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Descontentamentos:
O
O Pós-Impressionismo, N
exuberânciae de orgulh0;os últimos, de desespero e ansiedade. também conhecida como a "Segunda Revolução Industrial".
Consoante o ponto de vista que se escolha,o período é designado A máquinaa vapor foi aperfeiçoada e superada. A electricidade,
por Belle Epoque, "a bela época", ou fin-de-siècle, "o fim do o teletonc, o motor de combustão interna, o automóvel, o sub-
Mundial são, com efeito, um período de crescimento cconómico vida moderna, cujo ritmo aumentou à mesma proporção dos
e de prosperidade, alimentado pelos quase 40 anos de paz que confortose da eficiência. Em 1901, Guglielmo Marconi enviou
Se seguiram à Guerra Franco-Prussiana. Na Europa, as nações um sinal sem fios através do Atlântico, o que fez encolher ainda
ctavam praticamente formadas e muitas eram governadas por mais o globo terrestre.
As cidades eram o paradigma da modernidade. Anónimas
repúblicas. A Alemanha e a França juntaram-se à Inglaterra e
à Bélgica, passando a fazer parte do grupo de naçõCs verdadei- e impessoais, atraíam e desenraizavam as populações rurais à
ramente industrializadas. Em 1914, a Alemanha chegou mesmo medida que a industrialização avançava. Os novos habitantes da
a ultrapassar a Inglaterra na produção de aço. Neste grupPo cidade, menos apegados às tradições do que os seus
congéneres
Cxclusivo incluem-se ainda os Estados Unidos da América. do campo, estavam mais abertos a novas ideias que, por seu
dos nacionalismos fervorOsOs turno, circulavam rapidamente devido ao sensacional aumento
Aconjugação do capitalismo e
dos jornais e da alfabetização. Separados das instituições tradi-
ntensificaram os ímpetos coloniais e imperialistas, o que resul-
tou cionais, os cidadãos identificavam-se mais facilmente com o
no retalhamento do continernte africano e de algumas partes
Estado, vindo reforçar as hostes nacionalistas que também defi
da Asia e do Pacífico em
coutadas, abertas à exploração desen-
reada das suas riquezas naturais. O mundo transformou-se nem este período. Com esta confluência de pessoas e de ideias,
as cidades transtormaram-se em poderosos centros de reforma
um verdadeiro mercado global, em que circulavam livremente social e, em particular, do socialismo e do Marxismo. Jornais,
bens, serviços, capital pessoas.
e
revistas e livros denunciavam as miseráveis condições de vida e
Contemporânea, que começara no século xvill, evoluiu
dur de trabalho dos pobres, com um crescente poder de
e este período para uma nova fase, chamada modernidade, persuasão,
especialmente quando ilustrados com fotografias.
Outra grande força modeladora deste período foi a emer-
ormenor da fig. 26.16, Gustave Moreau, A Aparição gencia da "Nova Mulher", apostada em mudar as leis c as
ATULO 26 o PROGRESSo E OS SEus DESCONTENTAMENTOS: O POS.IMPRESSIONISHO, o SiMBOLISMO E A ARTE NOVA (1880 1905) 927
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ropica de Capricomio-
DAS CARAIRAS
1000 Milhas
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masculinos indo mesmo ao luta pela "sobrevivência do mais apto" por "selecção natural"
confortáveis inspiradas nos trajes e
da mulher fatal, dominante e castradora, que se popularizou zações ocidentais. Os hábitos e valores de uma dada cultura.
circunstânchas
cxpressando visualmente os temores masculinos. Ao mesmo argumentavam, adequavam-se ao ambiente e às
tempo, havia cada vez mais mulheres artistas a representarem No entanto, os europeus, desencantados com a industrialzaça0
a mulher a partir de um ponto de vista feminino, conferindo-lhe camedrontados pelo progresso desenfreado, preferiram ver os
importância e dignidade social, seguindo os exemplos de Mary novos territórios colonizados e explorados pelas potênciis cur
dos males quc
Cassat e Juliun Margaret Cameron (ver Capitulo 25). Estas peias como utopias impolutas, santuários ao abrigo
a
artistas romperam com a tradição masculina de representar a assolavam as civilizações materialistas. Dando continuidade
tradição iniciada por Jean-Jacques Rousseau., no século
xVILI,
mulher como objecto sexual, apenas definida pela sua depen-
ainei
dência face aos homens. chamadas sociedades primitivas foram vistas como estando
A um nível global, o final do século x1x assistiu à radicali protundamente enraizadas na Natureza, port.anto, virtuosis. pura
zação de uma auto-imagen europeia de superioridade e em ligação directa com as forças universais e espirituals.
civiliz.acional. Apesar das fortes cisõcs rasgadas pelos naciona- seculo XIX presenciou também uma nova procura esp
ICas
lismos, os paises da Europa e os países extra-europeus ual. Os antropólogos demonstraram que os rituais, 1s prat
construidos à sua imagcin (os Fstados Unidos, o Canadá, a eas crenças do Cristianismo, longe de serem únicas, tn
Austrália e a Nova 7elândia) comungav am dos mesnos modos paralclos nas culturas tribais e nas religiöes orientais. .A Cpre
afirmava que a magiaca religto apenas estavam separadas por seu antídoto.
uma linha ténuc. Cada vez mais pessoas trocavam o progresso
O psicólogo alemão Wilhelm Wundt (1832-1920) partiu da lançamento para novas direcções artísticas. Todos os pintores
baseando-a no método cientítico e pormenorizando as suas van Gogh e Paul Gauguin - desenvolveram estilos únicos.
