta complexidade.
Para que as ações possam ocorrer seguindo as diretrizes do Ministério, respeitando o comando único
das ações, foram atribuídos mecanismos de gestão que devem ser apropriados em todas as esferas
de governo, além de analisados e deliberados pelos conselhos (nacional, estadual e municipal) de
assistência social. Assim, respeitando-se a realidade socioterritorial de cada ente, cumprindo a diretriz
de descentralização e participação.
Em 6 de julho de 2011, foi promulgada a Lei n. 12.435, que implanta o Suas, conforme seu artigo 6º.
Baseando‑nos nessa trajetória, vamos nos aprofundar nos conceitos e diretrizes da política de
assistência social.
Nesse sentido, a política de assistência social representa a garantia de um direito social consolidado
na Constituição Federal e é considerada de extrema importância para o fazer profissional do assistente
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social, uma vez que compõe um dos maiores espaços sócio‑ocupacionais de sua atuação e que a sua
operacionalização requer uma articulação intersetorial com as demais políticas públicas.
A primeira parte será voltada para a contextualização histórica da política de assistência social, bem
como a apresentação da Loas, da PNAS e do Suas. Em seguida, serão apresentadas as configurações dos
serviços socioassistenciais e dos programas de transferência de renda e cidadania. Nesse sentido, serão
abordados os serviços, programas, projetos e benefícios que compõem a política de assistência social,
detalhando as proteções sociais: básica e especial de média e alta complexidade e as especificidades
que as envolvem. Por fim, discorrerá sobre a gestão do trabalho no Suas e o trabalho do profissional na
política de assistência social. Essa discussão permitirá maior compreensão dos limites e possibilidades
da gestão, do financiamento e dos conceitos de vulnerabilidade e risco social no contexto da assistência
social e a intervenção das equipes do profissional.
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POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Unidade I
Será realizado um estudo da trajetória da política de assistência social no Brasil, iniciando pela
conceituação de política social e a constituição da seguridade social, seguidos pela apresentação dos
principais marcos regulatórios, bem como: a Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), a Política Nacional
de Assistência Social (PNAS) e o Sistema Único de Assistência Social (Suas).
A política de assistência social é considerada uma política social criada pelo Estado, enquanto
representante dos interesses entre as classes sociais, como um mecanismo para mediar os conflitos
econômicos, sociais e políticos da sociedade, assim como para incorporar as reivindicações das classes e
regulamentar os direitos constituídos em lei.
Dessa forma, é preciso compreender o que são políticas sociais. De acordo com Pereira (2009),
a política social é considerada como uma categoria acadêmica e política, de contribuição teórica e
prática, que não apenas se dispõe a conhecer e a explicar o mundo real, mas também de agir e de
promover melhorias no contexto social vivido. Ou seja, entende‑se que as políticas sociais são um
meio de concretizar direitos sociais e necessidades humanas (leia‑se sociais) na perspectiva de uma
cidadania ampliada.
A existência de várias conceituações inconsistentes sobre política social afeta tanto a credibilidade
e a razão de ser da política quanto à própria vida em sociedade. Como exemplos de utilização
equivocada do termo, tem‑se a de Hitler na Alemanha nazista, em que denominou de política social
os experimentos criminosos em “enfermos, doentes mentais, judeus e outros grupos étnicos, com a
finalidade de submetê‑los a investigações médicas, esterilizá‑los e enviá‑los à câmara de gás” (TITMUSS,
1981 apud PEREIRA, 2009, p. 45).
Saiba mais
11
Unidade I
De acordo com Pereira (2009), um dos motivos que tem levado à dificuldade para estabelecer uma
conceituação gnosiológica – parte da filosofia que estuda o conhecimento humano – do termo se
dá por causa de a política não ser neutra. Dessa maneira, todo ensaio de conceituação estaria entranhado
por ideologias, valores e perspectivas teóricas competitivas. Portanto, é preciso eleger uma perspectiva
teórica que embase a compreensão de política social, e para o serviço social é pertinente analisá‑la sob
a perspectiva dialética, considerando a política social como um produto da contradição que envolve
as relações antagônicas entre capital e trabalho, Estado e sociedade e os princípios da liberdade e
igualdade que regem os direitos de cidadania.
Contudo, ao se tornar uma disciplina acadêmica, a política social ganhou corpo teórico‑metodológico
e se inscreveu no âmbito das chamadas ciências sociais, rompendo com a concepção de administração
social. Assim, “política social e administração caminham juntas, mas não significam a mesma coisa”
(PEREIRA, 2009, p. 170). A principal diferença reside no fato de que a política social contém uma tomada
de decisão pautada na representação de interesses, enquanto a administração das ações políticas visa
garantir sua eficácia e eficiência (LAFER, 1978 apud PEREIRA, 2009).
A fim de promover subsídios para caracterização das políticas sociais, importa acrescentar que essas
podem ser do tipo pública e/ou privada, de natureza emancipatória e/ou compensatória e de abrangência
universal, segmentada e/ou fragmentada. Conforme o disposto a seguir:
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POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Observa‑se que política significa princípios para ação e social qualifica o tipo de ação. Assim, quando
desenvolvida pelo Estado, é caracterizada como pública e, quando por entidades privadas, como privada.
Para este tema, importa compreender a política social de assistência social do Brasil enquanto uma
política pública de proteção social. Para Pereira (2009), há de se ressaltar que a política social do tipo
pública consolida uma ação que se propõe a atender as necessidades sociais cuja resolução ultrapassa a
iniciativa privada, individual e espontânea, e requer decisão coletiva regida por princípios de justiça social.
De um lado, as políticas sociais públicas precisam ser amparadas por leis impessoais e objetivas,
garantidoras de direitos, e por isso está relacionada ao Estado – governos, políticas e aos movimentos
da sociedade, assim como pelos indivíduos, grupos, profissionais, empresários, trabalhadores e outros
segmentos sociais que tentam influir na sua constituição.
Por outro lado, as políticas privadas podem ser desenvolvidas por empresas e organizações privadas,
tanto de forma interna para os seus funcionários quanto de forma externa para a comunidade. Ademais,
visam promover melhorias sociais que não necessariamente estejam preconizadas no texto da lei, que
vão atender a um público‑alvo específico.
A natureza das políticas sociais pode ser emancipatória, envolvendo a implementação de ações que
visam promover a resolução de uma situação problema a longo prazo. Enquanto as compensatórias são
ações que requerem resultados mais imediatos, portanto, se propõem a resolver situações problemas de
forma temporária e a curto prazo.
As políticas sociais também podem ter abrangências diferenciadas: a universal é destinada a todos os
cidadãos, com caráter universal e totalizante; a segmentada é caracterizada por um fator determinado
(idade, gênero, raça etc.); e a fragmentada é destinada a grupos sociais dentro de cada segmento
(crianças, idosos, mulheres etc.)
No atual contexto de políticas sociais com inspiração neoliberal, as políticas estão servindo como
um instrumento de funcionalização da pobreza. Na concepção de Almeida (2004), as políticas sociais
segmentadas e fragmentadas são caracterizadas como políticas focalizadas, e quando o Estado neoliberal
implementa políticas de assistência social focalizadas no tratamento da pobreza, está realizando
políticas de cunho assistencialista, como os programas de transferência de renda para pessoas pobres,
forjando assim o atendimento aos direitos de cidadania. Essa seletividade vai de encontro ao conceito
de universalização dos direitos, atuando ainda como um instrumento de repressão social.
