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Política Setorial -

Assistência Social
Autoras: Profa. Cristiane Gonçalves de Oliveira
Profa. Giselle Viegas Dantas Rodrigues
Profa. Silmara Cristina Ramos Quintana
Colaboradoras: Profa. Amarilis Tudella
Profa. Tânia Sandroni
Professoras conteudistas: Cristiane Gonçalves de Oliveira /
Giselle Viegas Dantas Rodrigues / Silmara Cristina Ramos Quintana

Cristiane Gonçalves de Oliveira

Assistente social graduada pela Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e pedagoga graduada pela Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). Atuante na área de serviço social, na política de assistência social, desde sua
formação. É mestra em sociologia da educação pela Universidade de São Paulo. Desde 1997 atua como assistente
social na Prefeitura Municipal de Campinas e desde 2014 é docente do curso de Serviço Social na Universidade Paulista
(UNIP), Campus Campinas.

Giselle Viegas Dantas Rodrigues

Graduada em serviço social e mestra em serviço social, políticas públicas e desenvolvimento pela Universidade
Federal do Pará (UFPA). Especialista em gestão de políticas sociais (2019) pela UNIP. Desenvolve pesquisas nas
áreas de trabalho, direitos humanos e seguridade social. Atua como docente do curso de Serviço Social da UNIP, no
município de Campinas, São Paulo. Possui experiência profissional em ambientes corporativos e em organizações da
sociedade civil (OSCs).

Silmara Cristina Ramos Quintana

Mestra em adolescentes em conflito com a lei pela Universidade Bandeirantes de São Paulo (Uniban); especialista
em psiquiatria e psicologia de adolescentes pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); especialista em
orientação e encaminhamento ao mundo do trabalho pelo Centro Brasileiro para Infância e Juventude (CBTIJ) e em psicodrama
pedagógico pela Animus. Assistente social graduada pela Faculdade de Serviço Social de Araraquara e pedagoga
graduada pela Unitelos. Atua, desde 2013, como coordenadora e professora do curso de Serviço Social da UNIP Campus
Campinas/Swift. Coordenadora do curso de pós‑graduação em Gestão de Políticas Públicas e professora‑adjunta do
curso de graduação em Serviço Social da UNIP Interativa, campus Cidade Universitária.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

O48p Oliveira, Cristiane Gonçalves de.

Política Setorial – Assistência Social / Cristiane Gonçalves de


Oliveira, Giselle Viegas Dantas Rodrigues, Silmara Cristina Ramos
Quintana. – São Paulo: Editora Sol, 2019.

192 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXV, n. 2-167/19, ISSN 1517-9230.

1. Política social. 2. Proteção social. 3. SUAS. I. Rodrigues, Giselle


Viegas Dantas. II. Quintana, Silmara Cristina Ramos. III. Título.

CDU 362

U503.47 – 19

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Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez


Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Bruno Barros
Juliana Muscovick
Sumário
Política Setorial - Assistência Social

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 CONCEITUALIZAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL............................................................................................. 11
2 DA LEI DOS POBRES À SEGURIDADE SOCIAL........................................................................................ 14
3 CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMO SISTEMA AFIANÇADOR DE PROTEÇÃO SOCIAL................... 24
4 POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL............................................................................................................ 34

Unidade II
5 EIXOS ESTRUTURANTES DO SUAS............................................................................................................. 64
6 NÍVEIS DE PROTEÇÃO SOCIAL PELO SUAS............................................................................................. 79
6.1 Proteção social básica......................................................................................................................... 92
6.1.1 Cras‑Paif...................................................................................................................................................... 92
6.1.2 Serviço de convivência e fortalecimento de vínculos.............................................................. 97
6.1.3 Serviço de proteção social básica no domicílio para pessoas com
deficiência e idosas............................................................................................................................................ 98
6.2 Proteção social especial...................................................................................................................... 99
6.2.1 Creas/Paefi................................................................................................................................................101
6.2.2 Tipos de violências e violações de direitos..................................................................................106
6.3 Proteção social especial de média complexidade..................................................................116
6.3.1 Serviço especializado em abordagem social............................................................................... 116
6.3.2 Serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de liberdade assistida e de prestação de serviços à comunidade................. 116
6.3.3 Serviço de proteção social especial para pessoas com deficiência,
idosas e suas famílias......................................................................................................................................117
6.3.4 Serviço especializado para pessoas em situação de rua........................................................ 117
6.4 Proteção social especial de alta complexidade.......................................................................118
6.4.1 Acolhimento institucional..................................................................................................................118
6.4.2 Serviço de proteção em situações de calamidades públicas e de emergências.......... 123
Unidade III
7 GESTÃO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL.................................................................................130
7.1 Gestão do Suas.....................................................................................................................................130
7.2 Gestão do trabalho.............................................................................................................................132
7.3 Vigilância socioassistencial.............................................................................................................140
7.4 Instrumentos de gestão....................................................................................................................154
8 ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL............................165
APRESENTAÇÃO

Este livro‑texto visa contribuir para a formação do aluno, tendo como objetivo refletir sobre a
evolução e trajetória da política de assistência social no Brasil e seus desdobramentos para a ação
profissional dessa área.

Considera‑se da maior importância, para a formação profissional, o conhecimento sobre a


política de assistência social, uma vez que ela faz interface com todas as demais políticas públicas,
bem como envolve um conjunto de ações das três esferas do Poder Público para atendimento das
necessidades sociais.

Essa obra permitirá ao aluno o desenvolvimento dos conhecimentos acerca dos processos
históricos e políticos que conduziram à elaboração da política de assistência social, da garantia de
proteção social básica e proteção social especial (afiançada por meio da cobertura de atendimento às
necessidades do cidadão e das famílias) e do trabalho do profissional na política de assistência social.

INTRODUÇÃO

Neste livro‑texto, veremos que a política de assistência social, existente desde a primeira metade do
século passado, teve um viés atrelado à benesse e à caridade, voltada aos pobres e desajustados.

Na segunda metade do século, iniciou‑se um movimento de ruptura com o caráter benemerente, até
que, em 1988, foi reconhecida como uma política pública pela Constituição Federal, inserindo‑a no tripé
da seguridade social, juntamente com as políticas de saúde e previdência social.

Desde então, a assistência social vem trilhando uma trajetória de luta pela afirmação como uma
política social de direito para todos e dever do Estado, embora no texto constitucional ainda esteja
direcionada “para quem dela necessitar” (BRASIL, 1988, art. 203).

Em 1993, temos a promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), por meio da Lei n. 8.742,
de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da política, firmando‑a como um direito do
cidadão e dever do Estado, como política de seguridade social não contributiva, que provê os mínimos
sociais, realizada por meio de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para
garantir o atendimento às necessidades básicas – Lei n. 8.742, art. 1º.

A Loas inicia um processo de inovação da assistência social ao propor que a política seja descentralizada
e participativa. Descentralizada porque divide com estados e municípios a responsabilidade do
planejamento e execução das ações voltadas à realidade de cada local, e participativa porque envolve a
participação da população nas esferas do planejamento e controle social.

A partir da efetivação da prática de participação, iniciaram‑se as conferências da assistência social,


que têm como objetivo principal debater e avaliar a política, propondo novas diretrizes que ampliem:

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os direitos socioassistenciais dos seus usuários. Os debates são coletivos
com participação social mais representativa, assegurando momentos para
discussão e avaliação das ações governamentais e também para a eleição
de prioridades políticas que representam os usuários, trabalhadores e as
entidades de assistência social (BRASIL, 2014a, p. 53).

Como fruto das discussões e deliberações das conferências de assistência social, concretiza‑se em
2004 a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), que regulamenta a política até os tempos atuais.

A política nacional prevê sua organização de forma intersetorial, considerando “as desigualdades
socioterritoriais, visando ao seu enfrentamento, à garantia dos mínimos sociais, ao provimento de
condições para atender à sociedade e à universalização dos direitos sociais” (BRASIL, 2014a, p. 48).

A política nacional prevê a organização do Sistema Único de Assistência Social (Suas), que atribui
ao Estado, de forma descentralizada, a responsabilidade por organizar os serviços socioassistenciais no
Brasil, tendo como parâmetro as diretrizes nacionais e as realidades socioterritoriais de cada região.

O Suas, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), prevê
um modelo de gestão participativa, com responsabilidades dos três níveis/esferas de governo (União,
estados, municípios). Para integrar o sistema, estados e municípios precisam cumprir determinados
requisitos e responsabilidades, estando assim habilitados ao Suas.

A habilitação ao Suas prevê níveis de gestão e classificação por porte populacional para os
municípios, dependendo da realidade de cada um, o que possibilita justiça em termos de repasse de
recursos. Essas classificações estão normatizadas nas Normas Operacionais Básicas – NOB/Suas de 2005
e 2012, bem como as regras para o controle social, financiamento, vigilância socioassistencial, entre
outras necessárias para a organização do sistema.

Seguindo as diretrizes da política nacional, as ações da assistência social são organizadas por tipos
de proteção e níveis de complexidade denominados proteção social básica e proteção social especial,
sendo esta de nível de média complexidade e alta complexidade.

Para que as ações possam ocorrer seguindo as diretrizes do Ministério, respeitando o comando único
das ações, foram atribuídos mecanismos de gestão que devem ser apropriados em todas as esferas
de governo, além de analisados e deliberados pelos conselhos (nacional, estadual e municipal) de
assistência social. Assim, respeitando-se a realidade socioterritorial de cada ente, cumprindo a diretriz
de descentralização e participação.

Em 6 de julho de 2011, foi promulgada a Lei n. 12.435, que implanta o Suas, conforme seu artigo 6º.
Baseando‑nos nessa trajetória, vamos nos aprofundar nos conceitos e diretrizes da política de
assistência social.

Nesse sentido, a política de assistência social representa a garantia de um direito social consolidado
na Constituição Federal e é considerada de extrema importância para o fazer profissional do assistente
8
social, uma vez que compõe um dos maiores espaços sócio‑ocupacionais de sua atuação e que a sua
operacionalização requer uma articulação intersetorial com as demais políticas públicas.

A primeira parte será voltada para a contextualização histórica da política de assistência social, bem
como a apresentação da Loas, da PNAS e do Suas. Em seguida, serão apresentadas as configurações dos
serviços socioassistenciais e dos programas de transferência de renda e cidadania. Nesse sentido, serão
abordados os serviços, programas, projetos e benefícios que compõem a política de assistência social,
detalhando as proteções sociais: básica e especial de média e alta complexidade e as especificidades
que as envolvem. Por fim, discorrerá sobre a gestão do trabalho no Suas e o trabalho do profissional na
política de assistência social. Essa discussão permitirá maior compreensão dos limites e possibilidades
da gestão, do financiamento e dos conceitos de vulnerabilidade e risco social no contexto da assistência
social e a intervenção das equipes do profissional.

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POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Unidade I
Será realizado um estudo da trajetória da política de assistência social no Brasil, iniciando pela
conceituação de política social e a constituição da seguridade social, seguidos pela apresentação dos
principais marcos regulatórios, bem como: a Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), a Política Nacional
de Assistência Social (PNAS) e o Sistema Único de Assistência Social (Suas).

1 CONCEITUALIZAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL

A política de assistência social é considerada uma política social criada pelo Estado, enquanto
representante dos interesses entre as classes sociais, como um mecanismo para mediar os conflitos
econômicos, sociais e políticos da sociedade, assim como para incorporar as reivindicações das classes e
regulamentar os direitos constituídos em lei.

Dessa forma, é preciso compreender o que são políticas sociais. De acordo com Pereira (2009),
a política social é considerada como uma categoria acadêmica e política, de contribuição teórica e
prática, que não apenas se dispõe a conhecer e a explicar o mundo real, mas também de agir e de
promover melhorias no contexto social vivido. Ou seja, entende‑se que as políticas sociais são um
meio de concretizar direitos sociais e necessidades humanas (leia‑se sociais) na perspectiva de uma
cidadania ampliada.

A existência de várias conceituações inconsistentes sobre política social afeta tanto a credibilidade
e a razão de ser da política quanto à própria vida em sociedade. Como exemplos de utilização
equivocada do termo, tem‑se a de Hitler na Alemanha nazista, em que denominou de política social
os experimentos criminosos em “enfermos, doentes mentais, judeus e outros grupos étnicos, com a
finalidade de submetê‑los a investigações médicas, esterilizá‑los e enviá‑los à câmara de gás” (TITMUSS,
1981 apud PEREIRA, 2009, p. 45).

Saiba mais

Para saber mais sobre a vida nos campos de concentração e a política


social adotada por Hitler durante a Segunda Guerra Mundial, permitindo
compreender a visão dos nazistas e dos prisioneiros, assista ao filme:

O MENINO do pijama listrado. Dir. Mark Herman. EUA/Reino Unido:


Miramax, 2008. 94 minutos.

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Unidade I

De acordo com Pereira (2009), um dos motivos que tem levado à dificuldade para estabelecer uma
conceituação gnosiológica – parte da filosofia que estuda o conhecimento humano – do termo se
dá por causa de a política não ser neutra. Dessa maneira, todo ensaio de conceituação estaria entranhado
por ideologias, valores e perspectivas teóricas competitivas. Portanto, é preciso eleger uma perspectiva
teórica que embase a compreensão de política social, e para o serviço social é pertinente analisá‑la sob
a perspectiva dialética, considerando a política social como um produto da contradição que envolve
as relações antagônicas entre capital e trabalho, Estado e sociedade e os princípios da liberdade e
igualdade que regem os direitos de cidadania.

Nota‑se que, inicialmente, a política social era associada ao gerenciamento e à administração de


benefícios e serviços, denominada por administração social – tratada mais como um campo de ação,
marcadamente pragmático, empírico e prescritivo.

Contudo, ao se tornar uma disciplina acadêmica, a política social ganhou corpo teórico‑metodológico
e se inscreveu no âmbito das chamadas ciências sociais, rompendo com a concepção de administração
social. Assim, “política social e administração caminham juntas, mas não significam a mesma coisa”
(PEREIRA, 2009, p. 170). A principal diferença reside no fato de que a política social contém uma tomada
de decisão pautada na representação de interesses, enquanto a administração das ações políticas visa
garantir sua eficácia e eficiência (LAFER, 1978 apud PEREIRA, 2009).

A fim de promover subsídios para caracterização das políticas sociais, importa acrescentar que essas
podem ser do tipo pública e/ou privada, de natureza emancipatória e/ou compensatória e de abrangência
universal, segmentada e/ou fragmentada. Conforme o disposto a seguir:

Pública Assegurar direitos sociais


determinados em lei
Tipologia
Promover melhorias sociais para
Privada um público-alvo específico
Política social

Políticas de longo prazo para


Emancipatória resolver situações complexas
Natureza
Políticas de curto prazo para
Compensatória amenizar situações temporárias

Universal Para todos os cidadãos

Caracterizada por um fator


Abrangência Segmentada determinado (idade, gênero,
raça etc.)

Destinada a grupos sociais


Fragmentada dentro de cada segmento
(crianças, idosos, mulheres etc.)

Figura 1 – Caracterização das políticas sociais

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POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Observa‑se que política significa princípios para ação e social qualifica o tipo de ação. Assim, quando
desenvolvida pelo Estado, é caracterizada como pública e, quando por entidades privadas, como privada.

Para este tema, importa compreender a política social de assistência social do Brasil enquanto uma
política pública de proteção social. Para Pereira (2009), há de se ressaltar que a política social do tipo
pública consolida uma ação que se propõe a atender as necessidades sociais cuja resolução ultrapassa a
iniciativa privada, individual e espontânea, e requer decisão coletiva regida por princípios de justiça social.

De um lado, as políticas sociais públicas precisam ser amparadas por leis impessoais e objetivas,
garantidoras de direitos, e por isso está relacionada ao Estado – governos, políticas e aos movimentos
da sociedade, assim como pelos indivíduos, grupos, profissionais, empresários, trabalhadores e outros
segmentos sociais que tentam influir na sua constituição.

