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Aulas imprescindíveis

1
Olá, Alunos!
Sejam bem-vindos ao E-book das aulas imprescindíveis!

O presente E-book contém os conteúdos referentes as aulas


imprescindíveis do nosso curso.

Com o intuito de facilitar a sua localização, o presente E-book


segue a sequência em que as aulas imprescindíveis estão
dispostas em nosso portal.

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estaremos à disposição para auxiliá-los através da ferramenta
“Pergunte ao professor”!

Bons estudos,

Abraços, Equipe Ceisc.

2
2ª FASE OAB | PENAL | 3 7º EXAME

Direito Penal e
Processual Penal

SUMÁRIO
Ação penal
1.1 Conceito ..........................................................................................................13
1.2. Ação penal pública incondicionada ................................................................13
1.3. Ação penal pública condicionada à representação ........................................14
1.3.1. Conceito e natureza jurídica ........................................................................14
1.3.2. Identificação ................................................................................................15
1.3.3. Titular do direito de representação ..............................................................17
1.3.4. Prazo ...........................................................................................................17
1.3.5. Retratabilidade ............................................................................................18
1.3.6. Consequências............................................................................................18
1.4. Ação penal privada .........................................................................................19
1.5. Questões sobre Ação Penal ...........................................................................20

Queixa-crime
2.1 Conceito ..........................................................................................................23
2.2 Base legal........................................................................................................23
2.3 Identificação ....................................................................................................23
2.4 Legitimidade. ...................................................................................................24
2.5 Prazo da ação penal privada ...........................................................................24
2.6 Requisitos da queixa .......................................................................................26
2.7 Alguns crimes de ação penal privada previstos no Código Penal ...................27
2.8 Procuração com poderes especiais.................................................................28
2.9 Valor indenizatório mínimo ..............................................................................28
2.10 Estruturação da Queixa-crime: ......................................................................29
2.11 Questões sobre queixa-crime........................................................................31

Citação
3.1 Da citação .......................................................................................................33
3.2 Questões sobre citação e rejeição da denúncia ..............................................35

3
Teoria do dolo e culpa
4.1 Do crime doloso ..............................................................................................37
4.1.1 Dolo direto ....................................................................................................37
4.1.2 Dolo eventual ...............................................................................................37
4.2 Do crime culposo .............................................................................................38
4.2.1 Conceito .......................................................................................................38
4.2.2 Elementos do crime culposo ........................................................................38
4.2.3 Diferença entre culpa consciente e dolo eventual ........................................43
4.3 Questões sobre Teoria do dolo e culpa ...........................................................45

Princípio da insignificância
5.1 Introdução .......................................................................................................47
5.2 Requisitos........................................................................................................48
5.3 Princípio da insignificância em espécie ...........................................................50
5.4 Questão sobre Princípio da insignificância ......................................................56

Resposta à acusação
6.1 Peça obrigatória ..............................................................................................58
6.2 Identificação ....................................................................................................58
6.3 Base legal........................................................................................................60
6.4 Prazo ...............................................................................................................60
6.5 Conteúdo .........................................................................................................61
6.6 Pedido de Absolvição Sumária ........................................................................65
6.7 Recursos .........................................................................................................66
6.8 Dicas ...............................................................................................................66
6.9 Estrutura da peça ............................................................................................68
6.10 Questões sobre Resposta à acusação ..........................................................71

Competência
7.1. Jurisdição .......................................................................................................73
7.2. Competência ..................................................................................................74
7.2.1. Espécies de competência............................................................................74
7.2.2. Critérios de fixação da competência:...........................................................75
7.2.3. Determinação do foro competente ..............................................................76
7.2.4. Competência em crime continuado e crime permanente ............................77
7.2.5. Competência pelo domicílio ou residência do réu .......................................77
7.2.6 Competência pela natureza da infração .......................................................78
7.2.7. Competência por distribuição ......................................................................78
7.2.8. Causas modificadoras da competência .......................................................78
7.2.9. Foro prevalente ...........................................................................................81
7.2.10. Da competência por prevenção .................................................................83

4
7.2.11. Da competência por prerrogativa de função ..............................................84
7.2.12. Competência do Supremo Tribunal Federal ..............................................85
7.2.13. Competência do Suprior Tribunal de Justiça .............................................85
7.2.14. Competência dos Tribunais Regionais Federais: ......................................85
7.2.15. Competência dos Tribunais de Justiça ......................................................86
7.2.16. Competência para julgar prefeitos municipais ...........................................86
7.2.17. Competência da Justiça Federal ...............................................................88
7.2.18. Competência da justiça militar ...................................................................93
7.2.19. Competência criminal da justiça eleitoral ..................................................93
7.2.20. Justiça política ou extraordinária ...............................................................94
7.2.21. Restrição ao foro por prerrogativa de função ............................................94
7.2.22. Marco para o fim do foro ...........................................................................94
7.2.23. Crime de moeda falsa ...............................................................................94
7.2.24. Justiça estadual .........................................................................................95
7.3. Questões sobre competência .........................................................................96

Iter criminis e tentativa


8.1 Iter criminis .................................................................................................... 102
8.1.1 Cogitação ................................................................................................... 103
8.1.2 Atos preparatórios ...................................................................................... 103
8.1.3 Execução.................................................................................................... 104
8.1.4 Consumação .............................................................................................. 105
8.2 Da tentativa ................................................................................................... 106
8.2.1 Conceito ..................................................................................................... 106
8.2.2 Natureza jurídica ........................................................................................ 106
8.2.3 Elementos da tentativa ............................................................................... 107
8.2.4 Punibilidade da tentativa ............................................................................ 109
8.2.5 Infrações penais que não admitem tentativa .............................................. 109

Desistência voluntária e arrependimento eficaz


9.1 Introdução ..................................................................................................... 111
9.2 Desistência voluntária ................................................................................... 111
9.3 Arrependimento eficaz................................................................................... 113
9.4 Requisitos...................................................................................................... 114
9.5 Consequência ............................................................................................... 116
9.6 Questões sobre Desistência voluntária e arrependimento eficaz .................. 120

Arrependimento posterior
10.1 Conceito ...................................................................................................... 121
10.2 Requisitos.................................................................................................... 121
10.3 Critério para redução da pena ..................................................................... 123

5
10.4 Reparação do dano ou restituição da coisa em situações específicas........ 123
10.5 Questões sobre arrependimento posterior .................................................. 124

Conflito aparente de normas


11.1. Introdução .................................................................................................. 126
11.2. Conflito aparente de normas x concurso de crimes ................................... 127
11.3. Princípios para dirimir o conflito aparente de normas................................. 127
11.3.1. Princípio da especialidade ....................................................................... 127
11.3.2. Princípio da subsidiariedade ................................................................... 128
11.3.3. Princípio da consunção ou da absorção .................................................. 131
11.3.4. Princípio da alternatividade ..................................................................... 135
11.4. Questões sobre Conflito aparente de normas ............................................ 136

Concurso de crimes
12.1. Introdução .................................................................................................. 138
12.2. Concurso de crimes e a relação com outros institutos ............................... 138
12.3. Concurso material de crimes ...................................................................... 139
12.3.1. Conceito .................................................................................................. 139
12.3.2. Concurso material e penas restritivas de direitos .................................... 140
12.3.3. Cumprimento simultâneo ou sucessivo de penas restritivas de direitos.. 140
12.3.4. Aplicação da pena ................................................................................... 141
12.4. Concurso formal ......................................................................................... 141
12.4.1. Conceito .................................................................................................. 141
12.4.2. Concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito ........................... 142
12.4.3. Aplicação da pena no concurso formal.................................................... 143
12.4.4. Concurso formal e crime único ............................................................... 145
12.5. Crime continuado ....................................................................................... 146
12.5.1. Conceito .................................................................................................. 146
12.5.2. Requisitos ................................................................................................ 146
12.5.3. Crime continuado específico ................................................................... 148
12.5.4. Aplicação da pena ................................................................................... 149
12.6. Questões sobre Concurso de crimes ......................................................... 152

Crime impossível
13.1 Conceito ...................................................................................................... 155
13.2 Crime impossível por ineficácia absoluta do meio ....................................... 156
13.3 Crime impossível por impropriedade absoluta do objeto ............................. 157
13.4 Questões sobre Crime impossível ............................................................... 159

6
Erro de tipo
14.1 Erro de tipo essencial .................................................................................. 161
14.1.1 Erro de tipo essencial invencível, inevitável ou escusável ....................... 163
14.1.2 Erro de tipo essencial vencível, evitável ou inescusável .......................... 164
14.1.3. Efeitos do erro de tipo essencial.............................................................. 165
14.2 Erro de tipo acidental................................................................................... 166
14.2.1 Erro sobre o objeto ................................................................................... 167
14.2.2 Erro sobre a pessoa ................................................................................. 168
14.2.3 Erro na execução ..................................................................................... 170
14.2.4 Resultado diverso do pretendido (aberratio criminis) ............................... 173
14.3 Erro provocado por terceiro ......................................................................... 176
14.4 Questões sobre Erro de tipo ........................................................................ 177

Excludente de ilicitude
15.1 Introdução ................................................................................................... 183
15.2 Os reflexos das causas de exclusão da ilicitude no processo penal ........... 183
15.3 Estado de necessidade ............................................................................... 184
15.4 Legítima defesa ........................................................................................... 189
15.5 Excesso punível .......................................................................................... 194
15.6 Estrito cumprimento do dever legal ............................................................. 195
15.7 Exercício regular do direito .......................................................................... 197
15.8 Consequências ............................................................................................ 200
15.9 Questões sobre Excludente de ilicitude....................................................... 201

Excludente de culpabilidade
16.1 Introdução ................................................................................................... 203
16.2 Inimputabilidade .......................................................................................... 204
16.3 Menoridade penal ........................................................................................ 209
16.4 Falta de potencial consciência da ilicitude ................................................... 210
16.4.1 Erro de proibição ...................................................................................... 210
16.5 Inexigibilidade de conduta diversa............................................................... 217
16.5.1 Coação moral irresistível .......................................................................... 218
16.5.2 Obediência hierárquica............................................................................. 219
16.6 Questão sobre Excludente de culpabilidade ............................................... 221

Teoria da pena
17.1 Fixação da pena .......................................................................................... 223
17.1.1 Primeira fase ............................................................................................ 225
17.1.2 Segunda fase ........................................................................................... 229
17.1.3 Terceira fase ............................................................................................ 242
17.2 Regime inicial de cumprimento de pena ...................................................... 244

7
17.3 Das penas restritivas de direitos ................................................................. 247
17.3.1. Requisitos objetivos................................................................................. 248
17.3.2 Substituição da pena restritiva x tráfico ilícito de entorpecentes .............. 252
17.4 Suspensão condicional da execução da pena (sursis) ................................ 254
17.5 Questões sobre Teoria da pena .................................................................. 256

Das Nulidades
18.1. Teoria Geral das Nulidades ........................................................................ 264
18.1.1. Sistema da Tipicidade dos Atos Processuais .......................................... 264
18.1.2. Graus de Atipicidade ............................................................................... 265
18.2. Conceito de Nulidade ................................................................................. 266
18.3. Nulidade Absoluta e Relativa ..................................................................... 266
18.3.1. Nulidades absolutas ................................................................................ 266
18.3.2. Nulidades relativas .................................................................................. 266
18.4. Vícios Processuais ..................................................................................... 267
18.4.1. Jurisdição e Competência ....................................................................... 267
18.4.2. Ilegitimidade da Parte .............................................................................. 267
18.4.3. Falta de Atos Essenciais ......................................................................... 267
18.5. Regularização da Falta ou Nulidade da Citação ........................................ 271
18.6. Questões sobre Nulidades ......................................................................... 275

Prescrição
19.1 Conceito ...................................................................................................... 278
19.2 Espécies de prescrição ............................................................................... 278
19.3 Efeitos da prescrição ................................................................................... 280
19.4 Prescrição da pretensão punitiva ................................................................ 281
19.4.1. Prescrição da pretensão punitiva em abstrato ou propriamente dita ....... 281
19.4.2. Prescrição da pretensão punitiva retroativa ............................................ 298
19.4.3. Prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente ........... 304
19.5 Prescrição da pretensão executória ............................................................ 307
19.5.1. Termos iniciais......................................................................................... 309
19.5.2. Causas interruptivas ................................................................................ 310
19.5.3. Prescrição no caso de evasão do condenado ou de revogação do livramento
condicional .......................................................................................................... 311
19.5.4. Algumas hipóteses de incidência da prescrição da pretensão
executória ............................................................................................................ 312
19.6 Questões sobre Prescrição ......................................................................... 315

Audiência de instrução
20.1 Considerações ............................................................................................ 319

8
Memoriais
21.1 Introdução ................................................................................................... 321
21.2 Identificação ................................................................................................ 321
21.3 Base legal.................................................................................................... 325
21.4 Prazo ........................................................................................................... 325
21.5 Conteúdo ..................................................................................................... 326
21.6 Pedido ......................................................................................................... 330

Teoria Geral das Provas


22.1. Introdução e Conceito ................................................................................ 335
22.2. Objeto Da Prova e Objetivo ........................................................................ 336
22.2.1. Presunções legais ................................................................................... 336
22.3. Princípios.................................................................................................... 337
22.4. Sistemas de apreciação das provas ........................................................... 338
22.4.1. Sistema do livre convencimento motivado .............................................. 338
22.4.2. Sistema da íntima convicção ................................................................... 339
22.4.3. Sistema da prova tarifada, da verdade legal ou da certeza moral do
legislador ............................................................................................................. 339
22.5. Elementos de informação x elementos de prova ........................................ 339
22.6. Ônus da Prova ........................................................................................... 340
22.6.1. Introdução ............................................................................................... 340
22.6.2. Distribuição .............................................................................................. 341
22.7. Poderes Instrutórios do Magistrado ............................................................ 342
22.8. Provas Ilegais, vedadas ou proibidas ......................................................... 343
22.8.1. Exceções ou Limitações à admissibilidade da prova ilícita por
derivação ............................................................................................................. 344
22.8.2. Utilização de prova ilícita em favor do réu e em favor da sociedade ....... 345

Provas em espécie
23.1. Provas Ilícitas e a Inviolabilidade do sigilo das comunicações ................... 352
23.1.1. Comunicações telefônicas ....................................................................... 352
23.2. Interceptação de Dados ............................................................................. 358
23.3. Interceptações Ambientais ......................................................................... 359
23.4. Sigilo de correspondência .......................................................................... 360
23.5. Exame de Corpo de Delito ......................................................................... 360
23.5.1. Aspectos Importantes .............................................................................. 363
23.5.2. Outras Perícias ........................................................................................ 363
23.5.3. Cadeia de Custódia ................................................................................. 364
23.6. Interrogatório .............................................................................................. 366
23.7. Confissão ................................................................................................... 368
23.8. Perguntas ao Ofendido............................................................................... 369

9
23.9. Prova Testemunhal ................................................................................... 370
23.10. Reconhecimento Pessoas e Coisas ......................................................... 374
23.11. Busca e Apreensão .................................................................................. 374
23.12. Questões sobre provas ............................................................................ 376

Recurso de apelação
24.1 Conceito ...................................................................................................... 390
24.2 Identificação ................................................................................................ 390
24.3 Base legal.................................................................................................... 395
24.4 Cabimento da apelação nas sentenças do juiz singular .............................. 395
24.5 Prazo ........................................................................................................... 396
24.6 Legitimidade do assistente à acusação ....................................................... 396
24.7 Conteúdo ..................................................................................................... 397
24.8 Pedido ......................................................................................................... 399
24.9 Estrutura do recurso .................................................................................... 400
24.10 Peça bipartida ........................................................................................... 402
24.11. Questões sobre Recurso de apelação ..................................................... 408

Contrarrazões de apelação
25.1 Introdução ................................................................................................... 411
25.2 Identificação ................................................................................................ 411
25.3 Base legal.................................................................................................... 413
25.4 Prazo ........................................................................................................... 413
25.5 Conteúdo ..................................................................................................... 414
25.6 Pedidos ....................................................................................................... 414
25.7 Estrutura da peça ........................................................................................ 414

Do Procedimento do Tribunal do Júri – 1ª Fase


26.1 Do procedimento do tribunal do júri ............................................................. 419
26.1.1 Recebimento da denúncia ........................................................................ 420
26.1.2 Indispensabilidade da Resposta à Acusação ........................................... 420
26.1.3 Contraditório: Específico do Procedimento do Júri ................................... 420
26.1.4 Providências judiciais ............................................................................... 420
26.1.5 Instrução concentrada .............................................................................. 421
26.1.6 Fase de apreciação da admissibilidade da acusação .............................. 422
26.1.7 Pronúncia ................................................................................................. 422
26.1.8 Impronúncia .............................................................................................. 423
26.1.9 Absolvição sumária .................................................................................. 423
26.1.10 Desclassificação ..................................................................................... 424
26.1.11 Emendatio libelli ..................................................................................... 424
26.1.12 Intimação da decisão de pronúncia ........................................................ 424

10
26.2 Resposta à acusação .................................................................................. 425
26.2.1 Identificação ............................................................................................. 425
26.2.2 Base legal................................................................................................. 425
26.2.3 Prazo ........................................................................................................ 425
26.2.4 Conteúdo .................................................................................................. 425
26.2.5 Pedido ...................................................................................................... 425
26.3 Memoriais ou alegações finais por memoriais ............................................. 429
26.3.1 Considerações iniciais .............................................................................. 429
26.3.2 Base legal................................................................................................. 429
26.3.3. Prazo ....................................................................................................... 429
26.3.4. Identificação ............................................................................................ 429
26.3.5. Conteúdo ................................................................................................. 430
26.3.6. Pedido ..................................................................................................... 433

Recurso em sentido estrito


27.1 Introdução ................................................................................................... 437
27.2 Hipóteses de cabimento .............................................................................. 438
27.3 Prazo ........................................................................................................... 444
27.4 Legitimidade ................................................................................................ 444
27.5 Peça bipartida ............................................................................................. 445
27.6 Efeito regressivo (Juízo de retratação) ........................................................ 446
27.7 Estruturação ................................................................................................ 446
27.8 Recurso em sentido estrito contra decisão de pronúncia ............................ 451
27.8.1 Introdução ................................................................................................ 451
27.8.2 Identificação ............................................................................................. 451
27.8.3 Base legal................................................................................................. 453
27.8.4 Prazo ........................................................................................................ 453
27.8.5 Efeito regressivo (Juízo de retratação) ..................................................... 453
27.8.6 Conteúdo .................................................................................................. 454
27.8.7 Pedido ...................................................................................................... 455
27.8.8 Estrutura do recurso em sentido estrito .................................................... 456
27.9. Questões sobre Recurso em sentido estrito ............................................... 461

Efeito extensivo
28.1 Conceito ...................................................................................................... 464

Agravo em Execução
29.1 Cabimento e conteúdo ................................................................................ 465
29.2 Rito e competência para o julgamento ........................................................ 466
29.3 Prazo ........................................................................................................... 466
29.4 Efeitos ......................................................................................................... 466

11
29.5 Estruturação da peça Agravo em Execução ............................................... 467
29.6. Questões sobre Agravo em execução........................................................ 470

Revisão criminal
30.1 Conceito ...................................................................................................... 473
30.2 Identificação ................................................................................................ 473
30.3 Base legal.................................................................................................... 474
30.4 Cabimento/conteúdo ................................................................................... 474
30.5 Revisão e extinção da pena ........................................................................ 476
30.6 Legitimidade ................................................................................................ 476
30.7 Órgão competente para o julgamento da Revisão Criminal ........................ 476
30.8 Decisão na Revisão Criminal ...................................................................... 477
30.9. Estruturação da Revisão Criminal .............................................................. 477

Olá, aluno(a). Este material de apoio foi organizado com base nas aulas do curso preparatório para
a 2ª Fase do 37º Exame da OAB e deve ser utilizado como um roteiro para as respectivas aulas.
Além disso, recomenda-se que o aluno assista as aulas acompanhado da legislação pertinente.

Bons estudos, Equipe Ceisc.


Atualizado em fevereiro de 2023.

12
Ação penal

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 28/02/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

Incondicionada
Ministério
Pública Denúncia
Público
Condicionada à
representação

Ação Penal
Exclusiva

Privada Personalíssima Ofendido Queixa-crime

Subsidiária

1.1 Conceito

É o direito de agir exercido perante juízes e tribunais, invocando a prestação jurisdicional,


que, na esfera criminal, é a existência da pretensão punitiva do Estado.

1.2. Ação penal pública incondicionada

Está prevista no artigo 24 do CPP. É aquela em que o Ministério Público poderá propor a
ação penal, independentemente da manifestação de vontade do ofendido ou do seu

13
representante legal. Em outras palavras, o Ministério Público poderá oferecer a denúncia de
ofício.

Quando o tipo penal silenciar em relação à natureza da ação penal, será pública
incondicionada.

1.3. Ação penal pública condicionada à representação

1.3.1. Conceito e natureza jurídica

É aquela cujo exercício se subordina a uma condição, consistente na manifestação de


vontade do ofendido ou de seu representante legal (representação). É o que se extrai do artigo
24, parte final, do CPP.

O Ministério Público somente poderá oferecer a denúncia se a vítima ou seu representante


legal o autorizarem, por meio de uma manifestação de vontade. Sem a manifestação de vontade
do ofendido ou seu representante legal, nem sequer poderá ser instaurado inquérito policial.

O oferecimento da denúncia sem representação ensejará rejeição da denúncia, por falta


de condição da ação (art. 395, II, do CPP) e nulidade (art. 564, III, “a”, do CPP), devendo, ainda,
se superado o prazo de seis meses, arguir a extinção da punibilidade pela decadência (art. 107,
IV, do CP).

A natureza jurídica da representação é a de condição de procedibilidade da ação penal


pública condicionada. Sem ela, o órgão do Ministério Público não pode intentar a ação penal
mediante o oferecimento da denúncia.

A ação penal pública, seja incondicionada, seja condicionada, é promovida pelo Ministério
Público por meio de denúncia, que constitui sua peça inicial (art. 100, § 1º, do CP, e art. 24 CPP).

OBS: Na peça resposta à acusação, recomenda-se alegar a rejeição da denúncia e a


nulidade, bem como a extinção da punibilidade, pela decadência (se extrapolado o prazo de 6
meses), com pedido de absolvição sumária (art. 397, IV, do CPP). Nas demais peças, pode ser
alegada apenas a nulidade, além da extinção da punibilidade pela decadência (art. 107, IV, do
CP).

14
1.3.2. Identificação

Como saber se o crime é de ação penal pública condicionada à representação? Pois bem,
os crimes de ação penal pública condicionada à representação são aqueles em que consta no
tipo penal a expressão “somente se procede mediante representação”.

O tipo penal descreve a conduta, comina a pena e, na sequência, deixa expresso que o
crime “somente se procede mediante representação”.

EXEMPLOS:

Ameaça
Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio
simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante representação.

Perseguição
Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a
integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de
qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou
privacidade. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido:
I – contra criança, adolescente ou idoso;
II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art.
121 deste Código;
III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma.
§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.
§ 3º Somente se procede mediante representação.

15
Cuidado: Crimes de lesão corporal leve e culposa

Nos casos de lesão corporal leve (art. 129, “caput”, do CP) e lesão corporal culposa
(art. 129, § 6º, do CP), ação penal será, via de regra, pública condicionada à
representação, conforme prevê o artigo 88 da Lei 9.099/95, que dispõe: “Art. 88. Além das
hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação a ação
penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.”

Todavia, em relação aos crimes de lesão corporal leve e lesão corporal culposa,
algumas considerações são necessárias, quando praticados no contexto de violência
doméstica, especialmente quando a vítima é mulher.

Se a vítima do crime de lesão corporal leve ou culposa for homem, ou, ainda,
mulher, mas sem a presença de qualquer hipótese prevista no artigo 5º da Lei
11.340/2006, a natureza da ação penal segue a regra do artigo 88 da Lei 9099/95, ou seja,
será pública condicionada à representação.

Assim, se, por exemplo, o agente agride uma mulher desconhecida apenas porque
ela é torcedora do Sport Clube Internacional, a ação será pública condicionada à
representação, uma vez que, embora seja mulher, o crime não foi praticado no contexto
de violência doméstica e familiar, já que não está presente qualquer hipótese do artigo 5º
da Lei Maria da Penha.

De outro lado, se a lesão corporal leve ou culposa foi praticada contra mulher, no
contexto de violência doméstica e familiar, com a incidência de uma das hipóteses do
artigo 5º da Lei 11.340/2006, a ação será pública incondicionada. É o que se extrai da
Súmula 542 do STJ, segundo a qual: “A ação penal relativa ao crime de lesão corporal
resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada”.

Nos termos do artigo 5º da Lei 11340/2006, configura violência doméstica e familiar


contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, quando praticada: a)
no âmbito da unidade doméstica; b) no âmbito da família; c) qualquer relação íntima de
afeto.

16
1.3.3. Titular do direito de representação

A representação pode ser exercida pelo ofendido ou representante legal (art. 24, parte
final, do CPP).

Se o ofendido contar com menos de 18 anos ou for mentalmente enfermo, o direito de


representação cabe exclusivamente a quem tenha qualidade para representá-lo, como, por
exemplo, seus pais.

Ao completar 18 anos e não sendo incapaz em decorrência de alguma enfermidade,


somente o ofendido poderá exercer o direito de representação e ninguém mais, já que, nesse
caso, atinge a capacidade plena para os atos da vida civil e também para representação na
esfera criminal.

O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com


poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério
Público, ou à autoridade policial (art. 39 do CPP).

No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito
de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (art. 24, § 1º, do CPP).

C ônjuge
A scentende
D escendente
I rmão

A representação não exige forma, bastando que o ofendido ou seu representante legal
manifeste a sua vontade, podendo, inclusive, ser de forma oral. Basta o registro de ocorrência
policial, com a manifestação de vontade do ofendido, para legitimar a representação.

1.3.4. Prazo

O direito de representação pode ser exercido dentro do prazo de 06 meses, contados do


dia em que o ofendido ou seu representante legal veio a saber quem é o autor do crime (art.
38 do CPP e art. 103 do CP).

17
Trata-se de prazo decadencial, que não se suspende nem se prorroga, e cuja fluência,
iniciada a partir do conhecimento da autoria da infração, é causa extintiva da punibilidade do
agente (art. 107, IV, do CP).

O prazo flui para o representante legal a partir do momento em que ele veio a saber quem
é o autor do ilícito penal. Quando a vítima for menor de 18 anos, entretanto, o prazo para
representar corre somente para o representante legal.

Ao completar 18 anos, somente o ofendido poderá exercer o direito de representação,


uma vez que, sendo considerado plenamente capaz pelo Código Civil, cessa, a partir dessa
idade, a figura do representante legal. Nesse caso, o prazo decadencial começará a correr no
momento em que o ofendido completar 18 anos de idade.

1.3.5. Retratabilidade

Nos termos do art. 25 do CPP e art. 102 do CP, “a representação será irretratável depois
de oferecida a denúncia”. Assim, se o ofendido exerce o direito de representação, pode retirá-la
antes de iniciar-se a ação penal com o oferecimento da denúncia, sem a necessidade de
qualquer formalidade.

Dica missioneira!

No contexto de violência doméstica ou familiar contra a mulher, nos crimes de ação


penal pública condicionada à representação, como, por exemplo, o crime de ameaça (art.
147 do CP), será possível a retratação perante o juiz, desde que seja designada
audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da
denúncia e ouvido o Ministério Público (art. 16 da Lei 11.340/2006).

1.3.6. Consequências

A falta de representação enseja a rejeição da denúncia, nos termos do artigo 395, II, do
CPP (essa tese é a adequada para a peça resposta à acusação), bem como a nulidade do
processo, nos termos do artigo 564, III, “a”, do CPP (essa tese seria mais adequada para
memoriais em diante).

18
Se tiver extrapolado o prazo de 06 meses, jamais esquecer de alegar a decadência do
direito de representação, e, por consequência, a extinção da punibilidade, conforme o artigo 107,
IV, do CP.

Dica missioneira!

Se a peça for resposta à acusação, após abordar a tese da decadência e extinção


da punibilidade, conforme o artigo 107, IV, do CP, deve ser formulado o pedido de
absolvição sumária, com base no artigo 397, IV, do CPP.

1.4. Ação penal privada


É aquela em que o Estado, titular exclusivo do direito de punir, transfere a legitimidade
para a propositura da ação penal à vítima ou a seu representante legal.
A ação penal privada é promovida mediante queixa-crime do ofendido ou de seu
representante legal. São aqueles crimes em que no tipo penal consta a expressão “somente se
procede mediante queixa”.

19
1.5. Questões sobre Ação Penal

1) QUESTÃO 2 – XXXI EXAME


Em 05 de junho de 2019, Paulo dirigia veículo automotor em via pública, com capacidade
psicomotora alterada em razão da influência de álcool, ocasião em que veio a atropelar Lúcia
por avançar cruzamento com o sinal fechado para os veículos. Lúcia sofreu lesões que a
deixaram com debilidade permanente no braço, o que foi reconhecido pelo laudo pericial
respectivo, também ficando comprovado o estado clínico em que se encontrava o motorista
atropelador. Considerando que Paulo arcou com as despesas que Lúcia teve que despender em
razão do evento, a vítima não quis representar contra ele. Inobstante tal manifestação da vítima,
o Ministério Público denunciou Paulo pela prática dos injustos do Art. 303, § 2º, e do Art. 306,
ambos da Lei nº 9.503/97. Considerando as informações narradas, esclareça, na condição de
advogado(a), aos seguintes questionamentos formulados por Paulo, interessado em constituí-lo
para apresentação de resposta à acusação.
A) Qual a tese jurídica de direito material que a defesa de Paulo deverá alegar para
contestar a tipificação apresentada?
B) Diante da ausência de representação por parte da ofendida, o Ministério Público teria
legitimidade para propor ação penal contra Paulo?
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

2) QUESTÃO 2 – XVII EXAME


Glória, esposa ciumenta de Jorge, inicia uma discussão com o marido no momento em que ele
chega do trabalho à residência do casal. Durante a discussão, Jorge faz ameaças de morte à
Glória, que, de imediato comparece à Delegacia, narra os fatos, oferece representação e solicita

20
medidas protetivas de urgência. Encaminhados os autos para o Ministério Público, este requer
em favor de Glória a medida protetiva de proibição de aproximação, bem como a prisão
preventiva de Jorge, com base no Art. 313, inciso III, do CPP. O juiz acolhe os pedidos do
Ministério Público e Jorge é preso. Novamente os autos são encaminhados para o Ministério
Público, que oferece denúncia pela prática do crime do Art. 147 do Código Penal. Antes do
recebimento da inicial acusatória, arrependida, Glória retorna à Delegacia e manifesta seu
interesse em não mais prosseguir com o feito. A família de Jorge o procura em busca de
orientação, esclarecendo que o autor é primário e de bons antecedentes. Considerando apenas
a situação narrada, na condição de advogado(a) de Jorge, esclareça os seguintes
questionamentos formulados pelos familiares:
A) A prisão de Jorge, com fundamento no Art. 313, inciso III, do Código de Processo Penal,
é válida?
B) É possível a retratação do direito de representação por parte de Glória? Em caso
negativo, explicite as razões; em caso positivo, esclareça os requisitos.
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

3) QUESTÃO 3 – 35º EXAME


Em 09 de agosto de 2021, durante uma reunião de condomínio, iniciou-se uma discussão. O
morador Paulo, lutador de vale tudo, chamou Fábio, o síndico, de ladrão. Ato contínuo, Paulo
partiu para cima de Fábio, no intuito de quebrar seu nariz com um soco. Em seguida, Fábio,
praticante de jiu jitsu, golpeou Paulo, que caiu no chão desmaiado. Paulo foi levado para o
hospital, mas foi liberado horas depois. O laudo hospitalar atestou apenas escoriações leves. Em
10 de maio de 2022, em outra reunião de condomínio, Paulo e Fábio encontraram-se novamente.
Fábio já tinha esquecido os fatos ocorridos na ocasião anterior, porque não era pessoa de
guardar rancor. No entanto, Paulo lembrou de tudo que passou, sentiu-se envergonhado perante
os demais condôminos e resolveu seguir em frente para processar Fábio criminalmente. No dia
seguinte, Paulo noticiou o ocorrido na reunião anterior à autoridade policial e apresentou o laudo
hospitalar para comprovar a lesão sofrida. Após os trâmites regulares das investigações, o
promotor de justiça com atribuição para o caso ofereceu denúncia em face Fábio como incurso
nas sanções do crime de lesão corporal leve, previsto no art. 129, caput do CP. A denúncia foi
recebida e determinada a citação do réu. Considerando as informações acima, na condição de
advogado(a) de Fábio, responda aos itens a seguir.

21
A) Qual tese a defesa pode alegar como preliminar? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual tese de direito material pode ser utilizada para a defesa de Fábio? Justifique.
(Valor: 0,65)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

4) QUESTÃO 1 – 36º EXAME


Ana Beatriz foi denunciada pelo Ministério Público pela prática dos crimes de falsificação de
documento particular (Art. 298 do CP) e estelionato (Art. 171 do CP), em concurso material (Art.
69 do CP), por ter obtido vantagem patrimonial ilícita às custas da vítima Rita (pessoa civilmente
capaz e mentalmente sã, à época com 21 anos de idade), induzindo-a e mantendo-a em erro,
mediante meio fraudulento. Segundo narra a denúncia, em julho de 2020 Ana Beatriz falsificou
bilhete de loteria premiado e o vendeu para Rita por metade do valor do suposto prêmio,
alegando urgência em receber valor em espécie para poder custear cirurgia da sua filha. Rita,
envergonhada, não procurou as autoridades públicas para solicitar a apuração dos fatos. A
denúncia foi oferecida ao Juízo competente em dezembro de 2020.
Sobre a hipótese, responda aos itens a seguir.
A) Qual é a tese jurídica de mérito que pode ser invocada pela defesa técnica de Ana
Beatriz? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual é a tese jurídica processual que pode ser invocada pela defesa técnica de Ana
Beatriz? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

22
Queixa-crime

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 01/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

2.1 Conceito

Trata-se, em síntese, da petição inicial da ação penal privada oferecida, via de regra, pelo
ofendido ou seu representante legal, por meio de advogado(a), ou seja, você haha.

2.2 Base legal

Arts. 30 (ou 31, na hipótese de ser oferecida por algum do CADI), 41 e 44, todos
do Código de Processo Penal, e art. 100, § 2º, do Código Penal.

2.3 Identificação

Narrando um fato do qual foi vítima, que se enquadra em crime de ação penal privada, o
ofendido ou seu representante legal procura advogado(a) para adotar a medida cabível.

Exemplo da peça queixa-crime do XV Exame da OAB: “(...) Enrico procurou seu escritório
de advocacia e narrou os fatos acima. Você, na qualidade de advogado de Enrico, deve assisti-
lo.”

PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica:
Peça:
“Ação penal privada... o ofendido
procura você como advogado(a)” Queixa-crime

PAROU!
23
2.4 Legitimidade – Arts. 30 e 31 do CPP.

OFENDIDO Art. 30 do CPP

REPRESENTANTE LEGAL Art. 30 do CPP

CADI (morte ou ausência do


Art. 31 do CPP
ofendido)

A queixa-crime é ajuizada por um advogado contratado pelo ofendido ou seu


representante legal, detentores da legitimidade para ajuizar a ação penal privada (art. 30 do
CPP).

Se o ofendido morre ou é declarado ausente, o direito de oferecer queixa, ou de dar


prosseguimento à acusação, passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (art. 31 do
CPP), ressalvado o caso dos art. 236, parágrafo único, do CP, cuja legitimidade será somente
do cônjuge enganado.

2.5 Prazo da ação penal privada

6 meses
A contar da
ciência da autoria
do fato
Prazo decadencial
(art. 10 do CP)

O prazo para o oferecimento da queixa-crime é de 06 (seis) meses, contados a partir da


data do conhecimento da autoria do crime pelo ofendido ou seu representante legal (art. 38 do
CPP e 103 do CP).

24
O prazo é penal, contado conforme o art. 10 do CP, computando-se o dia do começo e
excluindo-se o dia final. Assim, se, por exemplo, o ofendido do crime de calúnia toma
conhecimento da autoria do fato no dia 12 de março de 2020, a queixa-crime deverá ser oferecida
até o dia 11 de setembro de 2020, sob pena de decadência e consequente extinção da
punibilidade.

DICA MISSIONEIRA!

Conte 6 meses menos um dia para encontrar o último dia do prazo para o
oferecimento da queixa-crime.

Tratando-se de ação penal privada subsidiária, o prazo será de 06 meses a contar do


encerramento do prazo para o Ministério Público oferecer a denúncia (art. 29 do CPP e 100, §
3º, do CP). Nesse caso, se o ofendido não exercer dentro do prazo de 6 meses a partir do
esgotamento do prazo para o Ministério Público, a única consequência é a de que perderá o
direito de representação, significando que a partir disso somente o Ministério Público terá
legitimidade para ajuizar a ação penal, pelo menos enquanto não incidir eventual prescrição.

25
2.6 Requisitos da queixa – Art. 41 do CPP

Descrição do FATO e circunstâncias

Identificação/Qualificação do querelante e
querelado

Classificação jurídica

Pedido de citação

Pedido de condenação

Rol de testemunhas

Valor mínimo indenizatório (art. 387, inciso IV, CPP)

Pedido produção de provas

A) Descrição do fato em todas as suas circunstâncias:

• Descrever o fato de forma clara e objetiva, mencionando o autor da ação


(ofendido/querelante) e o ofensor (querelado), a data, local do fato, os meios e instrumentos
empregados, a forma como foi praticado o crime e o motivo.
• Mencionar que a conduta do querelado constitui crime de ação penal privada,
destacando e descrevendo, ainda, eventuais agravantes, qualificadoras ou causas de aumento
de pena.
• Na hipótese de concurso de agentes, a queixa deve especificar a conduta de cada
um. Assim, no caso de coautoria e participação, deverá ser descrita, individualmente, a conduta
de cada um dos coautores e partícipes.

26
B) Qualificação do acusado ou fornecimento de dados que possibilitem sua
identificação

Qualificar é apontar o conjunto de qualidades pelas quais se possa identificar o querelado,


distinguindo-o das demais pessoas: nome, nacionalidade, estado civil, RG, etc...

OBSERVAÇÃO: Na prova da OAB, colocar na qualificação única e exclusivamente os


dados fornecidos no enunciado da questão, sob pena de ter a peça zerada (podem interpretar
que o candidato esteja se identificando).

C) Classificação jurídica do fato

O autor deverá indicar o dispositivo (artigo) que se aplica ao fato imputado, não bastando
a simples menção ao nome da infração.

Trata-se da adequação típica do fato narrado ao dispositivo legal correspondente.

D) Rol de Testemunhas

O momento adequado para arrolar testemunhas, consoante o disposto no art. 41 do CPP,


é o da propositura da ação.

E) Pedido de condenação

2.7 Alguns crimes de ação penal privada previstos no Código Penal

• Arts. 138 (calúnia), 139 (difamação) e 140 (injúria), ressalvada a hipótese do art.
145 e parágrafo único, bem como disposto na Súmula 714 do STF.
• Art. 161, § 1º, incisos I e II – Alteração de limites (se não usar de violência e a
propriedade for particular).
• Art. 163, caput, inciso IV do parágrafo único e art. 164 c/c art. 167 (crime de dano)
• Art. 179 e parágrafo único – fraude à execução
• Art. 184, caput – violação de direito autoral
• Art. 236 - induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento
• Art. 345 (exercício arbitrário das próprias razões – VIII Exame da OAB)

27
2.8 Procuração com poderes especiais

Na peça, importante mencionar, na parte do preâmbulo e qualificação, que a queixa-crime


está instruída com instrumento de procuração com poderes especiais (art. 44 do CPP).

DICA MISSIONEIRA... SE ESQUECER, FUJA DAS GALÁXIAS!

Na peça queixa-crime, é fundamental, na parte do preâmbulo (qualificação e base legal),


seja feita referência à procuração com poderes especiais, e ao artigo 44 do CPP.

No XV Exame representou 0,30 pontos:

Item 3.2 – Existência de Procuração com poderes


especiais de acordo com o artigo 44 do CPP em
0,00/ 0,30
anexo ou menção acerca de sua existência no corpo
da qualificação. (0,30)

2.9 Valor indenizatório mínimo

Além disso, deve ser feita referência ao disposto no art. 387, IV, do CPP, que dispõe sobre
a fixação do valor mínimo para a indenização da vítima.

28
2.10 Estruturação da Queixa-crime:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DA


COMARCA DE... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DE... (se crime da competência da Justiça Federal)1
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO... DO JUIZADO ESPECIAL
CRIMINAL DA COMARCA DE... (se a infração for de menor potencial ofensivo – Lei
9.099/95)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO DA VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE...2

FULANO DE TAL, nacionalidade..., estado civil..., profissão..., RG...,


CPF..., endereço eletrônico..., residente e domiciliado 3..., por seu procurador infra-assinado,
com procuração com poderes especiais em anexo, vem, respeitosamente, à presença de
Vossa Excelência, oferecer QUEIXA-CRIME, com base nos artigos 30, 41 e 44, todos do
Código de Processo Penal, e artigo 100, § 2º, do Código Penal, contra CICLANO DE TAL,
nacionalidade..., estado civil..., profissão..., RG..., CPF..., endereço eletrônico..., residente
e domiciliado... , pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos.

I) TEMPESTIVIDADE
A presente queixa-crime é tempestiva, pois oferecida dentro do prazo de 6
meses, previsto no artigo 38 do Código de Processo Penal e artigo 103 do Código Penal4.

1 Art. 109, CF – competência da justiça federal.


2 Se se tratar de crime de ação penal privada praticado contra a mulher no contexto de violência doméstica e familiar, como, por
exemplo, marido praticar injúria (art. 140 CP) contra a esposa.
3 Não inventar dados, apenas utilizar o fornecido no enunciado.
4 Considerando a exigência da tempestividade na peça do 35º Exame, sugerimos fazer menção ao prazo para oferecimento da
queixa-crime.

29
II) DOS FATOS5
1º parágrafo: localizar (data, hora, local) e verbo nuclear do tipo;
2º parágrafo: descrever como foi praticado o delito;
3º parágrafo: eventuais agravantes, causas de aumento de pena ou qualificadoras;

III) DO DIREITO
Mencionar o fato e atribuir o respectivo tipo penal.

IV) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer o querelante:
a) o recebimento da queixa-crime;
b) a citação do querelado;
c) produção de provas, com a oitiva das testemunhas arroladas;
d) a procedência do pedido, com a consequente condenação do querelado nas penas
dos artigos... do CP;
e) a fixação de valor mínimo de indenização, nos termos do artigo 387, IV, do CPP.

ROL DE TESTEMUNHAS (somente dados fornecidos no enunciado)


A) Fulano de tal...
B) Fulano de tal...
Nestes termos,
pede deferimento.

Local..., data...
Advogado...
OAB...

5 Deve-se narrar o fato criminoso de forma clara, objetiva e detalhada, com todas suas circunstâncias, sem inventar dados e
somente reproduzir o enunciado da questão.

30
Observações:
a) Se for ajuizada a queixa-crime perante o Juizado Especial Criminal, formular pedido também
de designação de audiência preliminar ou de conciliação, conforme constou no XV Exame,
quando caiu queixa-crime.
b) Como regra, a competência para processar e julgar os crimes contra a honra será do Juizado
Especial Criminal (pois a pena máxima é a do crime de calúnia e não supera 2 anos), seguindo
o rito lá disposto.
c) Contudo, havendo concurso de crimes entre calúnia e difamação e/ou injúria, bem como causa
de aumento de pena que resultem na pena superior a dois anos, a queixa-crime não será
oferecida perante o Juizado Especial Criminal, mas perante a Vara Criminal, e, nesse caso, deve-
se formular pedido de audiência de reconciliação, nos termos do artigo 520 do CPP.
d) Jamais esquecer de apresentar o rol de testemunhas (sem inventar nomes e dados. Colocar
somente os fornecidos pelo enunciado).

Assista como resolver a peça queixa-crime

2.11 Questões sobre queixa-crime

5) QUESTÃO 2 – XXXIII EXAME


Bernardo, em 31 de dezembro de 2018, com a intenção de causar dano à loja de Bruno, seu
inimigo, arremessou uma pedra na direção de uma janela com mosaico, que tinha valor
significativo de mercado. Ocorre que, no momento da execução do crime, Bernardo errou o
arremesso e a pedra acabou por atingir Joana, funcionária que passava em frente à loja e que
não tinha sido percebida, causando-lhe lesões corporais que a impossibilitaram de trabalhar por
50 dias. A janela restou intacta. No momento do crime, não foi identificada a autoria, mas, após
investigação, em 04 de março de 2019, foi descoberto que Bernardo seria o autor do arremesso.

31
O Ministério Público iniciou procedimento em face de Bernardo imputando-lhe o crime de lesão
corporal de natureza culposa, figurando como vítima Joana, que apresentou representação
quando da descoberta do autor. Bruno, revoltado com o ocorrido, contratou um advogado,
conferindo-lhe procuração com poderes gerais, constando o nome do ofendido e do ofensor. O
procurador apresenta queixa-crime, em 02 de julho de 2019, imputando a prática do crime de
tentativa de dano a Bernardo. Ao tomar conhecimento da queixa-crime, Bernardo o procura,
como advogado. Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado(a)
de Bernardo, responda aos questionamentos a seguir.
A) Qual argumento de direito processual poderá ser apresentado em busca da rejeição da
queixa-crime apresentada? Justifique.
B) Qual argumento de direito material a ser apresentado para questionar o delito imputado
na queixa-crime? Justifique.
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

32
Citação

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 02/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

3.1 Da citação

a) Citação pessoal

Não sendo caso de rejeição da denúncia, deve o juiz recebê-la, determinando, a seguir, a
citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, se não
for o caso de suspensão condicional do processo (previsto no artigo 89 da Lei 9.099/95 ).

No processo penal, a regra é citação pessoal e por mandado, observando-se os requisitos


do art. 351, 352 e 357 CPP.

b) citação por hora certa

Se o réu se oculta para não ser citado, o artigo 362 prevê a possibilidade de citação por
hora certa, oportunidade em que o oficial de justiça certificará a ocorrência e procederá à citação
com hora certa, na forma estabelecida nos arts. 227 a 229 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de
1973 - Código de Processo Civil.

Todavia, a partir da entrada em vigor do novo CPC, a citação por hora certa na esfera
penal segue o procedimento previsto nos artigos 252 a 254 do CPC. Assim, quando, por 2 (duas)
vezes, o oficial de justiça houver procurado o citando em seu domicílio ou residência sem o
encontrar, deverá, havendo suspeita de ocultação, intimar qualquer pessoa da família ou, em
sua falta, qualquer vizinho de que, no dia útil imediato, voltará a fim de efetuar a citação, na hora
que designar.

Nos termos do artigo 253 do Novo CPC, no dia e na hora designados, o oficial de justiça,
independentemente de novo despacho, comparecerá ao domicílio ou à residência do citando a
fim de realizar a diligência. Se o citando não estiver presente, o oficial de justiça procurará

33
informar-se das razões da ausência, dando por feita a citação, ainda que o citando se tenha
ocultado em outra comarca, seção ou subseção judiciárias.

A citação com hora certa será efetivada mesmo que a pessoa da família ou o vizinho que
houver sido intimado esteja ausente, ou se, embora presente, a pessoa da família ou o vizinho
se recusar a receber o mandado.

Da certidão da ocorrência, o oficial de justiça deixará contrafé com qualquer pessoa da


família ou vizinho, conforme o caso, declarando-lhe o nome.

O oficial de justiça fará constar do mandado a advertência de que será nomeado curador
especial se houver revelia.

Conforme o artigo 254 do CPC, feita a citação com hora certa, o escrivão ou chefe de
secretaria enviará ao réu, executado ou interessado, no prazo de 10 (dez) dias, contado da data
da juntada do mandado aos autos, carta, telegrama ou correspondência eletrônica, dando-lhe de
tudo ciência.

c) Citação por edital

Na hipótese de o réu encontrar-se em local incerto e não sabido, a citação será feita por
edital, suspendendo-se o processo e o prazo prescricional se o réu não comparecer ou não
nomear advogado, conforme artigo 366 CPP. A citação por edital somente será possível quando
se esgotarem todas as possibilidades de localizar o réu.

Ressalta-se: somente quando o réu for citado pessoalmente e não apresentar resposta à
acusação é que o juiz poderá nomear um defensor para realizar a defesa técnica e continuar o
processo. Se não for caso de citação pessoal, mas citação por edital, deve-se aplicar a regra do
art. 366 do CPP, suspendendo-se o processo e a prescrição.

34
CUIDADO:

Nos termos da Súmula 415 do STJ, “O período de suspensão do prazo prescricional é


regulado pelo máximo da pena cominada”.
Ou seja, na hipótese de um crime com pena máxima de 02 anos o prazo prescricional é de
04 anos. Com o recebimento da denúncia, o prazo de prescrição é interrompido, passando
a correr novamente o prazo de 04 anos. Considere que entre o recebimento da denúncia e
a decretação da suspensão do processo e do prazo prescricional (em decorrência da
citação por edital) tenha se passado 06 meses. A ação ficará suspensa por 04 anos se o
réu não for localizado. Findo o período de suspensão, o prazo prescricional volta a correr
pelos 03 anos e 06 meses restantes. Ao término deste período, deverá ser decretada extinta
a punibilidade do réu pela prescrição da pretensão punitiva.

A ausência de citação ou vícios insanáveis no ato citatório constitui causa de nulidade


absoluta do processo.

3.2 Questões sobre citação e rejeição da denúncia

6) QUESTÃO 3 – XXXIV EXAME


Carla, funcionária de determinado estabelecimento comercial, inseriu, em documento particular,
informação falsa acerca da data de determinado serviço que teria sido prestado pela empresa,
em busca de prejudicar direito de terceiro, sendo realmente a inserção da informação de sua
responsabilidade. Descobertos os fatos pelo superior hieráquico de Carla, foi apresentada notitia
criminis em desfavor da funcionária, que veio a ser denunciada como incursa nas sanções penais
do Art. 298 do Código Penal (falsificação de documento particular). No momento da citação, o
Oficial de Justiça compareceu ao endereço fornecido pelo Ministério Público, sendo que
constatou, na primeira vez que foi ao local, que Carla lá residia, mas que estava se ocultando
para não ser citada. Diante disso, certificou tal fato e foi determinada a citação por edital pelo
magistrado. Carla é informada do teor do edital por uma amiga que trabalhava no Tribunal de
Justiça e procura você, como advogado(a), para prestar assistência jurídica.
Responda, na condição de advogado(a) de Carla, considerando apenas as informações
expostas, aos seguintes questionamentos.
A) A citação de Carla foi realizada de forma válida? Justifique. (Valor: 0,60)

35
B) Qual o argumento de direito material a ser apresentado para questionar a capitulação
delitiva? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação ou transcrição do
dispositivo legal não confere pontuação.

7) QUESTÃO 1 – 36º EXAME


Ana Beatriz foi denunciada pelo Ministério Público pela prática dos crimes de falsificação de
documento particular (Art. 298 do CP) e estelionato (Art. 171 do CP), em concurso material (Art.
69 do CP), por ter obtido vantagem patrimonial ilícita às custas da vítima Rita (pessoa civilmente
capaz e mentalmente sã, à época com 21 anos de idade), induzindo-a e mantendo-a em erro,
mediante meio fraudulento. Segundo narra a denúncia, em julho de 2020 Ana Beatriz falsificou
bilhete de loteria premiado e o vendeu para Rita por metade do valor do suposto prêmio,
alegando urgência em receber valor em espécie para poder custear cirurgia da sua filha. Rita,
envergonhada, não procurou as autoridades públicas para solicitar a apuração dos fatos. A
denúncia foi oferecida ao Juízo competente em dezembro de 2020.
Sobre a hipótese, responda aos itens a seguir.
A) Qual é a tese jurídica de mérito que pode ser invocada pela defesa técnica de Ana
Beatriz? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual é a tese jurídica processual que pode ser invocada pela defesa técnica de Ana
Beatriz? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

36
Teoria do dolo e culpa

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

4.1 Do crime doloso


4.1.1 Dolo direto
No dolo direto, o agente quer o resultado e desenvolve uma conduta voltada a produção
desse resultado. Aplica-se aqui a teoria da vontade.
Exemplo: o agente desfere golpes de faca na vítima com intenção de matá-la. O dolo se
projeta de forma direta no resultado morte.

4.1.2 Dolo eventual


Em relação ao dolo eventual, adota-se a teoria do consentimento ou assentimento, inserta
na expressão “assumiu o risco de produzi-lo”, encartada no artigo 18, I, do Código Penal.
Ocorre o dolo eventual quando o sujeito assume o risco de produzir o resultado, isto é,
admite e aceita o risco de produzi-lo. No dolo eventual, o agente não quer o resultado (se
desejasse, seria dolo direto), mas, mesmo prevendo a realização do resultado, segue em diante
na sua conduta assumindo o risco de produzi-lo. No dolo eventual, o agente representa como
possível o resultado não desejado, mas assume o risco de provocar lesão a um bem jurídico,
seguindo em diante com a sua conduta, revelando, assim, conformismo com a produção do
evento.
Tomemos como exemplo a conduta do agente que, pretendendo a morte do seu desafeto,
efetua um disparo em sua direção, mesmo visualizando que se encontrava conversando com
uma pessoa bem próxima a ele. O agente prevê que também pode atingir a outra pessoa, mas
segue em diante na sua conduta, assumindo o risco de errar o disparo contra o seu desafeto e
atingir a outra pessoa, sendo-lhe indiferente quanto ao resultado que possa ser produzido em
relação ao terceiro. Se efetuar disparos matando o seu desafeto e também a outra pessoa, o
agente responderá por dois crimes de homicídio: o primeiro, a título de dolo direto; o segundo, a
título de dolo eventual.
Assim, no dolo eventual, o agente, embora não deseje diretamente o resultado, age com
indiferença e desprezo na sua produção, aceitando a sua ocorrência. Prefere arriscar-se a

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produzi-lo a se abster e cessar a sua conduta. Age, pois, com dolo eventual, o agente que ofende
a integridade física de mulher grávida, ciente do seu adiantado estado gravídico, causando-lhe
o aborto. Note-se que o agente não quer o resultado, pois se desejasse, agiria com dolo direto,
mas prevê como possível o aborto e mesmo assim segue em diante com a sua conduta,
assumindo o risco de interromper a gravidez com a morte do feto.

4.2 Do crime culposo


4.2.1 Conceito
Extrai-se do artigo 18, inciso II, do Código Penal, que, no crime culposo, o agente
desenvolve uma conduta voluntária, produzindo, no entanto, um resultado involuntário (não
querido ou aceito pelo agente), mas que lhe era previsível (culpa inconsciente) ou
excepcionalmente previsto (culpa consciente) e poderia ser evitado se empregasse a cautela
necessária.
Via de regra, os tipos penais culposos não descrevem a conduta, limitando-se a apontar
que determinado delito é culposo. Trata-se de um tipo penal aberto, sendo, por isso, necessário
empregar um juízo de valor acerca da conduta do agente. Ex: homicídio culposo, previsto no
artigo 121, § 3º, CP.
Nesse sentido, se determinado delito não prevê a modalidade culposa, o fato praticado
será atípico.
Exemplo: O crime de dano (art. 163 do Código Penal) não prevê a modalidade culposa.
Logo, causar, por negligência ou imprudência, dano a patrimônio alheio constitui fato atípico.

4.2.2 Elementos do crime culposo


E São elementos do fato típico culposo: a) Conduta humana voluntária; b) Inobservância
do dever de cuidado objetivo c) Resultado involuntário; d) Nexo de causalidade; e) Previsibilidade
objetiva; f) Ausência de previsão; g) Tipicidade.

a) Conduta humana voluntária


No crime culposo, o agente desenvolve uma conduta voluntária, agindo, porém, sem o
dever de cuidado objetivo. O resultado produzido é involuntário.
Tomemos como exemplo alguém que, atrasado para realizar uma prova na faculdade,
imprime velocidade excessiva em seu veículo, vindo, em razão disso, a atropelar uma pessoa,

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causando-lhe a morte. A finalidade do agente, sem dúvida, era lícita (chegar no local da prova).
Contudo, os meios utilizados para alcançar essa finalidade foram inadequados, uma vez que,
para chegar ao local da prova, imprimindo alta velocidade na condução de veículo automotor,
não observou o dever de cuidado objetivo, atropelando e causando a morte de uma pessoa.
Note-se que a conduta voluntária do agente foi desenvolvida para alcançar uma finalidade
lícita, gerando, no entanto, um resultado involuntário.

b) Inobservância do dever de cuidado objetivo


As pessoas, durante as relações de convívio social, devem observar as regras básicas de
cuidado e cautela. Essas regras gerais de cuidado decorrem da vedação de condutas capazes
de gerar riscos a bem jurídico alheio além do que se reputa razoável tolerar.
De fato, as regras de convívio social impõem às pessoas o dever de cautela para não
atingir bem jurídico alheio. Por isso, quem se arriscar a realizar, por exemplo, conduta
imprudente, sobrevindo um resultado típico, incorrerá na prática de crime culposo.

c) Resultado involuntário
Ao desvalor da ação voluntária, acrescenta-se o desvalor do resultado involuntário, mas
produzido em decorrência da inobservância do dever de cuidado objetivo.
Como nos crimes culposos a conduta voluntária é dotada de finalidade lícita, afigura-se
imprescindível a produção de um resultado naturalístico. Isso porque, se é voltada a uma
finalidade lícita, a conduta do agente constitui um indiferente penal, razão pela qual se mostra
necessário a produção de um resultado involuntário para caracterizar o crime culposo.

d) Nexo de causalidade
O crime culposo depende de um resultado naturalístico, já que se trata de crime material.
E, em se tratando de crime material, exige-se, para a adequada tipificação, o nexo causal entre
a conduta voluntária descuidada e o resultado involuntário.

e) Previsibilidade objetiva
É a possibilidade de uma pessoa comum, com diligência e prudência inerente à média da
população, prever a incidência de determinado resultado. Trata-se da previsibilidade daquilo que
se convencionou chamar de homem médio, considerando-se o grau de atenção e cuidado
exigido das pessoas de mediana inteligência.

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A previsibilidade do resultado é aferida a partir de um juízo de valor, comparando a
conduta desenvolvida pelo agente com a de um homem médio.
Assim, se realizar uma conduta sem prever o resultado, mas uma pessoa comum, com
prudência e inteligência mediana, inerente à generalidade dos indivíduos, teria a possibilidade
de prever, o agente terá agido, se presentes os demais elementos, com culpa, uma vez que, nas
circunstâncias, desenvolveu uma conduta sem prever o resultado que era previsível.
Esse juízo de valor deve ser realizado considerando as circunstâncias do caso concreto,
considerando a postura de um homem médio nas mesmas condições em que o agente se
encontrava. Ou seja, a análise não deve levar em conta qualquer homem médio, mas a
possibilidade de antever o resultado nas mesmas circunstâncias e condições em que o agente
estava inserido.
Assim, se o contexto fático envolve acidente de trânsito, deve-se realizar um juízo de valor
acerca da conduta do agente levando-se em conta a generalidade dos motoristas de veículo
automotor. Se a situação fática envolve uma intervenção cirúrgica, o juízo de valor e a
possibilidade de antever o resultado deve ser realizado considerando um cirurgião com diligência
e perspicácia normais à generalidade dos cirurgiões.

f) Ausência de previsão
Para caracterizar o fato típico culposo, é necessário, ainda, que o agente não tenha
previsto o resultado, embora previsível. Se o previu, não há culpa, mas, via de regra, dolo.
Se o agente, dentro da concepção do homem médio, não tinha condições de prever o
resultado, embora previsível, afastada estará a culpa. Se há previsão do resultado, mas ainda
assim o agente desenvolve a conduta, sendo indiferente quanto à produção do evento, há dolo,
e não culpa.
Não se vislumbra, pois, previsibilidade do agente que, conduzindo o veículo dentro das
normas de trânsito, atropela uma pessoa, que, de forma inesperada e repentina, se joga em
frente ao veículo com desejo suicida.
Todavia, de forma excepcional, pode haver previsão do resultado na culpa, quando se
tratar de culpa consciente.

g) Tipicidade
A tipicidade também constitui elemento do fato típico culposo.

40
Para caracterizar o crime culposo, o fato praticado pelo agente deve encontrar
correspondência num tipo penal que prevê a modalidade culposa da conduta.
E, nos crimes culposos, há a peculiaridade de somente incidirem se expressamente
previstos em lei. É o que se extrai do artigo 18, parágrafo único, do Código Penal, segundo o
qual “salvo os casos expressos em lei, ninguém poderá ser punido por fato previsto como crime,
senão quando o pratica dolosamente”.
De fato, quando o tipo penal descreve um modelo legal de conduta proibida, silenciando
a respeito da modalidade culposa, significa que o crime existe somente na forma dolosa.
Tomemos como exemplo o crime de furto (CP, art. 155). O tipo penal descreve a conduta
proibida (Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel), silenciando quanto à modalidade
culposa dessa conduta. Logo, forçoso concluir que não existe furto culposo, incidindo, pois,
somente na modalidade dolosa.
Da mesma forma, se Adriano, acidentalmente, quebra a tela do celular de Vinicius, seu
colega de trabalho, o fato não constituirá crime, uma vez que não há previsão na lei do crime de
dano culposo.
Assim, para se aferir a tipicidade, deve-se verificar se o fato praticado pelo agente
encontra correspondência numa norma penal incriminadora que prevê a modalidade culposa.
Imaginemos que um motorista, imprimindo velocidade excessiva no seu veículo, dirigindo, pois,
de forma imprudente, perde o controle da direção e atropela uma pessoa, causando-lhe a morte.
Essa conduta imprudente encontra correspondência no tipo penal que define o crime de
homicídio culposo na condução de veículo automotor (Lei 9.503/97, art. 302), havendo, pois,
tipicidade.

• Modalidades de culpa:
A inobservância do dever objetivo de cuidado, que é a quebra do dever de cuidado imposto
a todos, é manifestada por meio de três modalidades de culpa, todas previstas no artigo 18, II,
do Código Penal: imprudência, negligência e imperícia.
a) Imprudência
A conduta imprudente se caracteriza por agir um positivo, sem a observância do dever de
cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato perigoso, de forma intempestiva e
precipitada.
É a culpa decorrente de um comportamento positivo descuidado. Trata-se de modalidade
de culpa que incide paralelamente à ação do agente. É, pois, a face ativa ou positiva da culpa,

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que se exterioriza de forma concomitante à ação desenvolvida pelo agente. Trata-se, enfim, da
culpa in agendo.
A imprudência é, portanto, um fazer algo perigoso, sem observar o dever de cuidado
objetivo.
Age com imprudência o condutor de veículo automotor, que, imprimindo excessiva
velocidade, perde o controle do veículo, invade a calçada e atropela um pedestre, matando-o.
Da mesma forma, age com imprudência o agente que limpa arma de fogo carregada
próximo a pessoas e, de forma descuidada, aciona o gatilho, matando alguém que estava ao seu
lado.
b) Negligência
Trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a inobservância do dever de cuidado
do agente é retratada pela ausência de cautela e precaução. É a face omissiva ou negativa da
culpa. Trata-se da culpa in omitendo.
A negligência é, portanto, um não fazer algo, deixando, por isso, de observar o dever de
cuidado objetivo.
Ao contrário da imprudência, que ocorre concomitante à ação, a negligência se revela
sempre antes do início da conduta. Antes de agir, o negligente deixa de tomar as cautelas que
uma pessoa prudente adotaria.
Tomemos como exemplo o condutor de veículo que, antes de sair de viagem, deixa de
reparar os pneus e verificar os freios. Da mesma forma, age com negligência o pai que deixa
arma de fogo ao alcance de uma criança. Agem, ainda, com negligência os pais, por culpa in
vigilando, que deixam a criança de tenra idade, sem noção do perigo, caminhar vários metros à
sua frente, em acostamento de rodovia de intenso tráfego, culminando o episódio com o trágico
desfecho de um atropelamento, a atravessar o infante, repentina e abruptamente, a pista
asfáltica.
c) Imperícia
A imperícia se caracteriza pela falta de capacidade, preparo ou de conhecimentos técnicos
suficientes de agente autorizado a desempenhar determinada arte, profissão ou ofício.
É a chamada culpa profissional, pois decorrente da falta de aptidão para o exercício de
arte, ofício ou profissão. Ocorre quando o agente não tem o adequado conhecimento acerca das
técnicas e regras que todos que se dedicam à determinada profissão, arte ou ofício deveriam
dominar.

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Assim, se um médico cirurgião, que não domina determinada técnica inerente à
determinada intervenção cirúrgica, causar a morte do paciente, responderá por homicídio
culposo (CP, art. 121, § 3º), já que agiu com imperícia no exercício da sua profissão.

4.2.3 Diferença entre culpa consciente e dolo eventual


A culpa consciente se aproxima do dolo eventual, mas com ele não se confunde. Há entre
ambos os institutos uma característica em comum: a previsão do resultado. Todavia, a distinção
fundamental reside no fato de que no dolo eventual o agente prevê o resultado como possível,
mas segue em diante com a sua conduta assumindo o risco de produzi-lo, aceitando, inclusive,
a incidência de eventual evento lesivo; na culpa consciente, ao revés, o agente, embora tenha
previsto o resultado, não o aceita, pois considera, sinceramente, que não ocorrerá ou que terá
habilidade suficiente para evitar o evento lesivo.
Na culpa consciente, o agente tem consciência do risco da sua conduta, representa a
produção do resultado típico, prevendo-o como possível, mas desenvolve a conduta sem
observar o dever de cuidado objetivo, porque acredita firmemente que nada ocorrerá.
Imaginemos que Felipe e Rogério estejam praticando uma caçada. Em certo momento,
Felipe visualiza um animal próximo a Rogério, e, confiando na sua habilidade no manuseio de
uma arma, refutando a possibilidade de atingir o amigo, faz a mira em direção do animal, aciona
o gatilho, mas acaba acertando Rogério, causando-lhe a morte. Nesse caso, Felipe responderá
pelo crime de homicídio culposo, já que confiou convictamente que atingiria o animal, e não a
vítima.
No dolo eventual, o agente tem a nítida representação do resultado, prevendo-o como
possível realizá-lo, segue em diante na conduta, assumindo o risco e aceitando a produção do
resultado.
Tomemos como exemplo a conduta de Leonardo que, após uma noite inteira ingerindo
bebida alcoólica, estando, portanto, absolutamente embriagado, conduz seu veículo em altíssima
velocidade, arriscando manobras ousadas numa via de intenso fluxo de veículos e pedestres,
quando, ao ultrapassar sinal vermelho, atropela uma pessoa que cruzava a via. Há,
evidentemente, a previsão do resultado e, analisando-se todos os elementos que envolveram a
circunstâncias do caso concreto (embriaguez ao volante, excesso de velocidade em via
movimentada, ultrapassar sinal vermelho), forçoso concluir que o condutor do veículo assumiu o
risco de produzir o resultado, sendo indiferente quanto à sua incidência. Logo, nesse caso,
Leonardo deveria responder por homicídio doloso, na modalidade dolo eventual.

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Em síntese, incide a culpa consciente quando o agente prevê o resultado, mas espera,
sinceramente, que não ocorrerá; configura- se o dolo eventual quando a vontade do agente não
está dirigida para a obtenção do resultado, mas, prevendo que o evento possa ocorrer, assume
assim mesmo a possibilidade de sua produção, conformando-se com a sua ocorrência.

44
4.3 Questões sobre Teoria do dolo e culpa

8) QUESTÃO 1 – XIX EXAME


João estava dirigindo seu automóvel a uma velocidade de 100 km/h em uma rodovia em que o
limite máximo de velocidade é de 80 km/h. Nesse momento, foi surpreendido por uma bicicleta
que atravessou a rodovia de maneira inesperada, vindo a atropelar Juan, condutor dessa
bicicleta, que faleceu no local em virtude do acidente. Diante disso, João foi denunciado pela
prática do crime previsto no Art. 302 da Lei nº 9.503/97. As perícias realizadas no cadáver da
vítima, no automóvel de João, bem como no local do fato, indicaram que João estava acima da
velocidade permitida, mas que, ainda que a velocidade do veículo do acusado fosse de 80 km/h,
não seria possível evitar o acidente e Juan teria falecido. Diante da prova pericial constatando a
violação do dever objetivo de cuidado pela velocidade acima da permitida, João foi condenado à

45
pena de detenção no patamar mínimo previsto no dispositivo legal. Considerando apenas os
fatos narrados no enunciado, responda aos itens a seguir.
A) Qual o recurso cabível da decisão do magistrado, indicando seu prazo e fundamento legal?
(Valor: 0,60)
B) Qual a principal tese jurídica de direito material a ser alegada nas razões recursais? (Valor: 0,65)
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere
pontuação.

9) QUESTÃO 4 – EXAME 2010-03


Caio, professor do curso de segurança no trânsito, motorista extremamente qualificado, guiava
seu automóvel tendo Madalena, sua namorada, no banco do carona. Durante o trajeto, o casal
começa a discutir asperamente, o que faz com que Caio empreenda altíssima velocidade ao
automóvel. Muito assustada, Madalena pede insistentemente para Caio reduzir a marcha do
veículo, pois àquela velocidade não seria possível controlar o automóvel. Caio, entretanto,
respondeu aos pedidos dizendo ser perito em direção e refutando qualquer possibilidade de
perder o controle do carro. Todavia, o automóvel atinge um buraco e, em razão da velocidade
empreendida, acaba se desgovernando, vindo a atropelar três pessoas que estavam na calçada,
vitimando-as fatalmente. Realizada perícia de local, que constatou o excesso de velocidade, e
ouvidos Caio e Madalena, que relataram à autoridade policial o diálogo travado entre o casal,
Caio foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de homicídio na modalidade de
dolo eventual, três vezes em concurso formal. Recebida a denúncia pelo magistrado da vara
criminal vinculada ao Tribunal do Júri da localidade recolhida a prova, o Ministério Público pugnou
pela pronúncia de Caio, nos exatos termos da inicial. Na qualidade de advogado de Caio,
chamado aos debates orais, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos
apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
A) qual(is) argumento(s) poderia(m) ser deduzidos em favor de seu constituinte? (Valor:
0,40)
B) qual pedido deveria ser realizado? (Valor: 0,30)
C) Caso Caio fosse pronunciado, qual recurso poderia ser interposto e a quem a peça de
interposição deveria ser dirigida? (Valor: 0,30)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

46
Princípio da insignificância

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

5.1 Introdução
O princípio da insignificância, também denominado crime de bagatela, guarda relação com
o princípio da intervenção mínima e da fragmentariedade, no sentido de que ao Direito Penal
cumpre a proteção de bens jurídicos que, por sua relevância, efetivamente necessitam de tutela
penal.
O Direito Penal não deve incidir quando a conduta do agente não for suficientemente
capaz de causar lesão ou ao menos perigo de lesão a um determinado bem jurídico. Em síntese,
o Direito Penal não se presta para atuar diante de condutas que atingem bens jurídicos
irrelevantes e de natureza ínfima.
A natureza jurídica do princípio da insignificância é de causa de exclusão da tipicidade
material. Embora a conduta seja formalmente típica, será materialmente atípica, diante da
ausência de lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. Explica-se.
A tipicidade penal é formada pela junção da tipicidade formal com a tipicidade material.
A tipicidade formal nada mais é do que a adequação do fato praticado ao modelo legal de
conduta proibida descrito na norma penal. É o enquadramento do fato praticado à conduta
descrita no dispositivo penal. Assim, o fato de o agente subtrair determinado objeto se enquadra
na norma penal que prevê como crime de furto a conduta de subtrair, para si ou para outrem,
coisa alheia móvel. Ou seja, o fato praticado pelo agente se amolda à conduta proibida descrita
no art. 155 do CP. Eis a tipicidade formal.
Todavia, a subsunção do fato à norma penal não é suficiente. É necessário, ainda, que o
fato praticado atinja bem jurídico suficientemente relevante para ensejar a atuação do Direito
Penal. A conduta do agente, pois, deve ser minimamente suficiente para causar lesão ou perigo
de lesão a um bem juridicamente relevante. Eis a tipicidade material.
Se, conquanto prevista na norma penal como proibida (tipicidade formal), a conduta
desenvolvida pelo agente atingir bem jurídico irrelevante, o fato será materialmente atípico,
incidindo, assim, o princípio da insignificância.

47
Tomemos como exemplo a subtração de uma barra de chocolate no valor de R$ 5,00
(cinco reais) em uma grande rede de supermercados. Tal fato é formalmente típico, já que
insculpido como proibido no art. 155 do CP, mas será materialmente atípico, uma vez que o bem
jurídico atingido, por seu ínfimo valor, é irrelevante para o Direito Penal.

5.2 Requisitos
A incidência do princípio da insignificância não se dá de forma indiscriminada e sem
critérios.
Para o reconhecimento da atipicidade material do fato em decorrência do princípio da
insignificância, devem estar presentes requisitos de ordem objetiva, relacionados ao fato, bem
como de caráter subjetivo, relacionados ao agente, considerando sempre o caso concreto.
• Requisitos objetivos

O STF e o STJ apontam quatro requisitos objetivos para a incidência do princípio da


insignificância: a) mínima ofensividade da conduta; b) ausência de periculosidade social da ação;
c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão jurídica.
Os Tribunais Superiores elencam tais requisitos, sem, no entanto, estabelecer a diferença
entre eles e especificar o alcance de cada um. Há, ainda, quem entenda que tais requisitos são
tautológicos, que, em síntese, dizem a mesma coisa.
E, na verdade, parece-nos que não seria realmente adequado estabelecer critérios rígidos
e absolutos para cada requisito, já que os parâmetros estabelecidos para aferição da incidência
do princípio da insignificância podem variar a depender das circunstâncias do caso concreto,
como, por exemplo, o valor do bem atingido, a situação econômica da vítima, as condições
pessoais do autor do fato, bem como as peculiaridades da prática delituosa.
Em outras palavras, a valoração conjunta desses requisitos pode variar de caso a caso, o
que pode parecer insignificante num caso, pode não ser em outro semelhante, ou seja, furtar um
objeto no valor de R$ 100,00 (cem reais) pertencente a uma pessoa com situação financeira
confortável pode ensejar a incidência do princípio da insignificância, ao passo que subtrair uma
velha bicicleta, avaliada em R$ 100,00 (cem reais), pertencente a um modesto trabalhador que
a utiliza como meio de transporte para se deslocar até o local de trabalho, pode não incidir tal
princípio.

48
• Requisitos subjetivos

Além dos requisitos objetivos, relacionados aos fatos, deve-se, ainda, verificar a presença
dos requisitos subjetivos, relacionados ao autor da infração penal e à vítima do delito.
a) Em relação ao autor da infração penal
A possibilidade de aplicação do princípio da insignificância em relação ao autor do fato
passa pela análise no sentido de verificar se é reincidente ou criminoso habitual.
Quanto ao agente reincidente, os tribunais divergem sobre a possibilidade de aplicação
do princípio da insignificância.
O STJ considera inaplicável o princípio da insignificância, salvo quando as instâncias
ordinárias, analisando o caso concreto, entenderem ser recomendável a incidência dessa causa
de exclusão da tipicidade. Nesse particular, o STJ confirmou entendimento do Tribunal de 2o
grau que manteve decisão de rejeição da denúncia oferecida contra réu reincidente, atentando
para as circunstâncias do caso concreto:

A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é firme no sentido de que não se revela
inexpressiva a lesão econômica superior a 10% do salário mínimo. É assente, ainda,
quanto ao entendimento de que a reincidência e os maus antecedentes, via de regra,
afastam a incidência do princípio da bagatela. Referidos vetores, contudo, não devem ser
analisados de forma isolada, porquanto não constituem diretrizes absolutas. Nesse
contexto, mister se faz o exame das particularidades do caso concreto, com o objetivo de
verificar se a medida é socialmente recomendável. In casu, não obstante o furto simples
tenha recaído sobre um par de alianças avaliado em valor superior a 10% do salário
mínimo, e apesar de se tratar de réu reincidente, o Tribunal de origem, atento às
particularidades do caso concreto – consistentes no fato de o réu, ao ser abordado, ter
confessado a subtração e restituído os bens objeto do delito, não acarretando prejuízo à
vítima –, manteve a rejeição da denúncia oferecida pelo Ministério Público. (STJ, AgRg no
REsp no 1804399/SP, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5a T., j. 4-6-2019.)

Verifica-se, pois, que, como regra, não se aplica o princípio da insignificância ao réu
reincidente, salvo em casos excepcionais, atentando-se às particularidades do caso concreto.
Assim, a reincidência do acusado não é motivo suficiente para afastar a aplicação do princípio
da insignificância, ressalvados casos específicos, que dependem da análise do contexto fático
concreto.
Em relação ao multirreincidente e ao reincidente específico, o STF e o STJ consideram
inaplicável o princípio da insignificância, diante da maior reprovabilidade da sua conduta.

49
b) Em relação à vítima
A aplicação do princípio da insignificância depende, ainda, das condições e características
pessoais da própria vítima.
Além da presença dos vetores objetivos, deve-se verificar o contexto que envolve a vítima,
como, por exemplo, sua condição econômica, a importância que o bem jurídico representa para
ela, o valor sentimental, as circunstâncias e as consequências do delito.
Com efeito, o que pode ser irrelevante para uma determinada vítima, pode não ser em
relação à outra. A extensão do prejuízo provocado pela subtração de um botijão de gás de uma
residência ocupada por família de excelente condição financeira não é, evidentemente, a mesma
em relação a uma família com modesta condição econômica, que reside num acanhado imóvel
e cuja renda mensal não supera o valor de um salário-mínimo.
Em relação à família dotada de boa condição econômica, pode-se aventar a incidência do
princípio da insignificância, ao passo que em relação à família com situação financeira modesta
não parece razoável considerar a hipótese de crime de bagatela.
Portanto, não há que se falar em reduzido grau de reprovabilidade da conduta do agente,
se o valor do bem jurídico atacado não é irrisório diante das condições econômicas da vítima.
Da mesma forma, ainda que inexpressivo economicamente, o valor sentimental em
relação ao bem jurídico atacado também é considerado para aquilatar a aplicação do princípio
da insignificância, uma vez que, nesse caso, o dano suportado pela vítima ganha maior
relevância do que qualquer quantia pecuniária. Esse é o entendimento do STF e do STJ.

