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Sociologia e os Aspectos da Segurança Pública |

Introdução

DISCIPLINA
SOCIOLOGIA E OS ASPECTOS DA
SEGURANÇA PÚBLICA

CONTEÚDO

Encarceramento em Massa
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Sociologia e os Aspectos da Segurança Pública |

Introdução

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Introdução

1 Sumário
2 Introdução ................................................................................................................. 4
3 Encarceramento em Massa ........................................................................................ 5
4 Segurança Pública no Brasil ....................................................................................... 6
5 Desigualdade Social ................................................................................................... 7
5.1 Da superpopulação carcerária .................................................................................................. 8
5.2 Perfil da População Carcerária ................................................................................................ 11
6 Encarceramento em Massa e Encarceramento em Pobreza ...................................... 12
6.1 Desafios e Soluções ................................................................................................................ 15
7 Conclusão ................................................................................................................ 17
8 Referências Bibliográficas ........................................................................................ 17

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Introdução

2 Introdução
O renomado sociólogo e criminologista Jock Yong discorre em sua obra intitulada
“Sociedade Excludente” (2002) sobre o aumento considerável da taxa de crimes
registrados após a década de 1960 na maioria dos países industriais e sobre como
este, dentre outros fatores, impulsionou uma reavaliação do sistema de justiça
criminal. Tomando por base a teoria da causalidade, o autor descreve como esse
problema contradizia a crença de que a criminalidade resultava de más condições
sociais, dado que eclodia em um período em que o Ocidente prosperava, de pleno
emprego.

Nesse sentido deram início aos debates acirrados entre as doutrinas classicista e
positivista quanto a natureza do crime, o papel da justiça criminal e “a possibilidade,
pela intervenção do governo, de um contrato social dos cidadãos. Explica o autor que
esse processo abrangeu, além dos estudos da criminologia, todas as outras áreas das
políticas sociais, “pois o crime e as ansiedades que o circundam são, como sempre, a
rosa-dos-ventos a mudar em nossa sociedade”.

Desde então, a questão da criminologia tem suscitado diversos debates em diversas


esferas da sociedade, entendendo-se necessário, para esse debate, situar a
criminologia no contexto dos problemas sociais, que perpassam a questão da
criminalidade, e das correntes políticas e sociais difundidas nesse contexto, porém,
não obstante, compreender as engrenagens internas que movem a criminologia
quando desprendem-se das forças externas.

Na atualidade, o entendimento quanto a questões que envolvem a criminologia


continua não sendo pacífico, e nessa esfera de discussão debate-se o tema da pena
privativa de liberdade e o grande número de encarcerados punidos com esta pena.
Há aqueles que defendem que é necessário, dentre outros, restringir os crimes que
resultam nessa pena, assim como há aqueles que defendem que é necessário investir
na ampliação de penitenciárias e outros espaços para o cumprimento da pena. Assim,
nesta aula, abordaremos alguns temas que podem ser considerados para o estudo e
a reflexão sobre a situação carcerária no Brasil.

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Encarceramento em Massa

3 Encarceramento em Massa
O termo aprisionamento em massa, ou encarceramento em massa como
popularmente utilizado no Brasil, surgiu, nos Estados Unidos, em meados da década
de 1970 e pode ser caracterizado a partir de sua manifestação mais acentuada que é
“uma taxa de encarceramento historicamente sem precedentes, altamente
concentrada em comunidades específicas” (BROWN, 2017, p. 495), fenômeno este que
pode ser encontrado de forma acentuada em diversos países ocidentais pós-coloniais.