Em particular, o bem‑estar tem estreita relação com a política social visto


que a esta compete garantir a população níveis de renda e acesso a recursos
e serviços básicos, impedindo‑lhe de cair na pobreza extrema, no abandono
e no desabrigo (PEREIRA, 2009, p. 178).

Por outro lado, as políticas privadas podem ser desenvolvidas por empresas e organizações privadas,
tanto de forma interna para os seus funcionários quanto de forma externa para a comunidade. Ademais,
visam promover melhorias sociais que não necessariamente estejam preconizadas no texto da lei, que
vão atender a um público‑alvo específico.

A natureza das políticas sociais pode ser emancipatória, envolvendo a implementação de ações que
visam promover a resolução de uma situação problema a longo prazo. Enquanto as compensatórias são
ações que requerem resultados mais imediatos, portanto, se propõem a resolver situações problemas de
forma temporária e a curto prazo.

As políticas sociais também podem ter abrangências diferenciadas: a universal é destinada a todos os
cidadãos, com caráter universal e totalizante; a segmentada é caracterizada por um fator determinado
(idade, gênero, raça etc.); e a fragmentada é destinada a grupos sociais dentro de cada segmento
(crianças, idosos, mulheres etc.)

No atual contexto de políticas sociais com inspiração neoliberal, as políticas estão servindo como
um instrumento de funcionalização da pobreza. Na concepção de Almeida (2004), as políticas sociais
segmentadas e fragmentadas são caracterizadas como políticas focalizadas, e quando o Estado neoliberal
implementa políticas de assistência social focalizadas no tratamento da pobreza, está realizando
políticas de cunho assistencialista, como os programas de transferência de renda para pessoas pobres,
forjando assim o atendimento aos direitos de cidadania. Essa seletividade vai de encontro ao conceito
de universalização dos direitos, atuando ainda como um instrumento de repressão social.

Ademais, está ocorrendo uma redefinição do significado de serviço público e a destruição da civilização
pautada na igualdade de direitos, pois em nome da racionalidade e eficiência, o Poder Público tem se
transformado em um bem privado, e uma das estratégias para isso é a depreciação do serviço público,
13
Unidade I

tornando a privatização uma saída que se apresenta como vantajosa. Tal fato concorre para a defesa da
reforma do Estado, preconizando a redução da sua intervenção no âmbito social e consolidando uma
tendência tecnocrática pautada na privatização dos serviços de – até então – caráter público, bem como
o processo de terceirização dos serviços socioassistenciais. Desse modo, a separação do público e do
social é da maior importância para omitir o sentido governamental da ação política, para despolitizá‑la
por meio da naturalização da pobreza e assim justificar o seu caráter compensatório (ALMEIDA, 2004).

Saiba mais

Para saber mais sobre o tema, leia:

MONTAÑO, C. Terceiro setor e questão social: crítica ao padrão emergente


de intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002.

Por fim, é de maior importância resgatar o sentido do público por meio de uma leitura crítica da
prática cotidiana do fazer profissional, com uma metodologia de intervenção que considere e contribua
para a ampliação da cidadania e para a universalização da política de assistência social no Brasil.

2 DA LEI DOS POBRES À SEGURIDADE SOCIAL

Após compreender em que consiste a política social e quais as suas principais características, importa
apresentar como se deu o tratamento das necessidades sociais ao longo dos anos, e como se consolidou
a atual política de assistência social no Brasil.

Sobre esse assunto, Behring e Boschetti afirmam que “não se pode indicar com precisão um
período específico de surgimento das primeiras iniciativas reconhecíveis de políticas sociais” (BEHRING;
BOSCHETTI, 2010, p. 47) no Brasil.

[...] como processo social, elas se gestaram na confluência dos movimentos


de ascensão do capitalismo com a Revolução Industrial, das lutas de
classe e do desenvolvimento da intervenção estatal. Sua origem é
comumente relacionada aos movimentos de massa social‑democratas e
ao estabelecimento dos Estados‑nação na Europa ocidental no final do
século XIX (PIERSON, 1991), mas a sua generalização situa‑se na passagem
do capitalismo concorrencial para o monopolista, em especial na sua fase
tardia, após a Segunda Guerra Mundial (BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 47).

Dessa forma, tem‑se as sociedades pré‑capitalistas, que administravam as necessidades sociais


da população, bem como a pobreza, por meio de políticas sociais privadas de cunho filantrópico
e caritativo, em que as situações de privação econômica eram justificadas não como resultado da
exploração, mas como “fenômenos autônomos e de responsabilidade individual ou coletiva”, ou seja, “a
questão social era vista como um fenômeno natural fruto do comportamento dos indivíduos, devido

14
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

a fatores como vinculados ao déficit de educação, a incapacidade de planejamento financeiro, e ao


comportamento devido a tendência a vadiagem” (MONTAÑO, 2012, p. 272).

Saiba mais

Para a compreensão desta temática, leia:

BEHRING, E. R.; BOSCHETTI, I. Política social: fundamentos e história.


7. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

As primeiras leis que regulamentaram a intervenção estatal sob as necessidades sociais e que podem
ser consideradas como as origens da política social de assistência social ocorreram na Inglaterra. Conforme
Behring e Boschetti (2010, p. 48), cronologicamente, tem‑se a promulgação das seguintes leis:

• 1349: Estatuto dos Trabalhadores.

• 1563: Estatuto dos Artesãos.

• 1601: Lei dos Pobres Elisabetanas.

• 1662: Lei do Domicílio.

• 1795: Speenhamland Act.

• 1834: Nova Lei dos Pobres.

Importa ressaltar que todas essas leis eram conservadoras e, a despeito do conceito de política
social protetiva que se tem hoje, as primeiras políticas partiam de uma perspectiva repressiva e punitiva,
culpabilizando os indivíduos pela situação em que viviam. Dessa forma, a Lei dos Pobres de 1601, criada
pela rainha Elizabeth, repassava para as paróquias a responsabilidade de assistir aos pobres.

Nesse contexto, as igrejas católicas desempenhavam um papel importante no processo de alívio da


pobreza, uma vez que promoviam ações sociais para garantir o mínimo necessário à sobrevivência dos
indivíduos marginalizados, a partir de uma postura moralista e religiosa (visto que as boas ações eram
consideradas como um dever de todo cristão), com intervenções para promover o ajuste do indivíduo
na sociedade, bem como pelo ensino de profissões aos pobres. Porém, com o processo de urbanização e
a grande migração do campo para a cidade, aumentou a quantidade de pessoas indigentes nas cidades,
fazendo com que o Estado precisasse se responsabilizar pela assistência dada aos pobres.

A partir do século XIX, com o liberalismo econômico e processo de industrialização do capitalismo


concorrencial, ocorre um significativo aumento das expressões da questão social, sendo necessário fazer

15
Unidade I

uma revisão da Lei dos Pobres (1834), na qual o Estado liberal entende que a distribuição de auxílio
aos pobres estimula a reprodução da pobreza. Assim, a questão social passa a ser um caso de polícia, a
pobreza é criminalizada e a mendicância nas cidades proibida.

A beneficência e os abrigos passam a ser substituídos pela repressão e


reclusão dos pobres. A ideológica expressão de “marginal” começa a adquirir
uma conotação de “criminalidade”. O pobre, aqui identificado com “marginal”,
passa a ser visto como ameaça à ordem. Aqui produz‑se a separação entre
“pobre” (objeto de ações assistenciais, por mendicância e vadiagem) e
“trabalhador” (objeto de serviços de saúde e previdência social); portanto,
diferencia‑se o indivíduo “integrado” do “desintegrado” ou “disfuncional”
(MONTAÑO, 2012, p. 273).

Os pobres passaram a ser classificados entre capazes de trabalhar, obrigados a pagar com o próprio
trabalho pelo auxílio recebido, e incapazes (idosos, doentes, deficientes, entre outros), considerados
merecedores da atenção plena do Estado por meio de asilos, abrigos etc. Tal lei obrigava todos os que
recebiam auxílio social a aceitarem qualquer trabalho, sendo que aqueles que se recusavam a trabalhar
eram castigados e poderiam até ser condenados à pena de morte.

Polanyi afirma que o princípio estruturador dessas leis era obrigar o exercício
do trabalho a todos que apresentassem condições de trabalhar, e as ações
assistenciais previstas tinham o objetivo de induzir o trabalhador a se
manter por meio de seu trabalho. Os critérios para acesso eram fortemente
restritivos e seletivos e poucos conseguiam receber os benefícios. Os
pobres “selecionados” eram obrigados a realizar uma atividade laborativa
para justificar a assistência recebida (POLANYI, 2000; CASTEL,1922 apud
BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 48‑49).

Até o século XIX, a política social era tratada mais sob a perspectiva da administração social da pobreza,
sob os princípios da eficiência e da eficácia, uma vez que o Estado liberal preconizava a ampliação dos
investimentos no âmbito financeiro, e deveria deixar a mão invisível do mercado regular os problemas
sociais. Em uma análise do Estado no período do liberalismo, as autoras Behring e Boschetti (2010) o
resumem pelas seguintes características:

I – predomínio do individualismo;

II – o bem‑estar individual maximiza o bem‑estar coletivo;

III – predomínio da liberdade e competitividade;

IV – predomínio da lei da necessidade;

V – manutenção de um Estado mínimo;

16
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

VI – as políticas sociais estimulam o ócio e o desperdício;

VII – a política social deve ser um paliativo.

Lembrete

A política social era associada ao gerenciamento de benefícios e serviços,


denominada por administração social, tratada mais como um campo de
ação, marcadamente pragmático, empírico e prescritivo.

No que diz respeito ao tratamento da questão social e a implementação de políticas de proteção


social, percorre‑se um longo caminho até a transição da caridade para o direito. Nota‑se que esse
processo é marcado pela resistência à exploração e a organização de lutas da classe trabalhadora por
melhorias nas relações de trabalho, as quais foram essenciais para que a assistência social e a proteção
social deixassem de ser tratadas no âmbito da caridade e passassem a ter o caráter de direito social.

Com o predomínio desses princípios ferozmente defendidos pelos liberais e


assumidos pelo Estado capitalista, não é difícil compreender que a resposta
dada à questão social no final do século XIX foi sobretudo repressiva e apenas
incorporou algumas demandas da classe trabalhadora, transformando as
reivindicações em leis que estabeleciam melhorias tímidas e parciais nas
condições de vida dos trabalhadores, sem atingir, portanto, o cerne da
questão social (BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 63).

Os trabalhadores estavam politicamente fortalecidos e intensamente organizados, todavia, o


movimento grevista era duramente reprimido pela classe dominante, de forma que os trabalhadores
passaram a organizar caixas de poupança e previdência, de maneira solidária e coletiva, a fim de socorrer
aqueles que precisassem de apoio financeiro.

No Brasil, esse processo ocorreu de maneira um pouco diferente, pois por se tratar de uma realidade
capitalista periférica, não acompanhou o mesmo ritmo histórico de desenvolvimento dos países capitalistas
centrais, sendo considerado um país com características de desenvolvimento desigual e combinado.

Saiba mais

Para saber mais sobre o modelo de desenvolvimento de realidades


periféricas, leia:

LOWY, M. A teoria do desenvolvimento desigual e combinado. Actuel


Marx, n. 18, 1995.

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Unidade I

Isso se deve ao fato de que a formação social da classe trabalhadora brasileira teve algumas
particularidades, bem como ter sido constituída majoritariamente por ex‑escravos que tiveram
dificuldades de se inserirem no mercado de trabalho, e por colonos europeus degradados que já tinham
vivido o processo de industrialização nos seus países de origem e estavam mais capacitados para assumir
os postos de trabalho nos grandes centros urbanos. Porém, nota‑se que “não houve no Brasil escravista
do século XIX uma radicalização das lutas operárias, sua constituição em classe para si com partidos e
organizações fortes” (BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 78). A abolição da escravidão ocorreu por motivos
externos, como a necessidade de expansão do capital e do uso do trabalho livre e assalariado para o
desenvolvimento das forças produtivas.

Para Iamamoto e Carvalho (2003), fazia‑se necessário a organização dos trabalhadores em resistência
à exploração e na luta por direitos, como única via possível de uma participação ativa na sociedade,
assim, haviam:

• associações de socorro mútuo;

• caixas beneficentes;

• ligas operárias;

• sindicatos;

A economia brasileira, até então baseada na monocultura de exportação, intensifica‑se com


o processo de urbanização industrial, que promove uma intensa migração do campo para a cidade,
causando um inchaço populacional e o aumento das expressões da questão social. Se nos países centrais
a implementação das políticas sociais esteve atrelada à luta de classes, no Brasil ocorreram medidas
esparsas de proteção social na década de 1930.

Os primeiros sindicatos foram formados no início do século XX e contavam com a influência dos
trabalhadores imigrantes que contribuíram para a politização e organização da classe trabalhadora
brasileira. O fortalecimento dos movimentos sindicalistas contribuiu para o aumento da pressão social
coletiva e forçou o Estado a assumir para si a responsabilidade em relação ao tratamento da questão
social no Brasil.

Saiba mais

Para saber mais sobre a realidade brasileira no período imperialista,


assista ao filme:

MAUÁ, o imperador rei. Dir. Sérgio Rezende. Brasil: Lagoa Cultural &
Esportiva, 1999. 135 minutos.

18
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Nessa mesma perspectiva, Otto Von Bismarck, na Alemanha, desenvolve um sistema de compensação
de renda para os trabalhadores por meio das caixas de seguro‑saúde, caixas de aposentadoria, entre
outras, consagrando uma política social que ficou conhecida como modelo bismarckiano de seguro
social. Em síntese, tem‑se que:

Modelo bismarckiano: prevê um sistema de seguro social público obrigatório,


de contribuição direta na folha de salários, destinado a algumas categorias
de trabalhadores. Ou seja, são medidas compulsórias que têm como
pressuposto a garantia estatal de recursos financeiros (para o trabalhador
e sua família) em momentos de perda da capacidade laborativa (BEHRING;
BOSCHETTI, 2010, p. 54).

Saiba mais

Para saber mais sobre o período de expansão capitalista e a situação da


classe trabalhadora, assista ao filme:

GERMINAL. Dir. Claude Berri. França: Renn Productions/France 2 Cinéma,


1993. 160 minutos.

Para Pereira (2011), a legislação do seguro social inaugurada na década de 1880, também conhecida
como socorro paliativo, consolidava o “reconhecimento das autoridades públicas de que a pobreza no
capitalismo era produto do próprio desenvolvimento predatório do sistema” (PEREIRA, 2009, p. 60),
ou seja, a preservação do sistema dependia de ações de proteção do trabalhador contra as perdas
decorrentes de contingências sociais (doença, acidentes, envelhecimento, entre outros).

Enquanto o modelo bismarckiano de seguro social era destinado a algumas categorias da classe
trabalhadora que contribuíam com o sistema de seguros sociais, de acordo com Pereira (2009) embora
tivesse estabelecido “esquemas de pensões, de saúde e de seguro‑desemprego, não impedia que milhões
de pessoas permanecessem na pobreza e ainda se submetessem aos humilhantes e degradantes testes
e meios para obter assistência pública” (PEREIRA, 2009, p. 93).

Em 1942, é lançado na Inglaterra, por William Beveridge, uma nova proposta de política social
denominada de Relatório Beveridge sobre Seguro Social, mais conhecido como Plano Beveridge, o qual
apresentava um conceito ampliado de seguridade social, que deu origem ao Welfare State e que iria
propor uma revisão da proteção social da Inglaterra.