teorias na obra Principles of Physiological Psychology, de 1874. As Contudo, existem condiçõcs artísticas que ajudam a unificar
pesquisas do russo Ivan Pavlov (1849-1936) suscitaram grande o período entre 1880 e 1904. Os Pós-Impressionistas rejeitaram
interesse pecla torma como o comportamento humano é condi as premiS$as empíricas do realismo e do impressionismo para
cionado pela experiëncia c pelo meio ambiente. Por fim, em criarem obras de arte de carácter monumental, universal c atë
iena, o neurologista Sigmund Freud começou a formular as mesmo visionário. Além disso, repudiaram também a viso
teorias sobre inconsciente, publicando-as
suas o A em
Interpre colcctiva que vimos nos impressionistas; erm vez disso, cada artista
tação dos Sonhos, de 1900. Este interesse pela mente humana ec desenvolveu a sua estética pessoal. Contudo, os novos artistas
pelas forças elementares, que condicionam a acção humana, partilharam com os impressionistas a busca de inspiração e de
extravasou do campo da ciência e invadiu as culturas popular e ideias estéticas na arte japonesa. Além disso, mantiveram
erudita. Artistas tão diferentes como Auguste Rodin e Edvard a atitude antiburguesa e anti-académica deles, virando-se para
Münch começaram a pesquisar essas forças ocultas que residem as cooperativas artisticas e para galerias privadas com o objectivo
nos recantos mais fundos da mente e que se manifestam em de promoverem as suas obras.
pulsões sexuais ou ansiedades.
Sob vários aspectos, o progresso foi a palavra de ordem do Paul Cézanne: Rumo à Abstracção
final do século xix, sendo também a força que motivou reacções Em rigor, Cézanne (1839.-1906) pertence à geração dos impres-
artisticas. A maior parte optou por o rejeitar, procurando uma al- S1onistas, pelo que o seu estilo inovador se desenvolveu
ternativa espiritual, utópica ou primitiva. O resultado foi uma paralelamente ao dos artistas mais importantes da sua juventude.
panóplia vastíssima de estilos ou movimentos, dos quais avultam Nasceu no sul da França, em Aix-en-Provence, e era oriundo
o Pós-Impressionismo, o Simbolismo e a Arte Nova. A maior de uma familia abastada, mas socialmente isolada. Cézanne
parte dos artistas baseou-se nas brilhantes inovações formais de trocou o curso de direito pela pintura, indo estudar para Paris
Manet e dos Impressionistas para criarem obras mais abstractas em 1861. Apesar de ter frequentado uma academia de desenho,
do que representativas. Além disso, as suas obras eram altamente foi um pintor essencialmente autodidacta que se formou, no
pessoais, independentes de qualquer visão de grupo. Por conse Louvre, fazendo cópias dos quadros de Délacroix e Courbet,
guinte, artistas como Vincent Van Gogh e Paul Cézanne entre outros pintores. De 1864 a 1869, Cézanne submeteu ao
cultivaram um estilo inconfundível. O seu trabalho era frequen- Salon telas consideravelmente imperteitas, sombrias e pintadas
temente visionário, representando fantasias e mundos oníricos, e com intensidade, dedicadas a temas tão misteriosos e mórbidos
era também espiritual, uma vez que procurava alívio parao como orgias anónimas, violaçõese assassínios. Tal como já era
grosseiro materialismo da modernidade e um maior significado esperado pelo próprio Cézanne, antiburguês e anti-académico,
para a cxistência. Muitos artistas encontraram temas no santuário as telas foram rejeitadas. Em parte, as pinturas destinaram-se
de um passado Clássico, medieval ou bíblico, que os realistas essencialmente a chocar o júri. Cézanne
pintava com espátula,
tinham repudiado com tanto vigor. A própria arquitectura na paleta de tonalidades escuras de Courbet, sendo também
moderna entregou-se à fantasia c à espiritualidade. A Arte Nova, inspirado pelo imaginário romântico de Délacroix assim como
POr exemplo, conseguiu libertar a arquitectura do domínio ecléc- pela ousadia temática de Manet. Chegou mesmo a pintar várias
dos estilos revivalistas criando edificios que lembram, de Olympias modernas, uma das quais apresentou na primeira
tico exposição impressionista, em 1874. Vira ainda a participar nas
d antasmagórica, formas estranhas, mas maravilhosamente
duas exposições seguintes.
Orginicas, Ao mesmo tempo, os grandes arquitectos de Chicago
das décadas de 1880 e 1890 desenvolveram os primeiros arranha- Em 1872,Cézanne deixou Paris, fixando-se
primeiro em Pontoise
e, depois, na cidade próxima de Auvers, a conselho de Pissarro
-ceus de vidro e aço e, no caso de Frank Lloyd Wright, casas de (ver fig. 25.17), que lá vivia. Este último, mais velho que Cézanne,
abitação complexas que obedeciam a uma austera geomctria
derna de horizontais e verticais. Ainda assim, estes arquitectos tornou-se mentor, sendo que os dois partilhavamomesmo
o seu
Oseguiram imbuir as suas casas e edifícios modernos de uma desejo de criar uma pintura que retlectisse estilisticamentea
PACTOSa espiritualidade que os ligava tanto às forças cósmicas modernidade. Cézanne começou a pintar paisagens, por vezes
incxorável marcha do progresso. realismoe acompanhando Pissarro. Este exerceu uma intluência estabili-
a Enquanto o
zadora sobre o scu jovem colegaea violenta emocionalidade de
pressionismo tinham procurado captar a essência do mundo
Cézanne começou a dissipar-se. A paleta adquiriu cores mais planos de cor. A paisagem inclui um grande número de breves
claras. passando a incorporar muito mais cores, c as suas com- traços verticais, o que realça as fortes linhas horizontais e, em
posições assumiram uma poderosa integridade estrutural, já simultâneo, denota a grelha compositiva da pintura.
