Você está na página 1de 17

1

A IMPORTÂNCIA DOS GRUPOS DE ENCOTRO DE CARL ROGERS NO


PROCESSO DE COACHING 1

Cristian Boragan2
Camila Torres Ituassu3

RESUMO
Através de revisão bibliográfica, este artigo analisa os pontos de contato entre o psicólogo
estadunidense Carl Rogers, sua abordagem centrada na pessoa e aplicação detalhada desta no livro Os
grupos de encontro com o processo de coaching, principalmente no coaching humanista. Através
destes pontos, são traçados os prós e contras da abordagem rogeriana no processo de coaching, mais
precisamente nos grupos do coaching empresarial.

PALAVRAS-CHAVE: 1 CARL ROGERS. 2 GRUPOS DE ENCONTRO. 3 COACHING. 4


COACHING HUMANISTA
_________________________

INTRODUÇÃO

Há várias formas para começar um artigo em que o tema central é balizado pela
gestão de pessoas, algumas um tanto conhecidas e outras, nem um pouco usuais. Exemplo:
começar com Charles Bukowski, poeta estadunidense da segunda metade do século XX,
conhecido por sua literatura de caráter autobiográfico, que narra aventuras de um alcoólatra
em bares, corridas de cavalo e hotéis baratos, praticamente um mendigo (L&PM EDITORES,
2016). Em forma de prosa, disse Bukowski:

Como, diabos, pode um homem gostar de ser acordado às 6h30 da manhã


por um despertador, sair da cama, vestir-se, alimentar-se à força, [...] escovar
os dentes e os cabelos, enfrentar o tráfego para chegar a um lugar onde
essencialmente o que fará é encher de dinheiro os bolsos de outro sujeito e
ainda por cima ser obrigado a mostrar gratidão por receber essa
oportunidade? (BUKOWSKI, 2007, p.55)

1
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Gestão de Pessoas da
Universidade Católica Dom Bosco em 2016 para a obtenção do título de especialista..
2
Jornalista, Redator, Blogueiro, Psicanalista, Hipnólogo, Especialista em Literatura e Mestre em Comunicação.
E-mail: crisboragan@gmail.com.
3
Psicóloga, Mestre em Psicologia, Professora da UCDB, Coach, Consultora de Empresas. Orientadora do curso
de Pós-graduação. E-mail: camilaituassu@yahoo.com.br.
2

Como resposta a uma pergunta como esta, o professor Idalberto Chiavenato


(2003) detalha a questão pela ótica da atitude: “a atitude representa o estilo pessoal de fazer as
coisas acontecerem, a maneira de liderar, de motivar, de comunicar e de levar as coisas para
frente (CHIAVENATO, 2003, p. 5). É, portanto, a atitude, segundo Chiavenato, a ferramenta
que faz com que um homem feito Bukowski saia da cama por volta das 6h30, faça acontecer
todo o seu dia e, ao final, sinta-se grato. Em outras palavras, o psicólogo estadunidense Daniel
Goleman (2001) cria o termo inteligência emocional, ou seja, um indivíduo mais apto a esta
forma de inteligência é aquele que consegue indentificar de maneira clara as próprias emoções
– e lidar com elas com mais facilidade.

Seja como inteligência emocional de Goleman4 ou seu sinônimo mais amplo


“atitude”, por Chiavenato, algumas pesquisas no ambiente corporativo demonstram
problemas daqueles que não conseguem lidar bem com estas características emocionais. Em
uma matéria da revista Exame on-line (GASPARINI,2015), foram identificadas cinco falhas
de profissionais que não possuem boa inteligência emocional, a saber, são pessoas que
geralmente: não reconhecem suas fraquezas, desconfiam das suas próprias emoções, não
enxergam o outro, não sabem o que querem e são inconstantes (IBIDEM). De acordo com os
especialistas ouvidos por Gasparini, a falta de inteligência emocional deve-se principalmente
ao isolamento profisional, que pode vir de uma atitude defensiva do colaborador para manter
seu espaço e carreira ou simplesmente fruto de uma rotina de trabalho regida por altas cargas
de estresse, tecnologia excessiva desumanizante ou ainda pela própria sobrecarga de trabalho.
Seja como for, a matéria indica que o perfil deste misântropo corporativo está com os dias
contados, principalmente nas posições de chefia, aquelas em que as qualidades dos
relacionamentos são essenciais para uma boa gestão de equipes.