Modelo beveridgiano: proteção social via políticas de ampliação da seguridade


social, que visam aumentar a responsabilidade estatal, universalizar os
serviços sociais e implantar uma rede de segurança em forma de serviços de
assistência social, cujo financiamento vem dos impostos fiscais e a gestão
da política é estatal (BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 37)

19
Unidade I

O grande diferencial desse modelo de seguridade social consiste no fato de ser uma proposta
nacional, unificada e com um eixo distributivo ao lado do contributivo, e eliminava os testes estabelecidos
pelo modelo anterior. O modelo beveridgiano prometia combater cinco gigantes: ignorância, sujeira,
enfermidade, preguiça e miséria (PEREIRA, 2009).

Destarte, na passagem para o século XX, o capitalismo assume uma condição monopolista marcada pela
produção fordista/keynesiana, com profundas alterações políticas e econômicas (entre elas, a crise de
1929) que fizeram com que o Estado mudasse sua postura em relação ao enfrentamento da questão social,
incorporando as reivindicações da classe trabalhadora urbano‑industrial e entendendo a pobreza como um
problema decorrente da má distribuição de renda e do precário desenvolvimento social e econômico.

Conforme Pereira (2009), esse período foi marcado pela concepção política de Estado ampliado,
defendida por John Maynard Keynes, de que o equilíbrio econômico não é autorregulado pelo mercado,
como propunham os liberais. Assim, ele defendia a intervenção estatal como um agente externo ao
mercado, com a finalidade de garantir o equilíbrio econômico e social.

O problema de distribuição estaria vinculado a um déficit de demanda


efetiva (por bens e serviços) no mercado, criado pela sobreoferta de força de
trabalho não absorvida pela esfera produtiva. Isto é, com o desenvolvimento
das forças produtivas (ou, na interpretação keynesiana, em função do ainda
insuficiente desenvolvimento), um contingente da população fica excluído
do mercado de trabalho, e ao não poder vender sua força de trabalho, não
tem fonte de renda que lhe permita adquirir no mercado bens e serviços
(MONTAÑO, 2012, p. 275).

Com a crise capitalista, a pressão dos trabalhadores por melhorias sociais e a ameaça socialista do
pós‑segunda guerra mundial, o Estado passou a implementar uma série de políticas sociais. Esse período,
segundo Montaño (2012), marca a responsabilização do Estado no tratamento da questão social, pois a
pobreza deixa de ser considerada como culpa do indivíduo e passa a ser considerada como um caso de
política. A transição para o Estado social nada mais é senão uma estratégia capitalista para inibir os conflitos
e o descontentamento da classe trabalhadora por meio da institucionalização das necessidades sociais.

A solução para a pobreza gerada no pós-crise 1929 estaria no investimento em políticas sociais de
pleno emprego, sob um sistema que ficou conhecido como o Estado de Bem‑Estar Social (Welfare State)
entre os anos de 1945‑1975, posto que se as pessoas tivessem empregos, logo teriam condições de
satisfazer suas necessidades sociais, diminuindo os problemas sociais a serem enfrentados pelo Estado.
Segundo Montaño, o Estado social precisaria intervir fundamentalmente nos seguintes aspectos:

• Responder a algumas necessidades (carências)/demandas dessa


população carente;

• Criar as condições para a produção e o consumo, incentivando a uma


contenção do desemprego ou uma transferência de renda (seguridade
social e políticas sociais) (MONTAÑO, 2012, p. 275).
20
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Lembrete

A política social passou a ser considerada como uma disciplina acadêmica


e se inscreveu no âmbito das chamadas ciências sociais, rompendo com a
concepção de administração social.

Na concepção de Behring e Boschetti (2010), não ocorreu necessariamente uma transição entre
o Estado liberal e o Estado social, uma vez que ambos reconhecem a assistência social como um
direito, sem colocar em pauta a gênese da questão social que está nos fundamentos do capitalismo.
Dessa forma, apesar de a história sinalizar uma transição para o Estado social, o que ocorre é apenas
a incorporação de orientações sociais democratas em um novo contexto socioeconômico de luta de
classes. Assim, há uma unanimidade entre os autores ao situar o final do século XIX como o marco da
atuação do Estado capitalista por meio de políticas sociais mais amplas, planejadas, sistematizadas e
de caráter obrigatório.

Para melhor compreensão do tema estudado até aqui, segue um quadro resumo condensando as
principais ações do Estado de combate à pobreza, ao passo que a assistência social transita da caridade
a um direito social, e a política pública de proteção social caracterizada como política de assistência
social vai se consolidando.

Quadro 1 – Síntese das ações do Estado de combate à pobreza

Cultura da pobreza

Século XVI Culpabilização do indivíduo


Problemas: educação, planejamento e comportamento
Protoformas da assistência social

Ações de caridade e filantropia


Caso de polícia

Século XIX Criminalização da pobreza


Vadiagem é uma ameaça à ordem
Ações de repressão e castigo aos pobres
Caso de política
Maior organização dos trabalhadores e pressão pelo reconhecimento de
Século XX direitos sociais
A questão social é internalizada pelo Estado
Políticas de assistência social

Adaptada de: Montaño (2012).

Em relação à cronologia histórica de legislações que deram origem à política de assistência social
brasileira, Behring e Boschetti (2010) pontuam que até dois anos antes da Proclamação da República
(1889) não existia nenhuma legislação social, e posteriormente, tem‑se o seguinte:

21
Unidade I

• 1888: Criação das Caixas de Socorro.

• 1889: Direito à pensão e a 15 dias de férias (para funcionários da imprensa nacional e ferroviários).

• 1891: Primeira legislação para assistência à infância.

• 1892: Direito à Pensão (funcionários da Marinha).

• 1907: Direito à Organização Sindical.

• 1911: Redução da jornada de trabalho para 12 horas diárias.

• 1923: Lei Eloy Chaves – Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) para ferroviários.

• 1927: Código de Menores.

Nesse sentido, a implementação da Lei Eloy Chaves é considerada um marco da formação da política
social brasileira, visto ter sido a primeira do país a institucionalizar a previdência social, que serviu de
base para a futura política de seguridade social.

O fundamental, nesse contexto do final do século XIX e início do século XX,


é compreender que nosso liberalismo à brasileira não comportava a questão
dos direitos sociais, que foram incorporados sob pressão dos trabalhadores
e com fortes dificuldades para sua implementação e garantia efetiva
(BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 81).

A introdução da política social brasileira ocorre durante o Estado Novo, entre os anos de 1930 a
1940, período pós‑crise que fez com que ampliasse a intervenção estatal no tratamento das expressões
da questão social. Tal fato marcou a dinâmica de desenvolvimento das políticas sociais, transitando da
caridade para o direito, sob uma perspectiva política mais universalizante.

No fim da década de 1930, o presidente Getúlio Vargas passou a implantar diversos programas de
assistência aos problemas sociais, prática comum nos governos desse período, e que ficou conhecida como
assistencialismo. Para Iamamoto e Carvalho (2003), a primeira legislação brasileira que responsabiliza o
Estado pelo atendimento e amparo aos pobres é a Carta Constitucional de 1934.

Assim, nota‑se que a política de assistência social começa a ser desenhada na década de 1940, com
a criação da LBA, a qual inicialmente era voltada para o atendimento das famílias dos convocados para a
guerra e, posteriormente, voltou‑se ao atendimento da população carente em geral, atuando como
uma instituição de organização e articulação da assistência social brasileira.

Importa ressaltar que no final dos anos 1940 é criada a teoria de Marshall, acerca dos direitos de
cidadania e dos serviços sociais públicos. Desse modo, conforme Pereira (2011), a cidadania é composta
por três grupos de direitos:
22
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

I – direitos civis (surgidos no século XVIII);

II – direitos políticos (surgidos no século XIX);

III – direitos sociais (surgidos no século XX).

Assim, pela concepção de Marshall, os direitos sociais se referem ao bem‑estar social e econômico
dos indivíduos, que nessas circunstâncias possuem capacidade plena de exercer a sua cidadania e só
assim serem considerados como cidadãos de direito.

Observação

A contribuição de Marshall para a política social está na emancipação


dos sujeitos sociais à cidadãos de direito, considerando o bem‑estar social
e econômico.

Figura 2 – Medalha da LBA

• 1944: Construção da sede da LBA na cidade do Rio de Janeiro.

• 1969: Decreto‑lei n. 593 que transforma a LBA em uma fundação vinculada ao Ministério do
Trabalho e Previdência Social.

• 1977: Lei n. 6.439 vincula a LBA ao Ministério da Previdência e Assistência Social.

• 1990: Decreto n. 99.244 vincula a LBA ao Ministério de Ação Social.

• 1995: Extinção da LBA pela Medida Provisória n. 813.


23
Unidade I

Observação

O amparo aos pobres mencionado na Constituição de 1934 e a


criação da LBA em 1942 são os precursores da política de assistência
social no Brasil.

Conforme Barbosa, do Estado Novo até a publicação da Constituição Federal de 1988, a assistência
social brasileira esteve vinculada a práticas clientelistas, ligadas à filantropia, por meio de intervenções
fragmentadas e descontinuadas.

Mesmo quando a “questão social” transita de um caso de polícia para


um caso de política – ou seja, quando o Estado assume o papel de
intervir nas expressões das desigualdades sociais – a assistência social
não foi “contemplada” como uma política social, resultante de relações
conflituosas, contraditórias, determinadas pela luta de classes, pelo
papel do Estado e sociedade, no marco das formações sociais de classe
(BARBOSA, 2010, p. 236).

Saiba mais

Para saber mais sobre a realidade das famílias que viviam em uma
periferia brasileira nos anos de 1960 a 1980, assista:

CIDADE de Deus. Dir. Fernando Meirelles. Brasil: O2 Filmes, 2002. 130 minutos.

3 CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMO SISTEMA AFIANÇADOR DE PROTEÇÃO SOCIAL

A Constituição Federal brasileira de 1988 instituiu no Brasil um relevante marco no processo


histórico de construção de um sistema afiançado de direitos humanos e sociais como responsabilidade
pública e estatal.

Conforme seu artigo 3º, constituem‑se objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: a
construção de uma sociedade livre, justa e solidária; garantia do desenvolvimento nacional; erradicação
da pobreza e da marginalização e redução das desigualdades sociais e regionais; promoção do bem de
todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação
(BRASIL, 1988).

Na emenda de 2010 da Constituição, o artigo 6º apresenta como direitos sociais a educação, a saúde,
a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade
e à infância e a assistência aos desamparados (BRASIL, 1988).

24
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Com a incorporação desses artigos e o reconhecimento do compromisso do Estado com o bem‑estar da


população, a Constituição Federal instaurou um novo paradigma para sociedade brasileira, introduzindo
o conceito de seguridade social, promovendo e garantindo uma vida digna a todos os cidadãos.

Segundo o artigo 194º, a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de


iniciativas dos poderes públicos e da sociedade que, destinado a assegurar os direitos relativos à saúde,
à previdência e à assistência social, traz para a responsabilidade do Estado, ainda, a competência de
organizar a seguridade social com base nos seguintes objetivos:

Quadro 2 – Objetivos da política de seguridade social brasileira

I – Universalidade da cobertura e do atendimento


II – Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais
Objetivos da política de
seguridade social

III – Seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços


IV – Irredutibilidade do valor dos benefícios
V – Equidade na forma de participação no custeio
VI – Diversidade da base de financiamento
VII – Caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão
quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e
do Governo nos órgãos colegiados (Emenda Constitucional n. 20, de 1988).

Adaptada de: Constituição Federal (1988).

A seguridade social preconizada na Constituição configura, assim, um sistema de proteção social:

[...] por meio do qual a sociedade proporcionaria a seus membros uma série de
medidas públicas contra as privações econômicas e sociais. Sejam decorrentes
de riscos sociais – enfermidade, maternidade, acidente de trabalho,
invalidez, velhice, morte, sejam decorrentes das situações socioeconômicas
como desemprego, pobreza ou vulnerabilidade, as privações econômicas e
sociais devem ser enfrentadas, pela via da política da seguridade social, pela
oferta pública de serviços e benefícios que permitam em um conjunto de
circunstâncias a manutenção de renda, assim como o acesso universal à
atenção médica e socioassistencial (JACCOUD, 2009, p. 62).

Composto pelo tripé da seguridade social, o sistema de proteção social proposto pela Constituição é
formado pela articulação das políticas sociais de saúde, previdência social e assistência social.

Constituição Federal – art. 194

Previdência social Saúde Assistência social

Política contributiva Proteção social não


contributiva - a quem
dela necessitar

Figura 3 – Tripé da seguridade social

25
Unidade I

Lembrete

A saúde é para todos, a previdência é para quem contribui e a assistência


social é para quem dela necessitar.

Cabe à política de saúde, conforme o art. 196, a garantia da universalidade, constituindo‑se em


direito de todos e dever do Estado, devendo ser ofertada por meio de políticas sociais e econômicas que
visem à redução do risco de doença e de outros agravos, bem como ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988).

A política de previdência social está organizada nos parâmetros do sistema de proteção social
contributiva, ou seja, são segurados somente os trabalhadores formais, que contribuem mensalmente
com valores incidentes sobre a remuneração. Atualmente, há também as categorias de contribuinte
individual, destinada aos trabalhadores autônomos ou de caráter eventual, ou seja, que exercem
atividades de forma não contínua e esporádica, sem subordinação e horário; e contribuinte facultativo,
destinada às pessoas maiores de 16 anos de idade que não exerçam atividades remuneradas que as
enquadre como segurado obrigatório da previdência social.

O direito ao benefício vincula‑se ao provimento de subsistência do beneficiário em caso de perda de


sua capacidade laborativa, como doença, invalidez, morte e idade avançada; proteção à maternidade,
proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; salário‑família e auxílio‑reclusão
para os dependentes dos segurados de baixa renda, pensão por morte do segurado, homem ou mulher,
ao cônjuge ou companheiro e dependentes (BRASIL, 1988).

Já a assistência social se insere na qualidade de proteção social não contributiva, ou seja, independe
de contribuição prévia à seguridade social e, segundo art. 203 da Constituição, será prestada a quem
dela necessitar, tendo como objetivos:

Quadro 3 – Objetivos da política de assistência social

I – A proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice


Objetivos da política de

II – O amparo às crianças e adolescentes carentes


assistência social

III – A promoção da integração ao mercado de trabalho


IV – A habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária
V – A garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora
de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei

Adaptada de: Brasil (1988).

26
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Cabe ressaltar que a introdução da política de assistência social no eixo da seguridade social, na
Constituição Federal, em 1988, ocorreu “mais pela decisão política do grupo de ‘transição democrática’
da denominada Nova República, período que marcou a passagem do final da ditadura militar
ao processo constituinte e reconstrução institucional do Estado de Direito”, que “analisou e propôs
a gestão da previdência social expurgada do que não era, stricto sensu , seguro social”; ou seja, a
“constituição político‑institucional da assistência social na seguridade social se deu pela negativa,
isto é, passou a ser campo de assistência social, o que não era da previdência social por não ser
benefício decorrente de contribuições prévias”. Dessa forma, a “introdução da função assistência
social como política de seguridade social não resultou de um processo político pela ampliação do
pacto social brasileiro” (SPOSATI, 2007, p. 445‑446).

No entanto, não se pode negar que o rebatimento dessa questão repercute na introdução de uma
nova concepção para essa política, que implica uma mudança de postura dos órgãos executores públicos,
principalmente após a implantação do Suas.

Embora, no início, ela tenha sido definida genericamente como “proteção à vida e à cidadania”,
isso já trouxe à tona a questão da discussão sobre o direito social e a universalidade de acesso. Porém,
muitas vezes, sua atuação tenha tomado o caráter de política complementar, e a redação do art. 203 da
Constituição Federal de 1988, “a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade
social” possibilite uma interpretação reducionista voltada às pessoas sem poder econômico, embora
pudéssemos analisar também que, “independente da contribuição”, nos remete à discussão sobre a
universalidade de acesso e direito social (ARAÚJO, 2009).