5.3 Princípio da insignificância em espécie


Embora seja mais frequente em relação a crimes contra o patrimônio, a aplicação do
princípio da insignificância não se limita a crimes dessa natureza, podendo, se preenchidos os
requisitos, incidir sobre qualquer crime.
A maior incidência do princípio da insignificância ocorre, inexoravelmente, em relação ao
crime de furto, já que praticado sem violência ou grave ameaça, atingindo, não raras vezes,
objeto de valor ínfimo.
A propósito, nesse aspecto, convém registrar que não há um valor máximo limitando a
incidência do princípio da insignificância, pois, como dito, além do valor do objeto do crime, deve-
se, ainda, considerar as condições financeiras da vítima, a importância do objeto material, bem
com as circunstâncias do caso concreto.

50
Não obstante isso, em que pese não constituir parâmetro absoluto, o STJ considera
aplicável o princípio da insignificância, se presentes os demais requisitos, quando o valor do
objeto material atingido não superar o equivalente a 10% do salário-mínimo vigente à época do
fato, rejeitando, por exemplo, a incidência do crime de bagatela em relação a furto de objeto com
valor equivalente a 23% do salário-mínimo vigente à época do fato.
Não há espaço, à evidência, para aplicação do princípio da insignificância em relação a
crimes hediondos ou equiparados, uma vez que o legislador conferiu maior rigor ao tratamento
dado a agentes acusados por tais delitos, reconhecendo a gravidade das condutas, sendo, pois,
incompatível com reduzida reprovabilidade e grau de ofensividade ao bem jurídico inerentes ao
crime bagatelar.
Alguns delitos, por suas peculiaridades, merecem especial análise acerca da incidência
ou não do princípio da insignificância.
a) Crimes praticados com violência ou grave ameaça à pessoa
É pacífico o entendimento no sentido da inaplicabilidade do princípio da insignificância em
relação a crimes de roubo e a outros delitos praticados com violência ou grave ameaça à pessoa.
Isso porque, ainda que irrelevante o valor do objeto material atacado, não se mostra
razoável considerar insignificante a conduta do agente que emprega violência ou grave ameaça
contra a vítima. Ao contrário, tal conduta revela maior periculosidade do agente, bem como
elevado grau de ofensividade e reprovabilidade, afastando, por absoluto, a aplicação do princípio
da insignificância.
Esse é o entendimento adotado pelo STJ:
Penal. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Roubo majorado.
Desclassificação. Impossibilidade. Súmula no 7 do STJ. Princípio da insignificância. Não
aplicação. Agravo não provido. 1. As instâncias ordinárias, após a minuciosa análise do
acervo fático-probatório, produzido sob o crivo do contraditório, condenaram o agravante
pelo crime de roubo majorado consumado por entenderem devidamente provada a grave
ameaça necessária à sua configuração. 2. Para entender-se pela desclassificação para o
delito de furto ou pela absolvição do réu, seria necessário o revolvimento de todo o
conjunto fático-probatório produzido nos autos, providência que é incabível na via do
recurso especial, consoante o enunciado na Súmula no 7 do STJ, in verbis: “A pretensão
de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. 3. A jurisprudência desta Corte
é firme em assinalar que, nos crimes praticados mediante violência ou grave ameaça
contra a vítima, como no roubo, não é aplicável o princípio da insignificância. 4. Agravo
regimental não provido (STJ, AgRg no AgREsp no 1013662/BA, rel. Min. Rogério Schietti
Cruz, 6a T., j. 7-2-2017).

Prevalece o entendimento, no entanto, da possibilidade da incidência do princípio da


insignificância nos casos de lesão corporal leve e lesão corporal culposa, desde que a conduta

51
gere lesões absolutamente ínfimas, como, por exemplo, pequenas escoriações, sem maior
lesividade, salvo se praticado no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher.

b) Crimes contra a fé pública


Os crimes contra a fé pública estão previstos nos arts. 289 a 311-A do CP.
O bem jurídico tutelado é a legitimidade e a credibilidade depositada nos documentos,
sinais e símbolos que registram as relações jurídicas celebradas na sociedade organizada.
Logo, diante da importância do bem jurídico tutelado, não se mostra razoável nem
proporcional admitir a incidência do princípio da insignificância em relação aos crimes contra a
fé pública.
De fato, julgando crime de falsificação de documento público (CP, art. 297), o STJ
considerou inaplicável o princípio da insignificância aos delitos cujo bem tutelado seja a fé pública
(STJ, AgRg no AgREsp no 1131701/SP, rel. Min. Rogério Schietti Cruz, 6a T., j. 17-4-2018).

c) Crimes contra a administração pública


Sedimentando discussão doutrinária e jurisprudencial, o STJ pacificou entendimento no
sentido da inaplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes praticados contra a
administração pública, já que, independentemente do valor material do bem atingido, busca-se,
no caso, tutelar a moralidade administrativa, insuscetível de mensuração econômica.
É o que se extrai da Súmula no 599 do STJ, segundo a qual “o princípio da insignificância
é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública”.
Em que pese o teor da referida Súmula, consideramos que esse entendimento não deve
ser aplicado de modo absoluto, sem analisar o caso concreto. De fato, não parece razoável, por
exemplo, a incidência da tipicidade material em relação à conduta do agente público que utiliza
uma única vez a máquina xerocópia, para imprimir, em poucas folhas, alguns documentos
particulares, ou a conduta de estagiário que se apropria de um clip ou caneta esferográfica de
que tem a posse em razão da função que exerce.
Embora não conste no capítulo dos crimes contra a administração pública, mitigando o
alcance da Súmula no 599, o próprio STJ reconheceu a incidência do princípio da insignificância
em relação ao crime de dano contra patrimônio público (CP, art. 163, parágrafo único, III),
considerando as peculiaridades do caso concreto, consistentes em ser o réu primário, que
contava com 83 anos de idade à época dos fatos, sendo, ainda, o dano de um cone avaliado em
R$ 20,00 (vinte reais) (STJ, RHC no 85272/RS, rel. Min. Nefi Cordeiro, 6a T., j. 23-8-2018).

52
O STF, por sua vez, reconheceu a incidência do princípio da insignificância em relação à
conduta de um carcereiro que subtraiu farol de milha que guarnecia motocicleta apreendida,
avaliado em R$ 13,00 (treze reais), absolvendo o réu da acusação pelo delito de peculato-furto
(CP, art. 312, § 1º).

d) Crime de descaminho e crimes contra a ordem tributária


Não obstante estar inserido no capítulo dos crimes contra a administração pública, o crime
de descaminho (CP, art. 334) também ofende a ordem tributária, já que o agente ilude, no todo
ou em parte, o pagamento de tributo devido pela entrada ou saída de mercadoria do País.
Em razão disso, verifica-se a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao
crime de descaminho, apesar do disposto na Súmula no 599 do STJ.
Ainda que possa parecer estranho num primeiro momento, sobretudo por força do valor
considerado como parâmetro, admite-se a incidência do princípio da insignificância no crime de
descaminho quando o valor do tributo devido não for superior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
De fato, nos termos do art. 20 da Lei no 10.522/2002, atualizado pelas Portarias do
Ministério da Fazenda nos 75/2012 e 130/2012, serão arquivados, sem baixa na distribuição, por
meio de requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de
débitos inscritos em Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por
ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior àquele estabelecido em ato do Procurador-
Geral da Fazenda Nacional.
A Port. no 130/2012, que alterou a Port. no 75/2012, prevê que o Procurador da Fazenda
Nacional requererá o arquivamento, sem baixa na distribuição, das execuções fiscais de débitos
com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil
reais), desde que não conste dos autos garantia, integral ou parcial, útil à satisfação do crédito.
Em outras palavras, se o valor do tributo iludido pelo agente for igual ou inferior a R$
20.000,00 (vinte mil reais), poderá, a princípio, ser aplicado o princípio da insignificância.
Isso porque, se a Fazenda Nacional expressamente considera irrelevante cobrar tributo
cujo valor não supera R$ 20.000,00, sendo, pois, insignificante na esfera fiscal, também será, na
ótica dos Tribunais Superiores, insignificante na esfera penal.
Esse é o entendimento adotado pelo STJ:

Agravo regimental no recurso especial. Descaminho. Princípio da insignificância. Tributos


que não ultrapassam o valor previsto no art. 20 da Lei no 10.522/2002, com as alterações
da Portaria no 75/2012 do Ministério da Fazenda. Incidência do princípio da insignificância.

53
Recurso não provido. 1. Esta Corte Superior de Justiça, em julgamento proferido pela
Terceira Seção nos Recursos Especiais nos 1.709.029/ MG e 1.688.878/SP, sob a
sistemática dos recursos repetitivos, firmou entendimento no sentido de considerar
insignificante os crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário,
excluídos os acréscimos posteriores à sua consolidação, decorrentes de juros e multa,
não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00, a teor do disposto no art. 20 da Lei no
10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias nos 75 e 130, ambas do
Ministério da Fazenda. 2. Na hipótese dos autos, o tributo sonegado pela conduta atribuída
ao embargado corresponde ao principal de R$ 15.873,15 (quinze mil, oitocentos e setenta
e três reais e quinze centavos), inferior ao limite previsto nas Portarias Ministeriais
mencionadas, mostrando-se correto o reconhecimento da atipicidade material da conduta
do acusado. 4. Agravo regimental a que se nega provimento (STJ, AgRg no REsp no
1716714/SP, rel. Min. Jorge Mussi, 5a T., j. 26-10-2018).

Esse também é o entendimento do STF, segundo o qual se aplica o princípio da


insignificância ao crime de descaminho se o valor do tributo devido for inferior a R$ 20.000,00,
nos termos do art. 20 da Lei no 10.522/2002, com valor atualizado pelas Portarias nos 75 e
130/2012 do Ministério da Fazenda.
Todavia, o princípio da insignificância em relação ao crime de descaminho não é aplicado
de forma indiscriminada.
O limite previsto na Lei no 10.522/2002, atualizado pelas Portarias nos 75/2012 e
130/2012, ambas do Ministério da Fazenda, para aplicação do princípio da insignificância
somente é aplicado em relação a tributos federais. Não se aplica, pois, aos tributos estaduais e
municipais; primeiro, porque tais tributos não estão abrangidos pela Lei no 10.522/2002, que
trata de tributos federais; segundo, porque a lesão jurídica provocada pela elisão fiscal pode ser
mais expressiva entre os entes federativos da esfera estadual e municipal.
Além disso, não se admite a aplicação do princípio da insignificância quando constatada
a habitualidade delitiva nos crimes de descaminho, configurada tanto pela multiplicidade de
procedimentos administrativos quanto por ações penais ou inquéritos policiais em curso.

e) Crime de contrabando
O crime de contrabando, previsto no art. 334-A do CP, consiste em importar ou exportar
mercadoria proibida.
A prática do crime de contrabando não atinge unicamente o erário público, mas também
outros bens jurídicos, que, por sua relevância, não permitem a aplicação do princípio da
insignificância, tais como a saúde pública e a moralidade administrativa.
Além disso, a conduta do agente que importa ou exporta mercadoria classificada como
proibida ou ilícita com grau maior grau de reprovabilidade, não se coaduna, portanto, com os
vetores que autorizam o princípio da insignificância.

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Por isso, os Tribunais Superiores possuem entendimento consolidado de que o princípio
da insignificância não se aplica aos crimes de contrabando de cigarros, por menor que possa ter
sido o resultado da lesão patrimonial, pois a conduta atinge outros bens jurídicos, como a saúde,
a segurança e a moralidade pública.

f) Crimes na Lei de Drogas – Lei nº 11.343/2006


A Lei de Drogas tutela a saúde pública. São crimes de perigo abstrato ou presumido,
sendo, por isso, dispensável a comprovação do efetivo risco ao bem jurídico tutelado. Em relação
ao crime de tráfico de drogas, delito equiparado a hediondo, não se discute a inaplicabilidade do
princípio da insignificância, diante do tratamento mais severo conferido pelo legislador aos delitos
dessa natureza.
Todavia, em relação ao delito de posse de drogas para consumo pessoal (Lei no
11.343/2006, art. 28) há divergência acerca da aplicabilidade ou não do princípio da
insignificância.
O STJ, por sua 5ª Turma, adota o entendimento no sentido de que a conduta de posse de
drogas para consumo pessoal está tipificada na Lei de Drogas, que, na sua íntegra, tutela a
saúde pública, bem jurídico que, a evidência, não pode ser considerado ínfimo. Além disso, o
crime do art. 28 da Lei no 11.343/2006 é de perigo abstrato, sendo irrelevante a pequena
quantidade de substância entorpecente apreendida em poder do agente (STJ, AgInt no HC no
372555/ES, rel. Min. Felix Fischer, 5a T., j. 15-8-2017).
De outro lado, o STF já admitiu o princípio da insignificância em favor de agente
condenado por portar 0,6 g de maconha (STF, HC no 110.475/SC, rel. Min. Dias Toffoli, 1a T., j.
14-2-2012).

g) Violência doméstica ou familiar contra a mulher


Diante da relevância do bem jurídico protegido e da natureza protetiva da Lei no
11.340/2006 não se mostra razoável ou proporcional admitir a incidência do princípio da
insignificância no contexto de violência doméstica ou familiar contra a mulher, nem mesmo na
hipótese de reconciliação do casal.
É o que se extrai da Súmula no 589 do STJ, segundo a qual: “É inaplicável o princípio da
insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das
relações domésticas”.

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h) Posse e porte ilegal de munição
Nos termos dos arts. 14 e 16, ambos da Lei no 10.826/2003, constitui crime possuir,
manter sob sua guarda, portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar,
ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar
munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou
regulamentar.
Os crimes de posse ou porte ilegal de munição incidem mesmo que desacompanhada de
arma de fogo, já que se trata de crime de mera conduta e de perigo abstrato. A inviabilidade do
pronto uso da munição, por estar desacompanhada da arma, não desnatura o delito.
Isso não significa a impossibilidade do reconhecimento, em situações excepcionais, do
princípio da insignificância. Com efeito, admite-se a incidência do princípio da insignificância
quando se tratar de posse de pequena quantidade de munição, desacompanhada de armamento
capaz de deflagrá-la, uma vez que ambas as circunstâncias conjugadas denotam a
inexpressividade da lesão jurídica provocada, bem como a diminuta ofensividade ao bem jurídico
tutelado.
Nesse contexto, o STJ considerou a incidência do princípio da insignificância ao agente
flagrado na posse de dois cartuchos de calibre.32, desacompanhados de arma de fogo. O STF,
por sua vez, reconheceu o princípio da insignificância em relação à conduta de portar, sem
autorização legal, uma munição de uso proibido, consistente num cartucho calibre 0.40.
Por outro lado, não se aplica o princípio da insignificância na hipótese de ser apreendida
razoável quantidade de munições, como, por exemplo, 18 no total, sendo 5 projéteis de calibre
.38 e 13 de calibre .380.

5.4 Questão sobre Princípio da insignificância

10) QUESTÃO 4 – XI EXAME


O Ministério Público ofereceu denúncia contra Lucile, imputando-lhe a prática da conduta descrita
no Art. 155, caput, do CP. Narrou, a inicial acusatória, que no dia 18/10/2012 Lucile subtraiu,
sem violência ou grave ameaça, de um grande estabelecimento comercial do ramo de venda de
alimentos, dois litros de leite e uma sacola de verduras, o que totalizou a quantia de R$10,00
(dez reais). Todas as exigências legais foram satisfeitas: a denúncia foi recebida, foi oferecida
suspensão condicional do processo e foi apresentada resposta à acusação. O magistrado,
entretanto, após convencer-se pelas razões invocadas na referida resposta à acusação, entende

56
que a fato é atípico. Nesse sentido, tendo como base apenas as informações contidas no
enunciado, responda, justificadamente, aos itens a seguir.
A) O que o magistrado deve fazer? Após indicar a solução, dê o correto fundamento legal.
(Valor: 0,65)
B) Qual é o elemento ausente que justifica a alegada atipicidade? (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

11) QUESTÃO 2 – 36º EXAME


David foi denunciado pela prática do crime de descaminho (Art. 334 do Código Penal), por
supostamente ter importado contêiner contendo 1 tonelada de materiais têxteis de procedência
estrangeira sem a quitação do imposto de importação devido à União, que soma R$ 750,00
(setecentos e cinquenta reais). Na cota que acompanha a denúncia, o Ministério Público Federal
se manifestou pelo não oferecimento de proposta de suspensão condicional do processo a David,
pois o acusado possui anotação na sua Folha de Antecedentes Criminais (FAC), relativa à
condenação definitiva à pena de multa pelo crime de ameaça (Art. 147 do Código Penal). Sobre
a hipótese apresentada, responda aos itens a seguir.
A) Qual é a tese de mérito que pode ser invocada pelo Defensor técnico de David no caso
concreto? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual é a questão preliminar ao mérito que pode ser invocada pelo Defensor técnico de
David no caso concreto? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

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Resposta à acusação

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 06/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

6.1 Peça obrigatória

A resposta à acusação constitui peça obrigatória, pois, se não apresentada, deverá o juiz
nomear defensor para oferecê-la, nos termos do artigo 396-A, § 2º, CPP.

Assim, não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir
defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por dez dias.
A ausência de nomeação de defensor pelo juiz para oferecimento da resposta à acusação gerará
nulidade absoluta.

6.2 Identificação

A resposta à acusação é oferecida após a citação do acusado. Antes, por óbvio, da


audiência de instrução.

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Logo, deve haver denúncia, o recebimento da denúncia e a citação do réu. Não poderá
ter sido realizada audiência de instrução e julgamento.

PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica: Peça:


“Citação...” Resposta à acusação

PAROU!

DICA MISSIONEIRA

Nem sempre consta expressamente no enunciado toda a sequência dos atos (“foi
oferecida denúncia e recebida...”). Basta, para identificar a peça resposta à acusação, que
no enunciado conste como último ato processual a CITAÇÃO.

Exemplos:

Peça XXIV Exame: “Em busca do cumprimento do mandado de citação, o oficial de justiça
comparece à residência de Patrick e verifica que o imóvel se encontrava trancado. Apenas em
razão desse único comparecimento no dia 26/02/2018, certifica que o réu estava se ocultando
para não ser citado e realiza, no dia seguinte, citação por hora certa, juntando o resultado
do mandado de citação e intimação para defesa aos autos no mesmo dia. Maria, vizinha
que presenciou a conduta do oficial de justiça, se assusta e liga para o advogado de Patrick,
informando o ocorrido e esclarecendo que ele se encontra trabalhando e ficará embarcado por
15 dias. O advogado entra em contato com Patrick por email e este apenas consegue
encaminhar uma procuração para adoção das medidas cabíveis, fazendo uma pequena síntese
do ocorrido por escrito. Considerando a situação narrada, apresente, na qualidade do advogado
de Patrick, a peça jurídica cabível, diferente do habeas corpus, apresentando todas as teses
jurídicas de direito material e processual pertinentes. A peça deverá ser datada do último dia do
prazo. (Valor: 5,00)”

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Peça XXI Exame: “Diante disso, em 16 de março de 2015, segunda-feira, sendo terça-feira dia
útil em todo o país, Gabriela e o advogado compareceram ao cartório, onde são informados que
o processo estava em seu regular prosseguimento desde 2011, sem qualquer suspensão,
esperando a localização de Gabriela para citação. Naquele mesmo momento, Gabriela foi
citada, assim como intimada, junto ao seu advogado, para apresentação da medida cabível.
Cabe destacar que a ré, acompanhada de seu patrono, já manifestou desinteresse em aceitar a
proposta de suspensão condicional do processo oferecida pelo Ministério Público. Considerando
a situação narrada, apresente, na qualidade de advogado(a) de Gabriela, a peça jurídica cabível,
diferente do habeas corpus, apresentando todas as teses jurídicas de direito material e
processual pertinentes. A peça deverá ser datada no último dia do prazo. (Valor: 5,00)”

Peça VIII Exame: “(...) Recebida a inicial pelo juízo da 5ª Vara Criminal, o réu é citado no dia
18 de janeiro de 2011. (...)”

6.3 Base legal

Art. 396 e 396-A do CPP

6.4 Prazo

Devidamente citado, cumpre ao réu oferecer resposta à acusação, no prazo de 10 dias.


O Código de Processo Penal não aponta a partir de quando começa a correr o prazo de citação.
Por isso, adota-se, por analogia, o art. 406, § 1º, CPP e Súmula 710 do STF, segundo o qual o
prazo será contado a partir do efetivo cumprimento do mandado e não da juntada do mandado
aos autos.

A contar do efetivo
10 dias cumprimento do
mandado

60
O prazo processual guarda relação, invariavelmente, aos prazos para praticar atos
processuais. Exemplo: apresentar resposta à acusação, memoriais, interposição de recursos.
Ele é disciplinado no artigo 798 do CPP e começa a correr a partir do primeiro dia útil da citação.
Assim, se a citação ocorreu na sexta (dia 05/08), o prazo começará a correr no dia 08/08
(segunda-feira, que será o primeiro dia útil).

Se o prazo vencer num sábado, domingo, ou feriado, será prorrogado para o 1º dia útil.

Tomemos como o exemplo o prazo considerado no XXI Exame, quando caiu resposta à
acusação. A ré foi citada no dia 16/03/2015, numa segunda-feira. O prazo começa a correr a
partir do 1º dia útil (17/03/2015, terça-feira) - 18/03/2015 (quarta) – 19/03/2015 (quinta) –
20/03/2015 (sexta) – 21/03/2015 (sábado) – 22/03/2015 (domingo) – 23/03/2015 (segunda) –
24/03/2015 (terça) – 25/03/2015 (quarta) – 26/03/2015 (quinta).

O último dia do prazo para apresentar a resposta à acusação seria o dia 26/03/2015.

Se o dia 26/03/2015 tivesse caído num sábado ou domingo, o prazo deveria ser
prorrogado para o 1º dia útil. Logo, se o dia 26/03/2015 tivesse caído no sábado, o último dia do
prazo seria 28/03/2015 (segunda-feira).

Importante registrar que a Lei n. 14.365/2022 introduziu o art. 798-A, do CPP, que dispõe
sobre a suspensão do curso do prazo processual nos dias 20 de dezembro a 20 de janeiro, sendo
proibida também a realização de audiências e sessões de julgamento, não se aplicando essas
disposições aos casos que envolvam réus presos, nos processos vinculados a essas prisões;
nos procedimentos regidos pela Lei Maria da Penha; e nas medidas consideradas urgentes,
mediante despacho fundamentado.

6.5 Conteúdo

Na resposta à acusação, deve-se buscar eventuais informações que permitam


desenvolver teses preliminares e de mérito.

É o momento destinado à defesa arguir nulidades, em matéria preliminar, como a rejeição


da denúncia, bem como nulidades existentes a partir do oferecimento denúncia e, até mesmo,
na fase de inquérito (nulidade de provas produzidas no Inquérito), bem como toda matéria de
defesa, visando à absolvição sumária (art. 397 CPP), oferecer documentos, especificar as provas
que pretende produzir e arrolar testemunhas.

61
Logo, na resposta à acusação deve-se buscar no enunciado: a) teses preliminares; b)
teses de mérito.

A) Preliminares

As preliminares, geralmente, guardam relação com vícios processuais e procedimentais


decorrentes da inobservância de exigências legais que podem levar à nulidade do ato e dos que
dele derivam e, até mesmo, do processo.

São alguns exemplos:

a) incompetência absoluta do juízo;

b) rejeição da denúncia (art. 395);

c) nulidade da citação;

d) nulidade/ilicitude de prova produzida no inquérito policial;

e) nulidades – art. 564, CPP, I, II, III (“a”, “b”, “c” e “e”) e IV;

f) nulidade do processo por não ter sido adotado o procedimento adequado;

g) nulidade por não ter sido oferecida proposta de suspensão condicional do processo.

B) Mérito

No caso da resposta à acusação, as teses de mérito guardam relação com as hipóteses


que ensejam a absolvição sumária, previstas no artigo 397 do CPP.

Em síntese, na resposta à acusação, assim como nas outras peças, deve-se desenvolver
uma tese que, ao final, viabilizará o correspondente pedido. Ou seja, a tese invariavelmente
guarda relação com o objeto de pedido.

Nesse sentido, considerando que o pedido correspondente à resposta à acusação é de


ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA, com base no artigo 397 do CPP, as teses de mérito na resposta à
acusação envolvem, via de regra:

62
a) causa excludente de ilicitude

b) excludente de culpabilidade, salvo a inimputabilidade por doença mental

c) excludente de tipicidade

d) causas extintivas de punibilidade

Essas teses de mérito serão estudadas na sequência do curso.

I) Algumas causas excludentes de ilicitude (art. 397, I, CPP): Ver remissão abaixo do artigo
397, I, do CPP

a) estado de necessidade – art. 24, CP;

b) legítima defesa – art. 25, CP;

c) estrito cumprimento do dever legal – art. 23, III, CP;

d) exercício regular do direito – art. 23, III, CP;

e) consentimento do ofendido – causa supralegal.

O juiz estará autorizado a julgar antecipadamente a lide penal quando estiver comprovada
a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato, prevista, via de regra, nos artigos
23, 24 e 25 do Código Penal. Ou seja, para a decretação da absolvição sumária é necessária a
existência de prova que permita ao juiz, desde logo, em cognição sumária, obter plena certeza
de que o réu agiu em legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal
ou exercício regular do direito.

II) Algumas causas excludentes da culpabilidade (art. 397, II, CPP): Ver remissão abaixo
do artigo 397, II, do CPP.

a) inimputabilidade pela embriaguez completa e acidental: art. 28, §1º, CP;

b) falta de potencial consciência da ilicitude: erro de proibição do art. 21, CP;

c) inexigibilidade de conduta diversa: coação moral irresistível e obediência hierárquica: art. 22,
CP;

Trata o dispositivo, por exemplo, das causas de exclusão da culpabilidade consistente na


embriaguez completa acidental (art. 28, §1º, do CP), a falta de potencial consciência da ilicitude

63
(erro de proibição inevitável, artigo 21 do CP), coação moral irresistível e obediência hierárquica
(art. 22 do CP).

Na hipótese em que a inimputabilidade se encontra comprovada por exame de insanidade


mental, o Código de Processo Penal não autoriza a absolvição imprópria do agente, pois esta
implicará a imposição de medida de segurança, o que poderá ser prejudicial ao réu, já que não
lhe será possível comprovar por outras teses defensivas a sua inocência, sem a imposição de
qualquer outra medida restritiva.

Além disso, em tese, ainda não há elementos suficientes para se aferir a inimputabilidade
do réu, já que nem sequer iniciou a fase de instrução.

Em síntese:
Na peça resposta à acusação, o artigo 397, II, do CPP inviabiliza que o juiz absolva
sumariamente o réu, porque teria de aplicar medida de segurança (internação em
manicômio). Isso prejudicaria o réu, porque seria internado sem lhe fosse viabilizado provar
em audiência de instrução a sua inocência. Ou seja, se proferir sentença de absolvição
sumária, aplicando medida de segurança, sem permitir que produza outras provas da sua
inocência em audiência de instrução, o juiz prejudicará o réu.
Nesse caso, o juiz deverá designar audiência de instrução e julgamento e, se não for
possível absolver o réu por outro fundamento, aí sim o juiz poderá proferir sentença
absolutória imprópria, com base no artigo 386, VI, do CPP c/c art. 386, parágrafo único, III,
do CPP, aplicando medida de segurança, consistente em internação em hospital de
custódia ou tratamento ambulatorial (art. 97 do CP).

III) Algumas causas excludentes de tipicidade que podem ensejar a absolvição sumária
(art. 397, III, CPP): Ver remissão abaixo do art. 397, III, do CPP

Se o juiz não rejeitar a denúncia e, por conta dos argumentos e provas juntadas com a
resposta escrita, se convencer que o fato narrado não constitui crime, poderá, agora, absolver
sumariamente o réu.

Alguns exemplos:

a) súmula vinculante nº 24;

64
b) fato atípico;

c) coação física irresistível;

d) crime impossível – art. 17, CP;

e) erro de tipo essencial – art. 20, CP;

f) princípio da insignificância.

IV) Algumas causas de extinção da punibilidade: Ver remissão abaixo do artigo 397, IV, do
CPP.

Aqui há uma impropriedade do legislador, pois, nos casos de extinção de punibilidade,


não há análise de mérito, mas causa impeditiva da sua análise, sendo, por isso, tratada, em
regra, nas preliminares. Além disso, o artigo 61 do CPP permite que o juiz, em qualquer fase do
processo, reconheça a extinção da punibilidade, inclusive de ofício.

De qualquer modo, para fins de resposta escrita, o juiz declara extinta a punibilidade e
absolve o réu, com base no art. 397, inciso IV, do CPP.

a) hipóteses do art. 107, CP;

b) prescrição - artigos 109 e 117, CP;

c) ressarcimento do dano no peculato culposo – art. 312, §3º, CP;

d) pagamento integral do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios;

e) ressarcimento do dano antes do recebimento da denúncia no crime de estelionato mediante


emissão de cheque sem provisão de fundos – art. 171, §2º, VI, CP e Súmula 554/STF.

6.6 Pedido de Absolvição Sumária – art. 397, CPP

No campo destinado aos pedidos, deve-se formular pedido expresso acerca de cada tese
desenvolvida. Por exemplo, se foi desenvolvida tese que envolva preliminar (incompetência do
juízo, por exemplo), deve-se pedir expressamente que seja declarada a incompetência do juízo.

Além disso, após o oferecimento da resposta à acusação, abre-se a possibilidade de o


juiz absolver sumariamente o réu, encerrando o processo, quando incidir, no caso, causa
manifesta de exclusão da ilicitude do fato; causa manifesta de exclusão da culpabilidade (exceto
a inimputabilidade por doença mental, seguindo-se o processo nesse caso); o fato narrado

65
evidentemente não constituir crime (causas excludentes de tipicidade, por exemplo); ou causa
extintiva de punibilidade.

DICA MISSIONEIRA: SE ESQUECER, ESSA SIM TERÁ DE FUGIR DAS GALÁXIAS

Na resposta à acusação, o pedido é de absolvição sumária, com base no artigo 397,


CPP.

Também deve constar pedido expresso de produção de provas, com designação de


audiência de instrução e julgamento e oitiva das testemunhas arroladas.

6.7 Recursos

A absolvição sumária faz coisa julgada material, resolvendo, pois, definitivamente o mérito
da causa.

Por isso, da decisão que absolve sumariamente o réu com base no artigo 397, incisos I, II
e III, cabe apelação. Ou seja, se o fundamento da absolvição sumária consistir na causa de
exclusão da ilicitude (art. 397, I, do CPP), excludente de culpabilidade, salvo inimputabilidade
(art. 397, II, do CPP), excludente de tipicidade (art. 397, III, do CPP), o recurso cabível será
apelação, com base no artigo 593, I, do CPP.

Quanto à decisão que declara a extinção da punibilidade, impropriamente considerada


como hipótese de absolvição sumária, a doutrina é uníssona no sentido de que o recurso cabível
é o recurso em sentido estrito, com base no artigo 581, VIII, do CPP.

Não há recurso cabível contra a decisão que não acolhe o pedido de absolvição sumária.
Nesse caso, assim como na hipótese de recebimento da denúncia ou queixa, a medida cabível
é a impetração de habeas corpus visando ao trancamento da ação penal.

6.8 Dicas

Embora não seja comum neste momento processual, cremos ser possível a
desclassificação do delito em sede de resposta à acusação, como, por exemplo:

a) desclassificação ensejar incompetência absoluta do juízo (arguida em


preliminar);

66
Exemplo: Denúncia pela prática do delito de moeda falsa (art. 289 CP) perante a Justiça
Federal. Acolhida a tese da falsificação grosseira, alegada na resposta à acusação, haverá
desclassificação para o delito de estelionato (art. 171 do CP), cuja competência é da Justiça
Estadual, nos termos da Súmula 73 do STJ.

b) desclassificação para crime de ação penal pública condicionada à representação


ou de ação penal privada, que, ao final, redundará na decadência e pedido de absolvição
sumária, pela extinção da punibilidade (art. 397, inciso IV, do CPP)

Exemplo: Conforme admitido no VIII Exame da OAB, possível postular a desclassificação do


delito, com consequente extinção da punibilidade se desclassificado para crime de ação penal
privada, com prazo decadencial expirado. No caso do VIII Exame, exigiu-se a desclassificação
do crime de extorsão (art. 158, CP) para exercício arbitrário das próprias razões (art. 345, CP),
que se trata de crime, via de regra, de ação penal privada.

67
6.9 Estrutura da peça

Base legal: art. 396 e 396-A,


CPP

Prazo: 10 dias

1. PRELIMINARES
- Incompetência do Juízo
- Rejeição da Denúncia
- Nulidades

NO MÉRITO:
Resposta à acusação - Causa excludente de ilicitude
2. MÉRITO: com base no art. - Causa excludente de culpabilidade
397, CPP - Causa excludente de tipicidade
- Causa excludente de punibilidade

3. PEDIDO
a) seja reconhecia a incompetência do
juíxo;
b) seja rejeitada a denúncia;
c) nulidades (referir todas as nulidades
enfrentadas na peça);
d) seja o réu absolvido sumariamente, com
base no art. 397 (apontar o inciso
correspondente);
e) a produção de provas, com designação
de audiência de instruçãoe julgamento e
oitiva das testemunhas arroladas

68
Estruturação da Resposta à acusação:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DE... (se crime da competência da Justiça Federal)

Processo nº...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência, dentro do prazo de 10 dias, previsto no artigo 396 do Código de Processo Penal,
apresentar RESPOSTA À ACUSAÇÃO, com base nos artigos 396 e 396-A do Código de
Processo Penal, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos:

I) DA TEMPESTIVIDADE

A presente Resposta à Acusação é tempestiva, uma vez que apresentada


dentro do prazo de 10 dias, na forma do artigo 396 do Código de Processo Penal.

II) DOS FATOS6

III) DO DIREITO
a) Das preliminares
b) Do mérito
* Após identificar e arguir eventuais preliminares contidas no enunciado, deve-se atacar o
mérito, buscando a absolvição sumária do réu, com base no art. 397, CPP.
* No mérito, busca-se no enunciado, invariavelmente, causas excludentes do crime: ilicitude,
culpabilidade, tipicidade e, excepcionalmente, na resposta à acusação, causas extintivas de
punibilidade.

6
Nos fatos, fazer um breve relato do crime pelo qual o réu foi denunciado, narrar o oferecimento e recebimento da
denúncia, e citação. Não inventar dados. Sugere-se, ainda, abrir um parágrafo para afirmar a tempestividade da
peça.

69
* O VIII Exame também considerou a desclassificação de um crime para outro: Extorsão (art.
158, CP) para exercício arbitrário das próprias razões (art. 345, CP), com posterior
decadência do direito de queixa, pois desclassificado para crime de ação penal privada.

IV) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer o denunciado:
a) seja reconhecida a incompetência do juízo;
b) seja rejeitada a denúncia;
c) nulidades (referir todas as nulidades enfrentadas na peça);
d) absolvição sumária, com base no art. 397, CPP (apontar inciso correspondente);
e) a produção de provas, com designação de audiência de instrução e julgamento e oitiva de
testemunhas arroladas.

ROL DE TESTEMUNHAS (somente dados fornecidos no enunciado)


A) Nome...
B) Nome...

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...7

ADVOGADO...
OAB...

Cuidado: No procedimento crimes de responsabilidade dos funcionários públicos (art.


514, CPP) e tráfico ilícito de entorpecentes (art. 55 da Lei 11.343/2006) há previsão de defesa
preliminar (que não se confunde com a resposta escrita do art. 396, CPP).
A defesa preliminar desses procedimentos especiais visa, em síntese, a convencer ao juiz
a rejeitar a denúncia ou queixa. Ou seja, tem cabimento antes do recebimento da denúncia ou
queixa, e o réu é notificado (e não citado) para apresentá-la.
O equívoco no fundamento legal pode levar a zerar e peça.

7
Cuidado com o prazo: a banca pode pedir para que seja apontado o último dia do prazo.

70
6.10 Questões sobre Resposta à acusação

12) QUESTÃO 3 – XVII EXAME


Ruth voltava para sua casa falando ao celular, na cidade de Santos, quando foi abordada por
Antônio, que afirmou: “Isso é um assalto! Passa o celular ou verá as consequências!”. Diante da
grave ameaça, Ruth entregou o telefone e o agente fugiu em sua motocicleta em direção à cidade
de Mogi das Cruzes, consumando o crime. Nervosa, Ruth narrou o ocorrido para o genro Thiago,
que saiu em seu carro, junto com um policial militar, à procura de Antônio. Com base na placa
da motocicleta anotada por Ruth, Thiago localizou Antônio, já em Mogi das Cruzes, ainda na
posse do celular da vítima e também com uma faca em sua cintura, tendo o policial efetuado a
prisão em flagrante. Em razão dos fatos, Antônio foi denunciado pela prática do crime previsto

71
no Art. 157, § 2º, inciso VII, do Código Penal, perante uma Vara Criminal da comarca de Mogi
das Cruzes, ficando os familiares do réu preocupados, porque todos da região sabem que o
magistrado, em atuação naquela Vara, é extremamente severo. A defesa foi intimada a
apresentar resposta à acusação. Considerando que o flagrante foi regular e que os fatos são
verdadeiros, responda, na qualidade de advogado(a) de Antônio, aos itens a seguir.
A) Que medida processual poderia ser adotada para evitar o julgamento perante a Vara
Criminal de Mogi das Cruzes? Justifique. (Valor: 0,65)
B) No mérito, caso Antônio confesse os fatos durante a instrução, qual argumento de
direito material poderia ser formulado para garantir uma punição mais branda do que a
pleiteada na denúncia? Justifique. (Valor: 0,60)

Observação: originalmente a questão menciona o artigo 157, §2º, inciso I, do CP, o qual foi
revogado. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.654/2018, a majorante pelo emprego de arma
branca passou a estar prevista no artigo 157, §2º, inciso VII, do CP, razão pela qual realizamos
esta adaptação na questão."

13) QUESTÃO 1 – VIII EXAME


Em determinada ação fiscal procedida pela Receita Federal, ficou constatado que Lucile não fez
constar quaisquer rendimentos nas declarações apresentadas pela sua empresa nos anos de
2009, 2010 e 2011, omitindo operações em documentos e livros exigidos pela lei fiscal. Iniciado
processo administrativo de lançamento, mas antes de seu término, o Ministério Público entendeu
por bem oferecer denúncia contra Lucile pela prática do delito descrito no art. 1º, inciso II da Lei
n. 8.137/90, combinado com o art. 71 do Código Penal. A inicial acusatória foi recebida e a defesa
intimada a apresentar resposta à acusação.
Atento(a) ao caso apresentado, bem como à orientação dominante do STF sobre o tema,
responda, fundamentadamente, o que pode ser alegado em favor de Lucile. (Valor: 1,25)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

72
Competência

Aula prevista para ocorrer ao vivo nos dias 07 e 08/03/2023.

Prof. Me. Mauro Stürmer


@prof.maurosturmer

7.1. Jurisdição
Conceito: Poder atribuído, com exclusividade ao Judiciário, para decidir um
determinado litígio segundo as regras legais existentes.
É o poder das autoridades judiciárias, regularmente investidas no cargo, para, diante do
caso concreto, “dizer o direito”.
Juris - dição: dizer o direito.
Competência seria a parte da jurisdição que cada órgão jurisdicional pode legalmente
exercer.

SE LIGA:

Não se pode confundir a jurisdição com a competência, sendo que esta é uma
limitação daquela.

Mecanismo de solução dos conflitos:


• Autotutela: caracteriza-se pelo emprego da força para satisfação de interesses. A
autotutela é vedada, salvo em hipóteses excepcionais, como a legítima defesa, estado de
necessidade e prisão em flagrante;
• Autocomposição: caracteriza-se pela busca do consenso dos conflitantes.
Doutrinadores antigos não admitem isso no processo penal.
Hoje não há como negar que a autocomposição é o objetivo dos Juizados Especiais,
conforme menciona o artigo 98, inciso I, da Constituição Federal/88 que trata da autocomposição
por meio da transação penal, nos casos de infrações de menor potencial ofensivo (Art. 61 da Lei
9.099/95).

73
a) Princípio do juiz natural
Art. 5º da Constituição Federal:
[...]
XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção;
[...]
LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente

b) Lei processual que altera as regras de competência

Art. 2º do Código de Processo Penal: A lei processual penal aplicar-se-á desde logo,
sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

c) Características da jurisdição
• Substitutividade: a Jurisdição é a atividade desenvolvida pelo órgão judicial em
substituição as partes;
• Inércia: Não há, como regra, prestação jurisdicional de ofício. O Poder Judiciário
deve ser provocado;
Exceção: Concessão de Habeas Corpus de ofício.
• Coisa Julgada: impossibilidade de decisão judicial se revista por órgão estranho
ao poder judiciário.

7.2. Competência
Conceito: Competência é a delimitação do poder jurisdicional (fixa os limites dentro dos
quais o juiz pode prestar jurisdição).
Competência é a medida e o limite de jurisdição dentro dos quais o órgão jurisdicional
poderá dizer o direito.
A jurisdição é una, é única, é uma só. No entanto, não pode se imaginar um único juiz
exercendo a jurisdição, então, divide-se em competências para cada juiz.

7.2.1. Espécies de competência


A doutrina tradicional distribui a competência considerando os seguintes aspectos
diferentes:
a) ratione materiae: estabelecida em razão da natureza do crime praticado.
b) ratione personae: em razão da qualidade das pessoas acusadas.
c) ratione loci (art. 69, incisos I e II, CPP): em razão do local.
d) competência absoluta e competência relativa.

74
Competência ABSOLUTA Competência RELATIVA

Regra de competência criada com base no Regra de competência criada com base no
interesse público interesse preponderantemente das partes.

A regra de competência absoluta não pode ser A regra de competência relativa pode ser
modificada, ou seja, cuida-se de competência modificada, ou seja, cuida-se de
improrrogável ou imodificável. competência prorrogável ou modificável

Pode ser reconhecida ex officio pelo Pode ser reconhecida ex officio pelo
magistrado, enquanto não esgotada sua magistrado, porém somente até o início da
jurisdição pela prolação da sentença. instrução processual, em virtude da
adoção do princípio da identidade física do
juiz (Art. 399, §2º, CPP). Não se aplica ao
processo penal a Súmula nº 33 do STJ

Exemplos: ratione materiae, ratione personae


e competência funcional.
Exemplos: ratione loci, competência por
distribuição, competência por prevenção
(Súmula 706 do STF), conexão e
continência.

7.2.2. Critérios de fixação da competência:


Não sendo hipótese de foro por prerrogativa da função, deve-se estabelecer critério para
fixação da competência. Nesse particular, necessário seguir os seguintes passos de forma
articulada:
1º) Identificar qual a Justiça Competente.
2º) Identificar o foro competente.
3º) Identificar o Juízo competente.

75
GUIA DE FIXAÇÃO DE COMPETÊNCIA – FERNANDO CAPEZ

Competência originária – o acusado tem foro por prerrogativa de função?


Competência de jurisdição – qual é a justiça competente?
Competência territorial – qual a comarca competente?
Competência de juízo – qual a vara competente?
Competência interna – qual o juiz competente?
Competência recursal – para onde vai o recurso?

Em relação à matéria, existe, basicamente, as de competência das Justiças Especiais


(Justiça Militar e Justiça Eleitoral) e da Justiça Comum (Federal e Estadual).
Nesse sentido, em primeiro lugar, deve-se verificar se o crime é da Justiça Especial Militar;
num segundo momento, se não for da competência da Justiça Militar, analisar se é da
competência da Justiça Eleitoral; para somente ao final, em não sendo da competência de
nenhuma das justiças especializadas, passar à análise se é da competência da Justiça Comum
Federal ou Estadual.

7.2.3. Determinação do foro competente


Estabelecida a Justiça competente, deve-se, agora, proceder à análise do foro
competente, que se traduz na competência em razão do lugar.
Artigo 69 do Código de Processo Penal:

Art. 69: Determinará a competência jurisdicional:

I - O lugar da infração:
II - O domicílio ou residência do réu;
III - A natureza da infração;
IV - A distribuição;
V - A conexão ou continência;
VI - A prevenção;
VII - A prerrogativa de função.

Regra geral: art. 70 do Código de Processo Penal


Para a determinação da competência lugar do crime é o lugar da consumação, ou seja,
onde terminam por se reunir todos os elementos da definição do crime.
No caso de tentativa, a competência é determinada “pelo lugar em que for praticado o
último ato de execução” (Art. 70, caput, segunda parte, CPP).

76
7.2.4. Competência em crime continuado e crime permanente: art. 71 do
Código de Processo Penal
Tratando-se de infração continuada ou permanente, praticada em território de duas ou
mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção (art. 71, CPP).

Art. 71. Tratando-se de infração continuada ou permanente, praticada em território de


duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção.
[...]
Art. 83. Verificar-se-á a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou
mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver
antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa,
ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa.

7.2.5. Competência pelo domicílio ou residência do réu: art. 72 e 73 do


Código de Processo Penal
Duas são as hipóteses:
• A primeira delas encontra-se no artigo 72, caput, CPP: “Não sendo
conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo domicílio ou
residência do réu.”
• A segunda hipótese refere-se à ação privada exclusiva, em que o querelante
poderá preferir o foro do domicílio ou residência do réu, ainda quando conhecido o
lugar da infração. Art. 73, CPP: “Nos casos de exclusiva ação privada, o querelante
poderá preferir o foro de domicílio ou da residência do réu, ainda quando conhecido
o lugar da infração.”
Não sendo possível a aplicação das regras acima mencionadas por não ter o réu domicílio
ou residência certa, sendo ignorado o seu paradeiro, é competente o juiz que primeiro tome
conhecimento do fato (art. 72, § 2º, CPP):

Art. 72: Não sendo conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo
domicílio ou residência do réu.
§ 1º Se o réu tiver mais de uma residência, a competência firmar-se-á pela prevenção.
§2º Se o réu não tiver residência certa ou for ignorado o seu paradeiro, será competente
o juiz que primeiro tomar conhecimento do fato.

77
7.2.6 Competência pela natureza da infração: art. 74 e 492 do Código de
Processo Penal

Art. 74: A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização
judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri.

§ 1º Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121, §§ 1º e
2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou
tentados.
§ 2º Se, iniciado o processo perante um juiz, houver desclassificação para infração da
competência de outro, a este será remetido o processo, salvo se mais graduada for a
jurisdição do primeiro, que, em tal caso, terá sua competência prorrogada.
§ 3º Se o juiz da pronúncia desclassificar a infração para outra atribuída à competência de
juiz singular, observar-se-á o disposto no art. 410 (atual 419, CPP); mas, se a
desclassificação for feita pelo próprio Tribunal do Júri, a seu presidente caberá proferir a
sentença (art. 492, § 2º).

Art. 492, CPP:


§ 1º Se houver desclassificação da infração para outra, de competência do juiz singular,
ao presidente do Tribunal do Júri caberá proferir sentença em seguida, aplicando-se,
quando o delito resultante da nova tipificação for considerado pela lei como infração penal
de menor potencial ofensivo, o disposto nos arts. 69 e seguintes da Lei no 9.099, de 26 de
setembro de 1995.
§ 2º Em caso de desclassificação, o crime conexo que não seja doloso contra a vida será
julgado pelo juiz presidente do Tribunal do Júri, aplicando-se, no que couber, o disposto
no § 1º deste artigo.

7.2.7. Competência por distribuição: art. 75 do Código de Processo


Penal
Art. 75. A precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma
circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente.

Parágrafo único. A distribuição realizada para o efeito da concessão de fiança ou da


decretação de prisão preventiva ou de qualquer diligência anterior à denúncia ou queixa
prevenirá a da ação penal.

7.2.8. Causas modificadoras da competência (conexão ou continência)


7.2.8.1. Competência por conexão: art. 76 do Código de Processo Penal

Art. 76: A competência será determinada pela conexão:


I - se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por
várias pessoas reunidas (simultaneidade), ou por várias pessoas em concurso, embora
diverso o tempo e o lugar (por concurso), ou por várias pessoas, umas contra as outras
(por reciprocidade);
II - se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras,
ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas; (lógica ou
material)
III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares
influir na prova de outra infração. (probatória)
(com destaques e comentários pessoais).

78
A conexão existe quando duas ou mais infrações estiverem entrelaçadas por um
vínculo, um nexo, um liame que aconselha a junção dos processos, propiciando, assim, ao
julgador perfeita visão do quadro probatório.
São efeitos da conexão: a reunião das ações penais em um mesmo processo e a
prorrogação da competência.

• Conexão intersubjetiva: art. 76, inciso I, CPP


a) Conexão Intersubjetiva por Simultaneidade:
Diante da primeira parte do artigo 76, CPP (conexão intersubjetiva por simultaneidade),
há conexão se, ocorrendo duas ou mais infrações, “houverem sido praticadas, ao mesmo tempo,
por várias pessoas reunidas”. Não há liame psicológico.
Exemplo: o exemplo clássico é o de diversos expectadores de um jogo de futebol,
ocasionalmente reunidos, praticarem depredações no estádio.
b) Conexão Intersubjetiva por Concurso:
Pelo artigo 76, inciso I, 2ª parte, CPP, há conexão se as infrações forem praticadas “por
várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e lugar”. É a hipótese de concurso de
pessoas em várias infrações.
Exemplo: quadrilha que trafica entorpecentes em vários pontos da cidade.
c) Conexão Intersubjetiva por Reciprocidade:
Pelo artigo 76, inciso I, última parte, CPP, há conexão se os crimes forem praticados “por
várias pessoas, umas contra as outras”.
Exemplo: agressões entre componentes de dois grupos de pessoas em um baile.

• Conexão objetiva, lógica ou material: art. 76, inciso II, CPP


Nos termos do artigo 76, inciso II, CPP, a competência é determinada pela conexão se,
no caso de várias infrações, “se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar
ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas”.

• Conexão instrumental ou probatória: art. 76, inciso III, CPP


Conforme o artigo 76, inciso III, CPP: “quando a prova de uma infração ou de qualquer de
suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração.”

79
7.2.8.2. Competência por continência: art. 77 do Código de Processo
Penal
Diz que há continência quando uma coisa está contida em outra, não sendo possível a
separação.
Art. 77. A competência será determinada pela continência quando:
I - duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração; (cumulação subjetiva)
II - no caso de infração cometida nas condições previstas nos º, 53, segunda parte, e 54
do Código Penal. (cumulação objetiva – concurso de crimes)
(com destaques e comentários pessoais).

• Continência em razão do concurso de pessoas: art. 77, inciso I, CPP


(cumulação subjetiva)
Justifica-se a junção de processos contra diferentes réus, desde que eles tenham
cometido o crime em conluio, com unidade de propósitos, tornando único o fato a ser apurado.
Difere da conexão por concurso, porque nesta há vários agentes praticando vários fatos.
• Continência em razão do concurso formal de crimes: art. 77, inciso II, CPP
(cumulação objetiva)

OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:

A referência feita aos artigos 51, 52, 53 e 53 do Código Penal, atualmente corresponde
aos artigos 70, 73 e 74 da mesma norma.

O artigo 70 refere-se ao concurso formal de crimes, em que, com uma mesma conduta
o agente pratica dois ou mais crimes.
O artigo 73, 2ª parte refere-se ao erro de execução (aberratio ictus), em que, por
acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, além de atingir a pessoa que pretendia
ofender lesa outra.
O artigo 74, 2ª parte, refere-se ao resultado diverso do pretendido (aberratio criminis),
em que fora da hipótese anterior, o agente além do resultado pretendido, causa outro.
Em todos os casos, está-se diante de concurso formal, razão pela qual, na essência,
o fato a ser apurado é um só, embora existam dois ou mais resultados.

80
7.2.9. Foro prevalente
• Competência prevalente do júri: art. 78, inciso I, CPP

Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas


as seguintes regras:
I - no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum,
prevalecerá a competência do júri;

• Jurisdição da mesma categoria: art. 78, inciso II, CPP


Considera-se jurisdição da mesma categoria aquela que une magistrados aptos a julgar o
mesmo tipo de causa.
Ocorre, porém, que pode haver um conflito real entre esses magistrados.
Exemplo: Furto e receptação (conexão instrumental). Cada inquérito foi distribuído a um
juiz diferente. Havendo conexão instrumental, torna-se viável que sejam julgados por um único
juiz.
Como ambos são de idêntica jurisdição, estabelecem-se regras para escolha do foro
prevalente:
a) Foro onde foi cometida a Infração mais grave:

Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas


as seguintes regras:
[...]
Il - no concurso de jurisdições da mesma categoria:
a) preponderará a do lugar da infração, à qual for cominada a pena mais grave;

Tendo em vista que o primeiro critério de escolha é o referente ao lugar da infração, é


possível que existam dois delitos sendo apurados em foros diferentes, tendo em vista que as
infrações se originaram em locais diversos (como no furto e receptação).
Assim, elege-se qual é o mais grave para a escolha do foro prevalente: se for um furto
qualificado e uma receptação simples, fixa-se o foro do furto qualificado (pena mais grave) como
o competente.

b) Foro onde foi cometido o mais número de infrações:

Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas


as seguintes regras:
[...]
Il - no concurso de jurisdições da mesma categoria:

81
a) prevalecerá a do lugar em que houver ocorrido o maior número de infrações, se as
respectivas penas forem de igual gravidade;

Exemplo: Imagine-se que três delitos de furto simples (art. 155, CP) estejam sendo
apurados em Santa Maria/RS, enquanto um delito de receptação simples (art. 180, CP),
praticados, em tese, em conexão, esteja sendo apurado em Santa Cruz do Sul/RS.
Embora a pena do furto e da receptação sejam idênticas, o julgamento dos quatro crimes
deve ser realizado em Santa Maria/RS, onde foi praticado maior número de infrações.

c) Foro residual estabelecida pela prevenção:

Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas


as seguintes regras:
[...]
Il - no concurso de jurisdições da mesma categoria:

d) Firmar-se-á a competência pela prevenção, nos outros casos:


Neste caso, havendo magistrados de igual jurisdição em confronto e não sendo possível
escolher pela regra da gravidade do crime (exemplo: furto simples e receptação simples), nem
pelo número de delitos (em ambas as comarcas foram praticados um delito), elege-se o juiz pela
prevenção, isto é, aquele que primeiro conhecer de um dos processos torna-se competente para
julgar ambos, avocando da Comarca ou Vara vizinha o outro. Não haverá unidade de processo,
conforme artigo 79, CPP.

Art. 79. A conexão e a continência importarão unidade de processo e julgamento, salvo:


I - No concurso entre a jurisdição comum e a militar;
II - No concurso entre a jurisdição comum e a do juízo de menores.
§ 1º Cessará, em qualquer caso, a unidade do processo, se, em relação a algum co-réu,
sobrevier o caso previsto no art. 152. (doença mental)
§ 2º A unidade do processo não importará a do julgamento, se houver co-réu foragido que
não possa ser julgado à revelia, ou ocorrer a hipótese do art. 461.

No caso de concurso de agentes onde um apresente uma doença mental superveniente


ocorrerá suspensão do processo para o doente e prosseguimento para os demais.
No caso da citação editalícia - artigo 366 do Código de Processo Penal, um dos acusados
citado por edital não comparece e nem constitui advogado (o processo ficará suspenso em
relação a ele, prosseguindo para os demais).

82
SEPARAÇÃO FACULTATIVA: ARTIGO 80 E 81, CPP

Art. 80: Será facultativa a separação dos processos quando as infrações tiverem sido
praticadas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo
número de acusados e para não Ihes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo
relevante, o juiz reputar conveniente a separação.
Art. 81. Verificada a reunião dos processos por conexão ou continência, ainda que no
processo da sua competência própria venha o juiz ou tribunal a proferir sentença absolutória
ou que desclassifique a infração para outra que não se inclua na sua competência,
continuará competente em relação aos demais processos.
Parágrafo único. Reconhecida inicialmente ao júri a competência por conexão ou
continência, o juiz, se vier a desclassificar a infração ou impronunciar ou absolver o
acusado, de maneira que exclua a competência do júri, remeterá o processo ao juízo
competente.

AVOCAÇÃO DO PROCESSO: ART. 82, CPP

Art. 82. Se, não obstante a conexão ou continência, forem instaurados processos
diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram
perante os outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva. Neste caso, a
unidade dos processos só se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação
das penas.

7.2.10. Da competência por prevenção


Artigo 83 do Código de Processo Penal:

Art. 83. Verificar-se-á a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou
mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver
antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa,
ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa (arts. 70, § 3o, 71, 72, § 2o,
e 78, II, c).

83
7.2.11. Da competência por prerrogativa de função
Determinadas pessoas, por exercerem funções específicas, possuem a prerrogativa de
serem julgadas originariamente por determinados órgãos.

ATENÇÃO!

Importante atentar acerca de decisão recente do STF, a qual trouxe alterações significativas
ao firmar o entendimento de que o foro por prerrogativa de função conferido aos deputados
federais e senadores se aplica apenas a crimes cometidos no exercício do cargo e em
razão das funções a ele relacionadas. Ainda, o relator da respectiva Ação Penal (AP 937),
ministro Luís Roberto Barroso, estabeleceu que, após o final da instrução processual, com
a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a
competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o
agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja
o motivo.

Legislação aplicável:
Artigo 84 do Código de Processo Penal:

Art. 84: A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do


Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos
Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder perante
eles por crimes comuns e de responsabilidade. (Redação dada pela Lei nº 10.628, de
24.12.2002)
§ 1o (Vide ADIN nº 2797) – continuidade do foro
§ 2o (Vide ADIN nº 2797) – ações de improbidade

Exceção da verdade:
Artigo 85 do Código de Processo Penal:

Art. 85. Nos processos por crime contra a honra, em que forem querelantes as pessoas
que a Constituição sujeita à jurisdição do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de
Apelação, àquele ou a estes caberá o julgamento, quando oposta e admitida a exceção
da verdade.

Legislação aplicável
Artigos 86 e 87 do Código de Processo Penal:

Art. 86: Ao Supremo Tribunal Federal competirá, privativamente, processar e julgar:

84
I - os seus ministros, nos crimes comuns;
II - os ministros de Estado, salvo nos crimes conexos com os do Presidente da República;
III - o procurador-geral da República, os desembargadores dos Tribunais de Apelação, os
ministros do Tribunal de Contas e os embaixadores e ministros diplomáticos, nos crimes
comuns e de responsabilidade.

Art. 87. Competirá, originariamente, aos Tribunais de Apelação o julgamento dos


governadores ou interventores nos Estados ou Territórios, e prefeito do Distrito Federal,
seus respectivos secretários e chefes de Polícia, juízes de instância inferior e órgãos do
Ministério Público.

Passa-se, agora, à análise de algumas hipóteses de foro por prerrogativa de função.

7.2.12. Competência do Supremo Tribunal Federal: art. 102, inciso I,


alíneas “b” e “c”, CF
O STF já firmou entendimento de que a expressão “infrações penais comuns” do artigo
102, inciso I, alíneas “b” e “c”, CF, abrange todas as modalidades de infrações penais, inclusive
os crimes eleitorais, militares e as contravenções penais.

7.2.13. Competência do Suprior Tribunal de Justiça: art. 105, inciso I,


alínea “a”, CF
Nos termos do artigo 105, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal/88, compete ao
Superior Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente, nos crimes comuns, os
Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os
desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos
Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos
Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas
dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais.

7.2.14. Competência dos Tribunais Regionais Federais: art. 108, inciso


I, alínea “a”, CF
Aos Tribunais Regionais Federais competem processar e julgar originariamente os juízes
federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos
crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada
a competência da Justiça Eleitoral.

85
Na parte final do artigo 108, inciso I, alínea “a”, CF, contém a ressalva em relação aos
crimes eleitorais, de modo que, se um desses agentes praticar um crime eleitoral, será julgado
pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE).

7.2.15. Competência dos Tribunais de Justiça: art. 96, inciso III, CF


Nos termos do artigo 96, inciso III, da Constituição Federal/88, compete aos Tribunais de
Justiça dos Estados julgar juízes estaduais e do Distrito Federal, bem como os membros do
Ministério Público dos Estados. Contudo, a Constituição faz expressa ressalva à Justiça Eleitoral,
de modo que, se qualquer desses agentes praticar crime eleitoral, será julgado no TRE.
Os magistrados e os membros do MP devem ser julgados pelo Tribunal ao qual estão
vinculados, pouco importando o lugar da infração, seguindo-se a competência estabelecida na
Constituição Federal.
Assim, caso um juiz estadual cometa um delito de competência da justiça federal será
julgado pelo TJ do seu Estado.
O mesmo se dá com o juiz federal que cometa um crime da esfera estadual: será julgado
pelo TRF da sua área de atuação.
Frise-se que pouco importa o lugar da infração penal. Se um juiz estadual de São Paulo
cometer um delito no Estado do Amazonas, será julgado pelo TJ de São Paulo.
Em se tratando de crime de competência do Tribunal do Júri continua prevalecendo a
competência por prerrogativa de função, pois também prevista na Constituição Federal, ou seja,
o Juiz que praticar crime doloso contra a vida será julgado pelo Tribunal de Justiça.

7.2.16. Competência para julgar prefeitos municipais: art. 29, inciso X,


CF
Se o prefeito cometer um crime de competência de Justiça Comum Estadual, será julgado
no Tribunal de Justiça.
Contudo, se praticar um crime eleitoral, será julgado pelo Tribunal Regional Eleitoral
(TRE).
Se o delito for de competência da Justiça Federal será julgado pelo Tribunal Regional
Federal (TRF).

86
É o que se extrai da Súmula 702 do STF: “A competência do Tribunal de Justiça para
julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da Justiça Comum Estadual; nos
demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau”.
Ver, ainda, as Súmulas 208 e 209 do STJ.

ATENÇÃO: CASOS ESPECIAIS NO ARTIGO 89, CPP

Art. 89: Os crimes cometidos em qualquer embarcação nas águas territoriais da


República, ou nos rios e lagos fronteiriços, bem como a bordo de embarcações
nacionais, em alto-mar, serão processados e julgados pela justiça do primeiro porto
brasileiro em que tocar a embarcação, após o crime, ou, quando se afastar do País,
pela do último em que houver tocado.

Competência nos casos de crimes de homicídio:

EXCEÇÃO: Em crimes contra a vida, a competência será determinada pela teoria da


atividade.
Assim, no caso de crimes contra a vida (dolosos ou culposos), se os atos de execução
ocorreram em um lugar e a consumação se deu em outro, a competência para julgar o fato
será do local onde foi praticada a conduta (local da execução).

ESTE É O ENTENDIMENTO DO STJ E DO STF:

(...) Nos termos do art. 70 do CPP, a competência para o processamento e julgamento da


causa, será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumou a infração.
2. Todavia, a jurisprudência tem admitido exceções a essa regra, nas hipóteses em que o
resultado morte ocorrer em lugar diverso daquele onde se iniciaram os atos executórios,
determinando-se que a competência poderá ser do local onde os atos foram inicialmente
praticados.
3. Tendo em vista a necessidade de se facilitar a apuração dos fatos e a produção de
provas, bem como garantir que o processo possa atingir à sua finalidade primordial, qual
seja, a busca da verdade real, a competência pode ser fixada no local de início dos atos
executórios. (...)

87
(HC 95.853/RJ, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 11/09/2012)
Qual é a razão de se adotar esse entendimento?
Explica Guilherme de Souza Nucci:
“(...) é justamente no local da ação que se encontram as melhores provas (testemunhas,
perícia etc.), pouco interessando onde se dá a morte da vítima. Para efeito de condução de uma
mais apurada fase probatória, não teria cabimento desprezar-se o foro do lugar onde a ação
desenvolveu-se somente para acolher a teoria do resultado. Exemplo de ilogicidade seria o autor
ter dado vários tiros ou produzido toda a série de atos executórios para ceifar a vida de alguém
em determinada cidade, mas, unicamente pelo fato da vítima ter-se tratado em hospital de
Comarca diversa, onde faleceu, deslocar-se o foro competente para esta última. As provas teriam
que ser coletadas por precatória, o que empobreceria a formação do convencimento do juiz.”
(Código de Processo Penal Comentado. 8ª ed., São Paulo: RT, 2008, p. 210).

7.2.17. Competência da Justiça Federal

São órgãos da
Justiça Federal
(art. 106, CF)

Tribunais Juízes
Regionais Federais Federais

A competência da Justiça Federal é residual em relação às especiais; prevalece, por outro


lado, sobre a Justiça Estadual, nos termos do artigo 78, inciso III, do Código de Processo Penal
e Súmula 122 do STJ.
Art. 78, inciso III, CPP: no concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará
a de maior graduação.

88
Súmula 122 do STJ: Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos
crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do artigo 78, inciso
II, alínea “a”, do Código de Processo Penal.
A competência da Justiça Federal está prevista no artigo 109 da Constituição Federal/88.
I) Os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens,
serviços ou interesse da união ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas,
excluídas as contravenções e ressalvada a competência da justiça militar e da justiça
eleitoral: artigo 109, inciso IV da Constituição Federal/88
Qualquer delito que atinja bens jurídicos de interesse da união será da competência da
Justiça Federal.
Não abrange as contravenções. Dispõe a Súmula 38 do STJ que “compete à Justiça
Estadual Comum, na vigência da Constituição de 1988, o processo por contravenção
penal, ainda que praticada em detrimento de bens, serviços ou interesses da União ou de
suas entidades”.
Desse modo, mesmo que haja conexão entre um crime federal e uma contravenção penal,
prevalece a regra constitucional, indicando a necessidade do desmembramento do processo,
não se aplicando neste caso o teor da Súmula 122 do STJ.
Há que se ressaltar o previsto na Súmula 147 do STJ no sentido de que é competente a
Justiça Federal para processar e julgar os crimes praticados contra funcionário federal,
quando relacionados com o exercício da função.
Evidentemente, por lesarem serviços da União, são também da competência da Justiça
Federal os crimes praticados por funcionários federais no exercício da função.
Por se limitar o artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal/88, às autarquias e empresas
públicas, assentou-se no STJ que “compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar
causas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em seu
detrimento” (Súmula 42 do STJ).
Por isso, não são da competência da Justiça Federal, mas da Justiça Estadual, os crimes
praticados contra o Banco do Brasil, por exemplo.
• Crimes contra os Correios:
• Exploração direta pela ECT: JF
• Franquia: Justiça Estadual
• Fundação Pública Federal – FURG
• Justiça Federal

89
• Bens Tombados
• Depende de quem tombou.
• Crimes Contrabando e Descaminho
• Justiça Federal do local da apreensão dos bens.
• STJ Súmula nº 140 - Competência - Crime - Índios - Processo e Julgamento
Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime em que o indígena
figure como autor ou vítima.
Recurso contra decisão que julgou o crime político, pela previsão no art. 102 da
Constituição Federal:

Art. 102: Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da


Constituição, cabendo-lhe:
II - Julgar, em recurso ordinário:
b) o crime político;

II) Crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando teve a execução


iniciada no Brasil, consumando-se ou devendo consumar-se no exterior, ou vice-versa:
artigo 109, inciso V da Constituição Federal/88
Compete, ainda, à Justiça Federal o processo e julgamento dos “crimes previstos em
tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no país, o resultado tenha ou
devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente” (Art. 109, inciso V, CF).
Exemplo: Súmula 522 do STF: “Salvo ocorrência de tráfico para o Exterior, quando, então,
a competência será da Justiça Federal, compete à Justiça dos Estados o processamento dos
crimes relativos a entorpecentes”.
• Rol exemplificativo de crimes previstos em tratado e convenção internacional (Art. 109,
inciso V da CF):
• Tráfico internacional de armas de fogo: de acordo com o artigo 18 da Lei nº 10.826/03 -
Estatuto do Desarmamento, que trata da conduta de importar, exportar armas de fogo,
tendo como competência a justiça federal;
• Tráfico internacional de pessoas: o artigo 231 do Código Penal tem como alvo homens,
mulheres e crianças, sendo a competência da justiça federal;
• Transferência ilegal de criança ou adolescente para o exterior: previsto no artigo 239 do
Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo a competência da justiça federal;
• Pornografia infantil e pedofilia por meio da internet: previsto no artigo 241-A do Estatuto
da Criança e do Adolescente, sendo de competência da justiça federal. Mas, para que a

90
competência seja da justiça federal, deve ficar demonstrado que o início da execução
ocorreu no Brasil e que a consumação da infração tenha ou devesse ter ocorrido no
exterior, ou vice-versa. Quanto à competência territorial, a consumação ocorre no local de
onde emanaram as imagens, pouco importando a localização do provedor. E o simples
fato de armazenar fotos já é considerado crime de pedofilia.
III) Causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º do art. 109: artigo 109,
inciso V-A da Constituição Federal/88
Estipula o parágrafo 5º que nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o
Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações
decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá
suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo,
incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal
Nesta hipótese, o deslocamento de um crime para a Justiça Federal somente deve dar-se
quando realmente houver grave violação de direitos humanos, de caráter coletivo (como, por
exemplo, um massacre produzido por policiais contra vários indivíduos).
Tal medida teria a finalidade de assegurar o desligamento do caso das questões locais,
mais próprias da Justiça Estadual, levando-o para a esfera federal, buscando, inclusive, elevar a
questão à órbita de interesse nacional e não somente regional.
IV) Crimes contra a organização do trabalho, quando envolver interesses coletivos
dos trabalhadores: artigo 109, inciso VI da Constituição Federal/88
Compete à justiça FEDERAL processar e julgar o crime de redução à condição análoga à
de escravo (Art. 149, CP). O tipo previsto no art. 149, CP caracteriza-se como crime contra a
organização do trabalho e, portanto, atrai a competência da justiça federal (Art. 109, inciso VI da
CF). STF. Plenário. RE 459510/MT, rel. orig. Min. Cezar Peluso, red. p/ o acórdão Min. Dias
Toffoli, julgado em 26/11/2015 (Info 809).
V) Crimes contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira: artigo 109,
inciso VI da Constituição Federal/88
Como previsto no artigo 26, caput, da Lei nº 7.492/86.
Também compete à Justiça Federal apreciar “os crimes contra organização do Trabalho
e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômica e financeira”
(Art. 109, inciso VI da CF).
VI) Crimes cometidos a bordo de navios e aeronaves, excetuados o da Justiça
Militar: artigo 109, inciso IX da Constituição Federal/88

91
• Navio: é a embarcação apta para a navegação em alto mar;
• Aeronave: é todo aparelho manobrável em voo, que possa sustentar-se e circular
no espaço aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a transportar pessoas ou coisas.
Segundo o STF e o STJ, navios são embarcações de grande cabotagem ou de grande
capacidade de transporte de passageiros, aptas a realizar viagens internacionais.
Logo, somente as embarcações de grande porte envolvem a Justiça Federal.
As demais (lanchas, botes, iates, etc) ficam na esfera da justiça estadual.
Os crimes cometidos a bordo de aeronaves terão competência sempre da Justiça Federal,
pois a Constituição Federal mencionou os crimes cometidos a bordo de aeronaves e não de
aviões de grande porte.

ATENÇÃO!

AERONAVE EM SOLO - COMPETÊNCIA


STF - RHC 86998 - STJ - HC 108.478 STJ
Pouco importa se a aeronave está em solo ou voando.
1ª Turma reconhece competência da justiça federal para crimes cometidos a bordo
de aeronaves

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou provimento (arquivou) ao


Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 86998, reconhecendo a competência da Justiça
Federal para processar e julgar crimes cometidos a bordo de navios e aeronaves, conforme
expresso no artigo 109, inciso IX da Constituição Federal.
O recurso relata o roubo de numerário de dentro de um avião, ocorrido no aeroporto de
Congonhas, em São Paulo/SP.
O relator, ministro Marco Aurélio, afirmou que este roubo teria ocorrido quando a
aeronave ainda estava no solo. E que poderia ter acontecido durante o deslocamento do carro
da firma de transporte de valores. Para ele, o inciso IX tenta “definir o juízo competente ante o
espaço aéreo e as águas territoriais. Não é a proteção do deslocamento em si verificado
mediante navios e aeronaves, porquanto surgiria o paradoxo em não englobar o transporte
ferroviário e rodoviário”.
Marco Aurélio ressalta que a norma constitucional busca estabelecer a área geográfica da
prática criminosa e, portanto, a comarca competente para o julgamento. “O preceito não envolve

92
situação concreta em que o crime ocorra enquanto atracado o navio ou estacionada a aeronave
no aeroporto”, diz o ministro. Destaca que, nestes casos, tem-se como definir a competência, “e
esta é a do juízo situado quer na área do porto, quer na localidade em que esteja o aeroporto”.
Dessa forma, Marco Aurélio votou para prover o RHC e conceder a ordem, fixando a
competência da justiça estadual onde verificado o roubo. Ele foi acompanhado pelo ministro
Ricardo Lewandowski.
Para a ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha, no entanto, o dispositivo
constitucional é taxativo e não deixa dúvidas, ao afirmar que cabe à Justiça Federal julgar
e processar “crimes cometidos a bordo de navios e aeronaves”. A ministra abriu
divergência e votou pela negação do provimento, sendo acompanhada pelos ministros
Carlos Ayres Britto e Sepúlveda Pertence.
Assim, por maioria, acompanhando o voto da ministra Carmen Lúcia, a Primeira
Turma negou provimento ao RHC 86998.

7.2.18. Competência da justiça militar


Justiça Militar da União: art. 124 da Constituição Federal
Crimes militares praticados por qualquer pessoa (inclusive civil).
Justiça Militar Estadual: art. 125 da Constituição Federal
Crime militares praticados apenas por militares dos estados (nunca julgará civil).
Julga também questões cíveis relacionadas a punição disciplinares (§ 4º, do Art. 125 da
CF).

7.2.19. Competência criminal da justiça eleitoral


É fixada em razão da matéria, cabendo a Justiça Eleitoral o processo e julgamento dos
crimes eleitorais. Os crimes eleitorais são aqueles previstos no Código Eleitoral e os que a lei,
eventual e expressamente, defina como eleitorais.

ATENÇÃO!

Quem julga crime eleitoral conexo a crime doloso contra a vida?


O crime eleitoral é julgado pela Justiça Eleitoral e o crime doloso contra a vida será julgado
pelo Tribunal do Júri, porque a competência desses crimes está prevista na CF.

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7.2.20. Justiça política ou extraordinária
Art. 52 da Constituição Federal:

Art. 52: Compete privativamente ao Senado Federal:


I - Processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de
responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do
Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

7.2.21. Restrição ao foro por prerrogativa de função


As normas da Constituição Federal de 1988 que estabelecem as hipóteses de foro por
prerrogativa de função devem ser interpretadas restritivamente, aplicando-se apenas aos crimes
que tenham sido praticados durante o exercício do cargo e em razão dele. Assim, por exemplo,
se o crime foi praticado antes de o indivíduo ser diplomado como Deputado Federal, não se
justifica a competência do STF, devendo ele ser julgado pela primeira instância mesmo ocupando
o cargo de parlamentar federal. Além disso, mesmo que o crime tenha sido cometido após a
investidura no mandato, se o delito não apresentar relação direta com as funções exercidas,
também não haverá foro privilegiado. Foi fixada, portanto, a seguinte tese: O foro por prerrogativa
de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados
às funções desempenhadas. STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado
em 03/05/2018 (Info 900).

7.2.22. Marco para o fim do foro


Término da instrução: Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho
de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar
ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou
deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo. STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min.
Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018 (Info 900).

7.2.23. Crime de moeda falsa


Em regra, é de competência da Justiça Federal, pois é de competência da União emitir
moeda (Art. 21, inciso VII, CF). E mesmo se a falsificação for de moeda estrangeira, a
competência continua sendo da Justiça Federal, porque compete ao Banco Central fiscalizar a
circulação de moeda estrangeira em território nacional. Entretanto, quando a falsificação de
moeda é grosseira, não se trata de crime de moeda falsa, pois se a falsificação é capaz de

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enganar alguém e se obteve a vantagem ilícita trata-se de crime de estelionato, logo, é de
competência da justiça estadual, no teor da Súmula 73 do STJ.

7.2.24. Justiça estadual


É a competência mais residual de todas, pois o crime somente será julgado na Justiça
Estadual quando não for da competência da Justiça Especial (Militar ou Eleitoral) e da Justiça
Comum Federal.
A propósito, havendo conflito entre a Justiça Comum Federal e Estadual, prevalece a
Justiça Federal, nos termos do art. 78, inciso III do Código de Processo Penal e Súmula 122 do
STJ.
Súmula 122 do STJ: “Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos
crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do Art. 78, II, "a",
do Código de Processo Penal.”

QUESTÕES PONTUAIS
Crimes contra a honra praticados pelas redes sociais da internet: Competência da
JUSTIÇA ESTADUAL (regra geral) STJ. CC 121.431-SE, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 11/4/2012.
Crime praticado em Banco Postal: Compete à JUSTIÇA ESTADUAL (e não à Justiça
Federal) processar e julgar ação penal na qual se apurem infrações penais decorrentes da
tentativa de abertura de conta corrente mediante a apresentação de documento falso em
agência do Banco do Brasil (BB) localizada nas dependências de agência da Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) que funcione como Banco Postal. STJ. 3ª Seção.
CC 129.804-PB, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 28/10/2015 (Info 572).

