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A Obsessao de Zachary King - Mari Monni
A Obsessao de Zachary King - Mari Monni
Mari Monni
Direitos autorais © 2022 Mari Monni
Os personagens e eventos retratados neste livro são fictícios. Qualquer semelhança com
pessoas reais, vivas ou falecidas, é coincidência e não é intencional por parte do autor.
Para Luísa.
E para Renata.
Zachary
Gaia
Zachary
Gaia
∞∞∞
Gaia
Zachary
Gaia
Zachary
Gaia
Ele alcança mais uma taça, vira todo o seu conteúdo e a enche
novamente. O processo é repetido três vezes, sem qualquer pausa.
Mas Oliver apenas ri, o corpo cada vez mais junto ao meu, me
pressionando contra a mesa.
— Que isso, gata. Não precisa se fazer de difícil. Eu sei muito
bem o que você quer.
Zachary
Samantha não me dá sossego. Ela está acostumada a ter tudo o
que quer, na hora que quer. Então, por que aceitaria a frase que mais
disse a ela nos últimos meses? “Acabou, Sam.”
Se arrependimento matasse, eu estaria enterrado a sete palmos.
Enquanto desço as escadas que levam ao primeiro andar da
casa de praia, tento me acalmar, respirando fundo para não
demonstrar o quanto essas conversas com ela me irritam. A de
ontem foi uma merda; a de hoje, ainda pior. Sam estava aos prantos.
Mas já passei da fase de sentir pena. Tudo o que eu queria neste
domingo era ficar um pouco com a minha família, comer os
sanduíches que Tata fez para mim e, quem sabe, conversar um
pouco com Gaia. Talvez descobrir por que estou tão encantado por
uma garota que mal conheço, também ter certeza de que não existe
essa coisa de “maldição dos King”. Porém, não fiz nada disso, já que
precisei ficar trancado no quarto enquanto tentava racionalizar com a
miss carência.
Maldito tio Eddie que me apresentou a ela. O pior é que nem
posso ser mais enfático no modo como a trato, porque Samantha
Strauss é a filha de um dos nossos diretores em Londres.
Olho para o relógio no pulso e vejo que já são quase três da
tarde. Pelo menos, ainda dá tempo de curtir um pouco o piquenique.
Assim que cruzo a porta, louco para dar um mergulho no mar, meus
pensamentos perdem o foco ao ver Gaia correndo pelo jardim.
Desvio do meu destino e vou até ela, que nem presta atenção na
minha presença.
— Gaia! — chamo seu nome, mas ela me ignora e continua
correndo, passando pela lateral da piscina.
É claro que a sigo até estarmos na parte de trás da casa. Antes
que ela consiga entrar pela porta da cozinha, eu a alcanço.
— Gaia — repito e consigo segurar seu braço.
— Me largue, seu… — ela grita e sou obrigado a dar um passo
para trás, espantado com a violência com que gira o corpo, se
soltando de mim. Quando me encara, o rosto lívido me assusta. —
Ah, achei que fosse ele.
As palavras vêm acompanhadas de um suspiro de alívio, o que
me deixa ainda mais confuso — e tudo piora quando vejo lágrimas
pesadas escorrendo pelo rosto de porcelana. Os olhos estão
vermelhos e a respiração, acelerada. Vê-la chorando causa o mesmo
impacto de um tapa na minha cara.
— Está tudo bem? O que aconteceu? Quem fez isso? —
pergunto com aflição, colocando uma mão na porta para impedi-la de
entrar.
— Nin-ninguém. Nada aco-conteceu — ela gagueja uma
resposta que eu sei ser falsa.
— Duvido. — Cruzo os braços na frente do peito e deixo que
meus olhos caiam por seu corpo. Mas Gaia não parece machucada.
— Só… preciso ficar sozinha, está bem? — diz e puxa o ar com
força, como se fosse difícil respirar.
— Prometo deixar você sozinha assim que me disser quem te
fez ficar nesse estado. — Meu tom deixa claro que não estou para
brincadeiras.
Ela não responde de imediato, o que me faz ficar ainda mais
preocupado. Apenas olha para os lados, como se me encarar fosse
difícil. Minha curiosidade, aliada à preocupação, não me permite
relaxar. Por isso, de forma impensada, deixo meus braços caírem
para os lados e dou um passo em sua direção. A reação dela é se
afastar de mim.
— O. Que. Aconteceu? — pergunto pausadamente, cada vez
mais tenso.
É então que seus olhos encontram os meus — e esqueço como
se faz para respirar. Porque, ali dentro, há muito mais do que um tom
azul. Há uma tristeza profunda, uma desesperança, um pânico.
— Gaia, por favor, me conte — peço baixinho, percebendo que
uma aproximação brusca não é a forma certa de conseguir
respostas.
Ela está abalada demais. Vulnerável demais.
— Oliver…
Uma única palavra sussurrada é o suficiente para fazer meu
sangue ferver. Aquele filho da puta desgraçado!
Nem dou tempo para que Gaia continue sua explicação.
— Vá para o seu quarto e tire o dia de folga — é tudo o que digo
antes de virar as costas para ela e seguir até a tenda.
Vou matar alguém hoje!
Marcho até lá, passos apressados e cheios de raiva, sabendo
muito bem do que Oliver é capaz. Desde que chegamos, ele ficou
fazendo comentários sobre Gaia. Como ela é linda, como é gostosa,
como queria “dar uma comidinha nela” na despensa — palavras
dele. Pelo visto, foi só beber um pouquinho que criou coragem de
investir.
A conversa que escutei entre Gaia e Derek me volta à mente.
Ele a alertou sobre os assédios de Oliver e de demais convidados, e
eu não levei a sério. Achei que ninguém que frequenta nosso círculo
social forçaria uma mulher a fazer algo que não quisesse.
Desta vez, não há contrato na minha cabeça. Não há executivos
do cinema, nem amizade de uma vida inteira.
Quando entro embaixo da tenda, ignoro as vozes alteradas das
pessoas e vou direto até aquele idiota. Sem pensar duas vezes, dou
um soco em sua cara, levando-o ao chão.
— Zachary! — minha mãe grita atrás de mim e sinto braços
tentando me conter, mas já estou além da racionalidade.
— Saia da minha casa agora! — cuspo as palavras. — Você
nunca mais vai pisar em uma propriedade King, entendeu? Não
aceitamos comportamentos de merda sob o nosso teto.
— Ah, o príncipe no cavalo branco veio em defesa da
empregadinha? — Oliver diz em tom de escárnio, limpando o corte
que abriu no lábio.
— Tanto faz se ela é empregada ou a porra da rainha da
Inglaterra, seu pote de merda! — A expressão de raiva não deixa o
meu rosto. — A nossa família trata todo mundo da mesma forma, e
não será um bostinha como você que vai sujar o nosso nome. Já
disse e repito: saia da minha casa agora, ou vai detestar as
consequências. — Minha ameaça não é vazia.
Oliver sempre foi do tipo que se aproveitou da nossa companhia
para subir na vida, tudo porque crescemos juntos. Por mais que se
ache um de nós, ele está longe de ser um King.
— Você ouviu o meu filho, Oliver. — Sinto quando meu velho
coloca a mão no meu ombro em sinal de apoio e as que me
seguravam se afrouxam. — Saia de nossa casa e não volte nunca
mais. Você não é mais bem-vindo.
Se a minha explosão e o soco não surtiram efeito, então a
declaração firme de meu pai é o suficiente para mostrar que eu não
estava brincando. É o último prego no caixão de Oliver. Porque
ninguém discute com Harvey King. Ninguém.
— Vocês só podem estar de palhaçada. Ela é uma empregada!
— Oliver tenta argumentar.
— Como meu primo disse — Trenton entra na conversa —, não
importa quem ela é.
Olho para os lados e vejo uma parede de homens sendo
formada. Trenton, Jackson, Eli, Sebastian, Harvey, Edmund e Walter:
todos dispostos a defender o que levamos anos para conquistar. Se
tem uma coisa da qual nos orgulhamos é de fazer a coisa certa.
Sempre. Dentro e fora do escritório, a família King vive sob um
código de conduta transmitido de geração em geração. Nunca minta,
nunca trapaceie, nunca desrespeite. Ponto final.
Leva um tempo para que Oliver perceba que não estamos
brincando, mas ele enfim volta para dentro da casa, xingando
entredentes.
— Derek, vá com ele para se certificar de que não haja uma…
mudança de percurso — peço ao garçom —, e depois chame um
carro para que o leve de volta à cidade. Eu pago.
Inclusive, pagaria muito mais para nunca ter que olhar para a
cara presunçosa de Oliver de novo.
O silêncio, que até então tinha se instalado na tenda, é rompido
por um sussurro de Vicky:
— Eu deveria ajudar meu irmão e…
— Você ainda é nossa convidada, Vicky. — Elijah encara a
garota, que parece encabulada com a situação. — Não fez nada de
errado.
— Mas Oliver é…
— Seu irmão, nós sabemos disso. Só que não estamos aqui
para te julgar — meu primo insiste. Dos cinco, ele é o mais sensato.
— Oliver agrediu uma funcionária, uma mulher, e por isso ele não
fará mais parte do nosso círculo social. Simples assim. Mas isso não
se estende a você ou ao seu pai.
— Agradeço pelas palavras, Elijah. — Ela passa a mão no braço
do meu primo, em um gesto de carinho. — Mesmo assim, ele é a
minha família. Desculpe a todos. — Vicky olha ao redor, para os
demais presentes, e começa a se afastar, seguindo os mesmos
passos que Oliver fez há poucos minutos.
— Que merda!
— Jackson! — tia Leah repreende o filho.
Troco olhares com meu pai, sabendo que a merda, na verdade,
é muito maior do que eles pensam.
Caralho, isso vai acabar com as chances de firmar um contrato
com Damon Cooper…
— O quê? É uma situação de merda e todos sabemos disso. A
Gaia estava conversando comigo. Na verdade, eu estava tentando
conversar com ela, mas a garota é tão quietinha que nem quis trocar
muitas palavras.
Não sei por que, mas a confissão de Jackson me faz soltar um
suspiro de alívio, e ignoro o outro problema por enquanto.
— E Oliver apareceu do nada? — Sebastian quer saber.
— Aham — Jackson confirma. — Ele escutou uma conversa
pela metade e se achou no direito de entrar no assunto. É claro que
pegou o bonde andando e pensou logo em merda.
— O que você disse para Gaia, Jackson? Preciso me preocupar
com você também? — pergunto ao meu primo, que pende a cabeça
para o lado enquanto me encara. Mas são as sobrancelhas erguidas
que deixam claro a sua desconfiança.
— Não precisa se preocupar comigo, Zach. — Ele sorri. — Só
estava oferecendo uma taça de espumante para ela. Acho que Gaia
ainda não entendeu que somos uma família diferente.
De fato, somos. Lottie e Derek conversam com a gente
enquanto servem. Lottie principalmente, já que sempre senta
conosco e toma alguns drinks. Este é o nosso normal. Nossos
funcionários podem ser amigos também, e fazemos questão de que
saibam que são bem-vindos em nossa casa para além de trabalhar.
— Vou falar com ela — aviso.
— Não — meu pai diz. — Eu falo com ela. Aproveitem o resto do
piquenique.
— Ninguém vai falar com ela. — A voz de minha mãe soa mais
alto do que as demais e me espanto ao vê-la em pé, com uma mão
na cintura enquanto a outra segura uma taça, e aquele olhar que tem
sempre que quer me dar uma bronca.
— Mas, mãe, eu acho que… — tento intervir, mas é em vão.
— Você não acha nada, Zachary James King. — Nome do
meio? Definitivamente, é uma bronca. — Inclusive, creio que já tenha
feito o suficiente por hoje. Pode deixar que eu falo com ela. A menina
não precisa de mais homens a rondando.
Merda! Eu queria poder conversar com Gaia agora, saber se
está tudo bem. Mas nessa casa há uma hierarquia: Harvey King
manda em todo mundo, e Monica King manda em Harvey. Até
mesmo meu pai fica quieto e apenas assente. Por isso, me limito a
aceitar o espumante que Jackson oferece e viro tudo de uma só vez,
enquanto observo minha mãe caminhar de volta para casa.
Paciência nunca foi meu forte, mas não vou desobedecer. Não
agora, depois de já ter fodido com tudo. Só que foi impossível
controlar meus impulsos depois de ver o estado em que Gaia estava.
E por mais que Oliver tenha merecido muito mais do que apenas um
soco, já começo a pensar nas consequências que minha atitude trará
para os negócios da família.
Um mergulho no mar parece mais do que necessário neste
momento.
Capítulo 11
Gaia
Zachary
Gaia
Zachary
Gaia
∞∞∞
— Gaia, Harvey está te chamando na sala de jantar — Derek
avisa enquanto termino de bater o chantili.
Meus pulsos estão doendo de tanto mexer o fouet, até o creme
ganhar uma espessura airada. Viro o pote de cabeça para baixo e
Derek arfa com a surpresa, porém, nem uma gota vai ao chão.
— Está pronto — aviso à Martha, que tem um sorriso no rosto.
— Boa menina. — É o máximo de elogio que receberei dela, por
isso, apenas assinto com a cabeça e coloco o bowl sobre a bancada.
— O que ele quer? — pergunto a Derek, que franze as
sobrancelhas e parece não entender a pergunta. — O sr. King. O que
ele quer comigo?
— Não sei. — Dá de ombros. — Só me pediu para vir te buscar.
Olho para Martha, que não fica nem um pouco contente com o
chamado.
— Vá e volte logo. — Aponta a porta e corro para limpar as
mãos em um pano de prato antes de sair da cozinha.
Como prometido, a família chegou pontualmente às 17h30.
Diferente do que aconteceu na semana passada, não precisamos
ficar na entrada da casa para recebê-los. Acho que esse “ritual” é só
no primeiro dia mesmo. Ainda bem, porque assim fiquei limitada ao
meu trabalho e não precisei mais me preocupar em ver Zachary.
— Ah, Gaia! — Harvey King se levanta da cadeira à cabeceira
da mesa e me toma em um breve abraço paternal, que me pega de
surpresa. — Ainda bem que continua com a gente.
— Obrigada, sr. King. É muito bom vê-los novamente. — Sorrio
para todos, até que meus olhos encontram com aqueles que não
gostaria de ver agora.
Acho que Zachary percebe o meu desconforto, porque me
oferece um sorriso contido. A confissão dele na sala de jogos fez
com que cruzássemos uma linha, e não tenho ideia do que vai
acontecer agora. Porém estou decidida a manter o máximo de
profissionalismo possível.
— Espero que estejam gostando da comida. Martha se
empenhou bastante hoje — digo, na esperança de que o assunto
leve me faça esquecer de coisas mais pesadas.
— A Martha é uma cozinheira excepcional — é Jackson quem
fala, sorrindo para mim. Sorrir de volta é involuntário. Tem algo nele
que me encanta de um jeito fraterno. — Se eu pudesse, carregaria
aquela mulher pra cima e pra baixo.
— Você entraria em uma guerra se fizesse isso, filho — Walter
King brinca e as risadas tomam conta da mesa.
— Ah, pai, você sabe que não tenho medo de uma boa briga.
De repente, um pedaço de beterraba é arremessado, cruzando
os demais presentes e atingindo em cheio o peito de Jackson. A
blusa branca ganha uma mancha púrpura e, para a minha surpresa,
quem o jogou foi Edmund King, que tem uma expressão severa no
rosto.
— Nem se atreva, moleque. Será uma disputa até a morte!
Enquanto a família finge uma discussão acalorada, começo a
sair de fininho, mas sou pega no flagra antes que eu consiga dar
mais do que três passos.
— Não vá embora ainda, Gaia — é Monica quem me denuncia.
— Decidimos fazer um luau amanhã à noite e adoraríamos a sua
presença. Foi por isso que te chamamos aqui.
O convite me pega de surpresa, mas então me dou conta do que
ela quis dizer.
— Fico muito agradecida, mas a Lottie estará aqui neste fim de
semana. — Sorrio para a loira, parada à esquerda da mesa, que
parece prestes a me fulminar com os olhos. — Acho que ela
consegue servir a família.
— Ah, mas não estamos te chamando para servir — o sr. King
me corrige. — Queremos você como convidada.
Apesar da distância que me separa de Lottie, posso ouvi-la
bufar.
— Convidada? — busco esclarecimento.
— Com certeza. — Harvey deixa o braço cair em torno dos
meus ombros e me puxa para seu lado. — Queremos te conhecer
melhor. E, por favor, leve uma sobremesa bem gostosa. Queremos
provar a sua comida, já que Christine te elogiou tanto.
Ergo uma sobrancelha, talvez um pouco desconfiada de tanta
amabilidade. Mas o que posso fazer? Negar? Claro que não.
— Muito obrigada pelo convite. Estarei lá. — Desta vez, sinto
minha pele queimar, só que não é pela vergonha e sim pelo olhar
fervente que Zachary me lança. — Prometo levar os melhores
brownies que já comeram na vida.
A mesa vibra com a minha resposta e sinto um friozinho subir
pelas pernas e chegar até a garganta. E o pior é que, agora, tenho
dois motivos para me sentir assim: saber que estarei perto de
Zachary King de uma forma social e confraternizar com um dos
grupos mais ricos do país.
Peço licença, usando a desculpa que Martha precisa de mim na
cozinha, e sigo para onde quero estar. Posso sentir vários olhares
me acompanhando e detesto cada segundo que fico sob o
microscópio.
Martha me lança um olhar cruzado quando volto ao meu posto.
Não digo uma palavra sequer, e ela também não pergunta. Por isso,
continuo montando as tacinhas de milkshake. Não é exatamente um
milkshake, mas o visual passa essa impressão. Na verdade, é um
creme frio de chocolate cremoso, com nozes picadas no meio, um
pouco de chantili por cima e, para finalizar, uma cereja e raspas de
chocolate amargo.
Lembro que um dos meus professores preferidos sempre dizia
que um cozinheiro precisava ter algumas sobremesas na manga.
Coisas simples e deliciosas, que pudessem encerrar o jantar com
chave de ouro, sem precisar de um profissional de confeitaria para
prepará-las. Desde então, os milkshakes se tornaram parte do meu
cardápio.
Termino de montar os copinhos e ajeito tudo em uma bandeja.
Logo em seguida, Derek aparece para buscar a sobremesa.
— Você foi muito bem hoje, menina. — Viro-me para Martha e a
vejo recostada em uma das bancadas, os braços apoiados no
mármore enquanto me encara.
— Obrigada. A sua comida estava deliciosa. Espero que me
ensine a fazer aquela marinada um dia — digo, na tentativa de
amolecer o dragão.
Martha ainda não me aceitou muito bem em sua cozinha, mas
percebi que ela merece cada um dos elogios que recebe da família.
Posso ser muitas coisas, burra não é uma delas, e por isso estou
determinada a aprender o máximo que conseguir enquanto estiver
aqui.
— Continue assim e eu ensinarei muito mais do que a marinada
— responde de forma seca.
— Obrigada.
— Agora, me diga uma coisa. — Ela se afasta da bancada e
vem até mim, os passos curtos prolongando a expectativa. Quando
para na minha frente e puxa o ar com força, sei que coisa boa não é.
— Eu pedi que se mantivesse afastada do meu menino. Você não
fez isso.
As palavras carregam um tom julgador e acabo abaixando o
olhar de forma involuntária.
— E-eu… — gaguejo um pouco, sem saber como me explicar.
— A fofoqueira da Lottie disse que você e o menino Zachary
ficaram trancados na sala de jogos hoje à tarde, e eu gostaria de
saber por quê. — Não é um pedido, e sim uma ordem.
Sinto o suor brotar nas têmporas enquanto crio coragem para
encarar a mulher de novo. Afinal, muitas coisas aconteceram
naquela sala. Na verdade, muitas sensações. Mas como posso
explicar isso à Martha?
— Ele só queria saber se eu estava bem. — Opto pela resposta
mais simples.
— Por que você não estaria bem? E por que precisaram de
privacidade para conversar sobre isso? — ela quer saber,
desconfiada.
Martha não sabe o que aconteceu com Oliver. Além de eu não
ter contado, também pedi a Derek para guardar o meu segredo. A
última coisa que eu queria era que Martha, ou qualquer outra
pessoa, pensasse que dei motivos para ele me tratar daquela
maneira. Porém, neste momento, percebo que não posso omitir o
ocorrido — não se eu quiser que ela aceite o fato de eu e Zachary
termos ficado a sós por um tempo.
Então, começo a narrar tudo o que aconteceu no outro fim de
semana. Desde o comentário inapropriado durante o café da manhã,
chegando ao ponto em que quase fui agarrada por Oliver no
piquenique. Não deixo nada de fora, nem a conversa que tive com
Monica King.
— Foi por isso que o sr. Zachary me chamou em particular —
revelo. — Para saber se eu estava bem e para me garantir que não
teríamos nenhum convidado esta semana.
Por vários segundos, Martha apenas escuta, sem dizer nada ou
esboçar qualquer reação. Até que, para a minha surpresa, ela me
envolve em seus pequenos braços e me puxa para um abraço. Sou
obrigada a curvar as costas para receber o afeto, e só então percebo
como estava precisando disso. Não só pelo que aconteceu com
Oliver — porque isso já foi devidamente guardado em uma gavetinha
no meu cérebro —, mas pela saudade que sinto da minha família.
Então, solto um suspiro de alívio e me permito ganhar um pouco de
carinho. Mesmo que seja por pena.
— Homem nenhum tem o direito de te tratar como um objeto.
Não importa a posição de poder que ele ocupa. Nem mesmo se for
seu namorado ou marido — ela sussurra em meu ouvido e logo se
afasta, colocando ambas as mãos nos meus ombros e me
encarando.
Encaro-a de volta e, em seus olhos, não vejo mais reprovação.
Apenas a cumplicidade entre mulheres que sabem muito bem o que
é ser assediada.
— Obrigada — falo baixinho para ela, que assente com a
cabeça.
— Bom, agora estou cansada — Martha declara e se afasta. —
O jantar já foi servido, então meu trabalho acabou. Lave a louça,
arrume a cozinha e vá descansar. Amanhã é um novo dia.
— Pode deixar.
Ofereço um gesto positivo e deixo que se encaminhe até a porta
da cozinha.
— E, Gaia — ela me chama quando está com a mão na
maçaneta, virando o rosto para me encarar. — Nunca mais esconda
qualquer coisa de mim.
Vida em Nova York
A sua fonte de informações sobre a cidade que
nunca dorme
Gaia
Zachary
Ela está tão perto que posso sentir meu corpo inteiro reagir à
sua presença. É ridículo como essa mulher consegue me
enlouquecer e me acalmar na mesma proporção. A última meia hora
que passei ao lado dela, apenas conversando, foi o suficiente para
provar que não sou imune a tudo o que tem a oferecer. Posso sentir
o cheiro do seu xampu — maçã-verde nunca foi tão afrodisíaca — e
as batidas frenéticas que vêm de seu peito, tão ritmadas com as
minhas, assim como a respiração ofegante.