Dado o histórico conceitual da assistência social em nosso país, a tendência é a interpretação baseada
na primeira alternativa. Como analisa Nozabielli:

A imediata relação dessa expressão com a pobreza possibilitou que o


entendimento do campo da política de assistência social permanecesse
o mesmo. “Aliás, a lei havia escrito exatamente o que a assistência social
representava: uma política pobre para atender o pobre e a pobreza”
(NOZABIELLI, 2008, apud ARAÚJO, 2009, p. 51).

Entretanto, para efeito deste estudo, iremos nos orientar quanto à segunda interpretação descrita
anteriormente, ou seja, aquela relacionada à universalidade de acesso e direito social. Nesse sentido,
o reconhecimento da assistência social como política pública e dever do Estado propõe a ruptura
dos paradigmas e concepções conservadoras de caráter benevolente e assistencialista, prevendo a
garantia de financiamento com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195,
a descentralização político‑administrativa para estados e municípios, no que tange à coordenação e
execução dos programas, cabendo à esfera federal a coordenação e as normas gerais, segundo art. 204,
inciso I, e a participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das
políticas e no controle das ações em todos os níveis, segundo o inciso II (BRASIL, 1988).

27
Unidade I

Portanto:

Referir‑se à assistência social como um sistema de proteção social supõe


compreender que sua organização e desenvolvimento são configurados
historicamente, dadas as condições sociais, políticas e econômicas de uma
sociedade onde as relações sociais determinam em última instância sua
abrangência, complexidade e cobertura (ARAÚJO, 2009, p. 40).

Como afirmam Silva, Yazbek e Giovanni:

Os modernos sistemas de proteção social não são apenas respostas


automáticas e mecânicas às necessidades e carências apresentadas e
vivenciadas pelas diferentes sociedades. Muito mais do que isso, eles
representam formas históricas de consenso político, de sucessivas e
intermináveis pactuações que, considerando as diferenças existentes no
interior das sociedades, buscam, incessantemente, responder a, pelo menos,
três questões: quem será protegido? Como será protegido? Quanto de
proteção? (SILVA; YAZBEK; DI GIOVANNI, 2008, p. 18).

A PNAS de 2004 apresenta o significado da proteção social como sendo as formas:

institucionalizadas que as sociedades constituem para proteger parte ou o


conjunto de seus membros. Tais sistemas decorrem de certas vicissitudes
da vida natural ou social, tais como a velhice, a doença, o infortúnio, as
privações. [...] Neste conceito, também, tanto as formas seletivas de
distribuição e redistribuição de bens culturais (como os saberes), que
permitirão a sobrevivência e a integração, sob várias formas na vida social.
Ainda, os princípios reguladores e as normas que, com intuito de proteção,
fazem parte da vida das coletividades (BRASIL, 2004a, p. 31).

Segundo o texto da PNAS, a assistência social “configura‑se como possibilidade de reconhecimento


público da legitimidade das demandas de seus usuários e espaço de ampliação de seu protagonismo”
(BRASIL, 2004a, p. 31).

Desse modo, vai se delimitando o conceito de proteção social no âmbito da assistência social, como
consequência da política pública de alcance mais amplo:

Podendo organizar‑se não apenas para a cobertura de riscos sociais,


mas também para a equalização de oportunidades, o enfrentamento das
situações de destituição e pobreza, o combate às desigualdades sociais e a
melhoria das condições sociais da população (JACCOUD, 2009, p. 3).

Desse modo, “a política de assistência social, enquanto mediação entre Estado e sociedade,
é determinada pela relação entre as forças sociais e políticas na qual se funda e que repercute na
28
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

legitimidade do seu estatuto de política pública” (ARAÚJO, 2009, p. 41), principalmente por se tratar de
uma política não contributiva.

Segundo Sposati:

O âmbito de uma política social é resultante de um processo social,


econômico, histórico e político e, por consequência, flui das orientações
que uma sociedade estabelece quanto ao âmbito das responsabilidades — se
públicas ou privadas — para prover as necessidades de reprodução social. A
política social refere como dever de Estado e direito do cidadão as provisões
que têm provisão pública, isto é, aquelas que transitam da responsabilidade
individual e privada para a responsabilidade social e pública. É bom sempre
relembrar que o processo de reprodução social não é autônomo do processo
de produção social, assim, as demandas por proteção social têm relação
intrínseca com o modo de inserção do cidadão no processo produtivo e o
modo de produção da sociedade de mercado (SPOSATI, 2007, p. 437).

Importante não esquecer que a assistência social se instala em um campo social constituído por
iniciativas históricas advindas da compaixão, do altruísmo e de práticas religiosas voltadas ao exercício
do amor ao próximo e à caridade. Portanto, o primeiro desafio que é colocado para essa política se situa
na separação do campo público e as práticas privadas, para depois reconstruir novas formas de relação
entre um e outro (ARAÚJO, 2009). Nesse sentido, a assistência social não se desvinculou totalmente do
antigo caráter de benemerência.

É na correlação de forças sociais e políticas que são estabelecidos os padrões


de acesso a bens e serviços a serem viabilizados através das políticas
sociais, cuja densidade político‑emancipatória possibilita configurar‑se como
mecanismo de distribuição de riquezas (PAIVA, 2006 apud ARAÚJO, 2009, p. 41).

A perspectiva conservadora de nossa sociedade ainda confere à assistência social a concepção de


ajuda, atribuindo individualmente a responsabilidade pela situação vivenciada, destituindo, assim, a:

dimensão econômica e política, dificultando o seu reconhecimento como


política pública. [...] Associada à benevolência configurou‑se como uma prática
“natural” inerente à solidariedade entre indivíduos, com presença subsidiária do
Estado e reiterada pelo ideário neoliberal predominante na sociedade brasileira
que considera a proteção social do âmbito privado e não público. Agrega ainda
Mestriner (2001), que o reconhecimento das necessidades sociais pelo Estado
tem sido mediado por organizações privadas, “truncando a possibilidade de
efetivação da cidadania dos segmentos fragilizados” (MESTRINER, 2001 apud
ARAÚJO, 2009, p. 42).

As práticas privadas são, por natureza, individualizadas, já que se vinculam às missões estatutárias
de suas organizações e são dirigidas a algumas pessoas ou grupos. A ação pública, por seus princípios,
29
Unidade I

é destinada a todos e tem a responsabilidade de resolver, suprir e prover determinadas necessidades


sociais da população.

A introdução da assistência social no campo da seguridade social, na Constituição Federal de 1988,


atribui sua responsabilidade à primazia do Estado, por meio da “descentralização político‑administrativa,
cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal; e a coordenação e execução dos respectivos
programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social”
(BRASIL, 1988, art. 204, inciso I); e prevendo a “participação da população, por meio de organizações
representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis” (BRASIL, 1988,
art. 204, inciso II), impetrou uma redefinição da relação entre Estado e sociedade.

Essa redefinição vem sendo reiterada, desde então, nas legislações que norteiam as diretrizes da
política (Loas – Lei n. 8.742 de 1993, PNAS de 2004, Lei n. 12.435 de 2011, que altera a Lei n. 8.742).

Afirmar a existência de um campo de proteção social não contributiva e incluí‑lo sob a égide da
responsabilidade estatal significa aceitá‑lo como domínio da gestão pública, ou seja, uma área da ação
estatal de responsabilidade dos três entes federativos.

Dessa forma, o rompimento com as ações de caridade e da solidariedade em torno da assistência


social, previsto no âmbito da legislação, vislumbra um novo caminho de construções coletivas e de
responsabilidades atribuídas a cada segmento.

A inclusão da assistência social na seguridade social foi uma decisão


plenamente inovadora. Primeiro, por tratar esse campo como de conteúdo
da política pública, de responsabilidade estatal, e não como uma nova ação,
com atividades e atendimentos eventuais. Segundo, por desnaturalizar o
princípio da subsidiariedade, pelo qual a ação da família e da sociedade
antecedia a do Estado. O apoio a entidades sociais foi sempre o biombo
relacional adotado pelo Estado para não quebrar a mediação da religiosidade
posta pelo pacto Igreja‑Estado. Terceiro, por introduzir um novo campo em
que se efetivam os direitos sociais (SPOSATI, 2009, p. 14).

A promulgação da Loas formaliza a assistência social como política pública, reitera as diretrizes
propostas em 1988, pela Constituição Federal, como a descentralização político‑administrativa para
os estados, o Distrito Federal e os municípios; comando único das ações em cada esfera de governo;
a participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e
no controle das ações em todos os níveis; e a primazia da responsabilidade do Estado na condução da
política de assistência social em cada esfera de governo (BRASIL, 1993).

O comando único, previsto no inciso I do artigo citado, caracteriza‑se por:

um núcleo coordenador da política de assistência social em cada uma das


instâncias de governo vai pressupor a estruturação de um órgão executivo
próprio, articulado ao cumprimento das suas competências específicas – nos
30
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

níveis de normatização, regulamentação, planejamento, execução e avaliação


– devendo ser desenvolvidas em um processo integrado de cooperação e
complementaridade intergovernamental, que evite paralelismos e garanta
unidade e continuidade das ações (BRASIL, 2008a, p. 18).

Em relação ao financiamento, previsto no art. 28 da Loas, será constituído com recursos da União,
dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, das demais contribuições sociais previstas no art. 195
da Constituição Federal, além daqueles que compõem o Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS).

Dos empregadores Sobre a receita de concursos de


(incidente sobre a folha de Dos trabalhadores prognósticos
salários, o faturamento e o lucro)

Figura 4 – Financiamento da política de assistência social.

Observação

De acordo com o § 1º do art. 26 da Lei n. 8.212/91, concursos e


prognósticos são “todos e quaisquer concursos de sorteios de números,
loterias, apostas, inclusive as realizadas em reuniões hípicas, nos âmbitos
federal, estadual, do Distrito Federal e municipal” (BRASIL, 1991).

As organizações representativas, denominadas conselhos de assistência social, constituem‑se enquanto:

instâncias deliberativas, de caráter permanente e composição paritária


entre governo e sociedade civil, apontam para a democratização da
gestão, confrontando o modelo centralizado e tecnocrático existente,
introduzindo a possibilidade de ampliar os espaços decisórios e o controle
social, através de um sistema aberto à participação da sociedade civil
(BRASIL, 2008a, p. 18).

Saiba mais

Sobre o financiamento da assistência social, leia:

BRASIL. Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome.


Subsecretaria de Planejamento e Orçamento. Coordenação‑geral de
Planejamento e Avaliação. Nota técnica: financiamento da assistência
social no Brasil. Brasília, 2010. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/
webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Nota_Tecnica_
Financiamento.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2019.
31
Unidade I

Vimos até aqui que o gestor público deve deslocar sua preocupação da ação dos processos de ajuda
às entidades sociais e se responsabilizar diretamente por criar soluções e respostas às necessidades de
proteção social da população. Sendo assim, cabe definir no que se constitui afinal a proteção social.

O sentido da palavra proteção (protectione, do latim) supõe defesa de algo, amparo, socorro, apoio,
guarda. Remete à ideia de preservação, de impedimento e de segurança. A partir desse conceito, a
política de assistência social preconiza e afiança seu sistema de proteção social, na garantia da segurança
necessária à sobrevivência, rendimento, autonomia, acolhida, convívio e vivência familiar e comunitária.

Sposati complementa:

A ideia de proteção social exige forte mudança na organização das atenções,


pois implica superar a concepção de que se atua nas situações só depois de
instaladas, isto é, depois que ocorre uma desproteção. A aplicação ao termo
“desproteção” destaca o usual sentido de ações emergenciais, historicamente
atribuído e operado no campo da assistência social. A proteção exige que se
desenvolvam ações preventivas (SPOSATI, 2009, p. 21).

O resultado desse processo foi a materialização da construção coletiva do redesenho dessa política,
proposto pela PNAS de 2004, na perspectiva de implementação do Suas, fruto do cumprimento das
deliberações da IV Conferência Nacional de Assistência Social, realizada em Brasília, em dezembro de
2003. Em 23 de junho de 2004, o MDS, por intermédio da Secretaria Nacional de Assistência Social
(SNAS), apresentou a versão preliminar do texto, que foi:

amplamente divulgada e discutida em todos os estados brasileiros nos


diversos encontros, seminários, reuniões, oficinas e palestras que garantiram
o caráter democrático e descentralizado do debate envolvendo um grande
contingente de pessoas em cada estado deste país. Este processo culminou
com um amplo debate na Reunião Descentralizada e Participativa do CNAS
realizada entre os dias 20 e 22 de setembro de 2004, em que foi aprovada,
por unanimidade, por aquele colegiado (BRASIL, 2004a, p. 11).

A partir de então, esforços foram conjugados no sentido de avançar progressivamente na construção


do Suas, integrado pelos entes federativos, pelos respectivos conselhos de assistência social e pelas
entidades e organizações de assistência social, sendo que a instância coordenadora da PNAS, nesse
período, foi o MDS (BRASIL, 2011f). Desde 1º de janeiro de 2019, é chamado de Ministério da Cidadania.

Apesar de a política de assistência social estar direcionada à proteção em situações em que a


ausência de renda e o acesso a bens e serviços podem agravar as situações de riscos e vulnerabilidades,
o seu caráter relacional, ou seja, o fato de proteger também as violações oriundas das relações familiares
e comunitárias faz com que tenha uma amplitude para além do corte de renda das populações que
poderão utilizar seus serviços. Por isso, adquire um caráter de política pública e tem como um de
seus princípios a universalidade de acesso. Nesse sentido, podemos dizer que a frase “para quem dela
necessitar” não se refere à parcela da população pobre ou excluída socialmente.
32
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Um dos requisitos da proteção social a que ela está relacionada faz menção aos conceitos de
prevenção, base da sua atuação nos territórios de vulnerabilidade. Portanto, podemos entender que:

prevenir significa dar condições para o enfrentamento de uma situação que


pode prejudicar algo ou alguém, antes que ela se instale, demonstrando a
possibilidade de deslocamento da condição mais frágil, vulnerável, para a
condição mais forte, protegido (ARAÚJO, 2009, p. 54).

A condição de estar protegido significa, segundo Sposati (2007), ter uma capacidade de
enfrentamento e resistência para impedir que as agressões, precarizações ou privações da vida e das
relações estabelecidas entre os pares deteriorem nossa condição de cidadão, sujeito de direitos, ser
humano, porém, “estar protegido não é uma condição inata, ela é adquirida não como mera mercadoria,
mas pelo desenvolvimento de capacidades e possibilidades” (SPOSATI, 2007, p. 17).

A PNAS define como público usuário da assistência social cidadãos e grupos que se encontram em
situações de vulnerabilidade e riscos, tais como:

famílias e indivíduos com perda ou fragilidade de vínculos de afetividade,


pertencimento e sociabilidade; ciclos de vida; identidades estigmatizadas
em termos étnico, cultural e sexual; desvantagem pessoal resultante de
deficiências; exclusão pela pobreza e, ou, no acesso às demais políticas
públicas; uso de substâncias psicoativas; diferentes formas de violência
advinda do núcleo familiar, grupos e indivíduos; inserção precária ou não
inserção no mercado de trabalho formal e informal; estratégias e alternativas
diferenciadas de sobrevivência que podem representar risco pessoal e social
(BRASIL, 2004a, p. 33).

“O conceito de vulnerabilidade social adotado pela PNAS é multidimensional, abrangendo não


somente a ausência ou insuficiência de renda, mas situações excludentes e discriminatórias processadas
nas relações sociais” (ARAÚJO, 2009, p. 55).

Analisamos, assim, a partir dos estudos de Oliveira (1995, apud ARAÚJO, 2009), que a vulnerabilidade,
ainda que deva ser a base material para seu mais amplo enquadramento, é insuficiente e incompleta, porque
não especifica as condições pelas quais se ingressa no campo dos vulneráveis, existindo outras
situações para além da ausência de renda que atingem os grupos étnico‑raciais, as mulheres, os grupos
indígenas, os trabalhadores rurais, os nordestinos, entre outros. Dessa forma, os autores citados situam
as vulnerabilidades sociais no campo das relações sociais, e suas compreensões devem perpassar “pela
ação de outros agentes sociais e que devem ser enfrentadas por meio das políticas públicas, sendo
fundamental situá‑las no campo dos direitos, como diz Oliveira, ‘retirando‑as da conceituação de
carências’” (ARAÚJO, 2009, p. 55).