Ademais, está ocorrendo uma redefinição do significado de serviço público e a destruição da civilização
pautada na igualdade de direitos, pois em nome da racionalidade e eficiência, o Poder Público tem se
transformado em um bem privado, e uma das estratégias para isso é a depreciação do serviço público,
13
Unidade I
tornando a privatização uma saída que se apresenta como vantajosa. Tal fato concorre para a defesa da
reforma do Estado, preconizando a redução da sua intervenção no âmbito social e consolidando uma
tendência tecnocrática pautada na privatização dos serviços de – até então – caráter público, bem como
o processo de terceirização dos serviços socioassistenciais. Desse modo, a separação do público e do
social é da maior importância para omitir o sentido governamental da ação política, para despolitizá‑la
por meio da naturalização da pobreza e assim justificar o seu caráter compensatório (ALMEIDA, 2004).
Saiba mais
Por fim, é de maior importância resgatar o sentido do público por meio de uma leitura crítica da
prática cotidiana do fazer profissional, com uma metodologia de intervenção que considere e contribua
para a ampliação da cidadania e para a universalização da política de assistência social no Brasil.
Após compreender em que consiste a política social e quais as suas principais características, importa
apresentar como se deu o tratamento das necessidades sociais ao longo dos anos, e como se consolidou
a atual política de assistência social no Brasil.
Sobre esse assunto, Behring e Boschetti afirmam que “não se pode indicar com precisão um
período específico de surgimento das primeiras iniciativas reconhecíveis de políticas sociais” (BEHRING;
BOSCHETTI, 2010, p. 47) no Brasil.
14
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Saiba mais
As primeiras leis que regulamentaram a intervenção estatal sob as necessidades sociais e que podem
ser consideradas como as origens da política social de assistência social ocorreram na Inglaterra. Conforme
Behring e Boschetti (2010, p. 48), cronologicamente, tem‑se a promulgação das seguintes leis:
Importa ressaltar que todas essas leis eram conservadoras e, a despeito do conceito de política
social protetiva que se tem hoje, as primeiras políticas partiam de uma perspectiva repressiva e punitiva,
culpabilizando os indivíduos pela situação em que viviam. Dessa forma, a Lei dos Pobres de 1601, criada
pela rainha Elizabeth, repassava para as paróquias a responsabilidade de assistir aos pobres.
15
Unidade I
uma revisão da Lei dos Pobres (1834), na qual o Estado liberal entende que a distribuição de auxílio
aos pobres estimula a reprodução da pobreza. Assim, a questão social passa a ser um caso de polícia, a
pobreza é criminalizada e a mendicância nas cidades proibida.
Os pobres passaram a ser classificados entre capazes de trabalhar, obrigados a pagar com o próprio
trabalho pelo auxílio recebido, e incapazes (idosos, doentes, deficientes, entre outros), considerados
merecedores da atenção plena do Estado por meio de asilos, abrigos etc. Tal lei obrigava todos os que
recebiam auxílio social a aceitarem qualquer trabalho, sendo que aqueles que se recusavam a trabalhar
eram castigados e poderiam até ser condenados à pena de morte.
Polanyi afirma que o princípio estruturador dessas leis era obrigar o exercício
do trabalho a todos que apresentassem condições de trabalhar, e as ações
assistenciais previstas tinham o objetivo de induzir o trabalhador a se
manter por meio de seu trabalho. Os critérios para acesso eram fortemente
restritivos e seletivos e poucos conseguiam receber os benefícios. Os
pobres “selecionados” eram obrigados a realizar uma atividade laborativa
para justificar a assistência recebida (POLANYI, 2000; CASTEL,1922 apud
BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 48‑49).
Até o século XIX, a política social era tratada mais sob a perspectiva da administração social da pobreza,
sob os princípios da eficiência e da eficácia, uma vez que o Estado liberal preconizava a ampliação dos
investimentos no âmbito financeiro, e deveria deixar a mão invisível do mercado regular os problemas
sociais. Em uma análise do Estado no período do liberalismo, as autoras Behring e Boschetti (2010) o
resumem pelas seguintes características:
I – predomínio do individualismo;
16
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Lembrete
No Brasil, esse processo ocorreu de maneira um pouco diferente, pois por se tratar de uma realidade
capitalista periférica, não acompanhou o mesmo ritmo histórico de desenvolvimento dos países capitalistas
centrais, sendo considerado um país com características de desenvolvimento desigual e combinado.
Saiba mais
17
Unidade I
Isso se deve ao fato de que a formação social da classe trabalhadora brasileira teve algumas
particularidades, bem como ter sido constituída majoritariamente por ex‑escravos que tiveram
dificuldades de se inserirem no mercado de trabalho, e por colonos europeus degradados que já tinham
vivido o processo de industrialização nos seus países de origem e estavam mais capacitados para assumir
os postos de trabalho nos grandes centros urbanos. Porém, nota‑se que “não houve no Brasil escravista
do século XIX uma radicalização das lutas operárias, sua constituição em classe para si com partidos e
organizações fortes” (BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 78). A abolição da escravidão ocorreu por motivos
externos, como a necessidade de expansão do capital e do uso do trabalho livre e assalariado para o
desenvolvimento das forças produtivas.
Para Iamamoto e Carvalho (2003), fazia‑se necessário a organização dos trabalhadores em resistência
à exploração e na luta por direitos, como única via possível de uma participação ativa na sociedade,
assim, haviam:
• caixas beneficentes;
• ligas operárias;
• sindicatos;
Os primeiros sindicatos foram formados no início do século XX e contavam com a influência dos
trabalhadores imigrantes que contribuíram para a politização e organização da classe trabalhadora
brasileira. O fortalecimento dos movimentos sindicalistas contribuiu para o aumento da pressão social
coletiva e forçou o Estado a assumir para si a responsabilidade em relação ao tratamento da questão
social no Brasil.
Saiba mais
MAUÁ, o imperador rei. Dir. Sérgio Rezende. Brasil: Lagoa Cultural &
Esportiva, 1999. 135 minutos.
18
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Nessa mesma perspectiva, Otto Von Bismarck, na Alemanha, desenvolve um sistema de compensação
de renda para os trabalhadores por meio das caixas de seguro‑saúde, caixas de aposentadoria, entre
outras, consagrando uma política social que ficou conhecida como modelo bismarckiano de seguro
social. Em síntese, tem‑se que:
Saiba mais
Para Pereira (2011), a legislação do seguro social inaugurada na década de 1880, também conhecida
como socorro paliativo, consolidava o “reconhecimento das autoridades públicas de que a pobreza no
capitalismo era produto do próprio desenvolvimento predatório do sistema” (PEREIRA, 2009, p. 60),
ou seja, a preservação do sistema dependia de ações de proteção do trabalhador contra as perdas
decorrentes de contingências sociais (doença, acidentes, envelhecimento, entre outros).
Enquanto o modelo bismarckiano de seguro social era destinado a algumas categorias da classe
trabalhadora que contribuíam com o sistema de seguros sociais, de acordo com Pereira (2009) embora
tivesse estabelecido “esquemas de pensões, de saúde e de seguro‑desemprego, não impedia que milhões
de pessoas permanecessem na pobreza e ainda se submetessem aos humilhantes e degradantes testes
e meios para obter assistência pública” (PEREIRA, 2009, p. 93).
