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MORTE ENCEFÁLICA

Cessação irreversível das funções respiratórias e circulatórias ou cessação irreversível de todas as funções do
cérebro, incluindo o tronco cerebral.

O diagnóstico de ME é obrigatório e a notificação é compulsória para a Central Estadual de Transplantes (CET).


Para tanto, deve ser aberto o protocolo para todos os pacientes com suspeita de ME, independentemente da
possibilidade de doação ou não de órgãos e/ou tecidos.

Paciente com encefalopatia hipóxico-isquemica comprovada.

Fisiopatologia
Aumento da pressão intracraniana + diminuição do fluxo sanguíneo cerebral = hipóxia do tecido encefálico

● Maioria das causas que levam a ME induzem a descompensação do equilíbrio entre os componentes
intracranianos (cérebro, liquor e sangue) responsáveis pela manutenção da pressão intracraniana.
● Aumentos da pressão intracraniana causam diminuição do fluxo sanguíneo cerebral e,
consequentemente, hipóxia tecidual.

Numa fase inicial, há a tempestade autonômica, com liberação maciça de neurotransmissores e hormônios, que
podem levar a hipertensão e taquicardia. Na sequência, pode haver hipotensão arterial com necessidade de
drogas vasoativas. A depleção do hormônio antidiurético (ADH ou vasopressina) induz distúrbios do sódio, como a
diabetes insipidus. Há risco de hipernatremia e depleção do espaço extracelular. Pode haver também perda dos
níveis adequados dos hormônios da tireóide e do cortisol. Todas essas alterações transformam o paciente em ME
num indivíduo único, com peculiaridades no diagnóstico e no tratamento dos distúrbios clínicos.

PROTOCOLO DE MORTE ENCEFÁLICA


Critérios para abertura do protoloco:
● GCS 3 + pupila midriática/meio midríase não responsiva a luz

● Sem incursões ventilatória voluntária

● Sem condição confundidora para coma, como sedação e bloqueadores neuromusculares

● Sem hipotermia/hipertermia

● Sem distúrbios metabólicos graves

● Causa do coma conhecido

● Período mínimo de 6h de observação e tratamento em ambiente hospitalar após instalação de lesão


encefálica

+ todo paciente com suspeita de ME deve ter comprovada por exame de imagem (tomografia ou ressonância de)
uma lesão estrutural encefálica suficientemente grave para justificar o exame neurológico encontrado.

TC de crânio 🡪 edema difuso, sem sulcos, sem ventrículos visíveis 🡪 sinal claro de HIC

Obs. Se paciente potencial doador tiver PCR em ME, ressuscita-se pois não queremos inviabilizar os órãos para
doação. Se n~so for potencial doador e estiver ME e tiver PCR, não ressuscita.
Protocolo:

exame
2 exames
clínicos
teste de
apneia
complem
entar
ME
Exame clínico

● 2 médicos distintos devem realizar o exame:


o Não devem ter envolvimento com as equipes de transplante
o 1 especialista – neuro, neurocx, intensivista
o 1 ano formado + 10 exames
o 1 ano de experiência + curso capacitante
● Objetivo - deve confirmar que o paciente está em coma aperceptivo
o Ausência de resposta supra-espinhal, ausência dos reflexos de tronco e de incursões respiratórias
aparentes.

Como deve ser feito

1. Confirmar GCS 3
o Não existe resposta verbal pois é paciente entubado (1pt)
o Abertura ocular deve ser testada com resposta a dor por meio de compressão esternal, glabelar
ou pressionando leito ungueal.
o Resposta motora é consequência de provocar dor, mas é considerada se paciente localiza dor ou
retira, afasta ou defende, caso ontrário, não existe, p.ex., reflexo de Lázaro, que não é
considerada resposta motora.
2. Os reflexos de tronco testados são:
o Reflexo vestíbulo-calórico
▪ Aferente NC VIII vestibulococlear

▪ Eferente NC III oculomotpr, NC VI abducente, NC IV troclear

▪ O paciente deve ser posicionado reto com pescoço e cabeça centrados, sem qualquer
flexão ou extensão e com os olhos abertos. Introduzimos de forma lenta com seringa 50
ml de soro fisiológico 0,9% na temperatura de 0oC no meato acústico externo em ambos
os ouvidos, um de cada vez. Quando preservado o reflexo, o olhar é desviado para o lado
em que foi injetada a solução gelada ou paciente faz nistagmo.
o Reflexo de tosse
▪ Aferente NC IX glossofaringeo