O termo tornou-se popular em 2001 com a publicação de uma edição especial do


jornal internacional de penologia, intitulado Punishment and Society. O destaque que
se dava nessa publicação era referente a taxa de aprisionamento significativamente
acima da norma histórica para esse tipo de sociedade, além dos efeitos que isso gera
na sociedade. Neste sentido, define-se o encarceramento em massa como aquele que
sai da esfera individual e passa para o “aprisionamento sistemático de grupos inteiros
da população” (GERLAND, 2001a, apud BROWN, 2017). Assim, o autor explica:

Isso não significa negar as categorias jurídicas tradicionais de culpabilidade e responsabilidade


individual que dominam o discurso legal, popular e político. Significa nada mais que localizá-
las dentro de uma análise sistêmica ampliada dos padrões e efeitos produzidos pelas políticas
e práticas da justiça criminal referente à raça, desigualdades, vulnerabilidades, classe, gênero,
direitos civis e cidadania (BROWN, 2017, p. 500).

Nesse processo, não só o indivíduo penalizado é parte da criminalidade, mas também


sua família, de forma que em algumas comunidades todos têm contato com alguma
pessoa que já esteve ou está na prisão, seja um membro da família, vizinhos, amigos
ou conhecidos. Neste reduto estão inclusos não só os condenados a penas longas,
mas também os presos preventivamente, que aguardam o julgamento nas cadeias
públicas.

A discussão desse tema é muito importante, pois aborda questões sobre políticas de
ressocialização, inclusão social, relações de segurança pública, entre outros.

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Segurança Pública no Brasil

4 Segurança Pública no Brasil


A segurança pública está prevista no art. 144 da Constituição Federal, trata-se de um
dever do Estado e uma responsabilidade de todos que têm direito a ela.

A segurança pública não envolve só a ideia de policiamento, mas também um aspecto


coletivo, social. Nesse sentido, é impossível não citar esse tema ao falar sobre o
sistema prisional e sobre a população carcerária, é impossível não falar dos problemas
e desafios e não falarmos da ideia de prevenção por meio da educação para impedir
o desdobramento cada vez mais escalar desse problema que é a superlotação dos
presídios e a falha dentro de uma estrutura conjunta no processo fundamental de
localização e organização.

Conforme explica Guilherme Nucci, o termo “segurança” alude a bem-estar, confiança


e conforto, e não é um termo necessariamente associado ao crime. Ao analisar a
origem da expressão, do latim se + cura, cita Lincoln D’Aquino Filocre, para explicar
que na sua etimologia, o termo sugere o sentido ‘ocupar-se de si mesmo’ (se + cura),
de tornar seguro, protegido, livre de perigo, sugere ainda a previsibilidade, “a certeza
de que o futuro ou repete o presente, ou sofre mudança desde que esta seja
livremente consentida”. Além disso, consideradas as diversas acepções de “público”,
entende-se que esse termo faça remissão à noção de interesse coletivo, de modo que,

na junção dos significados, segurança pública é a ausência de risco correspondente ao


interesse da sociedade, tomada esta como a soma das individualidades, mas como um corpo,
qual seja, a coletividade. Segurança pública é o conjunto das ações preventivas e reativas, de
natureza pública, que, em resposta ao fenômeno da criminalidade, volta-se ao alcance ou à
manutenção da ordem pública e que tem como fim último proporcionar aos indivíduos, na
convivência social, a fruição de relações pautadas no direito básico de liberdade, garantidas a
segurança jurídica – proteção contra repressão autoritária do Estado – e a segurança material
– proteção contra agressões de todo tipo (FILOCRE 2010, apud NUCCI, 2016).

O tema não recebe muita atenção na ceara Penal ou Processual Penal, o que se
percebe é uma discussão em torno da polícia em si, das atividades que desempenha
e de soluções teóricas para a criminalidade ou debates sobre as leis penais, sobre o
funcionamento de institutos tais como a pena restritiva de liberdade e a multa.
Contudo, a segurança pública passa negligenciada. Nos termos de Nucci, “não há

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Desigualdade Social

dedicação, igualmente, à segurança pública, passando a mensagem subliminar de que


execução penal não se vincula à segurança da sociedade, como se fosse um fim de
percurso” (Ibd.). Assim, o autor ressalta que a segurança pública é um dever de todos,
incluindo-se a polícia e os órgãos vinculados à Justiça Criminal.