indiciada pelas obras da juventude, mas que só agora florescia. Vários aspectos da pintura podem ser lidos de duas tormas
Como mais tarde veio a afirmar, queria *criar qualquer coisa diametralmente opostas. Por um lado, temos a pincelada vacilante
sólida a partir do Impressionismo, como as pinturas nos museus". dos Impressionistas, mas a imagemé de uma imobilidadeestru-
Podemos ver como atingiu este objectivo numa obra da década tural. Se bem que o quadro seja uma profundíssima vista
Montanha de Sainte-Victoire (fig. 26.1), pintado na panorâmica, os planos são achatados e superficiais, uma vez que
seguinte,
Provença, entre 1885e 1887. Esta tela apresenta as característi- o céu, supostamente ao longe, pertence ao mesmo plano dos ramos
cas típicas do lmpressionismo, representando uma paisagem da árvore. Esta fusão deve-se, em parte, a uma espessa tapeçaria
cheia de luz. pintada com largas pinceladas e cores razoavelmente entretecem com as
de rápidas pinceladas esbranquiçadas que se
vivas. A princípio, parece-nos brilhar, mas de repente tudo se agulhas de pinheiroeo azul do céu; contudo, as pinceladas pare
imobiliza. Cézanne entreteceu a imagem numa rede subtil de cem sobrepostas, criando um sentido de espaço ou de profundidade
formas que se repetem entre si. Os ramos sinuosos e curvados entre si. Cada linha desempenha duas funções, uma vez que
da árvore em prineiro plano podem ser encontrados nas mon- podem ser lidas como sombra, como por exemplo no cune
tanhas e colinas ao fundo. Por seu turno, as linhas diagonais na montanha, dando uma sensação de profundidade, ou então tun
orla dos pastos verdes ressoam nas casas, no declive das monta- C1Onam como simples linhas dle contorno. Há aqui um conthto
senta
nhas e na dircccionalidade das pinceladas paralelas, agregadas entre oigurativismoe a albstracção, porque se a pintura represe
cst.inos
em pequenos grupos, como exennplificam as agulhas do pinheiro. umapaisagem existente, não nos é pernitido esquecer que
A presença cúbica da casa imediatamente à dircita do tronco da olhar ara una tela plana, preenchida por manchas dde cor e
árvore repete-se nas combinações de pastos verdes planiformes pelo traço. Poxdemos também sentir todo o tempo que tou neces
o
entre
e de campos ocres, antes de se dissolverem de novo em delgados Sario pura resolver estes contlitos e atingir o cquilíbrw
De uma Carta a Emile Bernard ptens Acterne Deus desdobra perante os nossos olhos. Mas para nós
homens, a naturcza é mais profundicdade do que superficic, de onde a
3ernard trabalhou com Cianguin na formmulaçio do estilo da Escola de Pont necessidade de introduzir na nossa luz vibraçöcs representadas pelos
Aren, tendo iniciado uma troca de
correspondência com Cézanne, depois de vermelhos c pelos amarelos e uma quantidade suficiente de azul para
r2) cneontro em Aixen-Provence, na Pramavera de 1904, altura em dar a impressão de ar.
que esta
curtufoi redigida.
P natureza
a
pelo cilindro, a
esfera, o cone, tudo na sua perspectiva OE PAuL CEZANNE. LETTERS. ED TR. MAR GUERITE
adequada, de maneira que a CASSIRER, 1946))
JOHN REWALD, KAY (LONDRES. BRUNO
espaço plano
e o
espaço tridimensional. Cézanne levou anos a
de parede. O conjunto é enquadrado pelas fortes horizontais da
pintar nmaior
a
parte dos seus
quadros, ponderando cuidadosa- mesa. Cada maçã tem uma poderosa presença física, uma vez que
mente cada pincelada (ver Fonte Primária,
acima). c construída por pinceladas largas, em "fatias", c a sua forma é
Além de paisagens, Cézanne executou retratos de
amigos e
conhecidos (nunca precisou de aceitar encomendas, vivendo cuicadosamente desenhada por uma linha distinta. As dobras do
de pano manifestam a mesma plasticidade e a sua tactilidade ilusio-
uma modesta pensao que o pai Ihe
dava), naturezas mortas c nista é reforçada pela presença concreta de camadas de tinta
pinturas com figuras humanas, em particular, de banhistas na
paralclas. Porém, a pintura também possui uma energia nervosa
paisagem. Em cada um dos géneros estão patentes os mesmos euma bidimensionalidade etérea: a borda da fruteira
conflitos e a
supressão da tensão. Em Natureza-Morta com
mesma avança para
além do plano que lhe parece destinado e o mesmo acontece com
Maçãs numa Fruteira (tig. 26.2), sentimos de imediato a monu- O prato, que desaparece por detrás das maçs, dificultando a
mentalidade de um Chardin (ver fig. 22.8). As maçs da fruteira
rclação espacial entre os dois. O próprio tampo da mesa ë espec
estão em equilíbrio com as
nmaçs sobre o
pratoeo pregucado do Cialmente desorientador, em termos
pano branco estå espaciais, por parecer
em
equilibrio com o motivo fitomórfico do
papel inclinar-se em direcção ao observador, em vez de se atastar em
a Cézanne. Natureza-Morta com Maçãs numa Fruteira. 1879-1883. Ölco sobre tela, 43,5 x 54 cm.