Para concluir, Araújo (2009) ressalta que as respostas à totalidade das demandas não são de exclusiva
atribuição da assistência social.

33
Unidade I

4 POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL

Conforme demonstrado, a política de assistência social brasileira é efetivamente consolidada como


um direito social a partir da promulgação da Carta Constitucional de 1988.

Trata‑se, portanto, de uma política que visa promover a seguridade social de todo cidadão brasileiro,
e que pode ser entendida como um amplo sistema de proteção social, o qual deve ser implementado de
maneira intersetorial e com equipes de atendimento interdisciplinares.

Entretanto, nota‑se a existência de um lapso temporal entre a divulgação da Constituição de 1988 e


a regulamentação da política de assistência social, pois somente em 1993 (cinco anos depois) foi criada
uma lei de regulamentação para a assistência social, a Loas. Vale a pena ressaltar que nesse ínterim, a
assistência social continuou sendo implementada pela LBA, até a sua extinção em 1995.

Em seguida, foi preciso aguardar mais onze anos até a consolidação da PNAS no ano de 2004, a
qual foi sequenciada em 2005 pelo Suas. Em uma linha cronológica, tem‑se que a política de assistência
social brasileira foi consolidada a partir das seguintes (principais) conquistas:

2005 - Sistema Único de


Assistência Social (Suas)

1993 - Lei Orgânica de


Assistência Social (Loas)
2004 - Política
Nacional de
Assistência Social
(PNAS)

1988 - Política
de Seguridade
Social na CF/88

Figura 5 – Trajetória da implementação da política de assistência social

Conforme exposto, a assistência social rompeu com o viés caritativo e filantrópico ao se tornar um
direito social pautado na Constituição Federal da República Brasileira. Tal fato consagrou a instituição
de uma política social de proteção social aos cidadãos, a partir de uma perspectiva de seguridade social
ampliada e de responsabilização do Estado pelo tratamento das desigualdades sociais.

Lembrete

A política de assistência social brasileira teve influência do modelo


beveridgiano, o qual previa a universalização dos serviços sociais e a
implantação uma rede de segurança em forma de serviços de assistência
social (BEHRING; BOSCHETTI, 2010).

34
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Em 6 de julho de 2011, o Suas se materializa efetivamente, por meio da Lei n. 12.435, que altera
a Loas, Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993, dispondo sobre a organização da assistência social a
partir de então.

Na Lei n. 8.742, de 1993, o art. 2º apresentava a seguinte redação:

I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;

III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;

IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a


promoção de sua integração à vida comunitária;

V – a garantia de 1 (um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa


portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover
a própria manutenção ou de tê‑la provida por sua família (BRASIL, 1993).

Com a Lei n. 12.435, de 2011, sofre alteração conforme apresentado a seguir, em que os incisos I, II
e III têm nova redação, e no inciso I as alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, e “e” são incluídas.

Assim, passa a ser objetivo da assistência social, conforme art. 2º da Lei n. 12.435:

I – a proteção social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à


prevenção da incidência de riscos, especialmente

a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes;

c) a promoção da integração ao mercado de trabalho;

d) a habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência e a promoção de


sua integração à vida comunitária; e

e) a garantia de 1 (um) salário‑mínimo de benefício mensal à pessoa com


deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção ou de tê‑la provida por sua família;

II – a vigilância socioassistencial, que visa a analisar territorialmente a


capacidade protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulnerabilidades, de
ameaças, de vitimizações e danos;

35
Unidade I

III – a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos direitos no
conjunto das provisões socioassistenciais.

Parágrafo único. Para o enfrentamento da pobreza, a assistência social


realiza‑se de forma integrada às políticas setoriais, garantindo mínimos
sociais e provimento de condições para atender contingências sociais e
promovendo a universalização dos direitos sociais (BRASIL, 2011g).

O art. 4º da Loas apresenta os princípios dessa política, que serão abordados posteriormente:

I – supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências


de rentabilidade econômica;

II – universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da


ação assistencial alcançável pelas demais políticas públicas;

III – respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito


a benefícios e serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e
comunitária, vedando‑se qualquer comprovação vexatória de necessidade;

IV – igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem discriminação


de qualquer natureza, garantindo‑se equivalência às populações urbanas
e rurais;

V – divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos


assistenciais, bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público e dos
critérios para sua concessão (BRASIL, 2011g).

Seu art. 5º apresenta as diretrizes da política de assistência social, regulamentando seu direcionamento
e instrumentais, na perspectiva das legislações especificas dessa política: a Loas, a PNAS e o Suas. Nesse
sentido, tem‑se o seguinte:
I – descentralização político‑administrativa para os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios, e comando único das ações em cada esfera de governo;

II – participação da população, por meio de organizações representativas, na


formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis;

III – primazia da responsabilidade do Estado na condução da política de


assistência social em cada esfera de governo (BRASIL, 2011g).

Trata‑se, sobretudo, de uma política social do tipo pública, que visa garantir a proteção social
de frações da classe trabalhadora que se encontram em situação de vulnerabilidade e risco social e
necessitam da intervenção do Estado para garantir as condições básicas de bem‑estar social.

36
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

A elevação da assistência social como um direito vem avançando e amadurecendo ao longo de três
décadas. A análise cronológica das principais conquistas normativas permite uma melhor visualização
desse processo, conforme o disposto abaixo:

• 1988: política de seguridade social na Constituição Federal de 1988.

• 1993: Loas.

• 2004: PNAS.

• 2005: o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) referenda o Suas.

• 2011: Loas incorpora legislativamente a PNAS e o Suas.

Ante ao exposto, o aluno pode vir a se questionar, mas dentro desse contexto da assistência social:
“o que é a Loas?”; “o que é a PNAS?”; “o que é o Suas?”; “qual a diferença entre esses instrumentos
normativos?”. Assim, apresenta‑se um quadro síntese que demonstra a processualidade dos
instrumentais da política de assistência social brasileira.

Lei Orgnânica de Sistema Único de


Assistência Social Assistência Social
(Loas) (Suas)
Estabelece como Regulamenta a Estabelece princípios
e diretrizes para Organiza as ações
direito social: política de assistência da assistência em
saúde, previdência e social e estabelece implementação do
Suas proteção social: básica
assistência social normas e critérios de e especial
sua organização
Política Nacional de
Política de
Assistência Social
seguridade social
(PNAS)

Figura 6 – Legislação que insere a assistência social como política pública

Conforme o disposto na figura acima, a principal diferença entre cada normativa consiste no fato
de que:

I – a política de seguridade social estabelece a assistência social como um direito de todo


cidadão brasileiro;

II – a Loas vai regulamentar a política de assistência social, estabelecendo normas e critérios para a
sua organização, e cria o CNAS;

III – a PNAS é o documento que estabelece os princípios e diretrizes para a implementação do Suas;

IV – o Suas são as diretrizes que vão organizar as ações da política social de assistência e cria a
Norma Operacional Básica (NOB/SUAS).

37
Unidade I

Todas as normativas apresentadas anteriormente contribuem para a regulamentação da política de


assistência social, e são mecanismos fundamentais para que se tenha clareza sobre o funcionamento
das instâncias de execução da política e no fazer profissional do assistente social, a fim de promover os
direitos sociais dos usuários.

Considerada uma política de assistência social nos dias atuais, levando em conta que em 6 de julho
de 2011, o Suas se materializa efetivamente por meio da Lei n. 12.435, que altera a Loas, Lei n. 8.742,
dispondo sobre a organização da assistência social a partir de então.

Passa a ser objetivo da assistência social, conforme artigo 2, desta Lei:

I – a proteção social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à


prevenção da incidência de riscos, especialmente: (Redação dada pela Lei
n. 12.435, de 2011)

a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;


(Incluído pela Lei n. 12.435, de 2011)

b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes; (Incluído pela Lei


n. 12.435, de 2011)

c) a promoção da integração ao mercado de trabalho; (Incluído pela Lei


n. 12.435, de 2011)

d) a habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência e a promoção de


sua integração à vida comunitária; e (Incluído pela Lei n. 12.435, de 2011)

e) a garantia de 1 (um) saláriomínimo de benefício mensal à pessoa com


deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção ou de têla provida por sua família; (Incluído pela Lei n. 12.435,
de 2011) (BRASIL, 2011g).

A PNAS, publicada em 2004, e a NOB/Suas, de 2005, afirmam que a proteção social a ser assegurada
pela política de assistência social:

ocupa-se de prover proteção à vida, reduzir danos, monitorar populações


em risco e prevenir a incidência de agravos à vida em face das situações
de vulnerabilidade. A proteção social de assistência social se ocupa das
vitimizações, fragilidades, contingências, vulnerabilidades e riscos que
o cidadão, a cidadã e suas famílias enfrentam na trajetória de seu ciclo
de vida, por decorrência de imposições sociais, econômicas, políticas e de
ofensas à dignidade humana (BRASIL, 2005, p. 89).

Quando se fala em riscos no âmbito da política de assistência social, sendo fundamental delimitar
o que precisa ser entendido como situação de risco social no âmbito desta política, e em quais
circunstâncias se dão suas ocorrências, uma vez que a sociedade capitalista pós-moderna está vulnerável
38
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

às consequências das ações humanas e ambientais e, portanto, a compreensão sobre o conceito de risco
deve permear toda a leitura da realidade do tecido social.

Sposati analisa que há de se considerar as expressões de risco e vulnerabilidade social a partir de


seguranças sociais afetas à proteção social não contributiva (de caráter socioassistencial), pois “não
são todas as necessidades humanas de proteção que estão para a resolutividade da assistência social,
como também não são as necessidades de proteção social dos pobres que aqui são consideradas como
específicas da assistência social” (SPOSATI, 2009, p. 33).

Para a delimitação da abrangência da política de assistência social, Sposatti caracteriza “os riscos
sociais a serem enfrentados pela política de assistência social conforme a natureza do ciclo de vida, a
dignidade humana, e a equidade” e afirma que “aprofundar essas dimensões permite a oferta de serviços
apropriados para responder a tais situações reduzindo danos e restaurando vidas” (SPOSATTI, 2009, p. 33).

Esclarece que, embora:

riscos e contingências sociais afetem ou possam afetar todos os cidadãos,


as condições que caracterizam o padrão de vulnerabilidade social para
enfrentá-los e superá-los são diferenciadas entre esses cidadãos, por
decorrência da sua condição de vida e da ocorrência da cidadania precária,
que lhes retira condições de enfrentamento a tais riscos com seus próprios
recursos. Assim, as sequelas da vivência desses riscos e as vulnerabilidades
em enfrentá-los e superá-los podem ser mais ampliadas para uns do que
para outros (SPOSATI, 2009, p. 32).

A partir dessa caracterização de risco, se apresenta um conteúdo substantivo, um adjetivo e outro temporal.

O conteúdo substantivo diz explicitamente o que é o risco. Essa noção


imediatamente leva à sua abordagem temporal: o antes, que se ocupa das
causas do risco, e o depois, que se ocupa dos danos, sequelas, perdas que
provoca. Há, porém, uma questão adjetiva, que vai se tornar fundamental
para o desenho da política e diz respeito à graduação do risco. A vivência do
risco pode proporcionar sequelas mais ou menos intensas, por decorrência
da vulnerabilidade/resistência dos que sofrem o risco, como também do
grau de agressão vital do próprio risco (SPOSATI, 2009, p. 29).

Perceba que no art. 2º da Loas, conjuntamente com a noção de riscos sociais, aparece a noção de
vulnerabilidade social, a qual se entende como sendo a materialização das situações decorrentes da:

situação de vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação (ausência


de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos, dentre outros) e,
ou, fragilização de vínculos afetivos – relacionais e de pertencimento social
(discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências, dentre outras)
(BRASIL, 2004a, p. 33).
39
Unidade I

Perceba que a “vulnerabilidade social não é só econômica, ainda que os de menor renda sejam mais
vulneráveis pelas dificuldades de acesso aos fatores e condições de enfrentamento a riscos e agressões
sociais” (SPOSATI, 2009, p. 34).

Sposati (2009) afirma que a vulnerabilidade, assim como o risco, também tem processos de agravos
e que pensar a política de assistência social abrangendo os mais e os menos vulneráveis significa pensar
nas pessoas e/ou grupos mais e menos sujeitos a um risco, ou naqueles a serem mais, ou menos, afetados
quando a ele expostos. Nesse sentido, cabe identificar etapas de agravamento das situações: o das
fragilidades e o da incapacidade em operar potencialidades humanas individuais e coletivas.

Sendo assim, atuar com vulnerabilidades significa reduzir fragilidades


e capacitar as potencialidades. Esse é o sentido educativo da proteção
social, que faz parte das aquisições sociais dos serviços de proteção. O
olhar da vulnerabilidade não pode ser só da precariedade, mas também
o dimensionamento da capacidade ou, como tenho proferido, da
resiliência, isto é, da capacidade de resistência a confrontos e conflitos
(SPOSATI, 2009, p. 35).

Partindo desses indicativos, a política de assistência social foi idealizada considerando o


trabalho preventivo das situações de riscos e vulnerabilidades e na graduação e hierarquização
da ocorrência dessas situações, constituindo, assim, níveis de proteção a serem afiançados pela
política, conforme a:

escala do agravamento e o grau do vínculo de pertencimento ao


convívio familiar que vão definir se o trabalho com a família partirá do
seu domicílio ou se serão adotados espaços substitutos, permanentes
ou temporários, desse convívio, quando irremediavelmente precário
(SPOSATI, 2009, p. 36).

Vulnerabilidades
diante das ocorrências
– fragilidades (ausência
de vínculos afetivos
familiares e comunitários
e incidência da ausência
de recursos físicos,
materiais e financeiros)
Riscos diante das
ocorrências, falta
de potência para
vencer as fragilidades
que expõem
Situações vulnerabilidade
de vivências
individuais e
coletivas

Figura 7 – Perspectiva das situações que levam à vulnerabilidade e riscos sociais

40
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Segundo Sposati (2009), o planejamento da proteção social considerou dados de precarização e


potencialidade dos indivíduos e das famílias, o diagnostico territorial de onde ocorrem essas incidências,
a oferta de serviços, programas, projetos, benefícios disponíveis para os usuários, entre outros indicadores,
pensando em uma oferta de trabalho da política de assistência social para que se efetive a prevenção e
a redução dos “danos provocados por riscos, isto é, diminui o possível efeito de deterioração que poderá
causar uma futura vivência de risco” (SPOSATI, 2009, p. 36).

Pensar na abrangência da política de assistência social, para Sposati (2009, p. 24) deduz que essa
política se coloca no campo da defesa da vida relacional, se alinhando “como política de defesa de
direitos humanos”. Segundo a autora, “defender a vida, independentemente de quaisquer características
do sujeito, como é o caso da saúde, é também um preceito que a orienta” (p. 24-25).

A política de assistência social requer especial atenção e intervenção ao enfrentamento e prevenção


das formas de agressão à vida, no sentido relacional, social e ético. A assistência social se coloca,
portanto, no campo da defesa da vida relacional (individual, entre pares e coletivo). Segundo Sposati, as
principais agressões à vida relacional se relacionam aos campos:

• Do isolamento, em suas expressões de ruptura de vínculos, desfiliação,


solidão, apartação, exclusão, abandono. Todas essas expressões
reduzem em qualquer momento do ciclo de vida as possibilidades
do sujeito, e sua presença agrava a sobrevivência e a existência nos
momentos em que ocorrem maiores fragilidades no ciclo de vida: a
infância, a adolescência e a velhice [...].