Quero me aproximar mais, e todo o controle que achei que
poderia manter vai embora quando sinto seus dedos tocarem o meu
peito. A mão que não segura seu pulso fino encontra a cintura
pequena e desliza para trás, ganhando lugar na base de suas
costas. Meus dedos flexionam, puxando-a para mais perto.
Ela é tão pequena que mal chega à altura dos meus ombros, por
isso, inclino-me para baixo, encurtando aos poucos a distância que
nos separa. Em seus olhos, encontro uma mistura de confusão e
desejo estampada. É essa porra de energia que parece ganhar vida
quando estamos tão perto, e não sei mais o que fazer. A
necessidade de beijá-la é mais forte do que qualquer outra coisa que
senti antes. Por isso, continuo abaixando meu rosto, deixando que a
promessa do que está prestes a acontecer nos domine.
O nariz pequeno, a língua umedecendo os lábios rosados, a
pele de porcelana e as várias sardas que decoram o rosto mais lindo
que já vi na vida… tudo é um convite para que eu me perca de vez
nessa mulher.
E o pior é que tem algo de familiar nela. Como se eu já estivesse
acostumado a estar tão perto, mesmo sem nunca a ter tocado desse
jeito antes. Um conforto de quem está fazendo a mesma coisa pela
trigésima vez, junto com uma ansiedade sem fim pela vontade do
primeiro beijo.
— Quero muito te beijar — acabo soltando os pensamentos, e
logo me arrependo.
Gaia abaixa a cabeça, como se tivesse se dado conta do que
estávamos prestes a fazer. E, quando desencosta o corpo do meu, o
frio da sua ausência me incomoda.
— Desculpe, sr. King — ela diz, erguendo o muro desgraçado
entre a gente. — Vou deixar a louça na pia, amanhã eu lavo.
A mudança brusca de assunto me faz franzir o cenho. Gaia vira
as costas, coloca os potinhos na bancada e começa a se encaminhar
para a porta. Levo alguns segundos para sair do estupor e, quando a
vejo cruzar o batente, não me controlo e vou até ela. Sigo-a pelo
corredor sem disfarçar e sei que ela percebe que estou aqui, já que
acelera os passos. Só que não vou embora até entender o que
diabos aconteceu agora há pouco.
Ela abre a porta do próprio quarto e, assim que entra no espaço,
vou atrás, invadindo sua privacidade. Apenas uma luz fraquinha
ilumina o ambiente e é como se ambos estivéssemos presos na
escuridão.
— O que houve? — pergunto ao encostar a porta por trás de
mim. Cruzo os braços na frente do corpo, esperando a resposta e
pouco me importando para o que tem ao nosso redor.
— Nada — ela diz, como se isso fosse uma resposta aceitável.
— Gaia, por favor, converse comigo. Uma hora você está perto,
sem esconder que sente por mim o mesmo que sinto por você. De
repente, tudo muda. Então, me diga: o que houve? — O que era para
ser uma simples pergunta acaba se tornando um vômito de palavras
desesperadas, porque não posso aceitar que ela simplesmente
tenha mudado de ideia. Alguma coisa está acontecendo e eu preciso
saber o que é.
— Não posso fazer isso, sr. King.
— Porra! Pare de me chamar assim! — Jogo as mãos para o
alto e elevo o tom de voz, em um nítido sinal de frustração.
Alguns passos encurtam a distância entre nós. Puxo-a pela
cintura, colando seu corpo ao meu. Sinto quando estremece com o
contato e, definitivamente, não é medo que está estampado em seus
olhos. É desejo. O mesmo sentimento louco que me guia neste
momento.
— Zachary, por favor… — Gaia pede baixinho e sou obrigado a
me afastar. Por mais que esteja desesperado para beijá-la, jamais
irei forçar algo. Não sou esse tipo de homem.
— É porque sou filho do seu chefe? — insisto, querendo saber.
— Também — Gaia confessa, e isso me deixa ainda mais
curioso.
— E o que mais?
Por alguns segundos, ela apenas me encara. Odeio não
conseguir ler pensamentos. Seria tão mais fácil… inclusive, adoraria
que Gaia pudesse ler os meus, porque eu tenho certeza de que
estão em sincronia com os dela, apesar dessa relutância.
— Gaia — chamo de novo quando ela permanece calada por
um bom tempo.
— Eu ouvi aquela mulher dizendo que te ama. Vocês estão
juntos? — joga a pergunta como se fosse uma bomba.
É sério isso?
— Claro que não estamos! — apresso-me em dizer, antes que
ela tenha mais ideias loucas a meu respeito. — De onde você
deduziu isso? — Mas a resposta vem em formato de silêncio de
novo, o que me deixa perto de um colapso. — Gaia, por favor, me
responda.
Dou um passo em sua direção, tentando diminuir a distância
física — e talvez emocional — que nos separa.
— Vocês não…?
Franzo a sobrancelha, confuso com a pergunta.
— Já disse que não. Ela era um caso, algo sem qualquer
compromisso sério nem promessa de exclusividade. Ficamos juntos
há meses, quando eu ainda estava em Londres.
— Então, vocês não têm mais nada?
Balanço a cabeça em negativa, aproximando meu rosto do dela.
Eu não deveria ter que me justificar para ninguém, muito menos para
Gaia, mas algo em sua expressão me obriga a ser verdadeiro. Essa
mulher desperta em mim coisas que não consigo entender.
Silêncio de novo.
Esse maldito silêncio.
É como se ambos estivéssemos vendados de frente para um
penhasco, com medo do que pode acontecer se dermos um passo à
frente. Mas algo muda no modo como ela me encara, um brilho
diferente no olhar — e não consigo desviar por um segundo sequer.
Estamos tão perto que Gaia precisa inclinar a cabeça para me
encarar.
Mesmo com pouca luz, posso ver seus lábios rosados, que
combinam com a coloração das bochechas quando emolduro seu
rosto com uma mão. Ela estremece com o contato e me sinto a porra
de um super-herói.
Não posso esperar nem mais um segundo — e é por isso que
deixo minha boca descer sobre a dela. No instante que isso
acontece, o mundo parece entrar no eixo.
Puta que pariu.
Sua boca macia me convida e não perco tempo, deixando que
minha língua a invada em um beijo carregado de desejo e
desespero. Com a mão livre, puxo sua cintura para mais perto, louco
para que não haja um mísero centímetro entre nós. É então que sinto
quando ela sobe os braços, passando-os em torno do meu pescoço,
e afunda os dedos em meu cabelo, como se também não suportasse
ficar sem me tocar. Como se quisesse me manter aqui, me
ancorando no meio desses malditos sentimentos que ela tem
despertado.
Nunca pensei que um beijo pudesse ser tão… certo. É por isso
que não paro, pouco me importando se consigo ou não respirar.
Nossas línguas perdidas em um frenesi descontrolado. É rápido,
intenso e contém promessas deliciosas.
A mão que estava em seu rosto começa a descer, desejando
percorrer cada pedacinho da pele de porcelana. Acaricio o ombro e
deslizo as pontas dos dedos pela lateral do corpo até parar na
cintura, apertando a carne macia. Não consigo me controlar e solto
um gemido contra sua boca, imaginando-a de quatro enquanto a
puxo com força contra mim.
Meu corpo é incapaz de esconder o desejo crescente, a ereção
pressionada à barriga lisa. Sem controle, balanço nossos corpos
para frente e para trás, numa fricção tentadora. A necessidade por
ela aumenta a cada movimento de nossas línguas. O que será que
encontraria nesse momento se deixasse minha mão entrar por
debaixo daquele short de cupcakes?
Caralho, eu quero tudo dessa mulher. Quero seus beijos, seu
corpo, seu sorriso… sou um egoísta filho da puta e preciso que Gaia
seja minha. Só minha.
É então que tomo a pior decisão de todos os tempos e afasto
minha boca dos lábios inchados. Os olhos de Gaia, nublados pelo
desejo, fitam os meus e… porra! Acho que nunca vi uma mulher tão
linda.
Mas o intervalo dura pouco quando a boca provocante procura a
minha de novo. O contato, cuidadoso no início, ganha urgência a
cada movimento. O corpo pequeno se derrete junto ao meu e só
consigo pensar no que vai acontecer quando eu a colocar na cama.
Nós nos beijamos pelo que parecem horas, numa sincronia
inexplicável que aplaca a minha frustração e agrava o meu desejo. O
gosto doce na boca ávida é a porra do paraíso, que continua me
conduzindo à loucura. Não consigo parar. Não consigo me afastar.
Não consigo manter um fluxo racional quando Gaia está tão perto de
mim.
Mãos pequenas passeiam pelo meu peito, os dedos volta e meia
flexionando sobre meus músculos, sentindo cada parte que acaricia.
Enquanto isso, a mantenho o mais colada possível ao meu corpo,
em um gesto de possessividade impensada, porém necessária.
Um beijo nunca foi tão bom — e não sei se tenho capacidade de
parar. É uma necessidade insana, que me consome por inteiro. É por
isso que a beijo com mais força, querendo que ela veja o quanto me
afeta. Um fervor violento, que me queima de dentro para fora ao
sentir que Gaia está tão imersa no momento quanto eu, me obriga a
erguê-la do chão. Quando sinto suas pernas envolverem minha
cintura — seu calor encontrando a minha rigidez, implorando para
que eu a tome —, tenho certeza de que estou completamente fodido.
Não há espaço para palavras. Na verdade, não há espaço para
mais nada, a não ser esse ímpeto de estar dentro dela.
— Gaia, eu…
O mundo para quando uma voz feminina invade o quarto, que
até então era apenas embalado pelo som de nossas respirações
entrecortadas.
Com Gaia ainda no meu colo, viro o rosto para o lado e dou de
cara com a porta escancarada e Valerie boquiaberta enquanto tenta
entender o que está acontecendo. “Empata foda do caralho”, xingo-a
mentalmente, mas revolvo não deixar que as palavras escapem.
Respiro fundo duas vezes, tentando me controlar.
Devagar, desço Gaia pelo meu corpo, até que seus pés toquem
o chão. Porém não consigo me afastar o suficiente e acabo
permitindo que minha mão vá para sua nuca.
— Ei, olhe para mim. — Ignoro a presença de Valerie e
mantenho minha concentração em Gaia. Ela está atordoada pela
interrupção, mas os lábios inchados e os olhos anuviados me
mostram que o efeito do nosso beijo ainda corre por suas veias. —
Depois continuamos isso, está bem?
Só que Gaia está em choque. É por isso que deposito um
selinho em sua boca e me afasto. Passo pela funcionária
embasbacada e desejo boa noite a ela, seguindo para o meu próprio
quarto.
A última coisa que quero é deixar Gaia desconfortável, e aposto
que expulsar a camareira não seja a melhor maneira de conquistar
essa mulher maravilhosa. Mas também debato se não acabei de
fazer a pior merda da minha vida.
Será que ela vai pensar que eu fugi?
Na verdade, nem sei por que saí daquele quarto. Talvez para
conseguir recobrar um pouco da minha lucidez.
No caminho até minha cama, tento fazer com que o meu corpo
retome o estado de normalidade, mas acho que ele nunca mais será
o mesmo. Não depois do que acabou de acontecer.
Maldita maldição.
Maldita obsessão.
Capítulo 18
Gaia
∞∞∞
Quando me levanto, sem ter conseguido dormir direito por mais
de um par de horas, sinto meu corpo todo dolorido. Mas é aflição que
me deixa com vontade de voltar para debaixo dos lençóis e fingir que
o resto do mundo não existe. O que vai acontecer assim que nos
vermos? Posso ficar escondida na cozinha? Não sei se quero vê-lo.
Por outro lado, não posso simplesmente ignorar meu trabalho e ficar
aqui, enquanto sonho acordada com um par de mãos fortes e olhos
verdes.
A camiseta que me emprestou ontem está a salvo sob meu
travesseiro, o perfume masculino impregnado na fronha. Talvez
tenha sido o cheiro dele que me impediu de ter um sono tranquilo,
que me faz fantasiar de um jeito que nunca fiz…
Tudo em Zachary King grita “sexo”. Desde o modo como se
mexe, até o timbre da voz. Sem esquecer da intensidade que
carrega e da paixão com que beija. Aquele homem é capaz de criar
um furacão de desejo dentro de mim.
Não tenho ideia do que vai acontecer, de como Zachary vai
reagir quando estivermos no mesmo ambiente de novo. E o pior de
tudo é que não sei como eu quero que ele reaja. Por isso, enquanto
tomo um banho, listo mentalmente as possibilidades do que pode
acontecer.
1 – Ele pode ignorar minha presença;
2 – Ele pode me beijar na frente de todo mundo;
3 – Ele pode me dar uma piscadinha safada e deixar claro que
não esqueceu a promessa que fez;
4 – Também pode…
— Céus, desde quando as atitudes de um homem viraram o
centro do meu universo? — pergunto em voz alta, repreendendo
meu comportamento.
Não deveria estar pensando nisso, e sim no que eu quero fazer.
Como eu quero lidar com o que aconteceu ontem à noite.
— Uma coisa é fato — falo sozinha de novo, enquanto retiro o
xampu do cabelo —, não quero esquecer ou ignorar o que
aconteceu. Não quero que tenha sido um lapso de julgamento.
“Algo casual, durante o verão, pode ser uma possibilidade…”
Não tenho todo o tempo do mundo para ficar aqui, cogitando
hipóteses de algo que talvez nunca aconteça. Finalizo o banho e me
seco rapidamente, escolhendo uma roupa adequada.
Por alguns minutos, olho para o uniforme — camiseta branca e
calça preta — e decido que, só por hoje, vou melhorar um pouco o
visual. Quero que Zachary me veja, que me ache bonita e que me
deseje de novo.
Nunca fui uma mulher sonsa, que finge estar sentindo uma coisa
quando, na verdade, está sentindo o oposto. Não mesmo. É por isso
que pego a saia de Lottie, que eu ainda não devolvi, e coloco uma
regata branca, um pouco mais decotada do que as roupas que uso
quando estou trabalhando na cozinha. Opto pela sapatilha preta e
faço uma trança no cabelo. Passo gloss de framboesa e um pouco
de rímel. Também aplico uma camada fina de corretivo, para
esconder os efeitos da noite mal dormida.
Quando saio do quarto, estou me sentindo bonita e pronta para
encontrar Zachary King de novo.
Chego à cozinha vazia e começo a preparar o café. Martha deve
aparecer a qualquer momento. No fundo, torço para que Zach venha
antes dela, para um cumprimento de bom-dia. Só que isso não
acontece e, no instante que o relógio indica 6h, a cozinheira cruza a
porta dos fundos.
— Bom dia, Gaia.
— Bom dia, Martha. — Sorrio para ela, notando que a água
ainda não ferveu.
A correria da manhã começa. Faço um pão de fermentação
rápida e, enquanto sovo a massa, penso em Zachary. Depois, corto
algumas frutas e penso nele. Para terminar, separo a louça a ser
posta na mesa e meu pensamento ainda está no mesmo homem.
Porque é impossível fazer qualquer coisa sem que as
lembranças do que aconteceu ontem sejam revividas. A cada tique
do relógio, minha ansiedade aumenta e borboletas voam com mais
ímpeto em meu estômago.
Martha conversa o tempo todo, falando de receitas que pretende
fazer, da vizinha que fez uma festa, do primo do cunhado da
sobrinha que, pelo visto, está tendo um caso com a tia da madrasta
da moça da padaria. Aceno nas horas certas, demonstro espanto em
momentos oportunos e finjo que tudo o que ela fala é do meu
interesse. Só que a única coisa que me importa de verdade é
Zachary King.
Valerie aparece, lançando um olhar conspiratório quando me vê.
Tina, Helga e Derek também chegam para o café da manhã dos
funcionários. Apenas Lottie, como de costume, está atrasada.
— Onde está a sua irmã? — Martha pergunta em um tom nada
amigável e Derek encolhe os ombros.
— Não sei. Ela deveria estar aqui — ele diz e coça a nuca.
— Eu juro por tudo que é mais sagrado: se Lottie não chegar em
cinco minutos, vou dispensá-la do verão todo. — Martha aponta para
o relógio, que indica faltar menos de meia-hora para que a primeira
refeição do dia seja servida para a família.
— Quer que eu vá ao quarto dela chamar? — Derek oferece.
— Não precisa. A responsabilidade não é sua, mesmo que Lottie
seja sua irmã — Martha fala, sem dar a chance de ser contestada. —
Vá colocar a mesa. — Indica a porta da cozinha e o rapaz mal tem
tempo de terminar o café com leite em sua xícara antes de sair
apressado. — Tina, preciso que vocês preparem três quartos de
hóspedes. O sr. Harvey avisou que os Lowell devem chegar depois
do almoço e uma amiga da Chloe vem junto. Ah, e não se esqueçam
de chamar o Kyle para ajudar Derek a preparar tudo para o luau.
Eles pediram uma fogueira! — Martha joga as mãos para o alto em
sinal de desespero. — Quem gosta de fogueira no verão? Também
temos que chamar a Julie e a Nancy, para ajudar a servir o luau.
Derek não vai dar conta sozinho e…
Ela continua ditando ordens, como um bom coronel. Tento me
manter ocupada, separando as fatias de bacon que serão servidas
em breve. Também aproveito que Martha está distraída e começo a
preparar a massa das panquecas.
— Gaia! — Viro o rosto quando escuto meu nome ser chamado.
— Fique pronta para servir caso a Lottie não apareça. Pelo jeito, o
sono de beleza daquela metida à dondoca é mais importante do que
as responsabilidades.
O pedido de Martha me faz sorrir por dentro. Por fora, apenas
assinto com a cabeça e finjo desinteresse. Já que Zachary não
apareceu na cozinha durante a manhã, servir o café pode ser uma
boa chance de encontrá-lo de novo e ver qual será a sua reação.
É claro que não estou esperando que ele me beije na frente de
todo mundo. Nem que declare um amor de contos de fadas. Mas um
olhar pode dizer muita coisa, e é disso que preciso agora.
— Estou pronta, Martha — confirmo.
— Posso ver… — Ela me olha de cima a baixo, prestando
atenção na roupa que uso pela primeira vez. Seu olhar analítico não
esconde a desaprovação, parando por tempo demais no decote que
uso, como se perguntasse por que diabos escolhi essa roupa.
O bom é que Martha não tem tempo de mais nada, porque o pão
precisa ser retirado do forno e fatiado da forma certa.
Os cinco minutos de Lottie se acabam, assim como a meia-hora
que nos separava do café da manhã. As vozes da família na sala de
jantar já podem ser ouvidas, fazendo com que a correria na cozinha
só aumente.
— Derek, leve as bebidas. Gaia, as frutas — a cozinheira ordena
e obedecemos na mesma hora.
Chegando à sala, vejo algumas pessoas sentadas em volta da
mesa, conversando animadamente enquanto esperam a refeição. Os
casais mais velhos já estão aqui, assim como Elijah, Trenton e
Sebastian.
— Bom dia, Gaia — o sr. Harvey me cumprimenta, oferecendo
um sorriso.
Cordialidades são trocadas entre os donos da casa e os
funcionários — no caso, Derek e eu —, até que um outro homem
aparece.
— Bom dia a todos. — Jackson King, que parece ser o mais
sonolento, toma o lugar na cadeira e logo se serve de uma enorme
xícara de café.
— Onde está o meu filho? — Monica questiona no instante em
que coloco uma fatia de melão em seu prato.
Finjo que não estou prestando atenção, mas, de repente, meus
ouvidos ficaram bem abertos.
— Esqueci de falar, titia — é Trenton quem responde —, ele não
está em casa.
A frase me pega de surpresa e acabo erguendo o olhar para
encarar o primo de Zachary. Quando faço isso, percebo que Trenton
também está olhando para mim.
Será que ele sabe?
— O que aconteceu? — Monica insiste. — Para onde meu filho
foi?
— Ontem de madrugada, Zach recebeu uma mensagem urgente
e teve que voltar à Manhattan — Trenton esclarece. — Tem algo a
ver com Samantha.
A explicação me deixa confusa, fazendo com que meu coração
tombe dentro do peito, ao mesmo tempo que o restante da mesa não
demonstra muito espanto.
— Aquela menina ainda vai fazer uma loucura… — O sr.
Edmund balança a cabeça desalentado.
— Acho que já fez, pai — Trenton responde de forma
enigmática.
O silêncio que segue a declaração é ensurdecedor, e fico me
perguntando se é a mesma mulher que ouvi ao telefone, dizendo que
o amava. Ontem, Zachary disse que os dois tiveram um caso sem
compromisso quando ele morava em Londres.
Será que mentiu? Se foi sem importância, por que ele foi
correndo para a cidade?
Sinto a decepção de não o ter aqui me baquear, levando uma
pequena tremedeira às minhas mãos, aliada às inseguranças que
começam a gritar dentro de mim. Então, obrigo-me a pedir licença e
voltar para a cozinha.
Minhas mãos estão mais trêmulas, as pernas, que parecem
feitas de gelatina, mal suportam meus passos. De repente, sou
tomada por um arrependimento enorme. Devia ter ficado escondida
na cama.
Afinal, Zachary King me beijou.
E me deixou.
Capítulo 19
Gaia
Gaia
∞∞∞
Duas horas depois, entramos no Danny’s. Desta vez, pouco me
importei com o que iria usar, escolhendo uma calça jeans, uma
regata preta bem justa, e sapatilha. Val melhorou meu visual com um
cordão dourado e argolas enormes, prendendo meu cabelo em um
rabo de cavalo alto e fazendo uma maquiagem mais pesada.
Diferente dela, que optou por um vestido vermelho bastante curto e
saltos, hoje estou com uma roupa confortável, do jeito que gosto.
Apesar de ser apenas dez da noite, o bar está lotado. O espaço
não é dos maiores, mas todas as mesas estão ocupadas, até mesmo
os bancos altos perto do balcão. O pop rock conhecido que toca ao
fundo faz com que algumas pessoas dancem com seus parceiros,
enquanto outras balançam a cabeça enquanto conversam com os
amigos.
— Vamos procurar o Derek — Valerie diz, apontando na direção
do balcão, e eu respondo com um aceno. — Só espero não
encontrar a Lottie também. — Ela faz cara de nojo, me obrigando a
rir.
— Ela não é tão ruim assim — sugiro numa tentativa de suavizar
a conversa. Val franze o cenho, como se não entendesse o meu
comentário. Também não entendo, mas a verdade é que não gosto
de falar mal das pessoas sem ter motivos para isso.
— Ei, o que você quer beber? — minha amiga pergunta,
segurando o meu braço.
— O mesmo que você. — Dou de ombros.
Hoje, estou disposta a qualquer coisa que me faça esquecer
daquelas milhares de fotos. E se isso significa ficar bêbada, então
que seja. Amanhã é um belo dia para se curar de uma ressaca.
— Oi, meninas! — Derek sorri atrás do balcão, um pano de prato
na mão e um copo de cerveja na outra. — Que bom que vocês
vieram.