Contudo, o Estado, através de seus órgãos e agentes públicos tem o dever e a


responsabilidade de defender a sociedade, inclusive de arbitrariedades que seus
agentes venham a cometer no exercício da função estatal. Trata-se de discutir não
somente táticas de policiamento ostensivo, prevenção criminal, mas o próprio papel
da Polícia, como agente garantidor da segurança pública, de “manter o crime sob
controle na medida das suas forças e dos instrumentos proporcionados pelo Estado”,
podendo ela contar com o apoio de outras instituições, respeitando o princípio da
legalidade, de modo que ninguém seja obrigado a fazer senão aquilo que a lei obriga,
e garantir a “sobrevivência da sociedade livre” (ibd.).

5 Desigualdade Social
O tema da desigualdade social exige um entendimento prévio sobre a cidadania que
pode ser definida como o conjunto de direitos e deveres que o indivíduo que vive em
sociedade exerce. A expressão vem do latim civitas, que quer dizer cidade.

Assim, a cidadania é também o direito que o indivíduo tem de exercer livremente seus
direitos e deveres. A cidadania existe na conformidade da Lei, no seu aspecto formal,
como garantido e apresentado na lei, e no aspecto material (a prática) que diz respeito
às condições de acesso aos direitos e benefícios. Contudo, existe uma questão de
desigualdade em relação ao acesso que desencadeia um problema social e acentua
questões relacionadas à injustiça.

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Desigualdade Social

Assim, embora o Estado oferte aos cidadãos direitos iguais, existe uma discrepância
de oportunidades e condições. Por exemplo, quem faz parte do grupo de baixa renda
não tem condições de pagar um bom advogado que esquadrinhe os pormenores e as
entrelinhas para criar condições de uma liberdade provisória ou um pedido de habeas
corpus. Isso faz com que muitas vezes o indivíduo dependa da defensoria, que tem
milhares de casos para cuidar. Assim, esse indivíduo, que não tem condições de renda,
não tem quem perturbe o Poder Público por ele. Ou seja, a lei é igual para todos, mas
não são todos que tem as mesmas condições e oportunidades e dinheiro para pagar
um bom advogado e ter acesso a uma defesa que se preocupe realmente em fazer o
máximo possível para garantir ao seu cliente o mais favorável. A lei é igual para todos,
o que não existe de forma igualitária é a oportunidade e a condição de garantir o
acesso àquilo que a lei diz ser direito de todos.

5.1 Da superpopulação carcerária

Os dados do CNJ apontam para o aumento da população prisional brasileira que em


junho de 2021 mostra um total de 908.742 pessoas privadas de liberdade, incluindo
presos provisórios, em execução provisória, em execução definitiva e em prisão civil,
em comparação a marca de 812.564 atingida em julho de 2019.

Ainda, no período de janeiro a junho de 2020, o diagnóstico do Departamento


Penitenciário Nacional registrou 702.069 presos em unidades prisionais, excluindo
aqueles que não estão sob tutela dos Sistemas Penitenciários. Desse total 29,81%
(209.257) são provisórios; 14,5% (101.805) em regime semiaberto; 6,17% (43.325) em
regime aberto e 49,11% (344.773) em regime fechado; o restante são aqueles que
estão em medida de segurança ou em tratamento ambulatorial. Segundo o
levantamento, são 97,01% (5.386) homens e 2,99% (166) mulheres. Considerando o
número absoluto de presos, o Brasil tem a terceira maior população carcerária do
mundo, atrás dos Estados Unidos e da China e à frente da Índia.

Embora os dados do DEPEN mostrem uma redução de 76.768 na população privada


de liberdade de 2019 para 2020, o déficit total de vagas ainda é de 231.768 nas prisões,
o que mostra uma situação ainda preocupante que precisa ser debatida.