• Da resistência à subordinação, em suas expressões de coerção, medo,


violência, ausência de liberdade, ausência de autonomia, restrições
à dignidade [...].

• Da resistência à exclusão social, em todas as suas expressões de


apartação, discriminação, estigma, todos distintos modos ofensivos
à dignidade humana, aos princípios da igualdade e da equidade [...]
(SPOSATI, 2009, p. 25).

Figura 8 – Retrato da exclusão social

41
Unidade I

Com base nos preceitos aqui descritos, e pela figura anterior, a violação de direitos pode se expressar
por meio de situações que representem fragilidade, vulnerabilidade ou iminência, ou ocorrência de
situações que abalam as condições de autonomia e protagonismo das pessoas, o convívio familiar e
comunitário, bem como o exercício da cidadania.

Essas situações podem se expressar em ocorrências de violência intrafamiliar física, psicológica,


abandono, negligência, abuso e exploração sexual; situação de rua; atos infracionais; trabalho infantil;
afastamento do convívio familiar e comunitário; e situações de isolamento social. São situações
vivenciadas por indivíduos, famílias e comunidades. Alguns segmentos da população, dado seu momento
peculiar de vida, podem gerar maior vulnerabilidade tal como em pessoas idosas, crianças, adolescentes,
jovens, mulheres, negros, pessoas com deficiência, indígenas e população de lésbicas, gays, bissexuais,
travestis e intersexuais (LGBTI+).

Portanto, segundo a autora, trabalhar situações de risco supõe “conhecer as incidências, as


causalidades, as dimensões dos danos para estimar a possibilidade de reparação e superação, o grau de
agressão do risco, o grau de vulnerabilidade/resistência ao risco” (SPOSATI, 2009, p. 29).

Figura 9 – Diversidade populacional em luta por garantia de direito à dignidade

Compreender a assistência social como um sistema de proteção social pressupõe reconhecer que
sua organização e dinamicidade foram configuradas historicamente, como mencionado anteriormente,
dadas as condições econômicas, políticas, sociais e culturais dessa sociedade, em que as relações sociais
determinaram e determinam sua abrangência, complexidade e cobertura.

Os modernos sistemas de proteção social não são apenas respostas automáticas


e mecânicas às necessidades e carências apresentadas e vivenciadas pelas
diferentes sociedades. Muito mais do que isso, eles representam formas históricas
de consenso político, de sucessivas e intermináveis pactuações que, considerando
as diferenças existentes no interior das sociedades, buscam, incessantemente,
responder a, pelo menos, três questões: quem será protegido? Como será
protegido? Quanto de proteção? (SILVA; YAZBEK; DI GIOVANNI, 2004, p. 16).

Definir o campo de atuação da política de assistência social envolve traçar um perfil das mazelas
e das desigualdades produzidas pela sociedade brasileira; portanto, a proteção social consiste:
42
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

no conjunto de ações, cuidados, atenções, benefícios e auxílios ofertados


pelo Suas para redução e prevenção do impacto das vicissitudes sociais
e naturais ao ciclo da vida, à dignidade humana e à família como núcleo
básico de sustentação afetiva, biológica e relacional (BRASIL, 2005, p. 90).

A definição apresentada delimita o campo de atuação dessa política e esclarece a compreensão das
determinações sócio‑históricas das vulnerabilidades e riscos sociais e como efetivar o enfrentamento
para se galgar a condição de direito social. Diante do cenário econômico, político e social brasileiro, que
se mostra um tecido social com grandes desigualdades sociais, pode se configurar como uma política
social de amplo alcance:

podendo organizar-se não apenas para a cobertura de riscos sociais,


mas também para a equalização de oportunidades, o enfrentamento das
situações de destituição e pobreza, o combate às desigualdades sociais e a
melhoria das condições sociais da população (JACCOUD, 2009, p. 60).

Esses conceitos apresentados não são estáticos e únicos, pelo contrário, as especificidades de
cada território, a cultura, as circunstâncias políticas, a realidade econômica local e, principalmente,
dos contextos sócio‑históricos de cada indivíduo, família e comunidade são fundamentais para o
planejamento das ações.

Diante de tantas emergências, isoladamente, a política de assistência social não pode abarcar toda a
demanda complexa dessa realidade. Assim sendo, tecer caminhos e possibilidades que buscam efetivar
a proteção, garantia e a preservação dos direitos sociais requer um trabalho que envolva uma ação
intersetorial e interdisciplinar, que envolvam os saberes de diversas áreas do conhecimento científico, ou
seja, uma construção coletiva pelo conjunto de políticas públicas e sociais envolvendo a regionalidade
de cada território. Conforme Santos nos esclarece:

Uma política efetivamente redistributiva, visando a que as pessoas não sejam


discriminadas em função do lugar onde vivem, não pode, pois, prescindir
do componente territorial. É a partir dessa constatação que se deveria
estabelecer como dever legal – e mesmo constitucional – uma autêntica
instrumentação do território que a todos atribua, como direito indiscutível,
todas aquelas prestações sociais indispensáveis a uma vida decente e que
não podem ser objeto de compra e venda no mercado, mas constituem um
dever impostergável da sociedade como um todo e, neste caso, do Estado
(SANTOS, 2007, p. 141).

A complexidade do cenário social exige, especialmente dos gestores da política de assistência social,
dinamicidade e diagnóstico socioterritorial de cada município, estado, distrito federal e da União,
considerando suas relações culturais, políticas, econômicas e, principalmente, seus contextos históricos
individuais, familiares e comunitários. A desigualdade social é refletida em cada território e desenhada
pelas relações sociais e humanas expressadas por diversos problemas sociais que inferem atenção e não
deve ser vista apenas como o:
43
Unidade I

resultado da superposição de um conjunto de sistemas naturais e um conjunto


de sistemas de coisas criadas pelo homem. O território é o chão e mais a
população, isto é, uma identidade, o fato e o sentimento de pertencer àquilo
que nos pertence. O território é a base do trabalho, da residência, das trocas
materiais e espirituais e da vida, sobre os quais ele influi. Quando se fala de
território, devese, pois, logo entender que está se falando de território usado,
utilizado por uma população (SANTOS, 2000 apud PAPALI, 2008, p. 54).

Sendo assim, cabe ao gestor do Estado propor políticas públicas, especialmente a de assistência
social, não considerando apenas as metas setoriais a partir de demandas ou necessidades genéricas:

mas identificar os problemas concretos, as potencialidades e as soluções, a


partir de recortes territoriais que identifiquem conjuntos populacionais em
situações similares, e intervir através das políticas públicas, com o objetivo de
alcançar resultados integrados e promover impacto positivo nas condições
de vida (BRASIL, 2004a, p. 44).

A definição do território, segundo o autor, não perpassa simplesmente pela delimitação geográfica,
mas deve considerar o modo de vida das pessoas que o habitam, suas potencialidades e suas necessidades.
Por consequência:

a perspectiva territorial exige a construção integrada de conhecimentos,


diagnósticos, ações e responsabilidades, não como somatório, mas na
perspectiva da produção de novas sinergias que potencializem o desempenho
de programas e serviços públicos, retirando cada ação específica do seu
isolamento, para conectá-la a totalidades dinâmicas e interdependentes
(RAICHELIS, 2008, p. 212 apud SILVA, 2012, p. 39).

Aspectos
econômicos

Demográficos,
Historicidade epistemológicos e
tecnológicos

Território

Relações Aspectos políticos e


de poder administrativos

Aspectos
socioculturais

Figura 10 – Território como espaço histórico em construção

44
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Na NOB/Suas, o princípio da territorialização atribui o “reconhecimento da presença de múltiplos


fatores sociais e econômicos, que levam o indivíduo e a família a uma situação de vulnerabilidade, risco
pessoal e social” (BRASIL, 2005, p. 91). Como consequência, esse princípio possibilita orientar a proteção
social de assistência social:

• na perspectiva do alcance de universalidade de cobertura entre


indivíduos e famílias, sob situações similares de risco e vulnerabilidade;

• na aplicação do princípio de prevenção e proteção proativa, nas ações


de assistência social;

• no planejamento da localização da rede de serviços, a partir dos territórios


de maior incidência de vulnerabilidade e riscos (BRASIL, 2005, p. 91).

Assim sendo, existe uma conexão entre a questão do território e a articulação dos serviços ofertados
no território, constituindo assim um grande desafio para a gestão das políticas sociais, que veremos
posteriormente. Por agora, nossa atenção está na perspectiva que a PNAS busca implementar, ou
seja, a concepção da assistência social como política pública que tem como principais pressupostos a
territorialização, a descentralização e a intersetorialidade (BRASIL, 2004a, p. 44).

Assim, a operacionalização da política de assistência social em rede, com base


no território, constitui um dos caminhos para superar a fragmentação na
prática dessa política. Trabalhar em rede, nessa concepção territorial, significa
ir além da simples adesão, pois há necessidade de se romper com velhos
paradigmas, em que as práticas se construíram historicamente pautadas na
segmentação, na fragmentação e na focalização, e olhar para a realidade,
considerando os novos desafios colocados pela dimensão do cotidiano, que
se apresenta sob múltiplas formatações, exigindo enfrentamento de forma
integrada e articulada (BRASIL, 2004a, p. 4445).

Intersetorialidade – Sistemas de garantias de direitos


CMAS - FMAS
CMDCA-FMDCA Promoção CMS
CME Nota: Conselho Municipal
Conseg dos Direitos da Criança e do
Esportes Suas Proteção Adolescentes (CMDA); Fundo
Municipal dos Direitos da
Controle social

Criança e do Adolescente
3 esferas do

(FMDCA); Conselho Municipal


governo

Sujeito de Assistência Social


Educação social SUS
(CMAS); Fundo Municipal de
Assistência Social (FMAS);
Conselho Municipal de
Sistema Saúde (CMS); Conselho
Cultura judiciário Habitação Municipal de Educação (CME);
Coordenadoria Estadual dos
Conselhos Comunitários de
Municipalização Defesa Financiamento Segurança (Conseg).

Figura 11 – Rede intersetorial de políticas e atenção a indivíduos, famílias e comunidades

45
Unidade I

Fortalecidos nessa perspectiva de atuação intersetorial e interdisciplinar, e reconhecendo a dinâmica


territorial de cada município, estabelecendo‑se critérios de recursos financeiros conforme população
abrangente em cada município:

de acordo com seu porte demográfico associado aos indicadores


socioterritoriais disponíveis a partir dos dados censitários do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, com maior grau de desagregação
territorial quanto maior a taxa de densidade populacional, isto é, quanto
maior concentração populacional, maior será a necessidade de considerar
as diferenças e desigualdades existentes entre os vários territórios de um
município ou região. [...] Porém, faz-se necessária a definição de uma
metodologia unificada de construção de alguns índices (exclusão/inclusão
social, vulnerabilidade social) para efeitos de comparação e definição de
prioridades da Política Nacional de Assistência Social (BRASIL, 2004a, p. 45).

Assim, a PNAS utiliza como referência a definição de municípios de pequeno, médio e grande porte
sobre desigualdades socioespaciais intraurbanas e o contexto específico das metrópoles.

Quadro 4

Tipo intraurbano
A
Áreas ricas
B
Boas condições de vida
C Melhores condições
D de vida
E
Médias ou medianas condições de vida
F
G
Baixas condições de vida
H
Piores condições
I de vida
Baixíssimas condições de vida
J
K Precárias condições de vida

Adpatado de: IBGE (2012).

Sendo que a divisão territorial adotada pela PNAS foi a seguinte:

• Municípios de pequeno porte 1 – entende-se por município de


pequeno porte 1 aquele cuja população chega a 20.000 habitantes
(até 5.000 famílias em média). Possuem forte presença de população
em zona rural, correspondendo a 45% da população total. Na maioria
das vezes, possuem como referência municípios de maior porte,
pertencentes à mesma região em que estão localizados. Necessitam
de uma rede simplificada e reduzida de serviços de proteção social

46
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

básica, pois os níveis de coesão social, as demandas potenciais e redes


socioassistenciais não justificam serviços de natureza complexa. Em
geral, esses municípios não apresentam demanda significativa de
política social de assistência social, proteção social especial, o que
aponta para a necessidade de contarem com a referência de serviços
dessa natureza na região, mediante prestação direta pela esfera
estadual, organização de consórcios intermunicipais, ou prestação
por municípios de maior porte, com cofinanciamento das esferas
estaduais e federal.

• Municípios de pequeno porte 2 – entende-se por município


de pequeno porte 2 aquele cuja população varia de 20.001 a
50.000 habitantes (cerca de 5.000 a 10.000 famílias em média).
Diferenciam‑se dos pequenos porte 1 especialmente no que se
refere à concentração da população rural que corresponde a 30%
da população total. Quanto às suas características relacionais
mantém‑se as mesmas dos municípios pequenos 1.

• Municípios de médio porte – entendem-se por municípios de médio


porte aqueles cuja população está entre 50.001 a 100.000 habitantes
(cerca de 10.000 a 25.000 famílias). Mesmo ainda precisando contar
com a referência de municípios de grande porte para questões de
maior complexidade, já possuem mais autonomia na estruturação
de sua economia, sediam algumas indústrias de transformação, além
de contarem com maior oferta de comércio e serviços. A oferta de
empregos formais, portanto, aumenta tanto no setor secundário
como no de serviços. Esses municípios necessitam de uma rede mais
ampla de serviços de assistência social, particularmente na rede de
proteção social básica. Quanto à proteção especial, a realidade de
tais municípios se assemelha à dos municípios de pequeno porte, no
entanto, a probabilidade de ocorrerem demandas nessa área é maior, o
que leva a se considerar a possibilidade de sediarem serviços próprios
dessa natureza ou de referência regional, agregando municípios de
pequeno porte no seu entorno.

• Municípios de grande porte – entendem-se por municípios de grande


porte aqueles cuja população é de 101.000 habitantes até 900.000
habitantes (cerca de 25.000 a 250.000 famílias). São os mais complexos
na sua estruturação econômica, polos de regiões e sedes de serviços
mais especializados. Concentram mais oportunidades de emprego e
oferecem maior número de serviços públicos, contendo também mais
infraestrutura. No entanto, são os municípios que por congregarem o
grande número de habitantes e, pelas suas características em atraírem
grande parte da população que migra das regiões onde as oportunidades
47
Unidade I

são consideradas mais escassas, apresentam grande demanda por serviços


das várias áreas de políticas públicas. Em razão dessas características, a
rede socioassistencial deve ser mais complexa e diversificada, envolvendo
serviços de proteção social básica, bem como uma ampla rede de proteção
especial (nos níveis de média e alta complexidade).

• Metrópoles – entendem-se por metrópole os municípios com mais


de 900.000 habitantes (atingindo uma média superior a 250.000
famílias cada). Para além das características dos grandes municípios,
as metrópoles apresentam o agravante dos chamados territórios de
fronteira, que significam zonas de limites que configuram a região
metropolitana e normalmente com forte ausência de serviços do
Estado (BRASIL, 2004a, p. 4546).

Tabela 1 – Porte do município em relação ao quantitativo de habitantes

Porte do município Tamanho da população


Pequeno porte 1 Até 20.000 habitantes
Pequeno porte 2 De 20.001 a 50.000 habitantes
Médio porte De 50.001 a 100.000 habitantes
Grande porte De 100.001 a 900.000 habitantes
Metrópole Acima de 900.001 habitantes

Adaptada de: Brasil (2004b).

A partir dessa classificação por porte de município, considerando sua população, são identificadas
as demandas por ações essenciais da proteção social básica que devem ser prestadas na totalidade dos
municípios, instituída pelo Suas.

Os serviços da proteção social especial, de média e alta complexidade, devem ser implementados
prioritariamente pelos municípios de médio e grande porte e metrópoles. Cabendo à esfera estadual a
“prestação direta como referência regional ou pelo assessoramento técnico e financeiro na constituição
de consórcios intermunicipais” (BRASIL, 2004a, p. 46). Que são as ações regionalizadas dos serviços de
proteção social especial.