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7.3. Questões sobre competência

14) QUESTÃO 3 – XXII EXAME


Na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, Maurício iniciou a execução de determinada
contravenção penal que visava atingir e gerar prejuízo em detrimento de patrimônio de entidade
autárquica federal, mas a infração penal não veio a se consumar por circunstâncias alheias à
sua vontade. Ao tomar conhecimento dos fatos, o Ministério Público dá início a procedimento
criminal perante juízo do Tribunal Regional Federal com competência para atuar no local dos
fatos, imputando ao agente a prática da contravenção penal em sua modalidade tentada,
oferecendo, desde já, proposta de transação penal. Maurício conversa com sua família e procura
um(a) advogado(a) para patrocinar seus interesses, destacando que não tem interesse em
aceitar transação penal, suspensão condicional do processo ou qualquer outro benefício

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despenalizador. Com base apenas nas informações narradas e na condição de advogado(a) de
Maurício, responda:
A) Considerando que a contravenção penal causaria prejuízo ao patrimônio de entidade
autárquica federal, o órgão perante o qual o procedimento criminal foi iniciado é
competente para julgamento da infração penal imputada? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual argumento de direito material deverá ser apresentado para evitar a punição de
Maurício? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

15) QUESTÃO 1 – EXAME 2010-03


Caio, na qualidade de diretor financeiro de uma conhecida empresa de fornecimento de material
de informática, se apropriou das contribuições previdenciárias devidas dos empregados da
empresa e por esta descontadas, utilizando o dinheiro para financiar um automóvel de luxo. A
partir de comunicação feita por Adolfo, empregado da referida empresa, tal fato chegou ao
conhecimento da Polícia Federal, dando ensejo à instauração de inquérito para apurar o crime
previsto no artigo 168-A do Código Penal. No curso do aludido procedimento investigatório, a
autoridade policial apurou que Caio também havia praticado o crime de sonegação fiscal, uma
vez que deixara de recolher ICMS relativamente às operações da mesma empresa. Ao final do
inquérito policial, os fatos ficaram comprovados, também pela confissão de Caio em sede policial.
Nessa ocasião, ele afirmou estar arrependido e apresentou comprovante de pagamento
exclusivamente das contribuições previdenciárias devidas ao INSS, pagamento realizado após
a instauração da investigação, ficando não paga a dívida relativa ao ICMS. Assim, o delegado
encaminhou os autos ao Ministério Público Federal, que denunciou Caio pelos crimes previstos
nos artigos 168-A do Código Penal e 1º, I, da Lei 8.137/90, tendo a inicial acusatória sido recebida
pelo juiz da vara federal da localidade. Após analisar a resposta à acusação apresentada pelo
advogado de Caio, o aludido magistrado entendeu não ser o caso de absolvição sumária, tendo
designado audiência de instrução e julgamento.
Com base nos fatos narrados no enunciado, responda aos itens a seguir, empregando os
argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
A) Qual é o meio de impugnação cabível à decisão do Magistrado que não o absolvera
sumariamente? (Valor: 0,2)
B) A quem a impugnação deve ser endereçada? (Valor: 0,2)

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C) Quais fundamentos devem ser utilizados? (Valor: 0,6)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

16) QUESTÃO 3 – EXAME 2010-03


Jeremias é preso em flagrante pelo crime de latrocínio, praticado contra uma idosa que acabara
de sacar o valor relativo à sua aposentadoria dentro de uma agência da Caixa Econômica
Federal e presenciado por duas funcionárias da referida instituição, as quais prestaram
depoimento em sede policial e confirmaram a prática do delito. Ao oferecer denúncia perante o
Tribunal do Júri da Justiça Federal da localidade, o Ministério Público Federal requereu a
decretação da prisão preventiva de Jeremias para a garantia da ordem pública, por ser o crime
gravíssimo e por conveniência da instrução criminal, uma vez que as testemunhas seriam
mulheres e poderiam se sentir amedrontadas caso o réu fosse posto em liberdade antes da
colheita de seus depoimentos judiciais. Ao receber a inicial, o magistrado decretou a prisão
preventiva de Jeremias, utilizando-se dos argumentos apontados pelo Parquet.
Com base no caso acima, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a
fundamentação legal pertinente ao caso, indique os argumentos defensivos para atacar a
decisão judicial que recebeu a denúncia e decretou a prisão preventiva.
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

17) QUESTÃO 3 – XVII EXAME


Ruth voltava para sua casa falando ao celular, na cidade de Santos, quando foi abordada por
Antônio, que afirmou: “Isso é um assalto! Passa o celular ou verá as consequências!”. Diante da
grave ameaça, Ruth entregou o telefone e o agente fugiu em sua motocicleta em direção à cidade
de Mogi das Cruzes, consumando o crime. Nervosa, Ruth narrou o ocorrido para o genro Thiago,
que saiu em seu carro, junto com um policial militar, à procura de Antônio. Com base na placa
da motocicleta anotada por Ruth, Thiago localizou Antônio, já em Mogi das Cruzes, ainda na
posse do celular da vítima e também com uma faca em sua cintura, tendo o policial efetuado a
prisão em flagrante. Em razão dos fatos, Antônio foi denunciado pela prática do crime previsto
no Art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal, perante uma Vara Criminal da comarca de Mogi das
Cruzes, ficando os familiares do réu preocupados, porque todos da região sabem que o

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magistrado, em atuação naquela Vara, é extremamente severo. A defesa foi intimada a
apresentar resposta à acusação. Considerando que o flagrante foi regular e que os fatos são
verdadeiros, responda, na qualidade de advogado de Antônio, aos itens a seguir.
A) Que medida processual poderia ser adotada para evitar o julgamento perante a Vara
Criminal de Mogi das Cruzes? Justifique. (Valor: 0,65)
B) No mérito, caso Antônio confesse os fatos durante a instrução, qual argumento de
direito material poderia ser formulado para garantir uma punição mais branda do que a
pleiteada na denúncia? Justifique. (Valor: 0,60)

Observação: originalmente a questão menciona o artigo 157, §2º, inciso I, do CP, o qual foi
revogado. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.654/2018, a majorante pelo emprego de arma
branca passou a estar prevista no artigo 157, §2º, inciso VII, do CP, razão pela qual realizamos
esta adaptação na questão."

18) QUESTÃO 2 – EXAME 2010-03


Caio, residente no município de São Paulo, é convidado por seu pai, morador da cidade de Belo
Horizonte, para visitá-lo. Ao dirigir-se até Minas Gerais em seu carro, Caio dá carona a Maria,
jovem belíssima que conhecera na estrada e que, ao saber do destino de Caio, o convence a
subtrair pertences da casa do genitor do rapaz, chegando a sugerir que ele aguardasse o
repouso noturno de seu pai para efetuar a subtração. Ao chegar ao local, Caio janta com o pai e
o espera adormecer, quando então subtrai da residência uma televisão de plasma, um aparelho
de som e dois mil reais. Após encontrar-se com Maria no veículo, ambos se evadem do local e
são presos quando chegavam ao município de São Paulo. Com base no relatado acima,
responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a
fundamentação legal pertinente ao caso.
A) Caio pode ser punido pela conduta praticada e provada? (Valor: 0,40)
B) Maria pode ser punida pela referida conduta? (Valor: 0,40)
C) Em caso de oferecimento de denúncia, qual será o juízo competente para
processamento da ação penal? (Valor: 0,20)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

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19) QUESTÃO 1 – XXI EXAME
Paulo e Júlio, colegas de faculdade, comemoravam juntos, na cidade de São Gonçalo, o título
obtido pelo clube de futebol para o qual o primeiro torce. Não obstante o clima de
confraternização, em determinado momento, surgiu um entrevero entre eles, tendo Júlio
desferido um tapa no rosto de Paulo. Apesar da pouca intensidade do golpe, Paulo vem a falecer
no hospital da cidade, tendo a perícia constatado que a morte decorreu de uma fatalidade,
porquanto, sem que fosse do conhecimento de qualquer pessoa, Paulo tinha uma lesão pretérita
em uma artéria, que foi violada com aquele tapa desferido por Júlio e causou sua morte. O órgão
do Ministério Público, em atuação exclusivamente perante o Tribunal do Júri da Comarca de São
Gonçalo, denunciou Júlio pelo crime de lesão corporal seguida de morte (Art. 129, § 3º, do CP).
Considerando a situação narrada e não havendo dúvidas em relação à questão fática, responda,
na condição de advogado(a) de Júlio:
A) É competente o juízo perante o qual Júlio foi denunciado? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual tese de direito material poderia ser alegada em favor de Júlio? Justifique. (Valor:
0.60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

20) QUESTÃO 4 – IX EXAME


Laura, empresária do ramo de festas e eventos, foi denunciada diretamente no Tribunal de
Justiça do Estado “X”, pela prática do delito descrito no Art. 333 do CP (corrupção ativa). Na
mesma inicial acusatória, o Procurador Geral de Justiça imputou a Lucas, Promotor de Justiça
estadual, a prática da conduta descrita no Art. 317 do CP (corrupção passiva). A defesa de Laura,
então, impetrou habeas corpus ao argumento de que estariam sendo violados os princípios do
juiz natural, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa; arguiu, ainda, que
estaria ocorrendo supressão de instância, o que não se poderia permitir. Nesse sentido,
considerando apenas os dados fornecidos, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir.
A) Os argumentos da defesa de Laura procedem? (Valor: 0,75)
B) Laura possui direito ao duplo grau de jurisdição? (Valor: 0,50)
Obs.: Não serão pontuadas respostas contraditórias.

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21) QUESTÃO 3 – IV EXAME
Na cidade de Arsenal, no Estado Z, residiam os deputados federais Armênio e Justino. Ambos
objetivavam matar Frederico, rico empresário que possuía valiosas informações contra eles.
Frederico morava na cidade de Tirol, no Estado K, mas seus familiares viviam em Arsenal.
Sabendo que Frederico estava visitando a família, Armênio e Justino decidiram colocar em
prática o plano de matá-lo. Para tanto, seguiram Frederico quando este saía da casa de seus
parentes e, utilizando-se do veículo em que estavam, bloquearam a passagem de Frederico, de
modo que a caminhonete deste não mais conseguia transitar. Ato contínuo, Armênio e Justino
desceram do automóvel. Armênio imobilizou Frederico e Justino desferiu tiros contra ele,
Frederico. Os algozes deixaram rapidamente o local, razão pela qual não puderam perceber que
Frederico ainda estava vivo, tendo conseguido salvar-se após socorro prestado por um passante.
Tudo foi noticiado à polícia, que instaurou o respectivo inquérito policial. No curso do inquérito,
os mandatos de Armênio e Justino chegaram ao fim, e eles não conseguiram se reeleger. O
Ministério Público, por sua vez, munido dos elementos de informação colhidos na fase inquisitiva,
ofereceu denúncia contra Armênio e Justino, por tentativa de homicídio, ao Tribunal do Júri da
Justiça Federal com jurisdição na comarca onde se deram os fatos, já que, à época, os agentes
eram deputados federais. Recebida a denúncia, as defesas de Armênio e Justino mostraram-se
conflitantes. Já na fase instrutória, Frederico teve seu depoimento requerido. A vítima foi ouvida
por meio de carta precatória em Tirol. Na respectiva audiência, os advogados de Armênio e
Justino não compareceram, de modo que juízo deprecado nomeou um único advogado para
ambos os réus. O juízo deprecante, ao final, emitiu decreto condenatório em face de Armênio e
Justino. Armênio, descontente com o patrono que o representava, destituiu-o e nomeou você
como novo advogado.
Com base no cenário acima, indique duas nulidades que podem ser arguidas em favor de
Armênio. Justifique com base no CPP e na CF. (Valor: 1,25)

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Iter criminis e tentativa

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 09/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

8.1 Iter criminis

Iter criminis significa literalmente “caminho do crime”. Trata-se do caminho percorrido pelo
agente para a prática da infração penal, passando pela ideação até chegar à consumação. Em
síntese, iter criminis é o conjunto de fases pelas quais passa o delito.

Compõe-se de uma fase interna, na qual o agente representa mentalmente a prática


delituosa, bem como de uma fase externa, em que o agente exterioriza a sua conduta, colocando
em prática a ideia criminosa, praticando atos preparatórios e executórios até alcançar a
consumação.

O iter criminis, pois, é composto pelas seguintes fases.

Atos
Cogitação Execução Consumação
preparatórios

• Fase interna: cogitação;


• Fase externa: atos preparatórios, execução e consumação.

Convém sinalar que o exaurimento não integra o iter criminis, já que ocorre após a
integralização da atividade criminosa. Constitui, na verdade, a atividade posterior à consumação
do delito, consistente, não raras vezes, no proveito da atividade criminosa, como se fosse uma
espécie de “plus”, podendo, ainda, constituir nos casos expressamente previstos em lei,
qualificadora ou causa de aumento de pena.

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Assim, o fato de o agente vender o bem móvel subtraído caracteriza o exaurimento do
crime de furto, já esgotado o iter criminis com o desapossamento do objeto. No crime de
corrupção passiva (CP, art. 317), o recebimento da vantagem indevida solicitada caracteriza o
exaurimento do crime, já que o crime se consumou com a solicitação de tal vantagem.

8.1.1 Cogitação

O primeiro momento do iter criminis é a chamada cogitatio. O agente idealiza internamente


a atividade criminosa. Elabora mentalmente a infração penal, delibera sobre o desenvolvimento
da conduta e, por fim, decide praticar a infração penal. Toda essa representação ainda se
encontra no plano interno do agente, ou seja, ainda não há exteriorização de nenhum ato.

É exatamente por isso que a fase da cogitação não é punível. De fato, como ainda está
no plano interno do agente, não há ainda qualquer violação a um bem jurídico, razão pela qual
não incidem as normas de Direito Penal.

Em outras palavras, na fase da cogitação não há falar em crime, nem mesmo na forma
tentada, já que, para tanto, deve haver, ao menos, o início da execução do delito para
caracterizar a infração penal.

8.1.2 Atos preparatórios

Os atos preparatórios consistem no conjunto de atos voltados a concretizar a infração


penal. O agente passa da cogitação para a exteriorização da sua atividade criminosa, buscando,
previamente ao início da execução, os elementos necessários para o desenvolvimento da
conduta delituosa. É a partir dos atos preparatórios que o agente começa a materializar, ou seja,
exteriorizar sua busca pela consumação da infração penal.

Para a prática do crime de homicídio, a aquisição de uma arma constitui mero ato
preparatório. Da mesma forma, o estudo do local do crime, buscando identificar a melhor hora e
forma de ingressar no ambiente, constitui atos preparatórios do crime de furto.

Os atos preparatórios, via de regra, não são puníveis, nem na forma tentada, uma vez
que, nos termos do art. 14, II, do CP, afigura-se necessário o início da execução do delito, com
a realização da conduta nuclear descrita no tipo penal. Em outras palavras, via de regra, não

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constituem crime. Nesse caso, se o agente for denunciado por fato que não passou dos atos
preparatórios, deve-se buscar a absolvição, pelo fato não constituir crime.

Todavia, em casos excepcionais, o legislador descreve atos que na sua concepção seriam
preparatórios como delitos autônomos. São os chamados crimes-obstáculo.

Nesses casos, o ato preparatório de um determinado delito é considerado pelo legislador


um crime autônomo e independente, tratando-o, na situação específica, como verdadeiro ato
executório.

A associação de três ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes, constitui
crime autônomo (CP, art. 288), ainda que nenhum crime seja praticado.

Da mesma forma, o legislador considera crime autônomo atos preparatórios para a prática
do crime de moeda falsa. De fato, nos termos do art. 291 do CP, constitui crime fabricar, adquirir,
fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou
qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda, ainda que nenhuma moeda
tenha sido falsificada.

O art. 5º da Lei no 13.260/2016 prevê conduta criminosa do agente que realizar atos
preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito, ainda que
nenhum ato executório seja realizado.

8.1.3 Execução

Idealizada a infração penal e após realizar os atos preparatórios, o agente passa à fase
de execução do delito, com a efetiva agressão ao bem jurídico tutelado.

O agente passa a desenvolver conduta voltada a realizar o verbo nuclear do tipo. A partir
dos atos executórios, o fato passa a ser punível, ao menos na forma tentada. Isso porque o
próprio art. 14, II, do CP, atrelou a tentativa ao início da execução do crime, condicionando sua
punibilidade ao início da prática de atos executórios.

O ato executório deve ser idôneo e inequívoco para alcançar o resultado.

Ato idôneo é aquele suficientemente apto a atingir um bem jurídico penalmente tutelado,
considerando as circunstâncias do caso concreto.

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Ato inequívoco é aquele que confere a certeza necessária do plano concreto do agente
no sentido de consumar a infração penal.

Exemplo: Adquirir um revólver para matar a vítima é apenas a preparação do crime de


homicídio. Agora, desferir o primeiro disparo em direção à vítima já constitui ato executório, já
que o agente revelou conduta idônea e inequívoca em busca da consumação do delito.

8.1.4 Consumação

Nos termos do art. 14, I, do CP, diz-se que o crime é consumado “quando nele se reúnem
todos os elementos de sua definição legal”. É o tipo penal integralmente realizado, ou seja,
quando o fato praticado pelo agente se enquadra plenamente no tipo penal abstrato.

É o elemento culminante do iter criminis.

É o momento de conclusão do delito, reunindo todos os elementos que integram o tipo


penal. Trata-se do crime perfeito ou completo, já que a conduta do agente atingiu a plenitude,
culminando na concretização dos elementos que definem o tipo penal.

Assim, quando o agente efetua disparo de arma de fogo contra a vítima, matando-a, terá
consumado o delito de homicídio, pois integralizou todos os elementos que compõem sua
definição legal, consistente em “matar alguém”.

Todavia, a definição de crime consumado revela uma complexidade maior do que o texto
legal aparenta. Isso porque, dependendo da classificação doutrinária e das características
próprias, as infrações penais podem ter um momento consumativo diverso. Em síntese, nem
todas as infrações penais possuem o mesmo momento consumativo.

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8.2 Da tentativa

8.2.1 Conceito

Nos termos do art. 14, II, do CP, tentativa se caracteriza pelo início da execução de um
crime, que não alcança a consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Para caracterizar ao menos crime tentado, afigura-se imprescindível que o agente tenha
superado a fase dos atos preparatórios e dado início à execução do delito, que, por razões
alheias à sua vontade, não atinge a consumação.

8.2.2 Natureza jurídica

Não há, como regra, no Código Penal e legislação penal extravagante descrição, de forma
isolada, da modalidade tentada de cada crime. Não há, por exemplo, tipo penal específico
descrevendo a conduta “tentar matar”, não sendo possível, pois, estabelecer a adequação típica
direta da conduta que não alcançou a consumação a um tipo penal específico. E o art. 14, II, do

106
CP estabelece essa ponte ou ligação entre a conduta do agente que não conseguiu alcançar a
consumação do delito e o tipo penal que define a conduta penalmente proibida.

O art. 14, II, do CP não incide por si só, sendo necessário o início da realização de uma
conduta descrita no tipo penal incriminador. Logo, para existir a figura do crime na modalidade
tentada é necessário a junção entre o tipo penal incriminador e o disposto no art. 14, II, do CP.

O art. 121 do CP, por exemplo, descreve a conduta “matar alguém”, não definindo, pois,
a modalidade tentada do delito de homicídio. Para que o ato executório anterior à consumação
seja punido, afigura-se indispensável a combinação com o art. 14, II, do CP.

Assim, a tipificação do crime de homicídio simples tentado pode ser estabelecida da


seguinte forma: art. 121, caput, c/c art. 14, II, ambos do CP.

Sem a combinação com a norma penal que prevê a tentativa, a conduta decorrente do
homicídio tentado seria atípica, por força do princípio da reserva legal.

Por essa razão, a tentativa constitui ampliação temporal da figura típica, sendo um dos
casos de adequação típica de subordinação mediata. Isso porque a utilização da norma de
extensão prevista no art. 14, II, do CP permite ampliar o alcance do tipo penal para alcançar atos
executórios praticados antes da consumação do delito.

Trata-se, pois, de uma norma de extensão entre a conduta do agente e o tipo penal
incriminador, ampliando o alcance da norma penal que descreve o modelo legal de conduta
proibida.

8.2.3 Elementos da tentativa

A tentativa se reveste de todos os elementos do crime desejado, exceto a consumação.

São três os elementos da tentativa: a) Elemento subjetivo (dolo da consumação); b) início


da execução do crime; c) não consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente.

a) Elemento subjetivo

O elemento subjetivo do crime tentado é rigorosamente o mesmo do crime consumado.


Ou seja, o dolo do agente que não alcançou o resultado por circunstâncias alheias à sua vontade
é, por evidente, o mesmo do crime consumado.

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O próprio artigo 14, inciso II, do Código Penal faz expressa referência à vontade do agente,
permitindo a conclusão de que o agente agiu com consciência e vontade de alcançar o resultado,
mas, por circunstâncias alheias à sua vontade, não conseguiu.

Note-se que não há propriamente dolo específico da tentativa, ou seja, dolo de tentar
consumar o delito. O dolo do crime tentado é o mesmo do crime consumado, que contra a
vontade do agente não foi alcançado. Assim, o dolo daquele que tentou furtar é rigorosamente o
mesmo do crime de furto na sua forma consumada.

b) Início da execução do crime

O início da execução é invariavelmente constituído de atos que principiem a concretização


do tipo penal.

Exige-se a existência de uma ação que penetre na fase executória do crime. Uma
atividade que se dirija no sentido da realização de um tipo penal.

A tentativa somente é punível a partir do momento em que a ação ingresse na fase de


execução. Só então se pode precisar a direção do atuar voluntário do agente no sentido de
determinado tipo penal.

Enquanto o agente não ingressar nos atos executórias, haverá apenas atos preparatórios,
que, como regra, não constituem crime.

c) Não consumação do crime por circunstâncias alheias à vontade do agente

Após o início da execução do delito, a consumação poderá não ocorrer por circunstâncias
próprias à vontade do agente ou por circunstâncias alheias à sua vontade.

Quando a conduta do agente não atinge a consumação por sua própria vontade, estar-se-
á diante da desistência voluntária ou arrependimento eficaz, previstos no art. 15 do CP.

De outro lado, quando o agente não alcança a consumação por circunstâncias alheias à
sua vontade, configura o crime na modalidade tentada. Imaginemos que o agente tenha
ingressado no domicílio e, no momento em que iria se apossar do objeto, o alarme é acionado,
motivo pelo qual empreende fuga sem nada levar. O acionamento do alarme constitui a
circunstância alheia à vontade do agente, razão pela qual estará configurada a tentativa de furto.

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8.2.4 Punibilidade da tentativa

O critério de diminuição de um a dois terços leva em conta o iter criminis percorrido pelo
agente. Quanto mais o sujeito se aproxima da consumação, menor deve ser a diminuição da
pena (mais próximo a um terço); quanto menos ele se aproxima da consumação, maior deve ser
a redução (mais próximo a dois terços).

Com efeito, o CP, em seu art. 14, II, adotou a teoria objetiva quanto à punibilidade da
tentativa, pois, malgrado semelhança subjetiva com o crime consumado, diferencia a pena
aplicável ao agente doloso de acordo com o perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. Nessa
perspectiva, a jurisprudência do STJ reconhece o critério de diminuição do crime tentado de
forma inversamente proporcional à aproximação do resultado representado: quanto maior o iter
criminis percorrido pelo agente, menor será a fração da causa de diminuição (STJ, HC no
596624/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 25-8-2020.).

Na peça, sempre buscar a redução pela tentativa na sua fração que mais diminua a pena,
ou seja, em 2/3.

8.2.5 Infrações penais que não admitem tentativa

A regra é a admissibilidade de crime também na sua modalidade tentada. Todavia, há


infrações penais incompatíveis com a tentativa, ou seja, que não incidem na modalidade tentada.
Ou existem na modalidade consumada, ou constituem fato atípico.

Dentre as infrações penais incompatíveis com a tentativa, destacam-se as seguintes:

a) Crime culposo: ocorre quando existe uma conduta negligente e involuntária do agente,
sem querer produzir um resultado. Não se pode tentar aquilo que não se tem vontade livre e
consciente, ou seja, sem que haja dolo.

Exemplo: O condutor de um veículo, de forma imprudente, atropela uma pessoa. Essa


pessoa vem a sobreviver as lesões sofridas. Será aplicado o delito de lesão corporal culposa na
direção de veículo automotor (art. 303, da Lei 9.503/97), e não o crime de tentativa de homicídio
culposo na condução de veículo automotor.

b) Contravenção penal (art. 4ª, do Decreto-Lei 3.688/41): é expresso na legislação que


não é punível a forma tentada.

109
c) Crimes omissivos próprios: ocorre quando o sujeito será responsabilizado por uma
conduta omissiva. Ao deixar de agir quando deveria, o crime é consumado.

Exemplo: Um sujeito vê uma pessoa ferida necessitando de ajuda e não presta


assistência. Nesse caso, o crime de omissão de socorro estará consumado (CP, art. 135). Se o
agente prestasse assistência, não haveria crime.

d) Crimes unissubsistentes: ocorre quando praticado um único ato, como, por exemplo,
na injúria verbal (art. 140 CP).

Exemplo: Proferir a expressão “corno” para alguém. Está consumado o delito de injúria.

110
Desistência voluntária e arrependimento eficaz

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9.1 Introdução

A desistência voluntária e o arrependimento eficaz estão previstos no art. 15 do CP,


segundo o qual “O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede
que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados”.

A desistência voluntária e o arrependimento eficaz constituem espécie de tentativa


abandonada, uma vez que, após dar início à execução do delito, o agente não alcança a
consumação por vontade própria, seja interrompendo os atos executórios, seja desenvolvendo
postura ativa para impedir o resultado.

Eis a fundamental diferença em relação à tentativa: enquanto na tentativa há início da


execução do delito e não consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente, na
desistência voluntária e arrependimento eficaz a consumação não ocorre por vontade do próprio
agente.

Em outras palavras, a tentativa e a desistência voluntária ou arrependimento eficaz são


institutos absolutamente incompatíveis. Se reconhecido o crime tentado, afasta-se a
possibilidade de desistência voluntária e arrependimento eficaz; se reconhecida a desistência
voluntária ou arrependimento eficaz, afastada estará a possibilidade do reconhecimento do crime
na modalidade tentada.

9.2 Desistência voluntária

Na desistência voluntária, o agente dá início à execução do delito, mas, de modo


voluntário, antes mesmo de esgotar os meios que tinha à sua disposição, interrompe os atos
executórios, não alcançando a consumação por vontade própria.

111
A desistência voluntária se caracteriza por um comportamento negativo do agente, que,
após dar início à execução do delito, adota uma postura de abstenção, deixando, mesmo tendo
a possibilidade, de prosseguir na execução do delito.

Em outras palavras, iniciada a execução, o autor do ilícito, antes de esgotar os atos


executórios, resolve, voluntariamente, não seguir adiante no comportamento delituoso.

Tomemos como exemplo a conduta do agente que, com a intenção homicida, desfere
um disparo de arma de fogo contra a vítima, acertando-a em região não letal. Podendo
prosseguir, já que tinha mais cinco balas no revólver, o agente resolve, por vontade própria,
não efetuar mais disparos, deixando a vítima sobreviver.

Indubitável que o agente deu início à execução do delito, mas não consumou o homicídio
por vontade própria, já que adotou uma postura de abstenção, cessando a atividade executória
antes de esgotar todos os meios que tinha à sua disposição. Trata-se, pois, de desistência
voluntária, devendo o agente responder pelas lesões corporais causadas.

Outro exemplo: Wilson decide matar Pedro, e, para tanto, desfere uma facada em sua
perna quando os dois estavam sozinhos. Durante a execução do delito, apesar de saber que
aquela facada ainda não seria suficiente para causar a morte de Pedro, opta por não mais
seguir na empreitada criminosa, pensando no sofrimento dos familiares da vítima. Deixa,
então, o local do crime, vindo Pedro a ficar, em razão do ferimento causado pelo golpe,
impossibilitado de exercer suas atividades habituais por 40 dias. Wilson não responderá por
tentativa de homicídio, mas pelo crime de lesão corporal grave (CP, art. 129, § 1º, I).

Da mesma forma, incidirá a desistência voluntária na hipótese do agente que, após


ingressar em residência alheia para o cometimento do furto, resolver adotar uma postura de
abstenção, deixando voluntariamente o local sem nada subtrair. Trata-se de evidente hipótese
de desistência voluntária, pois, embora tenha dado início à execução do furto, o agente, por
vontade própria, cessou a atividade executória antes de esgotar sua potencialidade lesiva. Nesse

112
caso, o agente responderá pelo crime de violação de domicílio (CP, art. 150), e não por tentativa
de furto.

Ainda, consideremos a hipótese de o agente se deslocar até a Delegacia de Polícia, com


o intuito de imputar a alguém a prática de determinado delito, sabendo ser inocente. Se o agente
desistir de prosseguir na execução do delito, interrompendo, por exemplo, voluntariamente o seu
depoimento, estaremos diante da desistência voluntária. Nesse caso, se ainda não imputou
qualquer fato definido como crime, desistindo de prosseguir na ideia de dar causa à instauração
de inquérito policial, mesmo sabendo ser a vítima inocente, não restará qualquer delito, já que
os atos até então praticados não constituem infração penal.

9.3 Arrependimento eficaz

No arrependimento eficaz, o agente, após ter esgotado todos os meios à sua disposição
para a consumação do delito, arrepende-se e, adotando uma postura ativa, impede que o
resultado se produza.

Diversamente do que ocorre na desistência voluntária, o arrependimento eficaz se


caracteriza pelo fato de o agente, após esgotar os meios executórios, desenvolver uma nova
atividade, a fim de evitar a consumação do delito.

O agente esgota sua potencialidade lesiva, faz tudo que está ao seu alcance para
consumar o delito, mas antes de alcançar o resultado inicialmente desejado, arrepende-se e
adota um comportamento ativo para evitar a sua consumação.

Em outras palavras, o arrependimento eficaz se dá após a execução, mas antes da


consumação do crime.

Tomemos como exemplo o agente que, com a intenção homicida, após efetuar disparos
de arma de fogo contra a vítima utilizando todas as balas do revólver, arrepende-se e,
adotando postura ativa, leva a vítima até o hospital, que, submetida a intervenção cirúrgica
exitosa, acaba sobrevivendo, embora tenha ficado gravemente ferida. Nesse caso, o agente
não responderá pelo crime de tentativa de homicídio, mas por lesão corporal grave.

113
Da mesma forma, agente que, com a intenção homicida, coloca veneno na bebida da
vítima, mas, arrependido, desenvolve nova atividade entregando-lhe o antídoto, evitando, assim,
a morte, embora tenha resultado lesão à sua saúde. Nesse caso, o agente não responderá pelo
crime de tentativa de homicídio, mas por lesão corporal (leve, grave ou gravíssima, conforme o
caso).

Com a intenção de praticar um golpe, Wilson pagou diversos produtos comprados em


determinada loja emitindo cheque sem provisão de fundos. Antes da data do vencimento do
desconto do título de crédito, Wilson, arrependido, retornou à loja e trocou o cheque por dinheiro
em espécie, tendo quitado o débito integralmente, evitando a consumação do delito de
estelionato por meio de pagamento de cheque sem provisão de fundos, já que não houve ob-
tenção de vantagem indevida em prejuízo da vítima. Nesse caso, o agente não responderá pelo
crime de tentativa de estelionato, sendo o fato atípico, já que os atos anteriores não constituem
crime.

Em síntese, a desistência voluntária consiste na interrupção da execução de um crime


após o agente tê-la iniciado, enquanto o arrependimento eficaz consiste na ação do agente para
impedir que o resultado do crime ocorra depois de estar bem mais próximo de todo o processo
executório da infração ou tê-lo percorrido integralmente.

9.4 Requisitos

A desistência voluntária e o arrependimento eficaz exigem a presença dos seguintes


requisitos: voluntariedade e eficácia.

a) Voluntariedade

A desistência voluntária e o arrependimento eficaz devem decorrer de atos voluntários,


livres de coação física ou moral, ainda que não sejam espontâneos.

De fato, não se afigura necessária a espontaneidade do ato de desistir ou se arrepender.


Ou seja, não se exige que a ideia de interromper os atos executórios ou de se arrepender tenha
se originado na mente do agente. Haverá, pois, desistência voluntária e arrependimento eficaz
se o agente não consumou o delito influenciado por terceira pessoa.

114
Exemplo: Durante uma discussão, Wilson, inimigo declarado de Dudu, seu cunhado,
golpeou a barriga de seu rival com uma faca, com intenção de matá-lo. Ocorre que, após o
primeiro golpe, a pedido da sua irmã, Wilson percebeu a incorreção de seus atos e optou por
não mais continuar golpeando Dudu, apesar de saber que aquela única facada não seria
suficiente para matá-lo. Neste caso, Wilson não desistiu de prosseguir nos atos executórios
de forma espontânea, mas a pedido de sua irmã, esposa da vítima. Embora não espontânea,
a desistência foi voluntária, porque livre de coação física ou moral.

Da mesma forma, se o agente, após ingressar na residência da vítima, deixou de


consumar o delito de furto, abstendo-se de prosseguir nos atos executórios por força de intensa
dor decorrente de infecção dentária, haverá desistência voluntária, embora não espontânea.

Não importa a natureza do motivo que levou o agente a desistir de prosseguir na


empreitada delituosa ou do seu arrependimento. Pode desistir ou arrepender-se por medo,
piedade, decepção com a vantagem do crime, remorso, repugnância pela sua própria conduta,
ou por qualquer outra razão.

Exemplo: Wilson tem um desafeto a quem sempre faz ameaças de morte. O último
encontro foi num bar. Portando um revólver carregado com seis munições, Wilson aproveitou
para concretizar o desejo de matar seu oponente. Anunciou que iria matar seu desafeto e
efetuou um disparo na sua perna. Neste momento, o desafeto suplica por sua vida. Wilson,
sensível ao apelo da vítima, desiste de continuar disparando, afirma que não iria mais matar
o rival e se retira do local. No caso, Wilson deixou de prosseguir na empreitada delituosa por
piedade da vítima, caracterizando ainda assim a desistência voluntária.

Em síntese, é irrelevante que o agente proceda por indulgência, comiseração, ou por


motivos subalternos, egoísticos, desde que não tenha sido obstado por causas exteriores
independentes de sua vontade.

115
b) Eficácia

Para que incidam os efeitos da desistência voluntária ou arrependimento eficaz, afigura-


se imprescindível que não ocorra a consumação do delito. Ou seja, a conduta do agente,
abstendo-se de prosseguir na empreitada delituosa, ou adotando postura para impedir o
resultado, deve ser apta e eficaz para evitar a consumação do delito.

Se, conquanto tenha buscado evitar a produção do resultado, o crime alcançou a


consumação, o agente responderá pelo delito desejado na sua forma consumada, já que a
desistência ou arrependimento não foi eficaz.

Imaginemos que Wilson, desejando matar João, efetua vários disparos contra a vítima,
atingindo-a na região torácica. Arrependido, decide socorrer João, que, levado ao hospital, não
resistiu aos ferimentos e acabou falecendo. Como o arrependimento não foi eficaz, uma vez que
o resultado ocorreu, Wilson responderá pelo crime de homicídio consumado.

Consideremos, ainda, a hipótese de agente desferir um disparo de arma de fogo contra a


vítima, acertando-a na região torácica, mas desiste de prosseguir na execução do delito, mesmo
tendo mais munição no revólver. A vítima é socorrida por populares e encaminhada ao hospital,
mas não resiste aos ferimentos e acaba falecendo. Nesse caso, a desistência voluntária não foi
eficaz, respondendo o agente pelo crime de homicídio consumado, ainda que tenha abandonado
a empreitada delituosa.

9.5 Consequência

Nos termos da parte final do art. 15 do CP, verificada hipótese de desistência voluntária
ou arrependimento eficaz, não é possível imputação do crime na modalidade tentada, já que,
como visto, há exclusão da tipicidade do crime inicialmente desejado, respondendo o agente
pelos atos até então praticados, se típicos.

Em outras palavras, jamais poderá ser atribuída tentativa de crime no contexto de


desistência voluntária ou arrependimento eficaz. Isso porque a desistência voluntária e o
arrependimento eficaz retiram a tipicidade dos atos somente em relação ao crime cuja execução
o agente iniciou, mas não consumou por vontade própria, respondendo, contudo, pelos atos
praticados.

116
Assim, no exemplo do agente que, com a intenção homicida, desfere um disparo de arma
de fogo contra a vítima, acertando-a em região não letal, mas resolve, por vontade própria, não
efetuar mais disparos, deixando a vítima sobreviver, não haverá tentativa de homicídio, devendo
o agente responder pelos atos até então praticados, quais sejam, lesões corporais leves, graves
ou gravíssimas, conforme o caso.

Na hipótese do agente que, após ingressar em residência alheia para o cometimento do


furto, resolveu interromper os atos executórios, deixando voluntariamente o local sem nada
subtrair, não haverá tentativa de furto, mas crime de violação do domicílio (CP, art. 150), atos
até então praticados.

Ainda, no exemplo do agente que se desloca até a Delegacia de Polícia, com o intuito de
imputar a alguém a prática de determinado delito, sabendo ser inocente, interrompendo
voluntariamente o seu depoimento, não haverá tentativa de denunciação caluniosa (CP, art.
339). Se ainda não imputou qualquer fato definido como crime, desistindo de prosseguir na ideia
de dar causa à instauração de inquérito policial, não restará qualquer delito, já que os atos até
então praticados não constituem infração penal.

O agente que, com a intenção homicida, após efetuar disparos de arma de fogo contra a
vítima utilizando todas as balas do revólver, arrepende-se e, adotando postura ativa, leva a vítima
até o hospital, que, submetida a intervenção cirúrgica exitosa, acaba sobrevivendo, embora
tenha ficado gravemente ferida, não responderá pela tentativa de homicídio, mas pelo crime de
lesão corporal grave.

117
Como dito, o agente somente responderá pelos atos até então praticados se constituírem
infração penal. Assim, se os fatos inicialmente praticados não se revestirem de tipicidade, o
agente não responderá por qualquer delito, já que os fatos anteriores à desistência voluntária ou
arrependimento eficaz não constituem crime.

Exemplo: Wilson, com a intenção de obter vantagem indevida em prejuízo alheio, adquiriu
diversos produtos, emitindo, como forma de pagamento, cheque sem provisão de fundos.
Arrependido, retornou à loja antes da data prevista para o desconto da cártula e a trocou por
dinheiro em espécie, quitando integralmente o débito, evitando, assim, a consumação do delito
de estelionato por meio de pagamento de cheque sem provisão de fundos, já que não houve
obtenção de vantagem indevida em prejuízo da vítima. No caso, diante do arrependimento eficaz,
o agente não responderá pelo crime de estelionato inicialmente desejado, nem mesmo na forma
tentada, devendo responder pelos atos até então praticados. Como, no caso, os atos anteriores
não se enquadram em qualquer modelo legal de conduta proibida, o fato será atípico, não sendo
o agente responsabilizado por crime algum.

Imaginemos outro exemplo: Wilson, pretendendo praticar crime de peculato, em


determinada noite, ingressa em repartição pública se valendo da senha de acesso que possuía
em razão do cargo, com o objetivo de subtrair um computador da repartição. Enquanto se dirigia
até a sala onde estava o computador, reflete sobre as consequências da sua conduta e a
decepção que poderia causar à sua família, razão pela qual deixa o local sem nada subtrair.
Nesse caso, Wilson deu início à execução do crime de peculato, mas, por vontade própria, não
consumou o delito, devendo, por isso, responder pelos atos até então praticados. Como os atos
praticados não configuram conduta típica, Wilson não será responsabilizado criminalmente.

118
DICA MISSIONEIRA

A desistência voluntária e o arrependimento eficaz excluem a tipicidade da tentativa.


Assim, nesses casos jamais o agente responderá pelo crime tentado, mas somente pelos
atos até então praticados, se constituírem fato típico.
Desistência voluntária e arrependimento eficaz: não consumação do delito por força
de conduta voluntária.
Tentativa: não consumação do delito por circunstâncias alheias à vontade do agente.
Logo, são institutos incompatíveis

119
9.6 Questões sobre Desistência voluntária e arrependimento eficaz

22) QUESTÃO 3 – XII EXAME


Félix, objetivando matar Paola, tenta desferir-lhe diversas facadas, sem, no entanto, acertar
nenhuma. Ainda na tentativa de atingir a vítima, que continua a esquivar-se dos golpes, Félix,
aproveitando-se do fato de que conseguiu segurar Paola pela manga da camisa, empunha a
arma. No momento, então, que Félix movimenta seu braço para dar o golpe derradeiro, já quase
atingindo o corpo da vítima com a faca, ele opta por não continuar e, em seguida, solta Paola,
que sai correndo sem ter sofrido sequer um arranhão, apesar do susto.
Nesse sentido, com base apenas nos dados fornecidos, poderá Félix ser responsabilizado
por tentativa de homicídio? Justifique. (Valor: 1,25)
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

23) QUESTÃO 2 – IX EXAME


Wilson, extremamente embriagado, discute com seu amigo Junior na calçada de um bar já vazio
pelo avançado da hora. A discussão torna-se acalorada e, com intenção de matar, Wilson desfere
quinze facadas em Junior, todas na altura do abdômen. Todavia, ao ver o amigo gritando de dor
e esvaindo-se em sangue, Wilson, desesperado, pega um taxi para levar Junior ao hospital. Lá
chegando, o socorro é eficiente e Junior consegue recuperar-se das graves lesões sofridas.
Analise o caso narrado e, com base apenas nas informações dadas, responda,
fundamentadamente, aos itens a seguir.
A) É cabível responsabilizar Wilson por tentativa de homicídio? (Valor: 0,65)
B) Caso Junior, mesmo tendo sido socorrido, não se recuperasse das lesões e viesse a
falecer no dia seguinte aos fatos, qual seria a responsabilidade jurídico-penal de Wilson?
(Valor: 0,60)
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

120
Arrependimento posterior

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10.1 Conceito

Trata-se de causa obrigatória de diminuição da pena que incide quando o agente,


responsável pelo crime praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa, repara o dano
provocado ou restitui a coisa, desde que por ato voluntário do agente, até o recebimento da
denúncia ou da queixa.

Difere do arrependimento eficaz, porque o arrependimento é manifestado após a


consumação do delito até o recebimento da denúncia. Por isso, chama-se arrependimento
posterior.

10.2 Requisitos

a) Crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa

Nos termos do artigo 16 do Código Penal, cabe arrependimento posterior nos crimes
praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa.

Não se restringe aos crimes contra o patrimônio, podendo ser aplicado a qualquer delito
compatível com a reparação do dano decorrente da conduta do agente. Por isso, entende-se,
por exemplo, possível a aplicação do arrependimento posterior no peculato doloso (CP, art. 312).

Se a reparação do dano ou restituição da coisa foi realizada no contexto de crime praticado


com violência ou grave ameaça, como o roubo, por exemplo, não incidirá o arrependimento
posterior, podendo incidir a atenuante genérica prevista no art. 65, III, b, do CP.

121
b) Reparação do dano ou restituição da coisa

A reparação do dano ou restituição da coisa deve ser voluntária, pessoal e integral.

A reparação do dano ou restituição da coisa deve ser realizada de modo voluntário. Não
é necessário que seja espontâneo. Logo, pode ser por meio de conselho ou sugestão de terceiro,
uma vez que o ato, embora não espontâneo, foi voluntário (aceitou o conselho ou sugestão
porque quis).

A reparação do dano ou restituição da coisa deve ser sempre integral, podendo, no


entanto, ser parcial mediante concordância da vítima. A recusa do ofendido em aceitar a
reparação do dano ou restituição da coisa não impede a redução da pena pelo arrependimento
posterior.

c) Até o recebimento da denúncia ou queixa

A reparação do dano ou restituição da coisa deve ser realizada até o recebimento da


denúncia ou queixa. Trata-se de um limite temporal.

Se a reparação do dano ou restituição da coisa ocorrer depois do recebimento da


denúncia, incide a atenuante genérica prevista no artigo 65, inciso III, “b”, do Código Penal.

O quadro abaixo ilustra os momentos de incidência dos institutos da desistência


voluntária, arrependimento eficaz, arrependimento posterior e atenuante genérica.

Durante a Esgotada a Consumação Recebimento


execução execução da denúncia ou
queixa

• Desistência • Arrependimento • Arrependimento • Atenuante


volunária eficaz posterior genérica do
art. 65, III, b,
do CP

Assim, se o agente subtraiu uma TV do seu local de trabalho e, ao chegar em casa com
a coisa subtraída, é convencido pela esposa a devolvê-la, o que efetivamente vem a fazer no dia
seguinte, mesmo quando o fato já havia sido registrado na delegacia, haverá arrependimento
posterior, com reflexo na dosimetria da pena.

122
10.3 Critério para redução da pena

O arrependimento posterior constitui causa de diminuição da pena, devendo ser


observado o patamar de 1/3 a 2/3.

O juiz, para definir o quantum da redução, deve considerar a celeridade da reparação do


dano ou restituição da coisa, bem como o grau de voluntariedade do agente. Quanto mais célere
e sincera a reparação do dano ou restituição da coisa, maior será a redução da pena; quanto
mais distante do fato a reparação do dano ou restituição da coisa e menos sincera, menor será
a redução da pena.

10.4 Reparação do dano ou restituição da coisa em situações


específicas

a) Peculato culposo

Nos termos do artigo 312, § 3º, do Código Penal, no caso do peculato culposo, se anterior
à sentença transitada em julgado, a reparação é causa de extinção da punibilidade; se a
reparação do dano for posterior à sentença irrecorrível, incide causa de diminuição da pena até
metade da pena imposta.

Se o peculato for doloso, não há extinção da punibilidade. A reparação antes do


recebimento da denúncia enseja a incidência do arrependimento posterior, tendo como
consequência a diminuição da pena de 1/3 a 2/3, nos termos do artigo 16 do Código Penal. Se
a reparação do dano ocorrer após o recebimento da denúncia, incide a atenuante genérica do
artigo 65, inciso III, “b”, do Código Penal.

b) Estelionato mediante emissão de cheque sem fundos

No caso da emissão de cheque sem suficiente provisão de fundos, a reparação do dano


até o recebimento da denúncia impede o prosseguimento da ação penal, adotando-se uma
interpretação a contrario sensu da Súmula 554 do Supremo Tribunal Federal.

Nesse caso, segundo a doutrina, haveria uma causa supralegal de extinção da


punibilidade, porque o delito de estelionato exige como pressuposto necessário à sua
consumação o efetivo prejuízo da vítima.

123
10.5 Questões sobre arrependimento posterior

24) QUESTÃO 1 – XXXI EXAME – 2020-03


Após receber informações de que teria ocorrido subtração de valores públicos por funcionários
públicos no exercício da função, inclusive com vídeo das câmeras de segurança da repartição
registrando o ocorrido, o Ministério Público ofereceu, sem prévio inquérito policial, uma única
denúncia em face de Luciano e Gilberto, em razão da conexão, pela suposta prática do crime de
peculato, sendo que, ao primeiro, foi imputada conduta dolosa e, ao segundo, conduta culposa.
De acordo com a denúncia, Gilberto, funcionário público, com violação do dever de cuidado, teria
contribuído para a subtração de R$ 2.000,00 de repartição pública por parte de Luciano, que
teria tido sua conduta facilitada pelo cargo público que exercia. Diante da reincidência de
Gilberto, já condenado definitivamente por roubo, não foram à ele oferecidos os institutos

124
despenalizadores. O magistrado, de imediato, sem manifestação das partes, recebeu a denúncia
e designou audiência de instrução e julgamento. No dia anterior à audiência, Gilberto ressarciu
a Administração do prejuízo causado. Com a juntada de tal comprovação, após a audiência,
foram os autos encaminhados às partes para apresentação de alegações finais. O Ministério
Público, diante da confirmação dos fatos, requereu a condenação dos réus nos termos da
denúncia. Insatisfeito com a assistência técnica que recebia, Gilberto procura você para, na
condição de advogado(a), assumir a causa e apresentar memoriais. Com base nas informações
expostas, responda, como advogado(a) contratado por Gilberto, aos itens a seguir.
A) Existe argumento de direito material a ser apresentado em favor de Gilberto para evitar
sua condenação? (Valor: 0,60)
B) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado em memoriais para
questionar toda a instrução produzida? (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

125
Conflito aparente de normas

Prof. Nidal Ahmad


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11.1. Introdução

O conflito aparente de normas se revela quando se tem a percepção da incidência, em


tese, de duas ou mais normas em vigor sobre determinado fato. Neste caso, surge o que se
denomina conflito aparente de normas penais, também chamado concurso aparente de normas,
concurso aparente de normas coexistentes, concurso ideal impróprio e concurso impróprio de
normas.
Há um fato, em tese, punível, mas que sobre ele podem incidir, aparentemente, duas ou
mais normas penais. Todavia, tendo em vista ser vedada a incidência de mais de uma norma
penal sobre fato único, apenas uma das normas possíveis deverá ser aplicada ao caso concreto.
Assim, no conflito aparente de normas, há a presença dos seguintes elementos: a)
unidade do fato (há somente uma infração penal); b) pluralidade de normas (duas ou mais
normas pretendendo regulá-lo); c) todas as normas em vigor, com a incidência de apenas uma
delas sobre o fato.
Imaginemos o caso de uma mãe matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho,
logo após o parto. Há um único fato sobre o qual, aparentemente, pode incidir o crime de
homicídio, previsto no art. 121 do CP, ou infanticídio, previsto no art. 123 do CP. Eis o conflito de
normas estabelecido, já que apenas uma delas deverá incidir sobre o fato.
A solução do conflito aparente de normas ganha especial importância sobretudo para
evitar o bis in idem, já que não se admite no nosso ordenamento jurídico dupla punição pelo
mesmo fato. Ou seja, não se mostra possível punir a mãe pelo crime de homicídio e de
infanticídio, devendo, no caso, incidir apenas uma dessas normas.
O conflito de normas é aparente, pois será sanado com a aplicação do princípio adequado
ao caso. Em outras palavras, o conflito que se estabelece entre as normas é apenas aparente,
porque, na realidade, somente uma delas acaba regulamentando o fato, ficando afastadas as
demais.

126
11.2. Conflito aparente de normas x concurso de crimes

No conflito aparente de normas há um único fato, retratado por única conduta, devendo
sobre ela incidir apenas uma das normas vigentes. No concurso de crimes há pluralidade de
condutas, ensejando a incidência de dois ou mais fatos delituosos. Nesse caso de pluralidade
de crimes, evidentemente será possível a aplicação de mais de uma norma penal, uma para
cada fato praticado, resultando na soma ou exasperação da pena final.
O conflito aparente de normas não encontra previsão expressa no ordenamento jurídico,
sendo suas bases construídas pela doutrina e jurisprudência. Já as regras do concurso de crimes
estão expressamente previstas no Código Penal, mais especificamente nos arts. 69 a 72 do
referido diploma legal.

11.3. Princípios para dirimir o conflito aparente de normas

Diante da ausência de expressa previsão legal de regras voltadas a dirimir o conflito


aparente de normas, a doutrina aponta quatro princípios para solucionar tal conflito: a)
especialidade; b) subsidiariedade; c) consunção; e d) alternatividade.

11.3.1. Princípio da especialidade

Trata-se da aplicação da regra de que a lei especial afasta a aplicação da lei geral.
A lei especial, ou específica, caracteriza-se por se revestir de sentido diferenciado,
individualizado, que a particulariza em relação às demais normas. Dito de outro modo, além de
reunir todos os elementos que integram a lei geral, a lei especial contém outros que a torna
específica, que a particulariza, chamados elementos especializantes.
E, nos termos do art. 12 do CP, a lei especial prevalece sobre a lei geral.
Tomemos, novamente, como exemplo o caso de uma mãe matar, sob influência do estado
puerperal, o próprio filho, durante ou logo após o parto. Há um único fato sobre o qual,
aparentemente, pode incidir o crime de homicídio, previsto no art. 121 do CP, ou infanticídio,
previsto no art. 123 do CP. O crime de infanticídio possui núcleo idêntico ao do crime de
homicídio, ou seja, reúne todos os elementos descritos no art. 121 do CP, consistentes em “matar
alguém”. Todavia, além dos elementos da norma geral, prevista no art. 121 do CP, o art. 123 do
CP contém elementos que o especializa e o diferencia do crime de homicídio, quais sejam: autora

127
do fato ser a própria genitora da vítima; vítima nascente ou neonato; crime praticado sob
influência do estado puerperal.
Note-se que se estabeleceu um conflito entre as normas dos arts. 121 e 123 do CP, mas
que é aparente, pois será solucionado pelo princípio da especialidade, prevalecendo, no caso, a
norma penal que define o crime de infanticídio, já que as elementares contidas neste crime o
torna especial em relação à norma geral que define o homicídio.
As normas genéricas e as específicas não exigem que estejam presentes no mesmo
diploma legal, podendo estar previstas em leis distintas. Ou seja, não se afigura necessário que
a norma geral e a especial estejam previstas no Código Penal, por exemplo. É possível, portanto,
que a norma geral esteja prevista no Código Penal e a especial em legislação extravagante.
É o que ocorre, por exemplo, entre os crimes de contrabando, previsto no art. 334-A do
CP, e o crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei no 11.343/2006. Sobre a
conduta de importar cocaína pode, aparentemente, incidir duas normas: a que define o crime de
contrabando e a que prevê o crime de tráfico de drogas. Todavia, esse conflito é resolvido pelo
princípio da especialidade. O art. 33, caput, da Lei no 11.343/2006 reúne todos os elementos
contidos no tipo penal que descreve o crime de contrabando, acrescido de elementares que o
especializa, qual seja, importar droga, prevalecendo, assim, sobre a norma geral.
Convém destacar que a gravidade de um crime em relação a outro não é determinante
para se definir qual a norma especial. De fato, a comparação entre as leis não leva em conta a
gravidade dos crimes, mas o critério especializante, mediante o confronto dos elementos que
integram a definição abstrata das normas penais.
A comparação não recai sobre o fato, mas entre as normas penais que aparentemente
podem incidir sobre o delito praticado. Assim, deve-se buscar adequar o fato praticado às normas
possíveis. Se, além de se enquadrar na norma geral, o fato praticado apresentar algum elemento
que o especialize, que o destaque, que o especifique em relação à conduta descrita na norma
geral, prevalecerá a incidência da lei especial. Em outras palavras, se, além de abrigar todos os
elementos da lei geral, conter ainda elementos que a especifiquem, a lei especial prevalece sobre
a geral.

11.3.2. Princípio da subsidiariedade

Para melhor compreensão do princípio da subsidiariedade, convém, por primeiro,


estabelecer distinção entre norma primária e norma subsidiária.

128
A norma primária ou principal é aquela que descreve a conduta de forma mais abrangente,
contemplando, inclusive, aquela descrita na norma subsidiária. Trata-se, pois, de norma que
descreve conduta de forma mais abrangente, que atinge com maior gravidade determinado bem
jurídico.
Considera-se subsidiária a norma que descreve uma conduta que atinge em menor grau
um determinado bem jurídico, sendo, pois, menos grave do que a norma principal. A norma
subsidiária, portanto, além de ser menos grave, descreve conduta que representa parte da
execução do delito previsto na norma principal. A norma subsidiária está abarcada pela norma
principal.
Tomemos como exemplo o tipo penal que define o crime de constrangimento ilegal (CP,
art. 146) em consonância com o crime de estupro (CP, art. 213). O delito de constrangimento
ilegal é menos grave que o de estupro. Além disso, o tipo penal que define o crime de
constrangimento ilegal descreve uma parte da execução do crime de estupro, consistente em
“constranger”. Logo, a norma que define o crime de constrangimento ilegal é subsidiária,
enquanto a que define o crime de estupro é a principal.
Note-se que, ao contrário do que ocorre no princípio da especialidade, a comparação não
é meramente entre as normas (uma mais especial do que a outra), mas em relação ao fato. Ou
seja, para a aplicação do princípio da subsidiariedade, é imprescindível a análise do caso
concreto, sendo insuficiente a mera comparação abstrata dos tipos penais, devendo ser
verificado, por exemplo, a intenção do agente, os meios empregados para a prática do crime,
além de outras circunstâncias que envolvem o contexto fático, a fim de ser verificada a extensão
da gravidade do delito praticado.
Isso porque a norma principal ou primária absorve a norma subsidiária, que incidirá
somente na impossibilidade de aplicação da norma principal mais grave. Primeiro, verifica-se,
considerando as circunstâncias do caso concreto, se não incide a norma primária. Se a conduta
não se enquadrar perfeitamente no tipo penal mais grave, passa-se então a cogitar da incidência
da norma subsidiária. É como, perdoe-nos a analogia, se o jogador titular do grande grêmio
imortal não puder entrar em campo, jogará o reserva.
A subsidiariedade pode ser expressa ou tácita.

129
11.3.2.1. Subsidiariedade expressa

A subsidiariedade expressa se caracteriza por estar formalmente declarada na norma. A


própria norma penal prevê expressamente que será aplicável somente quando outra norma de
maior gravidade não incidir. Em outras palavras, a própria lei faz expressa ressalva ao seu
caráter de subsidiariedade, admitindo incidir somente se o fato praticado não caracterizar crimes
mais grave.
O crime de expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente constitui exemplo
de subsidiariedade expressa, porquanto o próprio art. 132 do CP prevê que incidirá a pena de
detenção, de três meses a um ano pela prática de tal delito, “se o fato não constitui crime mais
grave”. Assim, se não restar caracterizada a prática, por exemplo, de tentativa de homicídio
(norma primária), poderá, conforme o caso, incidir o delito previsto no art. 132 do CP (norma
subsidiária).
O crime de lesão corporal seguido de morte também se reveste de caráter de
subsidiariedade, uma vez que, como expressamente consta no art. 129, § 3o, do CP, somente
incidirá se “as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco
de produzi-lo”. Logo, se não restar demonstrado que o agente quis a morte da vítima ou assumiu
o risco de causá-la, o que ensejaria a aplicação do art. 121 do CP (norma primária), incidirá o
crime previsto no art. 129, § 3o, do CP (norma subsidiária).
A norma subsidiária que define o crime de subtração de incapaz, previsto no art. 249 do
CP, somente incidirá “se o fato não constitui elemento de outro crime”. Assim, se, por exemplo,
o agente subtraiu/sequestrou o menor de 18 anos como condição ou preço de resgate, incorrerá
no crime de extorsão mediante sequestro, previsto no art. 159 do CP (norma principal).
O crime de importunação sexual, previsto no art. 215-A do CP, incluído pela Lei no
13.718/2018, incidirá “se o ato não constitui crime mais grave”, conforme expressamente prevê
o referido dispositivo legal. Logo, o delito de importunação sexual somente incidirá se a conduta
do agente não caracterizar crime mais grave, como, por exemplo, estupro (CP, art. 213) ou
estupro de vulnerável (CP, art. 217-A).
Assim, como já decidiu o STJ, a conduta do agente que surpreendeu a vítima, puxando-a
pelo braço, para fazê-la tocar em seu órgão genital, não obtendo êxito porque a vítima conseguiu
dele se desvencilhar, enquadra-se no art. 213 c/c art. 14, II, ambos do CP, já que se trata de ato
mais grave do que aquele previsto no art. 215-A do CP. Poder-se-ia cogitar da incidência do art.

130
215-A do CP (norma subsidiária), se a ação atentatória contra o pudor praticada com propósito
lascivo contra a vítima tivesse ocorrido sem violência ou grave ameaça.8

11.3.2.2. Subsidiariedade tácita

A subsidiariedade tácita ou implícita ocorre quando a norma penal não ressalva, de modo
expresso, a sua incidência na hipótese de outra norma de maior gravidade punitiva não ser
aplicável ao caso concreto.
Não há previsão expressa da natureza subsidiária da norma, extraindo-se essa condição
do contexto que envolveu o fato praticado, que não se enquadra em norma penal mais grave.
Busca-se, agora, adequar o fato ao tipo penal subsidiário, que prevê tratamento menos grave,
tanto que, não raras vezes, constitui elementar, qualificadora, causa de aumento de pena,
agravante ou meio de execução do crime previsto na norma principal ou primária.
O crime de constrangimento ilegal (CP, art. 146) é tacitamente subsidiário em relação ao
crime de estupro (CP, art. 213). Assim, se, no caso concreto, não restar caracterizado que o
constrangimento, praticado mediante violência ou grave ameaça, tinha por finalidade a prática
de conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso, possível incidir o crime de constrangimento ilegal.
Logo, a conduta do agente que aponta uma arma em direção à vítima maior de idade,
determinando que fique nua, sem o dolo lascivo, mas tão somente para constrangê-la, não se
enquadra no crime de estupro, porque não foi compelida a praticar ou permitir que com ela se
pratique ato sexual. Todavia, porque a vítima foi constrangida a fazer algo contra sua vontade,
incide a norma subsidiária, prevista no art. 146 do CP.

11.3.3. Princípio da consunção ou da absorção

11.3.3.1. Introdução

Diversamente do princípio da subsidiariedade, em que a prática de um ato delituoso deve


ser enquadrada na norma mais grave, o princípio da consunção é aplicado para dirimir conflito
aparente de normas decorrente de uma sequência de fatos delituosos, que, isoladamente,
constituem crime, mas que, ao final, devem ser subsumidos a um único tipo penal. Em outras
palavras, os atos delituosos praticados para alcançar o resultado esperado serão absorvidos

8
STJ, AgRg no REsp no 1767968/MG, rel. Min. Nefi Cordeiro, 6a T., j. 5-5-2020.

131
pelo crime desejado, resultando, assim, na responsabilização do agente pela prática de um
crime.
Contextualizando para melhor compreensão. Imaginemos um agente que desfere golpe
de faca na vítima, causando-lhe lesões corporais; na sequência, desfere outro golpe de faca na
vítima, gerando outra lesão corporal; e, por fim, desfere o golpe fatal, matando-a. Temos duas
lesões corporais em sequência e, ao final, o homicídio. Dessa sequência de fatos delituosos
surge o conflito aparente de normas. O agente deverá responder por três crimes (duas lesões
corporais e homicídio) ou apenas pelo crime de homicídio?
Pelo princípio da consunção, ou da absorção, o fato mais abrangente e grave consome,
absorve, o(s) fato(s) menos abrangentes. Os fatos menos abrangentes figuram como meio
necessário ou normal fase de preparação ou execução de outro crime. Nesse caso, a norma
consuntiva prevalece sobre a norma consumida. Trata-se da hipótese de o crime meio ser
absorvido pelo crime fim.
Prevalece, nessa hipótese, a norma penal que define o crime mais abrangente, que
absorverá a norma que prevê conduta de menor amplitude, evitando-se a incidência do bis in
idem.
A aplicação do princípio da consunção se justifica, porque o bem jurídico protegido pela
norma menos abrangente já está tutelado pela norma mais abrangente. Além disso, a violação
da norma menos abrangente constitui meio necessário para atingir o bem jurídico tutelado pela
norma mais abrangente.
Assim, considerando o exemplo acima, a integridade corporal (bem jurídico tutelado pelo
art. 129 do CP) também está protegido pela norma mais abrangente prevista no art. 121 do
CP. E, ainda, como a ofensa à integridade corporal constitui meio necessário para alcançar o
crime de homicídio, as lesões corporais previamente praticadas serão absorvidas pelo crime de
homicídio. Em síntese, o agente responderá unicamente pelo crime de homicídio (CP, art. 121).

11.3.3.2. Hipóteses de incidência do princípio da consunção

O princípio da consunção pode ser aplicado em quatro situações distintas: crime


progressivo, progressão criminosa, crime complexo e fatos impuníveis.
a) Crime progressivo
No crime progressivo, o agente, desejando desde o início produzir um resultado mais
grave, pratica previamente sucessão de fatos, que, isoladamente, constituem crime, até alcançar

132
o resultado final almejado. Ou seja, para alcançar o resultado pretendido, o agente pratica atos
antecedentes de menor gravidade, sem os quais não seria possível atingir a consumação do
delito desejado. O ato final, ensejador do resultado inicialmente pretendido, absorve todos os
anteriores. Trata-se da hipótese dos denominados crimes de passagem.
No crime progressivo há, portanto, unidade de elemento subjetivo, sendo a conduta
composta de vários atos praticados progressivamente até produzir o resultado desejado.
Tomemos como exemplo o agente que pretende desde o início produzir a morte da vítima.
Para tanto, utiliza-se de uma faca, golpeando a vítima em várias partes do corpo, vindo ao final
a aplicar o golpe fatal, causando-lhe a morte. Há um único elemento subjetivo, sendo a conduta
composta por vários atos praticados de forma progressiva até atingir o resultado mais grave.
Surge, assim, o conflito aparente de normas: o agente responderá pelos delitos de lesão corporal
(CP, art. 129) e homicídio (CP, art. 121) ou apenas pelo crime de homicídio (CP, art. 121)??
Nesse caso, aplicando-se o princípio da consunção, o agente responderá apenas pelo crime de
homicídio (CP, art. 121), pois as várias lesões corporais produzidas pelos golpes de faca
constituíram meio necessário para a execução do delito pretendido, sendo, por isso, absorvidas
pelo crime de homicídio.
Convém ressaltar que o princípio da consunção somente poderá ser adotado se
evidenciada relação de dependência ou de subordinação entre as condutas, bem como que os
delitos sequenciais foram praticados no mesmo contexto fático.
Essa premissa é fundamental para a verificação da incidência do princípio da consunção
em relação aos crimes de porte ilegal de arma e homicídio, bem como crime de porte ilegal de
arma de fogo e roubo majorado pelo emprego de arma de fogo.
E, nesse aspecto, o STJ sedimentou entendimento no sentido de que a absorção do crime
de porte ilegal de arma de fogo pelo de homicídio exige que as condutas tenham sido praticadas
no mesmo contexto, guardando relação de dependência ou subordinação, de modo que o porte
tenha como fim unicamente a prática do delito de homicídio.9
Assim, se restar demonstrado que o agente portava a arma em ocasiões distintas da
prática do crime de homicídio, não será aplicado o princípio da consunção, diante da incidência
de crimes autônomos e independentes entre si. Logo, nesse caso, o agente responderá pelo
delito previsto na Lei no 10.826/2003 e crime de homicídio, em concurso material de crimes.

9
STJ, AgRg no AgREsp no 1186399/MS, rel. Min. Nefi Cordeiro, 6a T., j. 3-5-2018.

133
b) Progressão criminosa
A progressão criminosa não se confunde com crime progressivo.
Enquanto no crime progressivo há, desde o início da conduta do agente, único elemento
subjetivo, na progressão criminosa a intenção inicial é praticar o delito menor, e, durante a
execução do delito, o agente delibera por cometer o crime mais grave. Há, portanto, pluralidade
de fatos e de desígnios em progressividade delitiva.
Assim, se o dolo inicial era o de praticar apenas lesão corporal, mas, ao longo da
execução, o agente decidir matar a vítima, haverá pluralidade de desígnios, com modificação do
dolo (primeiro, pretendia lesionar; após, deliberou por matar a vítima) e pluralidade de condutas,
praticadas em progressividade delitiva. Nesse caso, o agente responderá apenas pelo crime de
homicídio, restando absorvidas as lesões corporais praticadas.

c) Fatos impuníveis
Pode ocorrer de o agente realizar uma conduta anterior ou posterior, previstos como
delitos autônomos, mas que, ao final, são impuníveis. Trata-se das hipóteses dos chamados ante
factum impunível e pos factum impunível.
O ante factum não punível ocorre quando um fato anterior menos grave constitui meio
necessário para a prática de outro fato, mais grave, ficando, por conseguinte, o primeiro
absorvido, sendo o fato antecedente mero indiferente penal.
Tomemos como exemplo o fato de o agente quebrar o vidro de um veículo, caracterizando
fato definido como crime de dano (CP, art. 163), para subtrair uma bolsa feminina que se encontra
no interior do automóvel. Nesse caso, o dano provocado na porta caracteriza o ante factum
impunível, já que funcionou como meio de execução para a subtração da bolsa. Logo, o agente
responderá apenas pelo crime de furto qualificado pelo rompimento de obstáculo (CP, art. 155,
§ 4º, I), sendo o fato anterior (dano) absorvido.
Nos termos da Súmula no 17 do STJ, o crime de falso é absorvido pelo de estelionato,
quando nele se exaure
O post factum impunível ocorre quando, após realizada a conduta, o agente pratica nova
conduta voltada a ofender o mesmo bem jurídico, visando apenas tirar proveito da prática
anterior. Trata-se, pois, de mero exaurimento. Assim, se após o furto o agente destrói a coisa
subtraída, só responde pelo furto (CP, art. 155), que absorverá o crime de dano (CP, art. 163).
Neste caso, a lesão ao interesse jurídico causada pela conduta precedente torna indiferente o
crime de dano.

134
Adotando esse fundamento, o STJ já decidiu no sentido de que o uso de documento
falsificado (CP, art. 304) deve ser absorvido pela falsificação do documento público ou privado
(CP, arts. 297 e 298), quando praticado pelo mesmo agente, caracterizando o delito de uso post
factum não punível, ou seja, mero exaurimento do crime de falso, não respondendo o falsário
pelos dois crimes, em concurso material.10

11.3.4. Princípio da alternatividade

O princípio da alternatividade se aplica nos crimes de ação múltipla ou de conteúdo


variado, no qual o tipo penal descreve duas ou mais condutas como verbos nucleares do tipo.
Nesse caso, o tipo penal descreve várias condutas, que, se praticadas pelo agente, de forma
sucessiva, configura fato único.
Se o agente adquirir, guardar e vender determinada droga, praticando, assim, três das
condutas previstas no art. 33 da Lei no 11.343/2006, deverá ser imputado a ele a prática de um
crime de tráfico de drogas, não incidindo, no caso, concurso de três infrações.

10
STJ, AgRg no RHC no 112730/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 3-3-2020.

135
11.4. Questões sobre Conflito aparente de normas

25) QUESTÃO 1 – 36º EXAME


Ana Beatriz foi denunciada pelo Ministério Público pela prática dos crimes de falsificação de
documento particular (Art. 298 do CP) e estelionato (Art. 171 do CP), em concurso material (Art.
69 do CP), por ter obtido vantagem patrimonial ilícita às custas da vítima Rita (pessoa civilmente
capaz e mentalmente sã, à época com 21 anos de idade), induzindo-a e mantendo-a em erro,
mediante meio fraudulento. Segundo narra a denúncia, em julho de 2020 Ana Beatriz falsificou
bilhete de loteria premiado e o vendeu para Rita por metade do valor do suposto prêmio,
alegando urgência em receber valor em espécie para poder custear cirurgia da sua filha. Rita,
envergonhada, não procurou as autoridades públicas para solicitar a apuração dos fatos. A
denúncia foi oferecida ao Juízo competente em dezembro de 2020.
Sobre a hipótese, responda aos itens a seguir.

136
A) Qual é a tese jurídica de mérito que pode ser invocada pela defesa técnica de Ana
Beatriz? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual é a tese jurídica processual que pode ser invocada pela defesa técnica de Ana
Beatriz? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

137
Concurso de crimes

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

12.1. Introdução

Quando um sujeito, mediante unidade ou pluralidade de ações ou omissões, pratica dois


ou mais delitos, surge o concurso de crimes ou de penas.
O concurso pode ocorrer entre crimes de qualquer espécie, comissivos ou omissivos,
dolosos ou culposos, consumados ou tentados, simples ou qualificados e ainda entre crimes e
contravenções.
O concurso de crimes está inserido no Título V do Código Penal, relativo às penas,
justamente porque sua incidência repercute no total da pena aplicada ao agente que praticou
dois ou mais crimes.
Há três espécies de concurso de crimes: concurso material, concurso formal e crime
continuado.

12.2. Concurso de crimes e a relação com outros institutos

As regras do concurso de crimes não repercutem somente na pena definitiva, mas também
influenciam em outros institutos jurídicos, como, por exemplo, na determinação do procedimento,
na concessão da suspensão condicional do processo, na prescrição.
Nos termos do art. 394 do CPP, para determinar o procedimento a ser seguido, deve-se
verificar o máximo da pena cominada ao delito, considerando os critérios do concurso de crimes.
Assim, para definir o procedimento no contexto de concurso material de crimes ou de concurso
formal imperfeito, as penas deverão ser somadas. Tratando-se de concurso formal perfeito e
crime continuado, considera-se a pena mais grave, com a elevação da fração que mais aumenta
a pena (1/2, se concurso formal perfeito; 2/3, se crime continuado).
Para a concessão da suspensão condicional do processo, um dos requisitos é que a pena
mínima cominada ao delito não seja superior a um ano (Lei no 9.099/1995, art. 89), devendo ser
considerado nesse limite o concurso de crimes. No contexto de concurso material de crimes, as
penas mínimas cominadas devem ser somadas. Se as penas mínimas somadas superarem um
ano, o réu não poderá ser beneficiado pela suspensão condicional do processo.

138
Em relação ao concurso formal de crimes e crime continuado, deve-se considerar a fração
que menos aumenta a pena. É o que dispõe a Súmula nº 723 STF:

Súmula 723 do STF:

Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se


a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um
sexto for superior a um ano.

E também a Súmula nº 243 STJ:

Súmula 243 do STJ:

O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações


penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva,
quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da
majorante, ultrapassar o limite de um (1) ano.

No contexto de concurso de crimes, o prazo prescricional deve ser verificado com base
na pena máxima cominada ou na pena imposta na sentença em relação a cada um dos crimes,
ou seja, isoladamente. É o que se extrai do art. 119 do CP e da Súmula no 497 do STF: “Quando
se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se
computando o acréscimo decorrente da continuação”.

12.3. Concurso material de crimes

12.3.1. Conceito

Ocorre o concurso material, também chamado de real, quando o agente, mediante mais
de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não (CP, art. 69, caput), não
sendo necessário que tenham sido praticados no mesmo contexto fático. Há, pois, pluralidade
de condutas e pluralidade de crimes.

139
12.3.2. Concurso material e penas restritivas de direitos

Conforme dispõe o art. 69, § 1º, do CP, no caso de concurso material, se o agente sofrer
pena privativa de liberdade por um dos delitos, não sendo concedido o sursis, não seria possível
atribuir, em relação ao outro, pena restritiva de direitos, porque, em tese, seria incompatível o
cumprimento simultâneo das penas.
Conclui-se, em sentido contrário, que, se concedido o sursis à pena privativa de liberdade,
será possível a substituição dessa pena pela restritiva de direitos em relação ao outro delito, já
que, uma vez suspensa a execução da pena privativa de liberdade, não haveria impedimento
para o cumprimento da pena restritiva de direitos.
Imaginemos, por exemplo, que o réu tenha sido condenado pelo crime de lesão corporal
grave (CP, art.129, § 1o), com pena aplicada de um ano e oito meses de reclusão, sendo
concedida suspensão condicional da pena, e, no mesmo processo, em concurso material de
crimes, pelo crime de furto (CP, art. 155), com pena aplicada em um ano. Logo, como foi
concedida a suspensão condicional da pena em relação ao crime de lesão corporal grave, pode
o magistrado substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em relação ao delito
de furto.

12.3.3. Cumprimento simultâneo ou sucessivo de penas restritivas de


direitos

Nos termos do art. 69, § 2º, do CP, quando forem aplicadas na sentença duas ou mais
penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis
entre si e sucessivamente as demais.
Assim, o condenado pode, por exemplo, cumprir simultaneamente uma pena de prestação
de serviço à comunidade e uma prestação pecuniária. Por outro lado, diante da incompatibilidade
de cumprimento simultâneo, o cumprimento de duas penas de prestação de serviços à
comunidade deverá ser de forma sucessiva.
Imaginemos, por exemplo, que o agente tenha sido condenado pelo crime de furto simples
(CP, art. 155), em concurso material com o crime de estelionato (CP, art. 171). Em relação ao
crime de furto foi aplicada a pena privativa de liberdade de um ano, substituída por prestação de
serviços à comunidade; em relação ao crime de estelionato, foi aplicada pena privativa de
liberdade de dois anos, também substituição por prestação de serviço à comunidade. Nesse
caso, não há possibilidade de cumprimento simultâneo das penas restritivas de direitos, devendo

140
o condenado cumprir as prestações de serviços à comunidade de forma sucessiva: Assim, por
exemplo, após cumprir a pena do crime de furto, passará a cumprir a prestação de serviços à
comunidade em relação ao crime de estelionato.

12.3.4. Aplicação da pena

Nos termos do art. 69, caput, do CP, quando o agente realiza o concurso real de crimes,
“aplicam-se cumulativamente as penas em que haja incorrido”. Portanto, no concurso material
as penas são cumuladas, somadas.
Aplica-se, pois, o sistema do cúmulo material de crimes.
Na hipótese de crimes conexos apurados na mesma ação penal, a soma das penas, pelo
concurso material, será realizada na própria sentença, após a adoção do critério trifásico para
cada um dos delitos.
Exemplo: O agente pratica o crime de estupro (CP, art. 213) e, para assegurar a sua
impunidade, desfere golpes de faca na vítima, matando-a, praticando o crime de homicídio
qualificado (CP, art. 121, § 2º, V). Imaginemos que o juiz fixe, em relação ao delito de estupro, a
pena de 8 anos de reclusão. Em relação ao crime de homicídio qualificado, a pena de 20 anos.
Ao final, considerando se tratar de concurso material de crimes, o Magistrado deverá aplicar o
sistema do cúmulo material, mediante o somatório das penas. Logo, no caso, a pena definitiva
do réu será de 28 anos de reclusão.
De outro lado, na hipótese de não haver conexão entre os crimes, sendo, por isso,
julgados em processos distintos, a soma das penas será realizada perante o juízo da execução
criminal, por força do disposto no art. 66, III, a, da LEP.

12.4. Concurso formal

12.4.1. Conceito

Ocorre o concurso formal (ou ideal) quando o agente, mediante uma só ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes (CP, art. 70, caput). Há unidade de conduta e pluralidade de crimes.
A unidade de conduta se concretiza quando os atos são realizados no mesmo contexto
espacial e temporal, não sendo necessário que seja praticado em ato único. De fato, pode haver
unidade de conduta mesmo quando fracionada em vários atos, como, por exemplo, agente que
subtrai objetos pertencentes a pessoas distintas, no mesmo contexto fático.

141
Para incidir o concurso formal de crimes, a única conduta deve produzir duas ou mais
infrações penais, atingindo mais de um bem penalmente tutelado, causando, pois, pluralidade
de resultados.
Assim, quem efetua disparos em direção a uma pessoa, atingindo a vítima pretendida e
também pessoa diversa, terá praticado, mediante uma única ação, dois crimes, uma vez que
violou mais de um bem penalmente tutelado.
Do mesmo modo, o motorista que conduz seu veículo de modo imprudente, vindo a matar
várias pessoas, desenvolveu um único comportamento, do qual resultaram vários crimes.

