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Repartição da

competência
do Estado
Oliveira, Julio
SST Repartição da competência do Estado / Julio Oliveira
Local: 2020
nº de p. : 12

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Repartição da
competência do Estado

Apresentação
A Federação ou Estado Federal designa uma forma de Estado, um modo de
organização territorial e de poder. O que caracteriza o Estado federado é o fato de
ser composto por diversas entidades territoriais autônomas, em maior ou menor
medida de pender do Estado nacional, que possui governo próprio.

O Brasil é um estado federado, composto pela União, estados e municípios, cada


qual com suas competências e governos locais. A existência de vários entes
federados importa na repartição de competências entre eles, que traz diversos
benefícios de ordem prática, como a descentralidade da organização e maior
preservação das identidades e necessidades locais. Vamos conhecer agora um
pouco sobre a repartição de competências.

Repartição da competência
Agra (2014) atribui à repartição de competência a principal característica da forma
federativa de Estado, pois desempenha missão sensível para o federalismo, que é
evitar atritos entre os entes federados.

Definir quais matérias devem ficar a cargo da competência dos entes federativos não
é trabalho fácil.

Os limites da repartição regional e local de poderes dependem da


natureza e do tipo histórico de federação. Numas a descentralização é
mais acentuada, dando-se aos Estados federados competências amplas,
como nos Estados Unidos. Noutras a área de competência da União é mais
dilatada, restando limitado campo de atuação aos Estados-membros,
como tem sido no Brasil, onde a existência de competências exclusivas
dos Municípios comprime ainda mais a área estadual. A Constituição
de 1988 estruturou um sistema que combina competências exclusivas,
privativas e principiológicas com competências comuns e concorrentes,
buscando reconstruir o sistema federativo segundo critérios de equilíbrio
ditados pela experiência histórica. (SILVA, 2013)

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Segundo Tavares (2017), o modelo de repartição de competência, que teve origem na
Constituição dos Estados Unidos da América de 1787, consistia na enumeração de
poderes na figura do Governo Central, reservando-se aos Estados parciais poderes
não enumerados.

Na atualidade, a repartição de competência é um verdadeiro desafio, pois é


tarefa árdua equacionar a distribuição de competências federativas nos Estados
contemporâneos, marcados por uma sociedade plural.

Observe-se que, por mais minuciosa que tenha sido a Carta de 1988, ainda
existem conflitos entre os componentes da Federação, oriundos da defesa de suas
autonomias.

O princípio da predominância do
interesse
O princípio geral que norteia a repartição de competência entre as
entidades componentes do Estado federal é o da predominância do
interesse, segundo o qual à União caberão aquelas matérias e questões
de predominante interesse geral, nacional, ao passo que aos Estados
tocarão as matérias e assuntos de predominante interesse regional,
e aos Municípios concernem os assuntos de interesse local, tendo a
Constituição vigente desprezado o velho conceito do peculiar interesse
local que não lograra conceituação satisfatória em um século de vigência.
(SILVA, 2013)

Acrescenta-se ao magistério de Silva a competência do Distrito Federal, que é de


interesse geral e local.

Ocorre que, conforme observa Bulos (2015), “tal princípio não resolve todas
as situações que lhe são colocadas, em razão da dificuldade ou mesmo da
impossibilidade de se determinar, em algumas hipóteses, qual é o interesse
predominante, como os problemas relacionados à Amazônia, ao polígono da seca e
ao Vale do São Francisco.”

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A repartição de competências e o dilema do interesse predominante

Fonte: Deduca (2020)

Técnicas de repartição
São técnicas tradicionais de repartição de competência previstas nas constituições,
segundo Silva (2013): enumeração dos poderes da União, reservando-se aos Estados
os poderes remanescentes (EUA e Argentina); atribuição dos poderes enumerados
aos Estados e dos remanescentes à União (Canadá); enumeração das competências
das entidades federativas (Índia e Venezuela).

Ocorre que as técnicas tradicionais deixaram de atender à evolução e à


complexidade do federalismo, bem como não respondiam de forma adequada à
ampliação das tarefas do Estado contemporâneo.

Assim, surgiram outras técnicas de repartição de competências com o objetivo de


compatibilizar a autonomia dos entes com a reserva de campos específicos de
competência, sejam exclusivas, sejam privativas com possibilidade de delegação;
áreas comuns nas quais se possibilita a atuação paralela e áreas concorrentes,
nas quais à União compete as atribuições de ordem geral enquanto aos Estados se
assegura a competência suplementar (SILVA, 2013).