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Desigualdade Social

Segundo levantamento feito pelo jornal G1 em maio de 2021, atualmente, o Brasil tem
322 pessoas presas para cada 100 mil habitantes, considerando-se o número de
presos dentro do sistema prisional, apontando apara um déficit de 241.652 vagas nas
cadeias. Os estados mais superlotados do Brasil são Amazonas (196,2%); Mato Grosso
do Sul (165,5%); Pernambuco (141,4%); Distrito Federal (114,2%); e Alagoas (106,2%).

Estudos vêm apontando, ainda, como maior motivo para as prisões no Brasil o tráfico
de drogas, que teve um aumento significativo desde que passou a vigorar a Lei de
Drogas em 2006. Em São Paulo, por exemplo, é responsável por 40,5% das prisões,
seguido do crime de roubo (26,1%) e furto (10,1%). O crime de homicídio ocupa a 4ª
posição com 7,6%.

Figura 1 - Déficit total e vagas por ano – valores absolutos


Fonte: Departamento penitenciário nacional

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Desigualdade Social

Os dados apresentados em relação a população carcerária nos mostram que existe


sim o encarceramento em massa e demonstra essa relação por meio de dados
coletados de 2005 a 2018 referentes à evolução da população carcerária, conforme
exposto nos gráficos a seguir.

Figura 2 - População privada de liberdade e vagas por ano


Fonte: Departamento penitenciário nacional

O alto índice de superlotações acaba complicando a estrutura da segurança, uma vez


que se torna difícil manter a ordem dentro do sistema carcerário com uma
superpopulação, além disso, foge da finalidade do sistema penitenciário, que é manter

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Desigualdade Social

o condenado contido no cárcere. A superpopulação resulta em revoltas e rixas entre


os detentos e morte entre a população carcerária, e fora dela, inclusive, quando
envolve facções criminais rivais.

5.2 Perfil da População Carcerária

O levantamento nacional de informações penitenciárias “No ano de 2017, o INFOPEN


coletou dados referentes a 726 mil pessoas presas no Brasil. É possível observar que a
maior parte dos custodiados é composta por: jovens, pretos, pardos e com baixa
escolaridade. O crime de roubo e de tráfico de drogas foram os responsáveis pela
maior parte das prisões” (INFOPEN, 2017, p. 68). Dentre os custodiados no Sistema
Penitenciário Federal, 45,8% não concluíram o ensino fundamental.

Quanto à etnia, constatou-se que 46,2% da população prisional brasileira é parda;


35,4% é branca; 17,3% é preta. Observe o gráfico:

Gráfico 1 - Etnia/ cor das pessoas privadas de liberdade e da população total


Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – Infopen, Junho/2017 e PNAD Contínua 2017.

Quanto à faixa etária, o relatório mostra que a maior parte da população carcerária do
Brasil é composta por jovens entre 18 a 29 anos de idade. “Entre estes, 29,9% possuem
entre 18 a 24 anos, seguido de 24,1% entre 25 a 29 anos e 19,4% entre 35 a 45 anos.
Somados o total de presos até 29 anos de idade totalizam 54% da população

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Encarceramento em Massa e Encarceramento em


Pobreza

carcerária” (Ibd. p. 30).

Gráfico 2 - Faixa etária das pessoas privadas de liberdade no Brasil


Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – Infopen, Junho/2017

Isso mostra que existe um perfil étnico, mas também um perfil social e, por que não
dizer, um perfil econômico em relação à população carcerária no Brasil. É no que
concerte esse aspecto, essa realidade que abordaremos na sequência a obra de Juliana
Borges sobre o encarceramento em massa pelo ângulo sociológico de análise da
estrutura, dos perfis étnicos, econômicos e sociais quando falamos da população
carcerária.

6 Encarceramento em Massa e Encarceramento em Pobreza


No dia 13 de maio de 1888 ocorria um dos eventos mais marcantes da nossa história,
a abolição da escravatura. Este episódio inaugurava o fim dos trabalhos obrigatórios
dos escravos negros, que eram também os próprios clientes de seus senhores. O ato
legal que pôs fim a quase quatro séculos de escravidão no Brasil, mais conhecido
como Lei Áurea, possui, contudo, apenas dois artigos:

LEI N. 3.353/88
ART. 1º É DECLARADA EXTINTA, DESDE A DATA DESTA LEI, A ESCRAVIDÃO NO BRASIL.
ART. 2º REVOGAM-SE AS DISPOSIÇÕES EM CONTRÁRIO.