12.4.2. Concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito

O concurso formal perfeito, ou próprio, está previsto na primeira parte do art. 70 do


CP. Ocorre quando o agente pratica duas ou mais infrações penais mediante uma única conduta,
movido por um único desígnio. O agente, por meio de um só impulso volitivo, dá causa a dois ou
mais resultados, sem desígnios autônomos em relação a cada um dos resultados.
Quando a unidade de comportamento corresponder à unidade interna da vontade do
agente, assim compreendido como sendo o desejo de realizar apenas um crime e obter um único
resultado danoso, fala-se em concurso formal perfeito.
Assim, se, por exemplo, o agente, na condução de veículo automotor, atropela e causa a
morte de uma pessoa e lesão corporal em outra, praticará o crime de homicídio culposo na
condução de veículo automotor (CTB, art. 302) e o crime de lesão corporal culposa na condução
de veículo automotor (CTB, art. 303), em concurso formal perfeito, já que não tinha desígnios
autônomos em relação a cada um dos resultados.
No concurso formal imperfeito, ou impróprio, o agente, mediante uma ação ou omissão,
pretende, de forma consciente e voluntária, o resultado em relação a cada um dos crimes. Ou
seja, o agente desenvolve a conduta única com desígnios autônomos em relação a cada um dos
resultados.
Desígnio autônomo se caracteriza pelo fato de o agente pretender, mediante uma única
conduta, atingir dois ou mais resultados. Ou seja, o agente, mediante uma ação ou omissão, age
com consciência e vontade em relação a cada um deles, considerados isoladamente.

142
EXEMPLO 1:

O agente provoca fogo em uma residência com a intenção de matar todos os


moradores. O agente tem desígnios autônomos (intenção de matar) em relação a
cada um dos moradores da residência.

EXEMPLO 2:

Wilson, maior, capaz, na saída de um estádio de futebol, tendo avistado diversos


torcedores do time adversário embarcados em um veículo de transporte regular,
aproveitou-se da oportunidade e lançou uma única bomba incendiária contra o
automóvel, causando graves lesões em diversas vítimas e a morte de uma delas.
Nesse caso, Wilson será apenado com base no concurso formal imperfeito ou
impróprio.

A expressão “desígnios autônomos” abrange tanto o dolo direto quanto o dolo eventual.
Assim, haverá concurso formal imperfeito, por exemplo, entre o delito de homicídio doloso com
dolo direto e outro com dolo eventual.

12.4.3. Aplicação da pena no concurso formal

a) Em relação ao concurso formal perfeito


O concurso formal próprio ou perfeito (CP, art. 70, primeira parte) foi concebido com a
finalidade de conferir tratamento menos severo a agente que, mediante uma conduta, gerou
pluralidade de resultados não derivados de desígnios autônomos, afastando, com isso, os rigores
do concurso material (CP, art. 69).
Por esse motivo, em relação ao concurso formal perfeito, ou próprio, o Código Penal
adotou o sistema de exasperação da pena. Aplica-se a pena do crime a mais grave ou, se iguais,
somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade.
Nesse sentido, se a regra da exasperação da pena se mostrar prejudicial ao réu em
comparação ao cúmulo material, deverá ser afastada. Trata-se, portanto, da regra do concurso
material benéfico como teto do produto da exasperação da pena.
Isso porque, conforme dito:

143
O concurso formal próprio ou perfeito (CP, art. 70, primeira parte), cuja regra para a
aplicação da pena é a da exasperação, foi criado com intuito de favorecer o réu nas hipóteses
de pluralidade de resultados não derivados de desígnios autônomos, afastando-se, pois, os
rigores do concurso material (CP, art. 69). Nesse diapasão, o parágrafo único do art. 70 do CP
impõe o afastamento da regra da exasperação, se esta se mostrar prejudicial ao réu, em
comparação com o cúmulo material. Nos termos da jurisprudência deste STJ, o aumento da pena
decorrente do concurso formal próprio é calculada com base no número de infrações penais
cometidas, que concretizará a fração de aumento abstratamente prevista (1/6 a 1/2),
exasperando-se a pena do crime de maior reprimenda. Nesses termos, aplica-se a fração de
aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para
5 infrações e 1/2 para 6 ou mais infrações.11
Assim, o critério adotado pela jurisprudência para a fixação do aumento da pena em
decorrência do concurso formal perfeito de crimes tem relação com o número de crimes
cometidos pelo agente.

Número de crimes Aumento da pena


• 2 crimes • 1/6 de aumento
• 3 crimes • 1/5 de aumento
• 4 crimes • 1/3 de aumento
• 5 crimes • 1/3 de aumento
• 6 ou mais crimes • 1/2 de aumento

b) Em relação ao concurso formal imperfeito


Como dissemos, o critério da exasperação da pena visa a favorecer o agente que, por
meio de uma conduta, produz dois ou mais resultados, sem desígnios autônomos em relação a
cada um deles.
No concurso formal imperfeito, ou impróprio, embora tenha desenvolvido uma conduta,
recai sobre o agente maior grau de reprovabilidade, já que revelou desígnios autônomos em
relação a cada resultado, não merecendo, por isso, tratamento menos severo proporcionado pelo
critério da exasperação da pena.

11
STJ, HC no 325411/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 19-4-2018.

144
Por isso, no concurso formal imperfeito, o critério adotado é o cúmulo material, devendo
ser somadas as penas aplicadas em relação a cada um dos crimes praticados pelo agente, nos
termos do art. 70, caput, 2ª parte, do CP.
Imaginemos que Wilson, pretendendo matar dois colegas de trabalho que exerciam suas
atividades em uma sala ao lado da dele, inseriu substância tóxica no sistema de ventilação dessa
sala, o que causou o óbito de ambos em poucos minutos. Nessa situação, Wilson, com uma
única conduta, praticou dois resultados, com desígnios autônomos em relação a cada um deles.
Trata-se, pois, de dois homicídios dolosos em concurso formal imperfeito.
Nesse caso, o Magistrado terá de realizar a dosimetria da pena em relação a todas as
vítimas, e, ao final, aplicar o critério do cúmulo material. Assim, vamos considerar que, em
relação a vítima “A”, a pena aplicada foi de 12 anos, e, em relação à vítima “B”, a pena aplicada
tenha sido de 15 anos. Como se trata de concurso formal imperfeito, o magistrado terá de adotar
o critério do cúmulo material, somando as penas, ficando a pena definitiva em 27 anos.

12.4.4. Concurso formal e crime único


O concurso formal se caracteriza pela produção de dois ou mais resultados, embora
decorrentes de conduta única. Logo, a partir da conduta do agente, devem resultar dois ou mais
crimes.
Há, no entanto, determinadas situações em que, num primeiro momento, poderia ensejar
a percepção da prática de dois ou mais crimes, quando, na verdade, se trata de crime único.
Quando, por exemplo, há o emprego de violência ou grave ameaça contra várias pessoas, mas
subtração de patrimônio pertencente a apenas uma delas, estaremos diante de crime único de
roubo, já que ocorreu crime contra apenas um patrimônio.
Todavia, se, num mesmo contexto fático, são subtraídos bens pertencentes a vítimas
distintas, não haverá crime único, mas concurso formal, já que com uma conduta, o agente
atingiu patrimônios distintos. caracterizando concurso formal, por terem sido atingidos
patrimônios diversos, nos moldes do art. 70 do CP. 12

12
STJ, HC no 608932/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 6-10-2020.

145
O STJ tem entendido que a prática do crime de roubo contra vítimas diversas, no mesmo
contexto fático, configura uma única ação, incidindo, por isso, as regras do concurso formal de
crimes.13

12.5. Crime continuado


12.5.1. Conceito
O crime continuado está previsto no art. 70 do CP.
Ocorre o crime continuado quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, devendo os subsequentes, pelas condições de
tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, ser havidos como continuação do
primeiro.

12.5.2. Requisitos
Para a incidência das regras do crime continuado é preciso verificar a presença de
requisitos dispostos no art. 71 do CP, consistentes: a) na pluralidade de condutas; b) na
pluralidade de crimes da mesma espécie; c) nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira
de execução e outras semelhantes.

12.5.2.1. Pluralidade de condutas


Nos termos do art. 71 do CP, o crime continuado se caracteriza pelo fato de o agente
praticar crimes mediante mais de uma ação ou omissão, exigindo, pois, pluralidade de condutas.
Distingue-se do concurso material, que também exige pluralidade de condutas, por força
da incidência dos demais requisitos, consistentes na prática de crimes de mesma espécie, nas
mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.

12.5.2.2. Crimes da mesma espécie


Crimes da mesma espécie são os que estão previstos no mesmo tipo penal, considerando-
se, inclusive, as figuras simples ou qualificadas, dolosas ou culposas, tentadas ou consumadas.
Além disso, para caracterizar crimes da mesma espécie, é necessário que os crimes
parcelares devem tutelar os mesmos bens jurídicos e possuem a mesma estrutura jurídica. Por

13
STJ, AgRg no HC no 412140/MG, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6a T., j. 1-3-2018.

146
isso, a teor da jurisprudência do STJ, não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os
crimes de roubo e o de latrocínio, porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam
bens jurídicos diferentes, uma vez que o roubo tutela o patrimônio e a integridade física
(violência) ou o patrimônio e a liberdade individual (grave ameaça); o latrocínio, por outro lado,
tutela o patrimônio e a vida.

12.5.2.3. Conexão temporal


Exige-se, para caracterizar crime continuado, conexão temporal entre as condutas
praticadas para que se configure a continuidade delitiva. Deve existir, em outros termos, uma
certa periodicidade que permita observar-se um certo ritmo, uma certa uniformidade, entre as
ações sucessivas, embora não se possam fixar, a respeito, indicações precisas.
A jurisprudência tem admitido crime continuado quando entre as infrações penais não
houver decorrido período superior a 30 dias.

12.5.2.4. Conexão espacial


Além dos demais requisitos, para que seja possível reconhecer a continuidade delitiva,
deve, ainda, estar presente a conexão espacial.
A lei não estabelece parâmetros para o reconhecimento da conexão espacial, tendo a
jurisprudência do STJ admitido a continuidade delitiva quando tratarem de crimes praticados na
mesma cidade, bem como em comarcas limítrofes ou próximas.
Assim, a prática de crimes da mesma espécie em locais diversos não exclui a
continuidade. Crimes praticados em bairros diversos de uma mesma cidade, ou em cidades
próximas, podem ser entendidos como praticados em condições de lugar semelhantes.

12.5.2.5. Maneira de execução


A lei exige que a forma de execução das infrações continuadas seja semelhante,
traduzindo-se no modo, forma e os meios empregados para a prática dos delitos.
Exemplo: Empregado de um estabelecimento comercial que subtrai, diariamente, objetos
da empresa.
Por outro lado, um crime de furto qualificado pela escalada e outro furto qualificado pela
destreza, conquanto crimes da mesma espécie, inviabilizam a incidência do crime continuado, já
que empregaram modos de execução distintos.

147
Da mesma forma, verifica-se a diversidade da maneira de execução dos diversos delitos,
quando o agente pratica furto ora sozinho, ora em companhia de comparsas, não configurando,
pois, continuidade delitiva, mas sim a habitualidade criminosa.

12.5.2.6. Unidade de desígnios


Exige-se unidade de resolução, devendo o agente desejar praticar os crimes com
continuidade. Portanto, além dos requisitos objetivos, exige unidade de desígnios, isto é, uma
programação inicial, com realização sucessiva.
É o entendimento adotado pelo STJ14, segundo o qual na prática dos crimes em
continuidade delitiva, exigindo-se, pois, que haja um liame entre os crimes, apto a evidenciar de
imediato terem sido esses delitos subsequentes continuação do primeiro, isto é, os crimes
parcelares devem resultar de um plano previamente elaborado pelo agente.
Com efeito, o próprio Código Penal, ao dispor que os crimes subsequentes devem ser
havidos como continuação do primeiro, sinaliza pela necessidade da ligação subjetiva entre os
diversos crimes praticados pelo agente. Não há como considerar um crime subsequente ao
primeiro sem a presença de liame ou vínculo subjetivo entre eles. Logo, deve restar demonstrado
que o agente agiu com consciência e vontade em praticar crimes da mesma espécie em
sequência, nas mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução.

12.5.3. Crime continuado específico


Além dos requisitos previstos no art. 71, caput, do CP, o crime continuado específico prevê
a necessidade de três requisitos, que devem ocorrer simultaneamente:
a) Contra vítimas diferentes
Admite-se nexo de causalidade entre crimes que lesam interesses jurídicos pessoais,
ainda que praticados contra vítimas diversas.
De fato, a circunstância de os delitos componentes atingirem bens jurídicos pessoais não
impede a continuação. Entretanto, cumpre observar o disposto no parágrafo único do art. 71 do
Código Penal:

14
STJ, HC no 419094/RJ, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 15-3-2018.

148
Art. 71, parágrafo único, do Código Penal:

Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave
ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a
conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as
circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais
grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70
e do art. 75 deste Código.

Assim, admite o Código Penal nexo de continuidade entre homicídios, lesões corporais ou
roubos contra vítimas diversas, podendo o juiz, de acordo com as circunstâncias judiciais do art.
59, caput, do CP, aumentar a pena de um dos delitos até o triplo, desde que a pena não seja
superior à que seria imposta se o caso fosse de concurso material.
b) Com violência ou grave ameaça à pessoa
Mesmo que o crime seja contra vítimas diferentes, se não houver violência – real ou ficta
– contra a pessoa, não haverá a continuidade específica.
c) Somente em crimes dolosos
Se a ação criminosa for praticada contra vítimas diferentes, com violência à pessoa, mas
não for produto de uma conduta dolosa, não estará caracterizado o crime continuado específico.

12.5.4. Aplicação da pena


Tratando-se de crime continuado comum, aplica-se a pena de qualquer um dos crimes,
se idênticas, aumentada de 1/6 até 2/3.
Tratando-se de crime continuado qualificado, aplica-se a pena do crime mais grave,
aumentada de 1/6 até 2/3.
O parâmetro para o aumento da pena entre 1/6 e 2/3 deve ser proporcional ao número de
infrações praticadas. Ou seja, “em se tratando de aumento de pena referente à continuidade
delitiva, aplica-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações;
1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações”.15

15
STJ, AgRg no EDcl-AgREsp no 1629001/SP, rel. Min. Laurita Vaz, 3a Seção, j. 28-10-2020.

149
Número de crimes Aumento da pena

• 2 crimes • 1/6 de aumento


• 3 crimes • 1/5 de aumento
• 4 crimes • 1/4 de aumento
• 5 crimes • 1/3 de aumento
• 6 crimes • 1/2 de aumento
• 7 crimes ou mais • 2/3 de aumento

Tratando-se de crime continuado específico, previsto no art. 71, parágrafo único, do CP, aplica-
se a pena do crime mais grave aumentada até o triplo. Todavia, segundo o entendimento do
STF, no crime continuado qualificado, a majoração da pena não está adstrita ao número de
infrações praticadas, uma vez que o art. 71, parágrafo único, do CP, determina que poderá o
juiz, “considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se
idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo”. Logo, a fração de aumento de pena no crime
continuado qualificado lastreia-se nos vetores em questão, e não apenas no número de infrações
praticadas.16
Se, da aplicação da regra do crime continuado, a pena resultar superior à que restaria se
somadas as penas, aplica-se a regra do concurso material benéfico (CP, art. 71, parágrafo único,
parte final).

16
STF, HC no 131871/PR, rel. Min. Dias Toffoli, 2a T., j. 31-5-2016.

150
FIQUE LIGADO!
Edição 23 STJ – CONCURSO DE CRIMES
4) Não há crime único, podendo haver concurso formal, quando, no mesmo
contexto fático, o agente incide nas condutas dos arts. 14 (porte ilegal de arma
de fogo de uso permitido) e 16 (posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso
restrito) da Lei n. 10.826/2003.
5) Não há crime único, podendo haver concurso material, quando, no mesmo
contexto fático, o agente incide nas condutas dos arts. 14 (porte ilegal de arma
de fogo de uso permitido) e 16 (posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso
restrito) da Lei n. 10.826/2003.
7) A apreensão de mais de uma arma de fogo, acessório ou munição, em um
mesmo contexto fático, não caracteriza concurso formal ou material de crimes,
mas delito único.

151
12.6. Questões sobre Concurso de crimes

26) QUESTÃO 4 – XXII EXAME


Diego e Júlio caminham pela rua, por volta das 21h, retornando para suas casas após mais um
dia de aula na faculdade, quando são abordados por Marcos, que, mediante grave ameaça de
morte e utilizando simulacro de arma de fogo, exige que ambos entreguem as mochilas e os
celulares que carregavam. Após os fatos, Diego e Júlio comparecem em sede policial, narram o
ocorrido e descrevem as características físicas do autor do crime. Por volta das 5h da manhã do
dia seguinte, policiais militares em patrulhamento se deparam com Marcos nas proximidades do
local do fato e verificam que ele possuía as mesmas características físicas do roubador. Todavia,
não são encontrados com Marcos quaisquer dos bens subtraídos, nem o simulacro de arma de
fogo. Ele é encaminhado para a Delegacia e, tendo-se verificado que era triplamente reincidente
na prática de crimes patrimoniais, a autoridade policial liga para as residências de Diego e Júlio,
que comparecem em sede policial e, em observância de todas as formalidades legais, realizam
o reconhecimento de Marcos como responsável pelo assalto. O Delegado, então, lavra auto de
prisão em flagrante em desfavor de Marcos, permanecendo este preso, e o indicia pela prática
do crime previsto no Art. 157, caput, do Código Penal, por duas vezes, na forma do Art. 69 do
Código Penal. Diante disso, Marcos liga para seu advogado para informar sua prisão. Este
comparece, imediatamente, em sede policial, para acesso aos autos do procedimento originado
do Auto de Prisão em Flagrante. Considerando apenas as informações narradas, na condição
de advogado de Marcos, responda, de acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores,
aos itens a seguir.
A) Qual requerimento deverá ser formulado, de imediato, em busca da liberdade de Marcos
e sob qual fundamento? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Oferecida denúncia na forma do indiciamento, qual argumento de direito material
poderá ser apresentado pela defesa para questionar a capitulação delitiva constante da
nota de culpa, em busca de uma punição mais branda? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

152
27) QUESTÃO 2 – XXVII EXAME
Em cumprimento de mandado de busca e apreensão, o oficial de justiça Jorge compareceu ao
local de trabalho de Lucas, sendo encontradas, no interior do imóvel, duas armas de fogo de
calibre .38, calibre esse considerado de uso permitido, devidamente municiadas, ambas com
numeração suprimida. Em razão disso, Lucas foi preso em flagrante e denunciado pela prática
de dois crimes previstos no Art. 16, caput, da Lei 10.826/2003, em concurso material, sendo
narrado que “Lucas, de forma livre e consciente, guardava, em seu local de trabalho, duas armas
de fogo de calibre restrito, devidamente municiadas”. Após a instrução, em que os fatos foram
confirmados, foi juntado o laudo confirmando o calibre 38 das armas de fogo, a capacidade de
efetuar disparos, bem como que ambas tinham a numeração suprimida. As partes apresentaram
alegações finais, e o magistrado, em sentença, considerando o teor do laudo, condenou Lucas
pela prática de dois crimes previstos no Art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 10.826/2003,
em concurso formal. Intimada a defesa técnica da sentença condenatória, responda, na condição
de advogado(a) de Lucas, aos itens a seguir.
A) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado em busca da desconstituição
da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Reconhecida a validade da sentença em segundo grau, qual o argumento de direito
material a ser apresentado para questionar o mérito da sentença condenatória e,
consequentemente, a pena aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

153
28) QUESTÃO 3 – XXX EXAME
Eduardo foi preso em flagrante no momento em que praticava um crime de roubo simples, no
bairro de Moema. Ainda na unidade policial, compareceram quatro outras vítimas, todas narrando
que tiveram seus patrimônios lesados por Eduardo naquela mesma data, com intervalo de cerca
de 30 minutos entre cada fato, no bairro de Moema, São Paulo. As cinco vítimas descreveram
que Eduardo, simulando portar arma de fogo, anunciava o assalto e subtraía os bens,
empreendendo fuga em uma bicicleta. Eduardo foi denunciado pela prática do crime do Art. 157,
caput, por cinco vezes, na forma do Art. 69, ambos do Código Penal, e, em sede de audiência,
as vítimas confirmaram a versão fornecida em sede policial. Assistido por seu advogado Pedro,
Eduardo confessou os crimes, esclarecendo que pretendia subtrair bens de seis vítimas para
conseguir dinheiro suficiente para comprar uma motocicleta. Disse, ainda, que apenas simulou
portar arma de fogo, mas não utilizou efetivamente material bélico ou simulacro de arma. O juiz,
no momento da sentença, condenou o réu nos termos da denúncia, sendo aplicada a pena
mínima de 04 anos para cada um dos delitos, totalizando 20 anos de pena privativa de liberdade
a ser cumprida em regime inicial fechado, além da multa. Ao ser intimado do teor da sentença,
pessoalmente, já que se encontrava preso, Eduardo tomou conhecimento que Pedro havia
falecido, mas que foram apresentadas alegações finais pela Defensoria Pública por
determinação do magistrado logo em seguida à informação do falecimento do patrono. A família
de Eduardo, então, procura você, na condição de advogado(a), para defendê-lo.
Considerando apenas as informações narradas, responda, na condição de advogado(a) de
Eduardo, constituído para apresentação de apelação, aos itens a seguir.
A) Existe argumento de direito processual, em sede de recurso, a ser apresentado para
desconstituir a sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Diante da confirmação dos fatos pelo réu, qual argumento de direito material poderá
ser apresentado, em sede de apelação, em busca da redução da sanção penal aplicada?
Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

154
Crime impossível

Aula prevista para ocorrer no dia 13/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal
13.1 Conceito

O crime impossível está previsto no art. 17 do CP. Trata-se de hipótese de tentativa não
punível, verificando-se quando a ineficácia absoluta do meio empregado na execução do delito
ou impropriedade absoluta do objeto sobre o qual recaiu a conduta do agente tornam impossível
a consumação do crime.

Embora o art. 17 do CP contenha a expressão “não se pune a tentativa”, o que poderia


revelar eventual causa de isenção de pena, o crime impossível, na verdade, tem natureza jurídica
de causa excludente da tipicidade.

Os elementos do fato típico são a conduta, o resultado, o nexo de causalidade e a própria


tipicidade. Se, em face da ineficácia absoluta do meio ou impropriedade absoluta do objeto, será
impossível alcançar a consumação, não haverá possibilidade de produção de qualquer resultado,
um dos elementos do fato típico.

Assim, se impossível alcançar o resultado, não haverá um elemento do fato típico, sendo,
portanto, causa excludente da tipicidade.

Além disso, a conduta desenvolvida pelo agente não se amolda a nenhum tipo penal, não
havendo, pois, tipicidade. Com efeito, a conduta consistente em desferir golpes de faca em
pessoa já morta jamais se enquadraria no tipo penal que define o crime de homicídio, pois
impossível “matar alguém” já sem vida.

Diante disso, considerando o aspecto processual:

• Concluído o inquérito policial, o Ministério Público deverá providenciar o


arquivamento;
• Se oferecida, a peça acusatória deverá ser rejeitada (CPP, art. 395, III);

155
• se, por qualquer razão, foi recebida a peça acusatória, o Magistrado deverá proferir
sentença de absolvição sumária (CPP, art. 397, III);
• Se recebida a peça acusatória e encerrada a instrução, o juiz deverá absolver o
réu, com base no art. 386, III, do CPP, uma vez que o fato não constitui crime;
• Tratando-se de procedimento do júri, ao final da primeira fase, deverá o juiz proferir
sentença de absolvição sumária, com base no art. 415, III, do CPP.

Não constitui crime. Trata-se, pois, de fato atípico!

13.2 Crime impossível por ineficácia absoluta do meio

O crime impossível por ineficácia absoluta do meio guarda relação com o meio de
execução ou instrumento utilizado pelo agente, que, por sua natureza, será incapaz de produzir
qualquer resultado, ou seja, jamais alcançará a consumação do delito.

Constitui crime impossível, por ineficácia absoluta do meio, a conduta da gestante que
busca interromper a gravidez com a morte do feto, fazendo uso de substância que não tem
efeito abortivo, como, por exemplo, chá de boldo.

Da mesma forma, trata-se de crime impossível a conduta do agente que, penalmente


imputável, pretendendo matar seu desafeto, aponta em sua direção arma de fogo que não
realiza nenhum disparo em razão de defeito estrutural que, de forma absoluta, impede o seu
funcionamento.

Não será punida, ainda, a conduta do agente que portava arma de fogo inapta para efetuar
qualquer disparo. É o que decidiu o STJ:

Agravo regimental em recurso especial. Penal e processo penal. Porte ilegal de arma de
fogo de uso restrito. Ineficácia da arma atestada por laudo pericial. Ausência de
potencialidade lesiva. Atipicidade da conduta. Absolvição. 1. A Terceira Seção deste
Tribunal Superior possui entendimento pacífico de que o tipo penal de posse ou porte ilegal
de arma de fogo cuida de delito de perigo abstrato, sendo irrelevante a demonstração de
seu efetivo caráter ofensivo.2. In casu, contudo, como ficou demonstrada, por laudo
pericial, a total ineficácia da arma de fogo (inapta a disparar), deve ser reconhecida a
atipicidade da conduta perpetrada, diante da caracterização de crime impossível dada a
absoluta ineficácia do meio. 3. Agravo regimental desprovido (STJ, AgRg no REsp no
1394230/SE, rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, 6a T., j. 23-10-2018).

156
Também constitui crime impossível por ineficácia absoluta do meio o uso de documento
grosseiramente falsificado como forma de obtenção de vantagem indevida em prejuízo alheio,
sobretudo quando imediatamente constatado pela vítima. Com efeito, conforme entendimento
do STJ, “Somente haverá crime impossível no crime de falso, por absoluta impropriedade do
objeto material, quando a contrafação for a tal ponto grosseira que não seja apta a ludibriar a
atenção de terceiros” (STJ, HC 417383/SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6a T., j. 12-
12-2017).

O crime impossível se caracteriza quando a ineficácia do meio for absoluta. A ineficácia


do meio, quando relativa, leva à tentativa e não ao crime impossível, por aplicação da teoria
objetiva temperada, adotada pelo Código Penal.

Há ineficácia relativa do meio quando, não obstante eficaz à produção do resultado, este
não ocorre por circunstâncias acidentais. É o caso do agente que pretende desfechar um tiro de
revólver contra a vítima, mas a arma nega o disparo, por defeito daquele projétil específico,
embora os demais que constavam no tambor fossem aptos a efetuar disparos.

13.3 Crime impossível por impropriedade absoluta do objeto

O crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto guarda relação com o objeto
material, compreendendo a pessoa ou coisa, sobre o qual recai a conduta do agente.

O objeto será absolutamente impróprio quando inexistente ao tempo da conduta do agente


ou, ainda, pelas circunstâncias em que se encontra, afigura-se impossível a produção do
resultado visado pelo agente.

Tomemos como exemplo a conduta do agente, que pretendendo matar a vítima, desfere
vários disparos de arma de fogo contra o seu corpo, verificando-se, após, que, ao receber os
disparos, já se encontrava morta, em decorrência de ter sofrido, momentos antes, fulminante
ataque cardíaco. Evidente, nesse caso, a impropriedade absoluta do objeto, diante da
impossibilidade de ceifar a vida de pessoa que já estava morta.

Da mesma forma, caracteriza crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto a


conduta da mulher que ingere substância abortiva, demonstrando-se, após, que jamais estivera
grávida. Trata-se de fato atípico, pois não há objeto material a ser atingido (feto com vida
intrauterina), não sendo possível, pois, punir a mulher nem mesmo a título de tentativa de aborto.

157
Considera-se, ainda, crime impossível por impropriedade absoluta do objeto a conduta do
punguista que pretende subtrair a carteira da vítima, que, ao tempo da ação, não trazia consigo
qualquer quantia ou bem com valor econômico.

Se a impropriedade do objeto for relativa, o agente poderá ser responsabilizado


criminalmente ao menos na modalidade tentada.

Há impropriedade relativa do objeto quando por uma circunstância acidental o agente não
consegue atingir a consumação, ou, ainda, embora presente o objeto na fase inicial da conduta,
vem a ausentar-se no instante do ataque.

Assim, se o punguista, buscando subtrair a carteira da vítima, coloca a mão no seu bolso
direito, quando, na verdade, o objeto material se encontra no bolso esquerdo, haverá, à
evidência, tentativa de furto, já que se trata de uma circunstância meramente acidental que não
torna impossível o crime. A existência de qualquer bem com a vítima impede o reconhecimento
da impropriedade absoluta do objeto.

Da mesma forma, o fato de o veículo subtraído possuir alarme e sistema de corte de


ignição não impede, por si só, a consumação da subtração, sobretudo quando o veículo foi
levado ligado e, quando parou de funcionar, foi empurrado, circunstância que impede a
configuração do crime impossível. Trata-se, no caso, de impropriedade relativa do objeto.

158
13.4 Questões sobre Crime impossível

29) QUESTÃO 3 – IX EXAME


Mário está sendo processado por tentativa de homicídio uma vez que injetou substância
venenosa em Luciano, com o objetivo de matá-lo. No curso do processo, uma amostra da referida
substância foi recolhida para análise e enviada ao Instituto de Criminalística, ficando comprovado
que, pelas condições de armazenamento e acondicionamento, a substância não fora hábil para
produzir os efeitos a que estava destinada. Mesmo assim, arguindo que o magistrado não estava
adstrito ao laudo, o Ministério Público pugnou pela pronúncia de Mário nos exatos termos da
denúncia. Com base apenas nos fatos apresentados, responda justificadamente.
A) O magistrado deveria pronunciar Mário, impronunciá-lo ou absolvê-lo sumariamente? (Valor:
0,65)

159
B) Caso Mário fosse pronunciado, qual seria o recurso cabível, o prazo de interposição e a quem
deveria ser endereçado? (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

160
Erro de tipo

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 13/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

DOLO Fato atípico


Invencível Exclusão
CULPA Fato atípico
ERRO DE TIPO

Essencial
Exclusão do dolo
Vencível
Responde por culpa,
se tiver previsão legal

Erro do objeto

Acidental Erro sobre pessoa -


art. 20, §3º, CP

Aberratio ictus - art.


73, CP

Aberratio criminis -
art. 74, CP

14.1 Erro de tipo essencial

Nos termos do artigo 20, caput, do Código Penal, caracteriza-se pelo erro sobre o
elemento constitutivo do tipo penal.

Antes de mais nada, mostra-se importante compreender o que significa a expressão


elemento constitutivo do tipo penal. A figura típica (ou tipo legal) é composta de elementos
específicos ou elementares. Cada expressão que compõe uma figura típica é um elemento que
constitui o modelo legal de conduta proibida.

161
Exemplo: O crime de homicídio (CP, art. 121) é composto pelos elementos “matar”
“alguém”. “Matar” é um elemento constitutivo do tipo que define o crime de homicídio. “Alguém”
é também um elemento constitutivo do tipo que define o crime de homicídio.

Para, por exemplo, que o agente seja responsabilizado pelo crime de homicídio, é
necessário que ele tenha desenvolvido conduta consciente de que estava matando alguém. Para
que o agente seja responsabilizado pelo crime de furto, é necessário que ele tenha desenvolvido
conduta consciente de que estava subtraindo coisa alheia móvel. Note-se que não se exige o
conhecimento do teor do tipo penal, mas que, na situação de fato, o agente esteja consciente
em relação ao contexto fático que o cerca.

Se o agente desenvolve conduta sem consciência em relação à realidade a que está


inserido, adotando compreensão equivocada da situação de fato, pode-se cogitar da hipótese de
erro de tipo.

Agora fica mais clara a compreensão de que o erro de tipo é aquele que recai sobre um
dos elementos constitutivos do tipo penal. Há uma falsa percepção da realidade que cerca o
agente. O agente desenvolve uma conduta sem saber que está praticando um fato típico. Não
sabe, em função do erro, que está praticando uma conduta típica.

Em outras palavras, o agente, diante do erro, desenvolve conduta sem a plena consciência
da presença de um elemento do tipo penal. Se, diante da situação de fato, tivesse atingido essa
consciência, não incorreria em erro, e, portanto, não teria praticado a conduta.

Exemplo: Durante uma caçada, o agente percebe que há movimentação atrás de


arbustos. Supondo ser um animal, atira em direção ao alvo, e, quando vai se certificar do
produto da caça, verifica que, na realidade, atingiu uma pessoa, que estava escondida atrás
dos arbustos. O contexto fático, na percepção do caçador, era a de que estava atirando
contra um animal. Todavia, trata-se de uma falsa percepção da realidade, já que acabou
atingindo uma pessoa. O agente errou sobre o elemento constitutivo “alguém”. Desenvolveu
uma conduta sem saber que estava praticando um fato típico, ou seja, sem saber que
estava incorrendo no tipo penal que descreve o crime de homicídio.

162
Outro exemplo: Imaginemos a conduta de uma pessoa que se apossa do aparelho
celular que estava sobre a mesa do escritório, supondo ser seu, quando, na realidade, era do
colega de trabalho. A realidade do agente era a de que estava se apossando do seu aparelho
celular. Todavia, trata-se de uma falsa percepção da realidade, pois se apossou do aparelho
celular que pertence a outra pessoa. O agente não sabia que estava praticando uma conduta
típica, pois errou sobre o elemento constitutivo “coisa alheia móvel” do tipo penal que define o
crime de furto (CP, art. 155).

Dessarte, no erro de tipo, o agente desenvolve conduta sem consciência e vontade em


relação a todos os elementos que integram o tipo penal. Há desconformidade entre a realidade
e a representação do sujeito que, se a conhecesse, não realizaria a conduta. Se o agente
soubesse que era uma pessoa atrás dos arbustos, não teria efetuado o disparo; se o agente
tivesse consciência que pertencia a outra pessoa, não teria se apossado do aparelho celular do
colega.

O erro de tipo essencial pode ser invencível ou vencível.

14.1.1 Erro de tipo essencial invencível, inevitável ou escusável

O erro de tipo invencível, inevitável ou escusável é aquele em que qualquer pessoa, nas
mesmas circunstâncias, incorreria. É um erro escusável, que não seria evitado ainda que se
tratasse de pessoa cautelosa e prudente.

Exemplo: Tomemos como exemplo a conduta de um estudante que deixou seu


aparelho celular carregando na tomada da sala de aula, saindo para comprar café na
cantina da escola. Quando retorna, retira o aparelho celular da tomada, que, na verdade,
não era o que havia deixado para carregar, mas outro idêntico, que pertencia à sua colega,
que havia retirado o celular do agente da tomada e colocou o seu no lugar. Nesse caso, há
evidente erro de tipo, pois o estudante, por conta da falsa percepção da realidade (supõe
ser seu o celular, já que idêntico), errou em relação ao elemento “alheio” do tipo que define
o crime de furto. E trata-se de erro de tipo invencível, porque qualquer pessoa, nas
circunstâncias, consideraria que era o seu aparelho celular que havia deixado carregando
na tomada da sala de aula.

163
Outro exemplo: Agente que se embrenha em mata fechada, distante de qualquer
centro urbano, com rara circulação de pessoas. Em dado momento, visualiza algo se
movimentando atrás da intensa vegetação. Supondo ser um animal, efetua um disparo. Ao
verificar o produto da caça, constata, para sua surpresa, que não matou um animal, mas
uma pessoa, que, por infeliz coincidência, também caçava no local. Trata-se de erro de tipo,
pois o caçador, por conta da falsa percepção da realidade (supôs ser um animal), errou em
relação ao elemento “alguém” do tipo que define o crime de homicídio. E, trata-se de erro
de tipo invencível, porque qualquer pessoa, nas circunstâncias, consideraria que a
movimentação atrás da vegetação seria a de um animal, não sendo possível supor, nem
mesmo para uma pessoa mais cautelosa e diligente, que, na verdade, tratava-se de uma
pessoa.

Da mesma forma, imaginemos um rapaz, imputável, que conhece uma menina no


interior de uma boate onde era vedada a entrada de pessoas menores de 18 anos. Os dois,
após algumas trocas de carícias, resolvem se dirigir a um motel e ali, de forma consentida,
o jovem mantém relações sexuais com a menina. Após, o rapaz descobre que a moça, na
verdade, tinha apenas 13 anos e que somente conseguira entrar na casa noturna mediante
apresentação de carteira de identidade falsa. Trata-se de erro de tipo invencível ou
inevitável, pois qualquer pessoa nas circunstâncias também consideraria que a menina não
era menor de 14 anos de idade.

O erro de tipo essencial invencível exclui o dolo e a culpa. Há exclusão do dolo,


porque desenvolveu a conduta sem consciência e vontade na produção do resultado; há
exclusão da culpa, diante da ausência de previsibilidade objetiva.

14.1.2 Erro de tipo essencial vencível, evitável ou inescusável

É aquele erro em que uma pessoa mais cautelosa e prudente, nas mesmas circunstâncias,
não incorreria. É um erro evitável, indesculpável ou inescusável, que uma pessoa, observando o
dever de cuidado objetivo, teria evitado.

164
Considerando o exemplo anterior, imaginemos que outro estudante, menos
cauteloso, tivesse deixado seu celular carregando na tomada da sala de aula, saindo, após,
para comprar café na cantina da escola. Quando retorna, retira um celular da tomada, que,
na verdade, não era o seu aparelho, mas de sua colega, que havia colocado para carregar
em substituição ao do estudante. Todavia, não obstante e troca dos aparelhos, o celular da
colega, embora parecido, era de outro modelo e marca, diferença que uma pessoa mais
prudente teria percebido. Nesse caso, há evidente erro de tipo, pois o estudante, por conta
da falsa percepção da realidade (supõe ser seu o celular), errou em relação ao elemento
“alheio” do tipo que define o crime de furto. No entanto, nesse caso, trata-se erro de tipo
vencível, plenamente evitável porque uma pessoa mais diligente teria, nas circunstâncias,
percebido que não era seu o aparelho celular que se apossou.

Suponha-se, ainda, que o agente resolve caçar em mata próxima à zona urbana,
comumente frequentada por outras pessoas, e, ao avistar algo se movimentando atrás da
vegetação, supondo ser uma animal, efetua um disparo de arma de fogo. Todavia, na
verdade, não se tratava de um animal, mas de uma pessoa que também estava caçando
no local. Trata-se de erro de tipo, pois o caçador, por conta da falsa percepção da realidade
(supôs ser um animal), errou em relação ao elemento “alguém” do tipo que define o crime
de homicídio. E, nesse caso, trata-se de erro de tipo vencível, porque, nas circunstâncias,
uma pessoa mais prudente adotaria as cautelas necessárias para se certificar que a
movimentação atrás da vegetação seria a de um animal, e não de uma pessoa.

O erro de tipo essencial vencível exclui o dolo, mas não a culpa, desde que previsto em
lei o crime culposo.

14.1.3. Efeitos do erro de tipo essencial

Nos termos do art. 20, caput, do CP, o erro de tipo, seja invencível ou vencível, sempre exclui
o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.

165
Tratando-se de erro de tipo invencível, inevitável ou escusável, haverá a exclusão do dolo e
da culpa, sendo o fato atípico. Isso porque, segundo a teoria finalista da ação, o dolo e a culpa
integram a conduta, elemento do fato típico. Ausente dolo e culpa, não há conduta punível, e,
por conseguinte, não haverá fato típico.

Logo, nos exemplos relacionados ao erro de tipo invencível, o estudante, o caçador e o rapaz
que conheceu a menina numa boate onde era vedado acesso a menores de 18 anos, não seriam
responsabilizados criminalmente, diante da ausência de dolo e culpa, sendo atípicos os fatos por
eles praticados.

O erro vencível, evitável ou inescusável exclui o dolo, mas não a culpa. Se o erro poderia ter
sido evitado com emprego de diligência mínima, pode-se responsabilizar o agente pelo crime
culposo, desde que previsto em lei nessa modalidade.

Assim, se o fato for punido na modalidade culposa, o agente responderá por crime culposo.
Quando o tipo, entretanto, não admitir essa modalidade, a consequência será inexoravelmente
a exclusão do crime, já que configurará fato atípico.

No exemplo do caçador que praticava a caça em mata próxima à zona urbana, onde havia
circulação de pessoas, o agente responderá pelo crime de homicídio culposo, já que se trata de
erro de tipo vencível, que poderia ter sido evitado, se tivesse empregado um pouco mais de
cautela. Isso porque o crime de homicídio prevê a modalidade culposa (CP, art. 121, § 3º).

Se não existir previsão do delito na modalidade culposa, o fato praticado mediante erro
evitável será atípico. Assim, considerando o exemplo do jovem estudante que não empregou a
necessária diligência para identificar se o aparelho celular que se apossou era seu ou não,
restará afastado o dolo, permanecendo, no entanto, a possibilidade de responsabilização pelo
crime na modalidade culposa, já que se trata de erro de tipo vencível. Todavia, como não existe
furto na modalidade culposa, haverá exclusão do crime, já que o fato é atípico.

14.2 Erro de tipo acidental

É o erro que incide sobre dados acidentais do delito, sobre circunstâncias (qualificadoras,
agravantes e causas de aumento de pena) e elementos irrelevantes da conduta típica. Não recai,
portanto, sobre elementos essenciais do delito. Logo, no erro de tipo acidental não há exclusão
do dolo ou culpa do agente.

166
No erro de tipo acidental, o agente tem consciência do caráter criminoso da sua conduta,
mas, por erro meramente secundário, o resultado produzido não sai exatamente conforme o
desejado.

Em outras palavras, há um crime, embora com resultado não exatamente conforme o


desejado, por conta de um erro acidental. Por isso, o erro de tipo acidental não afasta a
responsabilização penal do agente.

São casos de erro acidental: a) erro sobre o objeto; b) erro sobre pessoa; c) erro na
execução (aberratio ictus); d) resultado diverso do pretendido (aberratio criminis); e) erro sobre
o nexo causal.

Erro sobre o
objeto

Resultado
diverso do Erro sobre a
pretendido Erro de tipo pessoa
(Aberratio Art. 20, §3º,
Criminis) acidental CP
Art. 74, CP

Erro na
execução
(Aberratio
ictus)
Art. 73, CP

14.2.1 Erro sobre o objeto

Há erro sobre objeto quando o sujeito supõe que sua conduta recai sobre determinada
coisa, sendo que, na realidade, ela incide sobre outra.
É o caso de o sujeito subtrair farinha pensando ser açúcar. O erro é irrelevante, pois
a tutela penal abrange a posse e a propriedade de qualquer coisa, pelo que o agente responde
por furto.

167
É o caso, ainda, do sujeito desejar subtrair joia preciosa, mas se apossar de objeto com
valor reduzido, pois banhado a ouro. O erro é irrelevante, sendo meramente acidental, não
influenciando na tipicidade da conduta do agente, pois subtraiu conscientemente coisa alheia
móvel, errando, no entanto, quanto ao objeto.

Todavia, boa parte da doutrina, considera possível, verificando-se o caso concreto, a


aplicação do princípio da insignificância, quando, por exemplo, o agente, primário e sem
antecedentes criminais, subtrai a réplica de uma joia, avaliada em R$ 10,00, supondo ser
verdadeira e de elevado valor.

14.2.2 Erro sobre a pessoa

Ocorre quando há erro de representação, em face do qual o sujeito atinge uma pessoa
supondo tratar-se da que pretendia ofender. Ela pretende atingir certa pessoa, vindo a ofender
outra inocente pensando tratar-se da primeira.
Nos termos do art. 20, § 3º, 2ª parte, CP reza o seguinte: “Não se consideram, neste caso”
(erro sobre pessoa), “as condições ou qualidades da vítima, senão as de pessoa contra quem o
agente queria praticar o crime”. Significa que no tocante ao crime cometido pelo sujeito não
devem ser considerados os dados subjetivos da vítima efetiva, mas sim esses dados em
relação à vítima virtual (que o agente pretendia ofender).
No erro quanto à pessoa, a vítima pretendida não corre risco de ser atingida, porque, em
tese, não estava no local no momento dos fatos. Há um erro de representação, pois o agente se
equivoca quanto à pessoa da vítima.

Exemplo:
Vinícius pretendia matar Dudu, camisa 10 e melhor jogador de futebol do time Energia,
seu adversário no campeonato do bairro. No dia de um jogo do Energia, Vinicius vê, de
costas, um jogador com a camisa 10 do time rival. Acreditando ser Dudu, efetua diversos
disparos de arma de fogo, mas, na verdade, aquele que vestia a camisa 10 era Ricardo,
adolescente que substituiria Dudu naquele jogo. Em virtude dos disparos, Ricardo
faleceu. Note-se que Vinicius pretendia matar Dudu, mas, por erro na identificação,
acabou matando Ricardo. Trata-se, pois, de erro sobre a pessoa.

168
O erro quanto à pessoa é considerado tão secundário que o próprio legislador cuidou de
assentar que, embora tenha atingido pessoa diversa (vítima efetiva), o agente responderá como
se tivesse atingido a pessoa pretendida (vítima virtual).
Conforme se extrai do art. 20, § 3º, do CP, no contexto de erro quanto à pessoa, o agente
não será isento de pena, respondendo pelo delito considerando-se as condições ou qualidades
da vítima pretendida.
Consideremos, por exemplo, a hipótese do filho desalmado, que, pretendendo matar seu
pai, que contava com 55 anos de idade, realiza disparos de arma de fogo contra o homem que
estava na varanda da residência do genitor, causando a morte deste. O filho desalmado, então,
deixa o local satisfeito, por acreditar ter concluído seu intento delitivo, mas vem a descobrir que
matara um amigo de seu pai, que contava com 65 anos de idade, que, de costas, era com
ele parecido.
Nesse caso, nos termos do art. 20, § 3º, do CP, consideram-se as condições e qualidades
da vítima pretendida. Logo, o filho desalmado responderá pelo crime de homicídio, com a
incidência da agravante de ter praticado crime contra ascendente, prevista no art. 61, II, e, 1ª
parte, do CP. Despreza-se, pois, as condições e características da pessoa atingida, ou seja, o
agente não responderá pelo crime de homicídio doloso, com a causa de aumento de pena em
razão da idade da vítima efetivamente atingida.
De outro lado, consideremos que Wilson, pretendendo matar Tobias, de 70 anos de
idade, amigo do seu pai, realiza disparos de arma de fogo contra o homem que estava na
varanda da sua residência, causando a morte deste. Wilson, então, deixa o local satisfeito, por
acreditar ter concluído seu intento delitivo, mas, logo depois, descobre que, na verdade, matara
o seu próprio pai, que estava visitando o amigo, e, de costas, era com ele parecido. Nesse
caso, o agente não responderá pelo crime de homicídio doloso, com a agravante por ter praticado
crime contra o próprio pai, pois devem ser consideradas as condições e qualidades da vítima
pretendida. E, como a vítima pretendida era Tobias, senhor de 70 anos de idade, Wilson
responderá pelo crime de homicídio, com a causa de aumento de pena em razão da idade da
vítima.
Consideremos a hipótese da mãe que, sob o efeito do estado puerperal, logo após o parto,
durante a madrugada, vai até o berçário de um hospital e, supondo ser o seu filho recém-nascido,
sufoca um bebê até a morte. Após, verifica-se que, na verdade, a criança morta não era o seu
filho, que se encontrava no berçário ao lado, mas um bebê diverso, tendo ela se equivocado,
portanto, quanto à vítima desejada. Nesse caso, como desejava, sob influência do estado

169
puerperal, matar o seu filho recém-nascido, despreza-se as condições e qualidades do bebê
efetivamente morto, devendo ser consideradas às do próprio filho. Assim, a mãe deverá
responder pelo crime de infanticídio (CP, art. 123), pois, embora tenha atingido bebê diverso, a
responsabilização penal deve ser como se tivesse matado a vítima pretendida, ou seja, seu filho.

14.2.3 Erro na execução

Aberratio ictus significa aberração no ataque ou desvio do golpe. Ocorre quando o sujeito,
pretendendo atingir uma pessoa, vem a ofender outra.
Ocorre erro na execução quando o agente, pretendendo atingir uma pessoa, por acidente
ou erro no uso dos meios de execução, acaba atingindo pessoa diversa. A relação é de “pessoa
versus pessoa” e não “crime versus crime”.
O agente não erra quanto à identidade da pessoa, mas quanto aos meios no uso dos
meios de execução do delito. Com efeito, visualiza como certa a vítima pretendida, mas, por erro
na pontaria, por exemplo, acaba atingindo pessoa diversa.
A aberratio ictus pode ocorrer quando, por acidente, o agente, ao invés de atingir a
pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Suponhamos, nesse caso, que o agente pretende
matar Wilson, deixando na sua mesa de trabalho uma xícara de café contendo veneno. Todavia,
quem toma o café é Pedro, que acaba falecendo.
Pode ocorrer também quando, por erro nos meios de execução, o agente, ao invés de
atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Exemplo: Agente pretendendo matar Wilson,
visualiza a vítima, tendo-a como certa, faz a mira e efetua o disparo, mas, no entanto, erra o alvo
pretendido, atingindo Maria, pessoa diversa, que se encontrava próxima ao local.

• Aberratio ictus com unidade simples

Ocorre a aberratio ictus com resultado único quando em face de erro na execução
somente a pessoa diversa da pretendida é atingida, resultando lesão corporal ou morte.
A consequência jurídica da conduta do agente se encontra retratada no artigo 73, 1ª parte
do Código Penal, que faz expressa remissão ao artigo 20, § 3º, do Código Penal. Ou seja, na
hipótese de erro na execução, deve-se observar o disposto no artigo 20, § 3º, do Código Penal,
segundo o qual, embora tenha atingido pessoa diversa, o agente deve receber tratamento penal
considerando-se as condições ou qualidades da pessoa pretendida (vítima virtual), desprezando-
se as condições pessoais da vítima efetivamente atingida.

170
Exemplo: agente efetua disparos em direção à vítima pretendida (vítima virtual), mas,
por erro na pontaria, acaba atingindo somente pessoa diversa, vindo a matá-la. Nesse caso,
responderá pelo delito de homicídio doloso, como se tivesse matado a vítima pretendida.

É também o caso do agente que, pretendendo matar o seu pai, efetua disparo de arma
de fogo, mas, por erro na pontaria, acaba atingindo pessoa diversa, que se encontrava próximo
ao seu genitor. Nesse caso, teríamos, em tese, tentativa de homicídio em relação ao pai, e
homicídio culposo em relação à pessoa diversa.
Todavia, como se trata de resultado único, não é possível imputar a prática de dois crimes.
Por isso, nos termos do art. 20, § 3º, do CP, deve-se considerar as condições ou qualidades da
vítima pretendida. Assim, no caso, embora tenha atingido pessoa diversa, o agente responde
como se tivesse atingido a pessoa pretendida, ou seja, como se tivesse matado o próprio pai.
Logo, responderá somente pelo crime de homicídio doloso consumado, com a incidência da
agravante de ter praticado crime contra ascendente, prevista no art. 61, II, e, 1a figura, do CP.
Consideramos, ainda, a conduta de Wilson, que, após acirrada discussão com Pedro num
evento comemorativo, efetuou disparo de arma de fogo contra a vítima pretendida. Contudo o
projétil não atingiu Pedro e sim Maria, criança que estava correndo pelo salão da festa, matando-
a. Nesse caso, Wilson deverá responder pelo crime de homicídio doloso consumado, sem a
agravante de ter praticado crime contra criança. Isso porque devem ser consideradas as condi-
ções e qualidades da vítima pretendida (Pedro) e não da pessoa efetivamente atingida (a criança
Maria).
Imaginemos, por exemplo, que Wilson, pretendendo matar a sua esposa, efetua disparos
de arma de fogo em sua direção, mas, por erro na pontaria, acaba atingindo Pedro, que reside
na casa em frente a do casal, causando-lhe a morte. Nesse caso, Wilson deverá responder pelo
crime de homicídio doloso consumado, com a qualificadora do feminicídio (CP, art. 121, § 2o,
VI), uma vez que, embora tenha acertado Pedro, o tratamento penal deve considerar as con-
dições e qualidades da vítima pretendida (esposa).
Em síntese, no erro na execução o agente não responde pelo crime na modalidade
culposa em relação à pessoa efetivamente atingida, mas pelo crime doloso, como se tivesse
praticado o crime contra a pessoa pretendida.

171
Os efeitos do erro na execução também incidem para aplicação de causas de diminuição
da pena, como, por exemplo, na hipótese de um pai efetuar disparos de arma de fogo contra
uma pessoa que horas antes praticou estupro contra a sua filha, mas, diante da sua imperícia no
manuseio de arma de fogo, erra o alvo, e atinge uma senhora de 80 anos de idade, que vem a
falecer. Nesse caso hipotético, o pai responderá pelo crime de homicídio privilegiado (CP, art.
121, § 1o), sem a causa de aumento de pena por ter atingido pessoa maior de 60 anos de idade,
considerando-se as condições e qualidades da pessoa pretendida.
Em que pese constar no art. 73 do CP que o agente responde como se tivesse praticado
crime contra a pessoa pretendida, essa regra também alcança eventual causa excludente de
ilicitude.
Em outras palavras, o tratamento penal a ser conferido ao agente deve sempre considerar
as condições ou qualidades da pessoa pretendida, inclusive quando envolve causa justificativa
ou tipo penal permissivo
Assim, se, ao repelir agressão injusta, o agente, por acidente ou erro no uso dos meios
de execução, atinge terceiro inocente, o tratamento penal deve levar em conta as condições ou
qualidades da pessoa pretendida, que, no caso, seria o autor da agressão injusta. Logo, estará
amparado pela excludente de ilicitude legítima defesa.
Imaginemos que Wilson, agindo em legítima defesa contra agressão injusta praticada por
José, atinja, por erro na execução, Maria, terceira inocente que estava passando pelo local no
momento dos fatos, causando-lhe lesões graves. Nessa situação hipotética, Wilson não será
responsabilizado criminalmente pelas lesões corporais graves provocadas em Maria, pois estará
abarcado pela legítima defesa, como se tivesse atingido o agressor injusto.

• Aberratio ictus com resultado duplo

A aberratio ictus com resultado duplo ocorre quando o agente, além de atingir a vítima
pretendida, atinge também pessoa diversa.
Nesse caso, com uma única ação, o agente produz mais de um resultado: atinge a pessoa
pretendida, e também pessoa diversa. Por essa razão, o artigo 73, 2ª parte, do Código Penal faz
expressa remissão ao artigo 70 do Código Penal, devendo ser aplicada a regra do concurso
formal de crimes.

172
Exemplo: ao pretender matar Wilson, o agente efetua um disparo, que, além de atingir
Wilson, atinge também Pedro, que se encontrava atrás da vítima pretendida. Por conta da
potência da arma utilizada, o disparo efetuado causou a morte da pessoa pretendida e também
a da pessoa diversa. Em tese, teríamos homicídio doloso em relação à vítima pretendida e
homicídio culposo em relação à pessoa diversa.

Nesse caso, nos termos do que dispõe o artigo 73, 2ª parte, do Código Penal, deve-se
aplicar a regra do artigo 70 do Código Penal, segundo o qual, se o agente com uma única ação
praticar dois ou mais crimes, deve-se considerar a pena do crime mais grave, aumentando-a de
1/6 (um sexto) até a ½ (metade).

Acidente ou erro no uso


Pessoa pretendida Pessoa diversa
dos meios de execução

Condições ou
Erro na execução Com resultado único Consideram-se qualidades da pessoa
pretendida

Com resultado duplo Concurso formal Art. 70 do CP

14.2.4 Resultado diverso do pretendido (aberratio criminis)

A aberratio criminis também resulta de acidente ou erro na execução do crime, mas em


contexto distinto da aberratio ictus.
Na aberratio criminis, o agente pretende ofender um determinado bem jurídico, mas, por
acidente ou erro na execução, acaba produzindo resultado diverso do pretendido. Na verdade, o
agente pretendia praticar um crime, mas acaba praticando crime diverso do pretendido.
Por essa razão, diz-se que na aberratio criminis há desvio do crime.
Enquanto na aberratio ictus, a relação é entre “pessoa versus pessoa”, ou seja, o agente,
pretendendo atingir uma pessoa, acaba ofendendo pessoa diversa (ou ambas), na aberratio
criminis, o agente quer atingir um bem jurídico e ofende outro bem jurídico, produzindo resultado
diverso do pretendido.

173
Exemplo: O agente, pretendo praticar o crime de dano (CP, art. 163), atira uma pedra
contra um carro. Todavia, por erro na pontaria, a pedra acabou atingindo uma pessoa que se
encontrava próxima ao local. Note-se que o agente pretendia produzir um resultado (dano no
veículo), mas acabou produzindo um resultado diverso do pretendido (lesão corporal).

• Espécies:

a) Com unidade simples ou resultado único:

Na aberratio criminis com unidade simples, o agente somente atinge o bem jurídico diverso
do pretendido. Ou seja, o agente quer atingir uma coisa, mas, por acidente ou erro no uso dos
meios de execução, ofende somente bem jurídico diverso.
Nesse caso, conforme a primeira parte do art. 74 do CP, o agente responderá pelo
resultado diverso do pretendido a título de culpa, se o fato é previsto como crime culposo.
Assim, se o agente, pretendendo atingir o veículo do desafeto, com o intuito de praticar o
crime dano, por erro na execução, não atinge o objeto, mas somente uma pessoa que se
encontrava próxima ao local, causando-lhe lesões corporais, responderá por lesão corporal
culposa (CP, art. 129, § 6º), se resultar lesão corporal; ou por homicídio culposo (CP, art. 121, §
3º, do CP), se resultar morte.
Cumpre ressaltar, por pertinente, que, se o resultado previsto como crime culposo for
menos grave ou se o crime não prever modalidade culposa, não se aplica o disposto no art. 74
do CP. Assim, se o agente efetua disparos de arma para matar a vítima, mas não o acerta e
quebra a vidraça de uma casa ou acertar um carro, deve-se desprezar a hipótese do art. 74 do
CP, respondendo por tentativa de homicídio. Primeiro, porque o crime de tentativa de homicídio
é mais grave do que o delito de dano; segundo, porque não há previsão legal de dano culposo.

b) Com unidade complexa ou resultado duplo

Na aberratio criminis com resultado duplo, o agente, além de praticar o crime pretendido,
também acaba produzindo um resultado diverso do pretendido, ou seja, com uma ação ou
omissão, acaba provocando dois resultados.
Nesse caso, como expressamente prevê a parte final do art. 74 do CP, aplica-se a regra
do concurso formal de crimes (CP, art. 70), considerando-se a pena do crime mais grave
aumentada de 1/6 até 1/2, de acordo com o número de resultados diversos produzidos.

174
Certo dia, imaginemos que o agente, com raiva do vizinho, resolva quebrar a janela da
residência dele. Para tanto, espera chegar a hora adequada e, supondo não haver ninguém na
residência, o agente arremessa com força, na direção da casa do vizinho, um enorme tijolo, que,
além de quebrar a vidraça, atinge também a nuca dele. O vizinho falece instantaneamente.
Nesse caso, o agente deverá responder por homicídio culposo em concurso formal com o crime
de dano (art. 121, § 3º, e art. 163, na forma do art. 70, todos do CP), considerando-se a pena
aplicada ao crime de homicídio culposo, já que mais grave, aumentada de 1/6.

175
14.3 Erro provocado por terceiro

O erro provocado por terceiro está previsto no art. 20, § 2o, do CP, segundo o qual
somente o terceiro que determina o erro responderá pelo delito.
Ao contrário do erro de tipo essencial, em que o agente incide no erro sobre os elementos
constitutivos do tipo legal por conta própria, no erro provocado por terceiro o agente é induzido
por alguém a ter uma falsa percepção da realidade em relação aos elementos constitutivos do
tipo legal.
Há a figura do agente provocador e do agente provocado. O agente provocador induz o
provocado a praticar determinada conduta, razão pela qual se diz que o erro não foi espontâneo,
mas em decorrência da atuação de uma terceira pessoa.
O terceiro provocador responde pelo delito na condição de autor mediato, podendo a
provocação ser dolosa ou culposa. O terceiro provocado figura como autor imediato, podendo
sua responsabilidade penal ser excluída, conforme a escusabilidade ou não do erro que incorreu.
Há provocação dolosa quando o erro é preordenado pelo terceiro, que conscientemente
induz o sujeito a incidir em erro. Neste caso, o terceiro provocador responde pelo crime a título
de dolo.
Existe determinação (ou provocação) culposa quando o terceiro provocador age com
imprudência, negligência ou imperícia. O terceiro provocador responderá a título de culpa pelo
delito decorrente da conduta do provocado.
O tratamento penal em relação ao agente provocado (autor imediato) vai depender da
escusabilidade ou não do erro ao qual foi induzido. Se o erro provocado pelo terceiro for
escusável ou inevitável, haverá exclusão do dolo e da culpa, não incidindo, portanto, qualquer
responsabilização criminal em relação ao terceiro provocado. Se o erro provocado pelo terceiro
for inescusável ou evitável, haverá exclusão do dolo, mas o terceiro provocado responderá pelo
crime na modalidade culposa, desde que prevista em lei.
Exemplo: Wilson havia alugado um apartamento parcialmente mobiliado e, após o
encerramento do contrato de locação, chamou Pedro, seu amigo, que nunca havia estado no
imóvel, para ajudá-lo com a retirada de seus pertences. Durante a mudança, Wilson garantiu a
Pedro que a televisão que se encontrava na sala era de sua propriedade e deveria ser retirada,
embora soubesse que o aparelho pertencia ao proprietário do imóvel. Ao perceber a situação, o
proprietário do imóvel registrou boletim de ocorrência contra Wesley e Sidney. Nesse caso,

176
apenas Wilson responderá por furto, pois Pedro agiu em erro de tipo escusável provocado por
terceiro, sendo atípica sua conduta.
Imaginemos outra situação. “A”, sem verificar se a arma se encontra carregada ou não,
entrega o artefato a “B”, afirmando que está sem munição, induzindo-o a acionar o gatilho. Sem
maiores cautelas, “B” acionado o gatilho, atingindo “C”, matando-o. O agente provocador “A”
responde por homicídio culposo, na condição de autor mediato. Em relação a “B”, agente
provocado, verificando-se que se trata de erro inescusável ou evitável, haverá a exclusão do
dolo, mas a responsabilização pelo crime de homicídio culposo, já que há previsão legal do crime
de homicídio na modalidade culposa.
Se o terceiro provocador e o agente provocado agirem com dolo, ambos respondem pelo
delito na modalidade dolosa.
Suponha-se que “A” faça crer a “B” que a arma se encontra descarregada, sabendo que
está carregada e querendo que “B” mate “C”. “B” percebe que a arma está carregada e, notando
a manobra ardilosa de “A”, acede à sua vontade de matar a vítima. Aciona o gatilho e mata a
vítima. Não se trata de erro provocado, uma vez que “B” não incidiu em erro. Neste caso ambos
respondem por homicídio doloso.

Imaginemos a hipótese de o terceiro provocador agir com culpa e o agente provocado agir com
dolo. Contextualizando a situação, consideremos a hipótese de “A”, supondo estar a arma
descarregada, induz “B” a efetuar disparo contra “C”. Percebendo que, no entanto, a arma estava
municiada, “B” faz a mira e efetua o disparo, causando a morte de “C”. Nesse caso, não há
propriamente erro provocado por terceiro, até porque o provocado não incorreu em erro. Também
não há concurso de pessoas, diante da ausência do liame subjetivo. Assim, “A”, que seria, em
tese, o agente provocador, responderá pelo crime de homicídio culposo, enquanto “B”
responderá pelo crime de homicídio doloso.

14.4 Questões sobre Erro de tipo

30) QUESTÃO 2 – XXV EXAME – 2018-1


Rodrigo, pela primeira vez envolvido com o aparato judicial, foi condenado definitivamente, pela
prática do crime de rixa, ao pagamento de pena exclusivamente de multa. Para pensar sobre as
consequências de seu ato, vai para local que acredita ser deserto, onde há uma linda lagoa. Ao
chegar ao local, após longa caminhada, depara-se com uma criança, sozinha, banhando-se, mas

177
verifica que ela tem dificuldades para deixar a água e, então, começa a se afogar. Apesar de ter
conhecimento sobre a situação da criança, Rodrigo nada faz, pois não sabia nadar, logo
acreditando que não era possível prestar assistência sem risco pessoal. Ao mesmo tempo, o
local era isolado e não havia autoridades públicas nas proximidades, além de Rodrigo estar sem
celular ou outro meio de comunicação para avisar sobre a situação. Cerca de 10 minutos depois,
chega ao local Marcus, que, ao ver o corpo da criança na lagoa, entra na água e retira a criança
já falecida. Nesse momento, Rodrigo verifica que a lagoa não era profunda e que a água bateria
na altura de sua cintura, não havendo risco pessoal para a prestação da assistência. Após a
perícia constatar a profundidade da lagoa, Rodrigo é denunciado pela prática do crime previsto
no Art. 135, parágrafo único, do Código Penal. Não houve composição dos danos civis, e o
Ministério Público não ofereceu proposta de transação penal, sob o argumento de que havia
vedação legal diante da condenação de Rodrigo pela prática do crime de rixa. Considerando
apenas as informações narradas, responda, na condição de advogado(a) de Rodrigo, aos itens
a seguir.
A) Existe argumento a ser apresentado pela defesa para combater o fundamento utilizado
pelo Ministério Público para não oferecer proposta de transação penal? Justifique. (Valor:
0,60)
B) Qual argumento de direito material poderia ser apresentado em busca da absolvição
do denunciado? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

31) QUESTÃO 2 – XXII EXAME – 2017-1


Em inquérito policial, Antônio é indiciado pela prática de crime de estupro de vulnerável, figurando
como vítima Joana, filha da grande amiga da Promotora de Justiça Carla, que, inclusive,
aconselhou a família sobre como agir diante do ocorrido. Segundo consta do inquérito, Antônio

178
encontrou Joana durante uma festa de música eletrônica e, após conversa em que Joana
afirmara que cursava a Faculdade de Direito, foram para um motel onde mantiveram relações
sexuais, vindo Antônio, posteriormente, a tomar conhecimento de que Joana tinha apenas 13
anos de idade. Recebido o inquérito concluído, Carla oferece denúncia em face de Antônio,
imputando-lhe a prática do crime previsto no Art. 217-A do Código Penal, ressaltando a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que, para a configuração do delito,
não se deve analisar o passado da vítima, bastando que a mesma seja menor de 14 anos.
Considerando a situação narrada, na condição de advogado(a) Antônio, responda aos itens a
seguir.
A) Existe alguma medida a ser apresentada pela defesa técnica para impedir Carla de
participar do processo? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual a principal alegação defensiva de direito material a ser apresentada em busca da
absolvição do denunciado? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

32) QUESTÃO 2 – VII EXAME – 2012-1


Larissa, senhora aposentada de 60 anos, estava na rodoviária de sua cidade quando foi
abordada por um jovem simpático e bem vestido. O jovem pediu-lhe que levasse para a cidade
de destino, uma caixa de medicamentos para um primo, que padecia de grave enfermidade.
Inocente, e seguindo seus preceitos religiosos, a Sra. Larissa atende ao rapaz: pega a caixa,
entra no ônibus e segue viagem. Chegando ao local da entrega, a senhora é abordada por
policiais que, ao abrirem a caixa de remédios, verificam a existência de 250 gramas de cocaína
em seu interior. Atualmente, Larissa está sendo processada pelo crime de tráfico de
entorpecente, previsto no art. 33 da lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006.
Considerando a situação acima descrita e empregando os argumentos jurídicos
apropriados e a fundamentação legal pertinente, responda: qual a tese defensiva aplicável
à Larissa? (valor: 1,25)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

179
33) QUESTÃO 1 – V EXAME – 2011-2
Antônio, pai de um jovem hipossuficiente preso em flagrante delito, recebe de um serventuário
do Poder Judiciário Estadual a informação de que Jorge, defensor público criminal com atribuição
para representar o seu filho, solicitara a quantia de dois mil reais para defendê-lo
adequadamente. Indignado, Antônio, sem averiguar a fundo a informação, mas confiando na
palavra do serventuário, escreve um texto reproduzindo a acusação e o entrega ao juiz titular da
vara criminal em que Jorge funciona como defensor público. Ao tomar conhecimento do ocorrido,
Jorge apresenta uma gravação em vídeo da entrevista que fizera com o filho de Antônio, na qual
fica evidenciado que jamais solicitara qualquer quantia para defendê-lo, e representa
criminalmente pelo fato. O Ministério Público oferece denúncia perante o Juizado Especial
Criminal, atribuindo a Antônio o cometimento do crime de calúnia, praticado contra funcionário
público em razão de suas funções, nada mencionando acerca dos benefícios previstos na Lei
9.099/95. Designada Audiência de Instrução e Julgamento, recebida a denúncia, ouvidas as
testemunhas, interrogado o réu e apresentadas as alegações orais pelo Ministério Público, na
qual pugnou pela condenação na forma da inicial, o magistrado concede a palavra a Vossa
Senhoria para apresentar alegações finais orais. Em relação à situação acima, responda aos
itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal
pertinente ao caso.
A) O Juizado Especial Criminal é competente para apreciar o fato em tela? (Valor: 0,30)
B) Antônio faz jus a algum benefício da Lei 9.099/95? Em caso afirmativo, qual(is)? (Valor:
0,30)
C) Antônio praticou crime? Em caso afirmativo, qual? Em caso negativo, por que razão?
(Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

34) QUESTÃO 4 – VI EXAME – 2011-3


Carlos Alberto, jovem recém-formado em Economia, foi contratado em janeiro de 2009 pela ABC
Investimentos S.A., pessoa jurídica de direito privado que tem como atividade principal a
captação de recursos financeiros de terceiros para aplicar no mercado de valores mobiliários,
com a função de assistente direto do presidente da companhia, Augusto César. No primeiro mês
de trabalho, Carlos Alberto foi informado de que sua função principal seria elaborar relatórios e

180
portfólios da companhia a serem endereçados aos acionistas com o fim de informá-los acerca
da situação financeira da ABC. Para tanto, Carlos Alberto baseava-se, exclusivamente, nos
dados financeiros a ele fornecidos pelo presidente Augusto César. Em agosto de 2010, foi
apurado, em auditoria contábil realizada nas finanças da ABC, que as informações mensalmente
enviadas por Carlos Alberto aos acionistas da companhia eram falsas, haja vista que os relatórios
alteravam a realidade sobre as finanças da companhia, sonegando informações capazes de
revelar que a ABC estava em situação financeira periclitante. Considerando-se a situação acima
descrita, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a
fundamentação legal pertinente ao caso.
A) É possível identificar qualquer responsabilidade penal de Augusto César? Se sim,
qual(is) seria(m) a(s) conduta(s) típica(s) a ele atribuída(s)? (Valor 0,45)
B) Caso Carlos Alberto fosse denunciado por qualquer crime praticado no exercício das
suas funções enquanto assistente da presidência da ABC, que argumentos a defesa
poderia apresentar para o caso? (Valor: 0,8)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

35) QUESTÃO 2 – X EXAME


Maria, mulher solteira de 40 anos, mora no Bairro Paciência, na cidade Esperança. Por conta de
seu comportamento, Maria sempre foi alvo de comentários maldosos por parte dos vizinhos;
alguns até chegavam a afirmar que ela tinha “cara de quem cometeu crime”. Não obstante tais
comentários, nunca houve prova de qualquer das histórias contadas, mas o fato é que Maria é
pessoa conhecida na localidade onde mora por ter má índole, já que sempre arruma brigas e
inimizades. Certo dia, com raiva de sua vizinha Josefa, Maria resolve quebrar a janela da
residência desta. Para tanto, espera chegar a hora em que sabia que Josefa não estaria em casa
e, após olhar em volta para ter certeza de que ninguém a observava, Maria arremessa com força,
na direção da casa da vizinha, um enorme tijolo. Ocorre que Josefa, naquele dia, não havia saído
de casa e o tijolo após quebrar a vidraça, atinge também sua nuca. Josefa falece
instantaneamente. Nesse sentido, tendo por base apenas as informações descritas no
enunciado, responda justificadamente:
É correto afirmar que Maria deve responder por homicídio doloso consumado? (Valor:
1,25)

181
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

36) QUESTÃO 2 – XXXIII EXAME


Bernardo, em 31 de dezembro de 2018, com a intenção de causar dano à loja de Bruno, seu
inimigo, arremessou uma pedra na direção de uma janela com mosaico, que tinha valor
significativo de mercado. Ocorre que, no momento da execução do crime, Bernardo errou o
arremesso e a pedra acabou por atingir Joana, funcionária que passava em frente à loja e que
não tinha sido percebida, causando-lhe lesões corporais que a impossibilitaram de trabalhar por
50 dias. A janela restou intacta. No momento do crime, não foi identificada a autoria, mas, após
investigação, em 04 de março de 2019, foi descoberto que Bernardo seria o autor do arremesso.
O Ministério Público iniciou procedimento em face de Bernardo imputando-lhe o crime de lesão
corporal de natureza culposa, figurando como vítima Joana, que apresentou representação
quando da descoberta do autor. Bruno, revoltado com o ocorrido, contratou um advogado,
conferindo-lhe procuração com poderes gerais, constando o nome do ofendido e do ofensor. O
procurador apresenta queixa-crime, em 02 de julho de 2019, imputando a prática do crime de
tentativa de dano a Bernardo. Ao tomar conhecimento da queixa-crime, Bernardo o procura,
como advogado. Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado(a)
de Bernardo, responda aos questionamentos a seguir.
A) Qual argumento de direito processual poderá ser apresentado em busca da rejeição da
queixa-crime apresentada? Justifique.
B) Qual argumento de direito material a ser apresentado para questionar o delito imputado
na queixa-crime? Justifique.
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

182
Excludente de ilicitude

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 14/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

15.1 Introdução

Com a aplicação da teoria da indiciariedade, ou da ratio cognoscendi, uma vez verificada


a presença de um fato típico, incide a presunção de que também se reveste de ilicitude. Ou seja,
o fato típico gera indício de que também é ilícito.

Todavia, trata-se de presunção relativa, ou iuris tantum, comportando a possibilidade de


demonstrar que o fato típico foi praticado amparado por uma causa de exclusão da ilicitude,
acarretando, por consequência, a exclusão do próprio crime.

O fato permanece típico, mas com a presunção da ilicitude afastada, diante da incidência
de uma causa de exclusão de ilicitude.

São causas de exclusão da antijuricidade, previstas no artigo 23 do CP:

a) Estado de necessidade;

b) legítima defesa;

c) estrito cumprimento do dever legal

d) exercício regular de direito.

15.2 Os reflexos das causas de exclusão da ilicitude no processo penal

A incidência de uma causa de exclusão da ilicitude gera reflexos desde eventual prisão
em flagrante até a fase da sentença.

183
Na verdade, comprovada a existência de uma causa de exclusão da ilicitude, não há se
falar em eventual conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva (art. 310, § 1º, do CPP).
Se recebida a denúncia, com citação do réu, após a resposta à acusação, cumpre ao juiz proferir
sentença de absolvição sumária, com base no artigo 397, I, do Código de Processo Penal; se o
processo se desenvolveu até a instrução, uma vez encerrada a produção de provas e oferecidas
as alegações finais, o juiz, até mesmo na dúvida, terá de proferir sentença absolutória, com base
no artigo 386, VI, do Código de Processo Penal.

No caso dos crimes dolosos contra a vida, encerrada a instrução da primeira fase do
procedimento do júri, se convencido da presença de uma causa excludente de ilicitude, deverá
o juiz proferir sentença de absolvição sumária, com base no artigo 415, IV, do Código de
Processo Penal.

15.3 Estado de necessidade

• Conceito
Nos termos do art. 24 do CP, estado de necessidade é a causa de exclusão da ilicitude
do fato praticado por quem, não tendo o dever legal de enfrentar o perigo atual, que não provocou
por sua vontade, sacrifica um bem jurídico alheio para salvar bem próprio ou de terceiros, cuja
perda não era razoável exigir.

Tanto o bem sacrificado quanto o bem protegido são legítimos. Há, pois, um conflito entre
interesses lícitos. Todavia, diante da situação de perigo, o legislador considera razoável sacrificar
o bem jurídico de menor valor, para preservar aquele de maior valor.

Se, por exemplo, o condutor do veículo, com a finalidade de evitar a colisão com um
pedestre, e, assim, preservar a vida humana, joga seu veículo contra outro que estava
estacionado, causando danos, estará abarcado pelo estado de necessidade. Há um conflito de
bens jurídicos legítimos: vida humana (bem protegido) e patrimônio alheio (bem sacrificado).
Todavia, não era razoável exigir-se o sacrifício da vida humana (bem de maior valor), para pre-
servar o patrimônio alheio (bem de menor valor). Por isso, embora seja típico, já que sua conduta
se adéqua ao disposto no art. 163 do CP, o fato não será ilícito, pois presente a excludente
consistente no estado de necessidade.

184
Convém destacar alguns exemplos que ilustram bem o contexto de incidência do estado
de necessidade:

Wilson ateou fogo em seu apartamento para receber o seguro correspondente. No


entanto, não conseguiu sair do imóvel pelas portas e tentou escapar pela janela, com a utilização
de uma corda. Todavia, Laura, funcionária da residência, percebendo a situação de perigo,
empurra violentamente Wilson para o lado, apossa-se da corda e consegue sair do local. Laura
agiu em estado de necessidade, em decorrência de um perigo provocado por ação humana.

Fabiano e Fernando disputam o único colete salva-vidas durante o naufrágio de um barco,


provocado por uma tempestade. Fabiano, para alcançar o único colete salva-vidas que restou
na embarcação, agride violentamente Fernando, causando-lhe lesões corporais graves. Fabiano
agiu em estado de necessidade, diante da situação de perigo decorrente de evento da natureza.

Durante um passeio pela fazenda da família, Candi caminhava com seu filho, de 5 anos
de idade, quando um touro bravo surgiu e passou a atacar a criança. Diante da situação de risco
para a integridade física do filho, Candi pegou um machado que estava no chão e passou a
golpear o animal, vindo a causar sua morte. Nesse caso, Candi agiu em estado de necessidade,
diante do perigo decorrente do comportamento de um animal.

Sávio e Felipe estavam em uma embarcação no rio Camaquã, na cidade de São Luiz
Gonzaga/RS. Sem qualquer motivo aparente, a pequena embarcação perdeu a estabilidade e
começou a virar. Sávio, que não sabia nadar, como única forma de evitar um naufrágio, empurrou
Felipe para fora da embarcação, acarretando sua morte por afogamento. Nesse caso, embora
seja típico, o fato não será ilícito, já que Sávio agiu em estado de necessidade.