Em 1942, é lançado na Inglaterra, por William Beveridge, uma nova proposta de política social
denominada de Relatório Beveridge sobre Seguro Social, mais conhecido como Plano Beveridge, o qual
apresentava um conceito ampliado de seguridade social, que deu origem ao Welfare State e que iria
propor uma revisão da proteção social da Inglaterra.
19
Unidade I
O grande diferencial desse modelo de seguridade social consiste no fato de ser uma proposta
nacional, unificada e com um eixo distributivo ao lado do contributivo, e eliminava os testes estabelecidos
pelo modelo anterior. O modelo beveridgiano prometia combater cinco gigantes: ignorância, sujeira,
enfermidade, preguiça e miséria (PEREIRA, 2009).
Destarte, na passagem para o século XX, o capitalismo assume uma condição monopolista marcada pela
produção fordista/keynesiana, com profundas alterações políticas e econômicas (entre elas, a crise de
1929) que fizeram com que o Estado mudasse sua postura em relação ao enfrentamento da questão social,
incorporando as reivindicações da classe trabalhadora urbano‑industrial e entendendo a pobreza como um
problema decorrente da má distribuição de renda e do precário desenvolvimento social e econômico.
Conforme Pereira (2009), esse período foi marcado pela concepção política de Estado ampliado,
defendida por John Maynard Keynes, de que o equilíbrio econômico não é autorregulado pelo mercado,
como propunham os liberais. Assim, ele defendia a intervenção estatal como um agente externo ao
mercado, com a finalidade de garantir o equilíbrio econômico e social.
Com a crise capitalista, a pressão dos trabalhadores por melhorias sociais e a ameaça socialista do
pós‑segunda guerra mundial, o Estado passou a implementar uma série de políticas sociais. Esse período,
segundo Montaño (2012), marca a responsabilização do Estado no tratamento da questão social, pois a
pobreza deixa de ser considerada como culpa do indivíduo e passa a ser considerada como um caso de
política. A transição para o Estado social nada mais é senão uma estratégia capitalista para inibir os conflitos
e o descontentamento da classe trabalhadora por meio da institucionalização das necessidades sociais.
A solução para a pobreza gerada no pós-crise 1929 estaria no investimento em políticas sociais de
pleno emprego, sob um sistema que ficou conhecido como o Estado de Bem‑Estar Social (Welfare State)
entre os anos de 1945‑1975, posto que se as pessoas tivessem empregos, logo teriam condições de
satisfazer suas necessidades sociais, diminuindo os problemas sociais a serem enfrentados pelo Estado.
Segundo Montaño, o Estado social precisaria intervir fundamentalmente nos seguintes aspectos:
Lembrete
Na concepção de Behring e Boschetti (2010), não ocorreu necessariamente uma transição entre
o Estado liberal e o Estado social, uma vez que ambos reconhecem a assistência social como um
direito, sem colocar em pauta a gênese da questão social que está nos fundamentos do capitalismo.
Dessa forma, apesar de a história sinalizar uma transição para o Estado social, o que ocorre é apenas
a incorporação de orientações sociais democratas em um novo contexto socioeconômico de luta de
classes. Assim, há uma unanimidade entre os autores ao situar o final do século XIX como o marco da
atuação do Estado capitalista por meio de políticas sociais mais amplas, planejadas, sistematizadas e
de caráter obrigatório.
Para melhor compreensão do tema estudado até aqui, segue um quadro resumo condensando as
principais ações do Estado de combate à pobreza, ao passo que a assistência social transita da caridade
a um direito social, e a política pública de proteção social caracterizada como política de assistência
social vai se consolidando.
Cultura da pobreza
Em relação à cronologia histórica de legislações que deram origem à política de assistência social
brasileira, Behring e Boschetti (2010) pontuam que até dois anos antes da Proclamação da República
(1889) não existia nenhuma legislação social, e posteriormente, tem‑se o seguinte:
21
Unidade I
• 1889: Direito à pensão e a 15 dias de férias (para funcionários da imprensa nacional e ferroviários).
• 1923: Lei Eloy Chaves – Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) para ferroviários.
Nesse sentido, a implementação da Lei Eloy Chaves é considerada um marco da formação da política
social brasileira, visto ter sido a primeira do país a institucionalizar a previdência social, que serviu de
base para a futura política de seguridade social.
A introdução da política social brasileira ocorre durante o Estado Novo, entre os anos de 1930 a
1940, período pós‑crise que fez com que ampliasse a intervenção estatal no tratamento das expressões
da questão social. Tal fato marcou a dinâmica de desenvolvimento das políticas sociais, transitando da
caridade para o direito, sob uma perspectiva política mais universalizante.
No fim da década de 1930, o presidente Getúlio Vargas passou a implantar diversos programas de
assistência aos problemas sociais, prática comum nos governos desse período, e que ficou conhecida como
assistencialismo. Para Iamamoto e Carvalho (2003), a primeira legislação brasileira que responsabiliza o
Estado pelo atendimento e amparo aos pobres é a Carta Constitucional de 1934.
Assim, nota‑se que a política de assistência social começa a ser desenhada na década de 1940, com
a criação da LBA, a qual inicialmente era voltada para o atendimento das famílias dos convocados para a
guerra e, posteriormente, voltou‑se ao atendimento da população carente em geral, atuando como
uma instituição de organização e articulação da assistência social brasileira.
Importa ressaltar que no final dos anos 1940 é criada a teoria de Marshall, acerca dos direitos de
cidadania e dos serviços sociais públicos. Desse modo, conforme Pereira (2011), a cidadania é composta
por três grupos de direitos:
22
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Assim, pela concepção de Marshall, os direitos sociais se referem ao bem‑estar social e econômico
dos indivíduos, que nessas circunstâncias possuem capacidade plena de exercer a sua cidadania e só
assim serem considerados como cidadãos de direito.
Observação
• 1969: Decreto‑lei n. 593 que transforma a LBA em uma fundação vinculada ao Ministério do
Trabalho e Previdência Social.
Observação
Conforme Barbosa, do Estado Novo até a publicação da Constituição Federal de 1988, a assistência
social brasileira esteve vinculada a práticas clientelistas, ligadas à filantropia, por meio de intervenções
fragmentadas e descontinuadas.
Saiba mais
Para saber mais sobre a realidade das famílias que viviam em uma
periferia brasileira nos anos de 1960 a 1980, assista:
CIDADE de Deus. Dir. Fernando Meirelles. Brasil: O2 Filmes, 2002. 130 minutos.
Conforme seu artigo 3º, constituem‑se objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: a
construção de uma sociedade livre, justa e solidária; garantia do desenvolvimento nacional; erradicação
da pobreza e da marginalização e redução das desigualdades sociais e regionais; promoção do bem de
todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação
(BRASIL, 1988).
Na emenda de 2010 da Constituição, o artigo 6º apresenta como direitos sociais a educação, a saúde,
a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade
e à infância e a assistência aos desamparados (BRASIL, 1988).