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Encarceramento em Massa e Encarceramento em


Pobreza

Por não haver nenhuma regulamentação ou provisão para o sistema de inclusão das
pessoas que até então eram escravas na sociedade brasileira, do dia para a noite, essas
pessoas perderam seus trabalhos, sua fonte de sustento, sua alimentação, moradia e
vestimenta, ou seja as poucas coisas que recebiam do seu senhor em troca do trabalho
escravo. Além disso, esses indivíduos não tinham acesso à educação, não recebendo
nenhuma instrução para entrar no mercado de trabalho, portanto não estavam
preparados para competir como os filhos dos brancos.

Agora toda a mão de obra até então escrava estava livre e lançava-se ao mercado de
trabalho, muitas vezes tendo que se submeter a condições degradantes para manter
a sua sobrevivência. Muitos libertos abandonaram as fazendas em que foram
escravizados e se distanciaram delas a procura de melhores salários. Contudo, esse
movimento migratório de ex-escravos gerou muita revolta por parte dos grandes
latifundiários, que começaram a pressionar as autoridades para reprimir o movimento.
Com isso, muitos desses homens e mulheres que estava a procura de melhores
condições passaram a ser taxados de vagabundos por não aceitarem as condições
impostas pelos proprietários, e com isso sofriam muita repressão.

Como consequência dessa relação, com homens e mulheres negras sendo submetidos
a trabalhos que proporcionavam um mínimo salário, dessa forma, tendo que
sobreviver muitas vezes em condições desumanas, não podendo proporcionar aos
seus filhos condições que lhes permitissem prosperar socialmente, perpetuava-se a
pobreza, desencadeando um problema social.

Outro aspecto que contribuía para perpetuar a manutenção desses indivíduos à


margem da sociedade vigorante era a questão da propriedade. Sem nenhuma reforma
agrária, esses indivíduos não tinham acesso a terra, restando-lhes apenas a opção de
permanecer submissos aos fazendeiros locais ou migrarem para outras regiões em
busca de oportunidades. Nesse sentido, o controle da sociedade, que antes se
organizava sobre o sistema escravocrata, agora encontrava uma nova forma de se
reorganizar enredado na vigência da estrutural capital e de trabalho – nesse contexto,
o senhor já não é mais o senhor do escravo, mas sim o patrão do funcionário.

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Encarceramento em Massa e Encarceramento em


Pobreza

Em um contexto como este, obviamente passaram a acontecer muitos delitos, entre


outros problemas imbuídos de uma carga étnica, histórica, social e econômica muito
grande. A pesquisadora, escritora e ativista Juliana Borges inicia a obra intitulada “O
que é encarceramento em massa?” com a exposição das origens do sistema
escravocrata e os seus efeitos na realidade brasileira. Conforme autora, esse contexto
tem sido responsável pela manutenção da desigualdade social e do racismo estrutural,
além de estar vinculado à atuação do Judiciário, norteando a lógica punitiva para a
população negra. Neste sentido, a autora explica que “abolida a escravidão no país,
como prática legalizada de hierarquização racial e social, outros foram os mecanismos
e aparatos que se constituíram e se reorganizaram, ou até mesmo fundados [...] como
forma de garantir controle social, tendo como foco os grupos subalternizados
estruturalmente” (BORGES, 2018).

Dessa forma, ao tratar sobre encarceramento em massa, Juliana Borges se refere


especificamente ao encarceramento massivo de negros e pobres, afinal, como
pudemos observar, existe uma grande disparidade entre o número de negros/pardos
e o número de brancos encarcerados. Atualmente são aproximadamente 64% de
negros e pardos para 35% de brancos compondo o sistema carcerário.