É a concepção de território mencionada que deverá ser considerada no processo de analisar a


necessidade de oferta de serviços, bem como o porte, a capacidade e a arrecadação dos municípios, e
para tal será necessária uma ferramenta que é o geoprocessamento.

O geoprocessamento como ferramenta da política de assistência social,


conforme preconizado no texto da própria PNAS. A ferramenta do
geoprocessamento e a análise socioterritorial se constituirão em um
poderoso instrumento de gestão, para aprimoramento da política (OLIVEIRA,
2014, p. 26).
48
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

O geoprocessamento é uma ferramenta que possibilita a visualização da realidade do tecido social,


ao que Oliveira explica sua utilidade frente à organização da política de assistência social nos municípios.

As desigualdades produzidas na sociedade brasileira agravam as situações de


vulnerabilidade tornando a realidade um tecido social de alta complexidade
e de difícil ação, o que aumenta ainda mais o desafio da articulação entre
territorialidade e intersetorialidade, tendo em vista que uma política
social isoladamente não conta com elementos suficientes para desvendar
a problemática que se apresenta nos contextos em que elas acontecem
(OLIVEIRA 2014, p. 26).

Ao se considerar as desigualdades socioterritoriais e seu enfrentamento, a “garantia dos mínimos


sociais e o provimento de condições de atender a contingências sociais que se apresentam, numa
perspectiva de universalização dos direitos sociais” (BRASIL, 2004a, p. 33), está prevista na PNAS ao
preconizar sua integração às demais políticas setoriais, propondo para o enfrentamento dessa questão
ações afiançadas por níveis de proteção e complexidade distintos, que, por sua vez, têm como objetivos:

• prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica


e, ou, especial para famílias, indivíduos e grupos que deles necessitar;

• contribuir com a inclusão e a equidade dos usuários e grupos


específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços socioassistenciais
básicos e especiais, em áreas urbana e rural;

• assegurar que as ações no âmbito da assistência social tenham


centralidade na família, e que garantam a convivência familiar e
comunitária (BRASIL, 2004a, p. 18).

A PNAS anseia por ver garantido o respeito das diversidades e diferenças geradas pelas desigualdades
sociais regionais, potencializando uma política:

de direção universal e direito de cidadania, capaz de alargar a agenda dos


direitos sociais a serem assegurados a todos os brasileiros, de acordo com
suas necessidades e independentemente de sua renda, a partir de sua
condição inerente de ser de direitos (BRASIL, 2005, p. 89).

A importância da conjugação de esforços com o gestor e o controle social está relacionada ao


compromisso de realmente atender às necessidades da população e dos territórios onde elas vivem,
mas também no cumprimento da diretriz de comando único das ações e participação popular, já
mencionado anteriormente.

A questão da participação popular se constitui em um desafio para a política de assistência social,


tentaremos compreender um pouco mais sobre isso.

49
Unidade I

A participação social na
assistência social, bem
como a descentralização
político-administrativa
e comando único em
cada esfera de governo
Todo poder emana e da primazia da
do povo, que o responsabilidade estatal na
exerce por meio de condução desta política
seus representantes
eleitos direta ou Loas, art. 5º,
indiretamente inciso II
“toda pessoa tem o direito de
tomar parte do governo de seus
pais, direita ou por intermédio de” Constituição Federal 1988,
art. 1º, art. 5º LXXIII, art.
“a vontade do povo será a base 129, III e IV; art. 194 §VII;
de autoridade do governo” art. 204 §IV
Declaração
dos Direitos
Humanos, 1948,
incisos 1 e 2

Figura 12 – Processo histórico da participação popular na ordem pública

A preocupação em assegurar a participação popular, sobretudo na gestão das políticas públicas


responsáveis pela implementação dos direitos sociais, serve de instrumento para regular a atuação
do Estado às reais necessidades da população, caracterizando assim os princípios básicos do Estado
Democrático de Direito.

A política propõe a normatização e a continuidade dos padrões dos serviços ofertados de forma equitativa
para todo o território nacional, por meio de eixos estruturantes da PNAS que sustentam a descentralização
político‑administrativa, participação social e a articulação, juntamente com as demais políticas públicas
setoriais. Considerando suas particularidades e especificidades do campo de ação, dos objetivos, dos usuários
e as formas de operacionalização da assistência social, como política com caráter de proteção social.

O controle social se consolidará principalmente por meio da participação em espaços institucionais


– os conselhos gestores e conferências de assistência social. No entanto, esses não são os únicos espaços
onde a participação pode ser efetivada.

As conferências de assistência social ocorrem ordinariamente a cada quatro anos, conforme art. 117
da NOB/Suas 2012, com o objetivo de avaliar a política de assistência social e definir diretrizes para seu
aprimoramento. Devem ocorrer no âmbito dos municípios, estados, Distrito Federal e União, contando
com a participação de todos os sujeitos envolvidos na assistência social e pessoas interessadas nas
questões relativas a essa política, como: gestores; representantes dos órgãos públicos; trabalhadores do
Suas e outras políticas que fazem interface com a assistência; representantes das entidades de assistência
social; usuários dos serviços, programas, projetos e dos benefícios; representantes de organizações de
usuários; representantes de conselhos setoriais (saúde, educação etc.) e de defesa de direitos (criança
e adolescente, idoso, pessoa com deficiência, mulher etc.); representantes das universidades, do Poder
Legislativo federal, estadual e municipal, do Judiciário e Ministério Público; entre outros (BRASIL, 2012a).

50
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Observação

Em 2019, o Governo Federal decretou pela não realização da conferência


nacional de assistência social, entretanto a Resolução CNAS n. 15/2019,
estabelece normas gerais para a realização das conferências extraordinárias
de assistência social em âmbito nacional, estadual e do Distrito Federal.

O processo de organização das conferências deve ser iniciado pelas etapas municipais, estaduais e
do Distrito Federal, até que ocorra a Conferência Nacional de Assistência Social. A realização se dará em
conjunto com os conselhos de assistência social, conforme art. 12 da NOB/Suas 2012; porém, cabe aos
órgãos gestores de cada esfera de governo “prever dotação orçamentária e realizar a execução financeira
garantindo os recursos, infraestrutura necessária e acessibilidade para as pessoas com deficiência e
idosas” (BRASIL, 2012a).

Os conselhos são constituídos de forma paritária, ou seja, igualitariamente, por representantes


do Poder Público e da sociedade civil. Podem ser representantes da sociedade civil os “usuários ou
organizações de usuários, entidades e organizações de assistência social (instituições de defesa de
direitos e prestadoras de serviços), trabalhadores do setor (artigo 17 – ll)” (BRASIL, 2004a, p. 52).

Instâncias do sistema descentralizado e participativo da política de


assistência social

Deliberação e
Gestão Negociação e Financiamento
controle social
pactuação
SNAS FNAS
CNAS
SEAS CIT FEAS
CEAS
SMAS CIB FMAS
CMAS

Rede socioassistencial

Unidades estatais e não estatais

Usuários do Suas

Figura 13 – Sistema descentralizado e participativo da política de assistência social

Cada esfera de governo deve instituir o Conselho de Assistência Social, que será responsável em seu
âmbito governamental pela aprovação da política pública de assistência social, normatização e regulação

51
Unidade I

da prestação de serviços de natureza pública e privada, garantia da efetivação do Suas, apreciação e


aprovação de propostas orçamentárias, entre outras. Acima dos conselhos municipais e estaduais, está
o CNAS, como órgão superior que está à frente desse processo. A articulação entre todas as esferas de
governo permite a articulação completa do controle social de forma integrada sobre a gestão social
brasileira, em seu modelo descentralizado e participativo, consolidado no Suas (BRASIL, 2014a).

Além dos conselhos de assistência social, existem instâncias de negociação e pactuações entre
gestores quanto aos aspectos operacionais do Suas, denominadas comissões intergestores tri e bipartite.

Entendem‑se por pactuações na gestão da política de assistência social as negociações e acordos


estabelecidos entre os entes federativos envolvidos por meio de consensos para a operacionalização
e o aprimoramento do Suas, segundo a Lei n. 12.435, art. 133. Esses espaços de pactuação da gestão
compartilhada exercem o papel de democratizar o Estado, seguindo as deliberações dos conselhos de
assistência social. As pactuações firmadas devem “ser formalizadas por meio da publicação do respectivo
ato administrativo, cabendo aos gestores ampla divulgação das mesmas, em especial na rede articulada
de informações para a gestão da assistência social” (BRASIL, 2011g, art. 133 § 1º).

As Comissões Intergestores Bipartite (CIB) se constituem como espaço de articulação e interlocução


dos gestores municipais e estaduais da política de assistência social. A Comissão Intergestores Tripartite
(CIT) é um espaço de articulação e expressão das demandas dos gestores federais, estaduais e municipais.

Gestor federal analisa os dados e Gestor federal recebe e analisa os


propõe mudanças dados e propõe mudanças

A CIT analisa os critérios e os pactuam

O CNAS delibera quanto aos critérios propostos

Gestor federal passa a


repassar os recursos com base
nos critérios pactuados

Figura 14 – Articulação e pactuação nas três esferas de governo

52
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Observação

Fonseas: Fórum Nacional de Secretários de Estado de Assistência Social,


formado pelos gestores estaduais de assistência social.

Congemas: Colegiado Nacional de Gestores Municipais. Representa os


municípios brasileiros junto ao Governo Federal e aos governos estaduais.

Como parte do processo de democratização da gestão, ampliação dos espaços decisórios e do controle
social, implementam‑se, a partir da promulgação da Loas, as conferências de assistência social que:

são espaços de caráter deliberativo em que é debatida e avaliada a política


de assistência social. Também são propostas novas diretrizes, no sentido de
consolidar e ampliar os direitos socioassistenciais dos seus usuários. Os debates
são coletivos com participação social mais representativa, assegurando
momentos para discussão e avaliação das ações governamentais e também
para a eleição de prioridades políticas que representam os usuários,
trabalhadores e as entidades de assistência social (BRASIL, 2011g).

O caráter do Suas pode ser compreendido pelos conceitos e fundamentos que sustentam suas
prerrogativas e principalmente pelo tratamento objetivo atribuído ao seu processo de gestão
conforme preconiza a NOB/Suas, no intuito de implantar um sistema com diretrizes e princípios únicos
em todo território nacional, mas que em contrapartida considerem o conhecimento da realidade, quanto
à presença e a prevenção de riscos e vulnerabilidades sociais da população, do território e da oferta de
serviços, considerando a distância entre a demanda de proteção social em face da rede socioassistencial
existente, articulando‑os na busca do alcance da implementação do Suas; a construção gradual de
metas nos planos de assistência social, o trato igualitário e equitativo dos municípios, dos estados
e regiões nacionais e das microrregiões dos estados; a defesa dos direitos socioassistenciais; o padrão
de financiamento e o controle social (BRASIL, 2005, p. 86).

Pensando na organização da implantação do Suas por tipos e níveis de gestão, a NOB/Suas propõe
a gestão dos municípios em três níveis: inicial, básica e plena.

Quadro 5 – Níveis de gestão do Suas

Níveis de gestão do Suas Instrumentos de gestão Suas Instâncias de articulação, pactuação e deliberação
Gestão inicial Plano de assistência social Comissões intergestores – CIB, CIT
Conselhos de assistência social
Gestão básica Orçamento de assistência social
Municipal (CMAS)
Gestão da informação, Estadual (Ceas)
Gestão plena monitoramento e avaliação
Nacional (CNAS)
Relatório de gestão

53
Unidade I

A gestão inicial destina aos municípios que “não se habilitarem à gestão plena ou à básica o
recebimento de recursos da União, conforme série histórica, transformados em piso básico de transição,
piso de transição de média complexidade e piso de alta complexidade I” (BRASIL, 2005, p. 99).

A gestão básica permite ao município assumir a organização da proteção social básica, propondo
ações de prevenção de riscos por meio do desenvolvimento de potencialidade e aquisições, conforme
constam na PNAS, Tipificação nacional dos serviços socioassistenciais e cadernos de orientações técnicas
pertinentes ao tema. O município deverá, então, responsabilizar‑se pela oferta de programas, projetos
e serviços socioassistenciais que “fortaleçam vínculos familiares e comunitários que promovam os
beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e transferência de renda e que vigiem direitos
violados no território” (BRASIL, 2005, p. 99‑100).

Na gestão plena, o município tem:

a gestão total das ações de assistência social, sejam elas financiadas pelo
Fundo Nacional de Assistência Social, mediante repasse fundo a fundo, ou
que cheguem diretamente aos usuários, ou, ainda, as que sejam provenientes
de isenção de tributos, em razão do Certificado de Entidades Beneficentes
de Assistência Social – Cebas (BRASIL, 2005, p. 101).

O município assumirá a responsabilidade de organizar a oferta de serviços na proteção social


básica e especial, não só prevenindo a incidência de riscos e vulnerabilidades, mas também
protegendo as pessoas ou grupos das violações de direitos já ocorridas, além das que já assumira
quando em gestão básica.

Quadro 6 – Critérios de transferência de renda por nível de gestão

Critérios de transferência

Piso de proteção social básica Piso de proteção social especial de média Piso de proteção social especial de
complexidade alta complexidade
Piso de proteção social especial de
Piso básico fixo Piso de transição de média complexidade alta complexidade I
Piso de proteção social especial de
Piso básico de transição Piso de fixo de média complexidade alta complexidade II
Piso básico variável

Assim, como se amplia o nível de autonomia do município para a implementação das ações da
política de assistência social com a gestão plena, ampliam‑se também os requisitos para sua adesão e
suas responsabilidades que se compõem. Se, por um lado, aderir a esse nível de gestão representa mais
responsabilidades para os municípios, por outro, oferece também a possibilidade de ampliar a autonomia
na execução e proposição de ações e no financiamento, por meio dos incentivos de repasse de recurso.

Para aqueles municípios que não forem habilitados para nenhum dos níveis de gestão previstos na
NOB/Suas (inicial, básica e plena), a “gestão dos recursos federais destinados ao cofinanciamento das
54
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

ações continuadas de assistência social é de responsabilidade do gestor estadual” (BRASIL, 2005, p. 104),
entende‑se que, atualmente, os estados e municípios já terminaram o reordenamento legislativo.

O financiamento da seguridade social está previsto no art. 195 da Constituição Federal de 1988,
instituindo que as políticas que compõem o tripé da seguridade social deverão ser financiadas por toda
a sociedade, mediante recursos provenientes da União, estados e municípios (BRASIL, 2004a, p. 48).

Quadro 7

Nível Tipos Ações financiadas


Piso básico fixo Paif
Piso básico Piso básico de transição Continuidade das ações anteriormente financiadas
Piso básico variável Agente jovem, revisão BPC e novas ações
Rede socioassistencial de média complexidade
Piso de transição de média complexidade atualmente cofinanciada
Piso especial Centros de referência especializado de assistência
Piso de fixo de média complexidade social (Creas).
Combate ao abuso
Piso de proteção social especial de alta Unidades de acolhimento
complexidade I
Piso especial Ações de proteção para usuários em situações de
Piso de proteção social especial de alta elevado grau de dependência e serviços altamente
complexidade II qualificados (custo elevado)

A PNAS propôs a articulação do financiamento aos eixos da gestão e do controle social. Essa
articulação instituiu um desafio para cada uma das esferas de governo, sobretudo os municípios,
que procuram:

Superar o modelo tradicional de operar o financiamento marcado por


práticas centralizadas, segmentadas, sobrepostas, pontuais, muitas vezes
operadas a partir de bases patrimonialistas e clientelistas e pautadas numa
série histórica, perpetuada, engessada e alicerçada num modelo de repasse
de recursos operado sob a lógica per capita, que na maioria das vezes não
correspondia às necessidades específicas (TAVARES, 2009, p. 230).