Imaginemos, por exemplo, a hipótese de uma mulher que reside numa humilde casa com
seu filho de 2 anos de idade. Desempregada e sem ter familiares por perto e nem outros
conhecidos, conseguia alimentar seu filho a partir de ajudas recebidas de desconhecidos. Em
determinado dia, não mais aguentando a situação e vendo o filho chorar e ficar doente em razão
da ausência de alimentação, após não conseguir emprego ou ajuda, a aflita mãe decidiu
ingressar em um grande supermercado da região, e subtraiu dois pacotes de macarrão, com a
intenção de preparar o alimento para dar ao seu filho. Trata-se, sem dúvida, de fato formalmente
típico, mas praticado em evidente situação de perigo atual decorrente da debilidade da saúde do
filho pela falta de alimento. Trata-se, na hipótese, de furto famélico, causa de exclusão de ilicitude
pelo estado de necessidade.

185
• Requisitos

Estar em perigo atual

Ameaçar a direito próprio ou alheio

Estar em situação de perigo não causada por sua vontade

Não existir dever legal de enfrentar o perigo

Não poder evitar comportamento lesivo

Não ser exigível sacrifício do interesse ameaçado

Ter conhecimento da situação do fato justificante

a) Situação de perigo atual

Para incidir o estado de necessidade, o fato típico praticado pelo agente deve ser para se
salvar de um perigo atual, provocado por ação humana, evento da natureza ou comportamento
instintivo de um animal.

Se já ocorreu ou se é esperado no futuro, não há estado de necessidade.

b) ameaça a direito próprio ou alheio: estado de necessidade próprio e de terceiro

A expressão “direito” deve ser entendida em sentido amplo, abrangendo qualquer bem
jurídico, como a vida, a integridade física, a honra, a liberdade e o patrimônio.

A intervenção necessária pode ocorrer para salvar um bem jurídico do sujeito ou de


terceiro (estado de necessidade próprio e estado de necessidade de terceiro). No último caso,
não se exige qualquer relação jurídica específica entre o sujeito que age em estado de
necessidade e o terceiro (não se exige relação de parentesco, amizade ou subordinação entre o
agente e o terceiro necessitado).

186
c) situação de perigo não causada voluntariamente pelo sujeito

O CP determina que só pode alegar estado de necessidade quem pratica o fato para
salvar de perigo atual direito próprio ou alheio “que não provocou por sua vontade”.

A razão é lógica e coerente: a ordem jurídica não pode homologar o sacrifício de um


direito, favorecendo ou beneficiando quem já atuou contra ele ao praticar um ilícito e criar o
perigo.

Exemplo: Tício mora no 3º andar de prédio de sua propriedade. Com ele reside colega de
escritório. Com a intenção de receber seguro, Tício ateia fogo no edifício. O incêndio, porém,
assume rapidamente proporções inesperadas e bloqueia praticamente todas as saídas. Tício,
neste momento, percebendo que o colega usa uma corda para descer pela janela mata o
companheiro para pegar a corda e salvar-se. O homicídio do companheiro de escritório não
encontra no estado de necessidade causa de justificação, uma vez que Tício criara o perigo que
ensejou a situação aflitiva.

d) inexistência de dever legal de enfrentar o perigo

Determina o art. 24, § 1º, que “Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o
dever legal de enfrentar o perigo”. Assim, é indispensável que o sujeito não tenha, em face
das circunstâncias em que se conduz, o dever imposto por lei, de sofrer o risco de sacrificar o
próprio interesse jurídico.

Sempre que a lei impuser ao agente o dever de enfrentar o perigo, deve ele tentar salvar
o bem ameaçado sem destruir qualquer outro, mesmo que para isso tenha de correr os riscos
inerentes à sua função.

Exemplo: o bombeiro não pode deixar de subir a um edifício incendiado invocando a


possibilidade de sofrer queimaduras.

e) inevitabilidade do comportamento lesivo

Ao definir o estado de necessidade, o CP, exige, como pressuposto, a inexistência de um


outro meio de evitar o perigo, isto é, quando o dano produzido pelo agente for inevitável.

Significa que o agente não tem outro meio de evitar o perigo ao bem jurídico próprio ou
de terceiro que não praticar o fato necessitado. É inevitável a realização do comportamento lesivo
em face da inevitabilidade do perigo de forma diversa.

187
Se o perigo pode ser afastado por uma conduta menos lesiva, a prática do comportamento
mais lesivo não configura a excludente.

Exemplo: alguém se vê atacado por um cachorro feroz, embora possa se salvar fechando
um portão, mata o cão. Não pode alegar estado de necessidade, porquanto havia outra forma
de impedir a lesão ao seu bem jurídico (fechando o portão).

f) inexigibilidade de sacrifício do interesse ameaçado

A ponderação de bens está insculpida no final do art. 24, ao admitir o estado de


necessidade, para proteger direito próprio ou alheio “cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era
razoável exigir-se”. A admissibilidade do estado de necessidade é orientada pelo princípio da
razoabilidade.

É o requisito da proporcionalidade entre a gravidade do perigo que ameaça o bem jurídico


do agente ou alheio e a gravidade da lesão causada pelo fato necessitado. Não se admite, p.ex.,
a prática de homicídio para impedir a lesão de um patrimonial de ínfimo valor.

Somente se admite a invocação da excludente do estado de necessidade, quando para


salvar bem de maior ou igual valor ao do sacrificado. Há ponderação de bens.

• Causas de diminuição da pena – art. 24, §2º

Nos termos do artigo 24, § 2º, do Código Penal “Embora seja razoável exigir-se o sacrifício
do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços”.
Se a destruição do bem jurídico não era razoável, falta um dos requisitos do estado de
necessidade, não sendo caso, portanto, de exclusão da ilicitude, respondendo o agente pelo
delito, podendo, ao final, ter a pena diminuída de um a dois terços.
Não é razoável admitir o sacrifício de uma vida humana para salvar um objeto de elevado
valor sentimental ou patrimonial. Nesse caso, o agente responderá pelo crime de homicídio,
podendo-se cogitar a incidência da causa de diminuição da pena de um a dois terços.
Exemplo: Imaginemos que, num incêndio, o agente opte por ofender a integridade física
de uma pessoa (praticar lesão corporal grave), para salvar seu computador que contém
importantes arquivos relacionados à sua empresa. Note que não há estado de necessidade, pois,
para salvar bem de menor valor, sacrificou outro de maior valor. No caso, o agente responderá
pelo delito de lesão corporal grave, podendo-se cogitar a incidência da causa de diminuição da
pena prevista no artigo 24, § 2º, do CP.

188
• Excesso

Dá-se o nome de excesso no estado de necessidade à desnecessária intensificação da


conduta inicialmente justificada. No comportamento com que pretende defender o bem jurídico
em situação de perigo o agente vai além dos limites da proteção razoável.
Tratando-se de excesso, nota-se que o agente se encontrava em situação de
necessidade, exorbitando no uso dos meios de execução postos em ação para a defesa do bem.
O excesso pode ser doloso ou não intencional (culposo).
Há excesso doloso quando o agente supera conscientemente os limites legais. Neste
caso, responde a título de dolo pelo fato constitutivo do excesso (art. 23, parágrafo único, CP).

• Outros exemplos de estado de necessidade

a) Causar lesão corporal numa pessoa ou produzir danos materiais produzidos em propriedade
alheia para extinguir um incêndio e salvar pessoas;
b) Subtração de um carro para transportar um doente em perigo de vida ao hospital;
c) Violação de domicílio para salvar vítimas de desastres;

d) Subtração de alimentos para salvar alguém da morte por inanição (furto famélico).

15.4 Legítima defesa

• Conceito
Nos termos do art. 25 do CP, “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente
dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.

É uma causa de exclusão da ilicitude que consiste em repelir injusta agressão, atual ou
iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios necessários.

A Lei 13.964/2019 introduziu o parágrafo único ao artigo 25 do Código Penal, segundo o qual
Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também
em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a
vítima mantida refém durante a prática de crimes.”

Em que pese já se enquadrar no “caput” do artigo 25 do Código Penal, o legislador optou por
especificar a conduta do agente de segurança que se depara com agressão ou risco de agressão
a vítima mantida refém durante a prática de crimes.

189
É o caso, por exemplo, do agente de segurança efetuar disparos contra o sujeito que, durante
a prática de roubo a banco, mantém vítima refém.

• Requisitos
a) agressão injusta, atual ou iminente

Exige-se, para caracterizar a legítima defesa, a existência de uma agressão injusta, assim
considerada como sendo aquela não protegida por uma norma jurídica, isto é, decorrente de
conduta não autorizada pelo ordenamento jurídico.

Dito de outro modo, agressão é a conduta humana que ataca ou coloca em perigo um bem
jurídico, independentemente de constituir ou não um ilícito penal. Assim, é perfeitamente possível
a reação diante da hipótese de furto de uso, já que, embora não constitua fato típico, diante da
ausência do dolo de assenhoramento definitivo, configura agressão injusta contra patrimônio
alheio.

A agressão injusta deve decorrer de ação ou omissão humana. Não há legítima defesa contra
ataque instintivo e espontâneo de um animal, porque ausente consciência e vontade inerente à
agressão. Nesse caso, como vimos, o agente estará diante de uma situação de perigo,
ensejando a incidência do estado de necessidade.

Convém registrar, no entanto, que, se o agente atiça um animal, cão feroz, por exemplo, a
atacar a vítima, estaremos diante de uma agressão injusta, não em decorrência do
comportamento do animal, mas pela conduta do agente instigador, que usou o cão como
verdadeira arma ou instrumento de ataque. Nesse caso, tratando-se de agressão injusta humana
(agente que atiçou o animal a atacar), a vítima poderá praticar um fato típico, que não será ilícito,
porque estará amparada pela legítima defesa. Atual é a agressão que está acontecendo, ou seja,
quando o efetivo ataque já está em curso no momento da reação defensiva. Exemplo: a vítima
reage enquanto está sendo se desenvolvendo o ataque com uma faca.

Iminente é a que está prestes a ocorrer. Nesse caso, a agressão ainda não teve início, mas
poderá ocorrer em momento imediato. Exemplo do agressor que anuncia o ataque, e parte,
munido de uma faca, em direção à vítima para matá-la, que reage desferindo um disparo de arma
de fogo contra o agressor, fazendo cessar a agressão.

A agressão que se anuncia para o futuro (remota) e a agressão passada (pretérita) não
autoriza a legítima defesa. De fato, não se admite legítima defesa contra suposta agressão que

190
talvez nem sequer se concretize, nem tampouco em relação à agressão pretérita, pois
caracterizaria vingança.

LEMBRE-SE:

Só as pessoas humanas, portanto, praticam agressões. O ataque de animais


não enseja a legítima defesa, mas sim estado de necessidade, pois a expressão “agressão”
indica conduta humana.

Agora, se o agente instiga um cão feroz a atacar a vítima, é permitida a legítima


defesa, pois a conduta se trata de uma agressão humana praticada por meio de um
instrumento que é o animal bravo.

b) agressão a direito próprio ou de terceiro

Considerando o titular do bem jurídico sujeito à agressão, há duas formas de legítima defesa:

b.1) legítima defesa própria: ocorre quando o autor da repulsa é o próprio titular do
bem jurídico atacado ou ameaçado.

b.2) legítima defesa de terceiro: ocorre quando a repulsa visa a defender interesse
de terceiro.

Todo e qualquer bem ou interesse, seja próprio ou de terceiros, pode ser objeto de defesa.
Trata-se de um critério de solidariedade permitir a legítima defesa de bem jurídico alheio. Não
há necessidade que exista vínculo de parentesco ou amizade entre a vítima de uma agressão
injusta e aquele que agiu para defendê-la, podendo ser, inclusive, pessoa desconhecida.

Imaginemos que Pedro esteja caminhando por uma rua com iluminação precária,
relativamente escura, quando se depara com a situação de uma pessoa estar agredindo uma
moça desconhecida, com a intenção de abusá-la sexualmente. Verificando que a jovem estava
em risco e não havendo outra forma de protegê-la, pega um pedaço de madeira que estava no
chão e desfere violento golpe contra o agressor, causando-lhe lesão corporal de natureza grave.
Trata-se de fato típico, mas não ilícito, pois Pedro agiu em legítima defesa de terceiro.

191
c) Reação com os meios necessários

A legítima defesa não constitui salvo-conduto para excessos ou atos de execução. Não tem
por objeto penalizar o agressor, mas repelir injusta agressão contra um determinado bem jurídico.
Dito de outro modo, a legítima defesa consiste num mecanismo jurídico entregue ao agredido
para fazer cessar uma agressão injusta. Uma vez cessada a agressão, cessa a situação que
legitima a defesa.

Por isso, o agredido deve eleger, dentre aqueles que tem à sua disposição, o meio necessário
e menos lesivo capaz de repelir e fazer cessar a injusta agressão. Logo, os meios necessários
são aqueles eficazes e suficientes para repelir a injusta agressão que está em desenvolvimento
ou prestes a acontecer, a direito próprio ou de outrem.

Evidentemente que não se exige que o agredido empregue, no contexto da agressão injusta,
raciocínio milimétrico para verificar o meio necessário para exercer sua defesa. Com efeito,
afigura-se desarrazoado exigir que o agredido, no desenrolar do ataque, exerça uma operação
matemática rígida para medir e eleger o meio necessário e suficiente para repelir a injusta
agressão.

Não há uma regra absoluta, rígida, para se medir o acerto da escolha do meio necessário
para o exercício da defesa. Uma arma de fogo pode constituir meio necessário para repelir um
determinado ataque, mas também pode revelar excesso em relação ao contexto que envolve
outra agressão. Tudo dependerá das circunstâncias do caso concreto.

O melhor critério é o da razoabilidade e da proporcionalidade. Sempre considerando o caso


concreto, verificar se o meio empregado é diretamente proporcional à intensidade do ataque. Se
proporcional, estaremos diante da legítima defesa, desde que preenchidos os demais requisitos;
se desproporcional à intensidade do ataque, estaremos diante do excesso, que pode ser doloso
ou culposo, afastando a legitimidade da defesa.

Assim, se estiver sendo agredido por alguém munido de facão, a vítima, tendo à sua
disposição uma faca e um revólver, poderá eleger a arma de fogo para repelir e fazer cessar a
injusta agressão. Isso porque, diante do caso concreto, a arma de fogo é um meio diretamente
proporcional à intensidade do ataque.

Agora, se estiver sendo agredido por alguém desarmado, a vítima, tendo à sua disposição
uma faca e um revólver, deverá eleger a faca para repelir e fazer cessar a injusta agressão. Isso

192
porque, diante do caso concreto, a faca seria o meio diretamente proporcional à intensidade do
ataque.

d) Uso moderado dos meios necessários

Após eleger o meio necessário, o agredido deverá fazer uso moderado desses meios, assim
compreendido como sendo o suficiente para fazer cessar a agressão injusta.

Trata-se do emprego dos meios necessários dentro do limite do razoável para conter a
agressão. A proporção entre o ataque e a defesa empreendida deve ser verificada no caso
concreto, considerando-se a natureza, a gravidade da agressão e a extensão da reação.

Assim como na escolha do meio necessário, a moderação do uso desse meio também deve
observar a proporcionalidade entre a reação e a intensidade do ataque.

Assim, se a vítima está sendo atacada pelo agente munido de uma faca, poderá se utilizar
de uma arma de fogo para repelir a injusta agressão (eis o meio necessário), mas deverá agir
com moderação. Nesse caso, se um disparo foi suficiente para fazer cessar a agressão, o
ofendido não poderá efetuar o segundo disparo, sob pena de incorrer em excesso e responder
pelo resultado produzido pela desproporção da defesa em relação ao ataque.

Da mesma forma, enquanto estiver em curso a injusta agressão, a vítima poderá exercer
legitimamente sua defesa mediante reiteração de golpes com pedaço de madeira contra o
agressor até fazer cessar o ataque. Cessada a agressão, superada estará a situação de legítima
defesa. Se a vítima continuar reagindo, passará à qualidade de agressora diante do excesso no
uso do meio necessário para se defender, devendo, por isso, responder pelo excesso doloso ou
culposo, conforme o caso.

• Legítima defesa e agente de segurança pública


A Lei 13.964/2019, chamada de “Pacote Anticrime”, introduziu a figura da legítima defesa
de agentes de segurança pública, nos casos de crimes com vítima refém, incluindo um parágrafo
único no artigo 25 do Código Penal, com a seguinte redação: “Observados os requisitos previstos
no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública
que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.”

Alguns autores, não sem razão, consideram inócuo esse dispositivo, uma vez que a ação
do agente de segurança pública já estaria abarcada pela legítima defesa do caput do artigo 25
do Código Penal.

193
Trata-se, todavia, de um dispositivo que visa a assegurar, de modo específico, a atuação
de agentes de segurança no contexto de crimes com vítima mantida refém. É um instrumento
jurídico de exclusão da ilicitude que busca legitimar, com mais segurança ainda, a ação daquele
atirador de elite (sniper), por exemplo, no desenrolar de um crime, que, por haver vítima refém,
torna a situação ainda mais tensa e imprevisível.

É nesse cenário tenso e imprevisível, onde a tomada de decisão e atuação ocorre em


frações de segundos, que o legislador inseriu a legítima defesa específica como forma de conferir
maior proteção jurídica a agentes de segurança pública no desenrolar de um crime com vítima
refém.

Com a introdução do parágrafo único ao artigo 25 do Código Penal, sedimentando-se, de


forma definitiva, a posição de que o agente de segurança pública que alveja um suspeito durante
a prática de um crime atuará em legítima defesa, e não estrito cumprimento de um dever legal.

15.5 Excesso punível

É a intensificação desnecessária de uma ação inicialmente justificada. Presente o


excesso, os requisitos das descriminantes deixam de existir, devendo o agente responder pelas
desnecessárias lesões causadas ao bem jurídico ofendido.

A condição essencial para que exista excesso é a preexistência de uma situação objetiva
de legítima defesa. Deve haver uma agressão injusta, de modo que o excesso se refere aos
limites da conduta do agredido, não à sua inicial ilicitude. Por isso, chama-se de excesso à
intensificação desnecessária de uma conduta inicialmente justificada.

Os nossos tribunais admitem o excesso quer na imoderação, quer no emprego de meios


desnecessários.

Há excesso quando o agente extrapola os limites da legítima defesa, intensificando a


reação, dolosa ou culposamente, elegendo meio além do necessário ou fazendo uso imoderado
dos meios necessários para repelir a injusta agressão.

Nesse caso, embora num primeiro momento o agente estivesse sob o amparo da legítima
defesa, presente o excesso, os requisitos da excludente de ilicitude deixará de existir, devendo
o agente responder pelas desnecessárias lesões causadas ao bem jurídico ofendido.

194
O excesso pode ser doloso ou culposo.

Há excesso doloso quando o sujeito, de forma consciente, extrapola o necessário para


repelir a agressão, valendo-se de meios mais lesivos ou usando de forma imoderada os meios
que elegeu para reagir à injusta agressão.

Assim, quando o agente, para se defender de um tapa, efetua disparos de arma de fogo
contra o agressor. Ou, ainda, quando, após fazer cessar a agressão, o agente segue em diante
na reação até matar o então agressor.

Constatado o excesso doloso, o agente responde pelo resultado dolosamente. No caso,


o agente, que num primeiro momento estava em legítima defesa, responderá pelo crime de
homicídio doloso.

No excesso culposo não há intenção em extrapolar os limites da repulsa à agressão


injusta, supondo o agente ainda estar sofrendo a agressão, que, na verdade, havia cessado.
Nesse caso, o agente responderá pelo resultado produzido a título de culpa.

15.6 Estrito cumprimento do dever legal

• Conceito

Ao contrário do estado de necessidade (CP, art. 24) e da legítima defesa (CP, art. 25), o
Código Penal não dispôs sobre o conceito e requisitos do estrito cumprimento do dever legal,
relegando à doutrina e jurisprudência estabelecer as características dessa causa excludente de
ilicitude.
Estará ao abrigo do estrito cumprimento do dever legal, o agente que praticar um fato
típico em face do cumprimento de um dever observando rigorosamente os limites impostos pela
lei, de natureza penal ou não.

Exemplo: Policial que prende o agente em flagrante ou mediante cumprimento de


mandado de prisão, embora atinja o direito de liberdade e até mesmo a integridade corporal
do preso, não comete crime algum, pois, embora seja típico, o fato não será ilícito, porque
praticado dentro do estrito cumprimento de um dever imposto pela lei, como é o caso do
flagrante obrigatório (CPP, art. 301).

195
Age em estrito cumprimento do dever legal policial rodoviário federal que, aplicando
técnicas de defesa policial, causa escoriações em um infrator que resiste à prisão.
Imaginemos que, durante operação em rodovia federal, uma equipe da Polícia Rodoviária
Federal abordou o condutor de um veículo, solicitando a apresentação de sua carteira nacional
de habilitação (CNH) e do certificado de registro e licenciamento de veículo (CRLV), verificando
que se trata de veículo clonado. Ao solicitar que saísse do veículo, o condutor se negou, razão
pela qual o policial usou de força necessária para fazê-lo cumprir a ordem. A conduta do policial
está amparada pelo estrito cumprimento do dever legal.
Também age em estrito cumprimento de um dever legal o oficial de justiça que cumpre
mandado de reintegração de posse de bem imóvel de propriedade de banco público, com ordem
de arrombamento, desocupação e imissão de posse.

• Destinatário da excludente

A excludente é destinada precipuamente aos agentes que exercem atividade pública, tal
como funcionário público ou agente público que age por ordem da lei. Também alcança o
particular que exerce função pública, ainda que temporariamente, como, por exemplo, o jurado,
mesário da Justiça Eleitoral.

• Dever legal

É fundamental, para incidir essa excludente, que o dever decorra, diretamente ou


indiretamente, de lei, em sentido genérico, emanado de autoridade pública competente.
O dever pode ser imposto por qualquer lei, seja penal ou extrapenal, podendo se originar
de decreto, regulamento ou qualquer ato administrativo de caráter geral. Da mesma forma, o
dever pode emanar de decisões judiciais, já que, ao fim e ao cabo, nada mais são que a aplicação
da lei ao caso concreto.
Não se enquadram no contexto de dever legal, não incidindo, portanto, a excludente de
ilicitude, o cumprimento de dever social, moral ou religioso. Assim, não age no estrito
cumprimento do dever legal, pastor que invade domicílio a pretexto de afastar maus espíritos.

196
15.7 Exercício regular do direito

• Conceito
É o desempenho de uma atividade ou a prática de uma conduta autorizada por lei, que
torna lícito um fato típico.

O exercício de um direito, desde que regular, não pode ser, ao mesmo tempo, proibido
pelo direito.

Regular será o exercício que se contiver nos limites objetivos e subjetivos, formais e
materiais impostos pelos próprios fins do Direito. Fora desses limites, haverá o abuso de direito
e estará, portanto, excluída essa causa de justificação.

Deve-se ter, no entanto, presente que a ninguém é permitido fazer justiça pelas próprias
mãos, salvo quando a lei permite (art. 345 CP).

Qualquer direito, público ou privado, penal ou extrapenal, regulamente exercido, afasta a


antijuridicidade. Mas o exercício deve ser regular, isto é, deve obedecer a todos os requisitos
objetivos exigidos pela ordem jurídica.

Exemplo: prisão em flagrante realizada por um particular.

• Alcance
Qualquer pessoa pode exercitar um direito subjetivo ou uma faculdade prevista em lei (penal
ou extrapenal).

A CF reza que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei (art. 5º, II, CF). Disso resulta que se exclui a ilicitude nas hipóteses em que o sujeito
está autorizado a esse comportamento. Ex: prisão em flagrante por particular.

• Algumas hipóteses de exercício regular de um direito

a) Correção dos filhos

Os arts. 229 da CF, 1.566, IV, e 1.634, I, do CC, bem como o art. 22 da Lei no 8.069/1990
(ECA) atribuem aos pais o dever de guarda, sustento e educação dos filhos.

197
Os atos de correção aplicados pelos pais aos filhos, desde que evidentemente não
transbordem para o castigo físico ou tratamento cruel e degradante, guardando a necessária
razoabilidade, embora possam constituir fato típico, não serão considerados ilícitos pelo
exercício regular do direito.

Assim, quando um pai, sempre, absolutamente sempre, dentro de um critério de razoabilidade


impor ao filho castigo consistente em ficar isolado no quarto, privando sua liberdade por alguns
minutos, para pensar sobre a arte que praticou, estará no exercício regular de um direito.

O abuso ou excesso no exercício desse direito acarretará a responsabilização criminal do pai,


até porque o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que a criança e o adolescente
têm o direito de ser educado e cuidado sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou
degradante (Lei nº 8.069/1990, art. 18-A).

b) Livre manifestação de pensamento e opinião

Nos termos do art. 5o, IV, da CF “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato”.

Logo, qualquer pessoa tem o direito de expor seu pensamento ou opinião, ainda que para
criticar alguém ou determinado ato. Embora, em tese, possa ser típico por atingir a honra de
alguém, se exercido regularmente o direito da livre manifestação de pensamento ou opinião, o
fato não será ilícito.

O STJ considerou exercício regular do direito a conduta de condôminos que se insurgiram


contra a administração do condomínio, considerando que gozam da liberdade de expressar seu
descontentamento e se manifestar, chamando a atenção dos demais condôminos, desde que
minimamente embasado (STJ, APn no 737/DF, rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, j. 17-12-
2014.)

O STF liberou a realização da chamada “marcha da maconha”, evento que reúne pessoas
favoráveis à descriminalização da droga. Para os ministros, os direitos constitucionais de reunião
e de livre expressão do pensamento viabilizam esse tipo de manifestação, desde que não dirigida
a incitar ou provocar ações ilegais e iminentes (STF, ADIn no 4274/DF, rel. Min. Ayres Britto,
Tribunal Pleno, j. 23-11-2011, noticiado no Informativo no 649).

198
c) Violência esportiva

A prática de determinadas atividades esportivas produz, invariavelmente, lesões corporais,


tais como o futebol, o boxe e a luta livre.

Nesses casos, o fato típico praticado não será ilícito, desde que a conduta desenvolvida pelo
agente observe os estritos limites das regras do esporte praticado.

Imaginemos, por exemplo, uma luta de boxe, durante disputa do cinturão de ouro, Naldinho,
obedecendo rigorosamente às regras do esporte, desfere diversos socos contra Mauro,
causando lesões gravíssimas em seu adversário. Nesse caso, embora típico, o fato não será
ilícito, pois Naldinho está amparado pelo exercício regular de um direito.

Se, no entanto, o desportista não observar as regras que disciplinam o esporte praticado,
responderá pelo resultado lesivo que produzir, segundo seu dolo ou sua culpa.

Assim, se um jogador de futebol desferir um violento pontapé no rosto do adversário caído


ao solo, responderá pelo resultado produzido, qual seja, lesão corporal, já que extrapolou os
limites das regras da atividade desportiva que exercia.

d) Inviolabilidade de domicílio

Nos termos do art. 5o, XI, da CF, “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo
penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para
prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.

Logo, durante o período noturno, se não for hipótese de flagrante delito, o morador poderá
exercer o direito de não franquear a entrada da autoridade policial para prender um suspeito,
ainda que munido de mandado de busca e apreensão. Nesse caso, embora constitua, em tese,
o fato típico consistente no favorecimento pessoal (CP, art. 348), não será ilícito, porque o
morador está no exercício regular de um direito.

199
15.8 Consequências

Memoriais / Resposta à Procedimento do


apelação acusação Júri

Art. 386, CPP: Art. 397, CPP: Art. 415, CPP:


O juiz absolverá o réu, O juiz, fundamentadamente,
mencionando a causa na Após o cumprimento do
disposto no art. 396-A, e absolverá desde logo o
parte dispositiva, desde que acusado, quando:
reconheça: parágrafos, deste Código, o
juiz deverá absolver
sumariamente o acusado
quando verificar:

VI – existirem circunstâncias
que excluam o crime ou
isentem o réu de pena (arts. 20,
21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28,
todos do Código Penal), ou I - a existência manifesta de IV – demonstrada causa de
mesmo se houver fundada causa excludente da ilicitude do isenção de pena ou de
dúvida sobre sua existência; fato; exclusão do crime.

200
15.9 Questões sobre Excludente de ilicitude

37) QUESTÃO 1 – VI EXAME


Ao chegar a um bar, Caio encontra Tício, um antigo desafeto que, certa vez, o havia ameaçado
de morte. Após ingerir meio litro de uísque para tentar criar coragem de abordar Tício, Caio partiu
em sua direção com a intenção de cumprimentá-lo. Ao aproximar-se de Tício, Caio observou que
seu desafeto bruscamente pôs a mão por debaixo da camisa, momento em que achou que Tício
estava prestes a sacar uma arma de fogo para vitimá-lo. Em razão disso, Caio imediatamente
muniu-se de uma faca que estava sobre o balcão do bar e desferiu um golpe no abdome de
Tício, o qual veio a falecer. Após análise do local por peritos do Instituto de Criminalística da
Polícia Civil, descobriu-se que Tício estava tentando apenas pegar o maço de cigarros que
estava no cós de sua calça. Considerando a situação acima, responda aos itens a seguir,
empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
A) Levando-se em conta apenas os dados do enunciado, Caio praticou crime? Em caso
positivo, qual? Em caso negativo, por que razão? (Valor: 0,65)
B) Supondo que, nesse caso, Caio tivesse desferido 35 golpes na barriga de Tício, como
deveria ser analisada a sua conduta sob a ótica do Direito Penal? (Valor: 0,6)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

38) QUESTÃO 2 – VI EXAME


Hugo é inimigo de longa data de José e há muitos anos deseja matá-lo. Para conseguir seu
intento, Hugo induz o próprio José a matar Luiz, afirmando falsamente que Luiz estava se
insinuando para a esposa de José. Ocorre que Hugo sabia que Luiz é pessoa de pouca paciência
e que sempre anda armado. Cego de ódio, José espera Luiz sair do trabalho e, ao vê-lo, corre
em direção dele com um facão em punho, mirando na altura da cabeça. Luiz, assustado e sem
saber o motivo daquela injusta agressão, rapidamente saca sua arma e atira justamente no
coração de José, que morre instantaneamente. Instaurado inquérito policial para apurar as
circunstâncias da morte de José, ao final das investigações, o Ministério Público formou sua
opinião no seguinte sentido: Luiz deve responder pelo excesso doloso em sua conduta, ou seja,
deve responder por homicídio doloso; Hugo por sua vez, deve responder como partícipe de tal

201
homicídio. A denúncia foi oferecida e recebida. Considerando que você é o advogado de Hugo
e Luiz, responda:
A) Qual peça deverá ser oferecida, em que prazo e endereçada a quem? (Valor: 0,3)
B) Qual a tese defensiva aplicável a Luiz? (Valor: 0,5)
C) Qual a tese defensiva aplicável a Hugo? (Valor: 0,45)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

39) QUESTÃO 3 – 35º EXAME


Em 09 de agosto de 2021, durante uma reunião de condomínio, iniciou-se uma discussão. O
morador Paulo, lutador de vale tudo, chamou Fábio, o síndico, de ladrão. Ato contínuo, Paulo
partiu para cima de Fábio, no intuito de quebrar seu nariz com um soco. Em seguida, Fábio,
praticante de jiu jitsu, golpeou Paulo, que caiu no chão desmaiado. Paulo foi levado para o
hospital, mas foi liberado horas depois. O laudo hospitalar atestou apenas escoriações leves. Em
10 de maio de 2022, em outra reunião de condomínio, Paulo e Fábio encontraram-se novamente.
Fábio já tinha esquecido os fatos ocorridos na ocasião anterior, porque não era pessoa de
guardar rancor. No entanto, Paulo lembrou de tudo que passou, sentiu-se envergonhado perante
os demais condôminos e resolveu seguir em frente para processar Fábio criminalmente. No dia
seguinte, Paulo noticiou o ocorrido na reunião anterior à autoridade policial e apresentou o laudo
hospitalar para comprovar a lesão sofrida. Após os trâmites regulares das investigações, o
promotor de justiça com atribuição para o caso ofereceu denúncia em face Fábio como incurso
nas sanções do crime de lesão corporal leve, previsto no art. 129, caput do CP. A denúncia foi
recebida e determinada a citação do réu. Considerando as informações acima, na condição de
advogado(a) de Fábio, responda aos itens a seguir.
A) Qual tese a defesa pode alegar como preliminar? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual tese de direito material pode ser utilizada para a defesa de Fábio? Justifique.
(Valor: 0,65)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

202
Excludente de culpabilidade

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 14 e 15/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

16.1 Introdução

Doutrinariamente, a culpabilidade é considerada um juízo de censurabilidade e


reprovação social incidente sobre o fato e seu autor, como forma de se verificar a necessidade
de aplicação de uma pena.

Em outras palavras, quando pratica um fato típico e ilícito, o agente será submetido a um
juízo de censura, que incide sobre a manifestação e exteriorização da vontade do agente, a fim
de verificar a possibilidade de imposição de uma pena.

Segundo a teoria limitada da culpabilidade adotada pelo CP, os elementos da


culpabilidade são:

A imputabilidade do sujeito

Potencial consciência da ilicitude

Exigibilidade de conduta diversa

De outro lado, as causas excludentes de culpabilidade consistem na inimputabilidade, falta


de potencial consciência de ilicitude e inexigibilidade de conduta diversa.

203
Doença mental - art. 26, CP
EXCLUDENTES DE CULPABILIDADE

INIMPUTABILIDADE

Embriaguez completa e acidental -


art. 28, §1º, CP

FALTA DE POTENCIAL
CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE - art. ERRO DE PROIBIÇÃO
21, CP

Coação moral Irresistível - art. 22,


CP

INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA
DIVERSA

Obediêcia Hierárquica - art. 22, CP

16.2 Inimputabilidade

Embora o Código Penal não tenha definido o conceito de imputabilidade, afigura-se


possível extrair as suas características a partir da definição das hipóteses de inimputabilidade,
previstas nos arts. 26, caput, 27 e 28, § 1º, todos do CP.

Para fins penais, pode-se considerar a imputabilidade como sendo a possibilidade de se


atribuir a autoria ou responsabilidade por fato criminoso a alguém, maior de dezoito anos e com
higidez mental, que revelou ter capacidade de compreensão em relação ao caráter ilícito do fato,
bem como de se determinar de acordo com esse entendimento.

O Código Penal prevê como causas de inimputabilidade:

a) doença mental (CP, art. 26, caput);

b) desenvolvimento mental incompleto (CP, arts. 26, caput, e 27);

c) desenvolvimento mental retardado (CP, art. 26, caput);

204
d) menoridade (CP, art. 27); e

e) embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior (CP, art. 28, § 1o).

13.2.1 Da inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento


mental incompleto ou retardado – art. 26, caput, CP

A doença mental compreende todas as alterações mentais ou psíquicas aptas a eliminar


a capacidade de compreensão do agente, tanto de origem patológica, quanto as toxicológicas,
como, por exemplo, a demência senil, psicose traumática, causadas por alcoolismo, psicose
maníaco-depressiva, esquizofrenia, loucura, histeria, paranoia etc.

Não constitui requisito indispensável que a doença mental seja de caráter permanente,
podendo, portanto, ser transitória, desde que, ao tempo da conduta, em decorrência dessa
enfermidade mental, o agente não reúna qualquer capacidade de compreensão ou
determinação.

Isso porque, conforme consta expressamente no art. 26, caput, do CP, a inimputabilidade
deve ser verificada no momento da conduta.

O critério adotado para aferir a inimputabilidade é o biopsicológico. Assim, além da doença


mental, é necessário que, em consequência desse estado biológico, o agente seja, no momento
da conduta, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento.

Em outras palavras, a doença mental retira do agente a capacidade de discernir o certo


do errado, de entender, por exemplo, que atentar contra a vida ou patrimônio de uma pessoa é
ilícito, bem como impede que o agente consiga controlar sua vontade e seu impulso. Ou seja,
retira totalmente do agente sua capacidade de compreensão e determinação.

Em decorrência disso, o doente mental com total incapacidade de compreensão e


determinação não reúne condições para suportar a fixação e execução de uma pena. Na
verdade, o portador de doença mental se revela perigoso para si e para a sociedade,
necessitando, conforme o caso, de internação em hospital de custódia ou tratamento
ambulatorial.

A segunda causa de inimputabilidade é o desenvolvimento mental incompleto. É o


desenvolvimento que ainda não encontrou a plenitude, por conta da idade cronológica do agente

205
ou à sua falta de convivência em sociedade, não tendo o agente, por isso, maturidade mental ou
emocional.

O desenvolvimento mental incompleto abrange os menores de 18 anos e os silvícolas


inadaptados ao convívio social.

Em relação aos menores de 18 anos de idade, a inimputabilidade gera presunção


absoluta, não admitindo prova em contrário, sem prejuízo, à evidência, de instauração de
procedimento para apuração de ato infracional no Juizado da Infância e Juventude, com eventual
aplicação de medida socioeducativa.

A doutrina também aponta como exemplo o silvícola inadaptado, assim considerado como
sendo aquele afastado da civilização e das regras de convívio social, arraigado à sua cultura de
forma a ignorar ou não reunir qualquer capacidade de compreensão ou determinação em relação
à ilicitude do fato.

Todavia, o fato de o agente ser índio, ainda que aparentemente não integrado, não gera,
por si só, a presunção de inimputabilidade. Com efeito, no caso do indígena, afigura-se
recomendável, considerando o caso concreto, a realização do exame antropológico, a fim de ser
verificado o grau de adaptação e compreensão das regras de convívio social e, por conseguinte,
em relação à ilicitude do fato.

A terceira causa de inimputabilidade contida no art. 26, caput, do CP, é o desenvolvimento


mental retardado, consistente na incompatibilidade com a fase da vida em que se encontra o
agente, já que abaixo do desenvolvimento mental inerente à sua idade cronológica.

Diante da sua peculiar condição, o agente com desenvolvimento retardado não reúne
aptidões cognitivas, de linguagem, motoras e sociais para compreender o caráter ilícito da sua
conduta. Estão inseridos na expressão “desenvolvimento mental retardado” os oligofrênicos nas
suas mais variadas formas, como, por exemplo, a idiotice, imbecilidade e debilidade mental, bem
como as pessoas que, por ausência ou deficiência dos sentidos, possuem deficiência psíquica.

a) Consequências do reconhecimento da inimputabilidade

Em relação à inimputabilidade pela enfermidade mental, o agente será processado e


julgado normalmente, mas, ao final, o juiz não poderá proferir sentença condenatória. Isso porque
ausente a culpabilidade, pressuposto para a aplicação da pena.

206
Nesse contexto, uma vez verificado que o agente praticou um fato típico e ilícito, sendo,
ao final, considerado inimputável por conta da sua enfermidade mental, o juiz deverá proferir
sentença absolutória imprópria, com base no artigo 386, VI, do CPP, aplicando medida de
segurança, consistente em internação em hospital de custódia ou tratamento ambulatorial, nos
termos do artigo 386, parágrafo único, inciso III, do Código de Processo Penal.

• Pergunta recorrente

Cabe absolvição sumária pela inimputabilidade pela doença mental após resposta à
acusação?
Na peça resposta à acusação, o artigo 397, II, do CPP inviabiliza que o juiz absolva
sumariamente o réu, porque teria de aplicar medida de segurança (internação em manicômio).
Isso prejudicaria o réu, porque seria internado sem lhe fosse viabilizado provar em audiência de
instrução a sua inocência. Ou seja, se proferir sentença de absolvição sumária, aplicando medida
de segurança, sem permitir que produza outras provas da sua inocência em audiência de
instrução, o juiz prejudicará o réu. Além disso, para se aferir a inimputabilidade exige produção
de provas.
Nesse caso, o juiz deverá designar audiência de instrução e julgamento e, se não for
possível absolver o réu por outro fundamento, aí sim o juiz poderá proferir sentença absolutória
imprópria, com base no artigo 386, VI, do CPP c/c art. 386, parágrafo único, III, do CPP, aplicando
medida de segurança, consistente em internação em hospital de custódia ou tratamento
ambulatorial (art. 97 do CP).

b) Capacidade reduzida - art. 26, parágrafo único, CP

É a semi-imputabilidade ou responsabilidade diminuída.

Nos casos do parágrafo único do art. 26, ingressam as doenças mentais que não
retiram do sujeito a capacidade intelectiva ou volitiva, MAS DIMINUEM essa capacidade, e
outras anormalidades psíquicas que, diminuindo o entendimento e a vontade, não constituem
doenças mentais.

Trata-se de causa de diminuição da pena. O agente responde pelo crime com pena
privativa de liberdade atenuada ou medida de segurança. E a sentença é condenatória.

207
13.2.2 Da inimputabilidade por embriaguez completa proveniente de
caso fortuito ou força maior – art. 28, § 1º

Embriaguez é a intoxicação aguda e transitória causada pelo álcool ou qualquer


substância de efeitos análogos, sejam eles entorpecentes (morfina, ópio), estimulantes (cocaína)
ou alucinógenos (ácido lisérgico), capaz de levar à exclusão da capacidade de entendimento
acerca do caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Nos termos do art. 28, II, do CP, a embriaguez voluntária ou culposa não exclui a
imputabilidade penal. Isso significa dizer que aquele que ingerir bebida alcoólica, de forma
voluntária ou culposa, poderá ser responsabilizado criminalmente, se praticar um fato típico e
ilícito. Assim, se o agente, depois de passar várias horas ingerindo bebida alcóolica
voluntariamente, pegar o seu veículo e, por conta da ausência de reflexos, acaba colidindo com
outro veículo, causando a morte de uma pessoa, responderá, a princípio, pelo crime de homicídio
culposo na condução de veículo automotor (CTB, art. 302).
A inimputabilidade pela embriaguez, com a excludente de culpabilidade, ocorre quando
se tratar de embriaguez completa e acidental, nos termos do que dispõe o art. 28, § 1o, do CP.
Logo, a embriaguez deve decorrer de caso fortuito ou força maior e, em decorrência disso, deixar
o agente, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do
fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Logo, não basta a embriaguez
acidental, sendo, ainda, necessário que, em decorrência da ingestão de substância alcoólica ou
de efeitos análogos, o agente tenha ficado, ao tempo da conduta, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito da sua conduta ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
A embriaguez é acidental quando não voluntária nem culposa. Pode ser proveniente de
caso fortuito ou força maior.
No caso fortuito, o sujeito desconhece o efeito inebriante da substância que ingere, ou
quando, desconhecendo uma particular condição fisiológica, ingere substância que possui álcool
(ou substância análoga), ficando embriagado. É o caso do agente que está tomando determinado
medicamento e ingere bebida alcóolica. A conjugação do medicamento e da bebida alcoólica
potencializa o metabolismo do agente, a ponto de deixá-lo embriagado. É também o caso do
agente que ingere determinada bebida sem saber que nela foi colocada uma substância capaz
de lhe retirar os sentidos, deixando-o embriagado, como, por exemplo, o chamado “boa noite
cinderela”.

208
É o caso, ainda, do agente que ingeriu, sem saber, bebida alcoólica, pensando tratar-se
de medicamento que costumava guardar em uma garrafa, e perdeu totalmente sua capacidade
de entendimento e de autodeterminação. Em seguida, entrou em uma farmácia e praticou um
furto. Nesse caso, será isento de pena, por estar configurada a sua inimputabilidade.
Na força maior, o agente é obrigado a ingerir bebida alcoólica. Não desejando se
embriagar nem de se exceder culposamente, o agente é forçado a ingerir bebida alcoólica. É o
caso, por exemplo, do trote acadêmico de péssimo gosto em que os veteranos obrigam, forçam
os calouros a ingerirem bebida alcoólica.
A natureza jurídica da sentença que acolhe a inimputabilidade pela embriaguez completa
a acidental é absolutória propriamente dita, sem, portanto, aplicação de qualquer medida de
segurança.
Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou força maior, é incompleta,
não há exclusão da imputabilidade. Isso porque, em decorrência da embriaguez, proveniente de
caso fortuito ou força maior, o agente, ao tempo da conduta, não possuía a plena capacidade de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Ou seja,
tinha capacidade de compreensão ou determinação, mas reduzida. A sentença será
condenatória, mas o agente, por ter a capacidade de compreensão ou determinação reduzida,
também terá a pena reduzida de um a dois terços, nos termos do art. 28, § 2o, do CP.
A embriaguez preordenada, ou dolosa, evidentemente não exclui a imputação. Pelo
contrário, não só enseja a responsabilização criminal do agente, como também constitui
circunstância agravante, devendo ser considerada pelo magistrado na segunda fase da fixação
da pena, conforme se extrai do art. 61, II, l, do CP.

Foi tese das peças do 34º e 35º exame da OAB.

16.3 Menoridade penal – art. 27 do CP

Para os menores, o CP adotou o sistema biológico.

Nos termos do art. 27 do CP, os menores de 18 anos são inimputáveis. Ao praticar um


fato típico e ilícito, não respondem por crime por ausência de imputabilidade, que exclui a
culpabilidade.

O CP prevê a presunção absoluta de inimputabilidade.

209
No caso de ser oferecida denúncia contra menor de 18 anos, a peça acusatória deve ser
rejeitada, nos termos do artigo 395, II, do CPP.

16.4 Falta de potencial consciência da ilicitude

Nos termos do artigo 21 do Código Penal, o desconhecimento da lei é inescusável. Não


se mostra possível, portanto, o agente acusado de uma infração penal alegar desconhecimento
da lei para se eximir da aplicação da lei penal. A partir da publicação da lei no Diário Oficial, há
presunção absoluta acerca do seu conhecimento.

O desconhecimento da lei não se confunde com a falta de potencial consciência da


ilicitude. A primeira guarda relação com o desconhecimento do seu texto legal, dos seus
detalhes, ao passo que a segunda se caracteriza pela ausência de conhecimento que a conduta
desenvolvida é ilícita. É nesse contexto que surge o instituto do erro de proibição.

16.4.1 Erro de proibição – Art. 21

Como vimos, a possibilidade de o agente adquirir a consciência da ilicitude do fato constitui


um dos elementos da culpabilidade; pode, no entanto, acontecer de o agente desenvolver uma
conduta supondo ser permitida ou lícita, quando, na verdade, é penalmente proibida, faltando-
lhe a potencial consciência da ilicitude do fato.

Surge, nesse cenário, o erro de proibição que, ao fim e ao cabo, constitui um erro sobre a
ilicitude do fato, para usar a expressão adotada pelo art. 21 do CP.

Com efeito, o agente desenvolve uma conduta conhecendo a realidade fática que o cerca,
tem consciência sobre o fato que está praticando; erra, no entanto, quanto à ilicitude do fato
praticado. Considera estar praticando fato permitido, mas movido por uma falsa percepção
acerca do caráter ilícito do fato típico praticado, faltando-lhe, em razão disso, a potencial
consciência da ilicitude do fato.

Exemplo: Uma mulher estrangeira, em visita ao nosso País, grávida de dois meses e
proveniente de país que não coíbe o aborto, ingeriu substância abortiva acreditando não ser
proibido fazê-lo no Brasil. A mulher não incorre em erro sobre a situação fática nem sobre
qualquer elemento do tipo que define o crime de aborto (CP, art. 124). Ou seja, tem consciência
que está ingerindo substância abortiva, com a finalidade de interromper a gravidez; erra, contudo,

210
quanto à ilicitude do fato praticado. Supõe ser lícita a conduta, quando, na verdade, é penalmente
proibida no Brasil.

Imaginemos outro exemplo: Wilson, estrangeiro que reside no Brasil há um mês, resolveu
plantar maconha no seu quintal, porque havia informações que essa substância tem efeito
medicinal em relação à doença respiratória que lhe acomete. Após ser flagrado pela polícia,
Wilson afirmou que supôs ser lícito o fato de plantar maconha para fins medicinais, já que tal
conduta era permitida em seu país de origem. Wilson não incorre em erro sobre a situação fática
nem sobre qualquer elemento do tipo que define o crime de tráfico de drogas (Lei no
11.343/2006, art. 33), mas em relação à proibição da sua conduta. De fato, tem pleno
conhecimento de que estava plantando substância entorpecente, errando, contudo, quanto à
ilicitude do fato praticado. Supõe ser lícita a conduta, quando, na verdade, é penalmente proibida
no Brasil.

Outro exemplo: Depois de jantar num restaurante, Francisco, homem de pouca cultura,
percebeu que lá havia esquecido seu celular e voltou para pegá-lo, mas não mais o encontrou.
Considerando que o dono do restaurante era responsável pelo seu prejuízo e acreditando ter o
direito de fazer justiça pelas próprias mãos, tomou para si objetos pertencentes ao
estabelecimento, supostamente de valor igual ao seu prejuízo. Francisco não incorre em erro
sobre a situação fática nem sobre qualquer elemento do tipo que define o crime de exercício
arbitrário das próprias razões (CP, art. 345), mas em relação à proibição da sua conduta. Tem
pleno conhecimento de que estava se apossando de objetos pertencentes ao dono do
restaurante, errando, contudo, quanto à ilicitude do fato praticado. Supõe ser lícita a conduta,
quando, na verdade, é penalmente proibida no Brasil.

• Formas e efeitos do erro de proibição


a) Escusável ou inevitável

No erro de proibição inevitável, escusável ou invencível, o agente, mesmo que tivesse


empregado as diligências ordinárias, considerando-se suas características pessoais, não teria a
possibilidade de adquirir a consciência da ilicitude do fato praticado, ou seja, de verificar que se
trata de conduta ilícita.

Adotando-se um critério mais objetivo para aferição da inevitabilidade do erro de proibição,


pode-se utilizar como parâmetro o conceito de erro de proibição evitável fornecido pelo próprio
Código Penal. Nos termos do art. 21, parágrafo único, do CP: “Considera-se evitável o erro se o

211
agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas
circunstâncias, ter ou atingir essa consciência”.

Nesse contexto, se o erro de proibição evitável reúne a característica de ser possível, nas
circunstâncias, ao agente ter ou atingir a consciência da ilicitude, forçoso concluir que o erro de
proibição inevitável é aquele em que o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do
fato, quando não lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.

Em outras palavras, ainda que tivesse empregado as diligências necessárias,


considerando sua condição pessoal, não seria possível ao agente a atingir a consciência da
ilicitude do fato praticado.

Diante do avanço tecnológico e da facilidade de acesso às informações, atualmente se


revela de difícil incidência a hipótese de erro de proibição inevitável. Há, de fato, diversos
mecanismos e instrumentos para se alcançar a consciência da ilicitude do fato, reduzindo
sobremaneira o alcance do erro de proibição inevitável.

De todo modo, podemos citar alguns exemplos, que, em tese, poderiam se enquadrar na
hipótese de erro de proibição indireto.

Exemplo: Um telejornal de alcance nacional informa, de forma equivocada, a aprovação


da lei que autoriza a eutanásia de doentes em estágio terminal. Não havendo nenhuma razão
para duvidar da veracidade da notícia, o agente se dirige até o hospital e desliga os aparelhos
que mantinham vivo um ente querido, que se encontrava sofrendo com a doença que o acometia
e em estágio terminal, causando-lhe a morte. Praticou fato típico e ilícito, mas lhe faltou potencial
consciência da ilicitude, incidindo o erro de proibição inevitável, cuja consequência será a
exclusão da culpabilidade. Note-se que, diante das circunstâncias do caso, ainda que
empregando diligência normal, o agente teria incorrido em erro quanto à licitude do fato praticado,
já que a notícia havia sido veiculada em telejornal de grande alcance, não havendo qualquer
razão para duvidar da veracidade da informação.

Pode-se, ainda, considerar a seguinte hipótese de erro de proibição inevitável:


Imaginemos um gaúcho bagual, que morou a vida toda na área rural, lidando no campo, onde
não há sinal de internet e as informações chegam de forma precária. Trata-se de um senhor que
cultiva as tradições gaúchas e sempre se veste com a indumentária típica, composta,
basicamente, pela camisa, lenço no pescoço, bombacha,2 guaiaca e bota. A guaiaca é uma
espécie de cinto, utilizado para guardar, dentre outras coisas, moeda, dinheiro e, antigamente,

212
até mesmo arma de fogo e munição. Havia, inclusive, a fabricação de guaiacas com local
destinado para colocar balas de revólver. Desde criança o gaúcho se vestia com a indumentária
típica, inclusive com a guaiaca cheia de munição. Imaginemos, agora, que esse gaúcho, depois
de muito tempo, resolva ir para a cidade. Para tanto, veste-se com a sua melhor indumentária e
segue para a cidade com a guaiaca repleta de balas de revólver, quando, de repente, é abordado
pela polícia e preso em flagrante pela prática do delito de porte ilegal de munição (Lei no
10.826/2003, art. 14). Nesse caso, considerando-se as circunstâncias do caso concreto, o perfil
subjetivo do agente, bem como suas características pessoais, pode-se concluir que, mesmo
adotando todas as diligências, não teria condições de adquirir a consciência de que a sua
conduta era penalmente proibida. De fato, o gaúcho considerava firmemente que portar munição
era permitido (até porque fez isso praticamente a vida toda), mas, na verdade, era proibido.
Faltou a ele potencial consciência da ilicitude do fato. Trata-se de erro de proibição inevitável,
causa excludente de culpabilidade, devendo, pois, o bagual ser isento de pena.

O erro de proibição inevitável, escusável ou invencível exclui a culpabilidade do agente,


por força da falta de potencial consciência de ilicitude. Com efeito, nos termos do art. 21, 1a
parte, do CP, “O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena”.

b) Inescusável ou evitável:

O critério de aferição do erro de proibição inescusável, vencível ou evitável encontra-se


no parágrafo único do art. 21 do CP, segundo o qual “considera-se evitável o erro se o agente
atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas
circunstâncias, ter ou atingir essa consciência”.

O erro de proibição inescusável ou evitável ocorre quando o erro sobre a ilicitude do fato
não se justifica, pois, se tivesse empregado um mínimo de esforço para se informar, o agente
poderia ter adquirido a consciência da ilicitude do fato praticado.

Nesse diapasão, alguém que reside na zona urbana, com amplo acesso aos meios de
informações, não pode alegar erro inevitável em face da acusação pelo porte de munição. De
fato, se reconhecido o erro de proibição, certamente será evitável, já que era possível ao agente,
diante das circunstâncias, de, com um mínimo de esforço, atingir a consciência da ilicitude da
sua conduta.

213
Tratando-se de erro de proibição evitável, inescusável, vencível, não haverá isenção de
pena ou exclusão da culpabilidade, o agente será condenado, mas, ao final, o juiz, na terceira
fase da fixação da pena, deverá diminui-la de um sexto a um terço.

No exemplo mencionado acima, em que manteve conjunção carnal com menina de 13


anos, considerando que o fato de estarem namorando retira a ilicitude do fato, Carlos responderá
pelo crime de estupro de vulnerável (CP, art. 217-A), e, se condenado, poderá ser aplicada a ele
a causa de diminuição da pena em decorrência do erro de proibição evitável, já que, se
empregasse um mínimo de esforço cognitivo, teria a possibilidade de atingir a consciência da
ilicitude da sua conduta.

Imaginemos, ainda, que Samara recebia a pensão previdenciária da sua mãe, depositada
mensalmente em sua conta bancária, em virtude de ser procuradora dela. Após a morte da sua
mãe, Samara continuou recebendo a pensão, supondo que, por ser filha da beneficiária, esse
benefício passaria diretamente para ela. Trata-se de erro de proibição evitável, porque seria
possível, com um mínimo esforço, alcançar a percepção da ilicitude de sua conduta. Assim, Sa-
mara responderia pelo crime de apropriação indébita, incidindo, na hipótese de condenação, a
causa de diminuição da pena prevista no art. 21, caput, do CP.

Em síntese, no erro de proibição inevitável, incide causa de exclusão da culpabilidade,


sendo o agente isento de pena. No erro de proibição evitável, inescusável, vencível, não haverá
isenção de pena ou exclusão da culpabilidade, devendo o agente responder pelo delito, e, se
condenado, ter a pena diminuída de um sexto a um terço.

214
ERRO DE PROIBIÇÃO

Inevitável/escusável Evitável/inescusável

O erro é impossível Reduz a pena de 1/6 O erro poderia ter


Isenta a pena
de ser evitado à 1/3 sido evitado

• Diferença entre erro de tipo e erro de proibição

No erro de tipo essencial, previsto no artigo 20 do CP, o agente erra sobre um dos
elementos constitutivos do tipo (que nada mais são do que as expressões que integram o artigo
que define o crime.
Exemplo: Art. 121 matar alguém: essas duas expressões são elementos que constituem
o tipo penal que define o delito de homicídio).
Aqui o agente age mediante uma falsa percepção da realidade. Ou seja, nas
circunstâncias do caso concreto, ele não sabe o que faz. Se soubesse, não incorreria no erro,
porque tem ciência da ilicitude da conduta.
Exemplo: rapaz mantém conjunção carnal com menina menor de 14 anos de idade,
supondo ser ela maior de idade. Errou sobre um elemento que constitui o artigo 217-A do CP,
qual seja, “menor de 14 anos de idade”.
O erro de proibição, previsto no artigo 21 do CP, é o erro que incide sobre a ilicitude do
fato. O sujeito sabe o que faz, mas, incorrendo em erro, supõe inexistir a regra de proibição, ou
seja, supõe que pratica conduta lícita.

Exemplo: Holandês, em visita ao Brasil, porta substância entorpecente para consumo


pessoal (sabe o que faz....), supondo ser conduta lícita, já que no seu País de origem é permitido
(...mas erra sobre a ilicitude do fato).

215
Para deixar bem clara a diferença, atentem para as seguintes hipóteses:

a) Agente que porta arma de fogo verdadeira, supondo ser de brinquedo (eis a falsa
percepção da realidade). Há erro de tipo, mais especificamente em relação ao elemento “arma
de fogo”, que constitui o tipo penal que define o delito de porte ilegal de arma de fogo, previsto
no artigo 14 da Lei nº 10.826/2003. O agente não sabe o que faz (portar arma de fogo verdadeira,
pois supõe ser de brinquedo). Se soubesse, não incorreria em erro, porque sabe ou deveria
saber que se trata de conduta ilícita.

Se o erro de tipo for invencível, exclui-se o dolo e a culpa e o fato será atípico; se o erro de tipo
for vencível, exclui-se o dolo e o sujeito responde pelo delito na modalidade culposa, se tiver
previsão legal, conforme prevê o artigo 20 do CP. Como, no caso, não existe delito de porte ilegal
de arma de fogo na modalidade culposa, o fato será atípico.

b) Cidadão americano, em visita ao Brasil, porta uma arma de fogo, supondo ser conduta
lícita, já que nos Estados Unidos, especificamente na região em que reside, tal conduta é
permitida. Trata-se de erro de proibição, uma vez que o agente sabe exatamente o que está
fazendo (portar arma de fogo verdadeira), mas supõe que sua conduta é permitida pelo direito,
quando, na verdade, é ilícita. Se o erro de proibição for inevitável, haverá isenção de pena e, por
consequência, exclusão da culpabilidade; se for evitável, o agente responde pelo delito previsto
no artigo 14 da Lei nº 10.826/2003, com redução da pena de 1/6 a 1/3, nos termos do artigo 21
do Código Penal.

216
ERRO DE TIPO ERRO DE PROIBIÇÃO

CIDADÃO AMERICANO
PORTAR ARMA DE
PORTAR ARMA DE
FOGO VERDADEIRA,
FOGO NO BRASIL
SUPONDO SER DE
SUPONDO SER
BRINQUEDO
CONDUTA LÍCITA

AGENTE NÃO SABE O AGENTE SABE O QUE


CAUSA
QUE FAZ FAZ
CAUSA
EXCLUDENTE DE
EXCLUDENTE DE
TIPICIDADE
CULPABILIDADE

SE SOUBESSE, NÃO
INCORRERIA EM ERRO, SUPÕE QUE SUA
POIS SABE SER CONDUTA É LÍCITA
CONDUTA ILÍCITA

SE O ERRO
SE ERRO FOR VENCÍVEL,
FOR EXCLUI O DOLO SE ERRO
E O AGENTE SE ERRO
INVENCÍVEL, FOR
RESPONDE FOR
EXCLUI O EVITÁVEL, HÁ
POR CULPA SE INEVITÁVEL,
DOLO E A REDUÇÃO DA
A CONDUTA HÁ ISENÇÃO
CULPA E O TIVER PENA DE 1/6
DE PENA
FATO SERÁ PREVISÃO NA A 1/3
ATÍPICO MODALIDADE
CULPOSA

16.5 Inexigibilidade de conduta diversa

• A exigibilidade de conduta diversa é o terceiro elemento da culpabilidade. O agente,


ao praticar a infração penal, frustra a expectativa da sociedade, pois lhe era exigido conduta
diversa daquela que deliberadamente adotou. Ou seja, o agente poderia se comportar conforme
o direito, mas optou por infringir a norma penal.
De outro lado, quando não lhe era exigível comportamento diverso, não incide o juízo de
reprovação, excluindo a culpabilidade.

E, nesse particular, as causas legais de exclusão da culpabilidade pela inexigibilidade de


conduta diversa estão previstas no artigo 22 do Código Penal, consistentes na coação moral
irresistível e a obediência hierárquica.

217
16.5.1 Coação moral irresistível – Art. 22

Nos termos do artigo 22 do Código Penal, se o fato é cometido sob coação irresistível
somente o autor da coação é punido.

Na coação moral, o agente coator, para alcançar o resultado desejado, emprega grave
ameaça contra o coagido, que, por medo de suportar um mal grave contra si ou contra outrem,
acaba realizando a conduta criminosa exigida. A coação empregada pelo agente, vicia a vontade
do coagido, retirando-lhe a exigência de se comportar de modo diferente. Nesse caso, em
relação ao coagido, incide a causa de exclusão da culpabilidade decorrente da inexigibilidade de
conduta diversa.

Exemplo: se o sujeito é coagido a assinar um documento falso, responde pelo crime de


falsidade o autor da coação. O coato não responde pelo crime, uma vez que sobre o fato incide
a causa de exclusão da culpabilidade. Assim, quando o sujeito comete o fato típico e antijurídico
sob coação moral irresistível não há culpabilidade em face da inexigibilidade de outra conduta
(não é reprovável o comportamento). A culpabilidade desloca-se da figura do coato para a do
coator.

Para ser reconhecida a causa excludente de culpabilidade pela inexigibilidade de conduta


diversa devem estar presentes o coator, o coagido e a vítima do crime praticado.

Assim, no caso de um gerente de banco, obrigado por criminosos a entregar valores que
se encontram no cofre que pode abrir, por conta da ameaça de morte do seu filho, que se
encontra em poder de um comparsa, os envolvidos são: os criminosos (coatores), o gerente do
banco (coagido) e o próprio banco, já que lesado no seu patrimônio (vítima).

Quando o sujeito pratica o fato sob coação física irresistível, não praticará crime por
ausência de conduta, aplicando-se o disposto no art. 13, caput, do CP. Trata-se de causa
excludente da tipicidade.

A coação moral deve ser irresistível. Tratando-se de coação moral resistível não há
exclusão da culpabilidade, incidindo uma circunstância atenuante (CP, art. 65, III, c, 1ª figura).

218
16.5.2 Obediência hierárquica – Art. 22

A hierarquia guarda relação com Direito Público, ou seja, com agentes públicos. Para que
os serviços públicos sejam prestados com eficiência, há necessidade de ser estabelecida uma
estrutura hierárquica em que as ordens são emanadas dos escalões superiores para serem
cumpridas pelos agentes subordinados, integrantes dos escalões menores da estrutura
administrativa.

E, como regra, as ordens emanadas dos superiores hierárquicos devem ser cumpridas
pelos subordinados, sob pena, inclusive, de constituir infração funcional, sujeita a sanções de
ordem administrativa.

Assim, o subordinado, ainda que não concorde com a ordem, deverá, a princípio, cumpri-
la. É nesse cenário que surge a exclusão da culpabilidade por força da obediência hierárquica,
uma vez que, diante de uma ordem não manifestamente ilegal, não seria exigível do subordinado
conduta diversa, que não seja cumpri-la.

Destarte, a obediência hierárquica decorre da conduta do subordinado que, por força de


ordem não manifestamente ilegal emanada por superior hierárquico, pratica fato típico e ilícito.
Trata-se de exclusão da culpabilidade, consistente na inexigibilidade de conduta diversa, prevista
no art. 22 do CP.

No caso de a ordem não ser manifestamente ilegal, embora constitua fato típico e
antijurídico, o subordinado não será culpável, em face da inexigibilidade de conduta diversa.
Diante das circunstâncias, não seria possível exigir do subordinado conduta diversa, sob pena,
inclusive, de, desobedecendo ordem não manifestamente ilegal, responder a procedimento
disciplinar.

Nesse caso, o subordinado será isento de pena, ao passo que o superior hierárquico
responderá pelo resultado produzido pelo executor. É o que se extrai do art. 22 do CP.

Imaginemos que um Delegado de Polícia Civil, mesmo sabendo que o mandado de busca
e apreensão regularmente expedido se encontra com prazo de cumprimento expirado, ordena
que Fernanda, policial civil recém-empossada, se dirija até a residência de um suspeito e cumpra
o mandado. Sem desconfiar que a diligência era ilegal, uma vez que determinada por autoridade
superior, Fernanda se desloca até a casa do suspeito, apresenta o mandado de busca e
apreensão, e ingressa na residência, mesmo sem a autorização do morador. Trata-se de uma

219
ordem ilegal, já que o mandado de busca e apreensão já não tinha validade, mas, considerando
as circunstâncias, tratando-se de policial recém-empossada, pode-se cogitar da hipótese de que
essa ordem não é manifestamente ilegal. Assim, embora tenha praticado fato típico e ilícito,
Fernanda não será culpável, pois atuou por força de uma ordem não manifestamente ilegal
emanada de superior hierárquico. Nesse caso, somente o superior hierárquico responderá pelo
crime previsto no art. 22 da Lei no 13.869/2019.

Se a ordem for manifestamente ilegal, tanto o superior hierárquico, quanto o subordinado


responderão pelo delito praticado. Nesse caso, para o superior hierárquico incide a agravante
genérica descrita no art. 62, III, 1a parte, do CP. E, em relação ao subordinado, aplica-se a
atenuante prevista no art. 65, III, c, do CP.

Pedro, funcionário público do Tribunal de Justiça, tem a responsabilidade de registrar em


um livro próprio do cartório os procedimentos que estão há mais de 10 dias conclusos, permitindo
o controle dos prazos por parte de advogados. O juiz responsável, buscando evitar que terceiros
soubessem de sua demora, determina que Pedro deixe de registrar diversos processos que
estavam conclusos para sentença há vários meses. Apesar de ter conhecimento de que a
conduta não era correta, Pedro cumpriu a ordem, já que partiu de seu superior hierárquico. Nesse
caso, como se trata de ordem manifestamente ilegal, tanto Pedro quanto o juiz deverão
responder pelo crime de falsidade ideológica (CP, art. 299), podendo incidir em favor do
subordinado a atenuante prevista no art. 65, III, c, do CP, e em desfavor do superior hierárquico
a agravante do art. 62, III, do CP.

220
16.6 Questão sobre Excludente de culpabilidade

40) QUESTÃO 1 – XXXII EXAME


Gabriel, estudante de farmácia, 22 anos, descobre que seu tio Jorge possuía grave doença no
fígado, que lhe causava dores físicas. Durante seus estudos sobre medicina alternativa em livro
oficial fornecido pela faculdade pública em que estudava, vem a ler que a droga conhecida como
heroína poderia, em doenças semelhantes à de seu tio, funcionar como analgésico e aliviar a
dor do paciente. Tendo acesso ao material que sabia ser heroína e sua classificação como droga,
Gabriel, em 27 de maio de 2019, transporta e entrega o material para o tio, acreditando que,
apesar de existir a figura típica do tráfico de drogas, sua conduta seria lícita diante dos fins
medicinais. Avisou que o material deveria ser usado naquele dia, de forma imediata. No dia 29
de maio de 2019, após denúncia, policiais militares, com autorização para ingresso na residência
de Jorge, apreendem o material ilícito e descobrem que Jorge o recebera de Gabriel, mas não o

221
utilizou. Em seguida, comparecem à faculdade de Gabriel e realizam sua prisão em flagrante.
Jorge e Gabriel foram indiciados, após juntada do laudo confirmando a natureza do material, pelo
crime de tráfico de drogas (Art. 33 da Lei nº 11.343/06), mas, em razão da doença, Jorge vem a
falecer naquela mesma data. Ao tomar conhecimento dos fatos, de imediato a família de Gabriel
procura você, como advogado, para esclarecimentos. Considerando apenas as informações
expostas, responda, na condição de advogado(a) de Gabriel, aos itens a seguir.
A) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado para questionar a prisão em
flagrante de Gabriel? Justifique.
B) Existe argumento de direito material a ser apresentado em busca da absolvição de
Gabriel pelo crime pelo qual foi indiciado? Justifique.
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

222
Teoria da pena: teses subsidiárias

Aula prevista para ocorrer ao vivo nos dias 15, 16 e 20/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

17.1 Fixação da pena

• Introdução:

O estudo da pena para a 2ª fase do Exame da Ordem guarda estreita relação com as
teses subsidiárias da peça prático processual, além de ser tema recorrente nas questões
dissertativas.
Para viabilizar um estudo sistemático e articulado, não será seguida a sequência do
Código Penal, mas o caminho que o juiz deve percorrer para fixar a pena. Isso facilitará ao
candidato identificar e articular eventual tese subsidiária na peça e, ainda, viabilizará responder
às questões dissertativas de forma mais adequada.
Após buscar identificar eventual tese absolutória, deve o candidato buscar extrair do
enunciado alguma tese subsidiária, ou seja, aquela que, na hipótese de condenação, amenizará
a situação do condenado em termos de pena, regime carcerário e/ou eventuais benefícios, tais
como substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos e sursis.
Trata-se, pois, de um processo judicial de discricionariedade do juiz visando à suficiência
para prevenção e reprovação da infração penal. Com base no artigo 59 do Código Penal o
juiz, na sentença condenatória, deve:

223
a) Escolher a pena (quando cominadas alternativamente – privativa
de liberdade ou multa, como, por exemplo, no crime do artigo 135,
CP);

b) Quantificar a pena;

c) Fixar o regime inicial

d) Substituir, quando o caso, a pena de prisão.

Conforme os incisos do art. 59, CP:

I Pena privativa de liberdade

II Quantidade da pena (sistema trifásico)

Art. 68, CP
III Regime carcerário

IV Pena restritiva de direito Art. 33, CP

V* Sursis Art. 44, CP

Art. 77, CP

• Vedação do bis in idem

A vedação do bis in idem consiste na inviabilidade de uma mesma circunstância seja


considerada por mais de uma vez pelo juiz na dosimetria da pena, quer para majorá-la, quer para
reduzi-la.
Exemplo: suponha que um filho único mate os pais para ficar com todo o patrimônio da
família. Trata-se de motivo torpe, previsto como qualificadora do crime de homicídio (CP, art.
121, § 2º, I, do CP), sendo também como agravante genérica (CP, art. 61, II, “a”). Além disso, o
artigo 59 do CP prevê como circunstância judicial o motivo pelo qual o crime foi praticado. Vê-

224
se, pois, que, a princípio, a motivação torpe do crime se enquadra em três dispositivos da lei
penal, servindo, em tese, de forma simultânea, como qualificadora, agravante e circunstância
judicial.
Todavia, considerando a proibição do bis in idem, a solução, no caso mencionado, será
reconhecer o motivo torpe como qualificadora do crime, porquanto se trata de dispositivo
específico, enquanto as agravantes do art. 61 do Código Penal e as circunstâncias judiciais do
art. 59 do Código Penal são genéricas, incidindo, apenas, quando não coincidirem com outras
causas.
Isso vale para causas de aumento e diminuição da pena que funcionem, simultaneamente,
como agravante ou atenuante. Por ser específico, prevalece a causa de aumento ou diminuição
da pena em detrimento da agravante ou atenuante genérica.
Da leitura do artigo 68 do Código Penal, verifica-se que, em relação à pena privativa de
liberdade, a legislação penal adotou o critério trifásico: “A pena-base será fixada atendendo-se
ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes
e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento”.

17.1.1 Primeira fase

DICA MISSIONEIRA

Aqui o teu negócio é sustentar pena-base no mínimo legal, criaturaaaa de Deus...

As circunstâncias judiciais são as que envolvem o crime, nos aspectos objetivo e subjetivo,
extraídas da livre apreciação do juiz, desde que respeitados os parâmetros fixados pelo
legislador no art. 59 do Código Penal, constituindo efeito residual das circunstâncias legais.

A fixação da pena-base leva em conta a análise das circunstâncias judiciais previstas no


artigo 59 do Código Penal. São chamadas de circunstâncias judiciais porque, na fixação da pena-
base, o juiz detém amplo grau de discricionariedade.

Todavia, em que pese o grau de discricionariedade, o juiz, nessa fase, está restrito à
cominação legal da pena, devendo observar o mínimo e o máximo da pena legalmente prevista.
Em outras palavras, ainda que todas as circunstâncias judiciais sejam favoráveis ao réu, a pena-
base não poderá ficar abaixo do mínimo legal. De outro lado, se as circunstâncias judiciais forem

225
desfavoráveis ao réu, não será possível ao juiz fixar a pena-base além do máximo da pena
cominada ao delito. Assim, por exemplo, em relação ao crime de furto simples (CP, art. 155,
caput), o juiz somente poderá fixar a pena-base dentro do limite de 01 (um) a 04 (quatro) anos.

Não há nenhum dispositivo legal norteando o juiz na fixação da pena-base, encarregando-


se a doutrina e a jurisprudência estabelecer critérios basilares para o montante da pena-base,
sempre ressaltando a discricionariedade do juiz.

De todo modo, se todas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal forem


favoráveis ao réu, a pena-base, como regra óbvia, deverá ser fixada no mínimo legal. Se alguma
circunstância judicial for desfavorável ao réu, o juiz está autorizado a fixar a pena-base acima do
mínimo legal.

As circunstâncias judiciais têm aplicação residual ou subsidiária, já que somente poderão


ser consideradas para fixação da pena-base se não configurarem elementares ou circunstâncias
específicas do tipo penal, como qualificadoras ou privilegiadoras, causas de aumento de pena,
agravantes ou atenuantes. Isso para evitar o bis in idem.

Assim, se, por exemplo, determinada circunstância for considerada para qualificar ou
agravar a pena, não poderá ser utilizada para elevar a pena-base como circunstância judicial
desfavorável. Logo, se foi praticado um crime de roubo contra mulher grávida, não poderá o
Magistrado considerar essa circunstância para elevar a pena-base, uma vez que será levada em
conta na segunda fase da fixação da pena como agravante genérica contida no artigo 61, II, “h”,
do Código Penal.

Em outras palavras, não se mostra possível uma mesma circunstância funcionar


simultaneamente como circunstância judicial e agravante genérica. É o que se extrai da Súmula
241 do Superior Tribunal de Justiça.

a) Antecedentes criminais

Para fins de 2ª fase da OAB, merece destaque a circunstância judicial voltada aos
antecedentes criminais, sobretudo no que se pode considerar fatos desfavoráveis ao réu.

Os antecedentes guardam relação com a vida pregressa do agente na esfera criminal.


Estão vinculados a fatos anteriores praticados pelo réu, que podem ser bons ou maus.

226
A discussão que se trava na doutrina e jurisprudência diz respeito ao que pode ser
considerado maus antecedentes.

Atualmente, prevalece o entendimento no sentido de que maus antecedentes exigem


condenação transitada em julgado que não induza reincidência. Ou seja, pressuposto para
caracterizar maus antecedentes é que o réu ostente condenação definitiva, mas que não seja
usada para agravar a pena pela reincidência.

Assim, a simples existência de inquérito policial, em curso ou arquivado, de ação penal,


em andamento ou com sentença absolutória, ou, ainda, transação penal concedida no âmbito do
Juizado Especial Criminal, bem como suspensão condicional do processo, não caracterizam
maus antecedentes.

É o que se extrai da Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “É


vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”.

Súmula 444 STJ: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso
para agravar a pena-base”.

Assim, se, por exemplo, o agente praticou novo crime antes do trânsito em julgado da
sentença penal condenatória do crime anterior, essa condenação definitiva não poderá ser usada
para fins de reincidência (cujo pressuposto é a prática de novo crime depois do trânsito em
julgado da sentença penal condenatória pelo crime anterior, conforme art. 63 do Código Penal),
mas, na dosimetria da pena do novo crime, poderá ser considerado pelo magistrado como maus
antecedentes, elevando a pena-base acima do mínimo legal.

Logo, imaginemos que o agente praticou o crime “A” em 10/05/2010. Foi julgado e a
sentença condenatória transitou em julgado em 05/08/2013. Cometeu o crime “B” em
20/07/2012; antes, portanto, do trânsito em julgado da sentença penal condenatória do crime “A”.
Nesse caso, não será reincidente, porque não enquadra no conceito do artigo 63 Código Penal,
que exige novo praticado depois da sentença definitiva do crime anterior. Nesse caso, quando o
juiz for proferir sentença pelo crime “B”, deverá, na primeira fase da fixação da pena, elevar a
pena-base por conta dos maus antecedentes.

227
Da mesma forma, se o agente ostentar mais de uma sentença condenatória transitada em
julgado, pode-se usar uma sentença para maus antecedentes (na 1ª fase de fixação da pena,
elevando a pena-base um pouco acima do mínimo legal) e a outra sentença para agravar a pena
pela reincidência (na 2ª fase de fixação da pena). Isso porque não haverá bis in idem, já que a
mesma sentença definitiva não foi usada duas vezes para agravar a situação do réu.

• Pergunta recorrente:

“Titio Nini, qual a diferença entre maus antecedentes e reincidência?”


Aí, o missioneiro respira fundo, sente vontade de dizer para o vivente que quase se matou
dando isso em aula, e candidamente responde:
Nos termos da Súmula 444 do STJ, ação penal em curso e inquérito policial instaurado
não pode ser considerado na pena para fins de maus antecedentes. Nem mesmo eventual ato
infracional praticado pelo agente quando adolescente.
Para incidir maus antecedentes, no contexto de elevação da pena-base além do mínimo
legal, é imprescindível que o agente ostente sentença penal condenatória transitada em julgado
por crime anterior, mas que não tenha sido utilizada para agravar a pena pela reincidência.
Isso porque não é possível é o juiz usar a mesma sentença condenatória transitada em
julgado para elevar a pena-base pelos maus antecedentes e também para agravar a pena pela
reincidência. É isso que retrata a Súmula 241 do STJ. Nesse caso, o juiz deverá considerar essa
sentença somente para agravar a pena pela reincidência e não a considerar para maus
antecedentes. Apenas uma observação, antecedentes criminais são circunstâncias judiciais e,
portanto, são analisados sempre na 1ª fase de fixação da pena.
Se o agente ostentar mais de uma sentença condenatória transitada em julgado, pode-se
usar uma sentença para maus antecedentes (na 1ª fase de fixação da pena, elevando a pena-
base um pouco acima do mínimo legal) e a outra sentença para agravar a pena pela reincidência
(na 2ª fase de fixação da pena). Isso porque não haverá bis in idem, já que não se usou a mesma
sentença duas vezes para agravar a situação do réu.

