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1.2 SABERES NECESSÁRIOS À PRÁTICA DOCENTE.

O entendimento da prática docente no nível superior se remete a formação


docente o ensino superior estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que em seu art. 66, rege que
o processo de formação para o exercício da docência superior deve ocorrer em nível de
“pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado” (BRASIL,
1996, p. 22). Dessa forma, a prática docente de nível superior além de contemplar os
saberes científicos específicos de cada área de conhecimento, deve primordialmente
prezar pela relevância da formação pedagógica, que consideramos imprescindível para o
exercício da profissão docente e seus saberes necessários.
Para o entendimento dos saberes necessários à prática docente é importante
considerar que a prática e os saberes docentes influenciam desde a formação inicial e
atuam nas necessidades de aprimoramento que o exercício da docência exigirá no
decorrer da sua vivência, como medidor para os docentes repensarem suas práticas.
Dessa forma, para discutir sobre os saberes necessários à prática docente, a
pesquisa parte dos autores clássicos como Pimenta; Almeida (2011), Masetto (1998;
2003), Gil (2009;2013), Zabalza (2004), Cunha (2001; 2004; 2007), Garcia (1994),
Tardif (2003), Gauthier et al. (1998), dentre outros.
Nesse sentido, para compreendermos como esses saberes podem ser associados
a prática docente dos professores bacharéis cita-se Freire (1996) que aponta
inicialmente e enumera 10 (dez) saberes necessários à prática docente do professor
progressista e autônomo. (Quadro 5).
Quadro 5: Saberes necessários à prática docente na concepção de Freire
Saberes Descrições Apontamentos
docentes
1) ensinar não é transferir conhecimento, Uma vez que inexiste validade no ensino
mas criar as possibilidades para sua do qual não resulta um aprendizado;
produção ou a sua construção.

2) ensinar exige rigorosidade metódica. Na medida em que é preciso reforçar no


aluno sua capacidade crítica, sua
curiosidade, sua insubmissão e o rigor
metódico com que devem aproximar-se dos
objetos cognoscíveis;

3) ensinar exige pesquisa. No sentido da busca contínua, da


indagação, da reprocura, da constatação e
da intervenção;

4) ensinar exige respeito aos saberes dos Toda vez que é necessário respeitar os
educandos. conhecimentos socialmente construídos
pelos alunos na prática comunitária e
discutir com eles a razão de ser de alguns
desses saberes em relação ao ensino dos
conteúdos;

5) ensinar exige criticidade. Vista como curiosidade, inquietação e rigor


na aproximação ao objeto cognoscível;

6) ensinar exige estética e ética. No sentido que o rigor da crítica não pode
ir à contramão de uma rigorosa formação
ética e estética, pois, quando se respeita a
natureza do ser humano, o ensino do
conteúdo não pode ficar alheio à formação
moral do educando;

7) ensinar exige a corporeificação das Na medida que pensar certo é fazer certo;
palavras pelo exemplo.

8) ensinar exige risco, aceitação do novo e Exige sair as zona de conforto e


rejeição a qualquer forma de compreender que o processo de ensinar se
discriminação; remete ao mesmo tempo a aprender;

9) ensinar exige reflexão crítica sobre a Pois na formação permanente dos


prática,  professores, o momento fundamental é o da
reflexão crítica sobre a prática;

10) ensinar exige o reconhecimento e a Se remete a necessidade de compreender


assunção da identidade cultural. que se ensina a uma diversidade de alunos
que carregam em sim diversos conceitos;

Fonte: PUENTES; AQUINO; QUILLICI NETO (2009)

Ao considerar os saberes enunciados por Freire e a formação científica que os


docentes bacharéis recebem em sua formação, percebe-se que apesar dos mesmos não
receberem uma formação de saberes ou conhecimentos pedagógicos, o Bacharel quando
assume o risco de ensinar e se autoavalia e pondera os aspectos éticos e estético da
formação moral do educando respeitando e compreendo que todos em sua essência
detém conhecimento. Logo, de forma direta ou indireta esses saberes se aplicam a todo
profissional que se põe no papel de ensinar, pois a atitude de mediar conhecimento cria
autonomia no sujeito.
Nessa perspectiva, vale mencionar os apontamentos de Pimenta; Almeida
(2011) que apresentam 3 (três) os saberes necessários ao exercício da docência que
também pode ser aplicado ao docente bacharel (Quadro 6).
Quadro 6: Saberes necessários à prática docente na concepção de Pimenta; Almeida
Saberes Descrições Apontamentos
1) saberes da experiência. Dizem do modo como nos apropriamos do
ser professor em nossa vida;
2) saberes da área do conhecimento. Conhecimentos específicos, conhecimentos
científicos, pois ninguém ensina o que não
docentes
sabe e;

3) saberes pedagógicos. Saber pedagógico e saber didático, isto é, a


relação professor-aluno, a importância da
motivação e do interesse dos alunos no
processo de aprendizagem, as técnicas
ativas de ensinar etc;

