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Estágio Curricular Supervisionado II

Prof.: Fábio Barros


Alunos:
Análise das Entrevistas

Os líderes educacionais precisam compreender que toda ação eficaz – sobretudo no mundo de
hoje – é, antes de tudo, a ação que muda a consciência - a própria e a dos outros. Eles precisam mover-se
dentro da sociedade e fazer com que os outros se movam, com uma larga consciência de suas
significações, de seus impedimentos e, sobretudo de suas possibilidades. Educação é um projeto
simultaneamente político e filosófico, cuja compreensão não cabe exclusivamente no âmbito da
racionalidade científica. (...) Assim sendo, a normatividade básica da educação não é haurida na ciência
empírica nem, a fortiori, na técnica. Ela provém de um saber mais radical: saber dos valores que, em
última análise, estruturam o ser e a cultura do homem na sociedade. Um projeto de educação funde os
interesses do indivíduo e da sociedade em processo de tensão que, permanentemente, encaminha a
oposição entre uma e outra, a solução de compromisso e, mesmo de integração – ou de ruptura.

Durmeval Trigueiro Mendes

Essas palavras de Mendes nos remetem ao projeto autoritário da ditadura que


estava se implantando naquela ocasião, e, entre outros autores, alertavam para a
responsabilidade da educação e da cultura para ampliar a consciência política e social de
uma sociedade. É também a partir deste argumento que muitos pesquisadores,
professores e estudantes desenvolvem seus trabalhos acadêmicos: A educação como
principal arma para o desenvolvimento de uma nação livre e democrática.
Por mais vasto que esses conceitos podem parecer, veremos que na prática
ainda é um discurso idealizado pelos docentes de acordo com as entrevistas feitas com
professores de escolas públicas que este trabalho pretende apresentar e analisar.
Conforme Ankersmit (2001, p. 117), “a realidade é a informação em si e não mais a
realidade por trás desta informação (...) isso dá à informação uma autonomia própria,
uma substância própria”, assim como uma lei física descreve a realidade, a informação
sob o ato da fala descreve também uma realidade. Portanto, para não corrermos o risco
de uma simples narrativa literária (LYOTARD, 2008), analisamos de forma mais literal
possível as falas dos entrevistados, pois como em Wittgenstein nas Investigações
Filosóficas, o significado das palavras está no seu uso, por isso seria necessário
pesquisar tais significados em seus usos próprios e singulares e, como essa não é a
proposta do trabalho, e também com finalidades didáticas, nos reservamos a uma análise
literal dos enunciados.
Sendo comumente admitido pelo senso comum, a escolha de uma carreira
profissional se dá como uma vocação, uma dádiva divina ou até mesmo um dom, mas,
de acordo com algumas falas, nem sempre isso ocorre:
...Aí optei por fazer história e porque também eu tentei várias
outras opções de trabalho e coincidiu de eu não ter me encontrado e busquei
essa alternativa.

E também de acordo com outro depoimento sobre sua carreira docente:


Inicialmente quando entrei no curso era a última coisa que queria
fazer. A primeira vez foi com cursinho vestibular, achei interessante, sempre
gostei de uma perspectiva mais social da ciência. Aí quando entrei em
contato com a sala de aula foi mais próximo do que me agradava, eu me senti
bastante a vontade... Gostei da área.

Assim, verificamos que nem sempre a escolha da carreira docente se dá por


dom ou vocação. Como qualquer outro emprego, a docência é tida como uma das
maneiras de se entrar no mercado de trabalho imposto pelo atual sistema de produção.
Por mais que existam mitos e fantasias sobre a profissão, ela pode ser apenas mais uma
mão de obra operária qualquer. Nesse sentido, a profissão está sujeita a toda e qualquer
vicissitude do atual sistema, principalmente com a ideologia neoliberal sendo aplicada
no país desde a intervenção do Banco Mundial nas políticas públicas para a Educação
(TOMMASI, L. De; WARDE, J. M. HADDAD, 1996) que trata os recursos humanos
como prejudiciais para um verdadeiro crescimento no valor custo/benefício focando
apenas nos aspectos técnicos e didáticos que trazem maior eficácia em menor número,
ou seja, gastos menores. Assim, fica evidente a consequência das falas dos entrevistados
sobre a atual educação no país como segue o relato:
Só que geralmente nas escolas isso é muito imposto no trabalho, a
gente não tem muito o que conversar a respeito. Acho que acontece, não tem
muito o que falar. A gente tem uma carga horária muito pesada, não tem
tempo pra planejar, o salário é baixo, a situação das escolas, tanto de
infraestrutura quanto de pessoal é muito fraca... eu acho que essas práticas
neoliberais do estado de Minas não ajudam muito a carreira docente. (...) a
educação é tratada como um produto mesmo, como uma mercadoria.