Ghptoteca Ny Carlsberg,
Copenhaga, Dinamarca
direcção ao fundo. Os núcleos formados pelas pinceladas são de atmosfera, a imagem, tal como qualquer pintura impressionista,
claramente marcas bid1mensionais e cobrem a supertície com uma parece, paradoxalmente, estar cheia de luz, espaço e movimento.
energia nervosa. Esta energia éé representada pela estranha vida Ao olharmos para esta pintura hermética não podemos deixar de
interior que anima as pregas do pano branco. Entretanto, o padro sentir como a tensão ea energia dos primeiros quadros românti-
com folhas do papel de parede parece fugir à suposta função cos do pintor foi suprimida e canalizada para uma luta pela
bidimensional e assumir uma vida tridimensional, tão concreta criação de imagens que equilibram a observação directa da natu-
como a das maçs ou das pregas. Cézanne abandonou a observa- reza com o desejo do pintor de tornar abstractas as formas da
ção fiel da realidadee passou a criar o seu próprio universo Natureza. Foi nesta obra que o pintor melhor conseguiu libertar
pictórico, que obedece a uma ordem estética pessoal e reconhece, o meio da sua função representativa, permitindo que os pintores
em cada nmovimento, que a pintura é inerentemente abstracta -ou seguintes pudessem inventar imagens que aderiam às leis próprias
seja, a pintura é a colocação da tinta sobre uma tela para criar e inerentes da pintura. A galeria parisiense Durand-Ruel começou
uma composição de linhas e cores. a expor as obras de Cézanne no final da década de 1890 o que
A pintura de Cézanne tornou-se cada vez mais abstracta nos viria a exercer uma poderosa influência sobre os artistas, parti-
úlimos dez anos da sua vida, como podemos ver na Montanha cularmente sobre Pablo Picasso e Henri Matisse.
Sainte-Victoire Vista da Pedreira de Bibermus (fig. 26.3), pintada
entre 1897 e 1900. A Montanha Sainte-Victoire foi um dos seus Georges Seurat: a Procura da Harmonia
motivos preferidos, chegando raiar obsessäão,
a a uma vez
que Sociale Pictural
aparece em cerca de 60 pinturas e aguarelas da fase tardia do Como Cézanne, Georges Seurat (1859-1891) quis aproximar o
pintor. A profundidade patente na primeira vista da montanha
Impressionismo dos grandes mestres do passado. Frequentou,
(ver fig. 26. 1) foi entretanto substituída por uma versão mais
apenas por pouco tempo, a Ecole des Beaux-Arts com um
comprimida. A sobreposição de objectos figurativos é um dos
seguidor de Ingres e, depois de cumprir unm ano de serviço
poucos artifícios que indicam profundidade. De resto, a paisagem
militar obrigatório na Bretanha, regressou a Paris, onde passou
é umaintensa rede cuidadosanmente executada
que pede para ser
lida como uma intricada tapeçaria
o resto da sua breve vida. Começando a trabalhar em
atele
espacial. As árvores em primeiro próprio, em 1884, apresentou o seu novo estilo numa grana
plano extravasam pela superfície da pedreira e a árvore no canto
tela intitulada Banhistas em Asnières, em que representa u
superior direito espalha-se pelo céu. Este, por seu turno, funde-se
grupo de trabalhadores nadando no Sena num subúrbio par
com as montanhas, separado destas apenas pela linha que desenha Siense de classe operária, próximo do local onde Seurat crescera.
os cumes.
Apesar da bidimensionalidade e da aparente ausência Recusado 1584
pelo Salon, o quadro foi apresentado em
n
Seurat participou no que viria a ser a última exposição impres- nomem de camisa sem mangas que fuma um cachimbo à direita,
sionista, em 1886, para a qual contribuiu com Tarde de Domingo em primeiro plano (o catálogo de tipos de Seurat estende-se aos
na Ilha da Grande Jatte (fig. 26.4). As datas das duas exposições cães em primeiro plano e aos barcos no Sena). Seurat apresenta
Sao importantes, porque assinalam o fim da era impressionista as suas figuras como ícones, uma vez que cada uma foi pintada
ea ascensão do Pós-Impressionismo.
de perfil, frontal ou a três quartos, obedecendo às prescrições
A Grande Jatte tem raízes óbvias no realismo de Manet e nas do arquitecto romano Vitrúvio para a disposição de figuras
de Monet, uma vez que se trata aqui de escultóricas em templos. Seurat declarou que desejava "fazer
telas impressionistas
tarde ensolarada e desfilar as suas tiguras como se fossem as estátuas de Fidias no
uma cena de lazer da classe média, numa
ualquer substância oleosa que tornou o meio mais apetecível para os editores de jornais e revistas,
O.simples, Aloys Senefelder,repele água.
inspector
a
Partindo deste
da Imprensa
principio
Nacional de
cujas tiragens
ram em
aumentavam. Dos muitos ilustradores de
jornais que trabalha-
Munique, inventou a
litografia, pouco depois de 1800. Neste litografia, Honoré Daumier foi o mais aclamado (ver fig. 25.4).
artista desenha sobre pedra com um processo, o Com o desenvolvimento de impressoras de maiores dimensões e com
bastão ou tinta oleosa, chamada tusche. Ratora
papel
a
capacidade de imprimir em várias cores,
Seguidamente, a pedra é humedecida com a
litografia tornou-se meio
Pedra o
preferido
água. que é absorvida pela pedra porosa, Com tinta para a impress o de cartazes. Nas últimas
excepto nas áreas ocupadas pelo dese ogranca décadas do século XIX, os cartazes come-
nho. O gravador aplica então a tinta de çaram a apresentar imagens, além de
luz". No importa que Seurat tenha interpretado Rood errada- Estética Científica (1885). Henry alegava que as cores, bem comno
mente e
que este argumento não seja verdadeiro, porque o as linhas, tinham significados emocionais específicos (por exem-
pintor acreditava que as cores eram mais lum1nosas do que as plo, o amarelo ou uma linha ascendendo a partir da horizontal
dos
Impressionistas e certamente
técnica, a que deu o nomne
a sua são conotadas com a felicidade, enquanto o azul ou uma linha
de "cromoluminarismo" e
que os académicos vieram mais tarde descendente evocam tristeza). Seurat pôs a teoria em
a chamar "Pontilhismo" ou "Divisionismo", criava uma prática nas
super grandes telas realizados nos últimos cinco anos, de pinturas género
ficieuniforme e vibrante que redundou num impressionismo que figuram entretenimentos populares urbanos como circos e
sistematizado. Tal como as figuras, a superfície regularmente cabarés. No alegre e festivo Le Chahut
(fig. 26.6), de 1889-1890,
pontilhada das telas de Seurat parece mecânica, como se a reac- é impossível não dar pela predominância da tonalidade de ama-
gão subjectiva mão-olhar dos impressionistas tivesse sido relo e das linhas verticais ascendentes. A cena
representa o final
substituída por uma máquina capaz de registar a cor e a luz de um can-can, num clube nocturno do ateliê de Seurat,
perto
com pontos uniformes de tinta. uma cena tão baseada na realidade
que permite identificar os in-
Na sua crítica dessa exposição impressionista, Fénéon chamou tervenientes, embora estes, como o público em cada um dos lados
Neo-Impressionismo", ou Novo Impressionismo, ao estilo de da passarela, também funcionem como um
catálogo de tipos.