— Aproveitamos que Martha estava com dor de cabeça e foi
dormir mais cedo — Val explica.
— Escolheram um bom dia para aparecer. A casa está lotada. —
Ele aponta para o mar de pessoas animadas e eu acabo forçando
um sorriso.
Não temos muita chance de papear com Derek, já que, como ele
mesmo disse, o bar está cheio e os clientes aparecem a cada
segundo pedindo bebidas. Valerie escolhe Sex on the Beach para
nós duas e, assim que temos as taças na mão, fazemos um brinde:
— Ele não sabe o que está perdendo — minha amiga diz e me
oferece uma piscadinha. Agradeço mentalmente por suas palavras
encorajadoras e dou um gole na bebida colorida.
O líquido doce desce por minha garganta de forma suave, tanto
que sorrio e fecho os olhos para aproveitar um pouco mais o sabor
de pêssego. Nunca tinha provado esse drink antes, e me arrependo
profundamente, porque é uma delícia. Logo penso em um prato que
posso criar, usando essa mistura de sabores como inspiração.
Bebemos, dançamos, rimos e, por alguns momentos, consigo
esquecer Zachary King. A quem estou tentando enganar? É claro
que ele não sai da minha cabeça por um minuto sequer, e toda vez
que tento me divertir, penso no que ele deve estar fazendo com
Samantha e sinto vontade de voltar para cama e chorar.
Odeio estar tão enfeitiçada por um homem que está pouco se
lixando para mim. Mesmo assim, finjo felicidade até que ela se torne
verdade. A música está animada e não posso desperdiçar minha
vida pensando em alguém que não me quer, por mais lindo que ele
seja.
Então, bebo mais um pouco, danço mais um pouco e rio mais
um pouco. Um looping forçado para ver se consigo sair desse
sentimento ruim.
— Querem companhia? — Estamos no quarto drink quando uma
voz grossa atrás de mim me faz virar o corpo.
Dou de cara com dois homens bem atraentes, que nos encaram
de forma apreciativa. Só que a última coisa que preciso agora é
flertar com quem quer que seja.
— Adoraríamos! — Valerie diz antes que eu possa recusar a
proposta. — Eu sou a Val e esta é a Gaia — ela nos apresenta e,
com isso, os dois se aproximam ainda mais, parando ao nosso lado.
— Dean — o que está mais próximo de mim fala. Ele é bem
interessante, com seu cabelo curtinho, no estilo militar, e a pele bem
bronzeada contrastando com os olhos cor-de-mel.
— Craig — o outro também se apresenta, e acho que são da
mesma família, porque as feições são parecidas.
Que nem os King.
— Vocês moram por aqui ou só estão passando as férias? — Val
quer saber, mas permaneço calada. Minha expressão murcha de
desespero ao ter que conversar com dois homens bonitos e,
provavelmente, ricos.
Seria engraçado se não fosse triste. Eles falam, mas não escuto
nada. Na minha cabeça, tudo o que queria era poder voltar para a
minha cama, me entupir de chocolate e esquecer que beijei Zachary
King. Por isso, vejo as bocas se mexendo, só que ignoro cada uma
das palavras que saem delas. Nada me interessa agora. Nem
ninguém.
— E você, Gaia? — Dean encosta no meu cotovelo, chamando
a minha atenção de volta à conversa. Quando franzo o cenho, sem
entender muito bem a pergunta, ele explica: — O que você faz da
vida?
Um sorrisinho de lado ganha espaço no rosto bonito.
— Sou cozinheira em uma das mansões — solto a verdade e ele
se espanta.
Dá para ver que o interesse que tinha vai embora quando
descobre que não sou uma mulher rica e importante, como a maioria
das que frequentam a região nesta época do ano.
— Ah, que legal… — Seu tom é tão murcho quanto a minha
expressão.
— É ótimo. Descasco cebola e alho o dia inteiro. É o sonho da
minha vida. — Viro o rosto para Val, que está boquiaberta. — Com
licença.
Eu me afasto do grupo antes de minha amiga tentar me impedir
e sigo na direção do banheiro, desviando das muitas pessoas no
caminho. Todos riem alto e parecem estar felizes de verdade.
Achei que poderia vir até aqui e me divertir um pouco, mas
estava mentindo para mim mesma. O que preciso é começar a
esquecer aquele homem, sem a ajuda de ninguém.
Zachary King foi o primeiro por quem me interessei desde…
Balanço a cabeça, tentando afastar as lembranças que continuam
me assombrando. Se eu consegui esquecer ele, com certeza farei o
mesmo com Zachary. O que tivemos nem se compara ao que tive
com meu ex-namorado. Mas que merda do caralho! Por que não
tenho sorte com relacionamentos? Por que só encontro babacas que
querem me usar? Por que nunca conheço um cara normal?
Chego ao banheiro e, para a minha sorte, não tem ninguém na
fila além de mim. Porém a porta está fechada, indicando que tem
uma pessoa lá dentro. Só que quando escuto um gemido masculino,
seguido de outro feminino, percebo que estava errada quanto ao
número de ocupantes.
Merda, o que faço agora? Tenho duas opções: esperar que o
casalzinho apaixonado “acabe” a diversão, ou voltar para Val e os
dois homens. São todas péssimas opções, quase torturantes para o
momento. Não preciso pensar por muito tempo até entender que
chegou a hora de voltar para a mansão.
Decidida a acertar a conta com Derek amanhã, viro as costas
para o banheiro. No instante que faço isso, a porta se abre,
revelando uma Lottie descabelada, com o rosto vermelho e uma
expressão bastante satisfeita no rosto. Ela para de andar assim que
me vê, os olhos arregalados com a surpresa. Logo Lottie se
recompõe, passa a língua pelos lábios inchados e volta a caminhar,
ignorando completamente a minha presença.
Se fosse só isso, tudo bem, eu teria seguido meu caminho. O
problema é que, atrás dela, está a última pessoa que esperava ver
aqui.
Jackson King.
Ele tem os olhos abaixados enquanto tenta abotoar a calça
social que usa, sem perceber que estou aqui. Quando nota que não
está sozinho, diferente de Lottie, ele abre um enorme sorriso ao me
reconhecer.
— Gaia! — Antes que eu possa dizer qualquer coisa, ele me
puxa para um abraço apertado.
Não sei se me sinto feliz por vê-lo aqui ou preocupada pelo que
estava fazendo. Com certeza estou com nojo, porque ele não lavou
as mãos — e eu posso imaginar onde elas estiveram nos últimos
minutos.
— A Lottie, Jackson? Sério? — acabo perguntando, mas ele não
parece nem um pouco abalado pelo meu tom de descrença.
— O Zachary, Gaia? Sério? — ele refaz a minha pergunta,
atingindo um ponto certeiro dentro de mim.
— Touché. Mas está desatualizado. — Aceno com a cabeça e
ele solta uma gargalhada.
— Humm… sei. Mas o que você está fazendo aqui? — Jackson
quer saber, mas não há um pingo de julgamento em sua voz, apenas
curiosidade.
— O mesmo que você. — Dou de ombros.
— Transando com Lottie no banheiro?! — Seu tom é
escandaloso. — Mas que coincidência!
Acabo rindo da situação ridícula e ele me acompanha. Dando
um passo em falso, Jackson cambaleia um pouco, apoiando-se em
mim para conseguir manter o equilíbrio. Pelas pernas bambas e pelo
cheiro, sei que está bêbado — como sempre.
— Pensei que a família só chegaria amanhã — comento e seus
olhos nublados confirmam a minha suspeita. Mesmo assim, ele
passa um braço em torno dos meus ombros e começa a me guiar de
volta para o salão, ignorando o motivo que tinha me levado ao
banheiro.
— A família vem amanhã. Eu só… precisei fugir um pouco mais
cedo. Essa coisa de trabalhar é muito ruim, Gaia, querida. Não estou
acostumado a uma vida de responsabilidades, nem quero isso para
mim. — As palavras saem um tanto emboladas.
Assim que chegamos de volta ao bar, ele faz um sinal de
número dois para Derek, que não parece surpreso ao ver um de
seus patrões ali.
— Me conte um pouco dessa vida — peço, tentando me manter
ocupada para não ter que voltar para Valerie e os dois homens.
De canto de olhos, vejo que eles estão no mesmo lugar de
antes, rindo e conversando como se não tivessem uma preocupação
na cabeça. Pelo visto, minha amiga vai poder escolher a companhia
para mais tarde.
Porém, antes que Jackson possa me esclarecer sobre a vida
boa, Derek reaparece, trazendo dois copinhos pequenos de um
líquido azul.
— Beba comigo, Gaia — o caçula dos King pede, enfiando um
deles na minha mão.
— O que é isso? — pergunto enquanto cheiro o conteúdo. O
aroma forte de álcool me faz franzir o nariz.
— A solução para os nossos problemas. Confie em mim. Você
vai esquecer seus problemas rapidinho se beber a poção mágica. —
A resposta me faz sorrir.
Já bebi quatro Sex on the Beach. Um shotzinho a mais não vai
fazer diferença. Por isso, encosto meu copo no dele num brinde pela
vida fácil antes de virarmos o líquido de uma vez só. A bebida
queima a minha garganta e sou obrigada a fazer uma careta. É claro
que Jackson ri de mim.
— Mais um! — grita para Derek, que corre para obedecer.
— Eca. Isso é muito ruim — confesso. — Mas se você diz que
funciona para esquecer problemas, acho que devo acreditar.
Repetimos o processo, só que, desta vez, Jackson também
coloca um comprimido pequenininho na boca. Não sei o que é — e
não quero saber —, mas logo o clima fica bem mais animado.
Não sei quantos shots bebemos. Três, talvez mais. Pouco
importa. É só quando estou dançando com Jackson, rebolando no
meio do salão, que percebo meu estado de embriaguez.
Valerie está ao nosso lado. Dean foi esquecido e toda a
concentração da minha amiga está em Craig, que dança junto com
ela.
A bebida mágica fez o efeito que eu precisava, e não há mais
Zachary King na minha mente, apenas a música e um pouco da
tontura. Jackson está comigo, empolgado como nunca vi, por isso
me forço a entrar no mesmo clima. Do outro lado do salão, vejo
Lottie me encarar com nada além de ódio nos olhos, mas também
não estou a fim de pensar nela agora.
Danço até meus pés doerem, com Jackson se mexendo atrás de
mim, o corpo colado ao meu. Jogo meus braços para cima e ignoro o
resto do mundo, sentindo as mãos dele envolverem minha cintura.
É… Foda-se Zachary King.
Capítulo 21
Gaia
Zachary
Gaia
Zachary
Zachary
Gaia dorme ao meu lado, tão serena que não consigo parar de
olhar para ela. A boca ligeiramente entreaberta, o cabelo ruivo
bagunçado, as sardas decorando o rosto de anjo… Enquanto isso,
fico parado que nem um idiota, com a cabeça apoiada na mão,
apenas observando a mulher mais linda do mundo.
Ainda bem que a porta do quarto está trancada, porque se
alguém entrasse aqui agora, a reputação que criei ao longo da vida
seria destruída. Inclusive, mudariam meu nome na certidão de
nascimento: deixaria de ser Zachary King e passaria a ser golden
retriever.
Que merda.
Ao mesmo tempo, não consigo parar de sorrir. Também não
quero.
Com cuidado para não a acordar, afasto uma mecha de cabelo
do seu rosto e puxo o ar com força, sem saber o que fazer. É
estranho — e muito melhor do que pensei — acordar com alguém ao
meu lado. Mas tenho certeza de que estou me sentindo assim
porque a pessoa que está comigo é Gaia. Se fosse qualquer outra
mulher, eu estaria arrependido e louco para sair correndo. Meu
modus operandi é sair no meio da noite, deixando um bilhete de
agradecimento pela noite “maravilhosa”. Nunca, jamais, em qualquer
circunstância, nem que eu estivesse bêbado, dormiria ao lado de
uma mulher.
Mas, com Gaia, não quero sair daqui. Não quero que ela acorde
e se arrependa da noite anterior, nem que voltemos ao “senhor King”.
Essa mulher desperta algo em mim, e não estou disposto a entender,
muito menos a rejeitar, os sentimentos novos que estão dando as
caras. A única coisa que quero é passar mais tempo com ela.
Então, como se soubesse que a estou olhando, ela se mexe na
cama, virando de costas para mim. O lençol desliza por seu corpo,
expondo parte da pele clarinha e a bunda redonda. Gaia não é cheia
de curvas, mas as poucas que tem são capazes de me enlouquecer.
De lado, a posição é perfeita para que eu me encaixe a ela. Sem
pensar duas vezes, é exatamente o que faço — e quem diria que
ficar de conchinha pudesse ter vantagens. Meu corpo nu contra o
dela é a porra da perfeição, sua bunda bem em cima do meu pau,
que já começa a ficar duro só por estar perto do seu parque de
diversões.
Não sei se continuo aqui — e ganho o troféu de pervertido do
ano, me aproveitando de uma mulher inconsciente — ou se me
afasto e sofro as consequências. Puta merda, Gaia ainda vai me
deixar maluco.
Mas então ela começa a se mexer… e a rebolar contra mim.
— Hummm, é isso o que eu chamo de bom dia. — Sua voz
grogue de sono acompanha os movimentos, e solto um suspiro de
alívio ao perceber que não sou o único a me sentir desse jeito. Não
que eu vá falar isso em voz alta.
Beijo o local onde seu ombro encontra o pescoço e sinto-a
estremecer.
— Bom dia. — Empurro meu corpo para a frente e ela geme
baixinho.
— De novo? — Solta uma risadinha baixa, e decido que este é o
segundo melhor som do mundo. O primeiro é quando ela grita meu
nome.
— Se você alcançar uma camisinha na gaveta, sim. De novo. —
Deixo uma mordida leve onde estava beijando e vejo-a esticar a
mão.
Só que seus movimentos são interrompidos quando meus
toques ficam mais ousados. Puxo uma de suas pernas para cima da
minha e alcanço seu clitóris, massageando bem devagar o pontinho
sensível.
— Zach… — Ela rebola no mesmo ritmo do meu estímulo,
balançando a bunda em cima do meu pau, que já está duro e
pulsando.
— Que foi, linda? Quer que eu pare? — Mordisco sua orelha,
acelerando o toque. Ela acelera também. Sua respiração começa a
ofegar e sei que não vai levar muito tempo até gozar na minha mão.
— Pega logo a camisinha — brinco, porque sei muito bem que ela
não consegue chegar lá agora.
Vou mais rápido, sentindo sua excitação escorrer por meus
dedos, ao mesmo tempo que uma necessidade latente de estar
dentro dela começa a me fazer suar frio. Encosto a testa em seu
ombro e me mexo no ritmo também, indo e vindo, simulando aquilo
que mais quero neste momento, tomando cuidado para não a invadir
por acidente.
— Pega a camisinha — murmuro em uma súplica e tiro a mão
de seu clitóris já inchado.
Na mesma hora, como se tivesse pressa, Gaia se estica até a
mesa de cabeceira, abre a gaveta e alcança o pacotinho. Não sei
como consigo fazer isso com meu corpo colado ao dela, mas
desenrolo o látex e começo a penetrá-la devagar, segurando sua
perna para ter mais acesso.
— Puta merda, acho que vou morrer — confesso quando a
cabeça já está dentro, sendo agarrada por seu calor.
— Não pare — ela pede. — Mete tudo.
A desgraçada sabe como me destruir, porque essas duas
palavrinhas são suficientes para me fazer perder o último pingo de
sanidade que restava. Como um cachorro no cio, monto em cima
dela e deixo de lado o cuidado, entrando e saindo com força.
Apoio as mãos na parede para dar impulso e vejo Gaia fazer o
mesmo, enquanto geme que nem uma desesperada e empina a
bunda, me incentivando a continuar.
— Mais forte! Mais forte! — E só consigo obedecer.
O suor escorre por minhas costas e, com esse ângulo, preciso
ranger os dentes para não me envergonhar, porque a boceta de Gaia
me aperta com força, como se nunca mais fosse me largar nesta
vida. Minha visão fica turva, o mundo inteiro desaparece. Ela geme
alto, me encontrando a cada estocada e eu preciso que ela goze
agora.
Seguro seu cabelo com força, puxando a cabeça dela para trás,
e vou ainda mais rápido, mais forte, ouvindo o choque de nossas
peles enquanto chupo seu pescoço.
— Vem, Gaia. Goza bem gostoso pra mim — peço. Imploro.
Suplico.
Pelo amor de Deus, goza logo. Porque eu não consigo mais
esperar.
Essa boceta é tão quente e apertada que vai tirar o meu juízo.
— Zachary! — ela grita o meu nome, se entregando ao clímax, e
eu finalmente consigo relaxar.
Meu orgasmo é intenso, acompanhado de um urro. Estremeço
por inteiro, deixando meu corpo tombar sobre o dela, e tenho certeza
de que a pobre coitada está sendo esmagada. Mas, neste momento,
não consigo me mexer. Minhas pernas não têm força. Gaia roubou
toda a minha energia. Acho que morri — e o paraíso é o melhor lugar
para se ficar.
∞∞∞
— Bom dia, priminho querido. Dormiu bem? — Jackson
pergunta quando o encontro no corredor.
Diferente de mim, que já tomei banho, ele ainda usa a mesma
roupa de ontem, menos os sapatos. E apesar do sorriso no rosto, dá
para ver as evidências da noite mal dormida não só no modo como
anda, mas também nas olheiras escuras.
— O que aconteceu com você? — desvio da pergunta, olhando-
o de cima a baixo, sem conseguir conter o tom preocupado. É então
que noto algumas manchas em sua blusa. Na mesma hora, paro de
andar e seguro-o pelo braço. — Jack…
— Nada de diferente. — Dá de ombros. — Só não trouxe nada
para vestir e… houve um acidente.
— Acidente? — repito, odiando a escolha de palavra.
Não foi um acidente. Jackson vomitou a noite inteira,
provavelmente bêbado demais para sequer levantar e ir ao banheiro.
O quarto deve estar uma imundície. Mesmo assim, foco toda a
atenção no meu primo, que está fedendo e tem uma aparência
tenebrosa.
— Não me olha desse jeito — ele repreende. — Desde quando
você é minha mãe?
— E desde quando você vomita a noite toda e não pede ajuda?
— rebato.
— Você estava ocupado demais, não queria atrapalhar. —
Jackson sobe e desce as sobrancelhas. Como sempre, minimizando
os problemas reais.
— Eu perguntei se você estava bem.
— E eu estava, mas depois não fiquei tão bem assim e… foda-
se, já passou. — Abana o ar com a mão, mas logo para, como se o
simples ato de se mexer fosse difícil demais para seu estado de
ressaca. — Vou lá embaixo ver se a Tata tem alguma roupa minha
guardada. Vim direto do escritório e acabei esquecendo de trazer
uma mala.
— Deixa que eu cuido disso. Vai tomar um banho, você está
nojento. — Faço uma careta no instante que ele me encara, porém
Jackson apenas ri.
Para ele, tudo é simples demais, fácil demais. Acho que é por
isso que assente com a cabeça e volta para o quarto, enquanto sigo
para o meu, a fim de procurar alguma coisa que possa emprestar a
ele. Mas assim que cruzo a porta, sinto o cheiro dela — e as
lembranças da noite passada vêm com força.
Gaia saiu correndo assim que se deu conta de onde estava. Ela
jurou que não estava fugindo, apenas indo trabalhar. Só que ainda
não estou convencido disso. A desculpa que ela me deu foi de que
Martha passou os últimos dias afastada por conta de uma gripe, e
como hoje a família toda chega no fim da tarde, há muita coisa a ser
feita para o fim de semana. É claro que me ofereci para ajudar, e
recebi uma gargalhada — também um beijo rápido — em resposta.
Só espero que ela não tenha mentido para mim, nem que esteja
surtando, porque a última coisa que quero agora é ter que convencê-
la de que não cometemos um erro. Porque não foi um erro. Foi
perfeito.
Sexo nunca foi tão gostoso. Estar com uma mulher nunca foi tão
certo.
Ela percebeu isso, né? Tem que ter percebido. Não posso ser o
único idiota da relação.
É então que paro no meio do quarto e olho para os lados,
completamente embasbacado.
— Caralho, será que estou em um relacionamento? — pergunto
para mim mesmo, e ainda bem que não tem ninguém aqui para me
responder. Meus primos ririam da minha cara, com tanta força que
cairiam no chão.
Mas a verdade é que não tenho ideia. Nunca estive com
ninguém assim, nem tive uma namorada na escola para ter algum
parâmetro.
Por um momento, esqueço que Jackson está precisando de
roupas limpas e faço a única coisa lógica que consigo. Pego meu
celular e digito no Google: “como descobrir se você está em um
relacionamento”. Não obtenho resposta, mas a primeira coisa que
encontro é uma opção bem interessante: como saber se você está
pronto para um relacionamento[1]. Passo os olhos pelo artigo e vejo
que está subdividido em tópicos. O primeiro fala que adolescentes —
reviro os olhos — geralmente começam a namorar na mesma época
que seus amigos. Se for pensar assim, estou pronto, já que a maioria
das pessoas de vinte e nove anos já sabem o que é isso. O segundo
é mais complexo, e ainda bem que vem dividido em itens:
1) Sentir-se confortável a ponto de expressar seus pensamentos,
sentimentos, opiniões e sonhos para a outra pessoa.
Nunca tentei fazer isso com ninguém a não ser meus primos.
Acho que será um desafio, mas posso tentar. Mas, pensando bem, já
comentei com Gaia que queria ser cowboy. Isso conta?
2) Tratá-la com respeito e oferecer apoio a ela.
Disso, não tenho dúvida. Posso ser um babaca de vez em
quando, mas minha mãe me deu educação.
3) Evitar violência.
Com Gaia, com certeza. Com qualquer babaca que ouse chegar
perto dela, duvido muito. Quase arranquei a cabeça do meu primo
quando vi os dois juntos ontem, sem contar no soco que dei em
Oliver, quase arruinando um contrato importante para a IK, antes
mesmo de estar com ela. Duvido que consiga me controlar, caso veja
Gaia com outro homem. Ela desperta algo em mim… Não consigo
explicar muito bem, nem entender. É primal demais.
4) Saber resolver conflitos e brigas.
Acho que sim. A conversa que tivemos ontem foi prova disso.
Sempre acreditei que sentar e explicar as situações é a chave para
resolver tudo.
5) Ser capaz de fazer confidências e comunicar-se direta e
abertamente.
De novo, nunca fiz isso com pessoas além da minha família. Mas
acho que posso tentar com ela. Confessar que preciso dela, como fiz
ontem à noite. É isso, certo?
6) Incentivá-la a ter seus próprios amigos e interesses.
Isso é fácil. Sou a favor de que ela continue perseguindo seus
interesses, e ter amigas é tranquilo. Quanto a amigos… vamos ver.
Depende do tipo de amizade que eles querem.