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A repartição de competências, pela ótica constitucional,
visa o equilíbrio das relações entre os entes federativos

Fonte: Deduca (2020)

Bulos identifica, de forma muito didática, as técnicas de repartição das


competências federativas na Carta Magna de 1988:

1. técnica dos poderes enumerados – aplicada à União (arts. 21 e 22) e aos Mu-
nicípios (art. 30);
2. técnica dos poderes remanescentes – aplicada aos Estados (art. 25, § 1º);
3. técnica da reserva especial de competência – aplicada ao Distrito Federal (art.
32, § 1º);
4. técnica da delegação legislativa – lei complementar federal pode autorizar os
Estados a legislar sobre assuntos correlatos à competência privativa da União
(art. 22, parágrafo único);
5. técnica da atuação administrativa paralela – aplicada, simultaneamente, a to-
dos os entes federativos (art. 23);
6. técnica da atuação legislativa concorrente – aplicada à União, aos Estados e
ao Distrito Federal (art. 24);
7. técnica na atuação exclusiva – aplicada ao Município (art. 30, I);
8. técnica da atuação suplementar – aplicada ao Município (art. 30, II); e
9. técnica da atuação residual – aplicada à União (arts. 145 a 162). (BULOS,
2015)

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Se você levar em consideração o princípio da predominância do interesse e as
técnicas de repartição de competências aqui citadas, podemos afirmar que a Lei
Maior de 1998 dividiu a competência em dois grandes grupos (Bulos, 2015):

Repartição de competências

ENUMERADA
EXCLUSIVA
REMANESCENTE
COMPETÊNCIA COMUM

ADMINISTRATIVA DECORRENTE

ORIGINÁRIA

PRIVATIVA

CONCORRENTE

SUPLEMENTAR

COMPETÊNCIA LEGISLATIVA RESIDUAL

DELEGADA

ORIGINÁRIA
Fonte: Bulos (2015)

Antes de adentrar em cada uma dessas classificações, é importante distinguir


competência administrativa de competência legislativa. Esta última diz respeito ao
poder de edição de atos normativos primários, ou seja, que criam direito sobre uma
respectiva matéria. Já a competência material se refere ao desempenho e execução
de tarefas previstas no ordenamento jurídico, para fins de satisfação do interesse
público.

Feita tal distinção, vamos prosseguir com as divisões citadas no Quadro.

Atenção
Competência administrativa exclusiva – é aquela que só pode
ser exercida pelo ente federado especificado na Constituição. Não
pode ser delegada. Por essa razão, o seu exercício se dá de modo
a excluir o campo de atuação dos demais entes. Exemplo: art. 21
da CF.

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A competência administrativa exclusiva pode ser enumerada ou remanescente. Por
enumerada entende-se que são aquelas que vêm taxativas na Constituição. Já as
remanescentes são as que sobram após a enumeração das competências de um
dos entes. O art. 21 da CF é um exemplo de competência administrativa exclusiva
numerada. Por sua vez, o art. 25, §1º, é exemplo de competência administrativa
exclusiva remanescente.

Atenção
Sabe-se que muitas competências administrativas existem
em virtude da previsão legal de competências legislativas que
com elas guardem pertinência. Na omissão de designação pela
Constituição Federal de competências administrativas para o
Distrito Federal, seria possível, em casos excepcionais, aplicar
as regras de competência legislativa do Distrito Federal que se
encontram efetivamente previstas na Carta Magna para solucionar
algum problema decorrente da omissão apontada?

• Competência administrativa comum – é exercida por todos os entes da Fe-


deração de modo a atender aos objetivos e a cumprir as tarefas que lhes são
comuns. O art. 23 da CF/88 é exemplo dessa competência.

Agra (2014) ainda estabelece uma subdivisão dessa competência em cumulativa ou


paralela: na cumulativa, a competência é exercida sem qualquer coordenação entre
os entes federados; diferentemente da paralela, em que há uma cooperação para
se otimizar o cumprimento das tarefas e o alcance dos objetos que são comuns a
todos os entes.

Competência administrativa decorrente

é aquela que se encontra implícita na Constituição Federal, como, por


exemplo, a do Supremo Tribunal Federal de fiscalizar a constitucionalidade
de emendas constitucionais que vão de encontro às cláusulas pétreas da
Constituição.