Chiavenato (IBIDEM) afirma ser esta uma questão comum na maioria das
empresas. Os profissionais estudam e são treinados para funções específicas, sejam médicos,
engenheiros, arquitetos etc. O problema é que, quando galgam patamares na hierarquia
corporativa, precisam lidar com pessoas, administrá-las para que os resultados sejam
alcançados, ou pelo menos buscados mais e mais em um nível em que todos ganhem: clientes,
empresas e colaboradores. Como “treinar” estas pessoas no trato com outro ser humano? É

4
Daniel Goleman é um psicólogo estadunidense que ficou famoso nos anos de 1990 ao afirmar que, além da
inteligência cognitiva e racional, cada ser humano possui também uma inteligência emocional.
3

possível um aprendizado neste nível em que o próprio administrador seja transformado, em


outras palavras, que mude a si mesmo em prol da convivência corporativa?

Ciências e ferramentas de estudo comportamental, como a psicologia, a


psicanálise e outras têm, ao longo destes primeiros 100 anos de estudo de administração,
tentado influenciar estas questões. Todas essas ferramentas possuem um o modus operandi
muito similar; mesmo com as suas diferentes técnicas, elas partem do mesmo princípio que a
transformação ocorre primeiramente dentro do indivíduo ou grupo de pessoas para depois,
com e tempo e maturidade, atingir os resultados do grupo. Uma dessas ferramentas foi criada
pelo psicolólogo estadunidense Carl Ramson Rogers e foi batizada como “terapia centrada na
pessoa”. Em linhas gerais o próprio Rogers explica sua teoria:

A hipótese central dessa abordagem pode ser colocada em poucas palavras.


Os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos para a autocompreensão
e para a modificação de seus autoconceitos, de suas atitudes e de seu
comportamento autônomo. Esses recursos podem ser ativados se houver um
clima de atitudes psicológicas facilitadoras. (ROGERS, 1983, p. 38)
Ao longo do século XX, outras ciências e ferramentas de estudo comportamental
apareceram, cada qual foi popular em um período específico. A partir dos anos de 1990
passou a ser adotado cada vez mais no mundo corporativo o coaching, definido como “uma
relação de parceria que revela e liberta o potencial das pessoas, de forma a maximizar o seu
desempenho. É ajudá-las a aprender, ao invés de ensinar algo a elas” (GALLWEY, 1986).

Em comum com Rogers, o coaching traz a ideia que os recursos para a mudanças
já existem dentro do próprio indivíduo ou grupo, a grande questão-chave do processo é como
contribuir para fazer tal potencial emergir para que, desta maneira, certos objetivos sejam
alcançados.

A ligação entre Rogers e o coaching já existe e provas serão dadas mais adiante. O
que interessa de fato é uma das ferramentas de Rogers usadas para terapia e que podem ser
transpostas para o coaching: os grupos de encontro (Rogers, 2002).

1 ROGERS, O MAIS PRESTIGIOSO


4

Segundo o psicólogo John K. Wood (REVISTA DE ESTUDOS ROGERIANOS,


1999), amigo e colega de Carl Rogers, ele, Rogers, não foi o mais importante psicólogo de
seu tempo – e nem o mais influente – mas apenas o mais prestigioso de toda história da
psicologia estadunidense. Não há dúvidas, segundo Wood, que a pessoa e obra de Rogers
marcaram de maneira indelével não só a psicologia daquele país, mas a psicologia como se
conhece ainda hoje e somente “os ignorantes e mal intencionados podem desconfiar do valor
e importância que as contribuições de Carl Rogers tiveram para o meio científico” (IDEM).

O primeiro trabalho de Rogers como psicólogo foi no Instituto de


Aconselhamento Infantil, em Nova Iorque, Estados Unidos, por volta de 1926. O salário
inicial era algo em torno de dois mil e quinhentos dólares, já considerado insuficiente para a
época, mas seus chefes queriam reduzi-lo pela metade, por considerarem Rogers, um
psicólogo, inferior a um psiquiatra. Esta é uma das primeiras batalhas da vida do psicólogo
contra os psiquiatras.

Apenas em 11 de dezembro de 1940 é que Rogers, ao ser confrontado com as


reações provocadas por uma conferência que fez na Universidade de Minnesota, tem
consciência que suas ideias são originais. Nasce a partir daí um primeiro livro tentando definir
tais conceitos: Aconselhamento e Psicoterapia (ROGERS, 1959).

De uma proposta tímida feita no primeiro livro, o psicólogo parte para a


conceituação científica numa fase posterior, o que originou uma de suas principais obras
(ROGERS, 1951).

Numa primeira fase, a terapia centrada na pessoa, conceito de Rogers, foi


utilizada somente em psicoterapia por Rogers e outros colegas. Numa fase posterior, Rogers
percebeu que os mesmos procedimentos poderiam ser usados em educação e em
administração de empresas e quase no fim da vida, mais precisamente no livro Um jeito de ser
(ROGERS, 1983), Rogers dá um salto à frente e transforma a seu método de tratamento
psicológico e educacional em filosofia, que recebe o nome de abordagem centrada na pessoa.