24
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
[...] por meio do qual a sociedade proporcionaria a seus membros uma série de
medidas públicas contra as privações econômicas e sociais. Sejam decorrentes
de riscos sociais – enfermidade, maternidade, acidente de trabalho,
invalidez, velhice, morte, sejam decorrentes das situações socioeconômicas
como desemprego, pobreza ou vulnerabilidade, as privações econômicas e
sociais devem ser enfrentadas, pela via da política da seguridade social, pela
oferta pública de serviços e benefícios que permitam em um conjunto de
circunstâncias a manutenção de renda, assim como o acesso universal à
atenção médica e socioassistencial (JACCOUD, 2009, p. 62).
Composto pelo tripé da seguridade social, o sistema de proteção social proposto pela Constituição é
formado pela articulação das políticas sociais de saúde, previdência social e assistência social.
25
Unidade I
Lembrete
A política de previdência social está organizada nos parâmetros do sistema de proteção social
contributiva, ou seja, são segurados somente os trabalhadores formais, que contribuem mensalmente
com valores incidentes sobre a remuneração. Atualmente, há também as categorias de contribuinte
individual, destinada aos trabalhadores autônomos ou de caráter eventual, ou seja, que exercem
atividades de forma não contínua e esporádica, sem subordinação e horário; e contribuinte facultativo,
destinada às pessoas maiores de 16 anos de idade que não exerçam atividades remuneradas que as
enquadre como segurado obrigatório da previdência social.
Já a assistência social se insere na qualidade de proteção social não contributiva, ou seja, independe
de contribuição prévia à seguridade social e, segundo art. 203 da Constituição, será prestada a quem
dela necessitar, tendo como objetivos:
26
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Cabe ressaltar que a introdução da política de assistência social no eixo da seguridade social, na
Constituição Federal, em 1988, ocorreu “mais pela decisão política do grupo de ‘transição democrática’
da denominada Nova República, período que marcou a passagem do final da ditadura militar
ao processo constituinte e reconstrução institucional do Estado de Direito”, que “analisou e propôs
a gestão da previdência social expurgada do que não era, stricto sensu , seguro social”; ou seja, a
“constituição político‑institucional da assistência social na seguridade social se deu pela negativa,
isto é, passou a ser campo de assistência social, o que não era da previdência social por não ser
benefício decorrente de contribuições prévias”. Dessa forma, a “introdução da função assistência
social como política de seguridade social não resultou de um processo político pela ampliação do
pacto social brasileiro” (SPOSATI, 2007, p. 445‑446).
No entanto, não se pode negar que o rebatimento dessa questão repercute na introdução de uma
nova concepção para essa política, que implica uma mudança de postura dos órgãos executores públicos,
principalmente após a implantação do Suas.
Embora, no início, ela tenha sido definida genericamente como “proteção à vida e à cidadania”,
isso já trouxe à tona a questão da discussão sobre o direito social e a universalidade de acesso. Porém,
muitas vezes, sua atuação tenha tomado o caráter de política complementar, e a redação do art. 203 da
Constituição Federal de 1988, “a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade
social” possibilite uma interpretação reducionista voltada às pessoas sem poder econômico, embora
pudéssemos analisar também que, “independente da contribuição”, nos remete à discussão sobre a
universalidade de acesso e direito social (ARAÚJO, 2009).
Dado o histórico conceitual da assistência social em nosso país, a tendência é a interpretação baseada
na primeira alternativa. Como analisa Nozabielli:
Entretanto, para efeito deste estudo, iremos nos orientar quanto à segunda interpretação descrita
anteriormente, ou seja, aquela relacionada à universalidade de acesso e direito social. Nesse sentido,
o reconhecimento da assistência social como política pública e dever do Estado propõe a ruptura
dos paradigmas e concepções conservadoras de caráter benevolente e assistencialista, prevendo a
garantia de financiamento com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195,
a descentralização político‑administrativa para estados e municípios, no que tange à coordenação e
execução dos programas, cabendo à esfera federal a coordenação e as normas gerais, segundo art. 204,
inciso I, e a participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das
políticas e no controle das ações em todos os níveis, segundo o inciso II (BRASIL, 1988).
27
Unidade I
Portanto:
Desse modo, vai se delimitando o conceito de proteção social no âmbito da assistência social, como
consequência da política pública de alcance mais amplo:
Desse modo, “a política de assistência social, enquanto mediação entre Estado e sociedade,
é determinada pela relação entre as forças sociais e políticas na qual se funda e que repercute na
28
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
legitimidade do seu estatuto de política pública” (ARAÚJO, 2009, p. 41), principalmente por se tratar de
uma política não contributiva.
Segundo Sposati:
Importante não esquecer que a assistência social se instala em um campo social constituído por
iniciativas históricas advindas da compaixão, do altruísmo e de práticas religiosas voltadas ao exercício
do amor ao próximo e à caridade. Portanto, o primeiro desafio que é colocado para essa política se situa
na separação do campo público e as práticas privadas, para depois reconstruir novas formas de relação
entre um e outro (ARAÚJO, 2009). Nesse sentido, a assistência social não se desvinculou totalmente do
antigo caráter de benemerência.
As práticas privadas são, por natureza, individualizadas, já que se vinculam às missões estatutárias
de suas organizações e são dirigidas a algumas pessoas ou grupos. A ação pública, por seus princípios,
29
Unidade I
Essa redefinição vem sendo reiterada, desde então, nas legislações que norteiam as diretrizes da
política (Loas – Lei n. 8.742 de 1993, PNAS de 2004, Lei n. 12.435 de 2011, que altera a Lei n. 8.742).
Afirmar a existência de um campo de proteção social não contributiva e incluí‑lo sob a égide da
responsabilidade estatal significa aceitá‑lo como domínio da gestão pública, ou seja, uma área da ação
estatal de responsabilidade dos três entes federativos.
A promulgação da Loas formaliza a assistência social como política pública, reitera as diretrizes
propostas em 1988, pela Constituição Federal, como a descentralização político‑administrativa para
os estados, o Distrito Federal e os municípios; comando único das ações em cada esfera de governo;
a participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e
no controle das ações em todos os níveis; e a primazia da responsabilidade do Estado na condução da
política de assistência social em cada esfera de governo (BRASIL, 1993).
Em relação ao financiamento, previsto no art. 28 da Loas, será constituído com recursos da União,
dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, das demais contribuições sociais previstas no art. 195
da Constituição Federal, além daqueles que compõem o Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS).
Observação
Saiba mais
Vimos até aqui que o gestor público deve deslocar sua preocupação da ação dos processos de ajuda
às entidades sociais e se responsabilizar diretamente por criar soluções e respostas às necessidades de
proteção social da população. Sendo assim, cabe definir no que se constitui afinal a proteção social.
O sentido da palavra proteção (protectione, do latim) supõe defesa de algo, amparo, socorro, apoio,
guarda. Remete à ideia de preservação, de impedimento e de segurança. A partir desse conceito, a
política de assistência social preconiza e afiança seu sistema de proteção social, na garantia da segurança
necessária à sobrevivência, rendimento, autonomia, acolhida, convívio e vivência familiar e comunitária.