7) Ser honesto quanto a relacionamentos ou hábitos sexuais do
passado.
Que merda! Será que vou precisar ouvir as experiências sexuais
de Gaia? Não sei se quero saber com quantos homens ela já ficou,
nem o que fez com eles. Só de pensar nisso, já começo a sentir meu
sangue ferver. E, pela reação dela ontem à noite, não sei se Gaia
ficaria confortável ao ouvir as minhas.
Gaia é minha, e a mera ideia de ela ter estado com outro já me
deixa com vontade de socar a parede.
8) Praticar atividades sexuais sem se sentir pressionado.
Finalmente alguma coisa boa nessa lista! Inclusive, estou louco
para saber tudo o que Gaia gosta. Descobrir cada detalhe de seu
corpo, cada área sensível… Que tipo de posições ela prefere. Estou
bem aberto a sugestões.
Se a nossa primeira vez foi ótima, as próximas serão ainda
melhores.
Continuo lendo e vejo que o artigo é enorme, então resolvo que
não vou perder mais tempo aqui. Não agora, porque Jackson está
esperando por mim. Só por este motivo, e não porque tenho medo
de relacionamentos. Não tenho, sou maduro demais para isso. Sigo
até o meu armário, encontro uma bermuda e uma camiseta, e depois
volto até meu primo.
Mas na minha cabeça, somente uma coisa se passa: será que eu
quero estar em um relacionamento de verdade ou isso é só o efeito
da maldição dos King?
Vida em Nova York
A sua fonte de informações sobre a cidade que
nunca dorme
Gaia
Zachary
Gaia
Gaia
Gaia
— Isso foi…
— A melhor surpresa de todas — Zachary termina a frase, depois
da terceira rodada, enquanto acaricia o meu braço. Agora não há
mais o medo de sermos pegos, já que estamos aninhados em sua
cama, seguros e saciados.
Foi preciso que ele me carregasse escada acima depois da foda
espetacular na sala de estar, junto com o trapo que virou o meu
vestido. Finalmente conseguimos um pouco de privacidade para
continuar nossa diversão.
— Nunca imaginei que você tivesse um lado exibicionista. —
Apoio a cabeça em seu peito, deixando os dedos roçarem os
músculos que tanto amo. — Nem o maratonista.
— A culpa é toda sua, mulher. — Não consigo conter a risada,
nem a vermelhidão que toma as minhas bochechas.
É então que me dou conta da loucura que fizemos lá embaixo e
me sento na cama.
— Meu Deus! — Enfio o rosto na mão. — E se tivéssemos sido
pegos? Eu sabia do perigo, mas… não me importei na hora.
— Agora você se preocupa com isso? — Ele solta uma risada
gostosa, fazendo com que eu suba um pouco o olhar para encará-lo
e ver a resposta. — Eu não teria parado.
— Zachary! — Pego o primeiro travesseiro que vejo e miro em
seu rosto. Mas os reflexos dele são ótimos e não consigo atingi-lo,
que pega o travesseiro e me puxa de volta para seus braços.
— Fique mais um pouco, Gaia. Ainda não estou pronto para te
deixar ir embora.
— Não pretendia ir — confesso. — Na verdade, estou bem
confortável aqui. — Jogo uma perna por cima das dele e me permito
ser apenas uma garota normal por alguns momentos.
Aqui e agora, somos Gaia e Zach. Nada de futuro CEO da IK e
funcionária da casa. Não há diferença entre nós. Não há
pretendentes esperando por ele do lado de fora, nem expectativas.
Apenas uma sensação gostosa de companheirismo e saciedade.
— No que você está pensando? — ele quer saber, seus dedos
acariciando levemente os fios do meu cabelo.
— Em duas coisas, na verdade — confesso.
— E quais seriam elas?
— A primeira é por que você não foi me ver. Na cozinha, você
disse que iria e…
— Meu pai me chamou para uma conversa. Acabei demorando
mais do que o esperado — ele explica. — Depois, fui tomar um
banho. Quando desci, dei de cara com você na escada.
Tento conter o suspiro de alívio, ao mesmo tempo que não
consigo esconder o sorrisinho bobo que se forma em meu rosto.
Ele não ia me ignorar…
— E a segunda? — pergunta, me puxando para mais perto.
— Nas convidadas que seu pai trouxe. Tenho certeza de que elas
dariam tudo para trocar de lugar com essa cozinheira, neste
momento — solto em tom de brincadeira e aproveito para deixar uma
mordidinha em seu peito, agora me sentindo bem mais relaxada.
Zachary ri alto.
— Imagina o desastre que seria o jantar — ele também faz piada
e não consigo conter a gargalhada. — Inclusive, estava delicioso. E
não estou falando isso porque você está na minha cama, nem
porque já provei outras coisas também. É a mais pura verdade. Você
tem muito talento, Gaia.
Subo o olhar para encontrar o dele. E ali, refletido em todo aquele
mundo verde, não há nada além de sinceridade. Tanto que meu peito
infla, fazendo meu coração errar algumas batidas.
— Você não tem ideia de como é bom ouvir isso.
— E sobre as mulheres quererem ser você agora… — Seu rosto
vem para bem perto, o nariz roçando o meu. — Elas podem até
tentar, mas ninguém jamais será você, Gaia.
— Você não pode dizer essas coisas. — Minha voz é tímida e
não passa de um sussurro.
— Por quê?
— Porque senão eu acabo acreditando — confesso, mais
baixinho ainda. O medo de me expor é enorme. Ao mesmo tempo
que não quero parecer a mocinha emocionada, também não estou a
fim de soar indiferente a tudo que tem acontecido entre nós. Até
porque não tenho mais como fingir que não sinto aquilo que meu
corpo já deixou bem claro para ele.
Só que, por vários segundos, Zachary apenas me encara de
volta, como se buscasse as palavras certas para dizer o que está em
sua mente. O silêncio domina o quarto, preenchido apenas por
respirações hesitantes. Por um segundo, fico com medo de ter falado
besteira, talvez trazido à tona um assunto que não deveria fazer
parte deste momento. Há uma tensão estranha no ar, como se não
soubéssemos ao certo o que está acontecendo. Algo está mudando
agora. De um lado da moeda, há o desejo. Do outro, há aquilo que
nenhum de nós está pronto para olhar e descobrir o que é.
— Se eu te dissesse que não minto, você acreditaria em mim? —
A pergunta é tão inesperada que acabo enrugando as sobrancelhas.
— Como assim?
— Todos dizemos mentirinhas bobas, é claro, mas eu me lembro
quando tinha doze anos e contei uma mentira séria na escola.
Coloquei a culpa por uma janela quebrada de um carro de luxo em
um menino bolsista. Ele era metido, insuportável e tinha ficado com a
menina que eu queria. — Solta uma risada sem qualquer humor. —
É claro que todos acreditaram em mim.
Zachary se ajeita nos travesseiros, desviando o olhar do meu, e
encara o teto. É como se, ali em cima, um filme estivesse passando
e ele pudesse enxergar a cena.
Ou talvez só não queira que eu veja seu rosto agora. Mesmo
assim, me puxa para perto, fazendo com que eu deite em seu peito.
— O menino era um Smith. Zachary Smith, de todos os nomes…
Eu, um King — continua narrando. — De alguma forma, meu pai
sabia que eu não estava sendo honesto, mas não me contestou na
frente de todo mundo. Ele ficou do meu lado e deixou que os
diretores da escola tomassem as atitudes necessárias. — Com a
cabeça sobre seu coração, enquanto traço círculos nos músculos da
barriga, escuto-o bater acelerado. Sei que a parte ruim está por vir.
— Expulsaram Smith no mesmo dia.
Absorvo o impacto da história, só que não consigo ficar calada.
— E o que aconteceu depois?
— Cheguei em casa, achando que tinha me safado, e meu pai
estava lá, sentado no escritório, esperando por mim. — Seu braço
me aperta com um pouco mais de força, o que me deixa preocupada
com o que vou ouvir em seguida. — Quando entrei, pensei que fosse
levar uma surra por ter mentido, mas não foi o que aconteceu. Meu
pai nunca levantou a mão para mim. Nem uma única vez. Ele apenas
olhou em meus olhos e disse, naquele tom firme de quem sabe mais
da vida: “Um King de verdade entende que mentiras ajudam um lado
e condenam o outro. De agora em diante, você será obrigado a
dormir com esse peso na sua consciência para sempre. Parabéns,
meu filho, foi brincar de rei e se tornou um carrasco”.
A frase me faz estremecer.
— Mas…
— Ele estava certo, Gaia — Zachary me impede de continuar. —
Durante meses, só conseguia pensar em Smith e na merda que eu
tinha feito. Eu era orgulhoso demais para voltar atrás e consertar o
meu erro. Não falei para ninguém que tinha sido eu o culpado pelo
estrago na janela do carro, mas encontrei outra solução. — O
coração dele bate mais rápido, acho que de forma animada pela
lembrança positiva, e suas mãos me acariciam com mais firmeza. —
Fui atrás de vários colégios, até encontrar o segundo melhor de
todos, e fiz uma doação generosa em nome de Zachary Smith. Tirei
o dinheiro da minha poupança pessoal e paguei a mensalidade dele
até o fim da escola. Não contei para o meu pai, mas, de novo, ele
sabia o que eu tinha feito. E, de novo, me chamou ao seu escritório.
Dessa vez, ele estava de pé. Quando entrei, tudo o que fez foi
estender a mão para mim. “A partir de hoje, você não é só um King,
mas o meu herdeiro também. Porque, nesta família, nós não temos
medo de nos sacrificarmos pelo que acreditamos ser o correto”, ele
disse.
Meus olhos ficam marejados quando termino de ouvir a história.
Não só pelo que aconteceu, mas por saber que, embaixo de tanta
pose e atitude, há um homem de verdade.
Não sei por que me surpreendo ao ver que Zachary King tem
princípios.
— É por isso que você está trabalhando tanto para ser o próximo
CEO da IK? — solto a pergunta. — Para honrar o seu pai?
— Também — ele confirma, virando-se para mim. — Harvey King
é o homem mais correto que já conheci na vida. Dentro e fora do
escritório. Quero muito ser o herdeiro que ele precisa, mas… —
hesita, fechando os olhos e puxando o ar com força.
— Mas? — incentivo-o a continuar. Aproveito e traço levemente
seu nariz. Depois, contorno a boca com a mesma leveza, descendo
o toque para seu pescoço enquanto mantenho os olhos presos em
seu rosto, até que meus dedos chegam ao peito forte e ele toma a
mão na minha, impedindo-me de seguir.
— Quero isso por mim — declara com firmeza, beijando a palma
da minha mão. — Eu quero ser capaz. Por mim, Gaia. Quero provar
a mim mesmo que posso ser metade do homem que meu pai é, nem
que seja apenas como profissional.
— Não sei se vale para muita coisa — deixo um beijo rápido em
seu pescoço —, mas acredito em você. Sei que vai ser um excelente
chefe.
É então que seu rosto muda, e algo novo aparece ali. Algo que
não consigo decifrar. O modo como Zachary me encara é… não sei.
Como se estivesse procurando algo em meus olhos, talvez na minha
alma. Tão lá dentro que fico desconfortável e sou obrigada a romper
o contato visual, balançando um pouco a cabeça.
Às vezes, ele é intenso demais para mim.
— Não foi por isso que contei aquela história, sabe? — ele diz,
aliviando meu incômodo.
— Ah, é?
— Só estava tentando te dizer que não minto. — Solta uma
risada, mas a frase me faz lembrar do que havia falado antes, e é
claro que fico vermelha de novo. — Meu Deus, mulher! Quando você
vai parar de ficar com vergonha?
— Não sei! — Começo a rir também, agora sem graça pela minha
vergonha descabida.
— Trabalhe nisso, porque há meia hora eu estava te chupando
e…
— E se você não parar agora, vai ter que me chupar de novo —
ameaço, só para calar a boca mesmo.
— Olha — finge uma expressão séria, porém logo relaxa —,
prometo que não será um sacrifício.
Então, nos encaramos. Os olhos buscando alguma coisa nos
meus, só que não há mais palavras sendo ditas. Não precisamos
falar nada. Apenas sentimos.
O desejo.
A necessidade.
Logo sua boca encontra a minha. E, desta vez, o beijo é calmo,
sem a urgência de antes, mas isso não quer dizer que não cause o
mesmo efeito devastador. É sempre assim, e não entendo o porquê.
— De novo? — pergunto, alcançando sua rigidez.
Um sorriso estampa o rosto atraente e Zachary me puxa para
cima, me fazendo montar sobre ele.
— Já perdemos muito tempo.
∞∞∞
Nem mesmo uma festa é divertida sem os King por perto. Ou
talvez seja a saudade que eu esteja sentindo de Zachary. Ele foi
embora no domingo e mal tive chance de me despedir. O máximo
que conseguimos foi uma troca de olhares. Pelo menos, ficamos até
as cinco da manhã juntos, sem conseguir parar de conversar. Uma
sequência de risadas, toques, beijos, orgasmos…
Acho que foi a melhor noite da minha vida.
Primeiro, o sucesso do jantar. Depois, Zachary. No domingo, eu
estava mais destruída do que meu vestido. Porém, quando o sol
nasceu, tudo voltou ao normal: eu era a cozinheira, e ele era o filho
do meu patrão. Mas cada segundo valeu a pena. Não só o sexo, as
conversas que tivemos também.
Agora estou olhando para o mar enquanto tento refletir sobre o
que vou fazer daqui para a frente. Porque a verdade é que me sinto
cada vez mais envolvida por Zachary, e não sei se devo me permitir
ter esses sentimentos de novo.
Já me iludi uma vez. Entreguei minha alma.
Se eu fizer isso de novo, e não der certo, não sei se vou
conseguir me reerguer.
“Mas será que não passamos do ponto de questionar o que
estamos fazendo?”, um Zachary imaginário pergunta em minha
mente. E por mais que eu odeie admitir, ele tem razão.
Ficar questionando se devo ou não me envolver quando já estou
envolvida é a mesma coisa que chorar o leite derramado. É tarde
demais para isso.
— Gaia! — A voz de Valerie interrompe meus pensamentos.
Desencosto da grade e olho para trás, vendo-a acenar para mim. —
Vem logo — ela chama, apontando para o grupo de pessoas em
volta da piscina.
— Só mais um minuto.
A vista na mansão dos Callihan é diferente da dos King, que fica
em uma área bem limitada de Southampton. A caminho de Havens
Beach, com alguns conhecidos de Valerie e Kyle, tive ainda mais
certeza de que a propriedade dos King faz parte do 1% do 1% dos
ricos e famosos. E que ninguém tem algo tão exclusivo quanto eles.
Até nós, que somos os funcionários, somos tratados de forma
diferente que os demais invasores.
Quando viu meu estado de total apatia, Val insistiu para que eu
viesse a essa festinha. Mesmo minha vontade sendo de ficar em
casa lendo um livro e comendo pipoca, aceitei. Só que ela tinha
razão: eu merecia uma folga agora que Martha está recuperada.
Depois de todo o esforço para cuidar da família no fim de semana,
nada melhor do que um pouco de diversão. O problema é que não
estou achando nada para me alegrar, porque não consigo tirar um
certo homem da cabeça.
— Gaia… — Kyle se aproxima.
— Desculpe. — Viro-me para ele. — Sou uma péssima
companhia hoje.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não — apresso-me em mentir. — É só que… não estou muito
a fim de ser sociável. E como não conheço a maioria das pessoas
aqui — aponto para o grupo —, fico meio desconfortável. Nada de
mais.
— Se você quiser, podemos ir embora — Kyle oferece, um sorriso
carinhoso estampando seus lábios.
— Imagina. Fique com seus amigos e aproveite a noite. Eu estou
bem. — Abano o ar, dispensando a ideia. — Daqui a pouco apareço.
Só estou vendo o mar.
— Tem certeza?
— Absoluta — garanto.
Não vou dizer a ele que minha bateria social é limitada. Muito
menos que preferia estar nos braços de um determinado homem
agora. Por isso, apenas forço um sorriso e afirmo que vou ficar legal.
Kyle assente e volta para o grupo animado. Todos estão rindo em
volta da piscina, tomando cerveja e parecem bastante alegres por
curtir a noite do mesmo jeito que os ricos e famosos.
Os Callihan, pelo que soube, estão passando o verão no sul da
Itália.
Ah, a vida difícil.
— Gaia! — Val me chama de novo.
— Prometo que já… — começo a dizer, virando-me para ela,
porém estremeço ao ver o celular em sua mão.
Da última vez em que ela veio até mim com o aparelho, não foi
para me trazer boas notícias. Acho que minha amiga percebe para
onde meus pensamentos vão, porque sua expressão fica murcha na
mesma hora. Há uma raiva contida ali também.
— Olha, eu não queria ser portadora de más notícias de novo,
mas… — Valerie nem consegue me encarar direito.
Puta merda, a coisa deve ser feia mesmo.
— Me mostra logo. — Estendo a mão, sem querer adiar o
inevitável.
Minha respiração é pesada e a coragem vacila no instante em
que ela coloca o aparelho na minha palma. Sinto o corpo inteiro gelar
antes mesmo de ver o que está ali, porque eu sei, eu sei, que vou
me decepcionar. A expressão de Valerie já diz tudo.
Então, fecho os olhos, tentando conter as batidas
descompassadas dentro do peito.
Contei a ela parte do que aconteceu entre mim e Zachary no
último fim de semana. Disse que o nosso envolvimento está cada
vez maior e que não estou conseguindo conter o avanço dos meus
sentimentos. Falei que estou me apaixonando, mesmo que eu tenha
certeza de que a recíproca não é verdadeira.
Zachary King, todos sabem, não é um homem que se apaixona.
Ele mesmo me disse que não tem relacionamentos bonitinhos, que
não se envolve com mulheres e que nunca namorou. Por que seria
diferente comigo? Tudo bem que fizemos mais do que sexo. Ele se
abriu comigo. Contou histórias de sua infância, me mostrou um lado
mais… humano. Só que isso não significa amor. Sei disso, mesmo
que precise repetir essas frases algumas vezes ao dia para não
afundar na besteira de acreditar em finais felizes de novo.
Crio coragem, abro os olhos e vejo o que ela tem a me mostrar.
Na tela, há uma postagem do Instagram. A primeira foto é de
Zachary ao lado de Trenton. Os dois de terno, rindo, no que parece
ser um evento da alta-sociedade.
— Isso é de hoje? — pergunto, minha voz não passa de um fiapo.
Val faz que sim com a cabeça. Fico me questionando quem
diabos vai a uma festa em plena terça-feira. Só então me lembro de
que também estou em uma festinha e ignoro o ciúme. Pelo menos,
por enquanto. Então, passo para a foto seguinte — e meu coração
para de bater.
Porque Zachary está abraçado a duas desconhecidas. Duas
mulheres lindas, com certeza modelos. Altas, magras, com vestidos
elegantes que devem custar mais do que meu salário anual,
maquiagens impecáveis e sorrisos de milhões. O pior de tudo é que
ele também está sorrindo. Sem suportar olhar mais para a imagem,
passo para a próxima. Zachary cochicha no ouvido de uma delas,
enquanto a outra tem a mão espalmada em seu peito.
O mesmo peito em que me deitei há poucos dias.
Engulo em seco, tentando conter a vontade de vomitar. Sigo para
a última foto e meus joelhos perdem as forças. Preciso me apoiar na
grade do deque para não cair. Ali, estampado para o mundo ver,
Zachary King está beijando a boca da acariciadora de peitos
masculinos.
— Ei, ei, ei! — Valerie me chama. — Presta atenção: essa última
foto é antiga, viu? — Não tenho como encarar minha amiga. — Leia
o que está escrito na postagem.
— Não consigo — confesso, sentindo minhas mãos tremerem.
— Então eu vou ler. Ele foi a um evento da gravadora. Essas aí
são duas cantoras. A da direita, Janice Blue — diz em tom acusador,
se referindo à mulher com quem ele estava cochichando —, é a
superfamosa do momento. A da esquerda é Kirsten Heart. Ela já é
antiga na King Records e um ex-casinho do Zachary. Esse perfil de
fofoca colocou essa foto e perguntou se os dois estão juntos de
novo. — Forço-me a desviar o olhar da tela para minha amiga. Posso
ver no rosto de Val que ela está tão preocupada quanto eu. —
Aquele cachorro! Eu podia jurar que ele estava a fim de você, Gaia,
de verdade. Desculpe, eu jamais imaginei que…
— Não precisa se desculpar. O erro não é seu, Val — interrompo-
a, cansada de ouvir explicações.
Meu olhar encontra o dela enquanto tento conter as lágrimas.
Mas não vou chorar agora. Não vou. Não posso me permitir chorar
por um homem que está se divertindo com outras mulheres,
enquanto fico aqui, pensando nele que nem uma idiota. Onde está o
meu senso de autovalorização?
— Talvez tenha sido algum engano. Você sabe como são essas
fofocas de internet… — Ao notar as lágrimas que lutam para cair, Val
tenta me acalmar, mas é em vão.
É impossível me tranquilizar agora, porque, a cada segundo que
passa, tenho mais certeza de que não sou nada além de uma
diversão de temporada para aquele homem.
Um romance proibido.
O sexo embaixo da escada.
Um desafio para Zachary King.
Vida em Nova York
A sua fonte de informações sobre a cidade que
nunca dorme
Zachary
Gaia
Zachary
∞∞∞
Gaia precisa me amar de volta.
Precisa. Porque a diaba ruiva está destruindo tudo o que tenho
de melhor. Primeiro, a minha autoestima. Depois, a casa nos
Hamptons. Sempre adorei passar férias lá, e será impossível voltar
se ela não estiver comigo. Serei o velho chato, que fica entocado na
biblioteca enquanto reclama do barulho que as futuras crianças da
família farão enquanto brincam na piscina. Não satisfeita, ela
destruiu meu helicóptero preferido gozando lindamente na minha
mão. E, neste momento, está destruindo a minha casa — e até o
meu cachorro.
— Konig! — solto um grito, seguido de um assobio de comando,
pedindo para o vira-lata descer de cima dela. Mas o bicho é tão
animado que nem me escuta. Fora que ele assistiu a um total de
duas aulas de adestramento e não aprendeu porra nenhuma.
— Calma, lindão… — Gaia acaricia o carente, que não para de
esfregar o rosto nela, depois de tê-la jogado no sofá. — Eu tenho
quase o seu peso. Assim você vai me sufocar.
Tento puxá-lo para longe, mas o audacioso me ignora. Tão forte e
estabanado que mantém o foco em cheirar seu rosto e lambê-la o
máximo que consegue.
— Desculpe — arrasto-o para o chão, apenas para que o monstro
suba de novo no sofá e volte a ser acariciado —, daqui a pouco ele
se acalma.
Ou não. Konig nem falou comigo direito, e sou seu humano
preferido. Logo que sentiu o cheiro dela, parece que o mundo deixou
de existir. O mesmo que o idiota aqui sente toda vez que Gaia está
por perto. Dizem que os cachorros são reflexos dos donos, porém o
meu, além de ser parecido comigo, também é um traidor de primeira
instância.