Exemplos:

REINCIDÊNCIA:

O agente praticou o crime A em 10/05/2010. Foi julgado e a sentença condenatória


transitou em julgado em 05/08/2013.

228
Cometeu o crime B em 20/07/2014. DEPOIS, portanto, do trânsito em julgado da
sentença penal condenatória do crime A (art. 63 CP).

Quando o juiz for proferir sentença pelo crime B, deverá, na SEGUNDA FASE DA
FIXAÇÃO DA PENA, elevar a pena pela agravante da reincidência.

MAUS ANTECEDENTES:

O agente praticou o crime A em 10/05/2010. Foi julgado e a sentença condenatória


transitou em julgado em 05/08/2013.

Cometeu o crime B em 20/07/2012. ANTES, portanto, do trânsito em julgado da sentença


penal condenatória do crime A. Logo, não será reincidente, porque não enquadra no conceito do
artigo 63 CP.

Nesse caso, quando o juiz for proferir sentença pelo crime B, deverá, na PRIMEIRA FASE
da fixação da pena elevar a pena-base por conta dos maus antecedentes.

SE O AGENTE NÃO REGISTRA SENTENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM


JULGADO, NÃO TERÁ NEM MAUS ANTECEDENTES E NEM SERÁ REINCIDENTE, NÃO
SENDO POSSÍVEL, POR ESSES MOTIVOS, O JUIZ ELEVAR A PENA.

17.1.2 Segunda fase

AGRAVANTES – art. 61 e 62 do CP AFASTAR

ATENUANTES – art. 65 e 66 do CP APONTAR

17.1.2.1. Circunstâncias agravantes - art. 61, CP


No contexto da prova da OAB, uma vez identifica eventual circunstância agravante no
enunciado, o candidato deverá desenvolver tese no sentido de que seja afastada pelo juiz.

229
No art. 61, caput, o CP emprega o advérbio “sempre”, em face do que as agravantes são
em regra de aplicação obrigatória. Em razão disso, o juiz não pode deixar de agravar a pena,
ficando o quantum da pena ao seu critério.

No art. 61, caput, o CP dispõe que as circunstâncias mencionadas “sempre agravam a


pena, quando não constituem ou qualificam o crime”. Assim, quando uma das circunstâncias
agravantes funciona como elementar ou como circunstância qualificadora não se aplica a
agravação do art. 61. De outra forma, haveria bis in idem.

Exemplo: se o sujeito pratica homicídio por motivo fútil (art. 121, § 2º, II), não incide a
agravante do art. 61, II, “a”, 1ª figura (ter sido o crime cometido por motivo fútil), pois a
circunstância genérica funciona como “qualificadora” do homicídio (qualifica o delito).

O rol das agravantes é taxativo, não admitindo ampliação.

A agravante da reincidência (CP, art. 61, I) pode incidir em crimes dolosos e culposos, já
que vinculada estritamente à pessoa do condenado.

Em relação às agravantes genéricas previstas no inc. II do art. 61 do CP, prevalece o


entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que somente incidem em relação aos
crimes dolosos e preterdolosos, não sendo possível aplicá-las aos crimes culposos, já que o
resultado involuntário característico dos delitos dessa espécie é incompatível com a necessidade
da ciência do agente da presença da circunstância agravante, para ser valorada na segunda fase
de fixação da pena.

17.1.2.1.1 Da reincidência – art. 63, CP


Conceito: é o cometimento de uma infração penal após já ter sido o agente condenado
definitivamente, no Brasil ou no exterior, por crime anterior.

A reincidência pressupõe uma sentença condenatória transitada em julgado por prática


de crime. Há reincidência somente quando o novo crime é cometido após a sentença
condenatória de que não cabe mais recurso.

Exemplo. o sujeito pratica um crime, sendo processado e condenado. Não recorre, vindo
a sentença transitar em julgado. Meses depois, vem a praticar novo crime. É considerado

230
reincidente uma vez que cometeu novo delito após o trânsito em julgado de sentença que o
condenou por prática de crime.

Deve ser após o TJ


VER DATA DO TRÂNSITO
VER DATA DO NOVO do crime anterior,
EM JULGADO DO CRIME
DELITO para configurar
ANTERIOR
reincidência!

Sentença condenatória transitada em julgado que não


MAUS
gere reincidência ou não usada para agravar a pena
ANTECEDENTES
pela reincidência

Além disso, complementando os pressupostos da reincidência, o artigo 7º da Lei de


Contravenções Penais dispõe que: “verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma
contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado, no Brasil, ou no
estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção”.

Assim, podem ocorrer várias hipóteses:

i) o agente, condenado irrecorrivelmente pela prática de um crime, vem a cometer outro


delito: é reincidente (art. 63).

ii) o agente pratica um crime; condenado irrecorrivelmente, vem a cometer uma


contravenção: é reincidente (art. 7º LCP).

iii) o sujeito pratica uma contravenção, vindo a ser condenado por sentença transitada em
julgado; comete outra contravenção: é considerado reincidente (art. 7º LCP).

iv) O sujeito comete uma contravenção; é condenado por sentença irrecorrível; pratica um
crime: não é reincidente (art. 63).

231
CRIME CRIME REINCIDENTE

CONTR. CONTR. REINCIDENTE

CRIME CONTR. REINCIDENTE

NÃO
CONTR. CRIME
REINCIDENTE

• Eficácia temporal da condenação anterior para efeito da reincidência


O CP adotou o sistema da temporariedade (art. 64, inciso I).

Se o agente vier a cometer novo crime depois de cinco anos da extinção da primeira pena,
a anterior sentença condenatória não terá força de gerar a agravação da pena, uma vez que o
réu não será considerado reincidente.

Nos termos do art. 64, inciso I, o termo a quo do prazo de 05 anos é a data:

a) do cumprimento da pena;

b) de sua extinção por outra causa;

c) do início do período de prova do sursis ou do livramento condicional sem revogação.

232
Logo, o prazo de 5 (cinco) anos começa a correr a partir do cumprimento da pena ou a
sua extinção por outro modo, como, por exemplo, incidência de uma causa extintiva da
punibilidade, como a prescrição da pretensão executória, graça ou indulto.

Convém ressaltar que, se a causa extintiva da punibilidade consistir em anistia ou abolitio


criminis, cessam todos os efeitos da sentença penal condenatória, não ensejando, portanto,
reincidência a eventual prática de novo crime.

Nos termos do artigo 64, I, do Código Penal, o período de prova do livramento condicional
e da suspensão condicional da pena será computado para fins de cessar os efeitos da
reincidência.

Assim, em tese, ao agente condenado a 06 (seis) anos de reclusão, cumprindo 1/3 (ou
seja, 02 anos), será concedido o livramento condicional (CP, art. 83, I), restando outros 04
(quatro) anos para o término da pena, que será o período de prova.

Consideremos a hipótese de o agente ter iniciado a cumprir a pena no dia 10/08/2010.


Após cumprir 1/3 da pena, dois anos, portanto, obteve o livramento condicional em 10/08/2012,
cumprindo integralmente a pena no dia 10/08/2016.

Em 10/09/2017, o agente pratica novo crime. Nesse caso, não será considerado
reincidente, pois se passaram mais de 05 (cinco) anos entre a data do cumprimento da pena e a
prática do novo crime, computando-se o período de prova do livramento condicional.

• Pergunta recorrente:

“Pode a sentença condenatória transitada em julgado pelo crime anterior, que não mais
gera reincidência, ser usada para maus antecedentes?”
O STJ entende que as condenações anteriores transitadas em julgado, alcançadas pelo
prazo de 5 anos previstos no art. 64, inciso I, do Código Penal, embora esse período afaste os
efeitos da reincidência, não o faz quanto aos maus antecedentes. Logo, não afasta maus
antecedentes.
O STF, por maioria, apreciando o tema 150 da repercussão geral, pacificou o
entendimento no sentido de que condenações criminais extintas há mais de cinco anos podem
ser consideradas como maus antecedentes para a fixação da pena-base em novo processo
criminal. Logo, "Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal
de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal"

233
Em síntese, a sentença condenatória transitada em julgado que não gera mais
reincidência pelo decurso do prazo, podendo, no entanto, ser considerada para fins de maus
antecedentes.

17.1.2.2 Circunstâncias atenuantes - art. 65


No contexto da prova da OAB, uma vez identifica eventual circunstância atenuante no
enunciado, o candidato deverá desenvolver tese no sentido de que seja reconhecida pelo juiz.

As circunstâncias atenuantes são de aplicação em regra obrigatória, pois o caput do art.


65 reza: “são circunstâncias que sempre atenuam a pena”.

Vejamos as várias atenuantes:

a) Ser o agente menor de 21, na data do fato, ou maior de 70 anos, na data da


sentença

O art. 65, I, do CP prevê duas situações: a) agente menor de 21 anos à época do fato; b)
maior de 70 anos na data da sentença. Trata-se da atenuante da menoridade relativa e da
senilidade.

Para a incidência da atenuante da menoridade relativa, basta que o agente seja menor de
21 anos de idade à época do fato, independentemente da sua idade na data da sentença.

O benefício começa no dia em que o agente completa os 18 anos, incidindo até o dia
anterior àquele em que completa 21 anos, aplicando-se a teoria da atividade prevista no art. 4º
do CP.

A segunda parte do dispositivo prevê a atenuação da pena ao maior de 70 anos de idade,


ao tempo da sentença, não importando a data em que o fato foi praticado.

Considera-se a idade na data da publicação da sentença condenatória, quando entregue


em mãos ao escrivão e certificado no processo. A expressão sentença é empregada em sentido
amplo, compreendendo as sentenças de primeira instância e acórdãos condenatórios em face
de recurso contra sentença absolutória, e acórdãos originários, no caso de foro por prerrogativa
de função.

Tratando-se de acórdão condenatório, decorrente de reforma da sentença absolutória em


sede de segundo grau, a idade deve ser verificada na data da sessão de julgamento do recurso
de apelação interposto.

234
Sinala-se, por pertinente, que a atenuante da senilidade só será aplicada ao agente que
contar com 70 anos na data da sentença condenatória, e, não, de sua confirmação em sede de
recurso. Assim, se o agente contava com 68 anos de idade ao tempo da sentença condenatória,
atingindo 70 anos quando a decisão for confirmada em grau recursal, não incidirá a atenuante
da senilidade, já que não tinha essa idade ao tempo da sentença.

b) Desconhecimento da lei

Embora o desconhecimento da lei não isente de pena e não afaste o caráter delituoso do
fato, poderá funcionar como atenuante genérica. O crime subsiste, mas a pena será abrandada
pelo desconhecimento de determinada lei.

A atenuante genérica do art. 65, II, do CP incide por conta do elevado número de leis que
existem no nosso ordenamento jurídico. Ninguém pode alegar desconhecimento da lei para se
eximir da responsabilidade penal, mas se tolera a atenuante por conta do emaranhado de leis
existentes e a dificuldade de conhecê-las.

Tomemos como exemplo a conduta de uma pessoa simples, com pouca instrução, deixar
de prover a instrução primária de filho em idade escolar. A alegação de que desconhecia a
existência do disposto no art. 246 do CP, por si só, não se revela suficiente para eximir sua
responsabilidade penal, mas, se eventualmente condenado, pode-se cogitar da possibilidade de
aplicar a atenuante prevista no art. 65, II, do CP.

c) Ter o agente cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral

Relevante valor social ocorre quando a causa do delito diz respeito a um interesse coletivo.

Exemplo: Insatisfeito com a inoperância dos órgãos estatais de segurança, cidadão priva
a liberdade de um traficante que distribui drogas a adolescentes de uma determinada
comunidade. O cidadão responderá, nesse caso, pelo crime de sequestro (CP, art. 148), sendo
possível reconhecer, na segunda fase de fixação da pena, essa atenuante.

O motivo de relevante valor moral diz respeito a um interesse particular, interesse de


ordem pessoal.

Exemplo: Um pai priva a liberdade do estuprador da sua filha, antes de entregá-lo às


autoridades, praticando o crime de sequestro (CP, art. 148).

235
Esses motivos podem constituir causa de diminuição de pena de um crime específico,
como, por exemplo, na hipótese de homicídio privilegiado (CP, art. 121, §1º). Quando isso ocorre,
não incide a atenuante genérica. De outra forma, o agente seria beneficiado duas vezes em face
do mesmo motivo.

d) Ter o agente procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após
o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências, ou ter, antes do julgamento, reparado
o dano

A primeira parte dessa alínea, consistente “ter o agente procurado, por sua espontânea
vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências”, não
se confunde com o arrependimento eficaz (CP, art. 15).

No arrependimento eficaz, o agente esgota os atos executórios, mas, arrependido, pratica


atividade para evitar a consumação do crime. Nesse caso, o agente responderá somente pelos
atos praticados, conforme dispõe o art. 15 do CP, não incidindo, por isso, a atenuante genérica.

A atenuante genérica, por sua vez, incide após a consumação do delito. Nesse caso, após
a consumação do delito, o agente, por sua vontade e com eficiência, busca impedir ou reduzir
as consequências do delito.

O arrependimento deve ser exteriorizado ou manifestado logo após o crime, conforme


prevê o art. 65, III, b, do CP, revelando certo grau de imediatidade entre o crime praticado e a
exteriorização do arrependimento. O arrependimento deve, ainda, ser voluntário e
suficientemente eficaz para evitar ou diminuir as consequências do crime praticado.

Imaginemos o agente que, com a intenção de ofender a integridade corporal da vítima,


provoca nela lesões corporais graves (CP, art. 129, §2º), e, logo depois da consumação, passa
a arcar com os custos decorrentes do tratamento médico a que a vítima teve de ser submetida.
O Magistrado, ao proferir a sentença condenatória pelo crime de lesão corporal grave, poderá,
na segunda fase de fixação da pena, considerar a atenuante genérica.

A atenuante da reparação do dano (CP, art. 65, III, b) não se confunde com o instituto do
arrependimento posterior, previsto no art. 16 do CP, que constitui causa de diminuição da pena,
se o crime praticado pelo agente for sem violência ou grave ameaça à pessoa, e a reparação do
dano ou restituição da coisa seja realizada até o recebimento da denúncia ou queixa.

236
Como forma de evitar o bis in idem, a atenuante genérica somente incidirá se não for caso
de aplicação da causa de diminuição da pena decorrente do arrependimento posterior.

Assim, se, por exemplo, o agente praticou um crime de roubo, com emprego de violência,
mas se arrependeu e reparou o dano, não incidirá a causa de diminuição da pena, pois não
preenche todos os requisitos do art. 16 do CP, já que se trata de crime praticado com violência
ou grave ameaça. Todavia, o juiz poderá considerar esse arrependimento como circunstância
atenuante (CP, art. 65, III, b).

Da mesma forma, se o agente praticou um crime sem violência ou grave ameaça à


pessoa, mas reparou o dano somente depois do recebimento da denúncia ou queixa, não incidirá
a causa de diminuição da pena, pois não preenche todos os requisitos do art. 16 do CP, podendo,
no caso, ser aplicada a atenuante do art. 65, III, b, do CP.

e) Ter o agente cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em


cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção,
provocada por ato injusto da vítima

Coação resistível é o constrangimento suportável, que não isenta o agente coagido da


responsabilidade penal, mas, mesmo assim, funciona como atenuante genérica, visto que a
ameaça e constrangimento moral praticado pelo agente coator influenciou para a prática do
delito.

Assim, se, por exemplo, alguém subtrair coisa alheia móvel e entregar o objeto furtado ao
coator, sob pena de ter sua relação extraconjugal revelada, praticará o crime de furto, sendo
possível, no entanto, a aplicação dessa atenuante genérica. Trata-se, sem dúvida, de coação,
mas que, no caso, seria exigido ao agente resistir a ela, em vez de optar por praticar um fato
típico e ilícito.

Se a coação moral for irresistível, incidirá a causa excludente de culpabilidade prevista no


art. 22 do CP, sendo o agente coagido isento de pena, por conta da inexigibilidade de conduta
diversa.

Convém sinalar que, se a coação for resistível, o coagido responderá pelo delito, tendo a
sua pena atenuada, ao passo que o coator terá a sua pena agravada (CP, art. 62, II).

237
Nos termos do art. 22 do CP, se praticar um fato típico e ilícito em obediência a ordem não
manifestamente ilegal emanada de superior hierárquico, o agente será isento de pena, diante da
exclusão da culpabilidade. No caso, somente o superior hierárquico responderá pelo delito.

Todavia, se a ordem for manifestamente ilegal, tanto o superior hierárquico quanto o


subordinado responderão pelo crime, incidindo, em relação ao subordinado a atenuante genérica
do art. 65, III, c, do CP.

O domínio de violenta emoção pode caracterizar causa de diminuição específica, também


chamada de privilégio, como, por exemplo, no homicídio doloso (CP, art. 121, §1º) e nas lesões
corporais dolosas (CP, art. 129, §4º).

Todavia, se o agente não estiver sob o domínio, mas diante de mera influência, haverá
atenuante genérica, e não o privilégio. Além disso, o privilégio exige o requisito temporal “logo
em seguida”, o que inexiste para a incidência da atenuante.

f) Ter o agente confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do


crime

Para a incidência desta atenuante, é necessário a admissão da autoria, sendo irrelevante


a demonstração de arrependimento, pois o que a lei pretende é o esclarecimento dos fatos,
premiando o agente que coopera espontaneamente para isso com a atenuação da pena.

A confissão pode ser parcial, não sendo necessário, por exemplo, alcançar eventual
qualificadora. No aspecto temporal, a confissão pode ocorrer até o trânsito em julgado da
sentença condenatória.

Em relação à incidência da atenuante da confissão espontânea, o STJ sedimentou


entendimento no sentido de que o reconhecimento da atenuante independe se a confissão foi
integral, parcial, qualificada, meramente voluntária, condicionada, extrajudicial ou posteriormente
retratada, especialmente quando utilizada para fundamentar a condenação.

A princípio, não incide a atenuante genérica quando o réu se retrata na fase judicial da
confissão realizada na fase inquisitiva. Todavia, conforme entendimento do STJ, se as
declarações do réu na fase investigatória, em harmonia com as provas produzidas na fase judicial
sob o contraditório, serviram de base para a condenação, incidirá a atenuante da confissão
espontânea. É o que se extrai da Súmula no 545 do STJ: “Quando a confissão for utilizada para

238
a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art.65, III, d, do
CP”.

Seguindo esse raciocínio, o STJ firmou entendimento no sentido de que, se tratando do


delito de tráfico de drogas, para a incidência da atenuante genérica da confissão espontânea,
faz-se imprescindível que o agente tenha confessado a traficância, não sendo suficiente a mera
admissão da posse da substância entorpecente para consumo pessoal. É o teor da Súmula no
630 do STJ: “A incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de
entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera
admissão da posse ou propriedade para uso próprio”.

g) Ter o agente cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o


provocou

Trata-se da hipótese de crime multitudinário, como, por exemplo, agressões praticadas


por torcidas organizadas em estádios de futebol, protestos em locais públicos. Nesses casos,
uma vez identificados os agentes, todos respondem pelo delito.

Todavia, considerada a alteração transitória do ânimo do agente, em decorrência do


contexto que circunda o crime multitudinário, já que agiu sob influência de outras pessoas em
tumulto, o legislador reconheceu a possibilidade da atenuação da pena.

• Circunstâncias atenuantes inominadas - art. 66, CP


São circunstâncias que não estão previstas expressamente em lei e que servem de meios
diretivos para o juiz aplicar a pena.

Exemplo: agente que se encontra desesperado em razão de desemprego ou moléstia


grave na família.

• Concurso de Circunstâncias Agravantes e Atenuantes Genéricas


É possível incidir num mesmo fato a presença de circunstâncias agravantes e
circunstâncias atenuantes, resultando no concurso entre as duas. Nesse caso, no momento da
fixação da pena, não pode o juiz realizar mera operação aritmética, somando todas as

239
agravantes para depois diminuir das atenuantes, ou simplesmente anular uma circunstância
agravante em detrimento de uma atenuante.

Isso porque, dependendo da natureza da circunstância, uma poderá predominar em


relação a outra, viabilizando, com isso, que, na segunda fase de fixação, a exasperação ou
diminuição da pena se aproxime do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes.

Nesse caso, nos termos do art. 67 do CP, havendo concurso de agravantes e atenuantes,
o juiz deve dar preponderância às de natureza subjetiva, calcadas na personalidade do agente,
nos motivos determinantes da prática da infração e na reincidência.

Assim, se, por exemplo, o agente, reincidente, pratica um crime de roubo, mediante
coação moral resistível, o juiz terá de agravar mais do que atenuar a pena, já que a reincidência
é circunstância preponderante em relação à atenuante da coação moral resistível.

Do mesmo modo, se o agente pratica um crime de furto por relevante valor social contra
vítima enferma, o juiz terá de atenuar mais do que agravar a pena, já que o motivo determinante
do crime prepondera sobre a agravante relativa a praticar crime contra enfermo.

Se as circunstâncias se equivalem, uma neutraliza o efeito agravador ou atenuador da


outra. Assim, poderá haver compensação entre a atenuante do motivo de relevante valor moral
e a agravante da reincidência, porque ambas são preponderantes.

Da mesma forma, poderá haver compensação entre a agravante de ter praticado crime
contra enfermo e a atenuante da coação moral resistível, já que nenhuma predomina em relação
a outra, uma vez que não estão inseridas no rol do art. 67 do CP.

• Concurso entre reincidência e confissão espontânea


A circunstância atenuante da confissão espontânea não consta expressamente como
preponderante no art. 67 do CP, razão pela qual surge a discussão a respeito do seu grau de
valoração, sobretudo diante da agravante da reincidência.

Para o STF, a confissão espontânea é ato posterior ao cometimento do crime e não tem
nenhuma relação com ele, mas, tão somente, com o interesse pessoal e a conveniência do réu
durante o desenvolvimento do processo penal, motivo pelo qual não se inclui no caráter subjetivo
dos motivos determinantes do crime ou na personalidade do agente. Logo, a agravante da

240
reincidência prepondera sobre a confissão espontânea, já que esta não integra o rol do art. 67
do CP.(STF, RHC no 141519/SC, rel. Min. Marco Aurélio, 1a T., j. 31-8-2020).

O STJ adota entendimento diverso, no sentido de que, embora não conste expressamente
no art. 67 do CP, a confissão espontânea também é considerada preponderante, uma vez
inserida na personalidade do agente, que revelou interesse em contribuir para a elucidação do
fato, contribuindo com a administração da justiça (STJ, HC no 576876/SC, rel. Min. Ribeiro
Dantas, 5a T., j. 18-8-2020).

Nesse contexto, o concurso entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão


espontânea enseja o afastamento de ambas as circunstâncias, não devendo a pena ser
aumentada ou diminuída na segunda fase da dosimetria, havendo, em última análise, a
compensação entre a referida agravante e a atenuante.

Convém registrar, por pertinente, que, se tratando de réu multirreincidente, que ostenta
várias sentenças condenatórias transitadas em julgado, a agravante da reincidência prepondera
sobre a atenuante da confissão espontânea, sendo admissível a compensação proporcional
entre as circunstâncias, em estrito atendimento aos princípios da individualização da pena e da
proporcionalidade (STJ, HC no 557198/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 5-3-2020). Em
outras palavras, sendo o réu multirreincidente, o magistrado deverá, na segunda fase da
dosimetria, exasperar mais a pena do que diminui-la.

• Concurso entre reincidência e menoridade relativa


Até a entrada em vigor do Código Civil de 2002, havia entendimento pacificado no sentido
de que a atenuante da menoridade relativa se revestia de circunstância superpreponderante, já
que prevalecia sobre as demais circunstâncias.

Com a entrada em vigor no novo Código Civil, a capacidade plena para os atos da vida
civil passou a ser adquirida quando a pessoa completar 18 anos perdendo o sentido o
fundamento de que a inexperiência e a falta de maturidade do agente autorizavam tratamento
mais brando na dosimetria da pena.

Todavia, continua prevalecendo no STJ o entendimento no sentido de que a atenuante da


menoridade relativa, por estar inserida na personalidade do réu, se reveste do status de
circunstância preponderante. Assim, por exemplo, a atenuante da menoridade relativa é
preponderante em relação à agravante do meio que dificultou a defesa da vítima (STJ, HC nº
557839/ES, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 2-6-2020).

241
Além disso, conforme entendimento do STJ, a atenuante da menoridade e a agravante da
reincidência, ainda que específica, são circunstâncias legais igualmente preponderantes, sendo
devida a compensação integral entre elas, salvo se o condenado for multirreincidente (STJ, AgRg
no REsp no 1820568/MT, rel. Min. Laurita Vaz, 6a T., j. 16-6-2020).

O STF também adota o entendimento no sentido de que a exegese do disposto no art. 67


do CP impõe a compensação entre a circunstância da agravante da reincidência e atenuante da
menoridade, porquanto se cuida de circunstâncias equivalentes (STF, RHC no 174590 AgRg/SC,
rel. Min. Luiz Fux, 1a T., j. 20-12-2019).

17.1.3 Terceira fase - causas de aumento e de diminuição da pena

CAUSAS DE AUMENTO DA PENA/MAJORANTES AFASTAR

CAUSAS DE DIMINUIÇÃO DA PENA/MINORANTES APONTAR

• Diferença entre causas de aumento e de diminuição da pena e circunstâncias


qualificadoras
Na terceira e última fase de aplicação da pena, o juiz deve considerar as causas de
aumento e de diminuição da pena presentes no caso concreto. Essas causas de aumento e
de diminuição da pena podem estar previstas tanto na Parte Geral do Código Penal quanto na
Parte Especial.

São causas de facultativo ou obrigatório aumento ou diminuição da sanção penal em


quantidade fixada pelo legislador (1/3, 1/6, o dobro, metade, etc).

Na parte geral do CP encontramos, por exemplo, as seguintes causas de aumento e de


diminuição da pena: arts. 14, parágrafo único; 24, § 2º; 26, parágrafo único; 28, § 2º, 29, §1º; 60,
§ 1º; 70, caput; 71, caput; 73, 2ª parte, e 74, parte final.

Na parte especial, as causas de aumento e de diminuição da pena estão previstas, por


exemplo, nos arts. 121, §§1º e 4º, 122, parágrafo único; 127, etc...

242
Qualificadoras são as circunstâncias legais especiais ou específicas previstas na parte
especial do CP, que, agregadas à figura típica fundamental, têm função de aumentar a pena.

Quando o CP descreve uma qualificadora, expressamente menciona o mínimo e o


máximo da pena agravada.

Exemplo: art. 121, § 2º (reclusão, de 12 a 20 anos).

Quantidade de pena – sistema trifásico

1ª FASE Pena-base

Agravantes e
2ª FASE
Atenuantes

3ª FASE Majorantes e minorantes

243
17.2 Regime inicial de cumprimento de pena

Ao proferir a sentença condenatória, o juiz deve, após fixar a quantidade de pena,


determinar a espécie de regime para início de cumprimento da pena, observando as regras
previstas no artigo 33 do Código Penal e os crimes apenados com reclusão e detenção.

Fechado

RECLUSÃO Semiaberto

Aberto

Semiaberto
DETENÇÃO

Aberto

• Crimes apenados com reclusão – art. 33, § 2º


No momento de proferir a sentença, o juiz, ao se deparar com um crime apenado com
reclusão, detém, desde logo, a informação de que poderá fixar o regime inicial de cumprimento
da pena fechado, semiaberto e aberto. Deverá, no entanto, observar determinados requisitos:

• Quantidade de pena
a) Se o agente for condenado a pena superior a 08 anos deverá começar a cumpri-la em
regime fechado;

244
b) o agente não reincidente, cuja pena seja superior a 04 anos e não exceda a 08, poderá,
desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;

c) o agente não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 04 anos, poderá, desde o
início, cumpri-la em regime aberto.

Súmula 269 do STJ: “É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos


reincidentes condenados à pena igual ou inferior a 04 anos se favoráveis as circunstâncias
judiciais”.

REGIME FECHADO + 08 ANOS

REGIME SEMIABERTO + 04 ANOS até 08 ANOS PRIMÁRIO

REGIME ABERTO - 04 ANOS PRIMÁRIO/Súmula 269 STJ

• Circunstâncias judiciais para fixação do regime carcerário


Nesse ponto, merecem, ainda, destaque as súmulas 718 e 719 do STF e 440 do STJ.

Súmula 718 do STF: A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não
constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido
segundo a pena aplicada.
Súmula 719 do STF: “a imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena
aplicada permitir exige motivação idônea”.
Súmula 440 do STJ: “Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento
de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base
apenas na gravidade abstrata do delito”.

• Crimes apenados com detenção


a) Se a pena for superior a 04 anos: inicia em regime semiaberto.

b) Se a pena for igual ou inferior a 04 anos: inicia em regime aberto

c) Se o condenado for reincidente: inicia no regime mais gravoso existente, ou seja, no


semiaberto.

d) Se as circunstâncias do art. 59 do Código Penal forem desfavoráveis ao condenado:


inicia no regime mais gravoso existente, ou seja, no regime semiaberto.

245
e) importante: não existe regime inicial fechado na pena de detenção (art. 33, caput), a
qual começa obrigatoriamente em regime semiaberto ou aberto.

REGIME SEMIABERTO + 04 ANOS até 08 ANOS


REGIME ABERTO - 04 ANOS PRIMÁRIO

Convém sinalar que, em qualquer caso, o período em que o agente esteve preso
provisoriamente deve ser computado para a fixação do regime inicial de cumprimento da pena,
conforme prevê o artigo 387, § 2º, do CPP.

• Regime inicial nos crimes hediondos e equiparados


Conforme prevê o artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), os
condenados por crimes hediondos, tráfico ilícito de entorpecentes, terrorismo e tortura devem
necessariamente iniciar o cumprimento da pena em regime fechado, mesmo sendo a pena
imposta inferior a 08 anos.

Ocorre, contudo, que, no dia 27 de junho de 2012, o STF, por oito votos contra três,
declarou inconstitucional tal dispositivo, por considerar que a obrigatoriedade do regime inicial
fechado viola o princípio constitucional da individualização da pena, previsto no artigo 5º,
XLVI, CF/88. (HC 111.840/ES e Informativo 670).

246
17.3 Das penas restritivas de direitos

Nos termos do art. 44 do CP, as penas restritivas de direitos são sanções penais
substitutivas e autônomas.

As penas restritivas de direitos são substitutivas, uma vez que o juiz, depois de fixar a
pena privativa de liberdade, verificando a presença dos requisitos, realiza a substituição por uma
ou mais penas restritivas de direitos, conforme o caso. Isso porque não há, no preceito
secundário dos tipos penais incriminadores, previsão direta de pena restritiva de direitos, mas
tão somente pena privativa de liberdade e/ou multa.

Assim, se o juiz proferir sentença condenatória a réu acusado pela prática do crime de
furto, aplicando-lhe pena privativa de liberdade de dois anos de reclusão, poderá, se preenchidos
os requisitos do art. 44 do CP, substituí-la por duas penas restritivas de direitos. Nesse caso, o

247
condenado não cumprirá a pena privativa de liberdade, mas as penas restritivas de direitos
substitutivas.

A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não se aplica para
qualquer crime ou condenado. Devem ser observados os requisitos objetivos e subjetivos,
previstos no art. 44 do CP.

São requisitos cumulativos, devendo, pois, todos estarem devidamente preenchidos para
a concessão do benefício. Estando todos os requisitos presentes, o juiz deverá realizar a
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, já que constitui direito
subjetivo do condenado.

Violência
Natureza do
Doloso Sem
crime
Grave
Objetivos ameaça
Pena aplicada
Doloso
até 4 anos
Quantidade de
pena
Culposo
Qualquer
quantidade
Requisitos

Não reincidente em crime doloso


Subjetivos

Princípio da suficiência

17.3.1. Requisitos objetivos

17.3.1.1. Em relação aos crimes dolosos

a) Quantidade da pena aplicada

O legislador estabeleceu como parâmetro para a concessão da pena restritiva de direitos


a pena aplicada na sentença, sendo irrelevante a pena abstratamente cominada no preceito

248
secundário do tipo penal. Em outras palavras, deve-se considerar a pena aplicada na sentença,
independentemente da pena prevista no tipo penal.

E, nesse particular, em relação aos crimes dolosos praticados sem violência ou grave
ameaça à pessoa, será possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos, desde que a pena aplicada na sentença não seja superior a quatro anos (CP, art. 44, I,
primeira parte).

Tratando-se de concurso de crimes, deve-se levar em conta o total da pena imposta,


considerando os critérios do cúmulo material ou exasperação da pena. Dessa forma, se
aplicadas as regras do concurso material, concurso formal ou crime continuado, o total da pena
privativa de liberdade efetivamente imposta exceder a quatro anos, não será possível a
substituição por pena alternativa.

b) Natureza do crime cometido

As penas restritivas de direitos são aplicáveis aos crimes cometidos sem violência ou
grave ameaça à pessoa. Convém deixar bem registrado que a violência que impede a medida
alternativa é aquela cometida contra a pessoa, e não contra o próprio objeto. Assim, se, por
exemplo, o agente praticar o crime de furto qualificado mediante destruição de obstáculo (CP,
art. 155, § 4º, I), será possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos, se preenchidos os demais requisitos, já que a violência empregada não foi contra
pessoa, mas contra o obstáculo que separava o agente da coisa alheia móvel que pretendia
subtrair.

17.3.1.2 Em relação aos crimes culposos

a) Quantidade da pena aplicada

A limitação da pena aplicada na sentença até 4 anos restringe-se aos crimes dolosos. Em
relação aos crimes culposos, será possível a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos qualquer que seja a pena aplicada (CP, art. 44, I, parte final).

Assim, se, por exemplo, um condutor de veículo, de forma imprudente, em razão do


excesso de velocidade, atropela e mata duas pessoas, que estavam caminhando sobre a
calçada, sendo processado e condenado pela prática de dois crimes de homicídio culposo na

249
condução de veículo automotor (CTB, art. 302, § 1º, II), em concurso formal de crimes, com pena
final acomodada em quatro anos e seis meses de detenção em regime semiaberto, poderá, em
tese, ter a pena privativa de liberdade substituída por pena restritiva de direitos, ainda que a pena
final tenha ficado acima de quatro anos.

Exceção: O legislador, por meio da Lei no 14.071/2020 introduziu importante alteração no


Código de Trânsito Brasileiro, sobretudo no que diz respeito à impossibilidade de substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos no crime de homicídio culposo na condução
de veículo automotor e lesão corporal culposa na condução de veículo automotor, sob a
influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.

Com efeito, nos termos do art. 312-B do CTB: “Aos crimes previstos no § 3º do art. 302 e
no § 2º do art. 303 deste Código não se aplica o disposto no inciso I do caput do art. 44 do
Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal)”.

Agora, com a alteração legislativa, veda-se por absoluto a possibilidade de pena restritiva
de direitos para as hipóteses dos arts. 302, § 3º, e 303, § 2º, do CTB. Assim, o agente que
conduzir veículo automotor sob influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa
que determine dependência, causando morte ou lesão corporal de natureza grave ou gravíssima
deverá cumprir a pena privativa de liberdade imposta na sentença condenatória.

b) Natureza do crime cometido

Em relação aos crimes dolosos, somente será possível a substituição da pena privativa
de liberdade por restritiva de direitos, se praticados sem violência ou grave ameaça.

Em relação aos crimes culposos, diversamente, será possível a substituição por pena
alternativa, ainda que da conduta do agente decorra resultado com desfecho violento. Isso
porque, embora a conduta tenha sido voluntária, o resultado provocado pelo agente não era
desejado, ou seja, não agiu com o desiderato de praticar crime violento, produzindo tal resultado
por conta da inobservância do dever de cuidado objetivo.

17.3.1.3 Requisitos subjetivos

Os requisitos subjetivos levam em conta as características pessoais do sentenciado.

250
a) Réu não reincidente em crime doloso

Nos termos do art. 44, II, do CP, para concessão do benefício, é necessário que o sujeito
não seja reincidente em crime doloso. O texto não trata de qualquer reincidente. Refere-se ao
não reincidente em crime “doloso”, de modo que não há impedimento à aplicação da pena
alternativa quando: a) os dois delitos são culposos; b) o anterior é culposo e o posterior é doloso;
c) o anterior é doloso e o posterior culposo.

Imaginemos a seguinte situação: Carlos foi denunciado pela prática de um crime de


estelionato (CP, art. 171, caput), constando em sua Folha de Antecedentes Criminais uma única
condenação anterior, definitiva, oriunda de sentença publicada quatro anos antes, pela prática
do crime de lesão corporal culposa praticada na direção de veículo automotor (CTB, art. 303).
Ao final do regular procedimento, o Magistrado, após fixar a pena privativa de liberdade não
superior a quatro anos, poderá substitui-la por duas penas restritivas de direitos, já que, embora
reincidente, o condenado não o é em crime doloso, uma vez que a condenação definitiva anterior
foi por crime culposo.

Essa regra, comporta exceção, que está prevista no art. 44, § 3º, do CP. Ainda que o
réu seja reincidente em crime doloso, se, em face de condenação anterior, a medida for
socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do
mesmo crime, será possível aplicar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos. Vê-se, pois, que, além dos requisitos anteriores, há outros dois que devem ser
preenchidos cumulativamente: a) a medida seja socialmente recomendável; b) não ser
reincidente específico.

A verificação da medida socialmente recomendável depende da análise subjetiva do


Magistrado, que, considerando os elementos do caso concreto, como as circunstâncias em que
o delito foi praticado e as características pessoais e sociais do agente, formará seu
convencimento acerca da conveniência da aplicação da pena alternativa. Assim, se, por
exemplo, embora reincidente, o agente demonstre exercer atividade lícita, ser provedor da
família, verificando-se, ainda, em face do crime anterior, não se tratar de pessoa com
personalidade agressiva ou voltada para o crime, pode-se aventar a possibilidade de ser
socialmente recomendável a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Além de ser socialmente recomendável, o réu não pode ser reincidente específico, ou
seja, pela prática do mesmo crime.

251
Sedimentando posição jurisprudencial, a Terceira Seção do STJ delimitou o alcance da
vedação imposta no artigo 44, § 3º, do CP à reincidência pela prática do mesmo crime, assim
entendidos aqueles previstos no mesmo tipo penal, não alcançando, portanto, os crimes de
mesma espécie, previstos em tipos penais distintos, mas que atacam o mesmo bem jurídico.

Assim, se, por exemplo, o agente ostenta sentença condenatória definitiva pelo crime de
estelionato (CP, art. 171) e comete novo crime, agora de furto (CP, art. 155), será reincidente,
mas não específico pelo mesmo crime, viabilizando, em tese, a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos.

Por outro lado, se o agente ostenta sentença condenatória definitiva pelo crime de
estelionato (CP, art. 171) e comete novo crime de estelionato (CP, art. 171), será reincidente
específico pela prática do mesmo crime, inviabilizando, por absoluto, a substituição da pena
privativa de liberdade por restritiva de direitos.

b) Princípio da suficiência

Conforme o art. 44, III, do CP, “a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a


personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa
substituição seja suficiente”.

Assim, além dos demais requisitos, a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e


a personalidade do condenado devem revelar a adequação e suficiência da substituição da pena
privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Convém notar que esses requisitos praticamente reproduzem as circunstâncias judiciais


previstas no art. 59, caput, do CP, com exceção de duas: comportamento da vítima e
consequências do crime, coincidentemente as únicas de natureza objetiva. Logo, verifica-se que
o art. 44, III, do CP somente levou em conta as circunstâncias subjetivas.

17.3.2 Substituição da pena restritiva x tráfico ilícito de entorpecentes

Em relação ao tráfico ilícito de entorpecentes, o descabimento da substituição da prisão


por penas restritivas de direito encontra-se expresso no art. 44 da Lei nº 11.343/2006. Todavia,

252
em setembro de 2010, ao julgar o HC 97.256, o STF declarou inconstitucional essa restrição
contida na Lei de Drogas.

A propósito, o Senado editou a resolução nº 5º, suspendendo a execução da expressão


que vedava a conversão em penas restritivas de direitos nos crimes de tráfico ilícito de
entorpecentes, conferindo caráter erga omnes à decisão proferida pelo STF.

253
17.4 Suspensão condicional da execução da pena (sursis)

Trata-se de um instituto de política criminal, tendo por fim a suspensão da execução da


pena privativa de liberdade, evitando o recolhimento ao cárcere do condenado não reincidente,
cuja pena não seja superior a 02 anos (ou 04, se septuagenário ou enfermo), sob determinadas
condições, fixadas pelo juiz, bem como dentro de período de prova pré-definido.

• Requisitos:
I) Requisitos objetivos:

a) Qualidade da pena

Quanto à qualidade da pena, somente a pena privativa de liberdade, seja reclusão, seja
detenção, admite o sistema. As penas restritivas de direitos e a multa não o permitem (CP, art.
80).

b) Quantidade da pena

O segundo requisito de ordem objetiva diz respeito à quantidade da pena privativa de


liberdade: não pode ser superior a 02 anos, ainda que resulte, no concurso de crimes, de sanções
inferiores a ela.

Tratando-se, entretanto, de condenado maior de setenta anos de idade, poderá ser


suspensa a pena privativa de liberdade não superior a 04 anos (CP, art. 77, § 2º).

c) Impossibilidade de substituição por pena restritiva de direitos

Somente se aplica o sursis caso não caiba substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos. Portanto, somente em casos excepcionais, quando não for cabível a referida
substituição, como, por exemplo, quando se tratar de crimes violentos contra a pessoa, como a
lesão corporal – pode o juiz aplicar o sursis.

II) Requisitos subjetivos

a) Condenado não reincidente em crime doloso

Nem toda reincidência impede a concessão do sursis, mas tão-somente a reincidência em


crime doloso. Isso quer dizer que a condenação anterior, mesmo definitiva, por crime culposo ou
por simples contravenção, por si só, não é causa impeditiva da suspensão condicional da pena.

254
Convém sinalar que a condenação anterior à pena de multa não impede a concessão do
sursis (art. 77, § 1º, do CP).

b) Circunstâncias judiciais favoráveis ao agente

• Diferença suspensão condicional da pena e suspensão condicional do processo

255
17.5 Questões sobre Teoria da pena

41) QUESTÃO 3 – XI EXAME


Ricardo cometeu um delito de roubo no dia 10/11/2007, pelo qual foi condenado no dia
29/08/2009, sendo certo que o trânsito em julgado definitivo de referida sentença apenas ocorreu
em 15/05/2010. Ricardo também cometeu, no dia 10/09/2009, um delito de extorsão. A sentença
condenatória relativa ao delito de extorsão foi prolatada em 18/10/2010, tendo transitado
definitivamente em julgado no dia 07/04/2011. Ricardo também praticou, no dia 12/03/2010, um
delito de estelionato, tendo sido condenado em 25/05/2011. Tal sentença apenas transitou em
julgado no dia 27/07/2013. Nesse sentido, tendo por base apenas as informações contidas no
enunciado, responda aos itens a seguir.
A) O juiz, na sentença relativa ao crime de roubo, deve considerar Ricardo portador de
bons ou maus antecedentes? (Valor: 0,25)

256
B) O juiz, na sentença relativa ao crime de extorsão, deve considerar Ricardo portador de
bons ou maus antecedentes? Na hipótese, incide a circunstância agravante da
reincidência ou Ricardo ainda pode ser considerado réu primário? (Valor: 0,50)
C) O juiz, na sentença relativa ao crime de estelionato, deve considerar Ricardo portador
de bons ou maus antecedentes? Na hipótese, incide a circunstância agravante da
reincidência ou Ricardo ainda pode ser considerado réu primário? (Valor: 0,50)
Utilize os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso. A
simples menção ou transcrição do dispositivo legal não pontua.

42) QUESTÃO 3 – XXVII EXAME


No interior de um coletivo, Alberto, João, Francisco e Ronaldo, até então desconhecidos,
começaram a conversar sobre a crise financeira que assombra o país e sobre as dificuldades
financeiras que estavam passando. Em determinado momento da conversa, Alberto informa que
tinha um conhecido seu, Lucas, com intenção de importar uma arma de fogo de significativo
potencial ofensivo, que seria um fuzil de venda proibida no Brasil, mas que ele precisava da ajuda
de outras pessoas para conseguir a importação. Diante da oferta em dinheiro pelo serviço
específico, todos concordaram em participar do plano criminoso, sendo que Alberto iria ao
exterior adquirir a arma, João alugaria um barco para trazer o material, Francisco auxiliaria junto
à imigração brasileira para que a conduta não fosse descoberta e Ronaldo entregaria o material
para Lucas, que era o mentor do plano. Após toda a organização do grupo e divisão de tarefas,
assustado com as informações veiculadas na mídia sobre as punições de crime de organização
criminosa, Francisco comparece ao Ministério Público com seu advogado e indica a intenção de
realizar delação premiada. Participaram das negociações do acordo Francisco, sua defesa
técnica, o membro do Ministério Público com atribuição e o juiz que seria competente para
julgamento, sendo acordada a redução de 1/3 da pena em relação ao crime de organização
criminosa. Após ser denunciado junto com Alberto, João, Ronaldo e Lucas pela prática do crime
de organização criminosa (Art. 2º, da Lei nº 12.850/2013), Francisco contrata você, como novo(a)
advogado(a), para patrocinar seus interesses. Na condição de advogado(a) de Francisco, com
base apenas nas informações narradas, esclareça os itens a seguir.
A) Considerando que aquela delação premiada não seria benéfica ao seu cliente, existe
argumento a ser apresentado em busca de desconstituir o acordo celebrado quanto ao
seu aspecto formal? Justifique. (Valor: 0,65)

257
B) Qual argumento de direito material deve ser apresentado para questionar a capitulação
jurídica realizada pelo Ministério Público na denúncia? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

43) QUESTÃO 3 – XXIX EXAME


Em patrulhamento de rotina, policiais militares receberam uma informação não identificada de
que Wesley, que estava parado em frente à padaria naquele momento, estaria envolvido com o
tráfico de drogas da localidade. Diante disso, os policiais identificaram e realizaram a abordagem
de Wesley, não sendo, em um primeiro momento, encontrado qualquer material ilícito com ele.
Diante da notícia recebida momentos antes da abordagem, porém, e considerando que o crime
de associação para o tráfico seria de natureza permanente, os policiais apreenderam o celular
de Wesley e, sem autorização, passaram a ter acesso às fotografias e conversas no WhatsApp,
sendo verificado que existiam fotos armazenadas de Wesley portando suposta arma de fogo,
bem como conversas sobre compra e venda de material entorpecente. Entendendo pela
existência de flagrante em relação ao crime permanente de associação para o tráfico, Wesley foi
encaminhado para a Delegacia, sendo lavrado auto de prisão em flagrante. Após liberdade
concedida em audiência de custódia, Wesley é denunciado como incurso nas sanções do Art.
35 da Lei nº 11.343/06. No curso da instrução, foram acostadas imagens das conversas de
Wesley via aplicativo a que os agentes da lei tiveram acesso, assim como das fotografias. Os
policiais foram ouvidos em audiência, ocasião em que confirmaram as circunstâncias do
flagrante. O réu exerceu seu direito ao silêncio. Com base nas fotografias acostadas, o juiz
competente julgou a pretensão punitiva do estado procedente, aplicando a pena mínima de 03
anos de reclusão, além de multa, e fixando o regime inicial fechado, já que o crime imputado
seria equiparado a hediondo. Ainda assim, substituiu a pena privativa de liberdade por restritiva

258
de direitos. Considerando as informações narradas, responda, na condição de advogado(a) de
Wesley, intimado(a) para apresentação de recurso de apelação.
A) Existe argumento a ser apresentado para questionar as provas utilizadas pelo
magistrado como fundamento para condenação? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Mantida a condenação, qual o argumento a ser apresentado para questionar a sanção
penal aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

44) QUESTÃO 1 – XXV EXAME


Lucas, jovem de 22 anos, primário, foi denunciado pela prática do crime de extorsão simples,
tendo o magistrado, em 05/05/2016, recebido a denúncia e decretado a prisão preventiva do
acusado. Cumprido o mandado de prisão no dia seguinte, Lucas permaneceu acautelado durante
toda a instrução de seu processo, vindo a ser condenado, em 24 de janeiro de 2017, à pena de
04 anos e 03 meses de reclusão, além de 12 dias-multa, sendo certo que o aumento da pena-
base foi fundamentado de maneira correta pelo magistrado em razão das circunstâncias do
crime. Foi, ainda, aplicado o regime semiaberto para início do cumprimento da sanção,
exclusivamente diante do quantum de pena aplicada, e o valor do dia-multa foi fixado em 3 vezes
o salário-mínimo, em razão das circunstâncias do fato. Apesar de não se opor à condenação,
nem à pena aplicada, Lucas, ainda preso, pergunta a seu advogado sobre a possibilidade de
recurso para aplicação de regime de cumprimento de pena menos gravoso, ainda que mantido
o quantum de pena. Também informa ao patrono que não tem condições de arcar com a multa
aplicada, pois mora em comunidade carente e recebia, antes dos fatos, remuneração de meio
salário-mínimo pela prestação de serviços informais. Considerando apenas as informações
narradas, na condição de advogado de Lucas, responda aos itens a seguir.

259
A) Qual o argumento a ser formulado em sede de recurso para alteração do regime
prisional de início de cumprimento de pena aplicado, mantida a pena final em 04 anos e
03 meses de reclusão? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual argumento a ser apresentado em sede de recurso em busca da redução do valor
do dia-multa aplicado? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

45) QUESTÃO 4 – XIII EXAME


Pedro foi preso em flagrante por tráfico de drogas. Após a instrução probatória, o juiz ficou
convencido de que o réu, por preencher os requisitos do artigo 33, § 4º, da lei 11.343/2006,
merecia a redução máxima da pena. Na sentença penal condenatória, fixou o regime inicialmente
fechado ao argumento de que o artigo 2º, § 1º, da lei 8.072/90, assim determina, vedando a
conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos, com base no próprio
artigo 33, § 4º, da lei 11.343/2006. O advogado de Pedro é intimado da sentença. À luz da
jurisprudência do STF, responda aos itens a seguir.
A) Cabe ao advogado de defesa a impugnação da fixação do regime inicial fechado, fixado
exclusivamente com base no artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90? (Valor: 0,60)
B) Com relação ao tráfico-privilegiado, previsto na Lei nº 11.343/06, artigo 33, § 4º, é
possível a conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos? (Valor:
0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

260
46) QUESTÃO 2 – XXXII EXAME
Luiz, no dia 05 de fevereiro de 2019, ingressou na residência de Henrique e, mediante grave
ameaça contra a vítima, buscou subtrair a televisão do imóvel. Após o emprego da grave ameaça
à pessoa e a retirada dos parafusos da televisão, mas ainda quando estava dentro da casa com
o bem, Luiz é surpreendido pela Polícia Militar, que informada dos fatos por vizinhos, realizou
sua prisão em flagrante.
Em sede policial, foi descoberto que Luiz contou com a participação de José, que, sabendo do
plano criminoso do amigo, foi o responsável por dizer o horário em que a vítima estaria sozinha
em sua residência, bem como a porta que teria uma falha na fechadura, facilitando o ingresso
de Luiz no imóvel. Luiz e José foram denunciados pela prática do crime de roubo majorado pelo
concurso de agentes.
Observado o procedimento previsto em lei e confirmados os fatos, foi proferida sentença
condenatória, sendo aplicada a pena mínima possível de 5 anos e 4 meses de reclusão, além
de 13 dias-multa, para José. Já Luiz teve sua pena base fixada acima do mínimo legal, em 4
anos e 6 meses de reclusão e 12 dias-multa, reconhecendo o magistrado a existência de má
conduta social, pelo fato de Luiz possuir 5 condenações sem trânsito em julgado pela suposta
prática de crimes de roubo, apesar de admitir, na decisão, que as anotações constantes da Folha
de Antecedentes Criminais não poderiam justificar o reconhecimento de maus antecedentes.
Não foram reconhecidas agravantes, sendo, na terceira fase, a pena aumentada, no mínimo
possível, em razão da majorante do concurso de agentes. Assim, a pena final de Luiz restou
acomodada em 06 anos de reclusão e 15 dias-multa. Intimado da decisão, o advogado de José
apresentou recurso buscando reconhecimento da modalidade tentada do delito, bem como da
causa de diminuição da participação de menor importância.
Luiz, então, consulta você, como advogado(a), para avaliar o interesse em apresentar recurso
de apelação.
Na condição de advogado(a) de Luiz, esclareça os questionamentos formulados pelo seu cliente.
A) Não sendo apresentado recurso de apelação por Luiz, poderá ele ser beneficiado pelo
reconhecimento da causa de diminuição de pena da tentativa no julgamento do recurso
apresentado por José? E da causa de diminuição de pena da participação de menor
importância? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Existe argumento de direito material a ser apresentado em busca da redução da pena
base aplicada a Luiz? Justifique. (Valor: 0,60)

261
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

47) QUESTÃO 2 – 35º EXAME


Roberto foi denunciado pelo crime de perseguição (Art. 147-A do CP). Segundo a denúncia, no
dia 15 de janeiro de 2022, na filial da sociedade empresária Ruan S/A, situada no Rio de
Janeiro/RJ, Roberto se aproveitou da proximidade física com Fábio (colega que trabalha na
matriz da empresa em São Paulo/SP e estava visitando a filial carioca por um dia apenas) no
ambiente de trabalho, para lançar-lhe olhares lascivos, o que teria “perturbado a esfera de
liberdade ou privacidade” de Fábio. Este ofereceu representação contra Roberto. O Ministério
Público se recusou a formular proposta de transação penal a Roberto, com fundamento em uma
anotação existente na sua Folha de Antecedentes Criminais (FAC), relativa à condenação
definitiva à pena corporal – extinta há mais de 5 (cinco) anos – pela prática de crime. Sobre a
hipótese apresentada, responda aos itens a seguir.
A) Quais teses de mérito podem ser invocadas pelo defensor técnico de Roberto?
Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual medida pode ser adotada pelo defensor técnico de Roberto para viabilizar a
proposta de transação penal? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

262
48) QUESTÃO 4 – 36º EXAME
Juntos, Bruno, Leila, Valter e Vinícius cometeram determinado ilícito em 2016. O processo veio
a ser desmembrado, de forma que Bruno aceitou a suspensão condicional do processo, em 2017;
Leila foi condenada, definitivamente, em 2018, tendo terminado de cumprir a sua condenação
em 2020; Valter foi condenado em primeira instância, porém, interpôs recurso, vindo a transitar
em julgado o acórdão condenatório em 2022; e Vinícius, por sua vez, não foi encontrado para
ser citado, tendo o processo sido suspenso, assim como o prazo prescricional, na forma do Art.
366 do CPP. Em 2021, os amigos se reúnem e praticam novo ilícito penal, sem violência ou
grave ameaça à pessoa. Na qualidade de advogado de todos eles, responda às questões a
seguir.
A) À vista dos antecedentes criminais mencionados, e considerando preenchidos todos
os demais requisitos legais, há algum acusado(s) impedido(s) de se beneficiar, em tese,
de oferta de acordo de não persecução penal? justifique. (Valor: 0,60)
B) Caso condenado(s) pelo novo fato, se fixada pena abaixo de quatro anos, qual(is)
acusado(s) poderá(ão) se beneficiar do regime aberto? justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: O examinando deve fundamentar corretamente sua resposta. A simples menção ou
transcrição do dispositivo legal não pontua.

263
Das Nulidades

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 21/03/2023.

Prof. Arnaldo Quaresma


@profarnaldoquaresma

18.1. Teoria Geral das Nulidades

Podemos afirmar que no processo penal há uma grande tensão existente em


compatibilizar o direito de o Estado-acusação perseguir a responsabilização penal do indivíduo
que, supostamente, violou a lei penal e o dever do Estado, imposto pela Constituição da
República, de garantir aos acusados, de uma maneira geral, a observância do devido processo
legal, do contraditório, da ampla defesa, dentre outras garantias fundamentais.

Tal tensionamento é bastante perceptível no tema de nulidades, uma vez que há uma
tendência natural da acusação e da jurisprudência em relativizar algumas violações a dispositivos
inerentes à lei processual, havendo um verdadeiro descompasso entre o que preceitua a
doutrina, à luz do que prega a Constituição da República, e a jurisprudência dominante. Em razão
disso, o estudo da teoria das nulidades é bastante tormentoso, uma vez que a ausência de uma
interpretação uniforme aliada ao casuísmo jurisprudencial e a falta de uma atualização legislativa
em consonância com o sistema processual adotado pela Constituição dificultam sobremaneira a
análise das invalidades processuais.

18.1.1. Sistema da Tipicidade dos Atos Processuais

Em relação ao sistema processual adotado pelo legislador no que concerne aos atos
processuais, bem como as consequências jurídicas advindas de eventual não-observância do
modelo padrão estipulado pela lei processual, mister elencar o preciso ensinamento de Heráclito
Antônio Mossin (2005, p. 46-47), abordando o sistema adotado pelo legislador processual
brasileiro:

264
O processo, sob o quadrante formal, é um conjunto de atos processuais, cuja coordenação
ou sucessão encadeada é feita por intermédio do chamado procedimento.

Para que esses atos que compõem o procedimento produzam seus efeitos jurídicos dentro
e fora do processo e para que a ordem jurídica não pereça, necessário se torna que sejam
realizados segundo as formas preconizadas pela lei processual penal. Em circunstâncias desse
matiz, cumpre ao legislador estabelecer a constituição intrínseca e extrínseca do ato processual,
enfim o modelo segundo o qual deve ser praticado: Forma dat est rei. A isso se chama de
tipicidade dos atos processuais

No tocante ao chamado sistema da tipicidade dos atos processuais ou legalidade dos atos
processuais, podemos afirmar que o legislador construiu um modelo pelo qual o juiz, os
assistentes e as partes devem se ajustar ao modelo legal, ou seja, todos aqueles que participam
da relação processual devem pautar o seu agir em conformidade com aquilo que a lei processual
determina.

Desta feita, quando há uma inadequação ao modelo proposto pela lei no tipo processual
em comento, haverá a atipicidade de tal ato processual, sendo que a consequência jurídica
variará de acordo com o grau de violação respectivo, podendo ensejar uma mera irregularidade
sem qualquer espécie de sanção processual ou até mesmo acarretar a inexistência do ato, por
não conter os requisitos mínimos de formação.

18.1.2. Graus de Atipicidade

De uma maneira geral, a doutrina aponta os seguintes graus de violação:

I - ATIPICIDADE IRRELEVANTE: Neste caso a consequência jurídica será a mera


irregularidade, não ensejando sanção processual específica, como por exemplo, no caso de a
defesa ou a acusação oferecer as razões da Apelação fora do prazo estabelecido pelo artigo 600
do Código de Processo Penal, uma vez que já interpôs o aludido recurso, podendo o Tribunal
respectivo conhecer e julgá-lo, inclusive sem as respectivas razões.

II – ATIPICIDADE MUITO INTENSA: Neste caso a consequência jurídica será a própria


inexistência do ato processual, uma vez que a atipicidade em questão atingiu os requisitos
mínimos de formação do ato processual em si, não se situando no plano da validade e sim no
plano da existência, como, por exemplo, no caso de uma sentença exarada por pessoa não

265
investida de jurisdição ou alegações finais escritas assinadas somente pelo estagiário do
escritório de advocacia.

III- ATIPICIDADE ATINGINDO NORMA DE INTERESSE PÚBLICO: Neste caso, haverá


a nulidade absoluta, restando o prejuízo presumido em razão da natureza da norma violada.

IV – ATIPICIDADE ATINGINDO NORMA QUE ATENDA INTERESSE DAS PARTES:


Neste caso haverá a nulidade relativa, devendo a parte comprovar o prejuízo, sob pena de
convalidação ou sanatória do ato.

18.2. Conceito de Nulidade


Nulidade é o vício que contamina determinado ato processual, praticado sem a
observância da forma prevista em lei, podendo invalidar o ato ou o processo, no todo ou em
parte.

18.3. Nulidade Absoluta e Relativa


18.3.1. Nulidades absolutas
São aquelas que devem ser proclamadas pelo magistrado, de ofício ou a requerimento de
qualquer das partes, porque produtoras de nítidas infrações ao interesse público na produção do
devido processo legal. Exemplo: não conceder o juiz ao réu ampla defesa, cerceando a atividade
do seu advogado.
São nulidades insanáveis, que jamais precluem. O prejuízo da parte é presumido.
A única exceção é a Súmula 160 do STF: “É nula a decisão do tribunal que acolhe, contra
o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.”

18.3.2. Nulidades relativas


São aquelas que somente serão reconhecidas caso arguidas pela parte interessada,
demonstrando o prejuízo sofrido pela inobservância da formalidade legal prevista para ato
realizado.

266
18.4. Vícios Processuais – Art. 564 do CPP

18.4.1. Jurisdição e Competência – Art. 564, inciso I, do CPP

Incompetência

•A competência absoluta (em razão da matéria e de foro privilegiado) não admite


prorrogação; logo, se infringida, é de ser reconhecido o vício como nulidade absoluta.

Suspeição

•Se houver suspeição do juiz, caberá às partes, se o próprio Magistrado não se


abstiver de funcionar no feito, argui-la, nos termos do artigo 98 do Código de
Processo Penal. Reconhecida a suspeição, ficarão nulos todos os atos (probatórios e
decisórios), como estabelece o artigo 101 do Código de Processo Penal. Os motivos
legais de suspeição estão elencados no artigo 254 do Código de Processo Penal.

18.4.2. Ilegitimidade da Parte - Art. 564, inciso II, do CPP

No inciso II, erige-se à categoria de nulidade a ilegitimidade de parte. Em se tratando de


ilegitimidade do representante da parte, a sanabilidade poderá ocorrer antes da sentença, com
a simples ratificação dos atos processuais.

18.4.3. Falta de Atos Essenciais (Falta De Fórmulas Ou Termos) – Art.


564, inciso III, do CPP

Há, no processo, atos considerados essenciais, imprescindíveis para a validade da


relação processual. São assim considerados porque a omissão (do ato) de qualquer deles é
nulidade absoluta.

São atos estruturais, ou essenciais, os alinhados no inciso III, do artigo 564. Faz-se
exceção àqueles elencados nas letras “d” e “e”, segunda parte, e, finalmente, “g” e “h” desse
mesmo inciso. O próprio legislador admitiu a sanabilidade desses atos, nos termos do artigo 572.
O inciso IV, do artigo 564 cuida da omissão da formalidade que constitua elemento essencial do
ato.

267
A) Denúncia ou queixa e a representação - Art. 564, inciso III, alínea “a”, do CPP

A falta de denúncia ou de queixa impossibilita o início da ação penal, razão pela qual este
inciso, na realidade, refere-se à ausência das fórmulas legais previstas para essas peças
processuais. Uma denúncia ou queixa formulada sem os requisitos indispensáveis (Art. 41
do CPP), certamente é nula.
Representação:
A falta de representação pode gerar nulidade, pois termina provocando ilegitimidade para
o órgão acusatório agir. Entretanto, é possível convalidá-la, se dentro do prazo
decadencial.

B) Exame de corpo de delito – Art. 564, inciso III, alínea “b”, do CPP

Quando o crime deixa vestígios, é indispensável a realização do exame de corpo de delito,


direto ou indireto, conforme preceitua o artigo 158 deste Código.

Assim, havendo um caso de homicídio, por exemplo, sem laudo necroscópico, nem outra
forma válida de produzir a prova de existência da infração penal, deve ser decretada a nulidade
do processo. Trata-se de nulidade absoluta.

C) Defesa do réu – Art. 564, inciso III, alínea “c”, do CPP

Preceitua a Constituição Federal que “aos litigantes, em processo judicial ou


administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa,
com os meios e recursos a ela inerentes” (Art. 5º, inciso LV).

Nessa esteira, o Código de Processo Penal prevê que “nenhum acusado, ainda que
ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor” (Art. 261). Assim, a falta de
defesa é motivo de nulidade absoluta.

Não nomeação de defensor dativo:


É caso de nulidade absoluta.
Ausência de defesa ou deficiência de defesa:
Súmula 523 do STF: “No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta,
mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”.

D) Falta de Intervenção do Ministério Público – Art. 564, inciso III, alínea “d”, do CPP
É causa de nulidade se o representante do Ministério Público não interferir nos feitos por
ele intentados (ação pública), bem como naqueles que foram propostos pela vítima, em atividade
substitutiva do Estado-acusação (ação privada subsidiária da pública) e nas ações privadas.

268
E) Falta ou nulidade da citação do réu para se ver processar (Ampla defesa e
contraditório e interrogatório) – Art. 564, inciso III, alínea “e”, do CPP

I) Citação: Se o réu não for citado ou se a citação for feita em desacordo com as normas
processuais, prejudicando ou cerceando o réu, é motivo para anulação do feito a partir da
ocorrência do vício. Trata-se de nulidade absoluta.

A falta ou a nulidade da citação estará sanada desde que o interessado compareça antes
de o ato consumar-se (Art. 570). Porém, haverá nulidade insanável se a falta de citação
prejudicar a defesa do acusado, não sendo possível a convalidação do vício apenas pelo
comparecimento do réu ao ato.

II) Interrogatório – Art. 564, inciso III, alínea “e”, do CPP: O interrogatório, sendo ato
fundamental – mesmo que não imprescindível -, deve sempre ser realizado quando o acusado
estiver presente, em qualquer momento do procedimento, a fim de que ele, no exercício de sua
defesa pessoal, possa apresentar diretamente a sua versão a respeito do fato, influindo sobre o
convencimento do juiz. Por isso, o Código de Processo Penal, estatui, no artigo 564, inciso III,
alínea “e”, que há nulidade na falta de interrogatório do réu presente. Cuida-se de nulidade
insanável.

III) Concessão de prazos à acusação e à defesa: Ao longo da instrução, vários prazos


para manifestações e produção de provas são concedidos às partes. Deixar de fazê-lo pode
implicar um cerceamento de acusação ou de defesa, resultando em nulidade relativa, ou seja,
se houver prejuízo demonstrado.

F) Sentença de pronúncia – Art. 564, inciso III, alínea “f”, do CPP

Com a abolição do libelo, a alínea “f” fica restrita à pronúncia.

G) Intimação do réu para a sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri – Art. 564,
inciso III, alínea “g”, do CPP

Tornou-se possível a realização do julgamento em plenário do Tribunal do Júri, mesmo


estando o réu ausente (Art. 457). Entretanto, é direito do acusado ter ciência de que se realizará
a sessão, podendo exercer o seu direito de comparecimento. Logo, a falta de intimação pode
gerar nulidade, porém relativa. Por outro lado, se o acusado, ainda que não intimado, comparecer
para a sessão, supera-se a falta de intimação, pois a finalidade da norma processual foi atingida,
que é permitir sua presença diante do júri.

269
H) Intimação de testemunhas - Art. 564, inciso III, alínea “h”, do CPP

Com a abolição do libelo, as partes poderão arrolar suas testemunhas, máximo 5 para
cada uma das partes, conforme dispõem os artigos 422 e 423, ambos do Código de Processo
Penal.

Se não forem intimadas e, sem embargo, comparecerem, a nulidade será considerada


sanada, nos termos do artigo 572. Não comparecendo, por não terem sido intimadas, a nulidade
é absoluta.

I) Instalação da sessão do júri – Art. 564, inciso III, alínea “i”, do CPP

Trata-se de norma cogente, implicando nulidade absoluta a instalação dos trabalhos, no


Tribunal do Júri, com menos de quinze jurados.

J) Incomunicabilidade dos jurados – Art. 564, inciso III, alínea “j”, do CPP

É causa de nulidade absoluta a comunicação dos jurados, entre si, sobre os fatos
relacionados ao processo, ou com o mundo exterior – pessoas estranhas ao julgamento -, sobre
qualquer assunto.

K) Inexistência dos quesitos e suas respostas – Art. 564, inciso III, alínea “k”, CPP

Súmula 156 do STF: “É absoluta a nulidade do julgamento pelo júri, por falta de quesito
obrigatório”.

L) Acusação e defesa no julgamento pelo Tribunal do Júri – Art. 564, inciso III, alínea
“l”, do CPP

M) Ausência da sentença – Art. 564, inciso III, alínea “m”, do CPP

N) Recurso de ofício – Art. 564, inciso III, alínea “n”, do CPP

Na verdade, cuida-se do duplo grau de jurisdição necessário. Em determinadas hipóteses,


impôs a lei que a questão, julgada em primeiro grau, seja obrigatoriamente revista por órgão de
segundo grau. A importância do tema faz com que haja dupla decisão a respeito. Exemplo: a
sentença concessiva de habeas corpus (art. 574, I). o desrespeito a esse dispositivo faz com que
a sentença não transite em julgado, implicando a nulidade absoluta dos atos que vierem a ser
praticados após a decisão ter sido proferida. Caso a parte interessada apresente recurso
voluntário, supre-se a falta do recurso de ofício.

270
O) Intimação para recurso – Art. 564, inciso III, alínea “o”, do CPP

As partes têm direito a recorrer de sentenças e despachos, quando a lei prevê a


possibilidade, motivo pelo qual devem ter ciência do que foi decidido. Omitindo-se a intimação,
o que ocorrer, a partir daí, é nulo, por evidente cerceamento de acusação ou de defesa, conforme
o caso.

IV) Por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato – Art. 564,
inciso IV, do CPP. No inciso IV, o legislador previu uma hipótese mais genérica, de modo que
na hora de se fundamentar uma nulidade quando não restar a possibilidade de encaixe nos
dispositivos anteriores, provavelmente o disposto em questão poderá ser utilizado.

V) Em decorrência de decisão carente de fundamentação (incluído pela Lei nº


13.964/2019). Foi incluído o inciso V no rol das nulidades em espécie do artigo 564 pelo
legislador anticrime, havendo o reconhecimento de nulidade em se tratando de decisão carente
de fundamentação enseja a nulidade.

Na verdade tal inclusão não representou um significativo avanço pois inúmeros artigos de
lei já ensejavam o dever do magistrado em fundamentar as suas decisões, inclusive a própria
Carta Magna, em seu artigo 93, inciso IX já determina que todos os julgamentos dos órgãos do
Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade,
podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados,
ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado
no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

18.5. Regularização da Falta ou Nulidade da Citação, Intimação ou


Notificação – Art. 570 do CPP

Estabelece o artigo 570 do Código de Processo Penal que o comparecimento do


interessado, ainda que somente com o fim de arguir a irregularidade, sana a falta ou nulidade da
citação, intimação ou notificação.

271
→ Exemplo de como já foi cobrado pela FGV:

ENUNCIADO DA PEÇA XXII EXAME


O magistrado concedeu prazo para as partes se manifestarem em alegações finais por
memoriais. O Ministério Público requereu a condenação nos termos da denúncia. O advogado
de Leonardo, contudo, renunciou aos poderes, razão pela qual, de imediato, o magistrado abriu
vista para a Defensoria Pública apresentar alegações finais.

GABARITO COMENTADO
No conteúdo das Razões Recursais, preliminarmente, deveria o advogado alegar a nulidade da
sentença, devendo os atos desde a apresentação das alegações finais pela defesa serem
anulados. Isso porque Leonardo tinha advogado constituído nos autos que veio a renunciar.
Diante disso, deveria o magistrado intimar o réu, que estava preso, para informar se tinha
interesse em constituir novo advogado ou ser assistido pela Defensoria Pública. A decisão do
juiz de, de imediato, encaminhar os autos para Defensoria Pública viola o princípio da ampla
defesa na vertente da defesa técnica. Certamente houve prejuízo, pois as Alegações Finais
foram apresentadas sem qualquer contato do Defensor com o acusado e este foi condenado.

272
FIQUE LIGADO!

Edição 69 STJ – NULIDADES NO PROCESSO PENAL


1) A decretação da nulidade de ato processual requer prova inequívoca do prejuízo
suportado pela parte, em face do princípio pas de nullité sans grief, previsto no art. 563 do
Código de Processo Penal.
2) As nulidades surgidas no curso da investigação preliminar não atingem a ação penal dela
decorrente.
3) As irregularidades relativas ao reconhecimento pessoal do acusado não ensejam
nulidade, uma vez que as formalidades previstas no art. 226 do CPP são meras
recomendações legais.
4) A ausência de intimação pessoal da Defensoria Pública ou do defensor dativo sobre os
atos do processo gera, via de regra, a sua nulidade.
5) A nulidade decorrente da ausência de intimação - seja a pessoal ou por diário oficial - da
data de julgamento do recurso não pode ser arguida a qualquer tempo, sujeitando-se à
preclusão temporal.
6) O defensor dativo que declinar expressamente da prerrogativa referente à intima-ção
pessoal dos atos processuais não pode arguir nulidade quando a comunicação ocorrer por
meio da imprensa oficial.
7) A ausência de intimação da defesa sobre a expedição de precatória para oitiva de
testemunha é causa de nulidade relativa.
8) A falta de intimação do defensor acerca da data da audiência de oitiva de testemunha no
juízo deprecado não enseja nulidade processual, desde que a defesa tenha sido cientificada
da expedição da carta precatória.
9) A inversão da ordem prevista no art. 400 do CPP, que trata do interrogatório e da oitiva
de testemunhas de acusação e de defesa, não configura nulidade quando o ato for
realizado por carta precatória, cuja expedição não suspende o processo criminal.
10) O falecimento do único advogado, ainda que não comunicado o fato ao tribunal, poderá
dar ensejo à nulidade das intimações realizadas em seu nome.
11) Na intimação pessoal do réu acerca de sentença de pronúncia ou condenatória, a
ausência de apresentação do termo de recurso ou a não indagação sobre sua intenção de
recorrer não gera nulidade do ato.
12) A inquirição das testemunhas pelo Juiz antes que seja oportunizada às partes a
formulação das perguntas, com a inversão da ordem prevista no art. 212 do Código de
Processo Penal, constitui nulidade relativa.

273
13) A falta de comunicação ao acusado sobre o direito de permanecer em silêncio é causa
de nulidade relativa, cujo reconhecimento depende da comprovação do prejuízo.
14) A ausência do oferecimento das alegações finais em processos de competência do
Tribunal do Júri não acarreta nulidade, uma vez que a decisão de pronúncia encerra juízo
provisório acerca da culpa.
15) As nulidades existentes na decisão de pronúncia devem ser arguidas no momento
oportuno e por meio do recurso próprio, sob pena de preclusão.
16) A instauração de inquérito policial em momento anterior à constituição definitiva do
crédito tributário não é causa de nulidade da ação penal, se evidenciado que o tributo foi
constituído antes de sua propositura.
17) É relativa a nulidade decorrente da inobservância da competência penal por prevenção
(Súmula 706 do STF).
18) A utilização da técnica de motivação per relationem não enseja a nulidade do ato
decisório, desde que o julgador se reporte a outra decisão ou manifestação dos autos e as
adote como razão de decidir.
19) São nulas as provas obtidas por meio da extração de dados e de conversas privadas
registradas em correio eletrônico e redes sociais (v.g. whatsapp e facebook) sem a prévia
autorização judicial.
20) O compartilhamento de dados obtidos pela Receita Federal com fundamento no art. 6º
da Lei Complementar n. 105/2001, mediante requisição direta às instituições bancárias no
âmbito de processo administrativo fiscal, é considerado nulo, para fins penais, se não
decorrer de expressa determinação judicial.