São diversos os fatores podem ter influenciado diretamente nesse processo e que
contribuem para a segregação dos sujeitos, tais como a ênfase na guerra às drogas, a
ampliação de políticas neoliberais, e criminalização da pobreza, entre outros. A lei
antidrogas, por exemplo, é um fator que contribuiu para a ampliação da população
carcerária, que, no entanto, tem uma atuação mais intensa muito mais voltada para o
alcance de uma solução imediata que atinge apenas a extremidade do problema, cujo
âmago permanece intocado. A autora explica que

O sistema de justiça criminal tem profunda conexão com o racismo, sendo o funcionamento
de suas engrenagens mais do que perpassados por esta estrutura de opressão, mas o aparato
reordenado para garantir a manutenção do racismo e, portanto, das desigualdades baseadas
na hierarquização racial. Além da privação de liberdade, ser encarcerado significa a negação
de uma série de direitos e uma situação de aprofundamento de vulnerabilidades (ibd.)

Juliana Borges defende que, em virtude do estigma social que existe em relação ao

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Encarceramento em Massa e Encarceramento em


Pobreza

cárcere, as chances desses indivíduos restituírem seu status de cidadania, que já é


“maculado pela opressão racial em todos os campos da vida” e as possibilidades
advindas deste são muito reduzidas, pois com o respaldo da sociedade, “a figura do
criminoso abre espaço para todo tipo de discriminação e reprovação”, e diante de
dados que demonstram que existe um grupo predominante entre a população
prisional, que é enxergado como criminoso indiscriminadamente, o preconceito, que
é antes de tudo racial, é confundido com um preconceito social.

A FIGURA DO CRIMINOSO ABRE ESPAÇO PARA TODO TIPO DE DISCRIMINAÇÃO E REPROVAÇÃO


COM TOTAL RESPALDO SOCIAL PARA ISSO. E AO RETOMARMOS OS DADOS QUE DEMONSTRAM
QUE HÁ UM GRUPO ALVO E PREDOMINANTE ENTRE A POPULAÇÃO PRISIONAL, OU SEJA, QUE É
CONSIDERADA CRIMINOSA, TEMOS AÍ UMA FÓRMULA PERFEITA DE ESCAMOTEAMENTO DE UM
PRECONCEITO QUE É RACIAL PRIMORDIALMENTE (BORGES, 2018).

6.1 Desafios e Soluções

Na Constituição Federal de 1988 restam assegurados, no aspecto formal, direitos e


garantias universais. Contudo, podemos observar que os Direitos Humanos estão em
permanente disputa e muitas vezes as instituições fortalecem discursos hegemônicos,
coloniais, sexista, racistas e a partir daí vemos a dificuldade de homens e mulheres
que tiveram sua liberdade privada em cárcere em acessar as políticas públicas e ter
seus direitos fundamentais garantidos.

Conforme defende Juliana Borges, precisamos repensar o sistema de justiça para que
este se reorganize não pela punição como forma de vingança, mas principalmente
pela restauração e pela conciliação. Partindo desse pressuposto, a solução para o
problema do encarceramento em massa não seria aumentar o número de vagas em
penitenciárias ou ampliar essas instituições. A despeito desse sistema punitivo e da
aplicação de penas, a criminalidade e a violência continuam ocorrendo em escala
ampla; os direitos continuarão sendo lesados e as prisões superlotadas.

Assim, a autora propõem como como solução a formulação de políticas sociais em


diversas áreas, entre elas políticas que reafirmem a cidadania e intervenções com

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Encarceramento em Massa e Encarceramento em


Pobreza

vistas a ampliar o acesso aos direitos fundamentais.

Em contrapartida, Guilherme Nucci esclarece que não há uma demonstração


satisfatória do governo, até hoje, sobre qual seria sua política criminal para o combate
à criminalidade, mas os debates acerca dessa temática externos ao governo são
muitos e os dados relacionadas ao número de pessoas condenadas e presas no
sistema carcerário nacional apresentadas por vezes são falseadas muitas vezes na
pretensão de convencer a sociedade, com um discurso emotivo, de que o “Judiciário
prende demais”.