Sposati complementa:
O resultado desse processo foi a materialização da construção coletiva do redesenho dessa política,
proposto pela PNAS de 2004, na perspectiva de implementação do Suas, fruto do cumprimento das
deliberações da IV Conferência Nacional de Assistência Social, realizada em Brasília, em dezembro de
2003. Em 23 de junho de 2004, o MDS, por intermédio da Secretaria Nacional de Assistência Social
(SNAS), apresentou a versão preliminar do texto, que foi:
Um dos requisitos da proteção social a que ela está relacionada faz menção aos conceitos de
prevenção, base da sua atuação nos territórios de vulnerabilidade. Portanto, podemos entender que:
A condição de estar protegido significa, segundo Sposati (2007), ter uma capacidade de
enfrentamento e resistência para impedir que as agressões, precarizações ou privações da vida e das
relações estabelecidas entre os pares deteriorem nossa condição de cidadão, sujeito de direitos, ser
humano, porém, “estar protegido não é uma condição inata, ela é adquirida não como mera mercadoria,
mas pelo desenvolvimento de capacidades e possibilidades” (SPOSATI, 2007, p. 17).
A PNAS define como público usuário da assistência social cidadãos e grupos que se encontram em
situações de vulnerabilidade e riscos, tais como:
Analisamos, assim, a partir dos estudos de Oliveira (1995, apud ARAÚJO, 2009), que a vulnerabilidade,
ainda que deva ser a base material para seu mais amplo enquadramento, é insuficiente e incompleta, porque
não especifica as condições pelas quais se ingressa no campo dos vulneráveis, existindo outras
situações para além da ausência de renda que atingem os grupos étnico‑raciais, as mulheres, os grupos
indígenas, os trabalhadores rurais, os nordestinos, entre outros. Dessa forma, os autores citados situam
as vulnerabilidades sociais no campo das relações sociais, e suas compreensões devem perpassar “pela
ação de outros agentes sociais e que devem ser enfrentadas por meio das políticas públicas, sendo
fundamental situá‑las no campo dos direitos, como diz Oliveira, ‘retirando‑as da conceituação de
carências’” (ARAÚJO, 2009, p. 55).
Para concluir, Araújo (2009) ressalta que as respostas à totalidade das demandas não são de exclusiva
atribuição da assistência social.
33
Unidade I
Trata‑se, portanto, de uma política que visa promover a seguridade social de todo cidadão brasileiro,
e que pode ser entendida como um amplo sistema de proteção social, o qual deve ser implementado de
maneira intersetorial e com equipes de atendimento interdisciplinares.
Em seguida, foi preciso aguardar mais onze anos até a consolidação da PNAS no ano de 2004, a
qual foi sequenciada em 2005 pelo Suas. Em uma linha cronológica, tem‑se que a política de assistência
social brasileira foi consolidada a partir das seguintes (principais) conquistas:
1988 - Política
de Seguridade
Social na CF/88
Conforme exposto, a assistência social rompeu com o viés caritativo e filantrópico ao se tornar um
direito social pautado na Constituição Federal da República Brasileira. Tal fato consagrou a instituição
de uma política social de proteção social aos cidadãos, a partir de uma perspectiva de seguridade social
ampliada e de responsabilização do Estado pelo tratamento das desigualdades sociais.
Lembrete
34
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Em 6 de julho de 2011, o Suas se materializa efetivamente, por meio da Lei n. 12.435, que altera
a Loas, Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993, dispondo sobre a organização da assistência social a
partir de então.
Com a Lei n. 12.435, de 2011, sofre alteração conforme apresentado a seguir, em que os incisos I, II
e III têm nova redação, e no inciso I as alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, e “e” são incluídas.
Assim, passa a ser objetivo da assistência social, conforme art. 2º da Lei n. 12.435:
35
Unidade I
III – a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos direitos no
conjunto das provisões socioassistenciais.
O art. 4º da Loas apresenta os princípios dessa política, que serão abordados posteriormente:
Seu art. 5º apresenta as diretrizes da política de assistência social, regulamentando seu direcionamento
e instrumentais, na perspectiva das legislações especificas dessa política: a Loas, a PNAS e o Suas. Nesse
sentido, tem‑se o seguinte:
I – descentralização político‑administrativa para os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios, e comando único das ações em cada esfera de governo;
Trata‑se, sobretudo, de uma política social do tipo pública, que visa garantir a proteção social
de frações da classe trabalhadora que se encontram em situação de vulnerabilidade e risco social e
necessitam da intervenção do Estado para garantir as condições básicas de bem‑estar social.
36
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
A elevação da assistência social como um direito vem avançando e amadurecendo ao longo de três
décadas. A análise cronológica das principais conquistas normativas permite uma melhor visualização
desse processo, conforme o disposto abaixo:
• 1993: Loas.
• 2004: PNAS.
Ante ao exposto, o aluno pode vir a se questionar, mas dentro desse contexto da assistência social:
“o que é a Loas?”; “o que é a PNAS?”; “o que é o Suas?”; “qual a diferença entre esses instrumentos
normativos?”. Assim, apresenta‑se um quadro síntese que demonstra a processualidade dos
instrumentais da política de assistência social brasileira.
Conforme o disposto na figura acima, a principal diferença entre cada normativa consiste no fato
de que:
II – a Loas vai regulamentar a política de assistência social, estabelecendo normas e critérios para a
sua organização, e cria o CNAS;
III – a PNAS é o documento que estabelece os princípios e diretrizes para a implementação do Suas;
IV – o Suas são as diretrizes que vão organizar as ações da política social de assistência e cria a
Norma Operacional Básica (NOB/SUAS).
37
Unidade I
Considerada uma política de assistência social nos dias atuais, levando em conta que em 6 de julho
de 2011, o Suas se materializa efetivamente por meio da Lei n. 12.435, que altera a Loas, Lei n. 8.742,
dispondo sobre a organização da assistência social a partir de então.
A PNAS, publicada em 2004, e a NOB/Suas, de 2005, afirmam que a proteção social a ser assegurada
pela política de assistência social:
Quando se fala em riscos no âmbito da política de assistência social, sendo fundamental delimitar
o que precisa ser entendido como situação de risco social no âmbito desta política, e em quais
circunstâncias se dão suas ocorrências, uma vez que a sociedade capitalista pós-moderna está vulnerável
38
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
às consequências das ações humanas e ambientais e, portanto, a compreensão sobre o conceito de risco
deve permear toda a leitura da realidade do tecido social.
Para a delimitação da abrangência da política de assistência social, Sposatti caracteriza “os riscos
sociais a serem enfrentados pela política de assistência social conforme a natureza do ciclo de vida, a
dignidade humana, e a equidade” e afirma que “aprofundar essas dimensões permite a oferta de serviços
apropriados para responder a tais situações reduzindo danos e restaurando vidas” (SPOSATTI, 2009, p. 33).
A partir dessa caracterização de risco, se apresenta um conteúdo substantivo, um adjetivo e outro temporal.
Perceba que no art. 2º da Loas, conjuntamente com a noção de riscos sociais, aparece a noção de
vulnerabilidade social, a qual se entende como sendo a materialização das situações decorrentes da:
Perceba que a “vulnerabilidade social não é só econômica, ainda que os de menor renda sejam mais
vulneráveis pelas dificuldades de acesso aos fatores e condições de enfrentamento a riscos e agressões
sociais” (SPOSATI, 2009, p. 34).