Fonte: PUENTES; AQUINO; QUILLICI NETO (2009)

Esses saberes descritos por Pimenta e Almeida se aplicam ao fazer docente do


bacharel em maior consonância, pois todo profissional, docente ou não suas próprias
didáticas e metodologias com suas experiências diárias. Bem como se alinham também
com os saberes da área de conhecimento, pois independente da metodologia ou didática,
o bacharel dominar do conteúdo e conhecimento terá habilidades para transmitir o que
aprendeu.
Outro apontamento importante referente aos saberes necessários à prática
docente pode ser observado na classificação de Gauthier et al. (1998), que pondera 6
(seis saberes (Quadro 7).
Quadro 7: Saberes necessários à prática docente na concepção de Gauthier et al
Saberes Descrições Apontamentos
docentes
1) saber disciplinar. referente ao conhecimento do conteúdo a
ser ensinado;
2) saber curricular. referente à transformação dos saberes
produzidos pela ciência num corpus que
será ensinado nos programas escolares;

3) saber das ciências da educação. relacionado com o conjunto de


conhecimentos profissionais adquiridos que
não estão diretamente vinculados com a
ação de ensinar;

4) saber da tradição pedagógica. relativo ao saber dar aula que se tem antes
da formação docente, adaptado e
modificado mais tarde pelo saber
experiencial e, principalmente, validado ou
não pelo saber da ação pedagógica;

5) saber experiencial. referente aos julgamentos privados que o


professor elabora com base na sua própria
experiência, elaborando, ao longo do
tempo, uma espécie de jurisprudência;

6) saber da ação pedagógica. o saber experiencial dos professores a partir


do momento em que se torna público e que
é testado por meio das pesquisas realizadas
em sala de aula;

Fonte: PUENTES; AQUINO; QUILLICI NETO (2009)

Conforme a concepção de Gauthier et al. Dos seis saberes pelo menos quatro
saberes podem ser atribuídos ao docente bacharel que não recebeu formação dos
conhecimentos pedagógicos. Dentre eles pode-se mencionar o saber disciplinar, o saber
curricular, o saber das ciências da educação e o saber experimental, esses saberes são
desenvolvidos a partir do conhecimento adquirido em sua formação de graduação e pós-
graduação sem a necessidade so saber pedagógico, mas que são mobilizados pelos
professores no decorrer do exercício da docência.
Buscando apresentar diversos olhares sobre as concepções dos saberes
docentes apresenta-se nessa conjuntura a concepção de Raymond (2000) que aponta 5
(cinco saberes dos professores (Quadro 8).
Quadro 8: Saberes necessários à prática docente na concepção de Raymond
Descrições Apontamentos

1) pessoais dos professores. adquiridos na família, no ambiente de vida,


pela educação no sentido lato e integrado
no trabalho docente pela história de vida e
pela socialização primária;

2) provenientes da formação escolar adquiridos na escola primária e secundária


anterior. e nos estudos pós-secundários não
especializados, e integrados pela formação
e pela socialização pré-profissional;

3) provenientes da formação profissional adquiridos nos estabelecimentos de


Saberes para o magistério. formação de professores, nos estágios, nos
docentes cursos de reciclagem e integrados pela
formação e pela socialização profissionais
nas instituições de formação de
professores;

4) provenientes dos programas e livros adquiridos na utilização das ferramentas


didáticos usados no trabalho. dos professores: programas, livros
didáticos, cadernos de exercício, fichas, e
integrados pela utilização de ferramentas de
trabalho e sua adaptação às tarefas;

5) provenientes de sua própria experiência adquiridos na prática do ofício na escola e


na profissão. na sala de aula e integrados pela prática do
trabalho e pela socialização profissional;

Fonte: PUENTES; AQUINO; QUILLICI NETO (2009)


Seguindo o direcionamento de Raymond notar que esses saberes docentes
também são vistos em muitos profissionais, que mesmo não tendo à docência como
carreira os desenvolve como os saberes pessoais, os escolares, os saberes adquiridos nas
leituras e os saberes da experiência profissional que no decorrer de sua prática
desenvolve suas metodologias e até cria didáticas próprias como ocorre com os docentes
bacharéis que não receberam formação de conhecimento pedagógico.
Contribuindo com essa reflexão Tardif (2003) apresenta sua classificação dos
saberes a partir de 4 (quatro) saberes diferentes (Quadro 9).
Quadro 9: Saberes necessários à prática docente na concepção de Tardif
Descrições Apontamentos

1) da formação profissional. da ciência da educação e da ideologia


pedagógica), referente ao conjunto de
saberes transmitidos pelas instituições de
formação de professores;
2) disciplinares. relacionados com os saberes dos diversos
campos do conhecimento, os saberes de
que dispõe a nossa sociedade, tais como se
encontram hoje integrados nas
universidades, sob a forma de disciplinas
(por exemplo, matemática, literatura,
Saberes história, etc.);
docentes
3) curriculares. associado aos discursos, objetivos,
conteúdos e métodos, a partir dos quais a
instituição escolar categoriza e apresenta os
saberes sociais por ela definidos e
selecionados como modelos de cultura
erudita e de formação para a cultura
erudita;