Mas, o que Carl Rogers afirmou de tão revolucionário?

Como sempre, as coisas simples são aquelas que mais transformam o mundo.
Durante o processo terapêutico Rogers percebeu que sempre que fosse extremamente sincero
com o paciente sobre os próprios sentimentos, em outras palavras, que demonstraria raiva se
5

tivesse raiva, demonstraria amor e assim o sentisse, cansaço, entre outros sentimentos, daria
abertura para a pessoa em processo de terapia fazer o mesmo, sendo possível, dessa forma
para ela, aceitar a si própria, seus problemas, qualidades e limitações...

Outro ponto da teoria rogeriana é a não-diretividade, um deixar a pessoa livre


para as suas próprias escolhas. Em terapia, por que o paciente deveria ser dirigido pelo
terapeuta? Para Rogers, isso implicava uma atitude de superioridade por parte do terapeuta e
submissão do paciente, atrapalhando o resultado final do processo, que é a autorrealização da
criatura humana.

Por falar em processo, eis outro ponto valorizado por Carl Rogers. Por que as
metas finais devem ser tão valorizadas em vez do processo? A trilha é mais importante que a
linha de chegada, segundo Rogers, pois é lá em que se aprende a lidar com as fraquezas, é lá
também que é possível descobrir o que realmente é viável ou não realizar. Neste ponto a vida
passa a ter sentido. Não raras às vezes, por exemplo, este autor ouve alguém dizer que a época
em que estava guardando dinheiro para comprar um carro era mais interessante que agora, que
possui o veículo. O processo de aquisição do carro foi o lugar onde a pessoa descobriu seus
potenciais.

Em educação, as ideias de Rogers vieram a se somar com as de pedagogos como


Paulo Freire, cujo livro Pedagogia do Oprimido (FREIRE, 1987) foi citado diversas vezes por
Rogers em seu próprio trabalho sobre o assunto (ROGERS, 1978) Neste ponto, o trabalho do
psicólogo assemelha-se ao desenvolvido na Summerhill School (ESCOLA SUMMERHILL,
2009). um polêmico colégio fundado no Reino Unido em 1921, baseado em conceitos como
educação autodirigida.

Educação autodirigida pode ser entendida como um método pelo qual uma escola
não possui currículos acadêmicos, ementas ou tarefas destinadas a ‘ensinar’ os alunos.
Levando-se em conta a curiosidade natural da criança, o professor perde suas características
autoritárias e passa a ser um ‘facilitador’ da aprendizagem, vai ensinar apenas aquilo que as
crianças solicitarem. Se o aluno decidir que nada quer aprender, assim será respeitado.

O livro A terapia centrada no paciente (ROGERS, 1951) traz uma série de


pesquisas científicas de campo baseadas em educação autodirigida, sempre com resultados
mensuráveis e positivos.
6

Como um novo modo de enxergar as relações entre as pessoas, as propostas de


Rogers atingiram em cheio os desejos de uma nova ordem surgida com sociedades
alternativas na década de 1960. Corajoso, Rogers não hesitava em dizer o que pensava sobre
os mais diversos assuntos, como, por exemplo, o casamento entre múltiplos parceiros e o
consumo de substâncias alucinógenas, além de pesquisas com poderes da mente como forma
de adivinhação. Para tanto, Rogers descreve a condição apropriada:

O aspecto facilitador da relação é a compreensão empática. Com isso quero


dizer que o terapeuta capta com precisão os sentimentos e significados
pessoais que o cliente está vivendo e comunica essa compreensão ao cliente.
Quando está em sua melhor forma, o terapeuta pode entrar tão
profundamente no mundo interno do paciente que se torna capaz de
esclarecer não só o significado daquilo que o cliente está consciente como
também o que se encontra abaixo do nível de consciência. Este tipo de escuta
ativa e sensível é extremamente raro em nossas vidas. (ROGERS, 1983, p.
39)
Rogers não acreditava em controle. Sobre isto, ele diza que:

Sinto pouca simpatia pela idéia bastante generalizada de que o homem é


fundamentalmente irracional e que seus impulsos, quando não controlados,
levam a destruição de si e dos outros. O comportamento humano é
extremamente racional... A tragédia para muitos de nós deriva do fato de as
nossas defesas nos impedirem de surpreender essa racionalidade, de modo
que estamos conscientemente a caminhar em uma direção, quando
organicamente seguimos outra. (ROGERS, 1978, p. 10)
Outro conceito profundamente enraizado na cultura ocidental - também oposto às
ideias de Rogers – vem do também psicólogo Burrhus Frederic Skinner, pai do termo
Behaviorismo Radical (HOLLAND, 1969), modelo que reduz o ser humano a algo
meramente limitado a uma sequências de estímulos e respostas. Para Skinner, o ser humano é
passível de condicionamento via reforços positivos ou negativos, o que é diametralmente
oposto as teorias de Rogers e a confiança no organismo humano como autocapaz.