— Por que você nunca o levou para a casa de praia? — Gaia
pergunta, virando a cabeça de um lado para o outro enquanto tenta
desviar dos mil beijos caninos.
— Porque ele tem medo de carro — confesso, fazendo-a soltar
uma gargalhada. — Na verdade, Konig tem medo de tudo.
Absolutamente tudo.
Isso me faz lembrar…
Pego o primeiro objeto que vejo, um porta-copos de papel que
Jackson roubou de um bar qualquer, e o solto no chão. Na mesma
hora, Konig dá um pulo e corre para debaixo da mesa de centro,
ficando encolhido, com o rosto entre as patas dianteiras.
— Você não estava mentindo — Gaia comenta, olhando
espantada para o cachorro.
— Não, já disse que não gosto de mentiras. — Com passos
leves, vou até o meu cão e começo a acariciá-lo devagar. — Calma,
garoto, é só um porta-copos. Isso não vai te fazer mal.
Mostro o objeto a ele, colocando bem perto de seu nariz para que
possa cheirá-lo. Depois, amasso o papel e mostro de novo. Só então
Konig começa a sair de baixo da mesa, a passos hesitantes, e vem
falar comigo.
— Por que ele é assim? — Gaia quer saber enquanto o vira-lata
deita a cabeça no meu joelho para ganhar um pouco de carinho. Dá
para ver que ele ainda está assustado.
Odeio ter feito isso, mas o bicho estava prestes a sufocar Gaia,
completamente fora de si.
— Adotei Konig de um abrigo há alguns meses e ainda estamos
em fase de adaptação. Ele é um filhote, por incrível que pareça. Tem
oito meses. — Aponto para o seu tamanho gigantesco. — O
veterinário disse que ele é uma mistura de Pastor Alemão com São
Bernardo. Como o cruzamento deu certo, é um mistério…
Já divaguei demais sobre o sexo dos cães, não aguento mais
pensar nisso.
— E o resultado foi um companheiro medroso desse? — Gaia
vem para o chão também, sentando ao meu lado, e segue meus
movimentos para acariciar Konig.
Encaro-a com assombro ao ver a maldita destruir o meu
cachorro. O nariz pequeno e reto, os olhos redondos, as sardas que
decoram a pele clara… e o cabelo vermelho, emoldurando tudo com
algumas ondas soltas. Tão linda que faz meu peito doer. E eu odeio
muito me sentir assim. Porque ao mesmo tempo que quero seu amor
de volta, quero foder sua boca com força.
Isso não faz sentido.
Passei os últimos vinte minutos beijando-a no helicóptero, louco
para entrar na cobertura e poder trepar com ela até ficar desidratado.
Então, assim que cruzamos o batente, ela virou o novo amor da vida
de Konig. Sentou no meu sofá. Espalhou seu cheiro. Largou os
sapatos no tapete.
Cinco minutos na minha casa foi o que precisei para, dentro de
mim, admitir que não posso deixá-la ir embora.
Nunca. Mais.
Por outro lado, tenho total consciência de que não posso me
declarar agora.
Cheguei aos Hamptons determinado a dizer como me sentia e o
pandemônio se instalou. Além de Gaia estar puta da vida por conta
das fotos que viu, Tata e Val estavam na cozinha. Mas o buquê nem
era o grande gesto que eu estava planejando. Só ia chegar com
flores e convidá-la para passar uns dias comigo em Nova York. Aqui,
e a sós, contaria a verdade.
Só que é difícil demais explicar a porra da maldição. Não sei por
onde começar.
Como ela vai se sentir quando souber que estou obcecado? Que
não posso mais ficar longe? Que, daqui em diante, nunca mais serei
capaz de olhar para outra mulher? Que sou a porra de um pau fiel?
Eu poderia ter explicado que seu ciúme era completamente
infundado, mas ela jamais teria acreditado. Ninguém em sã
consciência levaria a explicação a sério.
Porque se maldições funcionam, então magia também é real. Só
que não é. Mas a dos King é real, sim. Eu sou a prova viva disso.
— Zachary? — ela chama o meu nome, porque, é claro, eu a
estava encarando que nem um psicopata.
— Venha. — Levanto-me do chão e estendo a mão para ela. Por
um milagre, Konig fica quieto no lugar. — Quero te mostrar o motivo
de eu ter comprado este apartamento — mudo de assunto.
— Não foi o heliporto no telhado? — pergunta em tom debochado
e eu finjo rir, revirando os olhos.
— Não, não foi. — Beijo sua têmpora, puxando-a para a varanda
toda fechada por vidros grossos. Melhor assim, pois não importa o
tempo lá fora, a vista sempre é espetacular. — Daqui a pouco a
gente faz um tour e eu mostro o resto, mas, por enquanto, preciso
que veja isso…
Deslizo a cortina e, em seguida, a porta de vidro.
Gaia arfa com a vista, ao darmos alguns passos para frente,
ficando no meio da varanda. Mesmo que eu ame esse skyline, ele só
não é mais bonito do que ela. Ótimo, agora eu virei um idiota ainda
maior.
— Olhe, Simba, tudo isso que o Sol toca… — começo a falar em
um tom grave e Gaia solta uma risada alta, acompanhada de um
tapa no meu peito.
— Seu palhaço. Está de noite.
Posiciono-me às suas costas, inclinando um pouco para frente, e
a envolvo em meus braços, ambos de frente para o vidro que nos
protege da imensidão.
— Foi por isso que resolvi morar aqui — explico. — A selva —
aponto para o Central Park abaixo de nós — e a pedra.
Olho para os muitos prédios à nossa frente, um mais alto e
importante que o outro, sentindo a pressão de estar em uma das
cidades mais imponentes do mundo. Em carregar um dos
sobrenomes mais influentes. Em saber que não falta muito para que
várias dessas luzes acesas sejam minhas. Engulo a tensão, ignoro a
agonia e aperto um pouco mais a mulher em meus braços.
— É muito lindo — Gaia sussurra, tombando a cabeça no meu
peito enquanto aprecia a vista.
A primeira coisa que fiz ao me mudar para cá foi pedir que
remodelassem a enorme varanda, que acompanha a sala inteira do
duplex. Porque é o modo que me sinto aqui em cima que me fez
escolher este como o meu lar: no topo do mundo, porém
insignificante. À vista de todos, mas sem que ninguém me veja. Com
vidros me cercando, oferecendo aquela falsa sensação de
segurança. Porque vidro quebra. E quando isso acontece, ele se
estraçalha em milhões de pedaços.
É exatamente isso o que significa ser um King: qualquer tropeço
pode colocar tudo a perder.
— Eu moro para… — Ela começa a gesticular com o indicador
para todos os lados, como se não soubesse ao certo para onde deve
apontar.
— Para cá. — Estico o braço rente ao dela e tomo seu dedo,
depois, viro-a para mim. Na posição que estamos agora, passo sua
mão por cima do meu ombro, indicando a direção atrás de nós. Para
dentro da minha casa.
Nossos olhos se encontram quando faço isso, e minha respiração
falha. Talvez esse seja o momento certo de falar tudo o que está
engasgado, só que o medo me paralisa, porque não posso correr o
risco de estilhaçar o que estamos construindo.
— Bem longe — Gaia atesta baixinho, como se quisesse, mais
uma vez, dizer que nossos mundos não se encontram.
“Só se você quiser”, respondo na mente, porém não tenho
coragem de colocar essas palavras para fora. Ainda não.
Limito-me a descer os lábios, encontrando com os dela no meio
do caminho. Essa é a única forma que me permito de mostrar o que
sinto: através de toques. Só espero que isso baste por enquanto.
Capítulo 34
Gaia
Zachary
Extra! Extra!
Samantha Strauss está namorando! Fiquei chocada com a notícia
que saiu no maior jornal de fofoca da Inglaterra ontem. De acordo
com o The Sun, a jovem milionária está em um relacionamento sério
com Drew Taylor, que é — pasmem! — amigo de Zachary King.
Será que houve uma traição?
Não estou entendendo mais nada!
Inclusive, Drew está passando uma temporada na Inglaterra com
a nova namorada e foi visto saindo do prédio da IK londrina.
Enquanto isso, do outro lado do Atlântico, ainda estamos
esperando mais fotos de Zach e Kirsten, ou um comunicado
explicando essa repentina aproximação. Por enquanto, nada mais
saiu sobre os dois. Será que não será dessa vez que Zach se
comprometerá?
De qualquer forma, Elijah King foi visto esta semana com Oliver
Cooper novamente. Os dois almoçaram juntos em TriBeCa,
acompanhados de mais quatro homens desconhecidos por esta
coluna. O que será que estavam fazendo?
Capítulo 36
Zachary
Trazer Gaia até a minha casa para preparar o jantar foi a melhor
e a pior ideia de todas. É uma tortura tê-la tão perto e não poder agir
do modo como quero, como preciso. Porque, no instante que ela
entrou na cozinha e colocou o avental, minha diaba ruiva ergueu um
muro tão alto entre nós, que nem meu melhor sorriso foi capaz de
penetrá-lo.
Agora estou aqui, recostado na parede, com as mãos no bolso
enquanto vejo-a andar de um lado para o outro, fazendo mil coisas
ao mesmo tempo. Gaia é uma máquina de eficiência — e, ao mesmo
tempo que isso me excita, também fico preocupado que ela possa
desmaiar de cansaço a qualquer momento.
— Tem certeza de que não posso ajudar? — Ela levanta o rosto
para me encarar, enquanto pica alguns vegetais com tanta rapidez
que me dá medo de que possa cortar o dedo fora. Gaia é realmente
boa no manejo de uma faca.
— Já disse que não. — Seu tom é ríspido. O olhar que me lança
é gélido.
A chef Denver não é a mesma mulher com quem dormi a noite
passada, muito menos a que estava gritando o meu nome hoje de
manhã. Não é uma pessoa angelical e carinhosa, nem uma
tremenda safada. Quando Gaia entra em modo profissional, parece
que adota uma outra personalidade.
— É sério, posso pegar algumas coisas e… — começo a
oferecer, porém logo sou interrompido.
— Se você der um passo para dentro da minha cozinha — aponta
a faca para mim —, não me responsabilizo pelos meus atos.
— Só estou querendo ajudar — tento me defender, tirando as
mãos do bolso e erguendo-as em sinal de rendição.
— Vai ajudar se sair daqui e me deixar fazer o meu trabalho. Teria
ajudado se tivesse me dado mais tempo, ou concordado em trazer
Spencer para servir de auxiliar. — Ela ergue uma sobrancelha e, na
mesma hora, fecho a cara.
— Sem Spencer — falo com os dentes cerrados. Ver a interação
dos dois na casa dos Hamptons foi torturante. Se tiver que ouvir
risadinhas sob o meu teto, não acho que serei capaz de controlar o
meu ciúme. — Você poderia ter escolhido qualquer outra pessoa. Eu
teria dado um jeito de trazê-la.
— Não conheço muitos auxiliares do ramo. Além disso, é difícil
ter química com alguém dentro da cozinha — ela se justifica e sou
obrigado a revirar os olhos.
Química? Com aquelezinho lá?
Química ela tem comigo, desde o dia que nos conhecemos!
— Dá pra desfazer essa cara? — Gaia interrompe os meus
pensamentos. Deixando a faca de lado, vem até mim com passos
calmos. Mordendo o lábio. Avaliando o meu rosto. Sorrindo.
Maldita mulher linda, que mexe com a minha sanidade e me
deixa à beira de um colapso. Não sei o que fazer quando estou perto
dela, talvez por nunca estar perto o suficiente. Mas assim que
apenas um passo nos separa, não consigo resistir e puxo-a pela
cintura, colando seu corpo ao meu. Gaia envolve meu pescoço com
os braços, porém as mãos não invadem o meu cabelo, como sempre
acontece.
— Odeio quando não podemos ficar juntos do nosso jeito —
confesso, colando nossas testas e deixando as palavras morrerem
na respiração entre as bocas.
— Foi você quem me chamou para trabalhar — Gaia diz baixinho,
e o esboço de um sorriso se forma em seus lábios. — Inclusive,
obrigada por isso. Estou me esforçando para oferecer o melhor jantar
que já cozinhei na vida. Nada como uma boa comida para deixar as
pessoas mais felizes e dispostas a assinarem contratos milionários.
— Sua ingenuidade me faz rir, ao mesmo tempo que me dá
esperança de que esta não será a primeira vez que preparará um
evento meu.
Nos próximos, não quero que Gaia fique apenas nos bastidores.
Só não sei como pedir isso a ela sem fazê-la sair correndo para
nunca mais voltar. Estou andando em uma corda bamba, e qualquer
passo em falso pode estragar tudo o que temos.
“Uma coisa de cada vez, Zachary”, tento lembrar a mim mesmo.
— Tem certeza de que não tem nada em que posso ajudar? —
Resolvo navegar em águas mais seguras.
— Tenho. Por favor, só fique longe da cozinha. Ter você tão perto
me distrai demais. Principalmente quando está usando esse terno. —
Ela encerra a distância entre nós, pousando os lábios sobre os meus
por um breve momento. O gesto foi curto demais para aplacar a
vontade que sinto, mas o suficiente para mostrar que ela não está
querendo me afastar. Apenas… precisa fazer o seu trabalho.
É por isso que tomo o que Gaia está disposta a dar, mesmo que a
minha vontade seja de mandar esse jantar se foder e arrastá-la para
o quarto. Se eu pudesse, deixaria bem claro que odeio essa linha
que ela insiste em manter entre a profissional que trabalha para os
King e a mulher que tem ocupado cada vez mais a minha mente — e
a minha cama.
— A equipe de serviço chega em vinte minutos. Os convidados
devem aparecer em menos de uma hora — aviso com um suspiro,
sabendo que jamais iria contra algo que Gaia me pediu. Deixando
mais um beijo rápido em sua boca, me afasto. — Vai lá terminar o
jantar.
Por mais que eu tente, não consigo manter minha expressão
neutra. É impossível não deixar transparecer a agonia que me
consome quando olho para ela antes de virar as costas e sair da
cozinha. Gaia percebe minha aflição, porque vejo em seu rosto o
mesmo desconforto. Hoje, cruzar a porta da cozinha para a sala é a
mesma coisa que transpor a linha que separa nossas realidades.
Uma que não deveria existir.
Gaia não só pode, como deve estar ao meu lado daqui para a
frente. E não existe nada de mundos diferentes. Nosso lugar é o
mesmo. Agora, só preciso encontrar um modo de fazer com que ela
enxergue isso também.
“Parabéns, Zachary, sua obsessão por essa mulher já passou do
limite do aceitável”, uma vozinha soa na minha cabeça. Resolvo
ignorá-la, afinal, tudo é culpa da maldição dos King.
∞∞∞
— Pare de andar — Elijah pede pela terceira vez. — Você não
quer receber os convidados suado feito um porco.
— Não sabia que porcos suavam. — Olho para ele, que estica o
pescoço e vira a cabeça de lado, antes de começar a refletir sobre o
que acabei de falar.
— Essa expressão não faz sentido, Eli. Animais não suam —
Trenton me apoia no argumento. — É por isso que cachorros ficam
com a língua para fora. Também ouvi dizer que tem algo a ver com
as almofadinhas nas patas e…
— E agora vamos conversar sobre glândulas sudoríparas? —
interrompo-o, fazendo como Elijah pediu e me sentando ao seu lado
no sofá da sala.
— Melhor do que ficar tendo crise de ansiedade à toa — oferece.
— Não é à toa e você sabe bem disso. A IK está em uma
bifurcação agora. O resultado dessa reunião vai definir o caminho
que vamos tomar daqui para a frente.
Apoio os cotovelos nos joelhos e enterro o rosto nas mãos,
preocupado com a merda que estou prestes a fazer. Ou talvez já
tenha feito, porque deveria ter me preocupado com o futuro da IK no
dia que soquei Oliver Cooper. Mas é claro que ignorei minhas
responsabilidades e agredi o filho de um aliado no instante que vi
Gaia chorando. Não tenho culpa se meu instinto falou mais alto.
Também não me arrependo, e faria de novo dez vezes, se fosse
necessário.
Agora que estou aqui, prestes a tentar resolver a merda que fiz
ao minar as chances de fechar um contrato com o apoio de Damon
Cooper, não posso deixar o medo — nem a ansiedade — me
dominar. Meu pai não tem ideia do que estou planejando. Se eu
contasse, me diria para ficar quieto e deixar que ele mesmo
resolvesse o impasse. Só que não posso fazer isso; não quando o
peso da IK recairá sobre meus ombros em pouco tempo. Tenho que
provar a ele, e a todos os olhos em cima de mim, que posso
contornar os problemas enquanto defendo aquilo em que acredito.
— Você deveria se preocupar menos com esse contrato —
Trenton aconselha em um tom calmo, que me faz erguer a cabeça e
encará-lo. Quando o faço, vejo um sorriso triunfante em seu rosto. —
Somos os King, cara. Damon Cooper não é o único nome do
mercado. Se ele não quiser, tem quem queira. — Dá de ombros,
como se a declaração fosse a coisa mais simples do mundo.
É então que a ideia me vem.
Sim, somos os King. E isso, na maioria das vezes, é o bastante
para resolver qualquer merda. Afinal, o que um King quer, um King
tem.
— Interessante avaliação, Trent… — Coloco a cara de pôquer no
lugar, imaginando a melhor forma de fazer minha vontade ser feita.
Porém, antes que eu consiga falar qualquer outra coisa para os
meus primos, alguém bate na porta do escritório.
— Senhor King — uma mulher loira, que não deve ser muito mais
velha do que Gaia, coloca a cabeça para dentro —, seus convidados
estão subindo.
— Certo. — Levanto-me do sofá e fecho o paletó. Depois, ajeito a
gravata, vendo Trenton e Elijah imitarem os meus movimentos. —
Hora do show, rapazes.
— Ah, esqueci de dizer — Eli interrompe antes de chegarmos à
porta. — Fechei contrato com aquela banda de indie rock. Eles ainda
não são famosos, mas…
Olho para o meu primo, que apenas dá de ombros.
— Porra, Elijah! — Vou até ele, envolvendo-o em um abraço
rápido. — Parabéns.
Sei que meu primo tem se interessado cada vez mais pelo lado
musical da IK. Por isso ouvi-lo dizer que fechou seu primeiro contrato
me enche de orgulho.
— Espero que dê certo — ele diz, retribuindo o abraço.
— Já deu. Se você diz que são bons, então não há dúvidas. —
Afasto-me e ofereço uma piscadinha.
— Parabéns, meu irmão — é a vez de Trenton cumprimentá-lo
pela conquista. — Depois você conta os detalhes, porque agora
temos um outro contrato para fechar.
— Certo… — Elijah retoma a postura, assim como eu.
Saio do escritório fingindo não estar nervoso, muito menos com
medo do que o resultado desta transação possa significar para o
futuro da empresa. Também tento não pensar em Gaia e no que
teremos que enfrentar quando as pessoas souberem que o próximo
CEO das Indústrias King está em um relacionamento com uma
cozinheira.
A sorte foi lançada.
Se a maldição dos King existe e quer que Gaia e eu fiquemos
juntos, então preciso de uma ajudinha. Darei o meu melhor para
trazer Damon Cooper para o nosso lado do jogo. Se ele aceitar,
convencerei Gaia a ser minha. Sem reservas. Sem ficarmos nos
escondendo.
É por isso que, quando entro na sala e vejo quatro homens
cruzando a porta, meus passos carregam mais determinação do que
o normal. Meu futuro está em cada gesto e decisão que tomarei hoje.
— Damon — cumprimento com mais animação do que realmente
sinto, indo até ele com a palma estendida —, obrigado por ter
aceitado o meu convite.
O homem que lidera o grupo aperta a minha mão, porém não há
qualquer alegria em seu rosto, apenas a curiosidade de um
empresário experiente. Confesso que sinto um certo alívio ao ver que
ele não foi burro o bastante a ponto de trazer Oliver até aqui para
tentar forçar uma reaproximação entre nós.
— Zachary — diz com calma, revezando olhares entre mim e
meus primos —, confesso que seu convite foi um tanto inesperado.
— Não sei por quê. — Finjo indiferença. — Temos vários
assuntos a tratar, e você sabe muito bem disso. Por favor, entre e
fique à vontade.
Gesticulo para a sala, deixando que ele passe na frente do grupo.
Cumprimento cada um dos homens que vem atrás, oferecendo a
minha melhor cara de anfitrião — aquela que aprendi com mamãe
—, apresentando Trenton e Elijah. Aproveito e aceno para a moça
loira, indicando que ela pode começar a servir algumas bebidas.
— Antes de entrarmos nos assuntos que os trouxeram aqui,
Damon, eu gostaria de dar uma palavrinha com você, a sós. — Viro-
me para os demais convidados antes mesmo de obter minha
resposta. — Tenho certeza de que meus primos conseguirão manter
os senhores entretidos por alguns breves minutos.
A sala se enche de risos forçados, inclusive de Elijah e Trenton,
que me olham sem saber ao certo o que estou fazendo. Apenas dou
uma piscadinha para que confiem em mim. Sei que nem precisava
pedir, a confiança é mútua. Fomos criados para isso. Nós nos
apoiamos sempre, não importam as circunstâncias.
— Claro, Zachary — Damon concorda com certa desconfiança.
Mantenho a postura reta enquanto levo-o até a porta de madeira
escura do escritório. Assim que a fecho atrás de mim e sei que
estamos a sós, decido não prolongar a agonia. atacando o problema
de uma vez.
— Vou direto ao ponto, Damon. — Posiciono-me atrás da mesa,
indicando a cadeira do outro lado para que ele se sente. Porém, não
tomo o lugar, mantendo-me de pé enquanto apoio os punhos no
tampo e chego o corpo um pouco para a frente. — Você deve ter
ouvido falar sobre o que aconteceu entre mim e seu filho.
Apenas vejo-o menear a cabeça em afirmativa enquanto se
recosta na cadeira e cruza as pernas. Com os dedos entrelaçados na
frente da barriga, penso se esta sua postura falsamente relaxada é
uma forma de se mostrar indiferente ao comentário. Entretanto, pelo
que conheço do modo protetor como lida com sua família, sei que
Damon está me avaliando.
— Foi por isso que me chamou aqui? Para se desculpar por ter
batido em Ollie? — ele pergunta, erguendo uma sobrancelha.
— Só peço desculpas quando cometo erros. — Às vezes nem
assim. — Achei melhor esclarecer as coisas para que você não
tivesse uma visão deturpada do que aconteceu, já que não estava lá
para presenciar a cena.
— Pelo que soube, você também não estava presente quando a
empregada da casa assediou o meu filho — Damon ataca e acabo
sorrindo. Um gesto carregado de raiva, porque é a única forma que
tenho de não socar a cara dele também.