Seurat serviu-se da composição de
eurat. Antes do final da década, o novo estilo contava já com enquadramento cortado e cheia
de figuras, ao estilo de Degas, imobilizando as
uma legião de
seguidores atraídos pela abordagem científica, pela e até mesmo figuras
monumentalidade e pela aparência moderna. Muitos mantiveram
o mobiliário e adereços como as lamparinas a gás, transformando-
O estilo durante uma parte considerável do século xx. Por muito -os em
poderosos ícones. A sua crença apaixonada na ciência, na
tecnologia e nas máquinas como instrumentos para atingir o
nvulgar e inconfundível que seja esta técnica, seria um erro
progressoea igualdade será mais tarde
partilhada geraçöes
caigar a sua
importância em detrimento do significado das obras posteriores de pintores.
por
c arte. Seurat era um simpatizante socialista, dedicado a criar
TULO 26 o PROGRESso E OS SEUus DESCONTENTAMENTOS: O PÓS-IMPRESSIONISMO. O SiMBOLISMO E A ARTE NOVA (1880-190s) 93s
contornos dos chapëus evocam Seurat e indicam as diferentes
OULIN ROUGE (Valentim sem Ossos), conhecido pela idiossincracia da sua danca.
26.9. Vincent van Gogh. Os Comedores de Batatas. 1885. Oleo sobre tela, 82x 114,3 cm.
Fundação Vincent van Gogh, /Museu Van Gogh, Amesterdão
O L O 26 O PROGRESSO E OSs SEUS DESCcONTENTAMENTOS: O PÓS-IMPRESSIiONISNO, O siMBOLISMO E A ARTE NOVA (1880-1905) 937
26.10. Vincent van Gogh. Retrato do Père Tanguy. 1887-188. Óleo sobre tela, 92 x 75 cm. Mus e Rodin, Paris
artísticos inclucn Millet, cujas poderOsas modelos seus Década de 1880 As nações europeias colonizam a África
empáticas
taçöcsde camponescs ecoam nas de van Gogh, seu represcn-
e
ca. 1885-1887 Montanha Sainte-Victoire, de Cézanne
e o
Rembrandt, cujo tencbrismo envolve esta ceia
compatriota 1888-1889 Café Nocturno, de van Gogh
ritualista., num humilde, quase 89 Paul Gauguin visita o Taiti pela primeira vez
manto de reverëncia. O quc
ingenuiclade técnica de van Gogh, quedistingue esta ima- 899 Claude Debussy compõe os Nocturnos
gem é a
confere à
pintura
uma energia crua; esta, por sua vez, dota os
c
vez dc
suspensa, parece sistemática, fazendo-a percorrer
antes destacar-se Tanguy, investindo a sua figura
da parede -
26.11. Vincent van Gogh. O Cafë Noctuwno. 1888. 72,4x92,1 cm.Galeria de Arte da Universidade de Yale,
New Haven. Legado de Stephen Carlton Clark, B.A. 1903.1961.18.34
APITULO 26 O PRoGRESSO E OS SEUS DESCONTENTAMENTOs: o PÓS-IMPRESSIONISMO, O SIMBOLISMO EA ARTE NOVA (1880.1905) 939
26.12. Vincent van Gogh. Noite Estrelada. 1889. Óleo sobre tela, 73 x 93 cm. Museu de Arte Moderna,
Nova lorque. Compra do Legado de Lillic P. Bliss (472.1941)
Nocturno e Noite Estrelada. As suas emoçõcs intensas e descon- de estrelas, que ligam a terra a um plano transcendental. O céu ê
iluminado por um espectacular fogo-de-artificio cósmico - nos
troladas subiram à tonaea sua pintura tornou-se cada vez mais
halos das estrelas e nas nuvens em movimento jubiloso ccoa
expressionista,servindo-se da cor para transmitir emoção, não
tanto para documentar a realidade, empregando um vocabulá- a ondulação das montanhas e das árvores, em baixo. Captando a
rio pessoal e simbólico. Em Cafë Nocturno (fig. 26.11), van Gogh energia deste vocabulário expressionista, van Gogh pintou o mundo
exprimiu a sua repulsa por aquele antro de iniquidade de Arles, primitivo ea utopia com que sonhava: a paz e a tranquilidade das
pessoas simples e despretensiosas, que se nutrem da natureza
c
afirmando querer "expressar as terríveis paixões da humanidade
estão em harmonia com as forças universais. Contudo, apesar da
através do vermelho e do verde". O uso simbólico de cores
frenética produção artística c dos seus anseios humanitários, van
complementares cria uma atmosfera de uma acidez rude, tornada
mais agressiva pela gama dissonante de tonalidades esverdeadas Gogh era um homem profundamente perturbado, que comegou
a0s poucos a duvidar da sua capacidade de pintar e que acabou
da mesa de bilhar, dos tampos das mesas, do bar, dos tectos e
até no cabclo do empregado. O mórbido vermelho-sangue das por cometer suicídio, um ano depois de pintar a Noite Estrelada.