Tais conceitos dão base de argumentação contra a abordagem centrada na


pessoa até hoje. Em defesa de Rogers, basta dizer que o seu grande livro A terapia centrada
no paciente (IBIDEM) traz de forma pormenorizada pesquisas feitas com educação
autodirigida e conceitos como empatia e congruência, explicados anteriormente. No mesmo
livro há uma resposta para aqueles que acreditam que o trabalho de Rogers é um ‘tudo-pode’.
Para o psicólogo, a abordagem centrada na pessoa está entre a autocracia, ordem baseada em
7

um poder autoritário e repressor e o laissez-faire, termo em francês que designa o não intervir
absoluto.

Dois anos depois, Rogers é indicado ao Prêmio Nobel da Paz no dia 28 de


janeiro. Infelizmente, Carl Rogers falece pouco depois no mesmo ano, aos 85 anos e ainda em
plena atividade, no dia 04 de fevereiro de 1987 em La Jolla, Califórnia, nos Estados Unidos.

1.1 OS GRUPOS DE ENCONTRO

Em seu livro Grupos de Encontro, Rogers pretende lançar as bases, não para um
mero grupo de trabalho, mas, como ele mesmo afirma; “é evidente que houve e haverá sempre
grupos enquanto o homem sobreviver neste planeta. Mas estou empregando a palavra num
sentido particular, o da experiência intensiva” (ROGERS, 2002, p.1). Em suma, o que Rogers
propõe é um grupo baseado em sua própria teoria centrada na pessoa. O psicólogo prossegue
e delinea o uso dos grupos: “estes grupos têm funcionado em inúmeras situações diversas.
Tem sido realizados nas indústrias, universidades, intituições religiosas, nas agências
governamentais, instituições educacionais e penitenciárias” (IBIDEM, p.2). Como reforço ao
estudo, Rogers cita o trabalho do psicólogo estadunidense Kurt Lewin, realizado em 1947,
que desenvolveu a ideia de que os grupos são “importantes para o treino das capacidades
humanas” (IDEM, p.3).

Para funcionar corretamente, acredita Rogers, os grupos precisam ter certas


características comuns, como, um número reduzido de membros, entre 8 a 18. Além disso, é o
próprio grupo quem define os seus objetivos e direções pessoais. Em quase todos os casos,
continua Rogers, a responsabilidade de dirigir um grupo é de um líder ou daquilo que o
psicólogo descreve como um “facilitador”, pois a responsabilidade deste consiste justamente
em facilita (fazer fluir) as expressões e sentimentos de cada membro do grupo. Rogers cita
também um clima de segurança emocional, para que as defesas psicológicas de cada membro
sejam reduzidas pouco a pouco. Desenvolve-se, a partir desta premissa, um local (mais
psíquico que físico) em que os sentimentos dos membros do grupo são amplamente aceitos,
tantos os positivos quanto os negativos (IDEM, p.8). Para Rogers, neste ponto “cada membro
8

caminha para a aceitação do seu ser global – emotivo, intelectual e físico – tal como ele é,
incluindo as suas potencialidades” (IDEM).

Prossegue Rogers: “com indivíduos menos inibidos por rigidez defensiva, a


possibilidade de mudanças em atitudes e comportamentos pessoais, métodos profissionais e
relações administrativas torna-se cada vez menos ameaçadora” (IDEM, ps. 8-9). Há ainda um
momento de feedeback, definido por Rogers como “a reação que a pessoa provoca nos
outros” (IDEM), assim, a pessoa pode perceber como é vista em suas relações interpessoais.
Tal aprendizagem, finaliza Rogers, tende a ser transitória ou mais duradoura para as diversas
relações, como aquelas entre subordinados e os chefes de determinada empresa (IDEM). Para
tanto, o estilo do líder é algo fundamental, afirma o psicólogo (IDEM).

2 O COACHING E SUA HISTÓRIA

Conforme o site da SLAC, Sociedade Latino Americana de Coaching, o termo


nasceu a partir do verbo em inglês “coax”, que significa persuadir. Para a a SLAC, o
profissional de coaching atua como um estimulador externo que desperta o potencial interno
em outras pessoas por meio da flexibilidade, insight, perseverança, estratégias, ferramentas
pautadas em uma metodologia de eficácia comprovada. (SLAC, 2016).Já para Correia e
Santos, coach vem do termo húngaro kócsi, que quer dizer carruagem, um tipo de 4 rodas,
com molas de aço e puxada por cavalos, desenvolvida justamente na cidade de Kócs, Hungria
do século XV (CORREIA & SANTOS, 2011).