▪ Eferente NC X vago

▪ Como esses pacientes estão em VM, o estímulo para a tosse pode ser feito pela
introdução de uma sonda através no tubo orotraqueal ou na traqueo, até que a árvore
traqueobrônquica seja tocada ao nível da carina. Pacientes com o reflexo preservado
terão como reação tosse, náuseas, movimentação facial e/ou movimento de deglutição.
o Reflexo óculo-cefálico
▪ Aferente NC VIII vestibulococlear
▪ Eferente NC III oculomotor, NC IV troclear, NC VI abducente

▪ Exame que demanda mobilização da cabeça, ele não deve ser performado em casos de
lesão cervical.
▪ O paciente deve estar com a cabeça e pescoço alinhados e centrados na linha média. O
reflexo é testado com a movimentação rápida em rotação lateral da cabeça. Caso o
reflexo esteja preservado, espera-se que os olhos se mantenham com olhar centrado na
linha média, indicando movimentação da musculatura extrínseca do olho. Os movimentos
devem ser performados para ambos os lados. Na morte encefálica, ou seja, na ausência
do reflexo, o olhar do paciente acompanhará a movimentação cefálica realizada.
o Reflexo córneo-palpebral
▪ Aferente NC V trigêmeo

▪ Eferente NC VII facial

▪ Gaze ou algodão para se fazer um leve estímulo tocando a córnea do paciente. Quando
presente, a resposta é de defesa, com fechamento ocular.
o Reflexo fotomotor e consensual
▪ Aferente – NC II optico

▪ Eferente – NC III oculomotor

▪ Pupilas devem estar midriáticas, com dilatação média ou completa e devem estar
centradas na linha média. As pupilas devem ser iluminadas e não devem apresentar
contração como resposta direta ao estímulo luminoso ou resposta consensual
(reatividade da pupila contralateral).

Na impossibilidade de realizar um dos reflexos unilateralmente, como nos casos de perfuração timpânica ou lesão
grave de globo ocular, os pares cranianos poderão ser testados do lado contralateral. Caso exista lesão bilateral
que inviabilize a análise do reflexo, o protocolo não poderá ser executado.

● Intervalo mínimo de tempo entre eles, em adultos e maiores de 2 anos é de no mínimo 1 hora. menores
devem ter entre 6h e 24h para novo teste clínico.

São reflexos medulares que não excluem morte encefálica:

● Reflexos osteotendinosos

● Reflexo cutâneo abdominal

● Reflexo cutâneo plantar em extensão ou flexão

● Reflexo cremastérico superficial e profundo

● Ereção peniana

● Reflexos flexores de retirada de membros superiores e inferiores

● Reflexo tônico-cervical

● Sinal de Lázaro

Obs. Nervos que não são analisados são NC I olfatório, NC XI acessório, NV XII hipoglosso.
Teste de apneia

● Centro de apneia no bulbo estimulado com altos níveis de CO2.

● Verifica o estímulo do centro respiratório à hipercapnia e seu objetivo é avaliar a integridade da região
pontobulbar.
● Para realizar o exame, o paciente deve estar com PAS > 100 ou PAM >65, sem arritmias, SatO2 > 94%, T >
35ºC e controle metabólico adequado.

Etapas que devem ser seguidas para que o teste obtenha sucesso

1. Oxigenar o paciente com FiO2 a 100% por 10 minutos – garante a saturação completa da hemoglobina
circulante e diminui o risco de hipóxia;
1. Coletar uma gasometria arterial inicial – deve demonstrar hiperóxemia e pCO2 entre 35 e 45 mmHg;
2. Desconectar o ventilador e inserir um cateter de oxigênio com fluxo de 6-8 l/min na traquéia ao nível da
carina;
3. Observar atentamente a presença de movimentos respiratórios por 10 minutos;
4. Coletar a gasometria arterial final – deve demonstrar pCO2 acima de 55 mmHg;
5. Reconectar o paciente à ventilação mecânica.

Positivo 🡪 caso não exista movimento respiratório e gasometria com pCO2 > 55 mmHg

Negativo 🡪 se movimento respiratório (o teste deve ser interrompido na hora)

Obs.: inconclusivo se hipotensão com PAS < 90, hipóxia com SatO2 <90%, arritmias ou gasometria final com pCO2
< ou igual a 55mmHg. Se inconclusivo podemos repetir algumas horas depois.

Caso paciente instabilize durante o teste, mas consigamos coletar uma gasometria antes de reconectar VM, e esta
gaso vier > 55, o teste é positivo, mas deve-se justificar ter durado menos de 10min no laudo de ME.

Exame complementar

Deve demonstrar ausência de atividade elétrica ou ausência de perfusão sanguínea cerebral.