O autor defende, ainda, que diante do argumento de que existe um elevado número
de presos provisórios, é válido ressaltar que estes “não podem ser incluídos na
população carcerária de quem já é definitivamente condenado. Afinal, a qualquer
momento, o preso provisório pode ser liberado por habeas corpus ou outra decisão
judicial. Enfim, esse número é variável”.

No que concerne à defesa de que parte da solução para o encarceramento em massa


seria a diminuição de penas restritivas de liberdade e o aumento de penas restritivas
de direitos, Nucci levanta a seguinte reflexão:

Ora, já há previsão de penas alternativas para os crimes cujas penas máximas não ultrapassem
4 anos de reclusão (ou detenção), atingindo inúmeros delitos. Outros crimes violentos contra
a pessoa ou com penas superiores a 4 anos (crimes graves) só podem seguir para o regime
carcerário. Para o Brasil diminuir os seus 325.917 presos em regime fechado, seríamos
obrigados a dar pena alternativa para roubo, extorsão, homicídio, estupro, furto qualificado,
tráfico de drogas etc.? É isso mesmo que a sociedade almeja de seus governantes?

O autor defende que a solução para resolver o problema do sistema fechado, é


necessário construir novos presídios e abrir novas vagas, “conferindo a indispensável
dignidade da pessoa humana no cárcere”. Nesse sentido, apresenta uma lista de
condições necessárias para alcançar esse fim, as quais implicam:

→ Mais vagas no sistema fechado;

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Conclusão

→ Coloniais penais aparelhadas, que não virem casas do albergado;


→ Efetivar casas do albergado para os abrigados em regime aberto;
→ mais vagas nas casas de detenção provisória

A ineficiência desse sistema fundamenta-se na falta de interesse por parte dos


políticos, que sequer divulgar a possibilidade de melhorar as condições carcerárias
como plano de governo, tendo em vista que “sabem perfeitamente bem que presos
não são fontes positivas de aumento de votos”. Ainda mais quando grande parte da
sociedade entende que os presos, indiscriminadamente, podem permanecer em “total
degradação física e moral”. Esta seria a solução mais plausível segundo o autor.

7 Conclusão
A questão do encarceramento em massa fomenta debates acirrados entre em diversas
esferas intelectuais, sendo objeto de exposição de doutrinadores, sociólogos, ativistas,
e escritores de modo geral. Contudo, observamos que existem grande dificuldade em
encontrar dados precisos e confiáveis que demonstrem a real situação carcerária do
país, tendo em vista que as atualizações nos meios de divulgação desses dados não
ocorrem em tempo real, que há um número variável de presos provisórios, e que
outros meios diversos dos oficiais fazem o levantamento de dados, mutas vezes
tensionando para o discurso que se pretende emitir.

À parte esses fatores, podemos constatar que existe um problema no sistema criminal
brasileiro, um problema de superlotação nas prisões, e um problema na segurança
pública. Todos esses temas, além de outros pertinente ao caso, envolvem pensar em
soluções para problemas que estão muito além da superfície, enraizados na sociedade
desde os tempos coloniais.

8 Referências Bibliográficas
BORGES, J. O que é: encarceramento em massa? Belo Horizonte: Letramento:
Justificando, 2018.

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Referências Bibliográficas

BROWN D. Encarceramento em Massa. Tradução: Uriel Moeller. In. CARLEN, P.;


FRANÇA, L. A. (org.) Criminologias alternativas. Porto Alegre: Canal Ciências
Criminais, 2017.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Dados das inspeções nos estabelecimentos
penais. 2014. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php.>
Acesso em: 16 de jun. de 2021.
DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL. Levantamento nacional de
informações penitenciárias: período de janeiro a junho de 2020. Disponível em:
<https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMjU3Y2RjNjctODQzMi00YTE4LWEwMDAtZ
DIzNWQ5YmIzMzk1IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRh
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Referências Bibliográficas

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