Segundo Krauz, o coaching começa por volta de 1970 quando o ex-tenista


Timothy Gallwey amplifica o conceito de técnico de tênis para um auxiliar comportamental
do desempenho das pessoas. O objetivo era lidar com problemas e situações das mais
variadas, não através de críticas, mas com a potencialização das qualidades inerentes do
indivíduo. Já nos Estados Unidos da década de 1980 há uma ampliação dos trabalhos de
coaching com a chegada de novos profissionais dispostos a auxiliar o desenvolvimento
humano. É também nesta década que os movimentos empresariais mudam o foco do resultado
dos trabalhos e funções para a qualidade de vida dos seus profissionais. O relacionamento
interpessoal passa a ser mais e mais valorizado (KRAUSZ, 2007).
9

O dicionário Martins Fontes segue na mesma linha e afirma que coaching deriva
da palavra, coach, em inglês. Como substantivo, essa se refere a um tutor particular, em outras
palavras, um profissional especialista na preparação de um indivíduo, alguém atua no
treinamento de esportistas ou na preparação de atores e cantores. (FONTES, 2005).

O SLAC complementa e afirma que a necessidade do aumento de performance


humana, objetivo do coaching, foi a demanda das empresas e organizações que precisam de
decisões rápidas e assertivas em um mercado altamente globalizado e competitivo (IBIDEM).
Para transformar as pessoas, ainda de acordo com o SLAC, faz-se necessário apoiá-las por
meio de técnicas próprias.

De acordo com Whitmore, o coaching leva o indivíduo a uma autopercepção de


si, além de uma amplificação da percepção sobre aqueles com quem se relaciona, dentro de
um contexto de atuação. É esta percepção amplificada que facilita a análise, a ajuda de
diagnósticos e a tomada de decisões na complicada rotina empresarial deste século
(WHITMORE, 2006).

A grande aplicação do coaching se deve no contexto empresarial. Para Rabaglio


(2004), o termo deve ser entendido como um estilo de gerenciamento de pessoas com
processos e tarefas bem definidos, metas claras e alcançáveis, com o objetivo de desenvolver
as pessoas e, por conseguinte, as organizações (IBIDEM). Com este processo – de coaching –
são deflagradas construções de planos de ação mais eficazes, que propiciam o êxito das metas,
sejam elas pessoais ou corporativas.

Rabaglio (IDEM) afirma ainda que o coaching trabalha com metas de pequeno,
médio e curto prazo. Além disso, este autor diz que o coaching identifica os pontos fortes e
fracos do indivíduo e, sendo processo, auxilia em como lidar com eles. Isto faz pensar, ainda
segundo Rabaglio (IDEM), em uma forma estruturada de desenvolvimento de pessoas, grupos
e equipes sobre o cenário organizacional.

Neste sentido, Zabot e Silva (2002) afirmam que, no cenário globalizado e


competitivo, resta às empresas um papel voltado ao aprendizado:

Fatores preponderantes do processo de globalização como competição,


demanda por qualidade, menores ciclos de vida dos produtos e mudanças
tecnológicas fazem com que a administração voltada para o aprendizado
10

tenha papel fundamental na obtenção de sucesso ou fracasso de uma


organização dentro desse ambiente (IBIDEM, p. 13)

Em que situações organizacionais o uso do coaching é recomendado? Araújo


(2006) assim as define:

● Quando há conflitos entre valores pessoais;


● Em processos decisórios críticos de toda espécie;
● Questionamentos diversos sobre o desenvolvimento do capital humano;
● Baixa qualidade na comunicação interna;
● Desmotivação;
● Problemas com objetivos e sinergia;
● Desequilíbrios de ordem emocional, como o estresse;
● Conflitos;
● Objetivos não alcançados em vendas;
● Produtividade aquém das metas;
● Falha nos relacionamentos;
● Mudanças organizacionais

Para Motter Junior (2012), o coaching se assemelha muito mais a uma filosofia:
“o coaching pode ser visto mais como filosofia geral e de perspectivas do que um estilo
particular de liderança” (IBIDEM, p. 21). Como uma filosofia, o coaching possui influência
de vários campos do conhecimento, que culminam em moldar seu modus operandi. A cada
nova influência, um novo jeito de fazer coaching e assim surgem as escolas de pensamento,
que norteiam as perspectivas de trabalho, sempre de acordo com as influências que recebeu ou
preceito dos seus executores. Cristina Gaspar (2016), consultora de coaching e palestrante,
mostra algumas destas escolas:

● PNL: influenciada pela programação neurolinguística, fornece um modelo


tanto pessoal quanto profissional;
● COMPORTAMENTAL (ou HUMANISTA): tem foco de trabalho na
transferência de aprendizado para a vida prática, através de mudanças
comportamentais. É influenciada pela corrente humanista da psicologia;
11

● G.R.O.W.: uma sigla que forma a palavra crescer, em inglês. Cada letra
corresponde a uma etapa. Por exemplo, a letra G quer dizer goal, que, em
inglês, significa meta;
● NEUROCOACHING: uma corrente moldada principalmente pela biologia
e seus estudos sobre o cérebro e o sistema nervoso, correlacionando estes
com o comportamento;
● FILOSÓFICO: prioriza a mudança de comportamento através das
percepções, em outras palavras, através dos diferentes olhares sobre as
coisas;
● ONTOLÓGICO: tem como objeto de trabalho o domínio do ser
observador. Este, através do exame e atenção das coisas ao redor, modifica
o próprio comportamento e, a partir daí, pode realizar transformações
nunca antes tentadas, obtendo, com isso, resultados diferentes.

Para facilitar o entendimento de alguns termos comuns a área, o Instituto


Brasileiro de Coaching, IBC, afirma que coaching é um processo de desenvolvimento. O
profissional desta área é o coach, enquanto o cliente, ou aquele que passa pelo processo de
coaching é o coachee (IBC, 2016).

Motter Junior (IDEM) cita algumas etapas do processo de coaching, a começar


pelo patrocinador – quem irá pagar, seja o indivíduo ou a empresa. Algumas organizações
fazem de forma individual, já outras o integram a programas próprios de treinamento e
aprendizagem. Esta fase é definida pelo autor como pré-coaching. Após a contratação, vem
uma fase de planejamento, subdividida em: coleta de dados, definição de metas,
desenvolvimento e execução do plano de coaching e a mensuração dos resultados, além dos
eventuais ajustes.

3 A RELAÇÃO ENTRE ROGERS E O COACHING

Esta relação não é nova. O próprio site da ICC, Comunidade internacional de


Coaching, entidade sem fins lucrativos, criada por Joseph O’Connor e Andrea Lages em 2001
12

em Londres, Inglaterra (ICC, 2016) fala da ligação do coaching com Carl Rogers ao explicar
sua metodologia humanista:

A metodologia segue as três tradições de conhecimento fundamentais do


coaching:
a) Psicologia humanista e as obras de Abram Maslow e Carl Rogers.
Os princípios essenciais da Psicologia humanista são:
- As pessoas possuem uma experiência válida de seus próprios valores e
metas.
- As pessoas desejam ser a melhor versão de si mesmos.
- Todos somos únicos e valiosos.
- Todos desejam poder escolher e pôr em prática suas decisões.
Estes são princípios básicos de todas as escolas de coaching (IBIDEM).

A pesquisadora Joceli Gonçalves (2016), uma profissional de coaching e adepta


da terapia centrada na pessoa, também faz a ligação entre Rogers e coaching. Para ela, este elo
se estabelece através da relação entre o coach e o coachee. Outro ponto de contato, ainda
segundo a pesquisadora, é a qualidade de aconselhamento que o coaching possui, desdobrada
como uma forma de atualização. Tanto Rogers quanto o coach enxergam seu cliente
(coachee) como alguém que deve ser respeitado em suas experiências, aprendizado e a partir
de suas próprias construções internas. Como Rogers, o coach permite que o cliente tome
consciência de suas ações indesejáveis e repetitivas, adquirindo uma clareza de pensamento e,
desta forma, desconstruindo certos padrões comportamentais. Estes fatores levam a um
crescimento do coachee. Também em Rogers e no coaching é admitido que o conhecimento é
centrado no cliente, não em um professor ou orientador com “superpoderes”.

Drummond e Bitart (2010) também são entusiastas da ligação entre Carl Rogers e
o coaching humanista:

Desta forma, o coaching com metodologia centrado em pessoas se diferencia


de outras abordagens pela forma rápida e eficaz de trabalhar as dificuldades
e inadequações do cliente, permitindo o olhar observador do coachee, e
possibilitando as mudanças desejadas por ele (DRUMMOND E BITART,
2010, p. 5)

Gonçalves (IBIDEM) complementa e afirma que é o coachee o sujeito do


processo de coaching que é estimulado a reconhecer e a desenvolver a si mesmo, ultrapassar
resistências internas e fortalecer novas identidades e valores, tudo para objetificar os sonhos
em realidade. A pesquisadora prossegue e diz que, como não se trata de um mero treinamento,
13

o coaching não tem como objetivo a transmissão de conteúdo, mas sim, de facilitar a
aprendizagem aos moldes de Carl Rogers.