paredes extravasou para as estridentes tábuas do soalho, cujo
amarelo parece conotado com o inferno, não com a alegria, uma Paul Gauguin: a Fuga à Modernidade
aura retorçada pclos raios que emanam das lamparinas a gás Paul Gauguin (1848-1903) é o quarto pintor do principal grpo
suspensas do tecto.
dos Pós-lmpressionistas. Partilhava com van Gogh o repudo
Contudo, a personalidade que transparece da maior parte das pela civilzação avançada e ansiava por uma alternativa utópica
obras de van Gogh é a do evangelista secular que celebrava a vida Oseu atastamento da sociedade foi, talvez, o mais radical en
na sua plcnitude e ansiava pela harmonia universal, como está os artistas do seu tempo. Tendo começado por ser um correc
patente em Noite Estrelada (fig. 26.12). Neste quadro vemos, ani- da bolsa atraído pela pintura, que coleccionava os Impression
nhadas num vale escondido, as luzes convidativas dos simples lares as, comcçou a pintar nos inícios da década de 1870. Em I882
rurais. O brilho amarclado das janelas rectangulares une-as às Gauguin perdeu o emprego e dedicou-se por completo a pu
estrelas arredondadas do univers0 nocturno, i0 cimo, Começou a estudar com o scu amigo Pissarro, que Ihe apre
num
contrastec
harmonioso entre os clementos yin e yang. O primeiro plano é tou a obra de Cézanne. Participou nas quatro iltimasexpo
dominado por um cipreste que ascende em espiral, paralelo ao 1mpressionistas, entre 1881 e 1886. Neste últimoano, abandon
vida
Paris e começou uma existência nómada, procurando u i a
campanário da igreja. Ambos penetra unn céu em chamas, repleto
uanto nmin, tomci uma apenas conhecem a suavidade da vida. Viver, para cles, é cantar e
arnar.
a decisão. Em breve
partirei para o Taiti, Mal tenha a minha vida naterial organizada, poderei devotar-me as
umapequena ilha na Occânia, onde as necessicdades materiais da
grandes obras de arte, livre de todas as invejas artísticas e sem qualquer
vida podem ser obtidas sem dinheiro. (Quero deixar
para trás todos os
necessidadc do baixo comércio.
infortúnios do passado quero ser livre para pintar sem esperar qualquer
c
26.13. Paul Gauguin. A Viso Depois do Sermão (ou Jacob eo Anjo). 1888. Oleo sobre tela, 73 x 92,7 cm.
OLO 26 O PROGRESSO E OS SEUS DESCONTENTAMENTOS: O POS-IMPRESSONISMO, o SiMBOLISMO E A ARTE NOVA (I 880-1905) 941
CAPITUL
26.14. Paul Gauguin. De Onde Vimos? Para Onde Vamos? Ouem Somos? 1897. Oleo sobre tela, 1,39 x 3,74 m.
Fotograti.a © Museum of Fine Arts, Boston. Arthur Gordon Tompkins Residuary Collection. 36.270
O impacto do vitral medieval e do cloisonné está patente na enquanto uma estatueta de um deus preside ao bem-estar dos
Tisão depois do Sermão, de Gauguin (fig. 26.13), em que tudo ilhéus, distribuindo bênçãos e uma intensa espiritualidade sobre
parece definido por uma única linha azul ondulante. Gauguin cada aspecto da vida quotidiana, ao mesmo tempo que aponta
apresenta um grupo de mulheres bret s que acabaram de ouvir para o céu e para a vida depois da morte. A paisagem tropical
um sermão dedicado à luta entre
Jacob e o Anjo. O artista atri- é densa, luxuriante e sensual, uma tapeçaria abstracta de formas
bui às nmulheres uma fé ingénua e cega, que lhes permite ver
profundamente saturadas, bidimensionais e curvilíneas, em que
espiritualidade em seres tão mundanos como uma vaca, cuja tudo parece flutuar. A vida é lânguida e
forma lembra a das duas figuras bíblicas que o padre acabara
despreocupada: aqu,
o
tempo parou. Assim, quando a tela foi apresentada em Paris
de descrever. Numa composição
ousadae devedora das gravu- não surpreende que os críticos a tenham comparado com os
ras japonesas (fig. 25.31), Gauguin colocao bovino e os lutadores mundos clássicos de leite e mel criados por Puvis de Chavannes
de cada um dos lados de uma árvore, em forte contraste com (ver Fonte Primária, página 941).
um intenso campo místico de cor vermelha. Os objectos da visão Como o título sugere, a pintura representa os três estádios
das mulheres existem claramente numa estera supraterrena, na da vida que encontramos nos quadros renascentistas: o nasci-
qual parecem flutuar como por magia. 'Tudo parece possuído, mento é representado à direita, a juventude ao centro e a velhice
na pintura de Gauguin, como se estivesse investido de uma no extremo esquerdo. A figura central é, sem sombra de dúvida,
religiosidade invisível. Os atilhos de duas das toucas movem-se uma Eva taitiana. A estátua da divindade é uma compilação de
como serpentes, enquanto as silhuetas dos toucados das duas
figuras de divindades: a deusa taitiana Hina, um Buda javanës
mulheres, à csqucrda, parecem animados de vida própria. Por e um megálito da Ilha da Páscoa. Os torsos foram retorcidos ate
toda a
magem encontramos formas bidimensionais e curvilíneas, se assemelharem a figuras egípciase os cantos dourados, como
caté formas no
mesno
a vaca c os lutadores.
interiorde
formas, pairando, tal como itulo e a assinatura, lembranm os primeiros ícones bizantinos C
América do Norte
O colonialismo, tão alegre mplacavelmente prosseguido
e partilhavam o ncsmo intcresse por estes
de
pelos temas transcendentais, nuna época em
que as pessoas procura-
construtores mpérios, transtormava-se agora num símbolo
da corrupção da Civilização Ocidental.
vam alívio do matcrialismo grossciro da modernidade. Além
de intercssarem
se
pelas religiões do Próximoc
Extrcno Oriente,
muitos dos Nabis deixaram-se influenciar
pela popularidade da
O SIMBOLISMO Teosofia c do Rosacrucianismo.