Apesar do desafio, esse novo formato trouxe a possibilidade de execução mais efetiva e democrática das
ações e, consequentemente, do controle público sobre os gastos com a política. Força os municípios e estados
a efetivarem mecanismos de gestão direcionados ao planejamento e avaliação das ações executadas, tendo
em vista a necessidade de deliberação por parte dos conselhos. Embora haja a necessidade da deliberação
dos conselhos tanto na aprovação do orçamento quanto na comprovação da execução das ações e dos
gastos públicos, quem deve apresentar os planos e relatórios é o gestor público, sendo garantida assim a
primazia do Estado no planejamento, proposição e financiamento da política.

O Fundo de Assistência Social é uma unidade orçamentária sem personalidade jurídica própria, sob
responsabilidade do órgão gestor de cada esfera de governo, utilizando o mesmo CNPJ da prefeitura
55
Unidade I

ou órgão correspondente. Por meio dele se “instaurou a transferência regular e automática [...] para o
custeio dos serviços, programas e projetos organizados segundo pisos de proteção (básica e especial),
baseados na complexidade dos serviços” (BRASIL, 2013c, p. 21).

Os fundos de assistência social são fundos especiais, por se constituírem na


reunião de recursos financeiros para determinadas ações de acordo com o
definido na Lei n. 4.320/64. Sua ênfase na gestão financeira da assistência
social tem o propósito de imprimir maior racionalidade e transparência aos
gastos com essa política pública (TAVARES, 2009, p. 234).

Para receber os repasses de fundo a fundo, ou seja, diretamente do fundo nacional para o fundo
municipal, os municípios devem se habilitar em um dos níveis de gestão do Suas (inicial, básica e plena)
e comprovar o uso de recursos próprios na execução da política.

O repasse de recursos, segundo proposição da NOB/Suas, deve acontecer tendo como base o território,
o porte dos municípios e a complexidade dos serviços (proteção social básica e proteção social especial).
Os repasses devem ser regulares e automáticos, estabelecidos por pisos de proteção, com cofinanciamento
indicando corresponsabilidade entre as esferas de governo e correspondência nos instrumentos de
planejamento público – PPA, LDO, e LOA – (TAVARES, 2009), com destaque para o plano plurianual, que
“se constitui em um guia programático para as ações do Poder Público e traduz a síntese dos esforços
de planejamento de toda a administração para contemplar os princípios e concepções do Suas”
(BRASIL, 2004a, p. 50).

Os planos de assistência deverão ser deliberados pelos conselhos de assistência social, logo o
orçamento estará incluso nesse procedimento expressando, assim, “a preocupação com o respeito às
instâncias de pactuação e deliberação, inclusive com grande peso atribuído aos critérios de partilha de
recursos” (TAVARES, 2009, p. 233).

O sistema de financiamento “fundo a fundo” garante a continuidade dos


atendimentos, agiliza os fluxos de transferência de recursos, assegura a
regularidade dos repasses. Em relação aos projetos e programas de caráter
descontinuado, permanece o sistema de convênio. Quando ao fato de a
demanda do município não justificar a oferta de determinados serviços
ou níveis de proteção, poderão ser articuladas parcerias entre municípios
vizinhos para o desenvolvimento de serviços de referência regional, inclusive
mediante consórcios públicos, com cofinanciamento estadual e federal e dos
municípios consorciados. Outra opção pode ser a prestação desses serviços
de referência regional pela esfera estadual, em parceria com os municípios
que apresentarem tal necessidade e não tiverem as condições para a gestão
individual (BRASIL, 2005, p. 132).

A partir das ações propostas nos planos municipais ou estaduais, os entes federados preencherão
os planos de ação no sistema informatizado Suas‑web e, somente após sua validação, os recursos serão
transferidos para o respectivo fundo. Ao final do exercício, os conselhos de assistência deverão deliberar
56
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

sobre prestação de contas apresentada pelos gestores públicos, efetivada por meio do relatório de gestão
(BRASIL, 2005).

Para cada nível de proteção, também são considerados critérios de partilha, que são analisados
sempre em conjunto, e sua combinação indica os municípios prioritários para expansão do
cofinanciamento federal.

As bases de financiamento proposto pelo Suas respeitam o disposto no art. 28 da Loas, que trata
sobre o financiamento dos serviços, programas, projetos e benefícios com recursos da União, dos
estados, do Distrito Federal e dos municípios e demais contribuições sociais previstas no art. 195
da Constituição Federal, além daqueles que compõem o FNAS, e ao parágrafo 1º desse artigo, que
atribui ao órgão da administração pública federal a responsabilidade pela coordenação da política de
assistência social nas três esferas de governo gerir o FNAS sob a orientação e controle dos respectivos
conselhos de assistência social.

É previsto pela Loas, ainda que a demanda municipal não justifique a execução própria de serviços
da proteção social especial, que elas poderão ser ofertadas pelos estados, mantendo‑se sempre a
preservação dos vínculos familiares e comunitários.

A instituição dos consórcios deve ser pactuada nas referidas CIB e deliberadas
pelos Ceas, sendo que os estados assumem, como responsabilidade de
gestão, identificar áreas potenciais para sua instalação (organizando sua
área de abrangência e referência), apoiar sua implantação e coordenação e
cofinanciar, juntamente com os municípios que os comporão.

• União – sua participação no cofinanciamento se dá em todos os níveis


de proteção, conforme mecanismos de financiamento e critérios de
partilha e de transferência de recursos, previstos na NOB/Suas. Provê
ainda, o pagamento do BPC a idosos e pessoas com deficiência
(BRASIL, 2005, p. 152).

Por fim, temos a considerar que o aporte de recursos destinados à política de assistência social, nos
últimos anos, vem aumentando consideravelmente. “Em valores constantes [...] o total executado na
função 08 passou de R$ 11,5 bilhões, em 2002, para R$ 56,6 bilhões, em 2012, o que corresponde a um
crescimento real de 392,8%” (BRASIL, 2008a, p. 21).

Ao adotar a concepção de pisos, em substituição ao cálculo per capita, e considerar as diferenças


socioterritoriais, porte dos municípios e níveis de complexidade:

esse modo de financiamento implicou a adoção de novos critérios para a


definição dos recursos que passam a adotar parâmetros definidos a partir do
diagnóstico de cada região, no intuito de tornar mais efetivo o atendimento
às reais necessidades da população (BRASIL, 2008a, p. 21).

57
Unidade I

A partir desses eixos estruturantes, a PNAS assume que o acesso à proteção social é garantido a
todos os cidadãos que dela necessitar, independentemente do território, etnia ou orientação sexual. Para
tanto, a compreensão dos conceitos de proteção social se constitui como condição fundamental
para o planejamento e gestão das ações propostas pelo Suas.

Resumo

Foi abordada a política de assistência social brasileira em diversos


aspectos, desde a sua contextualização histórica até a apresentação da
estrutura normativa da política de assistencial social no Brasil.

Assim, no primeiro tópico foi apresentada a trajetória percorrida pela


assistência social na transição da perspectiva da caridade para um direito
social, de forma que a Constituição Federal de 1988 representou o marco
legal de rompimento desse paradigma.

No segundo tópico, tem‑se a evolução processual da política de


seguridade social assistencial, em que são apresentadas as principais
normativas que consolidam a política de assistência nos últimos
26 anos. Além disso, pontua‑se a importância da atuação do profissional
na elaboração, execução e avaliação dessa política social que constitui um
dos maiores campos de atuação da profissão.

No terceiro tópico, analisa‑se a Loas e a PNAS, enquanto principais


normativas que organizam a política de assistência social brasileira.

Por fim, no quarto tópico são apresentados os princípios estruturantes


do Suas, a organização da proteção social e as normativas que decorreram
deste documento, bem como a Tipificação dos serviços socioassistenciais e
a NOB/Suas.

Após a leitura é possível compreender e interpretar como se deu o


processo de construção da política de seguridade social assistencial no
Brasil e como se dá a sua organização estrutural no âmbito da proteção
social dos indivíduos em situação de vulnerabilidade e risco social

A participação da União no cofinanciamento se dá em todos os níveis


de proteção, conforme mecanismos de financiamento e critérios de
partilha e de transferência de recursos, previstos na NOB/Suas. Provê, ainda,
o pagamento do BPC a idosos e pessoas com deficiência.

Por fim, temos a considerar que o aporte de recursos destinados à política


de assistência social, nos últimos anos, vem aumentando consideravelmente.
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POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Ao adotar a concepção de pisos, em substituição ao cálculo per capita, e


considerar as diferenças socioterritoriais, porte dos municípios e níveis de
complexidade, cujo financiamento será de acordo com o tamanho populacional
de cada município, além de considerar o diagnostico socioterritorial, que
demonstrará a vulnerabilidade e o risco social eminente.

A principal atuação se relaciona ao enfrentamento e prevenção das


formas de agressão à vida, no sentido social e ético, colocando a assistência
social no campo da defesa da vida relacional.

As ações de planejamento ganham destaque ao envolverem as


especificidades de cada território de atuação, por meio de diagnóstico e
estudo da realidade, da territorialização, descentralização e intersetorialidade
das ações.

Sua oferta se dá por meio da organização das referências de vigilância


social, proteção social e defesa social e institucional, que deverá prover
serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social, permitindo, assim,
o conhecimento e ação no foco das causas de vulnerabilidade e risco social,
cumprindo, portanto, seu papel de proteção social aos que dela necessitarem.

Para integrar o Suas, os municípios devem cumprir determinados requisitos


e responsabilidades, conforme o nível de gestão e o porte populacional
discutidos e pactuados nas comissões intergestores tri e bipartite.

A organização do Suas por tipos e níveis de gestão se dá em três níveis:


inicial, básica e plena, e a divisão territorial em municípios de pequeno
porte I e II, médio e grande porte e metrópoles.

A preocupação em assegurar participação popular por meio do controle


social se consolidará principalmente por meio da participação em espaços
institucionais – os conselhos gestores e conferências de assistência social.

O financiamento da assistência social está previsto no art. 195 da


Constituição Federal de 1988, dentro do orçamento da seguridade social
e no capítulo V da Loas, que regulamenta especificamente a política de
assistência social. Ele se dá por meio do repasse dos recursos dos Fundos
de Assistência Social – unidade orçamentária sem personalidade jurídica
própria, sob responsabilidade do órgão gestor de cada esfera de governo.

O financiamento proposto na lógica do Suas se dá por meio da


constituição de pisos divididos pelos níveis de proteção.

59
Unidade I

Exercícios

Questão 1. Leia a charge e o texto a seguir.

Figura 15

Disponível em: <https://www.facebook.com/sociedaderacionalista>. Acesso em: 15 nov. 2013.

Perguntas frequentes sobre o sistema de cotas

1) O que é a lei de cotas?

A Lei n. 12.711/2012, sancionada em agosto deste ano, garante a reserva de 50% das matrículas por
curso e turno nas 59 universidades federais e 38 institutos federais de educação, ciência e tecnologia a
alunos oriundos integralmente do ensino médio público, em cursos regulares ou da educação de jovens
e adultos. Os demais 50% das vagas permanecem para ampla concorrência.

2) A lei já foi regulamentada?

Sim, pelo Decreto n. 7.824/2012, que define as condições gerais de reservas de vagas, estabelece
a sistemática de acompanhamento das reservas de vagas e a regra de transição para as instituições
federais de educação superior. Há, também, a Portaria Normativa n. 18/2012, do Ministério da Educação,
que estabelece os conceitos básicos para aplicação da lei, prevê as modalidades das reservas de vagas e
as fórmulas para cálculo, fixa as condições para concorrer às vagas reservadas e estabelece a sistemática
de preenchimento das vagas reservadas.

3) Como é feita a distribuição das cotas?

As vagas reservadas às cotas (50% do total de vagas da instituição) serão subdivididas — metade
para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a um salário mínimo e
meio per capita e metade para estudantes de escolas públicas com renda familiar superior a um salário

60
POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

mínimo e meio. Em ambos os casos, também será levado em conta o percentual mínimo correspondente
ao da soma de pretos, pardos e indígenas no estado, de acordo com o último censo demográfico do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

4) A lei deverá ser aplicada imediatamente?

Sim, mas gradualmente. Em 2013 terão de ser reservadas, pelo menos, 12,5% do número de vagas
ofertadas atualmente. A implantação das cotas ocorrerá de forma progressiva ao longo dos próximos
quatro anos, até chegar à metade da oferta total do ensino público superior federal.

Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cotas/perguntas‑frequentes.html>. Acesso em: 15 nov. 2013.

Com base na leitura e nos seus conhecimentos, analise as afirmativas.

I – O sistema de cotas proposto, de acordo com a charge, baseia‑se no sistema de igualdade.

II – Segundo a charge, a justiça pressupõe que sejam realizadas ações com o intuito de eliminar
diferenças de oportunidades.

III – O sistema de cotas do MEC é uma política compensatória e propõe que metade das vagas das
universidades públicas seja reservada aos negros e indígenas.

IV – A política social de cotas classifica‑se como pública, de abrangência universal.

É correto o que se afirma somente em:

A) I e IV.

B) II e III.

C) II e IV.

D) I e III.

E) II.

Resposta correta: alternativa E.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa incorreta.

Justificativa: de acordo com os textos, o sistema de cotas baseia‑se no sistema de justiça, uma vez
que visa a proporcionar oportunidades aos que não tiveram boas condições.
61
Unidade I

II – Afirmativa correta.

Justificativa: a charge mostra que são necessárias ações reparadoras para garantir as mesmas
oportunidades a todos, para que haja justiça.

III – Afirmativa incorreta.

Justificativa: a medida refere‑se às instituições federais e apenas uma parte das vagas reservadas às
cotas (50%) é destinada a negros, indígenas e pardos.

IV – Afirmativa incorreta.

Justificativa: a política social de cotas não tem abrangência universal.

Questão 2. Leia o texto e os quadrinhos a seguir:

O Brasil de hoje é herdeiro de uma sociedade colonial e imperial escravocrata, em que o negro
ocupou fundamentalmente a posição de pessoa escravizada. O Brasil em 1888 foi o último país a abolir
a escravidão nas Américas. Um abolicionismo incompleto, que não permitiu incluir o negro na ordem
social capitalista (BASTIDE; FERNANDES, 2008).

A escravidão negra deixou marcas profundas de discriminação em nossa sociedade, inclusive


escutamos insultos raciais atuais exigindo que negros e negras voltem “para a senzala”. Mas será que
o racismo contra o negro brasileiro atualmente só existe por causa do “tempo do cativeiro”? Há pessoas
racistas que nem sabem e nem mencionam esse contexto. Elas afirmam que não gostam de “negros”,
tem raiva dos “pretos” e que estes são “fedidos”, “sujos” e “preguiçosos”. O racismo opera cotidianamente
por meio de piadas, causos, ditos populares etc. Afinal de contas, temos uma variedade de expressões
correntes na língua portuguesa recheadas de racismo contra os negros.

Disponível em: <http://www.comfor.unifesp.br/wp‑content/docs/COMFOR/biblioteca_virtual/UNIAFRO/mod1/


Disc3‑Unidade3‑UNIAFRO.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2016.

Figura 16

Disponível em: <http://photos1.blogger.com/blogger/7946/2941/1600/


mafaldapreconceito1.1.gif>. Acesso em: 8 jun. 2016.

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POLÍTICA SETORIAL - ASSISTÊNCIA SOCIAL

Com base na leitura e nos seus conhecimentos, analise as afirmativas:

I – Os quadrinhos ilustram o comportamento descrito no texto: as pessoas mantêm na linguagem


seu preconceito.

II – O texto coloca, entre as raízes do preconceito racial, o sistema escravocrata, que imperou até o
final do século XIX no Brasil.

III – De acordo com o texto, a abolição da escravidão no Brasil, embora tardia, permitiu que os negros
se integrassem completamente à sociedade capitalista.

Está correto o que se afirma somente em:

A) I.

B) II.

C) III.

D) I e II.

E) I e III.

Resposta desta questão na plataforma.

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