Sposati (2009) afirma que a vulnerabilidade, assim como o risco, também tem processos de agravos
e que pensar a política de assistência social abrangendo os mais e os menos vulneráveis significa pensar
nas pessoas e/ou grupos mais e menos sujeitos a um risco, ou naqueles a serem mais, ou menos, afetados
quando a ele expostos. Nesse sentido, cabe identificar etapas de agravamento das situações: o das
fragilidades e o da incapacidade em operar potencialidades humanas individuais e coletivas.
Vulnerabilidades
diante das ocorrências
– fragilidades (ausência
de vínculos afetivos
familiares e comunitários
e incidência da ausência
de recursos físicos,
materiais e financeiros)
Riscos diante das
ocorrências, falta
de potência para
vencer as fragilidades
que expõem
Situações vulnerabilidade
de vivências
individuais e
coletivas
40
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Pensar na abrangência da política de assistência social, para Sposati (2009, p. 24) deduz que essa
política se coloca no campo da defesa da vida relacional, se alinhando “como política de defesa de
direitos humanos”. Segundo a autora, “defender a vida, independentemente de quaisquer características
do sujeito, como é o caso da saúde, é também um preceito que a orienta” (p. 24-25).
41
Unidade I
Com base nos preceitos aqui descritos, e pela figura anterior, a violação de direitos pode se expressar
por meio de situações que representem fragilidade, vulnerabilidade ou iminência, ou ocorrência de
situações que abalam as condições de autonomia e protagonismo das pessoas, o convívio familiar e
comunitário, bem como o exercício da cidadania.
Compreender a assistência social como um sistema de proteção social pressupõe reconhecer que
sua organização e dinamicidade foram configuradas historicamente, como mencionado anteriormente,
dadas as condições econômicas, políticas, sociais e culturais dessa sociedade, em que as relações sociais
determinaram e determinam sua abrangência, complexidade e cobertura.
Definir o campo de atuação da política de assistência social envolve traçar um perfil das mazelas
e das desigualdades produzidas pela sociedade brasileira; portanto, a proteção social consiste:
42
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
A definição apresentada delimita o campo de atuação dessa política e esclarece a compreensão das
determinações sócio‑históricas das vulnerabilidades e riscos sociais e como efetivar o enfrentamento
para se galgar a condição de direito social. Diante do cenário econômico, político e social brasileiro, que
se mostra um tecido social com grandes desigualdades sociais, pode se configurar como uma política
social de amplo alcance:
Esses conceitos apresentados não são estáticos e únicos, pelo contrário, as especificidades de
cada território, a cultura, as circunstâncias políticas, a realidade econômica local e, principalmente,
dos contextos sócio‑históricos de cada indivíduo, família e comunidade são fundamentais para o
planejamento das ações.
Diante de tantas emergências, isoladamente, a política de assistência social não pode abarcar toda a
demanda complexa dessa realidade. Assim sendo, tecer caminhos e possibilidades que buscam efetivar
a proteção, garantia e a preservação dos direitos sociais requer um trabalho que envolva uma ação
intersetorial e interdisciplinar, que envolvam os saberes de diversas áreas do conhecimento científico, ou
seja, uma construção coletiva pelo conjunto de políticas públicas e sociais envolvendo a regionalidade
de cada território. Conforme Santos nos esclarece:
A complexidade do cenário social exige, especialmente dos gestores da política de assistência social,
dinamicidade e diagnóstico socioterritorial de cada município, estado, distrito federal e da União,
considerando suas relações culturais, políticas, econômicas e, principalmente, seus contextos históricos
individuais, familiares e comunitários. A desigualdade social é refletida em cada território e desenhada
pelas relações sociais e humanas expressadas por diversos problemas sociais que inferem atenção e não
deve ser vista apenas como o:
43
Unidade I
Sendo assim, cabe ao gestor do Estado propor políticas públicas, especialmente a de assistência
social, não considerando apenas as metas setoriais a partir de demandas ou necessidades genéricas:
A definição do território, segundo o autor, não perpassa simplesmente pela delimitação geográfica,
mas deve considerar o modo de vida das pessoas que o habitam, suas potencialidades e suas necessidades.
Por consequência:
Aspectos
econômicos
Demográficos,
Historicidade epistemológicos e
tecnológicos
Território
Aspectos
socioculturais
44
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Assim sendo, existe uma conexão entre a questão do território e a articulação dos serviços ofertados
no território, constituindo assim um grande desafio para a gestão das políticas sociais, que veremos
posteriormente. Por agora, nossa atenção está na perspectiva que a PNAS busca implementar, ou
seja, a concepção da assistência social como política pública que tem como principais pressupostos a
territorialização, a descentralização e a intersetorialidade (BRASIL, 2004a, p. 44).
Criança e do Adolescente
3 esferas do
45
Unidade I
Assim, a PNAS utiliza como referência a definição de municípios de pequeno, médio e grande porte
sobre desigualdades socioespaciais intraurbanas e o contexto específico das metrópoles.
Quadro 4
Tipo intraurbano
A
Áreas ricas
B
Boas condições de vida
C Melhores condições
D de vida
E
Médias ou medianas condições de vida
F
G
Baixas condições de vida
H
Piores condições
I de vida
Baixíssimas condições de vida
J
K Precárias condições de vida
46
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
A partir dessa classificação por porte de município, considerando sua população, são identificadas
as demandas por ações essenciais da proteção social básica que devem ser prestadas na totalidade dos
municípios, instituída pelo Suas.
Os serviços da proteção social especial, de média e alta complexidade, devem ser implementados
prioritariamente pelos municípios de médio e grande porte e metrópoles. Cabendo à esfera estadual a
“prestação direta como referência regional ou pelo assessoramento técnico e financeiro na constituição
de consórcios intermunicipais” (BRASIL, 2004a, p. 46). Que são as ações regionalizadas dos serviços de
proteção social especial.
A PNAS anseia por ver garantido o respeito das diversidades e diferenças geradas pelas desigualdades
sociais regionais, potencializando uma política:
49
Unidade I
A participação social na
assistência social, bem
como a descentralização
político-administrativa
e comando único em
cada esfera de governo
Todo poder emana e da primazia da
do povo, que o responsabilidade estatal na
exerce por meio de condução desta política
seus representantes
eleitos direta ou Loas, art. 5º,
indiretamente inciso II
“toda pessoa tem o direito de
tomar parte do governo de seus
pais, direita ou por intermédio de” Constituição Federal 1988,
art. 1º, art. 5º LXXIII, art.
“a vontade do povo será a base 129, III e IV; art. 194 §VII;
de autoridade do governo” art. 204 §IV
Declaração
dos Direitos
Humanos, 1948,
incisos 1 e 2
A política propõe a normatização e a continuidade dos padrões dos serviços ofertados de forma equitativa
para todo o território nacional, por meio de eixos estruturantes da PNAS que sustentam a descentralização
político‑administrativa, participação social e a articulação, juntamente com as demais políticas públicas
setoriais. Considerando suas particularidades e especificidades do campo de ação, dos objetivos, dos usuários
e as formas de operacionalização da assistência social, como política com caráter de proteção social.