● Doppler transcraniano: método não-invasivo que avalia o fluxo sanguíneo cerebral através de janelas
ósseas. Como vantagem, é um exame portátil, feito ao lado do leito do paciente. Porém, pode apresentar
falsos negativos (fluxo sanguíneo cerebral mesmo em casos de ME) nos pacientes submetidos à
craniectomia descompressiva ou válvula de derivação ventricular, neonatos com fontanela aberta e uso
de balão intra-aórtico.
● Arteriografia cerebral: avalia o fluxo sanguíneo após a injeção de contraste nas artérias carótidas e
vertebrais. Como desvantagens, estão a necessidade de transporte do paciente para a sala cirúrgica e o
uso de contraste, que pode interferir na função renal do paciente.
● Eletroencefalograma (EEG): detecta a atividade elétrica cerebral e é necessário um exame com, no
mínimo, 21 canais. Como vantagem, pode ser feito na beira do leito e tem como desvantagem, a
interferência com os outros equipamentos eletrônicos. É o indicado para pacientes que fizeram
craniotomia ou possuem fontanela.
● Cintilografia cerebral: demonstra a circulação sanguínea por meio da injeção de radioisótopo tecnécio
99m. Requer a remoção do paciente até o local adequado para realização do exame. Pacientes com
insuficiência renal, hepática ou com história de intoxicação por medicamentos potencialmente
depressores do Sistema Nervoso Central devem realizar preferencialmente um exame que verifique o
fluxo sanguíneo cerebral (doppler transcraniano ou arteriografia).
Caso um primeiro exame não seja compatível com ME, está indicada a sua repetição após um prazo de 24-48
horas sem a inviabilização do protocolo. A fim de garantir a segurança do processo, o mesmo tipo de exame deve
ser utilizado, preferencialmente, para a repetição.

Caso paciente seja reprovado como possível doador por recusa da família após ser dx a ME, os aparelhos
devem ser desligados imediatamente, pois manter em equipamentos é considerado ocultação de cadáver. Se
no teste o paciente apresentar reflexos, não possuir exame complementar comprobatório ou respirar no teste
de apneia, deve ser mantido em aparelhos até que ocorra ME ou para possível intervenção.

MANUTENÇÃO DO POTENCIAL DOADOR DE ÓRGÃOS

Suspensão da sedação, analgésicos opióides e bloqueadores neuromusculares Ausência de sedação

Prevenção de hipotermia

● Aquecimento do ambiente
T ≥ 35,1 ˚ C
● Uso de mantas térmicas

● Infusão de líquidos aquecidos

Controle da glicemia: Iniciar insulina endovenosa em bomba infusora as duas Glicemia entre 140 - 180
medidas consecutivas ≥ 180 mg/dl mg/dl

Controle da diurese

● Se oligúria: avaliar bolus de cristalóide para restabelecer a volemia Diurese 1 – 4 ml/Kg/h

● Se poliúria: avaliar indicação de vasopressina ou desmopressina

Coração: realizar ECG, ecocardiograma e dosar enzimas cardíacas. Pacientes acima de 45 anos necessitam de
cateterismo cardíaco

Fígado: sódio, potássio e glicemia a cada 6h. TGP, TGO, BT e TAP a cada 24h. não contraindicar em hepatite B e
C (órgãos expandidos)

Manter ventilação mecânica protetora VC 6-8 mL/kg e PEEP 8-


10cmH2O

Correção de distúrbios hidroeletrolíticos Na+ < 155 mEq/dL

● Para correção de hipernatremia, iniciar a infusão de SG5% ou Solução K+ entre 3,5 – 5,5 mEq/L

salina 0,45% para taxa de correção máxima de 8-12 mEq/dia Mg2+ > 1,6 mEq/L

Início ou manutenção da dieta enteral, exceto se instabilidade hemodinâmica


15-20 kcal/Kg/dia
grave

Compensação hemodinâmica:

● Caso meta não alcançada: realizar RV 20-30mL/kg, puncionar ACV e PA


PAM ≥ 65 mmHg PAS ≥ 100
invasiva e iniciar drogas vasopressoras. Se bradicardia, iniciar dopamina. mHg
● Quando necessário uso de vasopressor, acrescentar vasopressina 0,5-
2,4U/h e hidrocortisona 300mg/dia

Coleta da rotina laboratorial completa (grade de exames do formulário de notificação) + tipagem sanguínea + 2
amostras de hemocultura + urocultura + cultura de aspirado traqueal para potencial doador de pulmão

Proteção ocular com gaze úmida

Infecção não contraindica doação. Se estiver em tratamento com boa resposta ou infecção tratada, pode doar.
Se não controlada, contraindicada e se suspeita de infecção, tratamos antes de avaliar doação.

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