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Fonte: Deduca (2020)

Competência administrativa originária

é aquela que desde o início é estabelecida em favor de ente da Federação. O


art. 30 da Constituição Federal é exemplo dessa competência.

Fonte: Deduca (2020)

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A Constituição de 1988 também prevê as chamadas competências legislativas.

• Competência legislativa privativa – é aquele que, embora seu exercício esteja


previsto para um determinado ente, pode ser delegada para outro, como pode
ser observado, por exemplo, do parágrafo único do art. 22 da CF/88.
• Competência legislativa concorrente – é aquela em que mais de um ente
da Federação, a partir de prerrogativas que lhes são próprias, legislam sobre
uma mesma matéria. O art. 24 da Constituição de 1988 é um exemplo dessa
competência.

Sobre o modelo de competência concorrente brasileiro, é importante destacar:

O modelo de competência concorrente adotado no Brasil se refere a


uma atribuição legislativa vertical, em que a União legisla sobre normas
gerais e os Estados se incumbem da legislação específica. Esse tipo de
competência reflete um federalismo de feição simbiótica, em que os
órgãos componentes somam esforços para alcançar uma finalidade
comum.

De importância salutar é a definição do que venha a ser uma norma geral,


porque isso imporá um limite para a competência legislativa dos Estados-
membros. Uma primeira característica deste tipo de norma reside na sua
extensão, que abrange a totalidade do Estado nacional, configurando-se
em uma norma de âmbito nacional, enquanto a norma específica tem como
extensão o território de um Estado-membro. A segunda característica é
que a norma geral não pode ser exaustiva, tolhendo todos os espaços
referentes à incidência da norma específica. Deve ser deixada uma zona
para a atuação das normas específicas, para que elas possam se adequar
às peculiaridades regionais. (AGRA, 2014)

Atenção

Mais uma vez se reafirma, tal como explicitado no tópico anterior,


que o alcance da repartição de competências propostas pela
Constituição de 1988 vem promover relações de coordenação
e cooperação entre entes federativos, de modo a harmonizar a
pluralidade de regimes jurídicos encontrados no Brasil.

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• Competência legislativa suplementar – ocorre quando os Estados e o Distri-
to Federal, para suprir lacunas legislativas, adicionam, esclarecem e aperfei-
çoam matérias de interesse regional, conforme pode ser observado no §2º do
art. 24 da Carta Magna de 1988.

A competência suplementar ainda pode ser dividida em complementar e supletiva.


Diz-se complementar quando os Estados-membros ou o Distrito Federal editam
normas para especificar a legislação da União. Pode se dizer que na competência
complementar há uma adequação legislativa da legislação nacional às
peculiaridades regionais.

Já a supletiva ocorre quando os Estados produzem normas de caráter geral ou


específico em decorrência da omissão legislativa da União.

• Competência legislativa residual – é a que permite aos Estados-membros


legislarem sobre temas não defesos ou que não tenham sido enumerados na
Constituição. Exemplo dessa competência é o art. 154, I, da CF/88.

Importa destacar que de acordo com Agra (2014) “o exercício da competência


residual pelos Estados-membros requer a existência de interesse regional, ex vi do
art. 25, §1º, da CF.”

• Competência legislativa delegada – é aquela transferível de um ente da Fe-


deração para outro, como previsto, por exemplo, no parágrafo único do art. 22
do Texto Maior.
• Competência legislativa originária – trata-se da competência criada inicial-
mente para determinado ente federativo.

Fechamento
Estudamos um pouco mais sobre a organização dos Estados federados. Foi possível
identificar a importância da divisão das competências e os vários modos de como
se dão. Como visto, apesar da Federação ser uma forma de organização de muitos
Estados, nem sempre têm a mesma configuração.

Nesse estudo, foi abordado também qual o critério para a distribuição de


competências: o princípio da predominância do interesse. Por fim, analisou-se as
diversas técnicas de distribuição de competências, na qual foi possível observar a
possibilidade dessa distribuição em diversos âmbitos e diferentes formas.

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Referências
AGRA, W. de M. Curso de direito constitucional. 8. ed. Rio de Janeiro:Forense, 2014

BULOS, U. L. Curso de direito constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

SILVA, J. A. Curso de direito constitucional positivo. 37. ed. São Paulo: Malheiros,
2013.

TAVARES, A. R. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

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