As conferências de assistência social ocorrem ordinariamente a cada quatro anos, conforme art. 117
da NOB/Suas 2012, com o objetivo de avaliar a política de assistência social e definir diretrizes para seu
aprimoramento. Devem ocorrer no âmbito dos municípios, estados, Distrito Federal e União, contando
com a participação de todos os sujeitos envolvidos na assistência social e pessoas interessadas nas
questões relativas a essa política, como: gestores; representantes dos órgãos públicos; trabalhadores do
Suas e outras políticas que fazem interface com a assistência; representantes das entidades de assistência
social; usuários dos serviços, programas, projetos e dos benefícios; representantes de organizações de
usuários; representantes de conselhos setoriais (saúde, educação etc.) e de defesa de direitos (criança
e adolescente, idoso, pessoa com deficiência, mulher etc.); representantes das universidades, do Poder
Legislativo federal, estadual e municipal, do Judiciário e Ministério Público; entre outros (BRASIL, 2012a).
50
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Observação
O processo de organização das conferências deve ser iniciado pelas etapas municipais, estaduais e
do Distrito Federal, até que ocorra a Conferência Nacional de Assistência Social. A realização se dará em
conjunto com os conselhos de assistência social, conforme art. 12 da NOB/Suas 2012; porém, cabe aos
órgãos gestores de cada esfera de governo “prever dotação orçamentária e realizar a execução financeira
garantindo os recursos, infraestrutura necessária e acessibilidade para as pessoas com deficiência e
idosas” (BRASIL, 2012a).
Deliberação e
Gestão Negociação e Financiamento
controle social
pactuação
SNAS FNAS
CNAS
SEAS CIT FEAS
CEAS
SMAS CIB FMAS
CMAS
Rede socioassistencial
Usuários do Suas
Cada esfera de governo deve instituir o Conselho de Assistência Social, que será responsável em seu
âmbito governamental pela aprovação da política pública de assistência social, normatização e regulação
51
Unidade I
Além dos conselhos de assistência social, existem instâncias de negociação e pactuações entre
gestores quanto aos aspectos operacionais do Suas, denominadas comissões intergestores tri e bipartite.
52
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
Observação
Como parte do processo de democratização da gestão, ampliação dos espaços decisórios e do controle
social, implementam‑se, a partir da promulgação da Loas, as conferências de assistência social que:
O caráter do Suas pode ser compreendido pelos conceitos e fundamentos que sustentam suas
prerrogativas e principalmente pelo tratamento objetivo atribuído ao seu processo de gestão
conforme preconiza a NOB/Suas, no intuito de implantar um sistema com diretrizes e princípios únicos
em todo território nacional, mas que em contrapartida considerem o conhecimento da realidade, quanto
à presença e a prevenção de riscos e vulnerabilidades sociais da população, do território e da oferta de
serviços, considerando a distância entre a demanda de proteção social em face da rede socioassistencial
existente, articulando‑os na busca do alcance da implementação do Suas; a construção gradual de
metas nos planos de assistência social, o trato igualitário e equitativo dos municípios, dos estados
e regiões nacionais e das microrregiões dos estados; a defesa dos direitos socioassistenciais; o padrão
de financiamento e o controle social (BRASIL, 2005, p. 86).
Pensando na organização da implantação do Suas por tipos e níveis de gestão, a NOB/Suas propõe
a gestão dos municípios em três níveis: inicial, básica e plena.
Níveis de gestão do Suas Instrumentos de gestão Suas Instâncias de articulação, pactuação e deliberação
Gestão inicial Plano de assistência social Comissões intergestores – CIB, CIT
Conselhos de assistência social
Gestão básica Orçamento de assistência social
Municipal (CMAS)
Gestão da informação, Estadual (Ceas)
Gestão plena monitoramento e avaliação
Nacional (CNAS)
Relatório de gestão
53
Unidade I
A gestão inicial destina aos municípios que “não se habilitarem à gestão plena ou à básica o
recebimento de recursos da União, conforme série histórica, transformados em piso básico de transição,
piso de transição de média complexidade e piso de alta complexidade I” (BRASIL, 2005, p. 99).
A gestão básica permite ao município assumir a organização da proteção social básica, propondo
ações de prevenção de riscos por meio do desenvolvimento de potencialidade e aquisições, conforme
constam na PNAS, Tipificação nacional dos serviços socioassistenciais e cadernos de orientações técnicas
pertinentes ao tema. O município deverá, então, responsabilizar‑se pela oferta de programas, projetos
e serviços socioassistenciais que “fortaleçam vínculos familiares e comunitários que promovam os
beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e transferência de renda e que vigiem direitos
violados no território” (BRASIL, 2005, p. 99‑100).
a gestão total das ações de assistência social, sejam elas financiadas pelo
Fundo Nacional de Assistência Social, mediante repasse fundo a fundo, ou
que cheguem diretamente aos usuários, ou, ainda, as que sejam provenientes
de isenção de tributos, em razão do Certificado de Entidades Beneficentes
de Assistência Social – Cebas (BRASIL, 2005, p. 101).
Critérios de transferência
Piso de proteção social básica Piso de proteção social especial de média Piso de proteção social especial de
complexidade alta complexidade
Piso de proteção social especial de
Piso básico fixo Piso de transição de média complexidade alta complexidade I
Piso de proteção social especial de
Piso básico de transição Piso de fixo de média complexidade alta complexidade II
Piso básico variável
Assim, como se amplia o nível de autonomia do município para a implementação das ações da
política de assistência social com a gestão plena, ampliam‑se também os requisitos para sua adesão e
suas responsabilidades que se compõem. Se, por um lado, aderir a esse nível de gestão representa mais
responsabilidades para os municípios, por outro, oferece também a possibilidade de ampliar a autonomia
na execução e proposição de ações e no financiamento, por meio dos incentivos de repasse de recurso.
Para aqueles municípios que não forem habilitados para nenhum dos níveis de gestão previstos na
NOB/Suas (inicial, básica e plena), a “gestão dos recursos federais destinados ao cofinanciamento das
54
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
ações continuadas de assistência social é de responsabilidade do gestor estadual” (BRASIL, 2005, p. 104),
entende‑se que, atualmente, os estados e municípios já terminaram o reordenamento legislativo.
O financiamento da seguridade social está previsto no art. 195 da Constituição Federal de 1988,
instituindo que as políticas que compõem o tripé da seguridade social deverão ser financiadas por toda
a sociedade, mediante recursos provenientes da União, estados e municípios (BRASIL, 2004a, p. 48).
Quadro 7
A PNAS propôs a articulação do financiamento aos eixos da gestão e do controle social. Essa
articulação instituiu um desafio para cada uma das esferas de governo, sobretudo os municípios,
que procuram:
Apesar do desafio, esse novo formato trouxe a possibilidade de execução mais efetiva e democrática das
ações e, consequentemente, do controle público sobre os gastos com a política. Força os municípios e estados
a efetivarem mecanismos de gestão direcionados ao planejamento e avaliação das ações executadas, tendo
em vista a necessidade de deliberação por parte dos conselhos. Embora haja a necessidade da deliberação
dos conselhos tanto na aprovação do orçamento quanto na comprovação da execução das ações e dos
gastos públicos, quem deve apresentar os planos e relatórios é o gestor público, sendo garantida assim a
primazia do Estado no planejamento, proposição e financiamento da política.
O Fundo de Assistência Social é uma unidade orçamentária sem personalidade jurídica própria, sob
responsabilidade do órgão gestor de cada esfera de governo, utilizando o mesmo CNPJ da prefeitura
55
Unidade I
ou órgão correspondente. Por meio dele se “instaurou a transferência regular e automática [...] para o
custeio dos serviços, programas e projetos organizados segundo pisos de proteção (básica e especial),
baseados na complexidade dos serviços” (BRASIL, 2013c, p. 21).