Encquanto
o misticismo teosófico
nais e a
psicologia mais clenmentar.
Os Nabis
1mpacto de Gauguin foi tremendo e, por volta de 1890, 0s
utrec (ver fig. 26.7), scndo ainda visiveis em muitos dos seus
ieos, como No Moulin Rouge (ver fig. 26.8). Gauguin eNereeu
nbéin uma influência formativa sobre os Nabis, uuna organn- 26.15. Flouard V'uillard. O. 1relië (ou ) Petendente). I893.
Olco sobre cartio, il,S x 35,0 cm. Smth College Nluseum of Art.
secreta fundada, cem 1888, por jovens pintores parisenses, Northapton, Mass.achusctts. Connpra do Fundo Drayton Hillyer,
clundo Edouard Vuillard e Pierre Bonard, dois artistas pr 1938. SC. 1938:15 .Artuts Right» Sacicty (.ARS), Nova lorque
amente impressionados pela novidade e pela espiritualidade ADAGP, Paris
APITULO 26 O PROGRESSO E Os SEUS DEScoNTENTAMENTOS O POS.IMPRESsiONISHO. o SIHBOLISMO E A ARTE NOVA (1880- 1 905) 943
Natura). de 1884. O protagonis
À Rebours (Contra
narratia de um qualquer evento-écssencialmente
uma
uma ordem
super-
é um
excêntrico
desencantado
de
que enclausura
se
objectos tão
usura Huysman
num estranho
ficie bidimensional coberta por cores, segundo mundo de
sonho, repleto surreais Cono
numa abstracção estâ incrustada de bvas, e uma
cspecifica". Esta ideia de realidade dissolvida
concha
viva, cuja
Vuillard. tartaruga obras de
íntimo óleo de Redon.
de cmoçõcs pode ser vista n o pequeno e arte de Moreau e
vemos o tema
datado de 1893, O Pretendente (fig. 26.15). Aqui,
pintores atraíram a atenção do público quando Delacroix e fazem tudo resplandecer (a própria paleta é inspirada
seguinte. Os dois
no romance simbolista de Joris-Karl Huysman,
apareceram
ulone
26.16. (Dunçuue a r
do Loure, p
Gustave Moreau. A Aparição
Cal.1876. Aguarela, 106 x 72 cm. Musc
RF 2130
6.18. Henri Rousseau. o Sonho. 1910. Oleo sobre tela, 2,05 x 2,96 cm. Museu de Arte Moderna, Nova lorque.
DOão de Nelson A. Rockefeller. O Herdeiros de Henri Rousseau
CAPITULO
LO 26
26 O
O
PROGRESSo E OS SEUS DESCONTENTAMENTOS: O PoS-IMPRESSIONISMO O SIMBOLISMO E A ARTE NOVA (1880-1905)
PROGRESSO 945
MAX KLINGER Em Berlim, o pintor e escultor quc melhe
granulosas c indist1ntas, elhor
pocticos. Os objectos, de arestas suavcs,
rcpresentou o Simbolismo foi Max Klinger (1857-1920), Em
flutuam, deslizam e
pairam no ar.
Tudo écquívoco no inundo 1881, Klinger executou una série de dez gravuras, sob o titulo
de Redon c num curioso estado de fluxo evolucionário. Na ima- de A Luva, tão sugestivas, incxplicáveis e psicologistas corm a
balão se metamorfoscia
gem aqui reproduzida, vemos como um
resposta de Redon à obra de Poc. A sua obra talvez seja mais
lentamente num olho pestanudo e abre o cu ao ascender, trans
ilustrativa c convencional, com uma narrativa forte, mas nin
portando uma carga misteriosa, enquanto uma planta primorda,
deixa de ser igualmente bizarra e alucinante. Cada gravura da
de frondes pirotécnicas, reluz contra um mar negro e proibido.
série mostra uma tentativa fútil de recuperar uma luva perdida.
ritos de
O Olho revela conotaçõcs de ressurreição, transcendência, Em O Rapto (fig. 26.19), uma luva é roubada por um pásaro
passagem, vida, morte, eternidade e desconhecido, mas o signifi
se escapa a custo dos braços que se estendem
cado narrativo da imagem permanece envolto em mistério, pré-histórico, que
em sua perseguição, através dos vidros estilhaçados de uma janela
sentimento de
prevalecendo uma psicologia perturbadora e um
Em baixo, encontramos um ramo de flores brutalmente cortadas,
incerteza assustadora.
Como em 0 Olho de Redon, é o psicologismo perturbador que
não uma histôria racional. A luva antropomórfica éE
HENRI ROUSSEAU A preocupação simbolista com o retrato prevalece,
das pulsões humanas fundamentais e a psicologia do desejo apresentada fetiche, u m objecto imprescindível, sím-
como um
reconhecimento oficial em vida, mas, em 1905, e a anarquistas e, em 1883, ajudou fundar, Bruxelas, o
a em
recebeu qualquer
contraponto belga da associação de Artistas Independentes
foi descoberto por Pablo Picasso e pelo seu círculo, que
encon-
naives a honestidade criativa e a Parisienses. Chamados Les Vingt (Os Vinte), organizavam expo-
traram nas suas pinturas
autenticidade que sentiam faltar à arte académica. sições sem júri com vários artistas belgas de todas as tendências,
dos Impressionistas aos Neo-Impressionistas e aos Simbolistas.
Porém, quando o grupo começou a expor Whistler, Seurat
e
estranhas oníricas não eram o exclusivo da comuni- nalista belga, retirou-se de vez para Ostende, onde mergulhou
Imagens e
No final da década de 1880, uma num mundo próprio de repúdio pela falsidade, artificialismo,
dade artística parisiense.