4) experienciais. vinculados ou baseados no trabalho


cotidiano do professor e no conhecimento
de seu meio, os quais brotam da
experiência e são por ela validados;

Fonte: PUENTES; AQUINO; QUILLICI NETO (2009)

Segundo a classificação de Tardif, o docente bacharel também desenvolve


esses saberes, mesmo não tendo diretamente uma formação pedagógica, pois possui
saberes profissionais, experimentais, disciplinares e experimentais. Dessa forma, o
professor bacharel quando assume a postura docente, o mesmo desenvolve ou põe em
prática diversos saberes que talvez desconheça e que lhe impeça de ter a visão docente
do que ensina aos seus alunos.
Entretanto, numa visão mais didática e seguindo os apontamentos de Tardif
(2003) sobre os saberes docentes Cunha (2004), apresenta sua classificação de maneira
mais categórica para fundamentar a estruturação do fazer docente do professor de
carreira que se constitui desde sua formação inicial e se estende na formação continuada
ponderando assim6 (seis) saberes (Quadro 10).
Quadro 10: Saberes necessários à prática docente na concepção de Cunha
Descrições Apontamentos

1) os relacionados com o contexto da vinculados ao saber identificar as teias


prática pedagógica. sociais e culturais que definem o espaço em
que os processos de ensinar e aprender
acontecem e como se dá a inter-relação
entre elas (conhecimento da escola, a
história das disciplinas escolares, das
políticas que envolvem a escola etc.);

2) os relacionados com a ambiência de vinculados às habilidades de incentivo à


aprendizagem. curiosidade dos alunos e o conhecimento
das condições de aprendizagem e das
múltiplas possibilidades que articulam
conhecimento e prática social);

3) os relacionados com o contexto sócio- associados às habilidades de leitura da


histórico dos alunos. condição cultural e social dos estudantes ao
estímulo de suas capacidades discursivas e
Saberes
de recomposição de suas memórias
docentes
educativas;

4) os relacionados com o planejamento vinculados às habilidades de delinear


das atividades de ensino. objetivos de aprendizagem, métodos e
propostas de desenvolvimento de uma
prática efetiva (saber dimensionar o tempo
disponível, relacionando-o à condição dos
alunos e às metas de aprendizagem);

5) os relacionados com a condução da associados ao saber dar aula, ser artífice,
aula nas suas múltiplas possibilidades. junto com os alunos, de estratégias que
favoreçam uma aprendizagem
significativa);

6) os relacionados com a avaliação da referentes à capacidade de saber retomar a


aprendizagem. trajetória percorrida, os objetivos previstos
e as estratégias avaliativas que melhor
informem sobre a aprendizagem dos
alunos;

Fonte: PUENTES; AQUINO; QUILLICI NETO (2009)

Partindo da concepção de Cunha se tem uma visão mais complexa do fazer docente dos
professores bacharéis, pois nessa concepção se estabelece a raiz do problema relacionado a prática
que distancia o docente formado para a carreira do magistério do bacharel que está docente pela
necessidade de profissional que possa fazer a mediação de determinado conteúdo ou conhecimento
específico e que em determinado momento deixa lacunas no processo de ensino aprendizagem por
não possuir a formação pedagógica que lhe habilite como um docente de formação.
Deve-se ressaltar messe processo de aquisição dos saberes docentes que o
professor necessita de uma formação continuada que possibilite a sua docência o
acompanhamento às novas tecnologias educacionais ou ao contexto social ao qual estará
inserido. Nesse sentido, Tardif (2012) traz o foco para a formação concebendo-o como
sujeito do conhecimento, enfatizando que a formação docente tem de contemplar o
saber, o saber-fazer, as competências e as habilidades que fundamentam o cotidiano do
trabalho docente desenvolvido na escola. Frisa ainda que a partir do momento que o
professor desconhece os princípios básicos de sua função, fica à mercê de planos e
currículos que visam não à formação ou a boa educação, mas sim interesses secundários
e isso afeta tanto os professores de carreira de magistério, quantos aos professores
bacharéis.
Nesse contexto, Pimenta (2009) comenta que a didática contemporânea
enfrenta em sua concepção atual uma diversidade de saberes, linguagens, culturas, que
permeiam sua formação, sem perder seu objetivo e especificidade que é o ensino como
prática social. Sendo assim, ao docente cabe uma aquisição de saberes docentes que
podem vir acompanhados dos conhecimentos pedagógicos ou dos conhecimentos
científicos específicos.
Nessa perspectiva, Candau (2020), enfatiza os desafios da didática
contemporânea ressaltando que essa nova didática é concebida na formação de novos
professores que podem ser de carreira ou que podem vir a contemplar os docentes
bachareis, que muita vez recebem essa formação de forma descontextualizada do
cotidiano escolar, o que gera futuros professores que não sabem o que e como ensinar.

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