— Não precisei estar lá, porque os homens da minha família
estavam e disseram o que aconteceu. Inclusive, dois deles estão na
sala agora e podem provar que o assédio foi cometido por Oliver. —
Mantenho meu olhar preso ao dele, sem desviar por um segundo.
Damon o sustenta, como a boa raposa velha que é. — É a palavra
do seu filho, um rapaz de histórico complicado, contra a nossa. Se eu
fosse você, escolheria muito bem em quem acreditar, Cooper, porque
você não vai querer estar contra os King. Principalmente agora, que
decidimos entrar em Hollywood de vez.
Meu blefe é calculado. A expressão fria em meu rosto também.
Ainda não sei se vamos investir muitas fichas no mercado
cinematográfico, quando temos muito a conquistar no universo dos
streamings. Nossa plataforma será lançada em alguns meses,
mesmo que ninguém saiba disso, porém estamos apenas
expandindo nossos horizontes. Com Damon ao nosso lado, a
ascensão dos King no cinema pode juntar esses dois objetivos da
melhor forma possível — e é por isso que não posso desistir dele
agora. Não quando estamos tão perto deste acordo.
Sei que esse é um sonho antigo de meu pai, que vinha plantando
isso há anos, aos poucos, sendo sutil. Quando tudo estava pronto
para ser realizado, fui lá e arruinei suas chances com um soco.
— Por que você está defendendo tanto essa empregada, garoto?
— ele quer saber. O homem perdeu um pouco da segurança ao ouvir
meus planos. As mãos que seguram o braço da cadeira é mostra
disso.
Diferente de seu filho, Damon Cooper não é burro.
— Não tem nada a ver com ela — minto da melhor forma que
consigo. — Tem a ver com você e com o contrato que quero firmar
com o estúdio. Sabe, Damon — chego o corpo para trás, assumindo
toda a minha altura e olhando de cima para ele —, eram três da
tarde e o seu filho já estava chapado de cocaína. Bêbado. E
assediando mulheres. Em um evento de família. Creio que é melhor
você colocar uma coleira naquele moleque, porque não queremos
que ele atrapalhe os nossos negócios daqui para a frente. —
Resolvo que está na hora de inverter a jogada e partir para o ataque.
— Estamos empolgados em fechar essa parceria, mas não
queremos nosso nome manchado por Oliver Cooper. Espero que
você entenda. — Enfio as mãos no bolso e ofereço meu melhor
sorriso. — Todo mundo quer um King ao seu lado, mas quem vai te
querer se o seu filho é um risco grande demais para a reputação do
negócio em vista?
Por vários segundos, Damon apenas me encara, como se não
acreditasse no que acabou de ouvir. Os nós dos dedos brancos
indicam seu estado de espírito. Só não sei se ele quer matar a mim
ou ao filho.
Talvez Damon não pensou em me levar a sério por nunca
acreditar que eu fosse capaz de abandonar meus dias de
vagabundagem. Talvez nunca tenha achado que eu pudesse ser o
homem à frente da IK. De qualquer forma, estava errado. Enquanto
Ollie manteve seus hábitos de merda, eu cresci.
— Eu te chamei aqui para que nós dois pudéssemos colocar
aquele… incidente para trás. Afinal, sei que as atitudes de Oliver não
devem manchar a sua reputação. — Ofereço o ramo de oliveira
como uma saída diplomática. — Apresentaremos a nossa proposta
para a diretoria e, se vocês tiverem interesse, ficaremos felizes em
nos considerarmos seus parceiros daqui para a frente. — Damon me
encara, ainda sem reação. Ótimo, era isso o que eu queria. — Agora,
que tal um jantar? Chamei uma das melhores chefs da cidade para
cozinhar especialmente para vocês.
Não digo a ele que a chef é a mesma mulher que seu filho
assediou, muito menos que estamos envolvidos. Isso será uma
surpresa no momento apropriado. Por enquanto, limito-me a apontar
para a porta e dou esta conversa por encerrada.
O que acontecer nas próximas horas será decisivo — tanto para
a IK, quanto para mim e Gaia.
Capítulo 37
Gaia
PAREM TUDO!
Zachary King é visto com ruiva misteriosa!
Quem é ela? Por que estava no conversível com ele? E, antes de
mais nada, POR QUE OS DOIS ESTAVAM SE BEIJANDO?
Sim, meus amigos, se beijando! Em plena sexta-feira de manhã!
Estou em choque!
De onde essa mulher apareceu e por que ninguém ouviu falar
dela antes? Pedi ajuda ao FBI, mas acabei eu mesma investigando
as redes sociais do nosso King. O problema é que não a encontrei. E
se você procurar por aí, não vai achar nada sobre a ruiva misteriosa.
Nenhum site, jornal, rede social conseguiu identificar o novo
interesse de Zachary King.
Estamos todos surtando!
O alvoroço é tanto que quase esqueci de mencionar o vexame
que Oliver Cooper deu durante a semana. Na quinta-feira à noite, ele
foi a um restaurante, onde ficou bêbado, começou a gritar com
outros clientes e, no fim, ainda se recusou a pagar a conta. Disseram
que copos e pratos foram quebrados. Depois disso, o filhinho de
papai foi levado para a delegacia.
Mas nada disso importa. O que todos querem saber é: quem era
a ruiva sortuda beijando Zachary King?
Capítulo 38
Zachary
∞∞∞
Há cinco minutos, Gaia não para de ser envolvida por abraços.
Minha mãe é uma que não consegue manter as mãos longe dela,
revezando entre as demais pessoas, como se não conseguisse
acreditar na novidade que contamos. Pelo menos aquela
preocupação de “não seremos aceitos” deixou de existir. Só estou
com medo de ela ser aceita demais, porque a coitada quase não
consegue respirar.
— Se vocês não pararem com isso, a Gaia vai acabar fugindo
desta casa. E a culpa, por incrível que pareça, não será minha —
ameaço, olhando para minha mãe, que a puxa para outro abraço.
— Mas é que eu estou tão feliz, meu filho… — ela diz, a
bochecha colada com a de Gaia enquanto sorri feito criança no
Natal. — Nunca pensei que esse dia fosse chegar.
Reviro os olhos, odiando admitir que compartilho o pensamento.
— Zachary tem razão, Monica — meu pai intervém, puxando-a
pelo braço e trazendo-a para o seu lado. — Deixe a menina respirar.
Só que ele também parece bem animado, tanto que beija a
têmpora de sua esposa enquanto dá um aceno para mim. Ofereço a
mão para Gaia, que aceita sem hesitar e vem para o meu lado, como
se quisesse fugir da loucura.
— Eu disse que não teria problema — falo baixinho, passando o
braço em torno de seus ombros.
— Mas não imaginei que seria… isso tudo. — O rosto dela deixa
claro o espanto. Não consigo conter o sorriso, ao mesmo tempo que
sinto vários pares de olhos sobre nós.
— Bem-vinda à família. — Ignorando todo mundo, dou uma
piscadinha e Gaia fica vermelha. — Com a gente, nada segue os
padrões normais.
— Percebi.
— Precisamos de uma festa! — mamãe solta em um grito,
fazendo com que todos na sala de jantar olhem para ela. — Sim,
para exibir a namorada do meu filho para o mundo. Ah, já posso até
ver a cara daquelas insuportáveis do clube. Qual é mesmo o nome
da bruxa, Angela? — Ela estala os dedos algumas vezes, tentando
se lembrar.
— A Gillian? Ou a Amelia? — minha tia oferece.
— As duas! — Mamãe gargalha de forma quase maligna. — Elas
estão querendo colocar as garrinhas em Zachary há anos. Tive que
fazer malabarismos para proteger o meu garoto, lembram?
Troco olhares com meus primos, que parecem mais assustados
do que eu com o rumo que as coisas tomaram nos últimos minutos.
Trenton é o mais espantado, tanto que mal tocou em seu café da
manhã. Ele sabe, melhor do que ninguém, que a pressão de
sossegar recairá sobre ele, agora que eu parei com meus dias de
putaria.
Puxo Gaia para mais perto e sinto seu corpo gelado junto ao
meu.
— Só ignora que é mais fácil — sussurro para que só nós
escutemos.
A resposta dela é me encarar, com pânico estampado em seus
olhos. Tenho vontade de rir, mas sei que, em breve, a minha ruiva irá
se acostumar com o jeito extravagante desta família.
— Achei uma excelente ideia, Monica — tia Leah concorda —,
mas precisamos pensar na desculpa perfeita. Isso ainda não é uma
festa de noivado. Não queremos deixar a Gaia encabulada.
— Como se eu já não estivesse… — a mulher abraçada a mim
murmura, apertando as minhas costas enquanto tenta manter a
postura firme. Não resisto e deixo um beijo no topo de sua cabeça,
adorando vê-la manter a pose. Sei que, por dentro, ela deve estar
morrendo de medo.
— Não precisamos de uma festa, mãe — tento argumentar para
salvar Gaia, porém sou ignorado.
— Christine, o que você acha? Consegue fazer algum evento
amanhã, na hora do almoço?
Os olhos de Gaia triplicam de tamanho. Na mesma hora, sei que
preciso retomar o controle da situação.
— Chega! — solto em um grito. — Sem festa! Sem loucura!
Senão a gente se casa amanhã e nenhuma de vocês estará
convidada.
Evito olhar para baixo e ver como Gaia reage ao comentário.
Provavelmente deve estar pronta para sair correndo daqui. Sei que
minha mãe e tias estão com os olhos arregalados, só não sei se
assustadas com a minha explosão ou com o fato de que usei a
palavra com “c”.
Escuto meus primos rirem baixinho, mas finjo que não percebo e
continuo mantendo meu olhar sobre as loucas. As mulheres King
ficam estáticas por alguns segundos, sem conseguir acreditar na
minha ameaça. Como não suavizo o olhar, elas percebem que há um
fundo de verdade no que falo. Por fim, acabam cedendo e apenas
assentem com a cabeça.
— Sem festa — mamãe concorda —, mas adoraria fazer um
almoço para os nossos amigos mais próximos no fim de semana que
vem.
— Se a Gaia não se incomodar… — Dou de ombros e olho para
ela, que continua com o rosto vermelho de vergonha.
Porém, em vez de se esconder atrás de mim, ela dá um passo à
frente.
— Não me incomodo com um almoço para alguns amigos, mas
queria deixar uma coisa bem clara, Monica. — Reveza olhares entre
mim e minha mãe. Neste momento, sei o que está prestes a dizer.
Por isso, apenas balanço a cabeça em afirmativa, a encorajando a
seguir em frente. — Eu vim para esta casa com o propósito de
trabalhar, e é muito importante para mim que isso não mude. Seu
filho e eu… — Gaia hesita, virando-se para mim e me oferecendo um
sorriso tímido — …espero que o nosso relacionamento tenha um
futuro, de verdade. Só que não nasci para viver à sombra de um
homem, e o que eu quero conquistar independe dele. Então, se
vocês não se importarem, continuarei cozinhando durante as
próximas semanas, até meu contrato acabar.
É neste momento que escolho olhar para o meu pai, e sua
expressão diz tudo o que queria saber quando estávamos no
escritório: com o peito estufado e os olhos brilhando, o orgulho
estampa seu rosto. Ele também me encara, agora com firmeza,
acenando com a cabeça. Um único movimento, quase imperceptível,
mas o suficiente para me dizer que aprova a mulher que escolhi.
— Sabe, Gaia — tio Wally começa a falar —, tem duas coisas
que levamos muito a sério nesta vida: a família e o trabalho. Então,
querida, fique à vontade para agir da forma que achar correta.
— Querer conquistar os próprios sonhos através do trabalho é
uma virtude. Só que eu tenho uma condição para esse namoro. —
Meu pai interrompe os sorrisos. — De agora em diante, não sou
apenas o velho que paga o seu salário, mocinha. Ou seja, você vai
ter que me chamar de Harvey.
Capítulo 39
Gaia
Gaia
Gaia
Zachary
Gaia
Desde domingo à noite, não tenho nada para fazer, por isso
estou sentada aqui, vendo Julian cuidar do jardim, sem pressa.
Também não tenho ânimo para cozinhar, nem disposição para ajudar
Martha com receitas novas. Minha cabeça é um turbilhão de
pensamentos, sempre imaginando o que vai acontecer se Oliver
cumprir com sua promessa.
Fiz o que ele pediu e mantive a boca fechada, mesmo tendo que
mentir para Zachary. Ou melhor, omitir. Eu estava pronta para contar
a verdade e explicar sobre o tipo de relacionamento que tive com
Jamie, só que não consegui.
Como Zach precisou voltar a Manhattan, achei melhor usar os
dias em que ficaríamos afastados para pôr minha cabeça em ordem.
Talvez encontrar uma forma de dizer tudo sem atrapalhar os planos
de Oliver. Porque, no fim das contas, era isso o que ele estava
pedindo: que Zachary aceitasse a Red Law na King Records.
Nesse meio tempo, percebi que não posso manter meu
namorado no escuro. Não se eu quiser que as coisas entre nós
continuem bem. Os últimos dias foram complicados demais,
simplesmente porque não sou capaz de esconder o que sinto. A
cada mensagem que Zach me manda, tenho vontade de contar toda
a verdade, mas preciso fazer isso pessoalmente para que não haja
nenhum mal-entendido. Já demorei demais para fazer o certo.
— Gaia! — Olho para o lado e vejo Valerie correndo até mim. De
novo, ela tem o celular nas mãos e uma expressão de conflito no
rosto. Sempre que isso acontece é sinal de más notícias.
“De novo não”, é o que penso antes de ela se aproximar.
— O que foi desta vez? — pergunto, controlando a tensão que
começa a se formar dentro de mim.
— Você não vai acreditar… — ela sussurra, revezando olhares
entre mim e o jardineiro. — Vem comigo. — Val segura a minha mão
e começa a me puxar em direção à casa.
Vou atrás dela aos trancos e barrancos, mesmo que minha
vontade seja de ir na direção oposta. Quero me esconder em algum
canto onde não haja fofocas a meu respeito nem pessoas que
querem saber da minha vida.
Desde que Zachary e eu paramos de esconder nosso
relacionamento, vários sites de fofoca têm noticiado coisas sobre
mim. Faço o melhor para ignorar, até porque as informações não têm
importância. Ninguém sabe muito a meu respeito, simplesmente
porque não há muito o que saber. Na primeira semana, foram só as
fotos de nós dois no carro, enquanto vínhamos para cá. É claro que
as imagens acompanhavam várias perguntas de “Quem é a mulher
misteriosa?” e “Será que Zachary King está namorando?”. Mas,
desde domingo, as coisas mudaram de tom.
Como Monica havia previsto, notícias de quem eu sou
começaram a aparecer, além de fotos minhas com Zach na festa,
abraçados, dançando, conversando e nos beijando. Algumas fontes
anônimas — ou seja, os convidados que não quiseram ter seus
nomes revelados — disseram que eu era uma garota comum. Outras
sugeriram que eu só tinha me aproximado dos King por interesse,
para alavancar a minha carreira. Independente do que diziam, em
todos os veículos havia uma verdade: Zachary King estava
namorando a cozinheira da casa de férias.
Só que pelo modo como Valerie me puxa, sei que a notícia da
vez carrega muito mais do que simples fatos. Sua mão está suada,
como se ela também estivesse aflita. E isso só piora o meu estado
de nervosismo.
— Val, por favor — digo assim que ela fecha a porta do meu
quarto —, me conte o que aconteceu.
— Ah, Gaia… deu merda. Merda das grandes. — Ela me
encara, mas não por muito tempo, porque logo começa a andar de
um lado para o outro do cômodo.
— Do que você está falando? — pergunto, mas na mesma hora
minha mente volta para a ameaça de Oliver.
Será que ele jogou alguma coisa do meu passado na internet?
Será que tem minhas fotos íntimas rolando nas redes?
— Estou falando do seu relacionamento com Jamie Lawrence —
Val solta a bomba. — O The New York Post anunciou que você e ele
namoraram. Está na Página Seis! A matéria saiu perto da hora do
almoço, mas só vi agora. Estava ocupada arrumando a casa. Só que
isso nem é o pior… — ela hesita, olhando de mim para o aparelho
em suas mãos.
Por um momento, fico com medo do que vou ouvir. Só que o
acúmulo dos últimos dias já me deixou anestesiada. Além disso,
essa era a informação que Oliver não queria que vazasse, então não
deve ter sido ele a passar a dica para a imprensa. Oliver parece ser
do tipo ganancioso, não burro.
— Fala logo, por favor — peço, sentando-me na beirada da
cama para receber o impacto.
— Estão dizendo que você e Jamie armaram tudo. Que o seu
envolvimento com Zachary é uma farsa para ajudar na carreira do
seu ex.
Minha primeira reação é rir. Rir de desespero, pois não há
espaço para humor dentro de mim. Só de pensar na possibilidade de
eu fazer qualquer coisa para ajudar Jamie a se dar bem na vida,
sinto vontade de vomitar. Porque não há hipótese mais ridícula neste
mundo.
— É sério isso?
— Seríssimo. Disseram também que vocês ainda estão juntos e
que seu namoro com Zachary é fachada — Val acrescenta.
— Claro que sim. Por que não seria? — Apoio as mãos ao lado
do corpo e abaixo a cabeça, encarando o chão.
Bem que Zachary avisou que a imprensa publicaria qualquer
coisa para ganhar dinheiro às custas dos King.
— Mas, Gaia… — Valerie chama e acabo olhando para ela. —
Se fosse só um site de fofoca qualquer, eu também teria ignorado.
Mas quem publicou esse artigo foi o The New York Post, e eles têm
uma certa credibilidade. Não dariam a informação sem verificar a
fonte. Ainda mais na página de mais destaque.
— Tá bom… Só que nada disso é verdade, Val. É só um bando
de mentiras — defendo-me.
— Eu sei, querida. Mas será que os King sabem?
A pergunta dela é o último prego no meu caixão. Porque, mais
do que a opinião dos King, o que me preocupa são as
consequências deste artigo. Afinal, se a família acreditar nele, pode
quebrar o contrato com a Red Law. Se isso acontecer, Oliver irá
vazar qualquer informação que possa ter a meu respeito, o que vai
gerar um escândalo ainda pior. Isso tudo é uma maldita bola de
neve. Agora, preciso descobrir exatamente o que esse filho da mãe
tem contra mim — e me preparar para a catástrofe.
Merda!
Quando foi que minha vida virou esse caos completo?
“No dia que você assumiu estar apaixonada por Zachary King”,
uma voz responde dentro da minha cabeça. Por mais que eu tente
ignorá-la, é impossível.
Antes dele, tudo era mais fácil: não tinha fofocas a meu respeito,
ninguém me ameaçava, meu ex-namorado estava vivendo em um
canto qualquer… Mas assim que Zach entrou na minha vida, as
coisas viraram de cabeça para baixo — em todos os sentidos. Mais
uma vez, parei de pensar apenas em mim e no que eu queria
conquistar. Abaixei a guarda. Cedi.
Agora, estou aqui, com pessoas me chamando de tudo o que
têm direito, enquanto preciso me preocupar em ter vídeos meus
vazados — e eu nem sei o conteúdo deles.
Suspiro, lembrando-me do conselho que recebi da coronel e de
Monica. Eu deveria ter ouvido quando tive a chance e ficado longe
de Zachary King.
Por outro lado, eu não teria a chance de ficar com ele.
— O que você vai fazer a respeito disso tudo, Gaia? — Valerie
pergunta, sentando-se ao meu lado na cama.
— Sinceramente? Não sei. Não faço a menor ideia. A impressão
que tenho é de que estou vivendo um pesadelo nos últimos dias e
não consigo acordar.
Semana passada, tudo era um sonho. Estar nos braços dele.
Ser beijada e tratada como uma princesa pela primeira vez na vida…
Só que as coisas saíram do controle em um piscar de olhos.
— Preciso falar com Zachary — aviso à Val. — Explicar a ele
que isso não passa de um grande mal-entendido. Talvez provar que
não fazia ideia do contrato da Red Law. Não sei…
— Acho que é uma boa ideia — minha amiga concorda,
tomando minha mão na sua e apertando-a em um sinal de apoio. —
Ligue para ele e avise que precisam conversar. Zachary vai acreditar
em você.
— Espero que sim.
Porque não sei o que vou fazer caso ele escolha a verdade do
artigo. Principalmente depois de todo aquele discurso durante a
festa.
Jackson tinha razão quando disse que esconder meu namoro
com Jamie daria merda. Maldito Oliver! Ele precisava ter aparecido
logo naquela hora? Cinco minutos depois e nada disso estaria
acontecendo.
— Hmmm, Gaia? — Valerie me chama, seu tom ainda mais
preocupado do que antes. — Você vai querer ver isso.
Olho para o lado e vejo-a encarar o aparelho nas mãos com a
boca escancarada.
— O que foi?
— Puta merda! — ela diz, sem desviar o foco do celular. — Puta
merda, puta merda! — repete, os olhos ficando cada vez mais
arregalados.
Consigo ouvir uma música tocando e várias risadas, além de
uma voz rouca:
Agora tira a blusa, amor!
Meu coração acelera na hora, porque eu sei o que vou ver.
Chego o corpo para o lado, olhando por cima do ombro de Valerie.
Na tela do celular, está o meu maior pesadelo: eu mesma.
Dançando, rindo, completamente bêbada em cima de uma
mesa. Quase não dá para ver meu rosto, de tanta fumaça que há na
pequena sala do apartamento de Jamie. Só que tudo no vídeo é
reconhecível para mim. E pela posição que ele é gravado, sei que
meu ex-namorado está sentado no sofá, enquanto danço na mesinha
de centro. Como a idiota que fui, é claro que faço o que ele pede e
tiro a blusa, ficando apenas de saia jeans e um sutiã preto, que já
tinha visto dias melhores. Meu cabelo está uma zona. Minha pele
parece macilenta.
A Gaia do vídeo não se parece em nada com a mulher que sou
hoje.
“É isso aí!”, os outros integrantes da banda vibram quando me
veem só de sutiã. Eu não paro de me balançar, uma garrafa de
vodca na mão e um cigarro aceso na outra. Trevor está tocando
guitarra em um canto, Justin batuca no braço da poltrona, porém não
dá para ver seus rostos. A câmera muda de foco e ouço Jamie
fungar. Sei que deve estar cheirando, apesar de não conseguir ver
na imagem, que logo volta para mim.
“Agora tira a saia!”, Justin pede e Jamie solta uma risada alta,
apoiando o amigo. Coloco o cigarro na boca antes de levar uma mão
ao botão na cintura.
Abaixo a cabeça, sem querer assistir à minha própria desgraça.
E o pior de tudo é que nem me lembro desse dia. Algo assim deve
ter acontecido milhões de vezes quando eu e Jamie estávamos
juntos, simplesmente porque eu fazia tudo o que ele me pedia.
Mesmo me humilhar para seus amigos.
— Pare, por favor. — Aperto com força a mão de Valerie, que
interrompe o vídeo.
Não consigo encará-la, meu rosto queimando com a vergonha.