Outro entrevistado relatou também problemas referentes ao governo e suas


práticas:
Em termos gerais eu não acredito muito nas divulgações que os
governos dão de que a educação esteja com qualidade do jeito que eles
colocam. (...) o aluno é o principal agente de aprendizagem e a nossa
sociedade tem que ter uma mudança estrutural pra que os alunos tenham essa
consciência de que o saber e a busca de conhecimento na sociedade moderna
é essencial (...) os governos nos embates com os professores que buscavam
melhorias de trabalho, de salários... O governo, ele destruiu a imagem do
professor. Ele utilizou os recursos de governo, que são muitos, pra ele
manipular mídia com propaganda... A imagem do professor no Brasil é uma
imagem que ficou bastante prejudicada e isso tem prejudicado demais a
educação, tem desvalorizado a educação porque a sociedade não tem essa
consciência...

Neste último relato, além da visão crítica sobre as atuais e antigas práticas
governamentais, destaca-se também o pré-juízo do entrevistado acerca do objetivo da
educação como dito antes, uma educação que é essencial para uma mudança.
De acordo com nossas atuais estruturas sociais, partindo do pressuposto que
essas estruturas segundo Lévi-Strauss nas palavras de Carvalho (2005, p. 88) são “as
regras de conveniência de uma sociedade como um sistema, incluindo as relações
familiares, as regras do trânsito e as normas da convivência civilizada, regras que
articulam as realidades sociais (...) a soma das descrições iguala a totalidade do
descrito”, ou seja, as superestruturas influem diretamente no modo de viver do cidadão,
e em nosso caso, do aluno. O que essas práticas da nossa estrutura educacional causam
no principal objetivo dela mesma, o aluno? Assim, segue os relatos dos professores
sobre os seus alunos:
É relativo de escola pra escola, relativo de turnos, o turno da noite,
por exemplo, o aluno falta mais, o turno da manhã o aluno é mais assíduo; o
aluno da manhã ele é mais cobrado pelos familiares, ele não tem essa
autonomia pra... né? E o aluno da noite já tem. Eu vejo assim que aluno tem
até consciência que ele precisa estudar, mas ele não tá disposto, não busca
com bastante decisão aquilo. (...) o aluno hoje, diante desse leque de
informações de possibilidades ele não consegue ter um enfoque.

Além das questões vistas neste relato e nos pressupostos teóricos apresentados
de forma a chegar numa totalidade, numa estrutura que explica todas as coisas da
mesma forma que um cálculo matemático revela uma natureza física, supomos também
que as questões subjetivas relacionadas a cada disciplina encontram-se com diversas
dificuldades. Não é surpresa a intensa e infinidade de publicações, estudos, livros e
teorias sem nexos ou preocupações com a realidade chegando a serem quase vômitos
acadêmicos insanos relacionados especificamente a cada disciplina com o objetivo de
ampliar a eficácia da didática, da transmissão ou compartilhamento do conhecimento
quase sem nenhum resultado satisfatório. Assim podemos perceber no relato de uma
professora:
Então, eu como professora de física, pesquisadora do ensino de
Física, eu acho que o principal é a falta de base que eles têm. No meu caso,
eles começam a ver Física no finalzinho do nono ano, eles tem uma, tipo uma
introdução à Física quando eles tem “Ciência”. O nono ano é pra eles verem
Biologia, Química e Física, então é como eles tivesse um terço de um ano pra
fazer uma introdução do que eles vão ver dali pra frente. Quando eles chegam
no primeiro ano, o currículo que já está estabelecido, nas Escolas, não no
CBC, porque o CBC é muito bom, nas escolas é muito rigoroso, é muito
cruel, eles chegam aqui sem ter nenhuma noção do que é Física, e ainda tem
que aplicar conceitos, formulação matemática e modelagem matemática e
aquilo confunde a cabeça deles totalmente sem contar que quando eles estão
no primeiro ano do Ensino Médio eles tem 15 anos e é uma idade muito
complicada. Então os primeiros anos são muito difíceis de trabalhar por causa
disso, eles não tem base sem contar que a idade já é difícil. Mas eu vejo
também muito problema em relação a falta de interesse mesmo, daí até a
minha perspectiva, desde o PIBID trabalhar com motivação.