274
18.6. Questões sobre Nulidades

49) QUESTÃO 2 – XXII EXAME


Em inquérito policial, Antônio é indiciado pela prática de crime de estupro de vulnerável, figurando
como vítima Joana, filha da grande amiga da Promotora de Justiça Carla, que, inclusive,
aconselhou a família sobre como agir diante do ocorrido. Segundo consta do inquérito, Antônio
encontrou Joana durante uma festa de música eletrônica e, após conversa em que Joana
afirmara que cursava a Faculdade de Direito, foram para um motel onde mantiveram relações
sexuais, vindo Antônio, posteriormente, a tomar conhecimento de que Joana tinha apenas 13
anos de idade. Recebido o inquérito concluído, Carla oferece denúncia em face de Antônio,
imputando-lhe a prática do crime previsto no Art. 217-A do Código Penal, ressaltando a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que, para a configuração do delito,
não se deve analisar o passado da vítima, bastando que a mesma seja menor de 14 anos.
Considerando a situação narrada, na condição de advogado(a) de Antônio, responda aos itens
a seguir.
A) Existe alguma medida a ser apresentada pela defesa técnica para impedir Carla de
participar do processo? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual a principal alegação defensiva de direito material a ser apresentada em busca da
absolvição do denunciado? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

50) QUESTÃO 1 – XX EXAME


Fausto, ao completar 18 anos de idade, mesmo sem ser habilitado legalmente, resolveu sair com
o carro do seu genitor sem o conhecimento do mesmo. No cruzamento de uma avenida de
intenso movimento, não tendo atentado para a sinalização existente, veio a atropelar Lídia e suas
05 filhas adolescentes, que estavam na calçada, causando-lhes diversas lesões que acarretaram
a morte das seis. Denunciado pela prática de seis crimes do Art. 302, § 1º, incisos I e II, da Lei
nº 9503/97, foi condenado nos termos do pedido inicial, ficando a pena final acomodada em 04
anos e 06 meses de detenção em regime semiaberto, além de ficar impedido de obter habilitação
para dirigir veículo pelo prazo de 02 anos. A pena privativa de liberdade não foi substituída por
restritivas de direitos sob o fundamento exclusivo de que o seu quantum ultrapassava o limite de
04 anos. No momento da sentença, unicamente com o fundamento de que o acusado,

275
devidamente intimado, deixou de comparecer espontaneamente a última audiência designada,
que seria exclusivamente para o seu interrogatório, o juiz decretou a prisão cautelar e não
permitiu o apelo em liberdade, por força da revelia. Apesar de Fausto estar sendo assistido pela
Defensoria Pública, seu genitor o procura, para que você, na condição de advogado(a), preste
assistência jurídica. Diante da situação narrada, como advogado(a), responda aos seguintes
questionamentos formulados pela família de Fausto:
A) Mantida a pena aplicada, é possível a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Em caso de sua contratação para atuar no processo, o que poderá ser alegado para
combater, especificamente, o fundamento da decisão que decretou a prisão cautelar?
(Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

51) QUESTÃO 4 – 35º EXAME


Arnaldo e Fábio, 22 anos, são irmãos gêmeos idênticos, mas Arnaldo sempre fez mais sucesso
com as meninas por ser mais extrovertido. Arnaldo inicia um relacionamento com Mônica, de 14
anos. Ambos costumam manter relação sexual consentida. Elena, amiga de Mônica, sempre foi
apaixonada por Arnaldo e, movida por ciúmes, resolve noticiar às autoridades sobre as relações
mantidas entre Arnaldo e Mônica, no intuito de incriminá-lo por estupro de vulnerável. Noticiado
o fato em sede policial e concluídas as investigações, o Ministério Público ofereceu denúncia,
imputando a Arnaldo o crime de estupro de vulnerável, previsto no Art. 217-A do CP. Após
recebimento da denúncia, citação e apresentação de defesa, foi designada audiência de
instrução e julgamento. De posse do mandado, o oficial de justiça foi até a residência dos irmãos
e realizou a intimação na pessoa de Fábio, que se fez passar por Arnaldo. No dia da audiência,
Arnaldo não compareceu, embora seu advogado estivesse presente. Finalizada a instrução e
após alegações finais, o juiz condenou Arnaldo no crime de estupro de vulnerável, na forma do
Art. 217-A do CP, a pena de 8 anos de reclusão, visto que Arnaldo não tinha qualquer anotação
criminal, sendo favoráveis as condições do crime. Considerando apenas as informações
narradas no enunciado, responda aos itens a seguir.
A) O que pode ser alegado em favor de Arnaldo em matéria processual? Justifique. (Valor:
0,60)

276
B) Qual argumento de direito material poderia ser apresentado? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

277
Prescrição

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 22/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

19.1 Conceito
Quando um indivíduo pratica, em tese, um fato típico e ilícito, surge para o Estado o poder
e o dever de buscar a punição do responsável, ou seja, a pretensão punitiva. E essa punição é
concretizada com a sentença penal condenatória transitada em julgado, com a imposição de uma
pena, surgindo, a partir de então, a pretensão executória dessa pena.
Todavia, o exercício da pretensão punitiva e executória do Estado não é ilimitada ou
perpétua; não perdura, pois, como regra, por tempo indeterminado. O direito de punir e de
executar a pena imposta ao apenado encontra limites temporais, que, se não observados, podem
levar à extinção da punibilidade do agente pela incidência prescrição da pretensão punitiva ou
prescrição da pretensão executória.
A prescrição penal, pois, é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo
decurso do tempo sem o seu exercício.

19.2 Espécies de prescrição


Com a prática do crime, o direito abstrato de punir do Estado concretiza-se, dando origem
a um conflito entre o direito estatal de punir e o direito de liberdade do indivíduo. Assim, praticado
o crime e antes de a sentença penal transitar em julgado, o Estado é titular da pretensão punitiva
em busca da prestação jurisdicional postulada na peça acusatória.
Com o trânsito em julgado da decisão condenatória, o jus puniendi concreto transforma-
se em jus punitionis, isto é, a pretensão punitiva converte-se em pretensão executória.
Assim, pode-se verificar duas espécies de prescrição: a) prescrição da pretensão
punitiva propriamente dita; b) prescrição da pretensão executória.
Na prescrição da pretensão punitiva há uma subdivisão, apresentando três
modalidades: a) prescrição da pretensão punitiva em abstrato; b) prescrição da pretensão
punitiva retroativa; c) prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente.

278
Na prescrição da pretensão punitiva, o decurso do tempo faz com que o Estado perca o
direito de punir no tocante à pretensão de o poder judiciário julgar a lide e aplicar a sanção penal.
O marco divisório para identificação da espécie de prescrição é o trânsito em julgado da
sentença condenatória.
A prescrição da pretensão punitiva ocorre antes de a sentença final transitar em julgado
(CP, art. 109, caput). Exemplo: Suponha-se que um sujeito cometa um crime de lesão corporal
leve (pena de 03 meses a 01 ano), não se descobrindo a autoria. Se o Estado, dentro do prazo
de 4 (quatro) anos, não exercer o jus perseqüendi in juditio, opera-se a extinção da punibilidade
pela prescrição da pretensão punitiva.
Na prescrição da pretensão executória, o decurso do tempo sem o seu exercício faz com
que o Estado perca o direito de executar a sanção imposta na sentença condenatória.
A prescrição da pretensão executória ocorre após o trânsito em julgado da sentença
condenatória (CP, art. 110, caput). Exemplo: Suponha-se que o agente tenha sido condenado
irrecorrivelmente a três meses de detenção pela prática de lesão corporal leve, não fazendo jus
ao sursis. Se o Estado não iniciar a execução da pena no prazo de três anos, opera-se a extinção
da punibilidade pela prescrição da pretensão executória.

Prescrição da
pretensão punitiva
em abstrato ou
propriamente dita

Prescrição da Prescrição da
pretensão pretensão punitiva
punitiva retroativa
Prescrição Espécies
Prescrição da Prescrição da
pretensão punitiva
pretensão superveniente ou
executória intercorrente

279
TRÂNSITO EM
JULGADO DA Prescrição da
Prescrição da
SENTENÇA pretensão
pretensão punitiva
PENAL executória
CONDENATÓRIA

19.3 Efeitos da prescrição


Os efeitos da prescrição da pretensão punitiva e da prescrição da pretensão executória
são distintos.
a) Prescrição da pretensão punitiva
A prescrição da pretensão punitiva elimina o próprio exercício da ação penal, seja na fase
investigatória ou durante o processo judicial. Se a incidência da prescrição ocorrer ainda na fase
investigatória, deve o inquérito policial ser arquivado; se oferecida a denúncia, a peça acusatória
deverá ser rejeitada, já que ausente o interesse de agir (CPP, art. 395, II); se recebida a denúncia,
com citação do réu, deverá ser declarada a extinção da punibilidade, com absolvição sumária do
réu (CPP, art. 397, IV). Se incidir a qualquer tempo após a resposta à acusação, deverá ser
declarada extinta a punibilidade do acusado, nos termos do artigo 107, IV, do Código Penal.
A prescrição da pretensão punitiva ocorre antes do trânsito em julgado da sentença penal
condenatória, razão pela qual não gera efeitos penais, como, por exemplo, para fins de
reincidência ou maus antecedentes, nem extrapenais, como o dever de reparar o dano, pois não
haverá formação do título executivo.
b) Prescrição da pretensão executória
A prescrição da pretensão executória pressupõe sentença condenatória transitada em
julgado, incidindo, pois, na fase de execução da pena. Logo, compete ao juízo da execução penal
reconhecer a prescrição executória, e declarar a extinção da punibilidade, nos termos do artigo
66, II, da Lei de Execução Penal. Se o pedido formulado for indeferido, caberá contra essa
decisão o recurso de agravo em execução (LEP, art. 197).
Como há sentença condenatória transitada em julgado, a prescrição da pretensão
executória não apaga os efeitos da condenação, permanecendo, pois, hígidos os efeitos
secundários da condenação tanto na esfera penal, como no campo extrapenal.
Assim, a prescrição da pretensão executória não cessa os efeitos da sentença
condenatória definitiva para fins de reincidência ou maus antecedentes, bem como mantém a
possibilidade de ação de execução ex delicto, já que mantém o status de título executivo.

280
19.4 Prescrição da pretensão punitiva
• Introdução:
A prescrição da pretensão punitiva incide antes da sentença penal transitar em julgado, e
se subdivide em: a) prescrição da pretensão punitiva em abstrato; b) prescrição da pretensão
punitiva retroativa; c) prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente.

Prescrição da
pretensão punitiva

Prescrição da Prescrição da
pretensão punitiva em Prescrição da
pretensão punitiva
abstrato ou pretensão punitiva superveniente ou
propriamente dita retroativa
intercorrente

Conforme a espécie de prescrição, altera-se a forma do cálculo, os termos iniciais, bem


como o momento processual que poderá ser reconhecida. Por isso, para melhor compreensão
do leitor, afigura-se necessário estudo individualizado de cada uma dessas espécies.

19.4.1. Prescrição da pretensão punitiva em abstrato ou propriamente


dita
A prescrição da pretensão punitiva em abstrato ou propriamente dita está prevista no
artigo 109, caput, do Código Penal, e poderá incidir, como regra: a) entre a data da consumação
do fato e a do recebimento da denúncia; b) entre a data do recebimento da denúncia e da
publicação da sentença penal condenatória; c) entre a data do recebimento da denúncia até a
fase recursal, na hipótese de sentença absolutória.

19.4.1.1. Cálculo do prazo da prescrição da pretensão punitiva em


abstrato
Quando alguém é acusado de praticar uma infração penal é como se um cronômetro fosse
acionado, passando a correr o prazo para o Estado punir o cidadão.

281
Como ainda não há nenhum elemento ou fator concreto que possa servir de parâmetro
para esse cálculo, o legislador estabeleceu como base para o cálculo da prescrição da pretensão
punitiva em abstrato a pena máxima cominada ao delito pelo qual o agente está sendo acusado
(CP, art. 109, caput).
Para encontrar o prazo de prescrição da pretensão punitiva em abstrato, deve-se,
primeiro, ser verificado a pena máxima prevista para o delito, para, após, enquadrá-la no
correspondente inciso do artigo 109 do Código Penal.
Assim, para saber o prazo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato do crime de
homicídio, que prevê pena de 6 (seis) a 20 (vinte) anos, deve-se enquadrar a pena máxima (20
anos) no correspondente inciso do artigo 109 do Código Penal. No caso, a pena máxima de 20
(vinte) anos, enquadra-se no art. 109, I, do Código Penal, razão pela qual o prazo prescricional
do crime de homicídio é de 20 (vinte) anos.

Máximo da pena privativa de liberdade cominada Prazo prescricional

Homicídio: pena máxima de 20 (vinte) anos 20 (vinte) anos (art. 109, I, CP)

Da mesma forma, para saber o prazo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato do


crime de furto simples, que prevê pena de 1 (um) a 4 (quatro) anos, deve-se enquadrar a pena
máxima (4 anos) no correspondente inciso do artigo 109 do Código Penal. No caso, a pena
máxima de 4 (quatro) anos enquadra-se no art. 109, IV, do Código Penal, razão pela qual o prazo
prescricional do crime de furto simples é de 8 (oito) anos.

Máximo da pena privativa de liberdade cominada Prazo prescricional

Furto simples: pena máxima de 4 (quatro) anos 8 (oito) anos (art. 109, IV, CP)

Para efeito de contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva são levadas em


conta as causas de aumento e de diminuição da pena.
As agravantes e as atenuantes, salvo a relacionada à menoridade relativa e senilidade
(CP, art. 115), não influenciam no cálculo do prazo da prescrição da pretensão punitiva em

282
abstrato, já que não há parâmetro estabelecido em lei do quantum do agravamento e da
atenuação, ficando, pois, a cargo da discricionariedade do juiz.
• Causas de aumento de aumento de pena
Em relação à causa de aumento de pena, deve-se considerar a fração que mais aumenta,
a fim de ser alcançada a pena máxima cominada ao delito na forma majorada.
Assim, se, por exemplo, o agente praticar o crime de roubo majorado pelo emprego de
arma branca, a pena será aumentada de 1/3 (um terço) até a metade (CP, art. 157, § 2º, VII).
Nesse caso, para fins de verificação da prescrição, deve-se considerar a pena máxima do crime
de roubo (dez)anos) e elevar em metade (fração que mais aumenta), chegando à pena máxima
do crime de roubo majorado pelo emprego de arma branca em 15 (quinze) anos. Agora, resta
enquadrar essa pena máxima no inciso I do artigo 109 do Código Penal, para constatar que o
prazo prescricional será de 20 (vinte) anos.

Máximo da pena privativa de liberdade cominada Prazo prescricional

Roubo majorado pelo emprego de arma branca


(aumento de 1/3 a ½): Pena máxima = 15 (quinze)
20 (vinte) anos (art. 109, I,
anos, resultado do acréscimo de metade sobre a pena
CP)
máxima de 10 (dez) anos cominada ao crime de roubo
simples.

• Causas de diminuição da pena


Em relação à causa de diminuição da pena, deve-se considerar a fração que menos
diminua, para alcançar a pena máxima cominada ao delito praticado, com incidência de causa
de redução da pena.
Imaginemos que o agente tenha praticado o crime de estelionato simples tentado (CP, art.
171 c/c 14, II). A pena do crime de furto simples varia de 1 (um) a 5 (cinco) anos, sobre a qual
recai a redução de um a dois terços, em decorrência da tentativa (CP, art. 14, parágrafo único).
Logo, deve-se considerar a pena de 5 (quatro) anos e diminui-la de um terço (1/3), como forma
de alcançar a pena máxima do crime de furto simples tentado, que, no caso, será de 3 (três)
anos e 4 (quatro) meses. Agora, resta enquadrar essa pena máxima do estelionato simples
tentado no inciso IV do artigo 109 do Código Penal, para constatar que o prazo prescricional será
de 8 (oito) anos

283
Máximo da pena privativa de liberdade cominada Prazo prescricional

Estelionato simples tentado: Pena máxima = 3 (dois)


anos e 4 (quatro) meses, resultado da diminuição de
8 (oito) anos (art. 109, IV, CP)
1/3 sobre a pena máxima de 8 (oito) anos cominada
ao crime de furto simples.

• Concurso de crimes
No caso de concurso de crimes, o prazo da prescrição da pretensão punitiva deve
considerar a pena máxima cominada a cada infração penal, isoladamente (CP, art. 119).
Logo, o critério da exasperação da pena e do cúmulo material não é considerado para
verificação do prazo prescricional.
Assim, se, por exemplo, o agente praticou três crimes de furto simples, em continuidade
delitiva, o prazo da prescrição da pretensão punitiva deve ser verificado isoladamente, em
relação a cada um dos crimes, ignorando em absoluto a exasperação da pena de um sexto e
dois terços, prevista no artigo 71, caput, do Código Penal.
É o que se extrai também da Súmula 497 do STF.

19.4.1.2. Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva em abstrato


O prazo prescricional, como dito, é verificado com base nos prazos previstos no artigo 109
do Código Penal. Após encontrar o prazo prescricional pertinente à infração penal pelo qual o
agente está sendo acusado, deve-se verificar em que momento esse prazo começa a correr, ou
seja, o termo inicial da contagem do prazo prescricional.
Nos termos do artigo 111 do Código Penal, a prescrição, antes de transitar em julgado a
sentença final, começa a correr:
I) Do dia em que o crime se consumou
Para fins de termo inicial da prescrição da pretensão punitiva em abstrato, aplica-se, como
regra, a teoria do resultado, devendo ser considerado o dia da consumação do delito.
Em relação aos crimes materiais, o prazo prescricional começa a correr a partir da
produção do resultado naturalístico. Nos crimes formais e de mera conduta, que não exigem a
produção de resultado naturalístico, o prazo começa a correr a partir da prática da conduta
delituosa, já que se confunde com o momento da consumação do delito.

284
II) No caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa
Em relação ao crime tentado, o prazo prescricional começará a correr na data em que foi
praticado o último ato de execução.
Assim, se, por exemplo, no contexto de tentativa de homicídio, os disparos foram
efetuados num determinado dia, sem, no entanto, ocorrer a consumação por circunstâncias
alheias à sua vontade, o prazo prescricional começará a correr na data dos disparos.
Todavia, se a vítima foi encaminhada para o hospital, onde ficou convalescendo por cerca
de dois meses, mas não resiste aos ferimentos, vindo a óbito, o prazo prescricional do crime de
homicídio consumado começará a correr da data do falecimento da vítima, ou seja, na data da
consumação do delito, que ocorreu dois meses depois do último ato executório.
III) Nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência
No crime permanente, a prescrição começa a correr do dia em que cessou a permanência.
Suponha-se, por exemplo, que a vítima de sequestro permaneça em poder do agente pelo
período de 30 (trinta) dias, sendo, ao final, resgatada. O termo inicial da prescrição da pretensão
punitiva pela prática do crime de sequestro (CP, art. 148) será a data em que a vítima foi
resgatada ou liberada, ou seja, no dia em que cessou a prática do crime permanente.
IV) Nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro
civil, da data em que o fato se tornou conhecido
Nos crimes de bigamia (CP, art. 235) e de falsificação ou alteração de assentamento de
registro civil (CP, art. 299, parágrafo único), a prescrição começa a correr da data em que o fato
se tornou conhecido de qualquer autoridade pública.
Não se afigura necessário se revestir de formalidade esse conhecimento, bastando que a
autoridade pública tenha tomado ciência até mesmo diante da notoriedade que o fato teria
alcançado.
V) Nos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência contra a criança
e o adolescente, previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima
completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.
Nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, previstos no Código
Penal ou em legislação especial, o termo inicial da prescrição ocorre da data em que a vítima
completar dezoito anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal (CP, art.
111, V). Esse inciso foi introduzido no Código Penal pela Lei nº 12.650/2012.

285
Nesse sentido, se uma criança de 10 (dez) anos for vítima de crime de estupro de
vulnerável (CP, art. 217-A), por exemplo, e a ação ainda não tiver sido instaurada, o prazo
prescricional passará a correr a partir da data em que ela completar 18 (dezoito) anos.
Se ação já tiver sido proposta, não se aplica o disposto no artigo 111, V, do Código Penal,
começando a correr o prazo prescricional da data em que foi ajuizada a ação penal (e não da
data da consumação do delito). Isso porque até o oferecimento da denúncia, o prazo
prescricional aguardava a vítima completar 18 (dezoito) anos para começar a correr. Como a
denúncia foi oferecida antes da vítima completar essa idade, o termo inicial da prescrição da
pretensão punitiva será o oferecimento da peça acusatória, sendo o prazo interrompido com o
recebimento da denúncia (CP, art. 117, I), voltando a correr até o próximo marco interruptivo,
que seria a publicação de eventual sentença penal condenatória (CP, art. 117, IV).
A Lei 14.344/2022 ampliou o alcance desse inciso, considerando também como termo
inicial a data em que a vítima completar 18 anos, quando se tratar de crimes que envolvam
violência contra a criança ou adolescente, como, por exemplo, lesão corporal grave ou
gravíssima.

19.4.1.3. Causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva


Após encontrar o prazo prescricional e verificar o termo inicial, afigura-se indispensável
identificar as causas interruptivas do curso do prazo prescricional, relacionadas, invariavelmente,
ao momento procedimental em que ação penal se encontra.
Conforme se extrai do artigo 117, § 2º, do Código Penal, uma vez interrompida a
prescrição, todo o prazo começa a correr novamente do dia da interrupção. Consideremos que
o prazo prescricional comece a correr a partir do dia da consumação do delito, com o recebimento
da denúncia ou queixa, a contagem desse prazo é interrompida, voltando a correr, por inteiro, a
partir da data da interrupção.
Assim, se, por exemplo, o agente estiver sendo acusado pela prática do crime de furto
simples, cuja pena cominada varia de 1 (um) a 4 (quatro) anos (CP, art. 155, caput), o prazo
prescricional de 8 (oito) anos (CP, art. 107, IV) começa a correr a partir da consumação do delito.
Consideremos que a denúncia tenha sido recebida 5 (cinco) anos depois da consumação. Nesse
caso, a contagem do prazo prescricional será interrompida, voltando a correr, por inteiro (ou
seja, o prazo de 8 anos), a partir da data da interrupção da prescrição.
As causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva estão previstas no artigo 117,
I a IV, do Código Penal:

286
Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se:
I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa;
II - pela pronúncia;
III - pela decisão confirmatória da pronúncia;
IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;
(...)

As hipóteses previstas nos incisos V (pelo início ou continuação do cumprimento da pena)


e VI (pela reincidência) guardam relação com a prescrição da pretensão executória, e serão
analisadas no momento oportuno.
Trata-se de rol taxativo, não sendo possível empregar analogia para alcançar causas não
previstas em lei.
A verificação das causas interruptivas da prescrição é de fundamental importância, pois,
invariavelmente, a prescrição incide no intervalo entre os marcos interruptivos.
Com efeito, no procedimento diverso do Tribunal do Júri, a prescrição da pretensão
punitiva em abstrato poderá incidir: a) entre a data da consumação do delito até o recebimento
da denúncia; b) entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença
condenatória; c) entre a data do recebimento da denúncia até a fase recursal, na hipótese de
sentença absolutória.

Data do recebimento da Data da publicação da


Data da sentença condenatória
denúncia
consumação art. 117, IV, CP
art. 117, I, CP

Momento da Momento da
prescrição 1 prescrição 2

Data do recebimento da Data da publicação Fase


Data da da sentença
denúncia recursal
consumação absolutória
art. 117, I, CP

Momento da Momento da
prescrição 1 prescrição 2

287
Note-se que, nesse caso, a publicação da sentença absolutória não constitui causa de
interrupção da prescrição, razão pela qual o prazo começa a correr da data do recebimento da
denúncia e não se interrompe com a sentença absolutória.
Em relação ao procedimento do Tribunal do Júri, a prescrição da pretensão punitiva em
abstrato poderá incidir entre: a) a data da consumação do delito até a data do recebimento da
denúncia; b) entre a data do recebimento da denúncia e a data da decisão de pronúncia; c) entre
a data da decisão de pronúncia e a data da decisão confirmatória da pronúncia, se interposto
recurso contra decisão de pronúncia; d) entre a data da decisão de pronúncia e a data da
publicação da sentença penal condenatória, se não interposto recurso contra decisão de
pronúncia; e) entre a data da decisão confirmatória da pronúncia e a data da publicação da
sentença penal condenatória.

Data do Data da decisão Data da decisão Data da publicação


Data da recebimento da confirmatória da da sentença
de pronúncia
consumação denúncia pronúncia condenatória
art. 117, II, CP Art. 117, IV, CP
art. 117, I, CP Art. 117, III, CP

Momento da Momento da Momento da Momento da


prescrição 1 prescrição 2 prescrição 3 prescrição 4

Passemos à análise de cada uma das causas interruptivas da prescrição da pretensão


punitiva:
I) pelo recebimento da denúncia ou da queixa
O recebimento da denúncia ou queixa (e não o oferecimento) interrompe o prazo
prescricional, recomeçando a correr a prescrição da pretensão punitiva por inteiro, não sendo
levado em conta o tempo já decorrido antes da interrupção.
O Ministério Público ou o ofendido oferecem a respectiva peça acusatória, que será
protocolada, sendo os autos conclusos ao juiz, que proferirá decisão recebendo ou não a
denúncia ou queixa-crime. Posteriormente, os autos são devolvidos para o escrivão ou diretor
do cartório, que registrará a decisão e certificará no processo, operando-se, nesse momento, a
publicação do despacho que recebeu ou não a peça acusatória.

288
Com a publicação do despacho de recebimento da denúncia ou da queixa, opera-se a
interrupção do prazo prescricional, que volta a correr, por inteiro, a partir dessa data.
Se, porventura, rejeitada ou não recebida a denúncia ou queixa-crime, e interposto o
recurso cabível, a interrupção da prescrição ocorrerá na data da sessão de julgamento do recurso
em sentido estrito (CPP, art. 581) ou da apelação (Lei nº 9.099/95, art. 82), que reformou a
decisão de primeiro grau, e recebeu a denúncia. Isso porque, segundo a Súmula 709 do
Supremo Tribunal Federal: “Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê
o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela.” Se nula a
decisão, os autos retornam ao juízo a quo, para proferir nova decisão sem vícios, não podendo,
pois, o Tribunal anular a decisão e receber a peça acusatória, sob pena de supressão de
instância.
Se a denúncia ou queixa-crime for recebida por juízo absolutamente incompetente, o
despacho, com caráter decisório, não terá o condão de interromper a prescrição, pois decisão
nula não gera qualquer efeito, conforme se extrai do disposto no artigo 567 do Código de
Processo Penal, segundo o qual a incompetência do juízo anula os atos decisórios.
II) pela pronúncia
Trata-se de decisão proferida no final da primeira fase do procedimento do Tribunal do
Júri, destinado a processar e julgar crimes dolosos contra a vida.
A decisão de pronúncia se caracteriza por ter natureza de decisão interlocutória mista não
terminativa, que, verificando a presença de indícios da autoria e prova da materialidade, submete
o réu a julgamento perante o Plenário do Júri, conforme se extrai do artigo 413 do Código de
Processo Penal.
A interrupção da prescrição ocorre com a publicação da decisão de pronúncia, nas mãos
do escrivão ou chefe do cartório, sem a necessidade de publicação no diário oficial, ainda que
no contexto de processo eletrônico.
III) pela decisão confirmatória da pronúncia
Essa causa de interrupção da prescrição também se restringe ao procedimento do
Tribunal do Júri. Ocorre quando o réu é pronunciado, e, irresignado, interpõe recurso em sentido
estrito ao qual é dado improvimento, com a consequente confirmação da decisão de pronúncia
proferida pelo juízo de primeiro grau.
A interrupção da prescrição ocorrerá na data da sessão de julgamento do recurso no
Tribunal competente, e não da data da publicação do acórdão.

289
IV) pela publicação da sentença ou acórdão condenatório recorríveis
O art. 117, IV, Código Penal, prevê que a prescrição se interrompe pela sentença
condenatória recorrível. A interrupção ocorre na data da publicação da sentença, isto é, no dia
em que o escrivão recebe a sentença e certifica nos autos o respectivo termo, registrando-a em
livro especialmente destinado a esse fim, conforme dispõe o artigo 389 do Código de Processo
Penal.
O Superior Tribunal de Justiça também passou a adotar o entendimento no sentido de que
o acórdão condenatório sempre interrompe a prescrição, inclusive quando confirmatório da
sentença de primeiro grau, seja mantendo, reduzindo ou aumentando a pena originariamente
imposta.
Dessarte, o acórdão confirmatório da sentença condenatória, seja mantendo, reduzindo
ou aumentando a pena anteriormente imposta, constitui causa interruptiva da prescrição.

19.4.1.4. Hipóteses de incidência da prescrição da pretensão punitiva


em abstrato
A partir da verificação do prazo prescricional e do termo inicial, levando em conta as
causas interruptivas da prescrição, afigura-se possível definir alguns cenários de incidência da
prescrição da pretensão punitiva em abstrato, distinguindo as hipóteses envolvendo
procedimento diverso do Tribunal do Júri e procedimento do Tribunal do Júri.
A) Procedimento diverso do Tribunal do Júri
Conforme exposto alhures, a prescrição envolvendo crimes não dolosos contra a vida, que
não seguem o procedimento do Tribunal do Júri, incide: a) entre a data da consumação do delito
e a data do recebimento da denúncia ou queixa; b) entre a data do recebimento da denúncia ou
queixa e a data da publicação da sentença penal condenatória; c) entre a data do recebimento
da denúncia ou queixa e a fase recursal, no contexto de sentença absolutória.
i) entre a data da consumação e a data do recebimento da denúncia ou queixa
Conforme o artigo 111, I, do Código Penal, o prazo da prescrição da pretensão punitiva
começa a correr, como regra, a partir da consumação do delito, tendo como primeiro marco
interruptivo o recebimento da denúncia ou queixa (CP, art. 117, I).
Nesse cenário, imaginemos que foi praticado um crime de furto simples (CP, art. 155) no
dia 5 de outubro de 2010. Instaurado o respectivo inquérito policial, a investigação se
desenvolveu de forma bastante lenta, não avançando quanto à identificação da autoria do delito,

290
mas recaindo a suspeita em relação ao agente “A”. Concluído o inquérito policial, o procedimento
investigatório foi encaminhado para o Ministério Público no dia 10 de novembro de 2018.
Nesse caso, considerando-se a pena máxima do crime de furto simples (04 anos), o prazo
prescricional será de 8 (oito) anos, conforme o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso
concluir que, no caso, incidiu a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, pois entre a data
da consumação do crime de furto e o dia 10 de novembro de 2018 passaram-se mais de 8 (oito)
anos sem o recebimento da denúncia e, por conseguinte, a interrupção do prazo prescricional.
Resta declarar extinta a punibilidade do agente, com base no artigo 107, IV, do Código Penal,
com extinção e baixa do expediente criminal.
Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria até
o dia 04/10/2018 para o recebimento da denúncia, e, por consequência, interrupção do prazo
prescricional, com o recomeço da contagem por inteiro.

Data da Data do recebimento


consumação da denúncia

05/10/2010 10/11/2018

PPPA
Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria até
o dia 04/10/2018 para o recebimento da denúncia, e, por consequência, interrupção do prazo
prescricional, com o recomeço da contagem por inteiro.
ii) entre a data do recebimento da denúncia ou queixa e a data da publicação da
sentença condenatória
Com o recebimento da denúncia ou queixa, interrompe-se o curso do prazo prescricional,
voltando a correr por inteiro até o próximo marco interruptivo, consistente na publicação da
sentença penal condenatória (CP, art. 117, IV).
Imaginemos que o réu foi denunciado por ter praticado crime de furto simples (CP, art.
155) no dia 5 de outubro de 2010. A denúncia foi recebida no dia 15 de março de 2012. A ação
penal se desenvolveu de forma bastante lenta, estando, até o dia 20 de abril de 2020, na fase
de instrução processual, não tendo sido, portanto, proferida sentença.

291
Nesse caso, considerando-se a pena máxima do crime de furto simples (04 anos), o prazo
prescricional será de 8 (oito) anos, conforme o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso
concluir que, no caso, incidiu a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, pois entre a data
do recebimento da denúncia (15/03/2012) e o dia 20 de abril de 2020 passaram-se mais de 8
(oito) anos sem publicação da sentença penal condenatória, e, por conseguinte, a interrupção
do prazo prescricional. Resta declarar extinta a punibilidade do agente, com base no artigo 107,
IV, do Código Penal, com extinção e baixa do processo.

Data do recebimento da Ainda não


Data da
denúncia proferida a sentença
consumação

05/10/2010 15/03/2012 20/04/2020

PPPA

Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria até
o dia 14.03.2020 para a publicação da sentença penal condenatória, e, por consequência,
interrupção do prazo prescricional, com o recomeço da contagem por inteiro.
iii) entre a data do recebimento da denúncia ou queixa e a fase recursal,
considerando sentença absolutória
Consoante se extrai do artigo 117, IV, do Código Penal, somente a sentença penal
condenatória tem o condão de interromper o prazo prescricional. Logo, se proferida sentença
absolutória, não haverá interrupção do prazo prescricional, que continuará correndo desde o
recebimento da denúncia.
Exemplo: o réu denunciado por ter praticado o crime de furto simples (CP, art. 155) no dia
5 de outubro de 2010. A denúncia foi recebida no dia 15 de março de 2012. Após regular
andamento do processo, o Magistrado proferiu, no dia 10 de junho de 2016 sentença absolutória.
Irresignado, o Ministério Público interpôs recurso de apelação, que, até o dia 20.04.2020, ainda
não havia sido pautado para ser submetido a julgamento pelo Tribunal de Justiça.
Nesse caso, considerando-se a pena máxima do crime de furto simples (04 anos), o prazo
prescricional será de 8 (oito) anos, conforme o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso
concluir que, no caso, incidiu a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, pois entre a data

292
do recebimento da denúncia (15/03/2012) e o dia 20 de abril de 2020 passaram-se mais de 8
(oito) anos, sem publicação de eventual acórdão condenatório, e, por conseguinte, a interrupção
do prazo prescricional. Resta declarar extinta a punibilidade do agente, com base no artigo 107,
IV, do Código Penal, com extinção e baixa do processo.

Data do
Data da recebimento da Sentença Apelação
consumação absolutória do MP
denúncia

05.10.2010 10.06.2016 20.04.2020


15.03.2012 Recuso ainda
não julgado

PPPA

Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria até
o dia 14/03/2020 para a publicação do acórdão condenatório, e, por consequência, interrupção
do prazo prescricional, com o recomeço da contagem por inteiro.

B) Procedimento do Tribunal do Júri


Em relação ao procedimento do Tribunal do Júri, a prescrição da pretensão punitiva em
abstrato poderá incidir entre: a) entre a data da consumação do delito até a data do recebimento
da denúncia; b) entre a data do recebimento da denúncia e a data da decisão de pronúncia; c)
entre a data da decisão de pronúncia e a data da decisão confirmatória da pronúncia; d) entre a
data da decisão de pronúncia e a data da publicação da sentença penal condenatória, se não
interposto recurso contra decisão de pronúncia; e) entre a data da decisão confirmatória da
pronúncia e a data da publicação da sentença penal condenatória.
O procedimento do Tribunal do Júri é aplicado aos crimes dolosos contra a vida, assim
considerados o homicídio doloso (CP, art. 121, caput, §§ 1º e 2º); induzimento, instigação ou
auxílio ao suicídio (CP, art. 122); infanticídio (CP, art. 123); e aborto (CP, art. 124/127).

293
a) entre a data da consumação do delito até a data do recebimento da denúncia
Conforme o artigo 111, I, do Código Penal, o prazo da prescrição da pretensão punitiva
começa a correr, como regra, a partir da consumação do delito, tendo como primeiro marco
interruptivo o recebimento da denúncia ou queixa (CP, art. 117, I).
Nesse cenário, imaginemos que o agente tenha sido acusado de ter praticado, no dia 5
de outubro de 2010, crime de aborto com o consentimento da gestante (CP, art. 126). Instaurado
o respectivo inquérito policial, a investigação se desenvolveu de forma bastante lenta, não
avançando quanto à identificação da autoria do delito, mas recaindo a suspeita em relação ao
agente “A”. Concluído o inquérito policial, o procedimento investigatório foi encaminhado para o
Ministério Público no dia 10 de novembro de 2018.
Nesse caso, considerando-se a pena máxima de 4 (quatro) anos, cominada ao crime de
aborto com o consentimento da gestante (04 anos), o prazo prescricional será de 8 (oito) anos,
conforme o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso concluir que, no caso, incidiu a
prescrição da pretensão punitiva em abstrato, pois entre a data da consumação do crime de
aborto e o dia 10 de novembro de 2018 passaram-se mais de 8 (oito) anos sem o recebimento
da denúncia e, por conseguinte, a interrupção do prazo prescricional. Resta declarar extinta a
punibilidade do agente, com base no artigo 107, IV, do Código Penal, com extinção e baixa do
expediente criminal.

Data da Ainda não recebida a


consumação denúncia

05/10/2010 10/11/2018

PPPA

Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria até
o dia 04/10/2018 para o recebimento da denúncia, e, por consequência, interrupção do prazo
prescricional, com o recomeço da contagem por inteiro.

294
b) entre a data do recebimento da denúncia e a data da decisão de pronúncia
Nesse cenário, imaginemos que o agente tenha sido acusado de ter praticado, no dia 5
de outubro de 2010, crime de aborto com o consentimento da gestante (CP, art. 126). A denúncia
foi recebida no dia 15.03.2012. A ação penal se desenvolveu de forma bastante lenta, estando,
até o dia 20 de abril de 2020, na fase de instrução processual, não tendo sido, portanto, proferida
sentença.
Nesse caso, considerando-se a pena máxima de 4 (quatro) anos, cominada ao crime de
aborto com o consentimento da gestante, o prazo prescricional será de 8 (oito) anos, conforme
o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso concluir que, no caso, incidiu a prescrição da
pretensão punitiva em abstrato, pois entre a data do recebimento da denúncia (15.03.2012) até
a data em que o processo ainda se encontrava na fase de instrução (20.04.2020) passaram-se
mais de 8 (oito) anos sem que tivesse sido proferida decisão de pronúncia e, por conseguinte, a
interrupção do prazo prescricional. Resta declarar extinta a punibilidade do agente, com base no
artigo 107, IV, do Código Penal, com extinção e baixa do expediente criminal.

Data da Data do recebimento da Ainda não proferida


consumação denúncia decisão de pronúncia

05/10/2010 15/03/2012 20/04/2020

PPPA

Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria até
o dia 14/03/2020 para a decisão de pronúncia e, por consequência, interrupção do prazo
prescricional, com o recomeço da contagem por inteiro.

c) entre a data da decisão de pronúncia e a data da decisão confirmatória da


pronúncia
Nesse cenário, imaginemos que o agente tenha sido acusado de ter praticado, no dia 5
de outubro de 2010, crime de aborto com o consentimento da gestante (CP, art. 126). A denúncia

295
foi recebida no dia 15 de março de 2011. A decisão de pronúncia foi publicada no dia 16 de julho
de 2012. O réu interpôs recurso em sentido estrito, sendo improvido no dia 23 de agosto de 2020,
com a consequente confirmação da decisão de pronúncia.
Nesse caso, considerando-se a pena máxima de 4 (quatro) anos, cominada ao crime de
aborto com o consentimento da gestante, o prazo prescricional será de 8 (oito) anos, conforme
o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso concluir que, no caso, incidiu a prescrição da
pretensão punitiva em abstrato, pois, entre a data da pronúncia (16/07/2012) até a data da
decisão confirmatória da pronúncia (23/08/2020), passaram-se mais de 8 (oito) anos. Resta
declarar extinta a punibilidade do agente, com base no artigo 107, IV, do Código Penal, com
extinção e baixa do expediente criminal.

Data do Data decisão


Data da recebimento da Data decisão de confirmatória da
consumação denúncia pronúncia pronúncia

05/10/2010 16/07/2012 23/08/2020


15/03/2011

PPPA

Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria até
o dia 15/07/2020 para apreciar o recurso interposto pela defesa e confirmar a decisão de
pronúncia, provocando, por consequência, interrupção do prazo prescricional, com o recomeço
da contagem por inteiro.

d) entre a data da decisão de pronúncia e a data da publicação da sentença penal


condenatória, se não interposto recurso contra decisão de pronúncia
Nesse cenário, imaginemos que o agente tenha sido acusado de ter praticado, no dia 5
de outubro de 2010, crime de aborto com o consentimento da gestante (CP, art. 126). A denúncia
foi recebida no dia 15 de março de 2011. A decisão de pronúncia foi publicada no dia 16 de julho
de 2012. O réu não interpôs recurso em sentido estrito. Até o dia 23.08.2020, o réu ainda não
havia sido submetido a julgamento perante o Plenário do Júri, não havendo, pois, sentença
condenatória.

296
Nesse caso, considerando-se a pena máxima de 4 (quatro) anos, cominada ao crime de
aborto com o consentimento da gestante, o prazo prescricional será de 8 (oito) anos, conforme
o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso concluir que, no caso, incidiu a prescrição da
pretensão punitiva em abstrato, pois, entre a data da pronúncia (16.07.2012) até a data que o
réu ainda não havia sido submetido a julgamento perante o Plenário do Júri (23.08.2020),
passaram-se mais de 8 (oito) anos. Resta declarar extinta a punibilidade do agente, com base
no artigo 107, IV, do Código Penal, com extinção e baixa do expediente criminal.

Data sem julgamento perante


Data da Data do recebimento Data decisão de o Plenário do Júri e, portanto,
consumação da denúncia pronúncia sem condenação

05/10/2010 16/07/2012 23/08/2020


15/03/2011

PPPA

Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria se
submeter o réu a julgamento perante o Plenário do Júri, com a respectiva condenação, até o dia
15/07/2020, provocando, por consequência, interrupção do prazo prescricional, com o recomeço
da contagem por inteiro.
e) entre a data da decisão confirmatória da pronúncia e a data da publicação da
sentença penal condenatória.
Nesse cenário, imaginemos que o agente tenha sido acusado de ter praticado, no dia 5
de outubro de 2010, crime de aborto com o consentimento da gestante (CP, art. 126). A denúncia
foi recebida no dia 15 de março de 2011. A decisão de pronúncia foi publicada no dia 16 de
fevereiro de 2012. O réu interpôs recurso em sentido estrito, sendo improvido no dia 23 de agosto
de 2012, com a consequente confirmação da decisão de pronúncia. Até o dia 24.09.2020, o réu
ainda não havia sido submetido a julgamento perante o Plenário do Júri, não havendo, pois,
sentença condenatória.

297
Nesse caso, considerando-se a pena máxima de 4 (quatro) anos, cominada ao crime de
aborto com o consentimento da gestante, o prazo prescricional será de 8 (oito) anos, conforme
o artigo 109, IV, do Código Penal. Logo, forçoso concluir que, no caso, incidiu a prescrição da
pretensão punitiva em abstrato, pois, entre a data da decisão confirmatória da pronúncia
(16.07.2012) até a data que o réu ainda não havia sido submetido a julgamento perante o
Plenário do Júri (24.09.2020), passaram-se mais de 8 (oito) anos. Resta declarar extinta a
punibilidade do agente, com base no artigo 107, IV, do Código Penal, com extinção e baixa do
expediente criminal.

Data sem
Decisão julgamento perante
Data da Data do confirmatória o Plenário do Júri e,
recebimento da Data decisão portanto, sem
consumação da pronúncia
denúncia de pronúncia condenação

16/02/2012 23/08/2012 24/09/2020


05/10/2010 15/03/2011

PPPA

Para que não incidisse a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, o Estado teria se
submeter o réu a julgamento perante o Plenário do Júri, com a respectiva condenação, até o dia
22/08/2020, provocando, por consequência, interrupção do prazo prescricional, com o recomeço
da contagem por inteiro.

19.4.2. Prescrição da pretensão punitiva retroativa


A prescrição da pretensão punitiva retroativa estava prevista no artigo 110, § 2º, do Código
Penal, que previa a possibilidade da prescrição da pretensão punitiva retroativa entre a data do
fato e o recebimento da denúncia. Esse artigo foi revogado pela Lei nº 12.234, de 5 de maio de
2010.

298
Com a revogação do artigo, surgiram algumas vozes afirmando a exclusão da prescrição
da pretensão punitiva retroativa do ordenamento jurídico. Todavia, a parte final do artigo 110, §
1º, do Código Penal, dispõe que a prescrição, em nenhuma hipótese, poderá ter por termo inicial
data anterior à da denúncia ou queixa.
Em síntese, em relação aos fatos praticados a partir do dia 05 de maio de 2010, somente
será possível a prescrição da pretensão punitiva considerando o lapso temporal incidente após
a denúncia. Para fatos praticados antes do dia 05 de maio de 2010, será possível a prescrição
da pretensão retroativa entre a data da consumação e o recebimento da denúncia, bem entre o
recebimento da denúncia e a publicação da sentença penal condenatória.
Pressupostos: Por primeiro, para cogitar a incidência da prescrição da pretensão punitiva
retroativa, não pode ter se verificado a prescrição da pretensão da pretensão punitiva em
abstrato.
A prescrição retroativa tem por pressuposto a prolação de uma sentença penal
condenatória, bem como o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para a acusação,
seja por força de decisão do juízo de primeiro grau, seja por força de eventual improvimento do
seu recurso. É o que se extrai do próprio artigo 110, § 1º, do Código Penal.

Não ter incidido prescrição da pretensão punitiva em


abstrato

Pressupostos Sentença condenatória

Trânsito em julgado para acusação ou improvimento do


seu recurso

19.4.2.1. Cálculo do prazo da prescrição da pretensão punitiva retroativa


Com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para a acusação ou
improvimento do seu recurso, tem-se que, a partir de eventual recurso da defesa, o Tribunal não
poderá agravar a situação do réu, sob pena de incorrer na reformatio in pejus direta, o que é
vedado conforme prevê o artigo 617 do Código Processo Penal. Em decorrência disso, a pena
máxima no caso concreto será a aplicada na sentença, já que, com o trânsito em julgado para
acusação, não poderá ser alterada para prejudicar o réu, na hipótese de recurso exclusivo da
defesa.

299
Assim, a base para calcular a prescrição se altera, passando a ser considerada a pena
aplicada na sentença, que deverá ser enquadrada num dos incisos do artigo 109 do Código
Penal, para ser verificado o prazo prescricional.

19.4.2.2. Hipóteses de incidência da prescrição da pretensão punitiva


retroativa nos crimes diversos do Procedimento do Tribunal do Júri
Verificado o prazo prescricional com base na pena aplicada na sentença, a prescrição
retroativa deve ser considerada a partir da publicação da sentença ou acórdão condenatório para
trás. Por isso, a denominação “retroativa”, já que sua incidência é verificada entre os marcos
interruptivos existentes antes da sentença ou acórdão condenatório.
Assim, em tese, no procedimento diverso do Tribunal do Júri, será possível verificar a
prescrição da pretensão punitiva retroativa: a) entre a data da publicação da sentença
condenatória e a data do recebimento da denúncia; b) entre a data do acórdão condenatório e a
data do recebimento da denúncia.

Data do recebimento da Data da publicação da


Data da denúncia ou queixa
consumação sentença condenatória

PPPR

Data publicação
Data da Data da sentença
absolutória acórdão
consumação condenatório
Data do recebimento da
denúncia ou queixa
PPPR

a) entre a data da publicação da sentença condenatória e a data do recebimento da


denúncia
Com o recebimento da denúncia ou queixa, interrompe-se o curso do prazo prescricional,
voltando a correr por inteiro até o próximo marco interruptivo, consistente na publicação da
sentença penal condenatória (CP, art. 117, IV).

300
Imaginemos que o réu tenha sido denunciado pela prática, no dia 5 de outubro de 2014,
do crime de furto simples (CP, art. 155). A denúncia foi recebida no dia 15 de março de 2016.
Após regular tramitação do processo, o Magistrado proferiu sentença condenatória, publicada no
dia 18 de abril de 2020, fixando pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, e multa. O
Ministério Público, satisfeito, não interpôs recurso, ocorrendo o trânsito em julgado para a
acusação.
Nesse caso, verifica-se que não há incidência da prescrição da pretensão punitiva em
abstrato. Os pressupostos para análise da prescrição da pretensão punitiva retroativa estão
presentes: a) sentença condenatória; b) trânsito em julgado para a acusação.
Logo, a base de cálculo para a prescrição se altera, passando da pena máxima cominada
ao delito, para ser considerada a pena aplicada. No caso, a pena aplicada foi de 1 (um) ano e 4
(quatro) meses, sendo o prazo prescricional de 4 (quatro) anos (CP, art. 109, V). Agora,
considerando o novo prazo prescricional, com base na pela aplicada, deve ser refeita, de forma
retroativa, ou seja, da sentença para trás, a análise da incidência da prescrição da pretensão
punitiva retroativa.
E, no caso, forçoso concluir que incidiu a prescrição da pretensão punitiva retroativa, pois,
fazendo a reanalise dos marcos interruptivos antes da sentença, verifica-se que entre a data da
publicação da sentença condenatória (18/04/2020) e a data do recebimento da denúncia
(15/03/2016), passaram-se mais de 4 (quatro) anos.

Pena: 01 ano e 04 meses

Data publicação da Trânsito em


Data da Data do recebimento julgado para o
da denúncia sentença
consumação Ministério
condenatória
Público

05/10/2014 15/03/2016 18/04/2020

PPPR

301
Para evitar a incidência da prescrição, a publicação da sentença penal condenatória
deveria ter ocorrido até o dia 14/03/2020.

b) entre a data do acórdão condenatório e a data do recebimento da denúncia.


Imaginemos que o réu tenha sido denunciado pela prática, no dia 5 de outubro de 2014,
do crime de furto simples (CP, art. 155). A denúncia foi recebida no dia 15 de março de 2016.
Após regular tramitação do processo, no dia 15 de junho de 2018, o Magistrado proferiu sentença
absolutória. O Ministério Público, irresignado, interpôs recurso de apelação, ao qual foi dado
provimento pelo Tribunal, que proferiu acórdão condenatório, fixando pena de 1 (um) ano e 4
(meses), transitando em julgado para a acusação, publicado no dia 18 de abril de 2020.
Nesse caso, verifica-se que não há incidência da prescrição da pretensão punitiva em
abstrato. Os pressupostos para análise da prescrição da pretensão punitiva retroativa estão
presentes: a) acórdão condenatório; b) trânsito em julgado para a acusação.
Logo, a base de cálculo para a prescrição se altera, passando da pena máxima cominada
ao delito, para ser considerada a pena aplicada. No caso, a pena aplicada foi de 1 (um) ano e 4
(quatro) meses, sendo o prazo prescricional de 4 (quatro) anos (CP, art. 109, V). Agora,
considerando o novo prazo prescricional, com base na aplicada, deve ser refeita, de forma
retroativa, ou seja, da sentença para trás, a análise da incidência da prescrição da pretensão
punitiva retroativa.
E, no caso, forçoso concluir que incidiu a prescrição da pretensão punitiva retroativa, pois,
fazendo a reanalise dos marcos interruptivos, verifica-se que entre a data da publicação do
acórdão condenatório (18/04/2020) e a data do recebimento da denúncia (15/03/2016),
passaram-se mais de 4 (quatro) anos.
.
Pena: 01 ano e 04 meses

Data da Data do
recebimento Sentença Apelação Publicação Trânsito em
consumação Ministério
da denúncia absolutória acórdão julgado para
Público condenatório MP

05/10/2014 15/03/2016 15/06/2018 18/04/2020

PPPR

302
Para evitar a incidência da prescrição, o acórdão condenatório deveria ter sido publicado
até o dia 14/03/2020.

19.4.2.4. Prescrição da pretensão punitiva retroativa entre a data da


consumação e o recebimento da denúncia e a ultratividade do artigo 110, §
2º, do Código Penal
O artigo 110, § 2º, do Código Penal, admitia a prescrição considerando como termo inicial
data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa. Em outras palavras, havia a
possibilidade de prescrição da pretensão punitiva retroativa entre a data da consumação e a data
do recebimento da denúncia.
Com a revogação do artigo 110, § 2º, do Código Penal, pela Lei nº 12.234, de 5 de maio
de 2010, não mais se afigura possível a prescrição da pretensão punitiva retroativa considerando
como termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa (CP, art. 110, § 1º, parte final). Logo,
em tese, a partir do dia 5 de maio de 2010, somente será possível prescrição da pretensão
punitiva retroativa após a denúncia.
Como se trata de lei posterior mais severa, não retroage para alcançar fatos praticados
antes do dia 5 de maio de 2010. Logo, o artigo 110, § 2º, do Código Penal, é dotado de
ultratividade, continuando gerando efeitos em relação aos fatos praticados antes do dia 5 de
maio de 2010.
Em síntese, em relação a fatos praticados antes do dia 5 de maio de 2010, será possível
a prescrição da pretensão punitiva retroativa entre a data da consumação do delito e a data do
recebimento da denúncia ou queixa, além das demais hipóteses.
Exemplo: Consideremos que o réu tenha sido denunciado pela prática, no dia 3 de março
de 2010, do crime de furto simples (CP, art. 155). A denúncia foi recebida no dia 15 de julho de
2014. Após regular tramitação do processo, o Magistrado proferiu sentença condenatória,
publicada no dia 15 de outubro de 2016, fixando pena de 1 (um) ano e 4 (meses), transitando
em julgado para a acusação.
Nesse caso, verifica-se que não há incidência da prescrição da pretensão punitiva em
abstrato. Os pressupostos para análise da prescrição da pretensão punitiva retroativa estão
presentes: a) sentença condenatória; b) trânsito em julgado para a acusação.
Logo, a base de cálculo para a prescrição se altera, passando da pena máxima cominada
ao delito, para ser considerada a pena aplicada. No caso, a pena aplicada foi de 1 (um) ano e 4

303
(quatro) meses, sendo o prazo prescricional de 4 (quatro) anos (CP, art. 109, V). Agora,
considerando o novo prazo prescricional, com base na aplicada, deve ser refeita, de forma
retroativa, ou seja, da sentença para trás, a análise da incidência da prescrição da pretensão
punitiva retroativa.
E, no caso, considerando que o fato foi praticado antes do dia 5 de maio de 2010, afigura-
se possível a incidência da prescrição da pretensão punitiva retroativa entre a data da
consumação do delito (03/03/2010) e a data do recebimento da denúncia (15/06/2014).

Pena: 01 ano e 04 meses

Data da Data do
recebimento Data publicação da Trânsito em julgado
consumação para o Ministério
da denúncia sentença condenatória
Público

03/03/2010 15/06/2014 15/10/2016

PPPR

Para evitar a incidência da prescrição, a denúncia deveria ter sido recebida até o dia
02/03/2014.

19.4.3. Prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente


A prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente está prevista no artigo
110, § 1º, do Código Penal, e incide entre a data da publicação da sentença penal condenatória
e o trânsito em julgado para a defesa. A expressão “superveniente” decorre justamente porque
sua incidência é posterior à sentença penal condenatória.
A prescrição da pretensão punitiva superveniente difere da prescrição da pretensão
punitiva retroativa, precipuamente em relação ao momento da incidência. A prescrição da
pretensão punitiva retroativa incide entre os marcos interruptivos existentes antes da sentença
penal condenatória; a prescrição da pretensão punitiva superveniente incide após a sentença
penal condenatória.

304
Data do
Data da recebimento Data publicação da Trânsito em julgado
consumação da denúncia sentença condenatória
para a defesa

Prescrição da Prescrição da pretensão


pretensão punitiva punitiva superveniente
retroativa

19.4.3.1. Pressupostos
Para se cogitar da hipótese da prescrição da pretensão punitiva superveniente, primeiro
deve-se constar a não incidência da prescrição da pretensão punitiva em abstrato e da retroativa.
Após, deve-se verificar a existência de sentença penal condenatória e o trânsito em
julgado para a acusação, seja por força de decisão do juízo de primeiro grau, seja por força de
eventual improvimento do seu recurso. É o que se extrai do próprio artigo 110, § 1º, do Código
Penal.

Não ter incidido prescrição da pretensão punitiva


em abstrato

Não ter incidido prescrição da pretensão punitiva


retroativa
Pressupostos
Sentença condenatória

Trânsito em julgado para acusação ou


improvimento do seu recurso

305
19.4.3.2. Cálculo do prazo da prescrição da pretensão punitiva
superveniente
A base para o cálculo da prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente
é a pena aplicada na sentença, que deverá ser enquadrada num dos incisos do artigo 109 do
Código Penal, para ser verificado o prazo prescricional.
Ainda que não tenha transitado em julgado para a acusação, admite-se a possibilidade de
prescrição da pretensão punitiva superveniente, se o Ministério Público ou o querelante
interpuserem recurso sem postular a elevação da pena, mas, por exemplo, a modificação do
regime carcerário ou a cassação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos. Note-se que, na falta de pedido expresso da acusação, não poderá o Tribunal elevar a
pena aplicada na sentença, sob pena de reformatio in pejus.

19.4.3.3. Hipótese de incidência da prescrição da pretensão punitiva


superveniente ou intercorrente
Verificado o prazo prescricional com base na pena aplicada na sentença, a prescrição da
pretensão punitiva superveniente tem por termo inicial a data da publicação da sentença penal
condenatória, podendo incidir até o trânsito em julgado para a defesa. Por isso, a denominação
“superveniente”, já que sua incidência é verificada após a publicação da sentença penal
condenatória.
Imaginemos que o réu tenha sido denunciado pela prática, no dia 5 de outubro de 2012,
do crime de furto simples (CP, art. 155). A denúncia foi recebida no dia 15 de março de 2014.
Após regular tramitação do processo, no dia 15 de junho de 2016, o Magistrado proferiu sentença
condenatória, aplicando pena de 1 (um) ano e 4 (meses). O Ministério Público não interpôs
recurso, transitando em julgado a sentença para a acusação. A defesa interpôs recurso de
apelação, ainda não colocado em pauta para julgamento pelo menos até o dia 18 de julho de
2020.
Nesse caso, verifica-se que não há incidência da prescrição da pretensão punitiva em
abstrato nem retroativa. Os pressupostos para análise da prescrição da pretensão punitiva
superveniente estão presentes: a) acórdão condenatório; b) trânsito em julgado para a acusação.
Logo, a base de cálculo para a prescrição passa a ser a pena aplicada na sentença. No
caso, a pena aplicada foi de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses, sendo o prazo prescricional de 4
(quatro) anos (CP, art. 109, V). Agora, considerando o novo prazo prescricional, com base na

306
aplicada, deve-se verificar se o trânsito em julgado para a defesa ocorrerá ou não dentro do
prazo prescricional.
E, no caso, forçoso concluir que incidiu a prescrição da pretensão punitiva superveniente,
pois entre a data da publicação da sentença condenatória (15/06/2016) e a data indicando que
ainda não ocorreu o trânsito em julgado para defesa (18/04/2020), passaram-se mais de 4
(quatro) anos.

Pena: 01 ano e 04 meses

Data do Trânsito em
Data da Data publicação da Trânsito em julgado
recebimento julgado para a
consumação da denúncia sentença condenatória para o Ministério
Público defesa

Recurso ainda não


05/10/2012 15/03/2014 15/06/2016 julgado 18.04.2020

PPPS

Para evitar a incidência da prescrição, o trânsito em julgado da sentença penal


condenatória deveria ocorrer até o dia 14.06.2020.

19.5 Prescrição da pretensão executória


A prescrição da pretensão executória está prevista no artigo 110, caput, do Código Penal.
O exercício da pretensão punitiva estatal se revela de forma plena quando a sentença
penal condenatória encontra o trânsito em julgado dentro do prazo estabelecido em lei. Com o
trânsito em julgado da sentença penal condenatória, surge para o Estado a pretensão executória,
ou seja, a pretensão de fazer cumprir a sentença, com a efetiva execução da pena imposta.
Ocorre, contudo, que também há prazo previsto em lei para que o Estado exerça a
pretensão executória, sob pena de não mais poder fazê-lo, por conta da incidência da prescrição
da pretensão executória e a consequente extinção da punibilidade.

307
Data do
Data da recebimento Data publicação da Sentença condenatória
consumação da denúncia sentença condenatória transitada em julgado

Prescrição da Prescrição da
pretensão punitiva pretensão punitiva Prescrição da
superveniente pretensão executória
retroativa

Pressuposto
Para que seja possível cogitar da incidência da prescrição executória, não pode ter se
operado qualquer das formas de prescrição da pretensão punitiva.
O pressuposto básico para se verificar a hipótese de incidência da prescrição da pretensão
executória é o trânsito em julgada da sentença penal condenatória. Logo, à evidência, a
prescrição da pretensão executória incide após o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Não tenha ocorrido prescrição punitiva

Pressupostos

Trânsito em julgado da sentença condenatória

Como não há mais possibilidade de alteração da pena imposta na sentença, já que, com
o trânsito em julgado, tornou-se definitiva, sintomático que a base para o cálculo da prescrição
da pretensão executória é a pena aplicada na sentença.
Tratando-se de reincidente, o prazo da prescrição da pretensão executória da pena
privativa de liberdade é aumentado de 1/3 (CP, art. 110, caput, parte final). Para tanto, é
necessário que a sentença condenatória tenha reconhecido a reincidência.
Esse acréscimo pela reincidência somente se aplica à prescrição da pretensão executória,
não tendo qualquer reflexo nos prazos da prescrição da pretensão punitiva. É o que se extrai da
Súmula 220 do Superior Tribunal de Justiça: “A reincidência não influiu no prazo da prescrição
da pretensão punitiva”.

308
19.5.1. Termos iniciais
Consoante se extrai do artigo 112 do Código Penal, o prazo da prescrição da pretensão
executória começa a correr: a) do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para
a acusação; b) do dia da revogação da suspensão condicional da pena ou o livramento
condicional; c) do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção
deva computar-se na pena.

a) Do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação


O pressuposto para a incidência da prescrição da pretensão executória é o trânsito em
julgado da sentença penal condenatória para todas as partes. Todavia, nos termos do artigo 112,
I, do Código Penal, o termo inicial da contagem do prazo prescricional considera o trânsito em
julgado da sentença penal condenatório para a acusação. Ou seja, em tese, o início da contagem
do prazo da prescrição executória é anterior à data do trânsito em julgado da sentença penal
condenatória.

Trânsito em Recurso Trânsito em julgado


Sentença julgado para o para a defesa e,
condenatória Ministério Público
defesa portanto, para todos

Termo inicial para prescrição

Trata-se de hipótese extremamente favorável ao condenado, uma vez que, se a acusação


optar por não interpor recurso contra a sentença condenatória, transitando em julgado para ela,
o réu, usando de sucessivos recursos, poderá prolongar o momento do trânsito em julgado da
sentença penal condenatória para todos. Não é raro acontecer, por exemplo, transitar em julgado
a sentença penal condenatória para acusação em determinada data, e o trânsito em julgado da
sentença condenatória para todos ocorrer anos depois.

309
b) Do dia da revogação da suspensão condicional da pena ou o livramento
condicional
A revogação do sursis e do livramento condicional tem como efeito automático a prisão
do condenado, para cumprir a pena cuja execução foi suspensa ou para dar continuidade à
execução da pena pela qual obteve o livramento condicional.
Logo, havendo revogação da suspensão condicional da pena, deve o condenado cumprir
integralmente a pena suspensa, passando a correr o prazo para dar início à execução da pena
da data da decisão revocatória.
Com a revogação do livramento condicional, o condenado deverá ser preso para cumprir
o restante da pena, começando a correr o prazo da prescrição executória, a partir da data da
revogação.

c) Do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção


deva computar-se na pena.
Interrompida a execução da pena pela fuga do condenado, inicia-se a contagem do prazo
prescricional da prescrição executória (CP, art. 112, II, 1ª parte), para recapturá-lo.
Nos casos dos arts. 41 e 42 do Código Penal (superveniência de doença mental ou
internação em hospital), em que se aplica o princípio da detração penal, embora interrompida a
efetiva execução da pena, não corre a prescrição (CP, art. 112, II., 2ª parte), já que computado
como pena cumprida.

19.5.2. Causas interruptivas


As causas interruptivas da prescrição da pretensão executória são: a) início ou
continuação do cumprimento da pena (CP, art. 117, V); b) reincidência (CP, art. 117, VI).

a) Início ou continuação do cumprimento da pena


Com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, expede-se, como regra,
mandado de prisão, a fim de que o condenado seja compelido a dar início ao cumprimento de
pena.
Quando o condenado efetivamente dá início ao cumprimento da pena, seja privativa de
liberdade ou restritiva de direitos, interrompe-se o prazo da prescrição da pretensão executória.
Evidentemente que, nesse caso, o prazo não volta a correr por inteiro, pois o condenado está

310
sob custódia do Estado, cumprindo pena. Essa é a exceção prevista no artigo 117, § 2º, do
Código Penal.
Se, eventualmente, o apenado empreender fuga, começa a correr o prazo prescricional
para sua recaptura, que será regulado pelo tempo que resta da pena (CP, art. 113). Ao ser
recapturado, com a consequente continuação do cumprimento da pena, ocorrerá a interrupção
do prazo prescricional.

b) Reincidência
A reincidência também interrompe a prescrição (CP, art. 117, VI). Ocorre quando o réu,
definitivamente condenado, ainda não deu início ao cumprimento da pena. Logo, o prazo da
prescrição executória estaria correndo. Se o agente praticar um novo crime, passando, portanto,
a ser reincidente, o prazo prescricional da pretensão executória da pena imposta pelo crime
anterior será interrompido no momento da prática do novo crime.
Portanto, conforme, inclusive, entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “a
reincidência, como causa de interrupção da prescrição da pretensão executória, é contada a
partir da prática do novo delito, e não do trânsito em julgado de eventual sentença
condenatória.”17
Essa interrupção, porém, ficará condicionada à efetiva condenação do réu em relação ao
segundo crime; se este vier a ser absolvido, evidentemente não houve reincidência e,
consequentemente, não pode ser considerada interrompida a prescrição.
A reincidência somente interrompe o prazo da prescrição da pretensão executória, sendo
inaplicável à prescrição da pretensão punitiva. Nesse sentido, a Súmula 220 do STJ: “A
reincidência não influiu no prazo da prescrição da pretensão punitiva”.

19.5.3. Prescrição no caso de evasão do condenado ou de revogação


do livramento condicional
Com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, surge para o Estado a
pretensão de fazer com que o condenado dê início ao cumprimento da pena. Para tanto, deve-
se observar o prazo prescricional computado com base na pena aplicada (CP, art. 110, caput,
do CP).

17
STJ: HC 360940/SC, rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, j. 15.09.2016.

311
Imaginemos, agora, que o condenado foi capturado, dando início ao cumprimento da
pena. Passado algum tempo, o condenado empreende fuga do estabelecimento carcerário.
Nesse caso, começa a correr o prazo prescricional para o Estado recapturar o condenado, para
continuação do cumprimento da pena, considerando-se como base o tempo que resta da pena
(CP, art. 113). Assim, se, por exemplo, o agente foi condenado à pena de 4 (quatro) anos, cujo
prazo prescricional é de 8 (oito) anos (CP, art. 107, IV), e, após cumprir 3 (três) anos, empreende
fuga. Nesse caso, a base para verificação da prescrição executória é a pena restante, qual seja,
1 (um) ano. Logo, a partir da fuga do condenado, o prazo da prescrição executória será de 4
(quatro) anos (CP, art. 109, V)
Agora, se ele deu início ao cumprimento da pena, ficando um determinado tempo preso,
se empreender fuga (se evadir), a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena (art. 113
do CP). Pega o tempo que resta da pena, vai no artigo 109 e enquadra. Esse será o prazo
prescricional. Ex: condenado a 04 anos (prazo prescricional de 08 anos), cumpriu 03 anos, resta
um ano (nesse caso, o prazo prescricional será de 04 anos - art. 109, V, do CP).
O mesmo raciocínio deve ser empregado na hipótese de revogação do livramento
condicional, já que o condenado terá de cumprir o restante da pena, que serve de parâmetro
para o cálculo do prazo da prescrição executória.

19.5.4. Algumas hipóteses de incidência da prescrição da pretensão


executória
Como regra, duas hipóteses emergem de incidência da prescrição da pretensão
executória: a) para o início do cumprimento da pena; b) para continuação do cumprimento da
pena, em face da fuga ou revogação do livramento condicional.

a) Para o início do cumprimento da pena


Imaginemos que o réu tenha sido denunciado por ter praticado no dia 5 de outubro de
2012 crime de furto simples (CP, art. 155). A denúncia foi recebida no dia 15 de março de 2014.
Após regular tramitação do processo, no dia 15 de junho de 2016, o Magistrado proferiu sentença
condenatória, aplicando pena de 1 (um) ano e 4 (meses). O Ministério Público não interpôs
recurso, transitando em julgado a sentença para a acusação no dia 25 de junho de 2016. A
defesa interpôs recurso de apelação, sendo mantida a condenação, com o trânsito em julgado
da sentença condenatória para defesa, e, portanto, para todos, no dia 12 de abril de 2018. O réu
não se apresentou para cumprir a pena, sendo, portanto, considerado foragido. No dia 18 de

312
agosto de 2020, em patrulhamento de rotina, policiais abordaram o condenado, e verificaram que
havia um mandado de prisão contra ele, razão pela qual o levaram para o estabelecimento
carcerário.
Nesse caso, verifica-se que não há incidência da prescrição da pretensão executória. Há
sentença penal condenatória transitada em julgado, pressuposto para análise da prescrição da
pretensão executória. Logo, a base de cálculo para a prescrição passa a ser a pena aplicada
na sentença. No caso, a pena aplicada foi de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses, sendo o prazo
prescricional de 4 (quatro) anos (CP, art. 109, V). O termo inicial é a data do trânsito em julgado
para a acusação (CP, art. 112, I), qual seja, 25.06.2016.
Agora, considerando o novo prazo prescricional, com base na aplicada, bem como o termo
inicial, deve-se verificar se não incidiu a prescrição da pretensão executória.
E, no caso, forçoso concluir que incidiu a prescrição da pretensão executória, pois entre a
data do trânsito em julgado para a acusação (25.06.2016) e a data em que o condenado foi
capturado (18.08.2020), passaram-se mais de 4 (quatro) anos. Logo, deve-se declarar a extinção
da punibilidade do condenado, com base no artigo 107, IV, do Código Penal, permanecendo
hígidos os efeitos secundários, penais e extrapenais, da sentença condenatória.

Pena: 01 ano e 04 meses

Captura e
Data do Data publicação Trânsito em
Trânsito em início
Data da recebimento da sentença julgado para a
julgado para o cumprimento
consumação da denúncia condenatória defesa, ou
Ministério Público da pena
seja, para
todos

05/10/2012 15/03/2014 15/06/2016 25/06/2016 12/04/2018 18/08/2020

PPE

313
b) Para continuação do cumprimento da pena, em face da fuga ou revogação do
livramento condicional.
Imaginemos que o réu tenha sido denunciado por ter praticado no dia 5 de outubro de
2010 crime de roubo simples (CP, art. 157, caput). A denúncia foi recebida no dia 15 de março
de 2011. Após regular tramitação do processo, no dia 15 de junho de 2012, o Magistrado proferiu
sentença condenatória, aplicando pena de 4 (quatro) anos. O Ministério Público não interpôs
recurso, transitando em julgado a sentença para a acusação no dia 25 de junho de 2012. A
defesa interpôs recurso de apelação, sendo mantida a condenação, com o trânsito em julgado
da sentença condenatória para defesa, e, portanto, para todos, no dia 12 de abril de 2014. Após
expedição e cumprimento do mandado de prisão, o réu iniciou a cumprir a pena no dia 10 de
maio de 2014. No dia 15 de junho de 2016, restando, portanto, aproximadamente 1 (ano) e 11
(onze) meses para o término da pena, o apenado empreendeu fuga. No dia 18 de agosto de
2020, em patrulhamento de rotina, policiais abordaram o condenado, e verificaram que havia um
mandado de prisão contra ele, razão pela qual o levaram para o estabelecimento carcerário.
Nesse caso, verifica-se que não há incidência da prescrição da pretensão executória. A
base de cálculo para será o tempo restante da pena, qual seja, 1 (um) ano e 11 (onze) meses.
Logo, o prazo prescricional de 4 (quatro) anos (CP, art. 109, V). O termo inicial é a data da fuga
do condenado, qual seja, 15/06/2016.
Agora, considerando o novo prazo prescricional, com base na aplicada, bem como o termo
inicial, deve-se verificar se não incidiu a prescrição da pretensão executória.
E, no caso, forçoso concluir que incidiu a prescrição da pretensão executória, pois entre a
data da fuga do condenado (15/06/2016) e a data em que foi capturado (18/08/2020), passaram-
se mais de 4 (quatro) anos. Logo, deve-se declarar a extinção da punibilidade do condenado,
com base no artigo 107, IV, do Código Penal, permanecendo hígidos os efeitos secundários,
penais e extrapenais, da sentença condenatória.

Pena: 04 anos
Trânsito em
julgado para a
Trânsito em defesa e,
julgado para o Início
portanto, para
Sentença Ministério cumprimento da Fuga Recaptura
todos
condenatória Público pena

15/06/2012 25/06/2012 12/04/2014 10/05/2014 15/06/2016 18/08/2020

PPE
314
19.6 Questões sobre Prescrição

52) QUESTÃO 3 – XXV EXAME – APLICADA EM PORTO ALEGRE/RS


Carlos, 50 anos, foi condenado, de maneira definitiva, pela prática de crime de roubo, ao
cumprimento de pena de 04 anos de reclusão, em regime inicial semiaberto em razão das
peculiaridades do caso, apesar de naquele momento ser primário. Após o cumprimento de 03
anos e 10 dias da pena aplicada, considerando o período de prisão provisória, Carlos veio a
praticar falta grave, em 10/03/2015, dentro do estabelecimento prisional, sendo que, no mesmo
dia, empreendeu fuga. Após processo administrativo disciplinar, inclusive com participação da
defesa técnica de Carlos, foi reconhecida a prática de falta grave. O juiz da execução penal, em
procedimento regular, ainda no ano de 2015, confirmou o reconhecimento da prática de falta
grave e determinou o reinício do prazo para obtenção do livramento condicional. Por falhas

315
cartorárias, a defesa técnica de Carlos somente foi intimada da decisão em 14/03/2018. Com a
intimação, Carlos, que nunca mais foi localizado para cumprimento do restante da pena, apesar
do mandado de prisão em aberto, procura seu advogado, indaga sobre as medidas cabíveis,
esclarecendo que, de fato, houve prática de falta grave, mas assegurando estar ressocializado
e que nunca mais se envolveu com a prática de crimes. Considerando apenas as informações
narradas, na condição de advogado de Carlos, responda aos itens a seguir.
A) Em sede de Agravo à Execução, qual argumento deverá ser apresentado para combater
o mérito da decisão do magistrado? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Por meio de Habeas Corpus, qual argumento de direito material poderá ser apresentado
para evitar a execução do restante da pena de Carlos? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

53) QUESTÃO 4 – XV EXAME


No dia 06/07/2010, Júlia, nascida em 06/04/1991, aproveitando-se de um momento de distração
de Ricardo, subtraiu-lhe a carteira. Após recebimento da denúncia, em 11/08/2011, e regular
processamento do feito, Júlia foi condenada a uma pena privativa de liberdade de 01 ano de
reclusão, em sentença publicada em 08/10/2014. Nem o Ministério Público nem a defesa de Júlia
interpuseram recurso, tendo o feito transitado em julgado em 22/10/2014.
Sobre esses fatos, responda aos itens a seguir.
A) Diante do trânsito em julgado, qual a tese defensiva a ser alegada em favor de Júlia
para impedir o cumprimento da pena? (Valor: 0,75)
B) Quais as consequências do acolhimento da tese defensiva? (Valor: 0,50)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

316
54) QUESTÃO 4 – VIII EXAME
João foi denunciado pela prática do delito previsto no art. 299 caput e parágrafo único do Código
Penal. A inicial acusatória foi recebida em 30/10/2000 e o processo teve seu curso normal. A
sentença penal, publicada em 29/07/2005, condenou o réu à pena de 01 (um) ano, 11 (onze)
meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime semi-aberto, mais pagamento de 16 (dezesseis)
dias-multa. Irresignada, somente a defesa interpôs apelação. Todavia, o Egrégio Tribunal de
Justiça negou provimento ao apelo, ao argumento de que não haveria que se falar em extinção
da punibilidade pela prescrição, haja vista o fato de que o réu era reincidente, circunstância
devidamente comprovada mediante certidão cartorária juntada aos autos. Nesse sentido,
considerando apenas os dados narrados no enunciado, responda aos itens a seguir.
A) Está extinta a punibilidade do réu pela prescrição? Em caso positivo, indique a espécie;
em caso negativo, indique o motivo. (Valor: 0,75)
B) O disposto no art. 110 caput do CP é aplicável ao caso narrado? (Valor: 0,50)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

55) QUESTÃO 3 – V EXAME


Jaime, brasileiro, solteiro, nascido em 10/11/1982, praticou, no dia 30/11/2000, delito de furto
qualificado pelo abuso de confiança (art. 155, parágrafo 4º, II, do CP). Devidamente denunciado
e processado, Jaime foi condenado à pena de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão. A
sentença transitou definitivamente em julgado no dia 15/01/2002, e o término do cumprimento
da pena se deu em 20/03/2006. No dia 24/03/2006, Jaime subtraiu um aparelho de telefone
celular que havia sido esquecido por Lara em cima do balcão de uma lanchonete. Todavia, sua
conduta fora filmada pelas câmeras do estabelecimento, o que motivou o oferecimento de
denúncia, por parte do Ministério Público, pela prática de furto simples (art. 155, caput, do CP).
A denúncia foi recebida em 14/04/2006, e, em 18/10/2006, Jaime foi condenado à pena de 1
(um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Foi fixado o regime inicial aberto para o cumprimento
da pena privativa de liberdade, com sentença publicada no mesmo dia. Com base nos dados
acima descritos, bem como atento às informações a seguir expostas, responda
fundamentadamente:
A) Suponha que a acusação tenha se conformado com a sentença, tendo o trânsito em
julgado para esta ocorrido em 24/10/2006. A defesa, por sua vez, interpôs apelação no

317
prazo legal. Todavia, em virtude de sucessivas greves, adiamentos e até mesmo perda dos
autos, até a data de 20/10/2010, o recurso da defesa não tinha sido julgado. Nesse sentido,
o que você, como advogado, deve fazer? (Valor: 0,60)
B) A situação seria diferente se ambas as partes tivessem se conformado com o decreto
condenatório, de modo que o trânsito em julgado definitivo teria ocorrido em 24/10/2006,
mas Jaime, temeroso de ficar mais uma vez preso, tivesse se evadido tão logo teve ciência
do conteúdo da sentença, somente tendo sido capturado em 25/10/2010? (Valor: 0,65)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

318
Audiência de instrução

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

20.1 Considerações

Em não sendo caso de absolvição sumária, o Magistrado designará audiência de instrução


e julgamento, aonde a produção de prova é concentrada, ou seja, toda prova oral deverá, em
regra, ser produzida em única audiência.

Na audiência de instrução, deve-se respeitar a ordem estabelecida pelo procedimento


legal.

Primeiramente, ouve-se o ofendido; depois, as testemunhas de acusação; após, as


testemunhas de defesa e, por fim, proceder-se-á ao interrogatório do réu. Note-se que, para
viabilizar a ampla defesa, o interrogatório do réu passou a ser o último ato instrutório.

Se a inversão da ordem de inquirição for determinada pelo juiz sem concordância do réu,
gera-se nulidade relativa.

Durante a audiência de instrução e julgamento pode haver, ainda, esclarecimentos de


perito, acareação, reconhecimento de pessoas e coisas.

No procedimento comum ordinário, as partes podem arrolar, sem justificar ou motivar, até
08 testemunhas cada uma.

Encerrado o interrogatório, passa-se à fase das diligências, passíveis de serem requeridas


pelas partes cuja necessidade ou conveniência se origine de circunstâncias ou de fatos apurados
na instrução.

Ordenada diligência considerada imprescindível, de ofício ou a requerimento da parte, a


audiência será concluída sem as alegações finais. Realizada a diligência determinada, as partes
apresentarão, conforme artigo 404, parágrafo único, do CPP, no prazo sucessivo de cinco dias,
suas alegações finais, por memorial, e, no prazo de 10 dias, o juiz proferirá a sentença. Trata-
se, portanto, de hipótese em que será autorizada a cisão da audiência única.

319
320
Memoriais

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 23/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

21.1 Introdução

Declarada encerrada a instrução, passa-se à etapa dos debates orais. Todavia, sobretudo
no contexto da prova da OAB, os debates orais podem ser convertidos em memoriais escritos
em, basicamente, três hipóteses: a) complexidade da causa; b) excessivo número de réus; c)
quando na audiência for ordenada realização de diligência.