— Acabou de sair no TMZ — ela diz baixinho. — Tem algumas
fotos também.
Val coloca o celular na minha frente, mostrando cada uma das
imagens. Em todas meu estado é pior: deitada no sofá, usando
lingerie, sempre bêbada ou beijando Jamie…
— Meu Deus. — Meu estômago se revira, ao mesmo tempo que
me esforço para não sair correndo deste lugar.
— Pense pelo lado positivo: quase não dá para te reconhecer —
Val comenta, afagando minhas costas.
Só que isso não é o suficiente para me acalmar agora. Nada é,
porque Oliver cumpriu a promessa. Ou talvez nem tenha sido ele.
Não sei o que pensar, muito menos o que fazer.
O que será que os King estão achando de mim?
O que será que Zachary está achando?
Enfio o rosto nas mãos e começo a chorar de desespero,
sentindo o peso dos meus atos voltarem com tudo. Mais do que isso,
sinto a humilhação correr em minhas veias, sabendo que tudo isso
foi por conta de um homem que nunca mereceu os meus
sentimentos.
Jurei a mim mesma, quando me livrei daquele inferno, que
jamais cometeria esse erro de novo, e olha onde estou agora: minha
vida foi virada de cabeça para baixo por conta de Zachary King. Eu
nunca deveria ter me envolvido com ele. Se tivesse mantido as
pernas fechadas e o coração trancado a sete chaves, meu passado
teria ficado quieto.
Eu tentei resistir, juro que sim, mas algo sempre me puxou em
direção a ele — e fui incapaz de me controlar. Acabei me
entregando, me permitindo sentir de novo. Tudo para ver minha vida
ir por água abaixo.
Agora, eu deveria estar preocupada com as consequências
desse vídeo vazado, mas só consigo pensar nele. Em como Zachary
deve estar se sentindo traído, em como deve estar me odiando.
Porque eu sou uma idiota mesmo.
Enquanto o mundo cai em ruínas ao meu redor, o único pilar que
preciso para me manter de pé é ele. E não entendo o porquê! Essa
obsessão toda que tenho por Zachary King não faz o menor sentido.
Sei que amor deixa a gente meio estúpida, mas o que sinto vai além
disso. É como se eu precisasse dele para viver.
— Gaia — Val cutuca a minha perna —, chegou uma mensagem
no seu celular. — Ela aponta para a mesinha de cabeceira, onde o
meu aparelho ficou esquecido o dia inteiro.
Um fio de esperança surge dentro de mim. Talvez Zachary
esteja tentando me ligar para saber se estou bem. Desta vez, irei
responder da forma como ele merece. Porém, quando vejo que a
mensagem na tela não é dele, meu coração acelera ainda mais. E ao
notar que é de um número desconhecido, fico com medo de clicar.
Era sobre esse tipo de segredo que eu estava falando. Você
tem ideia do que causou quando não me contou a verdade? Eu
te dei todas as chances de ser sincera, Gaia. Agora, estamos no
meio de um furacão, tentando controlar os danos que esses
vídeos e fotos vão causar. Nos falamos mais tarde. MK.
Zachary
Gaia
— Tem certeza de que você quer ouvir? Meu passado é algo que
eu preferia deixar para lá, Zachary. Não é uma história bonita —
aviso, antes que ele se arrependa.
Ou talvez eu me arrependa, porque ainda não sei se tenho
coragem de ver a cara de decepção dele quando souber tudo o que
fui capaz de fazer.
— Quero saber. Você deveria ter me contado antes, Gaia.
— Assim como você deveria ter me contado da maldição? —
devolvo, cansada de ser posta contra a parede. Os últimos dias
foram difíceis demais.
Tudo o que ouvi, tudo o que foi dito…
— Não comece com esse jogo de rebater minhas perguntas com
outras, por favor. Se quiser descontar suas frustrações, volte a chutar
o carro — ele fala com um sorriso debochado. Vendo que não
amoleço, Zachary suspira e passa a mão no cabelo. — Tudo bem,
nós dois estamos irritados com o mundo. Só que agora preciso
entender tudo o que aconteceu desde aquela festa.
Puxo o ar com força, debatendo internamente o que fazer agora.
Por um lado, Zach está certo: ele merece saber cada detalhe da
verdade. Por outro, eu também mereço um pouco mais de
explicações.
O problema é que meu coração amoleceu depois que ele se
declarou, deixando bem claro que me ama.
Ele disse as palavras que esperei ouvir durante as últimas
semanas e, mesmo assim, continuo duvidando de tudo. Claro que,
estar com ele aqui, de novo ao meu alcance, faz com que muitas das
dúvidas desapareçam.
Eu amo e odeio esse efeito que Zachary causa em mim: quando
estamos juntos, nada mais importa. Quando estamos longe, todas as
minhas inquietações aparecem. Porém, se quero uma chance real de
estar com ele, preciso tomar a iniciativa e revelar aquilo que mantive
preso dentro de mim por tanto tempo. Mais do que isso, preciso
mostrar um lado meu que preferia deixar escondido: a minha
vulnerabilidade.
— Eu tinha dezoito, quase dezenove anos quando me mudei para
Nova York — começo a contar, tentando manter um pouco de
firmeza na voz. Mesmo que tenha decidido falar, não consigo encará-
lo enquanto faço isso. — Tinha acabado a escola e fui morar com a
Pamela. Ela é a filha de uma amiga da minha mãe, e já estava na
cidade há um tempo.
Afasto-me de Zachary e volto a me recostar no carro. Preciso
manter um pouco de distância entre nós se quiser ter lucidez
suficiente neste momento. Assim que me apoio na lataria, ele vem
para o meu lado, enlaçando a sua mão junto à minha, como se
quisesse demonstrar apoio.
Maldito homem maravilhoso.
— Foi através da Pamela que conheci Jamie. Eles não eram
próximos, mas tinham alguns amigos em comum. Um dia, ela me
levou a um barzinho, onde a banda estava tocando. Vou pular os
detalhes sórdidos, mas posso dizer que fiquei… deslumbrada —
confesso, os olhos ainda grudados nas pedrinhas espalhadas pelo
chão. — Jamie era lindo, popular e estava interessado em mim, que
nunca fui mais do que uma garota comum do interior. Enquanto isso,
todas as meninas se jogavam em cima dele. O vocalista da Red Law,
com uma voz perfeita, jaqueta de couro e muitas tatuagens. —
Balanço a cabeça, me sentindo uma idiota. — Não demorou muito
para começarmos a namorar.
Conto que, durante alguns meses, Jamie fez questão de me
buscar em casa todos os dias antes dos shows. Ele me tratava como
uma princesa, nunca ficava com outra menina, me dava flores e fazia
de tudo para conseguir a minha atenção. No fim, acabei cedendo e
concordei em ir a um encontro com ele.
— Eu estava cursando gastronomia na época — explico —, por
isso ele fez questão de me buscar depois da aula e me levou para
jantar em um restaurante bem legal. Aos poucos, as coisas foram
evoluindo… e mudando.
Sinto a mão de Zachary apertar a minha. Ele já sabe que a
história não tem um final feliz. Preciso respirar fundo algumas vezes
para não deixar as lembranças me sobrecarregarem.
— Ele foi abusivo com você, Gaia? — Incentivado pelo meu
silêncio, Zachary solta a mesma pergunta que já me fiz duzentas
vezes. Nunca consegui encontrar uma resposta certa para isso.
— Não sei — limito-me a dizer, mesmo que pareça um tanto
louca. — Hoje em dia consigo enxergar Jamie como um narcisista.
Claro que não sou psiquiatra para confirmar o diagnóstico, mas
talvez não seja exatamente isso o que ele é. Só que tinham mais
coisas de errado com ele. No início, fez de tudo para me conquistar
e, no momento que conseguiu e o desafio acabou, o foco do seu
interesse também mudou. Jamie começou a ter prazer em me
manipular. O mundo começava e terminava nos desejos dele. Era
tudo sobre ele. Os sonhos dele. O que ele queria fazer. E eu era uma
menina cega, apaixonada, que se deixou levar. Aquele vídeo que
você viu… — hesito, sentindo um bolo de humilhação se formar em
minha garganta.
— Ei, está tudo bem. — Zachary me sente tensionar e passa o
braço em torno do meu ombro, me puxando para perto. Não resisto e
vou na mesma hora, aninhando-me em seu peito, simplesmente
porque preciso do seu calor agora. Lembrar-me daquele tempo, e de
como tudo mexeu comigo, faz com que eu me sinta nua, sendo
julgada por uma multidão. Por isso, tê-lo aqui é como se houvesse
uma âncora garantindo minha permanência na realidade.
— Jamie sempre foi muito carismático. Era fácil demais ficar
envolvida por ele e por aquele mundo de fantasia que criou. Cada
vez mais, eu queria fazer parte daquilo. E ele me mostrava, todos os
dias, como eu era sortuda por ser sua escolhida. Afinal, tinham
tantas outras esperando a oportunidade.
A ironia do comentário não me passa despercebido. Zachary
tinha tudo para ser igualzinho a Jamie. Só que isso não pode estar
mais longe da verdade. Acho que nunca conheci duas pessoas tão
diferentes, mesmo que as circunstâncias sejam parecidas. Enquanto
Jamie sempre quis ser alguma coisa — e usava do seu carisma para
se consolidar —, Zachary não precisa fazer nada para que as
pessoas queiram estar perto dele.
— Foi por isso que você resistiu a nós dois por tanto tempo, não
é? — ele pergunta, lendo meus pensamentos, enquanto acaricia as
minhas costas. Apenas assinto com a cabeça e repouso o rosto em
seu peito.
— Naquele tempo, eu larguei tudo para ficar com Jamie, inclusive
meu curso de gastronomia. Deixei de lado meus sonhos, minha vida
e a mim mesma. Estava tão envolvida que acabei ignorando o resto
do mundo. Na verdade, tornei ele o meu mundo… e só ele. Depois
que consegui me libertar de tudo isso, jurei para mim mesma que
nunca mais faria esse tipo de sacrifício por homem nenhum —
confesso. — Acho que, de certa forma, o Universo decidiu me punir.
Ou talvez tenha sido carma, mas, depois que terminamos, eu não
consegui mais juntar dinheiro para voltar ao curso. Precisei trabalhar
e acabei deixando os estudos de lado. Até voltei por um tempo, mas
tive que parar de novo. Sempre aparecia algo que me impedia de
alcançar meu sonho, sabe?
— O vídeo que vazou foi daquela época? — Zach pergunta.
— Hu-hum. Eu não sabia que ele existia, nem as fotos. Mas não
duvido que tenha feito algo assim. Eu queria fazer parte do mundo
dele. Se Jamie me pedisse para beber, eu bebia. Se me pedisse
para dançar, eu dançava. Tinha medo de que, se não fizesse isso,
ele me deixaria.
As palavras trazem um gosto ruim à minha boca. É difícil aceitar
quão burra fui durante todo esse tempo. Tem uma parte dessa
história toda que ainda não conseguirei contar a Zachary: Jamie foi
meu primeiro amor… e meu primeiro homem.
Dentro de mim, após a separação, a ideia de que eu jamais seria
amada de novo criou raízes, afinal, Jamie era tudo o que sempre
precisaria para ser feliz. Não consigo descrever o ódio que senti de
mim mesma quando tudo acabou. Na verdade, me senti um lixo.
Insignificante. Não digna de receber qualquer tipo de afeto, porque
eu não era boa o suficiente. Nem para mim mesma. Afinal, que tipo
de mulher se anula tanto por causa de um homem? Que tipo de
mulher abandona tudo para seguir os sonhos dos outros?
E até agora carrego um pouco desse trauma comigo.
— Quando foi que vocês terminaram? — Zachary questiona de
forma tranquila.
— Um pouco antes de fazermos dois anos. Quando eu descobri
que Jamie dormia com todas as suas fãs. A verdade jogada na
minha cara de que nunca fui especial, que ele não me amava,
acabou me destruindo. Tudo era um jogo — solto a verdade que
mais dói. Também aquela que me libertou.
— Ele era um idiota, Gaia. Um imbecil por ter te usado e não ter
percebido a mulher incrível que tinha ao lado. — Pressiono meu
corpo ao de Zachary, abraçando-o com força. Posso ouvir seu
coração batendo acelerado, e não sei se ele consegue sentir a
mesma raiva que eu neste momento.
Talvez ninguém consiga. Porque só vivendo aquela situação para
saber o quão horrível ela é. Se foi ou não um relacionamento
abusivo, não sei. Afinal, eu queria fazer as coisas para agradar, foi
minha decisão satisfazer os desejos do meu namorado. Jamie nunca
me ameaçou, me bateu, ou disse que eu era isso ou aquilo. Mas a
ideia de que ele me largasse me causava tanto medo, tanto pavor,
que eu estava disposta a qualquer coisa para não arriscar perdê-lo.
Só que, quando perdi, me libertei.
— No dia da festa, muitas coisas aconteceram — volto à história,
dando um passo para trás a fim de encarar Zachary. Paro bem à sua
frente, passando um dedo embaixo dos olhos e secando as lágrimas
que começaram a escorrer. — Primeiro, sua mãe me fez ouvir
comentários muito maldosos de algumas mulheres que não
conseguiam compreender como foi que você me escolheu. — Engulo
em seco, lembrando-me daquele momento que me fez ficar em
pânico. Mas como estamos na hora da verdade, resolvo colocar tudo
para fora. — Uma delas, inclusive, era Chloe Lowell.
— Eu sei — Zach diz, me surpreendendo. Quando ele vê minha
expressão espantada, completa: — Foi ela uma das fontes do artigo
do The Post.
— Mas como ela sabia sobre mim e Jamie?
— Não sei se sabia. Acho que só falou uma parte para a Página
Seis. O resto, eles buscaram sozinhos. — Faço que sim com a
cabeça. — Christine está furiosa. Minha mãe também. Você não tem
ideia do caos que foi esta tarde. — Ele coça a nuca e, pela primeira
vez, noto como seu rosto está cansado.
Os olhos verdes não carregam o mesmo brilho de sempre, talvez
por conta dos círculos escuros que começam a se formar sob eles.
Há também um vinco permanente entre as sobrancelhas. Até a
postura altiva não está tão ereta quanto normalmente.
Saber que sou a causadora disso tudo só me deixa ainda mais
culpada.
— Depois dos comentários humilhantes, voltei para a festa e dei
de cara com a banda no palco. E eu juro, Zach, juro que não sabia
que eles tinham sido contratados pela King Records. Desde o dia
que terminamos, nunca mais falei com Jamie. Por favor, acredite em
mim. Eu jamais teria ajudado qualquer um deles a…
— Eu sei, Gaia — Zachary me interrompe. — Depois de tudo o
que você me contou, não faria sentido você ajudar aqueles
desgraçados. Mas por que escondeu isso de mim?
— Não ia esconder. Só espero que entenda que, assim que vi a
banda tocando, fiquei em choque — confesso, lembrando-me do
susto que levei. — Jackson apareceu naquele momento e viu o meu
estado.
— E você conversou com ele em vez de ir atrás de mim? — Zach
solta uma risada sem qualquer humor, balançando a cabeça.
— Não foi bem assim — começo a me explicar. — Eu não
conseguia pensar direito. Foi um choque. Uma hora tinham mulheres
falando um mundo de coisas horríveis a meu respeito; em seguida,
sua mãe fez um puta discurso sobre ser cordial com quem só quer
nos ferrar, antes de me perguntar se eu guardava algum segredo
obscuro. Então, quando parecia que as humilhações tinham acabado
e eu estava disposta a correr para os seus braços, dei de cara com
meu passado. Eu fiquei paralisada! — desabafo, soltando tudo em
uma torrente sem qualquer contenção. — Jackson me achou e me
levou para um lugar onde ninguém mais me veria dar um vexame,
porque a sua mãe deixou claro que isso não é comportamento de um
King. Mas seu primo me incentivou a contar a verdade para você, e
eu concordei, mesmo relutante.
Zachary arregala os olhos, incrédulo, e começa a andar de um
lado para o outro.
— E você não pensou em me contar a verdade. Por quê?
— Eu só não queria contar no meio da festa! — falo em um tom
elevado. — Até expliquei isso para o Jackson: que iria falar quando
todos fossem embora. Já tinha gente demais ali, esperando que eu
fracassasse, que cometesse uma gafe. Minha ideia era esperar que
o circo acabasse para que a gente pudesse conversar. Mas Jackson
me convenceu de que era uma péssima ideia. Então, pedi a ele que
te chamasse para um lugar mais calmo. Foi nesse meio tempo que
Oliver apareceu.
— Isso. Me explique o que ele tem a ver com essa história toda.
— Zach para a centímetros de mim. Sua altura imponente fazendo
com que eu me sinta ainda mais insignificante. É por isso mesmo
que eu o empurro, até que esteja novamente encostado no carro.
Não quero me sentir inferior, especialmente agora. Não mais do
que já me sinto por todos os erros que cometi ao longo da minha
vida.
— Oliver me chamou de puta e vagabunda, para começo de
conversa — revelo, envolvendo-me com meus próprios braços. É
uma tentativa inútil de me proteger. — Falou sobre como eu
atrapalhei a conexão dele com vocês, de que foi por minha causa
que os King cortaram relações com ele. Então, contou que era o
empresário da banda, e que eu não iria atrapalhar esse negócio. Ele
percebeu que eu podia contar a você sobre o meu passado e que, se
você soubesse do meu envolvimento com Jamie, iria quebrar o
contrato.
— E qual foi a ameaça? — Zachary quer saber, apoiando uma
mão em cada lado do corpo na lataria do carro.
— Se eu abrisse a boca ou se você interrompesse os planos
dele, Oliver soltaria alguns vídeos meus na internet. Vídeos e fotos
que eu não sabia que Jamie tinha feito. Na hora em que Oliver me
chantageou, não soube o que fazer.
Antes que eu perceba o que está acontecendo, Zachary se vira e
começa a agredir meu pobre carro, revezando murros no capô e
chutes no pneu já rasgado.
— Filho da puta, desgraçado! — ele grita sem parar, descontando
todas as suas frustrações na única lembrança física que tenho do
meu avô.
— Pare com isso! — peço, puxando-o pelo braço. — Não destrua
meu carro.
— Foda-se o carro. Eu compro outro — Zachary diz.
— Não quero outro. — A declaração faz com que ele me encare,
uma sobrancelha erguida em descrença. Mas logo começa a rir.
— Você quer essa lata velha? — Assinto. — E o que aconteceu
com aquela ideia de torrar todo o meu dinheiro? Podemos começar
comprando um carro decente para você.
— Meu carro é decente. Só… furou o pneu. — Aponto para a
roda, ignorando o resto. — E agora tem uns amassados, mas a culpa
não foi minha. Ele é a última lembrança que tenho do meu avô.
Então, pode deixá-lo em paz?
— Ah, Gaia, o que eu faço com você? — Assim que as palavras
saem de sua boca, sou puxada para um abraço apertado. Zachary
me envolve, apoiando o queixo sobre minha cabeça, e na mesma
hora passo os braços em torno de sua cintura. Inalo seu perfume e
me permito relaxar por alguns segundos. — Você consegue perceber
que a culpa foi minha por seus vídeos terem vazado na internet?
A pergunta me faz dar um passo para trás e encará-lo.
— Como assim?
— Quando vi o artigo do The Post, fiquei tão puto que a primeira
coisa que fiz foi cancelar o contrato com a Red Law. Não por causa
do seu passado, mas pela ligação que eles têm com Oliver. —
Observo a cara de pau de Zachary com uma sobrancelha erguida. —
Tá bom, também foi por causa do babaca ser seu ex. Mas aposto
que isso levou Oliver a cumprir com a ameaça. — O modo como ele
me encara não esconde a raiva nem o arrependimento que sente. E
isso só me faz ter vontade de sentar no chão e chorar. Talvez rir um
pouco, porque nunca pensei que estaria em uma situação parecida
com essa. — Ele foi até o escritório hoje à tarde. Falei todas as
verdades que estavam entaladas na minha garganta e prometi que
ele jamais teria outro contrato com a IK, seja com a King Records,
com a King Videos ou qualquer outra plataforma nossa. Um soco ou
dois podem ter acontecido no processo.
— Ele mereceu — falo com sinceridade. — Mas e agora, o que
eu faço?
— O que nós fazemos, você quer dizer — Zach me corrige,
fazendo com que eu o encare. — Você deveria ter me contado tudo
desde o início, Gaia. Se tivesse, nada disso estaria acontecendo. Eu
teria…
— Pode parar! — interrompo-o, colocando as mãos na cintura. —
É muito fácil para você me julgar assim, mas lembre-se que nunca
precisei me preocupar com esse tipo de coisa até você aparecer na
minha vida. Não conheço os protocolos, não sei do que a imprensa é
capaz… Caramba, eu nunca fui ameaçada! De repente, todos os
olhares estão sobre mim, e você espera que eu aja racionalmente?
— solto as acusações sem medir meu tom de voz. — Sua mãe me
mandou uma mensagem amedrontadora. Até seu primo veio me
intimidar, Zachary.
— Isso não importa, Gaia — ele diz, como se fosse a coisa mais
simples do mundo.
— Claro que importa! — Jogo as mãos para o alto, querendo
argumentar. — Eu não pertenço a esse mundo. Não sei o que fazer
direito, não tenho dinheiro, não sou o tipo de mulher com quem você
deveria estar e…
— E é a mulher que eu amo — Zachary me interrompe, puxando-
me pela cintura. Paro entre suas pernas, enjaulada em seu abraço e
presa em seus olhos. — Se você quiser, lidaremos com tudo isso.
Mas só se você quiser e achar que vale a pena. Não posso te obrigar
a ficar, muito menos a aceitar essa loucura que é o meu mundo. A
única coisa que posso fazer é te proteger de tudo o que estiver ao
meu alcance, enquanto tento te mostrar todos os dias o quanto te
amo.
Não há qualquer hesitação em sua voz. Porém a vulnerabilidade
no modo como me encara faz com que eu estremeça por dentro.
Zachary está me entregando seu coração, me oferecendo o que tem
— o que é. Há também uma apreensão em seu rosto, como se
estivesse por um fio.
Ele não é o único a se sentir assim. Estou prestes a cair de um
precipício escuro, sem saber a altura da queda. Mas é impossível
olhar para esse homem maravilhoso e não querer arriscar. Não
querer enfrentar todos os meus medos e me deixar levar pelo que
sinto. Porque, no fundo, sei que Zachary King é alguém por quem
vale a pena lutar.
— Eu vou ser a pior namorada de todas — digo com convicção.
— Ah, é? Por quê?
— Porque sou insegura e tóxica. Sou um perigo ambulante, que
usa facas diariamente. Sem falar que não sei se vou conseguir lidar
com a imprensa noticiando coisas a meu respeito o tempo todo —
solto a verdade e recebo um sorriso em resposta.
— Isso quer dizer que, pelo menos, você não vai fugir? —
Zachary pergunta, me puxando mais um pouco e deixando nossos
corpos colados um ao outro.