E por fim, para fecharmos essa breve análise das entrevistas acerca da
educação e da carreira docente, foi perguntado aos entrevistados o que eles têm como
ação principal para serem aplicadas no contexto atual. Questão bastante subjetiva, mas
relativamente válida, já que a maioria das nossas decisões são tomadas à partir de meras
opiniões e posições ideológicas de partidos políticos quase ou sem nenhuma relação
com a técnica e competências estudadas acerca do assunto (ZEITGEIST Addendum,
2007).
... Deixa eu pensar... Olha, eu acho que a organização dos
currículos seria uma coisa boa e unificação dos currículos também nas
escolas. Eu falo do ponto de vista da escola estadual, da rede pública
estadual, então, entendam assim. Eu acho que seria bom uma organização
melhor de infraestrutura nas escolas, igual eu te falei, aqui nós estamos numa
situação muito privilegiada, a gente tem laboratórios equipados, a gente tem
muito espaço físico, a escola tem bastante verba mas é uma escola modelo na
cidade, o resto das escolas não tem essa realidade, às vezes pra gente
conseguir um laboratório, às vezes um data-show é muito difícil, as salas são
pequenas, não tem cadeiras às vezes, pra todo mundo, então... Infraestrutura.
Sem contar valorização da profissão passa pela valorização econômica,
porque hoje eu trabalho com isso porque eu sou solteira, moro sozinha e eu to
fazendo meu mestrado, só a minha bolsa do meu mestrado é maior do que
meu salário, então se fosse pra eu trabalhar pro resto da minha vida, eu não
vou trabalhar, vou trabalhar até eu acabar meu mestrado e fazer um concurso
pra outra coisa que eu me sinto valorizada e é um tempo perdido, o que eu
estudo eu não posso fazer aqui, entendeu? Também as escolas tem que ter um
pouco mais de autonomia com relação a superintendência, não só autonomia
mas participação das políticas públicas, é essencial.

Fica evidente a questão econômica como requisito para a valorização


profissional, não seria surpreendente já que estamos num sistema monetário,
diferenciando ainda mais do pensamento do professor como algo relacionado ao amor à
profissão, como uma missão a se cumprir.
No caso do Brasil uma ação a longo prazo, estrutural, uma ação de
governo de política pública, de conscientização da sociedade através do
resgate da imagem do professor. A gente não vê outra alternativa que não
seja essa. Os sindicatos estão fragilizados... a gente vê que o governo, ele
toma medidas pra dividir, pra desarticular os professores, o tempo inteiro ele
faz isso... aprovando leis ilegais... eu acredito que pra resolver o problema de
governo, ele usa de qualquer artifício até ilegal pra... né? A educação está
sendo tratada com muito desrespeito, eles fazem qualquer coisa.
Referências Bibliográficas:

LYOTARD, Jean-François. A condição Pós-Moderna. 10ª ed. Rio de Janeiro:


José Olympio, 2008.
CARVALHO, José Maurício de. Filosofia Clínica: Estudos de
Fundamentação. São João Del Rei: UFSJ, 2005.
MENDES, Durmeval Trigueiro. Existe uma filosofia da educação brasileira?
In: MENDES, Durmeval Trigueiro (coord.). Filosofia da educação brasileira. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.
ANKERSMIT, F.R, Historiografia e pós-modernismo. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Topoi, 2001.
WITTGENSTEIN, L. Investigações Filosóficas. Col. Os Pensadores. São
Paulo: Abril Cultural, 1974.
TOMMASI, L. De; WARDE, J. M.; HADDAD, S. (Orgs.) O Banco Mundial e
as políticas educacionais. São Paulo: Cortez Ed./Ação Educativa/PUC-SP, 1996.

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