Para receber os repasses de fundo a fundo, ou seja, diretamente do fundo nacional para o fundo
municipal, os municípios devem se habilitar em um dos níveis de gestão do Suas (inicial, básica e plena)
e comprovar o uso de recursos próprios na execução da política.
O repasse de recursos, segundo proposição da NOB/Suas, deve acontecer tendo como base o território,
o porte dos municípios e a complexidade dos serviços (proteção social básica e proteção social especial).
Os repasses devem ser regulares e automáticos, estabelecidos por pisos de proteção, com cofinanciamento
indicando corresponsabilidade entre as esferas de governo e correspondência nos instrumentos de
planejamento público – PPA, LDO, e LOA – (TAVARES, 2009), com destaque para o plano plurianual, que
“se constitui em um guia programático para as ações do Poder Público e traduz a síntese dos esforços
de planejamento de toda a administração para contemplar os princípios e concepções do Suas”
(BRASIL, 2004a, p. 50).
Os planos de assistência deverão ser deliberados pelos conselhos de assistência social, logo o
orçamento estará incluso nesse procedimento expressando, assim, “a preocupação com o respeito às
instâncias de pactuação e deliberação, inclusive com grande peso atribuído aos critérios de partilha de
recursos” (TAVARES, 2009, p. 233).
A partir das ações propostas nos planos municipais ou estaduais, os entes federados preencherão
os planos de ação no sistema informatizado Suas‑web e, somente após sua validação, os recursos serão
transferidos para o respectivo fundo. Ao final do exercício, os conselhos de assistência deverão deliberar
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POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
sobre prestação de contas apresentada pelos gestores públicos, efetivada por meio do relatório de gestão
(BRASIL, 2005).
Para cada nível de proteção, também são considerados critérios de partilha, que são analisados
sempre em conjunto, e sua combinação indica os municípios prioritários para expansão do
cofinanciamento federal.
As bases de financiamento proposto pelo Suas respeitam o disposto no art. 28 da Loas, que trata
sobre o financiamento dos serviços, programas, projetos e benefícios com recursos da União, dos
estados, do Distrito Federal e dos municípios e demais contribuições sociais previstas no art. 195
da Constituição Federal, além daqueles que compõem o FNAS, e ao parágrafo 1º desse artigo, que
atribui ao órgão da administração pública federal a responsabilidade pela coordenação da política de
assistência social nas três esferas de governo gerir o FNAS sob a orientação e controle dos respectivos
conselhos de assistência social.
É previsto pela Loas, ainda que a demanda municipal não justifique a execução própria de serviços
da proteção social especial, que elas poderão ser ofertadas pelos estados, mantendo‑se sempre a
preservação dos vínculos familiares e comunitários.
A instituição dos consórcios deve ser pactuada nas referidas CIB e deliberadas
pelos Ceas, sendo que os estados assumem, como responsabilidade de
gestão, identificar áreas potenciais para sua instalação (organizando sua
área de abrangência e referência), apoiar sua implantação e coordenação e
cofinanciar, juntamente com os municípios que os comporão.
Por fim, temos a considerar que o aporte de recursos destinados à política de assistência social, nos
últimos anos, vem aumentando consideravelmente. “Em valores constantes [...] o total executado na
função 08 passou de R$ 11,5 bilhões, em 2002, para R$ 56,6 bilhões, em 2012, o que corresponde a um
crescimento real de 392,8%” (BRASIL, 2008a, p. 21).
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Unidade I
A partir desses eixos estruturantes, a PNAS assume que o acesso à proteção social é garantido a
todos os cidadãos que dela necessitar, independentemente do território, etnia ou orientação sexual. Para
tanto, a compreensão dos conceitos de proteção social se constitui como condição fundamental
para o planejamento e gestão das ações propostas pelo Suas.
Resumo
59
Unidade I
Exercícios
Figura 15
A Lei n. 12.711/2012, sancionada em agosto deste ano, garante a reserva de 50% das matrículas por
curso e turno nas 59 universidades federais e 38 institutos federais de educação, ciência e tecnologia a
alunos oriundos integralmente do ensino médio público, em cursos regulares ou da educação de jovens
e adultos. Os demais 50% das vagas permanecem para ampla concorrência.
Sim, pelo Decreto n. 7.824/2012, que define as condições gerais de reservas de vagas, estabelece
a sistemática de acompanhamento das reservas de vagas e a regra de transição para as instituições
federais de educação superior. Há, também, a Portaria Normativa n. 18/2012, do Ministério da Educação,
que estabelece os conceitos básicos para aplicação da lei, prevê as modalidades das reservas de vagas e
as fórmulas para cálculo, fixa as condições para concorrer às vagas reservadas e estabelece a sistemática
de preenchimento das vagas reservadas.
As vagas reservadas às cotas (50% do total de vagas da instituição) serão subdivididas — metade
para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a um salário mínimo e
meio per capita e metade para estudantes de escolas públicas com renda familiar superior a um salário
60
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
mínimo e meio. Em ambos os casos, também será levado em conta o percentual mínimo correspondente
ao da soma de pretos, pardos e indígenas no estado, de acordo com o último censo demográfico do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Sim, mas gradualmente. Em 2013 terão de ser reservadas, pelo menos, 12,5% do número de vagas
ofertadas atualmente. A implantação das cotas ocorrerá de forma progressiva ao longo dos próximos
quatro anos, até chegar à metade da oferta total do ensino público superior federal.
II – Segundo a charge, a justiça pressupõe que sejam realizadas ações com o intuito de eliminar
diferenças de oportunidades.
III – O sistema de cotas do MEC é uma política compensatória e propõe que metade das vagas das
universidades públicas seja reservada aos negros e indígenas.
A) I e IV.
B) II e III.
C) II e IV.
D) I e III.
E) II.
I – Afirmativa incorreta.
Justificativa: de acordo com os textos, o sistema de cotas baseia‑se no sistema de justiça, uma vez
que visa a proporcionar oportunidades aos que não tiveram boas condições.
61
Unidade I
II – Afirmativa correta.
Justificativa: a charge mostra que são necessárias ações reparadoras para garantir as mesmas
oportunidades a todos, para que haja justiça.
Justificativa: a medida refere‑se às instituições federais e apenas uma parte das vagas reservadas às
cotas (50%) é destinada a negros, indígenas e pardos.
IV – Afirmativa incorreta.
O Brasil de hoje é herdeiro de uma sociedade colonial e imperial escravocrata, em que o negro
ocupou fundamentalmente a posição de pessoa escravizada. O Brasil em 1888 foi o último país a abolir
a escravidão nas Américas. Um abolicionismo incompleto, que não permitiu incluir o negro na ordem
social capitalista (BASTIDE; FERNANDES, 2008).
Figura 16
62
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL
II – O texto coloca, entre as raízes do preconceito racial, o sistema escravocrata, que imperou até o
final do século XIX no Brasil.
III – De acordo com o texto, a abolição da escravidão no Brasil, embora tardia, permitiu que os negros
se integrassem completamente à sociedade capitalista.
A) I.
B) II.
C) III.
D) I e II.
E) I e III.
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