Balanço a cabeça em negativa, sem conseguir desviar o olhar do
dele.
— Só para constar, eu também te amo, Zachary. Prometo não
esconder mais nada de você. — Fico na ponta dos pés e encerro o
resto da distância que nos separa.
Ele me encontra no meio do caminho, seus lábios tocando os
meus enquanto solta um suspiro de alívio.
— Pensei que nunca ouviria essas palavras de você — sussurra
contra a minha boca, os olhos abertos enquanto me beija devagar.
— E eu pensei que não seria capaz de dizê-las novamente. —
Enfio os dedos em seu cabelo e aprofundo o beijo, cansada de me
manter longe do homem que amo.
Quando Zach se entrega ao momento, a impressão que tenho é
de que ele nunca mais vai me soltar. Uma mão emoldura meu rosto
enquanto a outra aperta a minha cintura com força. Eu também me
deixo levar, nossas línguas se entrelaçando, e permito que ele tome
tudo o que quer. Porque tudo é dele.
Zachary me tem desde o primeiro olhar. Cansei de lutar e de fingir
o contrário.
Depois do que passamos, a última coisa que quero é impor mais
barreiras entre nós. O muro que ergui para proteger meu coração foi
derrubado. Agora, só nos resta este sentimento louco — talvez
mágico —, que me faz querer mais e mais dele.
Deixo minha mão acariciar seu peitoral, descendo para o
abdômen definido, até alcançar o cós da calça. Sinto-o rosnar
baixinho contra a minha boca, a vibração reverberando dentro de
mim, antes que ele inverta nossas posições e me impressione contra
o carro.
Só que em vez de continuar me beijando, Zachary dá um passo
para trás e apenas me analisa de cima a baixo, esfregando o polegar
no lábio enquanto balança a cabeça.
— Você me deixa louco, sabia? — Ele fixa os olhos nos meus,
como se quisesse ter certeza de que estou prestando atenção.
Apenas ofego, sentindo meu corpo queimar com o efeito do beijo. —
Não sei quanto do mundo eu teria queimado se você tivesse ido
embora.
— Não quero ir, nunca quis — sussurro, esticando a mão para
puxá-lo de volta enquanto mantenho o contato visual. — Descobri
que é impossível ficar longe de você.
Assim que a verdade escapa, ele esmaga nossas bocas de novo,
retomando o beijo, agora com mais urgência. Zachary me ergue pela
bunda, colocando-me sentada sobre o capô do carro. Para não
deixar espaço entre nossos corpos, envolvo-o com as pernas,
trazendo-o para perto. Ele enfia a mão no meu cabelo, puxando-me
pela nuca enquanto me devora — e só consigo me render.
O desespero de sentir sua pele quente junto à minha fala mais
alto, tanto que ignoro o fato de estarmos no meio de uma estrada e
começo a tirar seu terno. Primeiro, vai o paletó para o chão. Foda-se
se for caro, ele pode comprar outro. Depois, desabotoo a camisa
com pressa, deixando meus dedos acariciarem os músculos quando
finalmente estão ao meu alcance.
Zachary solta um murmúrio baixo no instante que passo as unhas
pelos desenhos de sua barriga, a boca consumindo a minha
enquanto ele mexe o quadril. Posso sentir sua ereção cutucar onde
mais preciso dele. Mais ainda, posso sentir a mudança entre nós.
Porque agora que as verdades foram libertadas — não aquelas
sobre o meu passado, e sim as sobre o nosso presente —, há uma
intensidade nova no modo como nos beijamos. É a primeira vez de
novo. A primeira de todas, porque nunca mais vou deixar que
mentiras e intrigas fiquem entre nós.
Durante todo esse tempo, Zachary fez questão de mostrar que
me aceita do jeito que sou. Agora, está na minha vez de fazer o
mesmo. É por isso que o empurro.
— O que…? — Zachary começa a perguntar, mas logo para
quando nota o que estou prestes a fazer.
Há duas semanas, ele se colocou de joelhos à minha frente e me
ofereceu seu mundo. Disse que não queria que fôssemos um
segredo. Está na hora de provar que aceito, de fato
e sem reservas,
os novos termos. É por isso que repito seu gesto de antes,
abaixando-me no chão da estrada.
Se ele sempre me mostrou o que sentia através de atitudes, nada
mais justo do que eu fazer o mesmo agora. Porque é isso o que eu
quero: ser dele. Quero me entregar ao que sinto, me permitir ser
amada e não ter essa insegurança o tempo todo — mesmo que eu
saiba que não será fácil superar todas as dúvidas constantes que
ficam rondando a minha mente.
Por Zachary, eu vou tentar.
Para ele. Com ele.
Já de joelhos, minhas mãos procuram o botão da calça social,
sem desviar o olhar por um segundo sequer dos verdes que sempre
me cativam. Assim que meus dedos invadem a cueca, abaixo o
tecido até o meio de suas coxas, permitindo que sua ereção pule
para fora.
Não consigo conter o sorriso no instante em que ele grunhe, e
logo passo a língua pelos lábios, desejando sentir seu gosto. Zach
toma o próprio pau com a mão, segurando-o pela base e
bombeando-o algumas vezes. Sinto minha boca aguar com a
vontade de prová-lo, de fazer com que ele se derrame em mim.
Com a mão livre, ele move meu cabelo para o lado, com tanta
gentileza que mal sinto seu toque. Mas são suas palavras que me
destroem, enquanto mantém os olhos presos em mim:
— Acho que nunca quis tanto algo nesta vida quanto sentir você
me chupando agora. — Ele contorna minha boca com a cabeça
rosada, e preciso apertar as pernas com a dor que começo a sentir,
causada pelo vazio de não o ter dentro de mim. — Abra a boca,
Gaia.
Faço o que ele pede e seu pau desliza entre meus lábios, ao
mesmo tempo que o aperto em meu cabelo se intensifica. Eu o
encaro enquanto sugo a ponta com força, para relaxar um pouco e
deixar que ele entre mais fundo. Passeio com a língua devagar,
seguindo a veia protuberante, até minha boca encontrar com sua
mão, que agarra a base. Substituo a dele pela minha, masturbando-o
devagar enquanto o chupo ao mesmo tempo.
Os cascalhos no chão machucam meus joelhos, mas eles não
importam. Nada importa a não ser o homem à minha frente, que
agora fecha os olhos e mexe o quadril para frente e para trás,
entrando no mesmo ritmo que eu. Sinto suas pernas tremerem um
pouco e sei que ele também está se deixando levar.
Subo e desço mais rápido com a boca, revezando sugadas leves
e gentis. Mas Zachary não quer gentileza agora, porque logo está
fodendo minha boca com força, a cabeça jogada para trás e uma
expressão de puro êxtase no rosto.
Então, antes que eu possa pensar mais, uso a outra mão para
envolver suas bolas com cuidado. E o grunhido grave que ele solta
indica que estou fazendo o certo.
— Caralho, que boca gostosa da porra — Zach diz, olhando para
mim. Rolo a língua ao redor da cabeça e ele aperta ainda mais o
meu cabelo. — Se você fizer isso de novo, vou gozar em dez
segundos — avisa, mas não para de se mexer, indo até o fundo da
minha garganta duas vezes, até que eu engasgo com o reflexo.
Quando isso acontece, ele sai da minha boca e me puxa para
cima, me devorando em um beijo rápido e forte. Sou empurrada de
volta para o carro, sentindo minha bunda bater na lataria com mais
violência do que esperava.
Zachary não para de me beijar, suas mãos passeando por meu
corpo sem qualquer pudor. Dane-se que estamos no meio da
estrada, que podemos ser vistos. Nada nesse momento importa mais
do que nós dois. Ele precisa disso tanto quanto eu. Então, para
deixar claro a minha necessidade, alcanço sua mão e levo-a até o
meio das minhas pernas, fazendo-a escorregar para dentro da minha
calcinha.
— Preciso de você aqui — sussurro contra seus lábios —, agora.
Ele puxa o ar com força ao ver como estou molhada. Pronta.
Precisando de mais. No instante que a boca de Zachary volta a
tomar a minha, seus dedos afastam meus lábios inferiores e
começam a brincar com o ponto mais sensível. O tremor que toma
meu corpo faz com que eu precise segurá-lo com força, senão corro
o risco de ir ao chão. Minhas pernas ficam bambas quando ele me
estimula rápido, oscilando meu clitóris de um lado para o outro
enquanto eu solto gemido atrás de gemido.
Minhas unhas cravam com força em seus braços, ainda cobertos
pela camisa semiaberta. Preciso apoiar a cabeça em seu peito e
fechar os olhos. As sensações são fortes demais, principalmente
quando Zachary enfia dois dedos em mim, impedindo-me de manter
o foco em qualquer coisa que não seja ele e o som molhado dos
efeitos que causa em meu corpo.
— Por favor… — começo a implorar, sentindo aquele
formigamento gostoso começar a percorrer minha coluna. — Eu
vou…
Mas antes que possa dizer que estou prestes a gozar, Zachary
tira os dedos de dentro de mim de forma rápida. Em um movimento
brusco, sou virada de costas para ele e forçada a me inclinar contra
o carro. Com a cabeça descansando na lataria do capô, sinto quando
Zach puxa a minha legging até embaixo, antes de estalar um tapa na
minha bunda. A ardência de sua palma queima minha pele.
— Gostosa pra caralho — ele diz, com uma mão de cada lado do
meu quadril, enquanto afasta uma nádega e passa a língua por meu
ânus. Solto um gritinho com o susto, mas logo relaxo e me deixo
aproveitar da sensação nova que o estímulo causa. — Ainda vou te
comer aqui, Gaia. Mas não agora. Talvez quando a gente chegar em
casa.
A língua aveludada desce mais, me lambendo com pressa.
Zachary enfia o rosto na minha boceta, chupando, devorando,
sugando, me fazendo gritar de prazer no meio da estrada deserta.
Apoio as mãos no carro e rebolo em sua cara, louca para senti-lo
por inteiro dentro de mim.
— Zach, por favor… — é tudo o que consigo dizer, e sei que ele
me entende, porque logo se coloca de pé novamente e pressiona as
minhas costas para baixo.
— Fique assim — ele ordena e, neste momento, é impossível não
obedecer. — Linda demais.
A mão que me pressionava agora acaricia minha bunda,
descendo para minha coxa, deixando uma trilha de arrepios por onde
passa. O caminho de volta é ainda mais torturante, já que ele o traça
pelo interior da perna, molhando o dedo com a minha excitação e
circulando meu ânus devagar.
— Zach — peço de novo, desesperada para que ele acabe logo
com isso e me foda do jeito que preciso. Do jeito que só ele sabe.
— O que você quer, Gaia? — pergunta, como se já não soubesse
a resposta.
— Você. Dentro de mim. Agora. — É uma súplica e uma ordem.
Mas não preciso pedir duas vezes, porque logo sinto seu pau
brincar na minha entrada, acariciando o clitóris bem devagar.
Atiçando. Indo e voltando. Me enlouquecendo.
— É isso o que você quer? — o desgraçado pergunta.
Chego o corpo para trás, apenas para receber um tapa na bunda
como punição. Olho para ele, sem conseguir esconder minha raiva
— e talvez meu tesão.
— Agora!
— Sim, futura senhora King. — Não tenho tempo de reagir ao
comentário, porque com uma única estocada, Zachary me preenche
por completo. A invasão deliciosa me faz soltar um grito, que ecoa
pela estrada, enquanto tento me manter com os pés firmes no chão.
— Apertada pra caralho. Tão quente e… Puta que pariu!
Com um grunhido mais alto, Zachary parece gostar quando
contraio meu interior. Assim que se recupera da surpresa, começa a
acelerar o ritmo, entrando e saindo de mim com força.
Perdemos o controle juntos, enquanto tento acompanhar seus
movimentos. Não consigo parar de gemer, ouvindo o som de nossas
peles se chocando.
É por isso que empino a bunda, sentindo seu aperto ficar ainda
mais intenso em meu quadril. Ele vai cada vez mais rápido, mais
forte, mais fundo… saindo quase todo e me invadindo de novo com
força.
Meu nome é como um mantra em sua boca, enquanto eu só
consigo soltar gritos incoerentes, sentindo o prazer escalar a cada
estocada.
— Porra, Gaia, isso é bom demais — ele diz, se deitando sobre
mim, a mão serpenteando até alcançar meu clitóris. E assim que
começa a massageá-lo, sei que é uma questão de segundos até eu
gozar.
— Diz que é meu, Zach. Que você é meu. Que me ama — peço,
deixando a minha vulnerabilidade escapar.
Mas preciso disso agora. Preciso dele por completo.
— Eu te amo, Gaia — sussurra no meu ouvido, o rosto molhado
de suor colado ao meu. — E sou seu, só seu. Assim como você é
minha, só minha.
Ele mete com mais força, me estimula mais rápido, até que eu
esteja gritando e me desfazendo em um orgasmo incontrolável.
Minhas pernas perdem as forças, meu corpo fica jogado sobre o
carro. Perdida em meio aos tremores, sinto o pau de Zach inchar
quando ele solta um grunhido rouco, latejando dentro de mim.
∞∞∞
Nunca pensei que veria Zachary King deitado no banco traseiro
do meu carro velho. É uma cena ridícula, para dizer o mínimo. Mas
aqui estamos, comigo sobre ele, em uma posição muito
desconfortável, enquanto aproveitamos os últimos minutos de
calmaria antes da tempestade.
Mesmo assim, eu não mudaria nada desse momento. Nem um
único segundo do que aconteceu na última hora.
— Você já sabe o que vai fazer? — pergunto, lutando para
manter os olhos abertos enquanto ele afaga meu cabelo.
— Claro que sim. Primeiro, vou levar você de volta para casa,
onde posso ficar de olho. Em seguida, chamar um guindaste pra
rebocar essa lataria. Depois, vou me livrar deste carro. Quem sabe
tacar fogo, porque…
— Não se atreva a destruir o carro do meu avô. — Dou um tapa
em seu peito, mas ele logo pega minha mão, deixando um beijo na
palma antes de devolvê-la para onde estava.
— Então vamos dar o uso que ele merece, de relíquia da família.
Coloco esse calhambeque na garagem e a gente finge que coleciona
antiguidades, pode ser? Compro até outro para este aqui não se
sentir sozinho — Zach sugere, e o fato de ele estar fazendo planos
para nós faz um quentinho tomar conta de mim.
— Não quero torrar seu dinheiro com carros que nunca vou dirigir.
Acho um desperdício — comento, controlando o sorriso. — Ainda
prefiro o chihuahua. Talvez se pegarmos um filhotinho, o Konig possa
se acostumar com a companhia.
Zachary não perde o intuito do meu comentário, tanto que ergue
um pouco as costas e olha para mim. Por vários segundos, apenas
me encara. Uma expressão surpresa toma conta de seu rosto, como
se não acreditasse no que estou dizendo. Eu também não acredito.
— Pode ser providenciado — ele diz, receoso, porém logo um
sorriso começa a se formar nos lábios avermelhados.
— Que bom. — Acaricio seu queixo devagar, sentindo os pelos
da barba começarem a crescer de novo. — Mas minha pergunta
inicial era em relação a todo o caos que se formou hoje.
Volto ao assunto chato.
— As providências já foram tomadas antes de eu chegar aqui.
Como falei, quebrei o contrato com a Red Law e, consequentemente,
com Oliver. Não quero fazer negócios com aquele pote de merda,
muito menos depois de tudo o que você me contou. — Assinto com a
cabeça. — Só espero que isso não prejudique os negócios com
Damon Cooper. Porém, só terei certeza quando isso acontecer.
Então, nada a fazer agora. Quanto ao vídeo e às fotos, mandei que
Trenton resolvesse o vazamento. Assim que voltarmos, vou avisá-lo
de que a fonte é o Oliver, para que meu primo decida como agir. É o
mínimo que ele deve depois de falar tantas merdas pra você. Pelo
que vi do vídeo e das fotos, não dá para garantir que é você. Então,
temos duas opções: negar até a morte ou processar Oliver por vazar
conteúdo íntimo sem o seu consentimento. De qualquer forma, não
ficaremos quietos.
— E se tudo isso prejudicar a reputação dos King? — quero
saber.
Zachary não responde de imediato, apenas se senta no banco,
mantendo-me no seu colo. Agora, com uma perna de cada lado de
seu corpo, encaro-o com interesse.
— Gaia, nós vamos resolver tudo. A influência da família não vai
ser arruinada por algo assim. A questão é que segredos trazem
aborrecimentos, e preferimos evitar isso. Agora, você tem mais
algum segredo problemático que eu precise saber? Um filho perdido,
uma postagem de cunho político questionável? — ele pergunta com
uma sobrancelha erguida.
— Não. Sem filhos… ainda. E nunca fui muito ativa nas redes.
Ah, tem meus pais. — Zachary me olha de forma preocupada, já
esperando alguma bomba. — Apenas a nível de esclarecimento,
preciso avisar que eles eram professores de escola pública, de anos
iniciais, antes de se aposentarem. Como se não fosse loucura o
bastante pegarem todas as economias e se mudarem para o
Tennessee, também resolveram abrir um bar country — revelo. —
Não que isso seja problemático o suficiente. Só que, como eles não
sabem dançar direito, sempre estão passando vergonha. Sem falar
que forçam sotaque para fingirem que são locais, o que eu acho um
tanto complicado.
— Seus pais são cowboys falsos? — Assinto de leve, vendo um
sorriso se abrir na boca que amo. — Já sei que vou adorá-los, Gaia
— ele fala com os olhos presos aos meus. — Mas nem se eles
fossem toureiros isso iria importar. Nada vai mudar o que sinto por
você, nem o que estamos construindo.
A frase faz meu coração flutuar dentro do peito. Sem conseguir
resistir, me aproximo ainda mais de seu rosto, encostando meus
lábios aos dele.
— E o que estamos construindo, senhor King? — pergunto
baixinho.
— Uma vida.
Vida em Nova York
A sua fonte de informações sobre a cidade que
nunca dorme
Zachary
Desde que criou coragem e lançou sua primeira obra, não para de
escrever histórias com humor, que fazem com que os leitores sintam
coisinhas gostosas lá embaixo e sempre encontrem um final feliz.
Hoje, tem mais de vinte romances publicados.
Instagram: @marianamonni
TikTok: @marimonni
Twitter: @marimonni
Uma loucura, daquelas que nunca havia se permitido fazer. Sem oi,
sem trocar nomes, sem nada. Apenas o desejo incontrolável.
Ela só não esperava que ele fosse Eduardo Müller, o chefe de sua
melhor amiga.
Seu passado não foi gentil, mas Eduardo veio para provar que seu
futuro pode ser tudo aquilo que ela sonhou. Basta apenas que Laura
se permita uma chance para amar.
Aquele Beijo
Quando se tem uma vida inteira planejada à sua frente, nada pode
interromper o que está por vir.
Certo?
Só que sua família já tinha decidido o que seria melhor para ela.
Carrick Griffin sabia como seria sua vida e não estava nada feliz com
o que havia sido posto em seu caminho. Porém, já estava
conformado. Afinal, ele era o herdeiro de um império.
Um momento.
Um desencontro.
Um destino já traçado.
Mas não desista de mim ainda. Não sou tão superficial assim… As
coisas começam a mudar radicalmente quando conheço minha nova
vizinha. Ela é linda, inteligente e sexy até o último fio de cabelo ruivo.
O único problema é que Clara é virgem. Ou seja, minhas táticas de
sempre não funcionarão com ela.
ATENÇÃO:
Não leia este livro em público se você não quer passar vergonha. Ele
vai te fazer gargalhar alto e sentir as famosas borboletas no
estômago. A autora não se responsabiliza caso você fique
completamente apaixonada por Dante e Clara.
Aquiles
“Parabéns, você é papai.”
Até agora, seu único objetivo era deixar de ser apenas um Herói e se
tornar um Deus do Olimpo. Os treinos eram exaustivos e as horas,
longas: não é fácil ser um lutador profissional de Jiu-Jitsu.
Se ele achou que essa seria a maior dificuldade de sua vida, então
terá uma surpresa.
Para Ana Júlia, aquele era apenas mais um dia de trabalho. Porém,
quando seu consultório foi invadido pelo homem mais lindo que já viu
na vida, tudo mudou. Não só por conta dele, mas pelo fato de que
trazia um recém-nascido no colo.
“Ele foi abandonado”, era tudo que aquele “deus grego” conseguia
dizer.
Como médica, ela não pode se apegar. Mas quando a sua vida e a
de Aquiles se entrelaçam, nada mais é garantido.
Dionísio
Eles se odeiam, mas é impossível controlar a atração.
Por outro lado, Dio sabe muito bem o que quer: irritar a princesinha a
todo custo. Ela é mimada, chata e possivelmente a mulher mais linda
que já conheceu. Só que isso não importa.
Nenhum dos dois quer se envolver, mesmo que resistir esteja cada
vez mais difícil. E quando a vida de Flora fica em perigo, Dionísio
será o único capaz de mantê-la em segurança.
Casada Por Acidente
É possível ser casada e não saber?
Se tem uma coisa que Alice Warrington vai descobrir é que esse tal
de Inferno Astral realmente existe. Ela nunca foi uma mulher
supersticiosa. Seu trabalho exige muita lógica e atenção para perder
tempo com coisas tão banais quanto o destino.
Como assim, casada? Ela não entrou na igreja e disse "aceito" para
ninguém, nunca esteve em um relacionamento por mais de duas
semanas, nem mesmo foi a Las Vegas. Como ela pode estar casada
e sequer saber quem é seu marido?!
Com sua vida em ruínas, ela vai atrás do homem que pode ter as
respostas para suas perguntas. O que não esperava era encontrar
aquele espécime de um metro e noventa, tatuagens pelo corpo todo
e um sorriso de derreter calcinhas.
Antes de completar trinta anos, todo mundo surta. No meu caso, foi
muito mais do que isso. Fui tomada por uma crise existencial que
mudou minha vida. Por isso, faltando alguns meses para o tão
temido dia, resolvi fazer uma lista de trinta coisas a fazer antes dos
trinta.
Afinal, não é todo dia que você percebe que está completamente
apaixonada pela única pessoa que não deveria.
Minha Ruína
Nada na minha vida é simples. Nunca foi. Só que agora o destino
parece estar de sacanagem com a minha cara.
Eu passei anos confinado, sem saber quem eu era, apenas para ver
minha mãe ser assassinada na porta de casa e descobrir da forma
mais inesperada possível que o meu pai é um Don da máfia italiana.
Não só isso: ele quer que eu e meus dois irmãos entremos para a
família.
Meu
Cinco livros.
Cinco casais.
Baby tem tudo planejado. Perder o controle nunca esteve nos seus
planos. O problema é quando ela conhece Alexandre e todas as
suas “faces”. Porque ele não é apenas um professor, ele é insaciável
e tem fetiches que farão com que ela descubra um lado novo, que
nunca imaginou ter.