Estas premissas, estes pontos de contato entre a teoria rogeriana e o coaching


servem tanto para casos individuais quanto para grupos. No universo corporativo, conforme
foi citado, o processo de coaching é ligado a outros como treinamento e aprendizagem. É aí
que residem os grupos e é também neste contexto que se pode avaliar os prós e contras da
aplicação de Rogers no ambiente organizacional.

Para validar seus grupos de encontro, Rogers cita as pesquisas do dr. Jack Gibb
(1970). Este acredita que grupos possuem forte apelo terapêutico, mas, para ter eficácia,
precisam primeiramente se ajustar à organização: família, vida, empresa e ambiente da
pessoa. Sobre o que se processa nos grupos, Gibb afirma: “Ocorrem mudanças na
sensibilidade, na capacidade de dirigir os sentimentos, na direção da motivação, nas atitudes
para com o eu e sua interdependência” (GIBB apud ROGERS, 2002, p. 138). Rogers define
ponto a ponto esta frase de Gibb. Alguns dos pontos interessam a este artigo, como a
definição que Rogers dá sobre motivação: “por direção de motivação, Gibb refere-se a
conceitos como atualização do eu, autodeterminação, compromisso [o grifo é meu] e direção
interior” (IDEM).

Quase no final do seu trabalho com os grupos de encontro, Rogers fala da


aplicação na TRW Systems Inc. uma indústria de informática nos Estados Unidos. Como
resultado, Rogers explicita os pontos desenvolvidos nesta empresa após a aplicação dos
grupos (IDEM, ps 159-161):

● Criação de um clima aberto para resolução de problemas em toda


organização;
● Reforço de autoridade associada ao conhecimento e competência;
● Responsabilização das decisões e resoluções próximas às fontes de
informação;
● Aumento de confiança em todos os níveis da organização;
● Aplicação da competitividade aos objetivos de trabalho (não mais entre si)
e aumento do esforço de colaboração;
14

● Desenvolvimento de um sistema de recompensas mais junto, com


premiações em dinheiro mais desenvolvimento das pessoas;
● Aumento do sentimento de “posse” dos objetivos da organização por parte
dos trabalhadores;
● Fomento do autocontrole e autodireção dentro da organização.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chiavenato (IDEM, p. 118) afirma que todo empregado tem necessidade de


participação, em suma, a necessidade de pertencer a um grupo para ter aprovação social,
reconhecimento, e calor humano, além do desejo de fazer parte de algo que seja construtivo e
significativo na esfera humana.

Neste artigo, por vezes, se apagarmos as referências bibliográficas e


embaralharmos as situações, teremos dúvidas se falamos de Rogers ou de coaching. Exemplo;
a explicação de Rogers ao argumento de Gibb com a definição de motivação, grifada aqui,
mistura-se com as propostas de coaching de Whitmore O mesmo vale para as propostas de
Araújo e os resultados da TRW Systems. São teorias paralelas em muitos pontos, com fins
específicos - Rogers era psicólogo e seu trabalho foi usado, na maior parte das vezes, em
psicologia e educação – o que não impede que estas observações não possam ser tomadas de
empréstimos pelo coaching, a exemplo do coaching Humanista. Aproveita-se um pouco mais
de Rogers e toma-se uma ferramenta muito útil para o coaching, os chamados grupos de
encontro. Só isto seria suficiente para mostrar a aplicabilidade proposta aqui.

Ainda sim, não se trata da simples transposição de uma coisa na outra, uma vez
que, por vezes, as teorias de Rogers e a do coching têm objetivos bem diferentes. Um viés
negativo, a saber, está na proposta de abertura às emoções proposta por Rogers. Pode
funcionar muito bem no âmbito familiar, das amizades, mas será tão funcional assim no
campo corporativo, lugar onde as competições internas por cargos são elevadas? Em outras
palavras, teria algum trabalhador a coragem de se expor sem reservas, como aquela proposta
por Rogers, em um ambiente onde o seu colega quer a sua vaga? O autor deste artigo acredita
que não ou que pode ser algo muito difícil de acontecer ou até mesmo intimidador. Porém,
15

usada com a devida parcimônia e adaptação, os grupos de Rogers podem muito bem funcionar
para os objetivos do coaching.

Os processos tecnológicos e de mudanças dos nossos tempos só crescem em


rapidez, o que não é novidade alguma. A grande questão, talvez esquecida por muitos dos
administradores é que este ser humano com vários nomes, seja funcionário, trabalhador,
colaborador ou colega carrega um aparelho emocional que pouco tem se transformado nos
últimos séculos. Diferentemente de uma das definições do coaching, que é de “olhar para
frente”, chegou a hora de buscar no passado certas funcionalidades teóricas e ferramentais de
pessoas como Carl Rogers. Buscar no antigo algo que possa ser usado no novo, eis um
caminho, eis uma proposta para o coaching, para a teoria rogeriana e para todos aqueles que
estudam o comportamental nos mais diferentes campos do saber.