Virando as
estética simbolista sobrenatural, que conjugava a fantasia, a corrupção e falta de valores da civilização moderna.
a
evasão e a psicologia, puderam ser encontradas por todo o mundo costas ao retinamento da arte académica, o pintor abraçou
ocidental, incluindo nos Estados Unidos da América. cultura popular, declarando: "viva a pintura naif e ignorante!.
O seu nacionalismo e o desprezo pelo artitício não sincero EDVARD MÜNCH Muita da pintura simbolista foi influenciada
levaram-no a admirar as grotescas representações de Bruegel e elos intrigantes e sinuosos padrões conmpositivos de Gauguin,
de Bosch. Essas manifestações da cultura carnavalesca, que os bem como pela sua abstracção e um desejo de explorar visual-
mestres antigos pintaram, ainda sobreviviam em Ostende, num mente as forças psicológicas mais elementares subjacentes à
festival anual, para o qual a loja Ensor vendia máscaras. civilização moderna. Talvez ninguém o tenha feito melhor do
A maturidade de Ensor pode ser vista na sua enorme tela que o pintor norueguês Edvard Münch (1863-1944), cujo estilo
de 4,3 m de comprimento, chamada A Entrada de Cristo em
Bruxelas enm 1889 (fig. 26.20). O quadro, cxecutado em 1888,
representa a segunda vinda do Messias. Este, diminuto e sobre
o dorso de um burro, quase desaparece no plano de fundo,
debaixo da bandeira que ostenta "Viva o Socialismo" e abafado
pela multidão. Os participantes, por seu turno, envergam más
caras, que revelam (em vez de ocultarem) a ganância, a
corrupçãoea imoralidade que pulsam sob a falsa máscara da
SOCiedade contemporânca. Ensor apropriou-se das máscaras da
oja dos pais para conferir à imagem uma rudeza grotesca e
primitiva e pintou todos os elementos do quadro com uma crueza
euma distorção que costumamos associar às formas artísticas
populares-a caricatura, o graffitti ea artenaive e infantil. Um
Vermelho berrante intensificado pclo verde complementar realça
a estridência desta imagem repulsiva e claustrofóbica. Estamos
TULO 26 o PROGRESSO E OS SEUS DESCoNTENTAMENTOS: O POS.IMPRESSiONISMO,. o SIMBOLISMO E A ARTE NOVA (1880-1905) 947
amadureceu no início da década de 1890, depois de uma tem-
porada cm Paris, onde pode ver as telas de Pont-Aven do seu
amigo (iauguin e o intenso colorido e a pineclada das pinturas
de Arles. de Van Gogh. Os temas de Münch eram semelhan-
tes aos dos seus amigos escandinavos, os dramaturgos Henrik
Ibsen e August Strindberg, cujas investigações sobre a sexua-
lidade e sondagens sobre o significado da existência chegaram
aos lugares mais recônditos da mente, para aceder às forças
primordiais.
Münch criou uma imagem de horrífica ansiedade em O Grito
(fig. 26.21). pintada em 1893, depois de o pintor se mudar para
Berlim. Uma figura comprimida, contorcida e grotesca agarra
a cabeça com as mãos, dando voz a um medo primordial que
A violenta
parece canalizado a partir da paisagem histérica, atrás.
perspectiva do passadiço em diagonal e a pincelada estilo de
ao
melancolia,
em Christiania (hoje Oslo), Münch, já preso pela
intinito, atra-
escreveu no seu diário "...senti um grito
enorme,
vessar a Natureza".
Y nMYNPO MODERNo
GUSTAV KLIMT O ascinio
pelos padrões orgânicos e pelos A ARTE NO SEU TEMPO
significados psicologicos que estes podem transmitir perpassa
também pela obra <de Gustav Klimt (1862-1918), cuja carreira 883 O grupo Les Vingt é fundado na Bélgica
884 PaulVerlaine publica Les Poètes Maudits (Os Poetas Molditos)
se desenrolou principalmente em Viena. No início de 1902,
886 Friedrich Nietzsche publica Pora além do Bem e do Mal
Klimt executou uma série de pinturas centradas no "beijo", cuja
1888 O colectivo Nobis é fundado em França
melhor versão toi executada cntre 1907 e 1909 (fig. 26.23). 1893 O Grito,de Edvard Münch
Embora o tema retlicta a própria vida pessoal de Klimt (a mulher
897 Formada
representada era a sua amante), o tema é de inspiração simbolista
a
Secessão Vienense
1900 Sigmund Freud publica A Interpretação dos Sonhos
c está directamente relacionado com uma
pintura de Münch de ca. 1910- Henry O. Tanner, Aparição dos Anjos aos Postores
1897. dedicada ao mesmo tenma (os dois quadros,
por sua vez,
inspiraram-se em O Beijo, de Rodin). No quadro de Münch, um
casal aprescnta-se unido da mesma maneira; porém, o par forma
uma massa escura simples, em que os rostos dos amantes estão paixão, bem como a sua natureza efémera c consequëncias
assustadoramente unidos, como se cada um absorvesse o outro. dolorosas.
A versão de Klimt do mesmo tema, rico O Beijo possui também um forte pendor decorativo, evidente
com o
padrão de super-
fície, mostra um homem sem rosto, que nas roupagens exóticas dos dois amantes. Em 1897, Klimt foi
perde a sua identidade
e se deixa atrair por uma mulher sedutora um dos 22 fundadores e o primeiro presidente da Secessão
mas indiferente, que
parcce prestes a puxá-lo para o abismo em baixo. A mulher fatal Vienense, uma organização vanguardista de artistas que inte-
-
figuras com vestes em folha de ouro, ornamentadas por ricos gava as artes decorativas para os escalões inferiores.