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Luis Cesar G. de. Gestão de Pessoas. São Paulo: Atlas, 2006.

BUKOWSKI, Charles. Factótum. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2007.

CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à teoria geral da administração: uma visão


abrangente da moderna administração das organizações. 7 ed. Rio de Janeiro: Elsevier,
2003.

CORREIA, M. C.; SANTOS, N. R. (2011). Psicologia e Coaching. In M. P. Lopes, P.


J.Palma, R. B. Ribeiro & M. P. Cunha, Psicologia Aplicada (pp. 413-430). Lisboa: Editora
RH, Lda.

ESCOLA SUMMERHILL. Disponível em < http://www.summerhillschool.co.uk > Acesso


em 15/5/09.

DRUMMOND, J.; BIDART, M. Coaching com Psicodrama. São Paulo, Revista Potenciar.
Ano 1. pp. 3 – 30, 2010.

FONTES, Martins. Password: English dictionary for speakears of portuguese. São Paulo:
Martins Fontes, 2005.
16

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido, 17ª. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

GASPAR, Cristina. Sferas consultoria. Disponível em <


https://blogsferas.wordpress.com/2011/06/01/a-origem-do-coaching-e-suas-escolas-de-pensa
mento/ > Acesso em 13/7/2016.

GASPARINI, Cláudia. 5 atitudes típicas de quem não tem inteligência emocional. Revista
Exame. Disponível em <
http://exame.abril.com.br/carreira/noticias/5-atitudes-tipicas-de-quem-nao-tem-inteligencia-e
mocional > Acesso em 10/4/2016.

GALLWEY, W.T. O jogo interior de tênis. São Paulo: Textonovo, 1996.

GIBB, Jack. The effects os the human relations training. IN: ROGERS, Carl. Os grupos de
encontro. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: teoria revolucionária. São Paulo: Objetiva,


2001.

HOLLAND, J. SKINNER, B. F. A análise do comportamento. São Paulo: Herder e EDUSP,


1969.

IBC, Instituto Brasileiro de Coaching. Disponível em <


http://www.ibccoaching.com.br/portal/coaching/o-que-significa-coach-coaching-coaches-coac
hee/ > Acesso em 12/7/2016.

ICC, Comunidade Internacional de Coaching. Disponível em <


http://www.internationalcoachingcommunity.com/pt > Acesso em 14/7/2016.

KRAUSZ, Rosa. Coaching executivo: a caminho da liderança. São Paulo: Nobel, 2007.

L&PM EDITORES. Vida & obra: Charles Bukowski. Disponível em <


http://www.lpm.com.br/site/default.asp?TroncoID=805134&SecaoID=948848&SubsecaoID=
0&Template=../livros/layout_autor.asp&AutorID=57> Acesso em 24/6/2016.

MOTTER JUNIOR, Mario Divo. A dimensão do sucesso em coaching: uma análise do


contexto brasileiro. Rio de Janeiro: FGV, 2012. Disponível em <
http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/9952/A%20dimens%C3%A3o%
17

20do%20sucesso%20em%20Coaching%20(APROVA%C3%87%C3%83O%20JUNHO-2012
)%20Web.pdf?sequence=1 > Acesso em 13/7/2013.

RABAGLIO, Maria Odete. Ferramentas de avaliação de performance com foco em


competências. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2004.

REVISTA DE ESTUDOS ROGERIANOS "A Pessoa como Centro" Nº. 3 Primavera-Maio


1999.

ROGERS, Carl (1902 – 1987). A terapia centrada no paciente. São Paulo, Martins, 1951.

_______. De pessoa para pessoa, o problema de ser humano. 3ed. São Paulo: Pioneira,
1987.

_______. Os grupos de encontro. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

______. Psicoterapia e relações humanas: teoria a prática da terapia não-diretiva. Belo


Horizonte: Interlivros, 1959.

______. Liberdade para aprender. 4. Ed. Belo Horizonte: Interlivros, 1978.

______. Um jeito de ser. São Paulo: EPU, 1983.

SLAC, Associação Latino Americana de Coaching. Disponível em <


http://www.slacoaching.com.br/o-que-e-coaching > Acesso em 12/7/2016.

WHITMORE, John. Coaching para a performance. Rio de Janeiro, Qualitymark, 2006.

ZABOT, João Batista M.; SILVA, Luiz C. M. Gestão do conhecimento: aprendizagem e


tecnologia: construindo a inteligência. São Paulo: Atlas, 2002.

Você também pode gostar