21.2 Identificação

Os memoriais são oferecidos após o encerramento da instrução e antes da sentença.

PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica: Peça:


“Encerrada a instrução...” Memoriais

PAROU!

321
Exemplos de como identificar a peça extraídos de memoriais já cobrados pela FGV:

Peça XXXII Exame: “(...) Após citação e apresentação de resposta à acusação, na qual Luiz
demonstrou interesse na aplicação do Art. 89 da Lei nº 9.099/95, os fatos foram integralmente
confirmados durante a instrução probatória. Igor confirmou a agressão, a ajuda posterior do irmão
e o desinteresse em responsabilizá-lo. O réu permaneceu em silêncio durante seu interrogatório.
Em seguida, foi acostado ao procedimento o laudo definitivo de lesão corporal da vítima
atestando a existência de lesões de natureza leve, assim como a Folha de Antecedentes
Criminais de Luiz, que registrava uma única condenação, com trânsito em julgado em 10 de
dezembro de 2019, pela prática de contravenção penal. O Ministério Público apresentou a
manifestação cabível requerendo a condenação do réu nos termos da denúncia,
destacando, ainda, a incidência do Art. 61, inciso I, do CP. Em seguida, a defesa técnica
de Luiz foi intimada, em 19 de janeiro de 2021, terça-feira, para apresentação da medida
cabível. Considerando apenas as informações expostas, apresente, na condição de
advogado(a) de Luiz, a peça jurídica cabível, diferente do habeas corpus e embargos de
declaração, expondo todas as teses cabíveis de direito material e processual. A peça deverá ser
datada no último dia do prazo para apresentação, devendo segunda a sexta-feira serem
considerados dias úteis em todo o país. (Valor: 5,00)”

Peça XXVI Exame: “(...) Na audiência de instrução e julgamento, a vítima Maria foi ouvida,
confirmou suas declarações em sede policial, disse que tinha 17 anos, apesar de ter esquecido
seu documento de identificação para confirmar, apenas apresentando cópia de sua matrícula
escolar, sem indicar data de nascimento, para demonstrar que, de fato, era Maria. José foi ouvido
e também confirmou os fatos narrados na denúncia, assim como os policiais. O réu não estava
presente na audiência por não ter sido intimado e, apesar de seu advogado ter-se mostrado
inconformado com tal fato, o ato foi realizado, porque o interrogatório seria feito em outra data.
Na segunda audiência, Lauro foi ouvido, confirmando integralmente os fatos narrados na
denúncia, mas demonstrou não ter conhecimento sobre as declarações das testemunhas e da
vítima na primeira audiência. Na mesma ocasião, foi, ainda, juntado o laudo de exame do material
apreendido, o laudo da arma de fogo demonstrando o potencial lesivo e a Folha de Antecedentes
Criminais, sem outras anotações. Encaminhados os autos para o Ministério Público, foi
apresentada manifestação requerendo condenação nos termos da denúncia.

322
Em seguida, a defesa técnica de Lauro foi intimada, em 04 de setembro de 2018, terça-
feira, sendo quarta-feira dia útil em todo o país, para apresentação da medida cabível.
Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado(a) de Lauro, redija a
peça jurídica cabível, diferente de habeas corpus, apresentando todas as teses jurídicas
pertinentes. A peça deverá ser datada do último dia do prazo para interposição. (Valor: 5,00)”

Peça XXIII Exame: “(...) Recebida a denúncia, durante a instrução, foi ouvida Cláudia, que
confirmou ter deixado seu notebook acoplado à tomada, mas que Roberta o subtraíra, somente
havendo restituição do bem com a descoberta dos agentes da lei. Também foram ouvidos os
funcionários do curso preparatório, que disseram ter identificado a autoria a partir das câmeras
de segurança. Roberta, em seu interrogatório, confirma os fatos, mas esclarece que acreditava
que o notebook subtraído era seu e, por isso, levara-o para casa. Foi juntada a Folha de
Antecedentes Criminais da ré sem qualquer outra anotação, o laudo de avaliação do bem
subtraído, que constatou seu valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), e o CD com as imagens
captadas pela câmera de segurança. O Ministério Público, em sua manifestação derradeira,
requereu a condenação da ré nos termos da denúncia. Você, como advogado(a) de
Roberta, é intimado(a) no dia 24 de agosto de 2016, quarta-feira, sendo o dia seguinte útil
em todo o país, bem como todos os dias da semana seguinte, exceto sábado e domingo.
Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado(a) de Roberta, redija
a peça jurídica cabível, diferente de habeas corpus, apresentando todas as teses jurídicas
pertinentes. A peça deverá ser datada no último dia do prazo para interposição. (Valor: 5,00)”

Peça XX Exame: “(...) Após a juntada da Folha de Antecedentes Criminais do réu, apenas
mencionando aquele inquérito, e do laudo de exame de material, confirmando que, de fato, a
substância encontrada no veículo do denunciado era “cloridrato de cocaína”, os autos
foram encaminhados para o Ministério Público, que pugnou pela condenação do acusado
nos exatos termos da denúncia. Em seguida, você, advogado (a) de Astolfo, foi intimado (a)
em 06 de março de 2015, uma sexta-feira. Com base nas informações acima expostas e
naquelas que podem ser inferidas do caso concreto, redija a peça cabível, excluída a
possibilidade de Habeas Corpus, no último dia do prazo, sustentando todas as teses jurídicas
pertinentes. (Valor: 5,00)”

323
Peça XVII Exame: “(...) Após, foi juntada a Folha de Antecedentes Criminais de Daniel, que
ostentava apenas aquele processo pelo porte de arma de fogo, que não tivera proferida sentença
até o momento, o laudo de avaliação indireta do automóvel e o vídeo da câmera de segurança
da residência. O Ministério Público, em sua manifestação derradeira, requereu a
condenação nos termos da denúncia. A defesa de Daniel é intimada em 17 de julho de
2015, sexta feira.”

Peça XIV Exame: “(...) A prova pericial atestou que a menor não era virgem, mas não pôde
afirmar que aquele ato sexual foi o primeiro da vítima, pois a perícia foi realizada longos meses
após o ato sexual. O Ministério Público pugnou pela condenação de Felipe nos termos da
denúncia. A defesa de Felipe foi intimada no dia 10 de abril de 2014 (quinta-feira).
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso
concreto acima, redija a peça cabível, no último dia do prazo, excluindo a possibilidade de
impetração de Habeas Corpus, sustentando, para tanto, as teses jurídicas pertinentes. (Valor:
5,0) “

Peça IX Exame: “(...) Nesse sentido, considere que o magistrado encerrou a audiência e abriu
prazo, intimando as partes, para o oferecimento da peça processual cabível. Como
advogado de Gisele, levando em conta tão somente os dados contidos no enunciado, elabore a
peça cabível. (Valor: 5,0)”

Peça XXXII Exame: “(...) Após citação e apresentação de resposta à acusação, na qual Luiz
demonstrou interesse na aplicação do Art. 89 da Lei nº 9.099/95, os fatos foram integralmente
confirmados durante a instrução probatória. Igor confirmou a agressão, a ajuda posterior do irmão
e o desinteresse em responsabilizá-lo. O réu permaneceu em silêncio durante seu interrogatório.
Em seguida, foi acostado ao procedimento o laudo definitivo de lesão corporal da vítima
atestando a existência de lesões de natureza leve, assim como a Folha de Antecedentes
Criminais de Luiz, que registrava uma única condenação, com trânsito em julgado em 10 de
dezembro de 2019, pela prática de contravenção penal. O Ministério Público apresentou a
manifestação cabível requerendo a condenação do réu nos termos da denúncia,
destacando, ainda, a incidência do Art. 61, inciso I, do CP. Em seguida, a defesa técnica
de Luiz foi intimada, em 19 de janeiro de 2021, terça-feira, para apresentação da medida
cabível. Considerando apenas as informações expostas, apresente, na condição de

324
advogado(a) de Luiz, a peça jurídica cabível, diferente do habeas corpus e embargos de
declaração, expondo todas as teses cabíveis de direito material e processual. A peça deverá ser
datada no último dia do prazo para apresentação, devendo segunda a sexta-feira serem
considerados dias úteis em todo o país. (Valor: 5,00)”

21.3 Base legal

Art. 403, § 3º, CPP ou 404, parágrafo único, CPP

• Pela complexidade da causa ou número de acusados: Art. 403, § 3º, CPP.


• Quando for requerido diligências em audiência: Art. 404, parágrafo único, CPP.

Na realidade, em todas as provas da OAB em que caiu a peça memoriais não havia
complexidade na causa nem pluralidade de réus, e a FGV considerou como base legal o artigo
403, §3º, do CPP. Basta ver, o que foi inusitado, os memoriais do IX Exame, que deveria ser
direcionado para o JEC (sendo que no JEC não pode ter causas complexas), a base legal foi
403, §3º, do CPP. Por isso, a sugestão é priorizar o artigo 403, §3º, CPP.

Note-se que o artigo 404 do CPP pressupõe diligências determinadas em audiência, a


ponto de ser encerrada sem as alegações finais. Assim, para considerar o artigo 404, parágrafo
único, do CPP, a realização de diligência imprescindível deve ser ordenada na própria audiência,
que será concluída sem as alegações finais. Após a realização da diligência determinada em
audiência, as partes serão intimadas para apresentar memoriais escritos.

Logo, sugerimos usar o artigo 404, parágrafo único, do CPP quando o enunciado
mencionar expressamente que foi ordenada diligência na audiência de instrução. Ou seja,
produção de mais provas imprescindíveis para apuração dos fatos.

21.4 Prazo

5 dias

325
O prazo processual é disciplinado no artigo 798 do CPP. Ele começa a correr a partir do
primeiro dia útil da citação ou intimação. Assim, se a intimação ocorreu na sexta (dia 05/08), o
prazo começará a correr no dia 08/08 (segunda-feira, que será o primeiro dia útil).

Se o prazo vencer num sábado, domingo, ou feriado, será prorrogado para o 1º dia útil.

Exemplo: A defesa foi intimada para apresentar memoriais no dia 14.07.2014 (terça-feira),
sendo o prazo de 05 dias. Nesse caso, como o quinto dia do prazo para a apresentação dos
memoriais caiu no dia 19/07/2014 (domingo), prorroga-se para o primeiro dia útil, nos termos do
artigo 798, § 3º, do CPP, razão pela qual o último dia do prazo será 20/07/2014 (segunda-feira).

21.5 Conteúdo

Os memoriais podem conter questões preliminares e/ou matérias de mérito.

• Preliminares
Como já referido, as questões preliminares são aquelas que não observam aspectos
formais de determinado ato processual, gerando, invariavelmente, nulidade.
Aqui, por questão de organização, recomenda-se que as causas extintivas de
punibilidade, notadamente prescrição, sejam abordadas no campo destinado às preliminares.
• Mérito
Conforme já mencionado, nas peças práticas profissionais deverão ser buscadas no
enunciado teses que, ao final, viabilizarão a formulação do correspondente pedido. Ou seja,
aborda-se na peça aquilo que, ao final, poderá ser objeto de pedido.
No caso dos memoriais escritos, as teses de mérito guardam relação com as hipóteses
que ensejam a absolvição, previstas no artigo 386 do CPP.
Considerando que o pedido de absolvição deve observar um dos incisos do artigo 386, a
matéria de mérito nos memoriais (aqui vale para apelação) consistirá, invariavelmente, na
discussão, acerca da materialidade, autoria, tipicidade, ilicitude, culpabilidade, além de teses
subsidiárias, formando aquilo que convencionamos representar pela sigla “MATICS”.

326
A sentença absolutória é aquela que julga improcedente a acusação, valendo-se de um
dos fundamentos mencionados no artigo 386 do CPP. Logo, deve-se buscar no enunciado
fundamentos da absolvição, que constam no artigo 386 do CPP.

a) Estar provada a inexistência do fato – artigo 386, inciso I, do CPP

Nesse caso, há prova robusta da inexistência da materialidade do delito. Ou seja, não se


trata de mera insuficiência de prova, pois restou categoricamente demonstrado que o fato não
existiu.

Exemplo 1: vítima de estupro que admite, em juízo, não ter havido o constrangimento,
tendo imputado o delito ao réu somente para prejudicá-lo.

Exemplo 2: vítima de furto que afirma ter encontrado os objetos, que, na verdade, estavam
perdidos.

b) Não haver prova da existência do fato – artigo 386, inciso II, do CPP

Nesse caso, incide a dúvida acerca da existência ou não do fato criminoso. Ou seja, o fato
até pode ter ocorrido, mas a acusação não logrou comprovar a sua existência ou materialidade.

Exemplo: quando não foi realizado auto de exame de corpo de delito em crime que deixa
vestígio. Agente denunciado por lesão corporal grave. Não foi realizado auto de exame de corpo
delito direto ou indireto. Nesse caso, não há prova da materialidade do delito, razão pela qual
deve o agente ser absolvido, com base no artigo 386, II, do Código Penal.

327
c) Não constituir o fato infração penal – artigo 386, inciso III, do CPP
Nessa hipótese, a instrução revelou causas de exclusão de uma ou algumas elementares
do delito relatado na denúncia. Trata-se, pois, de hipótese de reconhecimento de uma das
causas excludentes da tipicidade do fato descrito na denúncia.

Exemplo 1: Sujeito denunciado por ter praticado conjunção carnal com menina de 13 anos
de idade. Durante a instrução, comprova-se que a relação sexual ocorreu quando a suposta
vítima já havia completado 14 anos. Nesse caso, há exclusão do crime de estupro de vulnerável,
previsto no art. 217-A do Código Penal.

Exemplo 2: princípio da insignificância.

Exemplo 3: erro de tipo invencível; se vencível, não existir o delito na modalidade culposa.

Exemplo 4: Crime impossível.

Exemplo 5: atos preparatórios.

Exemplo 6: ausência de dolo ou culpa.

d) Estar provado que o réu não concorreu para a infração penal – artigo 386, inciso
IV, do CPP

Nesse caso, restou caracterizada a existência do delito. Todavia, restou comprovado que
o delito foi praticado por outras pessoas. Trata-se da hipótese de autoria ou participação.

Exemplo: vítima reconhece o réu por fotografia como sendo o autor do roubo ocorrido na
Avenida Tenente Coronel Brito em Santa Cruz do Sul, no dia 05 de novembro de 2012, por volta
das 22h. o réu consegue comprovar não ter sido o autor do delito, porque, na referida data e
horário, estava em São Luiz Gonzaga, distante 400km, visitando a família.

e) Não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal – artigo 386, inciso
V, do CPP

O fato ocorreu. Todavia, não há comprovação segura no sentido de que o réu contribuiu
para a empreitada delituosa. Trata-se da hipótese de autoria ou participação, em que a dúvida
deve militar em favor do réu.

328
Considere o fato de a autoria ter sido apontada por meio de prova ilícita (Ex: interceptação
telefônica sem autorização judicial), uma vez alegada a ilicitude da prova e o seu consequente
desentranhamento dos autos, nada restará para apontar a autoria do delito.

f) Existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20,
21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do CP), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre
sua existência – artigo 386, inciso VI, do CPP

* Absolvição com base nas circunstâncias que excluam o crime: trata-se de causas
excludentes de ilicitude, previstas nos artigos 23, 24 e 25 do CP, consistentes na legítima defesa,
estado de necessidade, exercício regular do direito e estrito cumprimento do dever legal.

* Absolvição com base nas causas que isentem o réu de pena: trata-se das causas
excludentes de culpabilidade previstas no artigo 21 (erro de proibição inevitável), 22 (coação
moral irresistível e obediência hierárquica à ordem não manifestamente ilegal), 26, caput
(inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado), e 28,
§ 1º (embriaguez acidental completa), todos do Código Penal.

Na hipótese de absolvição com base na inimputabilidade decorrente de doença mental ou


desenvolvimento mental incompleto ou retardado, o juiz aplicará medida de segurança
consistente em internação ou tratamento ambulatorial (art. 386, parágrafo único, III, do CPP).
Por se tratar de sentença absolutória na qual se aplica uma espécie de sanção penal, chama-se
de sentença absolutória imprópria.

g) Não existir prova suficiente para a condenação

Constitui fórmula genérica a ser utilizada quando não existir provas suficientes para a
condenação.

• Subsidiariedade18

Além das preliminares e das questões de mérito, deve-se buscar no enunciado


informações que permitam identificar alguma tese subsidiária. As teses subsidiárias consistem,
basicamente, nas hipóteses em que, uma vez condenado, permitem ao réu ter sua situação
amenizada.

18
As teses subsidiárias são estudadas com mais profundidade na aula de teoria da pena.

329
Como forma de facilitar a identificação, convencionarmos considerar a ordem estabelecida
no art. 59 do CP. Trata-se de espécie de checklist.

a) na quantidade de pena: Art. 59, II: verificar o sistema trifásico (art. 68 do CP).

* buscar no enunciado informações para sustentar a pena-base no mínimo legal (afastar,


por exemplo, maus antecedentes);

* Apontar atenuantes (previstas no artigo 65 do CP); afastar agravantes (previstas no


artigo 61 e 62 do CP);

* Apontar causas de diminuição de pena (ex: tentativa – art. 14, parágrafo único, do CP);
afastar causas de aumento de pena.

* Afastar qualificadoras

b) regime carcerário mais brando: Art. 59, III, do CP

* Verificar o artigo 33 do Código Penal e artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90 (O STF declarou
inconstitucional esse dispositivo).

c) Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos: Art. 59, IV,
do CP

* Verificar o artigo 44 do CP e artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 (ver Resolução nº 05 do


Senado).

d) Sursis – Art. 77 do CP

e) Desclassificação do delito

21.6 Pedido

No campo destinado aos pedidos, deve-se formular pedido específico para cada uma das
teses desenvolvidas ao longo da peça.

Exemplo. Se sustentou a tese da incompetência do juízo, sob o argumento de que o


processo tramita na Justiça Estadual, ao passo que a competência é da Justiça Federal, deve-
se, ao final, formular pedido expresso de que seja declarada a incompetência do Juízo.

330
Isso vale também para as matérias de mérito e teses subsidiárias. Se sustentou, por
exemplo, princípio da insignificância, deve-se formular pedido expresso de absolvição, com base
no artigo 386, inciso III, do CPP. Se sustentou, subsidiariamente, que o réu não é reincidente,
deve-se, ao final, formular pedido expresso para afastar a reincidência, com a consequente
diminuição da pena...e assim por diante...

O pedido de absolvição tem como base uma das hipóteses do artigo 386 do CPP.

DICA MISSIONEIRA

• Nos memoriais do procedimento comum, o pedido de absolvição é com base no


artigo 386, CPP;
• Na resposta à acusação (art. 396-A), o pedido é de absolvição sumária, com base
no artigo 397 do CPP;
• Nos memoriais do procedimento do júri, o pedido é de absolvição sumária terá
por base o artigo 415 do CPP.

Base legal: Art.


403, §3º, CPP
MEMORIAIS Prazo: 05 dias
OU Art. 404,
p.ú., CPP

- Mesmas da
1) Preliminares

Materialidade Todas as teses


4) Pedido
2)Mérito

3) Subsidiariedade

resposta à acusação
Quantificação
+ nulidades da
Autoria da pena; alegadas
audiência; Tipicidade - Regime inicial +
- Nulidades do ato e Ilicitude carcerário;
do processo (art. 564, Culpabilidade Absolvição art.
CPP); Subsidiariedade - Substituição 386, CPP
- Extinção da da PPL por
punibilidade; PRD;
- Prescrição da - Sursis da
pretensão punitiva pena (se não
em abstrato.
cabível PRD).

331
Estruturação dos Memoriais:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DA


COMARCA DE ... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DE... (se crime da competência da Justiça Federal)

Processo nº...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência apresentar, dentro do prazo de 5 dias, previsto no artigo 403, § 3º, do Código de
Processo Penal, MEMORIAIS OU ALEGAÇÕES FINAIS POR MEMORIAIS, com base no
artigo 403, § 3º, do Código de Processo Penal (se complexidade da causa ou número de
réus), ou 404, parágrafo único, do Código de Processo Penal (se deferida realização de
diligências em audiência), pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos:

I) DA TEMPESTIVIDADE
Os presentes memoriais são tempestivos, já que apresentados dentro do
prazo de 5 dias, previsto no artigo 403, § 3º, do Código de Processo Penal.

II) DOS FATOS

III) DO DIREITO
a) Das preliminares
b) Do mérito
* No mérito, busca-se afastar a materialidade e a autoria, bem como arguir uma das causas
excludentes do crime: exclusão da tipicidade, ilicitude e culpabilidade, além das teses
subsidiárias, representada pela sigla “MATICS”.
c) Subsidiariedade

332
IV) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer o denunciado:
a) preliminares;
b) nulidades (referir todas as nulidades enfrentadas na peça);
c) absolvição, com base no art. 386, CPP (apontar inciso);
d) diminuição da pena (pena-base no mínimo legal, reconhecimento de atenuante e/ou causa
de diminuição da pena, afastar agravante e/ou causa de aumento de pena);
e) regime carcerário;
f) substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos,
g) “sursis” (se não cabível a restritiva de direitos).

Nestes termos, pede deferimento.


Local..., data...

ADVOGADO...
OAB...

333
334
Teoria Geral das Provas

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 27/03/2023.

Prof. Arnaldo Quaresma


@profarnaldoquaresma

22.1. Introdução e Conceito

Trata-se de todo e qualquer meio de percepção empregado pelo homem com a


finalidade de comprovar a verdade de sua alegação.

É o conjunto de elementos produzidos pelas partes ou determinado pelo juiz visando à


formação do convencimento quanto a atos, fatos e circunstâncias.

O termo prova, segundo Guilherme de Souza Nucci, vem do latim probatio, que significa
ensaio, verificação, inspeção, exame, argumento, razão, aprovação ou confirmação.

OBSERVAÇÕES IMPORTANTES

a) Normalmente no processo penal há uma controvérsia fática: imputação dos fatos


penalmente relevantes pela acusação x negativa de tais fatos pela defesa. neste sentido
as provas no processo penal desempenham uma função importantíssima.

b) Na atividade probatória há uma reconstrução histórica dos fatos, razão pela qual a
atividade do magistrado possui semelhanças com a atividade do historiador, uma vez que
ambos analisam fatos já ocorridos, entretanto, com algumas diferenças, na medida em que
a atividade do magistrado possui limites, como por exemplo, em relação à inadmissibilidade
de provas ilícitas e, necessariamente, precisa chegar a uma conclusão, ainda que não
convencido da culpabilidade do acusado.

335
c) Tendo em vista que o código de processo penal é de 1941, apesar da ocorrência de
algumas reformas recentes, ainda há uma necessidade de compatibilizar o CPP com a
CF/88, principalmente em relação às cláusulas de reserva de jurisdição. (ex. art. 241 CPP
– busca e apreensão domiciliar sem mandado)

d) O CPP não regulamentou temas essenciais como a interceptação ambiental, (lei


12850/13) ou telefônica (lei 9296/96), sendo necessária a observância da legislação
extravagante.

e) A Lei 11690/08 alterou o código de processo penal de maneira substancial em relação


às provas:

1) Alterou os artigos referentes às disposições gerais (155/157).

2) Alterou o artigo 159 do CPP, passando a exigir apenas um perito de natureza oficial.

3) Alterou o art. 212 do CPP, admitindo que as partes fizessem perguntas de forma direta
às testemunhas.

4) Alterou o art. 386, vi do CPP dispondo que a dúvida fundada sobre a existência de
circunstância que exclua o crime ou isente réu de pena é caso de absolvição.

22.2. Objeto Da Prova e Objetivo


A regulamentação dos meios de prova no CPP não é taxativa.

Objetivo: Formar a convicção do juiz sobre os elementos necessários para a decisão da


causa.

Objeto: fatos principais ou secundários, que reclamem apreciação judicial e exijam uma
comprovação.

22.2.1. Presunções legais


a) presunções legais: são juízos de certeza decorrentes da lei.

Podem ser: jure et jure (absoluta) ou juris tantum (relativas).

336
As presunções absolutas não admitem prova em contrário, sendo exemplo a condição
de inimputável do indivíduo menor de 18 anos.

As presunções relativas, por sua vez, admitem prova em contrário.

Neste sentido, oportuno mencionar que havia discordância entre doutrina e jurisprudência
acerca da presunção da vulnerabilidade do menor de 14 anos em relação ao crime de estupro
de vulnerável, existindo discussão se se configuraria presunção relativa ou absoluta.

Todavia, recentemente restou pacificado entendimento de que se trata de presunção com


caráter absoluto, ao ser editada a Súmula 593 do STJ, que dispõe que “o crime de estupro de
vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14
anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência
sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente”.

Corroborando a súmula 593 do STJ, o legislador através da lei 13718/18 incluiu o


parágrafo 5° no artigo 217-a do CP elencando que “As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º
e 4º deste artigo aplicam-se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela
ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)”.

22.3. Princípios
* Princípios importantes:

a) contraditório: significa que toda prova realizada por uma das partes admite a produção
de uma contraprova pela outra. Significa garantir a participação das partes no processo, bem
como o poder de influência na decisão judicial.

b) não autoincriminação (nemo tenetur se detegere): princípio da inexigibilidade de


produção da prova contra si mesmo, fazendo que o acusado não seja obrigado a realizar alguma
conduta positiva que pode lhe incriminar.

Exemplo: Não é obrigado a realizar o exame de etilômetro.

337
22.4. Sistemas de apreciação das provas
22.4.1. Sistema do livre convencimento motivado
O Código de Processo Penal adotou, como regra, o do livre convencimento do juiz,
fundamentado na prova produzida sob o contraditório judicial (Art. 155, caput, do CPP), embora
remanesçam exceções com resquícios dos sistemas da íntima convicção e da prova tarifada.

a) Consequências da adoção do Sistema do Livre Convencimento do Juiz:

I) ausência de limitação quanto aos meios de prova: o Código de Processo Penal não
exaure as possibilidades probatórias;

Exemplo: captações ambientais (gravação de conversa de duas ou mais pessoas em local


público), serve como prova, embora careça de regulamentação específica.

II) ausência de hierarquia: inexistência de valor prefixado na legislação. O juiz confere


valoração às provas.

Exemplo: pode desprezar a perícia e a confissão do réu.

b) Restrições à liberdade valorativa do julgador:

I) obrigação de motivar o decisum: artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal/88 e artigo
381, inciso III, do Código de Processo Penal.

II) as provas deverão constar dos autos do processo judicial (quod nos est in actis nos est
in mundo).

III) produção sob crivo contraditório: o artigo 155 do Código de Processo Penal não proibiu
o uso de eventuais provas da fase extrajudicial como elementos de convicção secundário,
restrição apenas como fundamento exclusivo de seu convencimento.

OBSERVAÇÃO
As provas realizadas em caráter cautelar, antecipadamente e não sujeitas à
repetição dispensam a necessidade de contraditório judicial. Exemplo: Interceptação
telefônica (Art. 3°, inciso I, Lei n° 9.296/96), busca domiciliar e perícia (exame de
conjunção carnal e lesões).

338
22.4.2. Sistema da íntima convicção
É adotado nos julgamentos afetos ao Tribunal do Júri: Os jurados não estão vinculados
às provas existentes no processo e não precisam fundamentar a decisão, podem decidir com
base em critérios subjetivos. (art. 593, III, e §3°, CPP).

22.4.3. Sistema da prova tarifada, da verdade legal ou da certeza moral do


legislador
A lei estabelece o valor de cada prova, impede poder discricionário do juiz para decidir
contra a previsão legal.

Exemplo 1: Art. 62 do CPP - extinção da punibilidade pela morte do réu exige certidão
óbito.

Exemplo 2: Art. 155, parágrafo único, CPP prova estado de pessoas deve ser comprovada
via certidão. Súmula 74 do STJ.

22.5. Elementos de informação x elementos de prova (análise do Art. 155 do


Código de Processo Penal)

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em
contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não
repetíveis e antecipadas.

A) ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO X ELEMENTOS DE PROVA:

I) Elemento de Informação: Produzidos na fase investigatória, sem observância do


contraditório e ampla defesa (sistema inquisitorial) / finalidade: decretação das medidas
cautelares e formação da opinio delicti do titular da ação penal.

II) Elementos de Prova: Produzidos na fase judicial, com observância do contraditório e


da ampla defesa (sistema acusatório) / finalidade: convencimento do magistrado).

III) Regra Geral: o magistrado não poderá fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na investigação.

339
Exceção: Provas Cautelares, Irrepetíveis ou Antecipadas.

B) PROVAS CAUTELARES, IRREPETÍVEIS OU ANTECIPADAS:

I) Prova Irrepetível: Não é produzida e nem submetida ao crivo do contraditório


(contraditório impossível) – a doutrina exige a característica da imprevisibilidade.

Exemplo: Morte de testemunha (se já era previsível – Art. 225 do CPP).

II) Prova Cautelar: É produzida sem observância do contraditório (normalmente na fase


investigatória), sendo submetida ao contraditório posteriormente em juízo.

Exemplo: Prova Pericial

III) Prova Antecipada: Produzidas em juízo de forma antecipada, ainda que na fase de
investigação.

Exemplo: Art. 225 do CPP - ver Art. 156, inciso I, do CPP)

22.6. Ônus da Prova


22.6.1. Introdução
Ônus significa uma faculdade cujo exercício é necessário para a consecução de um
interesse.

I) Pode ser Absoluto ou Perfeito: Quando a não realização necessariamente acarretará


um prejuízo.

Exemplo: Não recorrer de uma sentença condenatória.

II) Pode ser imperfeito ou relativo (não necessariamente ocorrerá um prejuízo).

Exemplo: Ônus da Prova

OBSERVAÇÃO

Não confundir ÔNUS com OBRIGAÇÃO, uma vez que na obrigação existe sanção para
o caso de descumprimento (testemunha que regularmente intimada não comparecer ao
ato pode ser conduzida coercitivamente).

340
É a faculdade de os sujeitos parciais produzirem as provas sobre as afirmações de fatos
relevantes para o processo, cujo exercício poderá levá-los a obter uma posição de vantagem ou
impedir que sofram um prejuízo.

Não possui caráter absoluto em razão dos poderes instrutórios conferidos ao magistrado
e ao princípio da comunhão das provas.

Se divide em:

I) Subjetivo: “quem deverá provar cada fato”.

II) Objetivo: disciplina como o juiz deverá julgar.

22.6.2. Distribuição
Uma primeira corrente defende que no processo penal, em razão do princípio da
presunção de inocência, o ônus de prova recai inteiramente sobre a acusação, não havendo que
se falar em distribuição do ônus da prova.

O artigo 156 dispõe que a prova da alegação incumbirá a quem fizer.

Já uma segunda corrente (majoritária) dispõe que:

I) À acusação compete provar a existência do fato imputado e sua autoria, elementos


subjetivos de dolo ou culpa, a existência de circunstâncias agravantes e qualificadoras.

II) À defesa incumbe provar excludentes de ilicitude, culpabilidade ou tipicidade,


atenuantes, minorantes e privilegiadoras.

OBSERVAÇÃO

1) Importante saber que a Lei nº 11.690/08 alterou o Art. 386, VI do CPP dispondo que
a dúvida fundada sobre a existência de circunstâncias que excluam o crime ou isentem
o réu de pena devem ensejar a absolvição do acusado, o que mitigou o ônus da defesa
neste ponto.

2) Ônus da prova direito local: analogia à regra do art. 337 CPC. O juiz pode exigir da
parte que o alega a respectiva comprovação.

341
22.7. Poderes Instrutórios do Magistrado - (Art. 156 do CPP)

Art. 156: A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz
de ofício:
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas
consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e
proporcionalidade da medida;
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de
diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.

Em razão do princípio da busca da verdade e tendo em vista o fato de ser o destinatário


das provas, o magistrado possui certa iniciativa probatória, não dependendo única e
exclusivamente das partes para formar o seu convencimento. Entretanto, tal atividade é
complementar a das partes.

a) A faculdade do juiz na produção antecipada de prova:

O juiz pode ordenar ex officio a produção antecipada de provas urgentes e relevantes,


mesmo antes de iniciada a ação penal, respeitada a necessidade, a adequação e a
proporcionalidade.

Essa faculdade do art. 156, I, CPP exige interpretação restritiva, sob pena de violação ao
sistema acusatório.

Requisitos:

I) Existência do periculum in mora: relevância e urgência.

II) Presença do fumus boni iuris: indício autoria e/ou materialidade.

III) Existência de investigação em andamento.

IV) Necessidade de procedimento sob análise judicial

V) Excepcionalidade da atuação judicial - (Princ. Proporcionalidade).

b) Faculdade do Juiz na produção de provas ex officio:

I) antes de iniciar a instrução: artigo 149, § 2°, artigo 225, artigo 366, todos do Código de
Processo Penal.

II) após iniciar a instrução: artigo 196, artigo 209, artigo 234, artigo 242, todos do Código
de Processo Penal.

342
22.8. Provas Ilegais, vedadas ou proibidas
A Constituição em seu artigo 5°, inciso LVI, consagrou a regra da inadmissibilidade das
provas ilícitas. Neste sentido, a doutrina majoritária sempre traçou uma diferenciação da prova
ilícita (obtida com violação a uma regra de direito material) e a prova ilegítima (obtida com
violação ao uma regra de direito processual.

Além disso, como consequência da sua produção, a prova ilícita deveria ser
desentranhada do processo e a prova ilegítima acarretaria a utilização da Teoria das Nulidades.

Ocorre que a lei 11690/08, ao alterar o art. 157 do Código de Processo Penal, não fez
menção a prova considerada ilegítima, razão pela qual parcela da doutrina, em especial o
professor Guilherme de Souza Nucci, passou a sustentar que, após a referida reforma, não
haveria diferenciação entre prova ilícita e ilegítima, ensejando o desentranhamento qualquer que
seja a modalidade.

Entretanto, a doutrina majoritária entende que, por se tratar de regra advinda da


Constituição da República, em que pese ter havido reforma no CPP, ainda persistiria a
diferenciação clássica, a seguir exposta:

a) Provas Ilícitas (Art. 157 do CPP): violação de regras direito material, produzindo
reflexos diretos ou indiretos em direitos e garantias constitucionais. Exemplo: interceptação
telefônica e busca e apreensão sem ordem judicial, violação carta lacrada, grampo, coação em
interrogatório policial (afrontamento direito ao Art. 5°, X, XI, XII, e LXIII, da CF/88).

Outros casos de afrontamento indireto à Constituição Federal: interrogatório judicial


de réu sem a presença de advogado ou sem prévia entrevista reservada com defensor (Art. 185
do CPP e Art. 5°, inciso LV, da CF/88) e mediante coação (Art. 186 do CPP).

Consequências do uso de provas ilícitas (Art. 157 do CPP): desentranhamento e, uma


vez preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será
inutilizada, podendo as partes acompanhar o incidente.

OBSERVAÇÃO

Na ausência de previsão legal expressa, caberá recurso em sentido estrito em relação ao


reconhecimento da ilicitude e no tocante ao desentranhamento e inutilização - (Art. 581,
inciso XIII, do CPP).

343
b) Provas Ilegítimas: São aquelas produzidas a partir da violação de normas de natureza
eminentemente processual.

Exemplo: Perícia por apenas um perito não-oficial - Art. 159, § 1°; reconhecimento judicial
do réu sem observância das formalidades do Art. 226 do CPP; extinção da punibilidade sem
juntada de certidão óbito - Art. 62 do CPP.

c) Provas Ilícitas por Derivação (art. 157, §1°, CPP): Embora lícitas na essência,
decorrem exclusivamente de prova considerada ilícita ou de ilegalidade manifesta ocorrida
anteriormente à sua produção (contaminadas).

Antes da reforma de 2008 a qual expressamente previu tal regra, a jurisprudência se valia
do artigo 573, parágrafo 1°, que dispõe: a nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos
atos que dele diretamente dependam ou sejam consequência.

Com a reforma de 2008, o artigo 157 incorporou de maneira expressa em nosso


ordenamento jurídico a Teoria da Árvore dos Frutos Envenenados (fruits of the poisonous tree),
a qual exige relação de exclusividade entre a prova posterior e a anterior que lhe deu origem.

Exemplo: Sujeito que confessou a autoria de delito, entretanto, momento antes foi
torturado por policiais civis. O professor André Nicoliti em seu blog relatou um caso que julgou
como magistrado, no qual, policiais militares abordaram um sujeito na rua, que não se encontrava
com drogas em sua posse, entretanto teria admitido (confissão não revestida das formalidades
legais) aos policiais que tinha drogas em casa, razão pela qual, em ato contínuo, tais policiais se
dirigiram até a residência em questão, encontrando substâncias entorpecentes.

22.8.1. Exceções ou Limitações à admissibilidade da prova ilícita por


derivação
I) Fonte Independente: Prevista de forma expressa no artigo 157, parágrafo 1°, parte final
e no parágrafo segundo do aludido artigo, a Teoria da Fonte independente dispõe que se, além
da prova ilícita, um outro elemento de convicção licitamente produzido conduzir ao objeto da
prova em análise não haverá ilicitude. Neste caso, não haverá nexo de causalidade entre a prova
que se quer utilizar e a situação de ilicitude ou ilegalidade antes ocorrida.

Exemplo: A testemunha João, essencial para a elucidação de um fato, foi descoberta em


razão de uma interceptação telefônica não revestida das formalidades legais. Ocorre que uma

344
outra testemunha, sem qualquer relação com aquela interceptação telefônica ilegal, teria referido
que João presenciou o referido fato. Neste sentido, o depoimento de João não será considerado
ilegal pois decorreu de uma fonte independente.

II) Limitação da contaminação expurgada (purged taint limitation) ou limitação da


conexão atenuada: Não possui previsão expressa, decorrendo do direito americano. Ocorre
quando um acontecimento posterior elide a ilicitude da prova viciada. Diferentemente da fonte
independente, na limitação da contaminação expurgada há nexo de causalidade entre a situação
de ilegalidade e a prova que se quer utilizar, entretanto este nexo é abrandado ou atenuado pela
interferência de um acontecimento posterior.

Exemplo: Sujeito que confessa sob tortura na fase policial. Entretanto, posteriormente, na
fase judicial, devidamente acompanhado de advogado, vem a confessar a prática delitiva visando
atenuar a pena em caso de provável condenação.

III) Descoberta Inevitável (Inevitable Discovery): Também não possui previsão


expressa, decorrendo do direito americano. Na descoberta inevitável, ainda que não fosse a
ilicitude anterior, a prova teria surgido de qualquer modo pelos meios legais.

Exemplo: Uma equipe de policiais da Delegacia de Polícia local, sem mandado, violou o
domicílio de João, encontrando drogas na referida residência. Ocorre que, naquele momento,
uma outra equipe de policiais da Delegacia Especializada no Combate às Drogas, devidamente
munida do mandado, se dirigia para a residência em questão com a finalidade de investigar
provável crime de tráfico de drogas.

22.8.2. Utilização de prova ilícita em favor do réu e em favor da sociedade


Uso da prova ilícita a favor do réu: A doutrina e jurisprudência entendem ser possível o
uso de provas ilícitas em favor do réu, quando se tratar da única forma de absolvê-lo ou
comprovar um fato importante à sua defesa.

Uso da prova ilícita pro societate:

• Entendimento majoritário: o princípio da proporcionalidade não serve para justificar


o uso da prova ilícita em favor da sociedade, mesmo que seja o único elemento para
uma condenação.

345
• Entendimento minoritário: Norberto Avena defende o uso quando o interesse público
exigir, em prevalência da segurança da sociedade, evitando-se a impunidade de
criminosos. Exemplo: Organizações criminosas, tráfico de drogas etc. (Mal coletivo)

FIQUE LIGADO!

Edição 105 STJ – PROVAS NO PROCESSO PENAL


1) As provas inicialmente produzidas na esfera inquisitorial e reexaminadas na instrução
criminal, com observância do contraditório e da ampla defesa, não violam o art. 155 do
Código de Processo Penal – CPP visto que eventuais irregularidades ocorridas no inquérito
policial não contaminam a ação penal dele decorrente.

2) Perícias e documentos produzidos na fase inquisitorial são revestidos de eficácia


probatória sem a necessidade de serem repetidos no curso da ação penal por se sujeitarem
ao contraditório diferido.

3) A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP
deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do
tempo. (Súmula n. 455/STJ).

4) A propositura da ação penal exige tão somente a presença de indícios mínimos de


materialidade e de autoria, de modo que a certeza deverá ser comprovada durante a
instrução probatória, prevalecendo o princípio do in dubio pro societate na fase de
oferecimento da denúncia.

5) A incidência da qualificadora rompimento de obstáculo, prevista no art. 155, § 4º, I, do


Código Penal, está condicionada à comprovação por laudo pericial, salvo em caso de
desaparecimento dos vestígios, quando a prova testemunhal, a confissão do acusado ou o
exame indireto poderão lhe suprir a falta.

6) É válido e revestido de eficácia probatória o testemunho prestado por policiais envolvidos


em ação investigativa ou responsáveis por prisão em flagrante, quando estiver em harmonia
com as demais provas dos autos e for colhido sob o crivo do contraditório e da ampla
defesa.

346
7) O reconhecimento fotográfico do réu, quando ratificado em juízo, sob a garantia do
contraditório e ampla defesa, pode servir como meio idôneo de prova para fundamentar a
condenação.

8) A folha de antecedentes criminais é documento hábil e suficiente a comprovar os maus


antecedentes e a reincidência, não sendo necessária a apresentação de certidão
cartorária.

9) Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por


documento hábil. (Súmula n. 74/STJ).

10) O registro audiovisual de depoimentos colhidos no âmbito do processo penal


dispensa sua degravação ou transcrição, em prol dos princípios da razoável duração do
processo e da celeridade processual, salvo comprovada demonstração de necessidade.

11) As provas inicialmente produzidas na esfera inquisitorial e reexaminadas na instrução


criminal, com observância do contraditório e da ampla defesa, não violam o art. 155 do
Código de Processo Penal – CPP visto que eventuais irregularidades ocorridas no
inquérito policial não contaminam a ação penal dele decorrente.

12) Perícias e documentos produzidos na fase inquisitorial são revestidos de eficácia


probatória sem a necessidade de serem repetidos no curso da ação penal por se
sujeitarem ao contraditório diferido.

13) A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do
CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero
decurso do tempo. (Súmula n. 455/STJ).

14) A propositura da ação penal exige tão somente a presença de indícios mínimos de
materialidade e de autoria, de modo que a certeza deverá ser comprovada durante a
instrução probatória, prevalecendo o princípio do in dubio pro societate na fase de
oferecimento da denúncia.

15) A incidência da qualificadora rompimento de obstáculo, prevista no art. 155, § 4º, I,


do Código Penal, está condicionada à comprovação por laudo pericial, salvo em caso de
desaparecimento dos vestígios, quando a prova testemunhal, a confissão do acusado ou
o exame indireto poderão lhe suprir a falta.

347
16) vestido de eficácia probatória o testemunho prestado por policiais envolvidos em
ação investigativa ou responsáveis por prisão em flagrante, quando estiver em harmonia
com as demais provas dos autos e for colhido sob o crivo do contraditório e da ampla
defesa.

17) O reconhecimento fotográfico do réu, quando ratificado em juízo, sob a garantia do


contraditório e ampla defesa, pode servir como meio idôneo de prova para fundamentar
a condenação.

18) A folha de antecedentes criminais é documento hábil e suficiente a comprovar os


maus antecedentes e a reincidência, não sendo necessária a apresentação de certidão
cartorária.

19) Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por
documento hábil. (Súmula n. 74/STJ).

20) O registro audiovisual de depoimentos colhidos no âmbito do processo penal


dispensa sua degravação ou transcrição, em prol dos princípios da razoável duração do
processo e da celeridade processual, salvo comprovada demonstração de necessidade.

348
FIQUE LIGADO!

Edição 111 STJ – PROVAS NO PROCESSO PENAL


1) É possível o arrolamento de testemunhas pelo assistente de acusação (art. 271 do
Código de Processo Penal), desde que respeitado o limite de 5 (cinco) pessoas previsto
no art. 422 do CPP.

2) O réu não tem direito subjetivo de acompanhar, por sistema de videoconferência,


audiência de inquirição de testemunhas realizada, presencialmente, perante o Juízo
natural da causa, por ausência de previsão legal, regulamentar e principiológica.

3) Em delitos sexuais, comumente praticados às ocultas, a palavra da vítima possui


especial relevância, desde que esteja em consonância com as demais provas acostadas
aos autos.

4) Nos delitos praticados em ambiente doméstico e familiar, geralmente praticados à


clandestinidade, sem a presença de testemunhas, a palavra da vítima possui especial
relevância, notadamente quando corroborada por outros elementos probatórios
acostados aos autos.

5) É possível a antecipação da colheita da prova testemunhal, com base no art. 366 do


CPP, nas hipóteses em que as testemunhas são policiais, tendo em vista a relevante
probabilidade de esvaziamento da prova pela natureza da atuação profissional, marcada
pelo contato diário com fatos criminosos.

6) É ilícita a prova colhida mediante acesso aos dados armazenados no aparelho celular,
relativos a mensagens de texto, SMS, conversas por meio de aplicativos (WhatsApp), e
obtida diretamente pela polícia, sem prévia autorização judicial.

7) É desnecessária a realização de perícia para a identificação de voz captada nas


interceptações telefônicas, salvo quando houver dúvida plausível que justifique a
medida.

349
8) É necessária a realização do exame de corpo de delito para comprovação da
materialidade do crime quando a conduta deixar vestígios, entretanto, o laudo pericial
será substituído por outros elementos de prova na hipótese em que as evidências
tenham desaparecido ou que o lugar se tenha tornado impróprio ou, ainda, quando as
circunstâncias do crime não permitirem a análise técnica.

9) O laudo toxicológico definitivo é imprescindível para a configuração do crime de tráfico


ilícito de entorpecentes, sob pena de se ter por incerta a materialidade do delito e, por
conseguinte, ensejar a absolvição do acusado.

10) É possível, em situações excepcionais, a comprovação da materialidade do crime


de tráfico de drogas pelo laudo de constatação provisório, desde que esteja dotado de
certeza idêntica à do laudo definitivo e que tenha sido elaborado por perito oficial, em
procedimento e com conclusões equivalentes.

11) É prescindível a apreensão e a perícia de arma de fogo para a caracterização de


causa de aumento de pena prevista no art. 157, § 2º-A, I, do Código Penal, quando
evidenciado o seu emprego por outros meios de prova.

350
FIQUE LIGADO!

Edição 117 STJ – INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NO PROCESSO PENAL


1) A alteração da competência não torna inválida a decisão acerca da interceptação
telefônica determinada por juízo inicialmente competente para o processamento do feito.

2) É admissível a utilização da técnica de fundamentação per relationem para a


prorrogação de interceptação telefônica quando mantidos os pressupostos que
autorizaram a decretação da medida originária.

3) O art. 6º da Lei n. 9.296/1996 não restringe à polícia civil a atribuição para a execução
de interceptação telefônica ordenada judicialmente.

4) É possível a determinação de interceptações telefônicas com base em denúncia


anônima, desde que corroborada por outros elementos que confirmem a necessidade da
medida excepcional.

5) A interceptação telefônica só será deferida quando não houver outros meios de prova
disponíveis à época na qual a medida invasiva foi requerida, sendo ônus da defesa
demonstrar violação ao disposto no art. 2º, inciso II, da Lei n. 9. 296/1996.

6) É legítima a prova obtida por meio de interceptação telefônica para apuração de delito
punido com detenção, se conexo com outro crime apenado com reclusão.

7) A garantia do sigilo das comunicações entre advogado e cliente não confere


imunidade para a prática de crimes no exercício da advocacia, sendo lícita a colheita de
provas em interceptação telefônica devidamente autorizada e motivada pela autoridade
judicial.

351
Provas em espécie

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 28/03/2023.

Prof. Arnaldo Quaresma


@profarnaldoquaresma

23.1. Provas Ilícitas e a Inviolabilidade do sigilo das comunicações


23.1.1. Comunicações telefônicas
A interceptação em sentido estrito e a escuta telefônica, quando feitas fora das hipóteses
legais ou sem autorização judicial, não devem ser admitidas, por afronta ao direito à privacidade.

A) BASE JURÍDICA: Artigo 5º, inciso XII, da CRFB/88: É inviolável o sigilo da


correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas,
salvo, no último caso, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação
criminal ou instrução processual penal.

O referido dispositivo constitucional aborda a questão do sigilo das comunicações, o qual


pode ser dividido em quatro grupos, quais sejam:

1) o sigilo das correspondências;

2) o sigilo das comunicações telegráficas;

3) o sigilo das comunicações de dados;

4) o sigilo das comunicações telefônicas.

A doutrina diverge quanto à extensão da ressalva feita pelo legislador constitucional


(“salvo neste último caso), surgindo as seguintes posições:

I) a ressalva feita pelo legislador constituinte somente inclui o sigilo das comunicações,
razão pela qual os grupos (1, 2 e 3), gozam de inviolabilidade absoluta (GRINOVER E
SCARANCE FERNANDES)

352
II) a ressalva feita pelo legislador constituinte incluiu o sigilo das comunicações telefônicas
e o sigilo das comunicações de dados (interpretação hermenêutica e a forma como o inciso XII
foi redigido – NORBERTO AVENA, PAULO RANGEL E STF NA PET. 577-DF).

B) ABRANGÊNCIA DA LEI 9.296/96:

Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em


investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e
dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.
Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações
em sistemas de informática e telemática.

Aplica-se a lei, a teor de seu artigo 1º, “à interceptação de comunicações telefônicas, de


qualquer natureza”.

Por mais amplitude que se pretenda atribuir ao conceito, permanece ele limitado à escuta
e eventual gravação de conversa telefônica, quando praticada por terceira pessoa, diversa dos
interlocutores (com ou sem conhecimento de um deles).

Ficam excluídas do regime legislativo as gravações clandestinas de telefonemas próprios,


assim como as gravações entre presentes.

C) CLASSIFICAÇÃO (INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA LATO SENSU - GÊNERO):

I) interceptação telefônica stricto sensu: um terceiro viola a conversa telefônica de duas


ou mais pessoas, registrando ou não os diálogos, sem que nenhum dos interlocutores tenha
conhecimento.

II) escuta telefônica: um terceiro viola a conversa telefônica mantida entre duas ou mais
pessoas, com ciência de um ou alguns dos interlocutores de que os diálogos estão sendo
captados.

III) gravação telefônica: um dos interlocutores simplesmente registra (grava) a conversa


que mantém com o outro, não há a figura de terceiro.

353
OBSERVAÇÃO

Art. 5°, XII, CF: a proteção constitucional alcança somente as duas primeiras formas de
interceptação acima. Logo, não tutela a gravação, devendo este meio de prova ser
considerado lícito, mesmo sem autorização judicial, salvo se obtido com traição de
confiança ou segredo profissional (STF e STJ).

D) REQUISITOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DA QUEBRA DO SIGILO


TELEFÔNICO:

D.1) Ordem do juiz competente para o julgamento da ação principal

Art. 1º: A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova


em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei
e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.
Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações
em sistemas de informática e telemática.

Somente o juiz competente para o julgamento da ação principal poderá determinar a


quebra do sigilo telefônico, jamais o Promotor de Justiça ou o Delegado de Polícia poderão fazê-
lo.

Obviamente que se trata de juiz que exerça jurisdição penal, seja esta eleitoral, militar, ou
comum, já que a interceptação será realizada para prova em investigação criminal e em instrução
processual penal. Assim, o juiz que determinar a quebra do sigilo será o competente para a ação
principal.

D.2) Indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer


qualquer das seguintes hipóteses: I - não houver indícios razoáveis da autoria ou
participação em infração penal; II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis; III
- o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.
Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da
investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo
impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

354
Não se exige prova plena, sendo suficiente o juízo de probabilidade (fumus boni iuris), sob
o influxo do princípio in dubio pro societate.

Havendo indicação provável de prática de crime, o juiz poderá autorizar. Não se exige a
instauração formal de inquérito policial.

D.3) Que a infração penal seja crime punido com reclusão

Art. 2°: Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer
qualquer das seguintes hipóteses:
I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;
II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;
III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.
Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da
investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo
impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

De acordo com o artigo 2º, inciso III, não será admitida a interceptação quando o fato
investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.

Isto significa dizer que somente será admissível a quebra do sigilo telefônico nas hipóteses
de crimes apenados com reclusão.

Contudo, conforme a doutrina, tal critério trouxe duas impropriedades:

a) deixou de lado crimes apenados com detenção, como a ameaça, comumente praticado
via telefone, ou mesmo contravenções, como o jogo do bicho;

b) ao elencar genericamente todas as infrações penais apenadas com reclusão como


objeto da interceptação, alargou sobremaneira o rol dos delitos passíveis de serem investigados
por quebra do sigilo telefônico, crimes estes, muitas vezes, destituídos de maior gravidade, o que
torna discutível, no caso concreto, o sacrifício de um direito fundamental como o sigilo das
comunicações telefônicas.

Deve incidir, na hipótese, o princípio da proporcionalidade dos bens jurídicos envolvidos,


não se podendo sacrificar o sigilo das comunicações em prol de um bem de menor valor.

D.4) Que não exista outro meio de se produzir a prova

Art. 2°: Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer
qualquer das seguintes hipóteses:
I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;
II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;
III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.

355
Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da
investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo
impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

Para a concessão da medida cautelar é necessário demonstrar o periculum, isto é, o


perigo de se perder a prova sem a interceptação.

A quebra do sigilo telefônico, por constituir medida excepcional, somente deverá ser
utilizada quando a prova não puder ser obtida por outros meios.

Por se tratar de medida que restringe um direito fundamental do cidadão, qual seja o direito
à intimidade e liberdade de comunicação, caberá ao juiz, no caso concreto, avaliar se há outras
alternativas menos invasivas, menos lesivas ao indivíduo.

Se houver outros meios processuais de obtenção da prova, estes deverão ser utilizados.
Deve-se, portanto, demonstrar fundamentadamente a necessidade da medida. Convém notar
que se existir outro meio, mas este for de extrema dificuldade de produção, na prática, a
autorização poderá ser concedida.

D.5) Que tenha por finalidade instruir investigação policial ou processo criminal

Art. 1º: A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova


em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei
e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.
Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações
em sistemas de informática e telemática.

Trata-se de requisito constante da Carta Magna e que foi reproduzido pela Lei nº 9.296/96
em seu artigo 1º. Assim, não se admite a quebra do sigilo para instruir processo cível, por
exemplo, ação de separação por adultério, em que é comum a ação de detetives particulares
“grampeando” o telefone do cônjuge suspeito, já que a autorização só é possível em questão
criminal. Da mesma forma, incabível a interceptação em sede de inquérito civil ou ação civil
pública.

No caso de descoberta fortuita ou ocasional de crime distinto daquele para o qual foi
expedida a ordem, o entendimento majoritário é da licitude das provas para responsabilização
penal, exigindo-se relação de conexidade (relação com o fato investigado), pouco importando se
é punido com reclusão.

356
D.6) Legitimados – Art. 3°

Os legitimados para requerer a decretação da interceptação telefônica constam no artigo


3° da Lei 9296/96:

Art. 3°: A interceptação das comunicações telefônicas poderá ser determinada pelo juiz, de
ofício ou a requerimento:
I - da autoridade policial, na investigação criminal;
II - do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução
processual penal.

Há a possibilidade de requerimento pelo ofendido enquanto titular ação penal privada


(indícios de autoria, crime reclusão e excepcionalidade), bem como também há a possibilidade
de requerimento pelo assistente acusação regularmente habilitado (Arts. 31, 268 e 271, todos do
CPP)

No que tange à possibilidade de decretação do sigilo de ofício pelo magistrado,


recomendamos a utilização do mesmo raciocínio aplicado no item 1.12 (poderes instrutórios do
magistrado – artigo 156 do Código de Processo Penal.

D.7) Prazo

O prazo de duração da interceptação telefônica está descrito no artigo 5°, sendo de 15


dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova.

Artigo 5° A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma
de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por
igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova.

Em relação ao cômputo do prazo, aplica-se o artigo 10 do Código Penal e não o artigo


798, § 1°, do Código de Processo Penal.

357
OBSERVAÇÃO

A interceptação telefônica não pode exceder 15 dias, porém pode ser renovada por
igual período, não havendo restrição legal ao número de vezes da renovação, desde
que comprovada a necessidade. Entretanto, em que pese a lei não limite o número de
vezes, há que se respeitar o princípio da proporcionalidade, não podendo a restrição
durar ad eternum por se tratar de uma garantia constitucional do indivíduo.

D.8) Procedimento

O procedimento está regulado nos artigos 5° ao artigo 10 da Lei nº 9.296/96.

Em caso de indeferimento da medida, poderá a parte impugnar a decisão judicial através


de mandado de segurança criminal, sendo tal ato mais recomendável pois dispensa
contrarrazões.

Já no caso de deferimento da medida à revelia da lei, a medida mais adequada é a


impetração de habeas corpus, uma vez que atinge de forma indireta a liberdade do indivíduo.

23.2. Interceptação de Dados: (e-mails, MSN, chat, sites e etc.)


Como mencionado no item 2.1, em relação à interceptação de dados, há uma primeira
corrente doutrinária que sustenta a sua inconstitucionalidade com base no artigo 5°, inciso XII,
da Constituição da República Federativa do Brasil/88, uma vez que a ressalva constitucional de
violação do sigilo seria aplicável somente às comunicações telefônicas.

Já uma segunda corrente sustenta a constitucionalidade de tal medida com base em uma
interpretação hermenêutica de tal instituto, sendo a interceptação da comunicação de dados
mencionada no artigo 1°, parágrafo único, da Lei nº 9296/96.

358
OBSERVAÇÃO

Devemos considerar que o artigo 5°, inciso XII do texto constitucional, em relação à
interceptação de dados, tutela a comunicação por intermédio de dados e não as
informações referentes a dados que constam nos aparelhos celulares ou
computadores, tais como agendas telefônicas, registros de chamadas, arquivos
digitalizados. Entretanto, o STJ tem entendimento consolidado (Edição 69 –
NULIDADES NO PROCESSO PENAL - RHC 068419/RN, Rel. Ministro FELIX
FISCHER, QUINTA TURMA, Julgado em 28/06/2016,DJE 01/08/2016; RHC
051531/RO,Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Julgado em 19/04/2016,DJE 09/05/2016)
que são nulas as provas obtidas por meio da extração de dados e de conversas
privadas registradas em correio eletrônico e redes sociais (v.g. Whatsapp e Facebook)
sem a prévia autorização judicial.

23.3. Interceptações Ambientais


Trata-se de captação de sons, imagens ou sinais eletromagnéticos sem uso de linha
telefônica, realizadas por meio de filmagens, gravadores e etc.

Cumpre ressaltar que tal meio de prova não se encontra previsto no Código de Processo
Penal, entretanto, há previsão no artigo 3° da Lei nº 12850/13 como meio de obtenção de prova.

O entendimento jurisprudencial dominante, antes do advento do pacote anticrime, era no


sentido de que, em regra, tal meio de obtenção de prova não implica, em si, violação ao direito
de intimidade a ponto de tornar ilícita a prova obtida, salvo se realizada em ambiente de
expectativa de privacidade e quando praticada com violação de confiança.

Entretanto, com o advento da Lei nº 13964/2019, o legislador regulamentou tal meio de


prova no artigo 8°-A da Lei nº 9296/96:

Art. 8º-A: Para investigação ou instrução criminal, poderá ser autorizada pelo juiz, a
requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, a captação ambiental de
sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, quando: (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
I - a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes; e
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em infrações
criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou em infrações penais
conexas. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

359
§ 1º O requerimento deverá descrever circunstanciadamente o local e a forma de
instalação do dispositivo de captação ambiental. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º A captação ambiental não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, renovável por
decisão judicial por iguais períodos, se comprovada a indispensabilidade do meio de prova
e quando presente atividade criminal permanente, habitual ou continuada. (Incluído pela
Lei nº 13.964, de 2019)
§ 4º § 4º A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento
da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa,
quando demonstrada a integridade da gravação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019) . (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 5º Aplicam-se subsidiariamente à captação ambiental as regras previstas na legislação
específica para a interceptação telefônica e telemática. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)

23.4. Sigilo de correspondência - (Art. 5°, inciso XII, primeira parte, da CF/88)
O sigilo de correspondência está intrinsecamente ligado ao direito à intimidade, impedindo
que terceiros tenha acesso ao texto incorporado à carta.

Cumpre destacar que pela leitura do artigo 5°, inciso XII da CF/88 o sigilo de
correspondência teria uma natureza absoluta, uma vez que não incluído na ressalva feita pelo
legislador constituinte.

Entretanto, tanto o STF como o STJ já relativizaram tal sigilo desde que haja autorização
judicial:

STF: “A INVIOLABILIDADE DA CORRESPONDÊNCIA NÃO É ABSOLUTA, PODE SER RELATIVIZADA EM


CASOS EXCEPCIONAIS, MEDIANTE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL”. (RHC 115983/RJ, 2°TURMA)

STJ NO HC 203371, 5° TURMA (JULGADO EM 03/05/12) PERMITIU A LEITURA DE CARTAS AMOROSAS


ENTRE DOIS CORRÉUS ACUSADOS DE HOMICÍDIO DA VÍTIMA, UMA VEZ QE A PROVA FOI OBTIDA
MEDIANTE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL, JUSTAMENTE PARA APURAR A MOTIVAÇÃO DO CRIME.

23.5. Exame de Corpo de Delito - (Arts. 158 a 184, todos do CPP)

Art. 158: Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de
delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

O exame de corpo de delito tem por finalidade comprovar a materialidade de infrações


que deixam vestígios (delitos não transeuntes). Pode ser:

• Direto: realizado pelo perito diante do vestígio deixado pela infração.

• Indireto: desaparecimento dos vestígios em face do tempo, podendo o expert se valer


de laudo particular realizado após a ocorrência ou de prova testemunhal, nos termos do artigo
167 do Código de Processo Penal.

360
A Lei nº 13.721/2018 incluiu o parágrafo único e seus incisos no artigo 158, do Código de
Processo Penal:

Art. 158: Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de
delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.
Parágrafo único. Dar-se-á prioridade à realização do exame de corpo de delito quando se
tratar de crime que envolva:
I - violência doméstica e familiar contra mulher;
II - violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência.

Mitigação ao rigor do Art. 158 do CPP (indispensabilidade do exame)

Art. 77, §1°, Lei n° 9.099/95 = basta boletim médico ou equivalente.

Art. 167 do CPP = prova testemunhal supre a ausência do exame. Também pode
ser documental (fotografia).

Observação: Não se aceita a confissão como meio hábil para suprir a perícia porque tem
valor relativo, depende de confirmação por outros meios.

Formalidades do exame de corpo de delito

Art. 159: O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito
oficial, portador de diploma de curso superior. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de
2008)

1o Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas


idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica,
dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame.
(Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

§ 2o Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente


desempenhar o encargo. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

O exame de corpo de delito deve ser realizado por perito oficial portador de curso superior,
sendo que na falta, poderá ser realizado por dois peritos não-oficiais (leigos), com curso superior,
preferencialmente na área objeto da perícia, nomeadas pelo delegado ou juiz, devendo prestar
compromisso.

361
Contraditório diferido

Art. 159: O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito
oficial, portador de diploma de curso superior.

§ 3º Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao


ofendido, ao querelante e ao acusado a formulação de quesitos e indicação de
assistente técnico.

§ 4º O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a


conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes
intimadas desta decisão.

§ 5º Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à


perícia: I – requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para
responderem a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou
questões a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de 10
(dez) dias, podendo apresentar as respostas em laudo complementar; II – indicar
assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a ser fixado pelo
juiz ou ser inquiridos em audiência.

§ 6º Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base


à perícia será disponibilizado no ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua
guarda, e na presença de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for
impossível a sua conservação.

§ 7º Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de


conhecimento especializado, poder-se-á designar a atuação de mais de um perito
oficial, e a parte indicar mais de um assistente técnico.

A Lei nº 11.690/09 ampliou o exercício do contraditório diferido em relação ao


exame pericial, tendo em vista que o artigo 159 do Código de Processo Penal facultou
ao Ministério Público, assistente de acusação, ofendido, querelante e acusado o
direito a formular quesitos e indicar assistente técnico, que atuará a partir da admissão
do juiz, e após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais.

362
23.5.1. Aspectos Importantes
Cumpre destacar que em caso de indeferimento injustificado da admissão de assistente
técnico, a jurisprudência tem admitido como formas de combater essa decisão os seguintes
meios: habeas corpus, mandado de segurança e correição parcial.

Em relação à oitiva dos peritos em audiência (Art. 159, § 5°, inciso I, do CPP) vale destacar
que há a necessidade de intimação destes profissionais com antecedência mínima de 10 dias
da solenidade, encaminhando-lhes, no mesmo prazo, as questões a serem respondidas.

Divergência de conclusões entre os peritos (Art. 180 do CPP)

Laudos complementares:

a) esclarecer omissões, obscuridades ou contradições (Art. 181 do CPP)

b) necessidade de aguardar-se decurso lapso temporal para viabilizar a resposta


a quesitos (Art. 168, caput e §§ 1° e 2°, do CPP).

O juiz não está vinculado às conclusões do laudo pericial. O CPP adotou o sistema
liberatório da apreciação da prova pericial, o que guarda sintonia com o princípio do livre
convencimento motivado.

23.5.2. Outras Perícias


• Necropsia: exame interno do cadáver, morte violenta (Art. 162 do CPP).

• Exumação: requer justa causa e autorização judicial. Sanar dúvidas acerca da causa
mortis ou complementar dados (Art. 163 do CPP).

• Incêndio: acidental ou criminoso (art. 173 do CPP).

• Reconhecimento de escritos: coletar material gráfico para confronto. Segundo o artigo


174, inciso IV, do Código de Processo Penal, vale destacar que a autoridade policial não poderá
mandar, apenas solicitar, ante o privilégio da não autoincriminação.

Instrumentos do crime: sujeitos a exame (Art. 175 do CPP).

363
Crimes contra a propriedade imaterial: o exame de corpo de delito, direto ou indireto,
visando a atestar a existência do crime é condição de procedibilidade para ação penal quando a
infração deixar vestígios (Arts. 524 a 530-I, todos do CPP).

23.5.3. Cadeia de Custódia


A Lei nº 13.964/2019 alterou a nomenclatura do capítulo no qual o exame de corpo de
delito restou inserido (capítulo II – Do Exame de Corpo de Delito, da cadeia de custódia e das
perícias em geral), bem como incluiu os Arts. 158-A, 158-B, 158-C, 158-D, 158-E, 158-F:

Art. 158-A: Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos


utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais
ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu
reconhecimento até o descarte. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com
procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a
produção da prova pericial fica responsável por sua preservação. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido,
que se relaciona à infração penal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Art. 158-B: A cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes


etapas: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a
produção da prova pericial; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar
o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime; (Incluído pela
Lei nº 13.964, de 2019)
III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no
corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias,
filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo
perito responsável pelo atendimento; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando
suas características e natureza; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
V - acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado
de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e
biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou
a coleta e o acondicionamento; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições
adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a
manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse; (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser
documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e
unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o
vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo,
assinatura e identificação de quem o recebeu; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a
metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se

364
obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;
(Incluído Lei nº 13.964, de 2019)
IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do
material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou
transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente; (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
X - descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação
vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial. (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)

Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial,
que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for
necessária a realização de exames complementares. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 1º Todos os vestígios coletados no decurso do inquérito ou processo devem ser tratados
como descrito nesta Lei, ficando órgão central de perícia oficial de natureza criminal
responsável por detalhar a forma do seu cumprimento. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 2º É proibida a entrada em locais isolados bem como a remoção de quaisquer vestígios
de locais de crime antes da liberação por parte do perito responsável, sendo tipificada
como fraude processual a sua realização. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Art. 158-D. O recipiente para acondicionamento do vestígio será determinado pela


natureza do material. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Todos os recipientes deverão ser selados com lacres, com numeração individualizada,
de forma a garantir a inviolabilidade e a idoneidade do vestígio durante o transporte.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º O recipiente deverá individualizar o vestígio, preservar suas características, impedir
contaminação e vazamento, ter grau de resistência adequado e espaço para registro de
informações sobre seu conteúdo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º O recipiente só poderá ser aberto pelo perito que vai proceder à análise e,
motivadamente, por pessoa autorizada. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 4º Após cada rompimento de lacre, deve se fazer constar na ficha de acompanhamento
de vestígio o nome e a matrícula do responsável, a data, o local, a finalidade, bem como
as informações referentes ao novo lacre utilizado. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 5º O lacre rompido deverá ser acondicionado no interior do novo recipiente. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)

Art. 158-E. Todos os Institutos de Criminalística deverão ter uma central de custódia
destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua gestão deve ser vinculada diretamente
ao órgão central de perícia oficial de natureza criminal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 1º Toda central de custódia deve possuir os serviços de protocolo, com local para
conferência, recepção, devolução de materiais e documentos, possibilitando a seleção, a
classificação e a distribuição de materiais, devendo ser um espaço seguro e apresentar
condições ambientais que não interfiram nas características do vestígio. (Incluído pela Lei
nº 13.964, de 2019)
§ 2º Na central de custódia, a entrada e a saída de vestígio deverão ser protocoladas,
consignando-se informações sobre a ocorrência no inquérito que a eles se relacionam.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º Todas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio armazenado deverão ser
identificadas e deverão ser registradas a data e a hora do acesso. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 4º Por ocasião da tramitação do vestígio armazenado, todas as ações deverão ser
registradas, consignando-se a identificação do responsável pela tramitação, a destinação,
a data e horário da ação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Art. 158-F. Após a realização da perícia, o material deverá ser devolvido à central de
custódia, devendo nela permanecer. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

365
Parágrafo único. Caso a central de custódia não possua espaço ou condições de
armazenar determinado material, deverá a autoridade policial ou judiciária determinar as
condições de depósito do referido material em local diverso, mediante requerimento do
diretor do órgão central de perícia oficial de natureza criminal. (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)

A inclusão dos artigos em questão representa um grande avanço em se tratando de prova


pericial, bem como demonstra a intenção do legislador em profissionalizar tanto a prova pericial
bem como a gestão dos órgãos de perícia acerca de tal matéria.

Em razão disso, deu tratamento especial a questão da cadeia de custódia, elencando as


suas fases ou etapas no 158-B. Podemos elencar também a previsão da criação do órgão central
de custódia responsável pela guarda e controle dos vestígios encontrados na cena do crime.

23.6. Interrogatório - (185 a 196, todos do CPP) – Súmula Vinculante 11 STF


A) CARACTERÍSTICAS

I) obrigatório: pena de nulidade processual (Art. 564, inciso III, alínea “e”, do CPP)

II) personalíssimo: no caso de incapacidade do agente após a prática da infração (Art.


152 do CPP) e se preexistia (Art. 151 do CPP).

Crime ambiental praticado por pessoa jurídica (Art. 225, § 3°, da CF/88):

O Código de Processo Penal é omisso. Analogia – Art. 75, inciso VIII CPC = a pessoa
jurídica, por quem os respectivos atos constitutivos designarem ou, não havendo essa
designação, por seus diretores;

III) oralidade: perguntas e respostas orais. Exceção: surdo, mudo e estrangeiro (Arts. 192
e 193 do CPP).

IV) publicidade: ato público, mas o juiz pode determinar que o ato seja realizado às portas
fechadas, limitando o n° presentes, para evitar pressão, escândalos ou perturbação ordem
pública.

V) individualidade: não se permite interrogatório conjunto.

366
VI) Sistema de Inquirição: Trata-se do sistema Presidencialista, no qual as partes
formulam as perguntas por intermédio do juiz, o qual poderá indeferir as perguntas impertinentes
e irrelevantes (Art. 188 do CPP). Entretanto, no procedimento do júri as perguntas poderão ser
realizadas diretamente pelas partes (Art. 474, § 1°), enquanto os jurados deverão fazê-las por
intermédio do juiz (Art. 474, §2°).

B) NATUREZA JURÍDICA DO INTERROGATÓRIO:

Trata-se de meio de prova e meio de defesa. Em que pese tenha sido elencado no Código
de Processo Penal como meio de prova, é a oportunidade no qual se materializa a defesa
pessoal do réu.

Neste sentido, a reforma de 2008, ao situar o interrogatório como último ato da instrução
no procedimento comum ordinário reforça o argumento de se tratar de verdadeiro meio de
defesa.

Ademais, nos termos do artigo 185 do Código de Processo Penal é obrigatória a presença
de defensor, pena de nulidade absoluta.

C) ASPECTOS IMPORTANTES

Em que pese o artigo 185 e seguintes do Código de Processo Penal se refiram de um


modo geral ao interrogatório na fase judicial, o artigo 6°, inciso V, do Código de Processo Penal,
determinada que tal normatização deve ser aplicada, no que for aplicável, ao interrogatório
realizado em sede policial.

O acusado possui o direito de entrevista pessoal e reservada com seu Defensor, nos
termos do artigo 185, § 5°, 1ª parte, havendo uma oscilação jurisprudencial se o descumprimento
acarreta nulidade absoluta ou relativa.

Em caso de réu algemado no momento de seu interrogatório, em caso de não haver


justificativa idônea, tal ato será nulo de pleno direito, acarretando também a responsabilização
civil, administrativa e penal do agente ou da autoridade, nos termos da Súmula Vinculante n° 11
do STF: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou
de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a
excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente
ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da
responsabilidade civil do Estado”.

367
D) DIREITO AO SILÊNCIO (NEMO TENETUR SE DETEGERE)

O entendimento majoritário é que tem direito ao silêncio quanto às perguntas relativas ao


fato e sobre sua pessoa (exemplo: oportunidades sociais).

O STJ possui entendimento consolidado (Ed. 69 Nulidades no processo penal) que a falta
de comunicação ao acusado sobre o direito de permanecer em silêncio é causa de nulidade
relativa, cujo reconhecimento depende da comprovação do prejuízo.

E) INTERROGATÓRIOS ESPECIAIS

I - Interrogatório réu preso: sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido (Art.
185, § 1°, do CPP).

II - Interrogatório por videoconferência réu preso: caráter excepcional, decisão


fundamentada, intimação das partes com no mínimo 10 dias de antecedência, condicionada à
impossibilidade de o juiz interrogar o réu no estabelecimento prisional, em face das seguintes
hipóteses:

a) prevenir risco à segurança pública e fundada suspeita de que o preso integre


organização criminosa (Art. 185, § 2°, inciso I, do CPP).

b) prevenir risco à segurança pública quando possa o acusado fugir durante o


deslocamento (periculosidade).

c) haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra
circunstância pessoal (ameaça de morte).

d) impedir influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima.

e) responder à gravíssima questão de ordem pública (clamor social).

23.7. Confissão – Art. 197 a 200, todos do CPP


Ocorre quando o imputado, normalmente no interrogatório realizado na sede policial ou
em juízo, assume a sua responsabilidade diante da autoridade.

368
A) ASPECTOS IMPORTANTES

Requisitos intrínsecos e formais para validade da confissão: verossimilhança, clareza,


persistência, coincidência, pessoalidade, caráter expresso, oferecimento perante juiz
competente, saúde mental e espontaneidade.

Valoração: confronto com as demais provas (Art. 197 do CPP)

A confissão pode ser divisível: juiz considera verdadeira em parte e inverídica em outra
parte. Exemplo: Reconhece autoria e nega excludentes. Exemplo: Reconhece autoria e nega
excludentes

A confissão pode ser retratável: mesmo confesso em juízo, o réu pode retratar-se,
cabendo ao juiz sua valoração.

A confissão policial - retratada em juízo - mas levada em consideração na sentença


condenatória, caracteriza a atenuante de confissão espontânea (Art. 65, inciso III, alínea “d”, do
CP) = entendimento do STJ. O STJ admite compensação da atenuante da confissão com a
agravante da reincidência – resp 1.154.752)

Já a confissão qualificada ocorre quando o réu reconhece o crime, mas agrega teses
defensivas, não permite, em regra, o reconhecimento da referida atenuante (STJ ADMITE A
ATENUAÇÃO DE PENA TURMA AGRG NI RESP.1.198.354-ES REL. JORGE MUSSI
16/10/2014 E STF 1 TURMA NÃO ADMITE – HC 119671).

23.8. Perguntas ao Ofendido – Art. 201 do CPP


• A vítima deve ser ouvida pelo juiz, independentemente de ter sido arrolada.
• Não se encaixa no contexto da prova testemunhal, não se computando no número máximo
de testemunhas facultado pelo rito.
• Não está sujeito ao compromisso (Art. 203 do CPP), não podendo ser sujeito ativo do crime
de falso testemunho (Art. 342 do CP).
• Se mentir responderá por falsa comunicação de crime ou denunciação caluniosa.
• Não pode se recusar a depor, podendo ser conduzido à solenidade.

Alterações introduzidas pela Lei n° 11.690/08:

a) Obrigatoriedade de comunicação ao ofendido quanto a determinados atos processuais


(data de audiências, sentenças/acórdãos) e sobre a prisão ou liberdade do acusado. Pode ser

369
intimação eletrônica ou carta registrada ao endereço por ele indicado (Art. 201, § 2° e § 3°, do
CPP)

b) Reserva de lugar em separado para que o ofendido permaneça antes e durante a


audiência (§ 4°).

c) Encaminhamento do ofendido a atendimento multidisciplinar, se for o caso, às expensas


do Estado ou, após trânsito em julgado, pelo ofensor (§ 5°). Ex: crimes sexuais.

d) Adoção de medidas necessárias para resguardar a imagem, honra e vida privada do


ofendido (§ 6°). Trata-se de publicidade restrita, com respaldo no artigo 792, § 1°, do Código de
Processo Penal. A ordem de sigilo do processo deve ser determinada em casos extremos e
fundamentada.

23.9. Prova Testemunhal – Arts. 202 a 225 do CPP


A) CLASSIFICAÇÃO DAS TESTEMUNHAS:

I) referida: embora não arrolada, pode ser inquirida ex officio ou a pedido das partes por
ter sido citada por outra testemunha. Não é computada para o número máximo de testemunhas
(Art. 401, § 1°).

II) judicial: inquirida ex officio e fundamenta-se no poder-dever ao magistrado de buscar a


verdade real (Art. 209 e Art. 156, ambos do CPP).

III) própria: ouvida sobre objeto do litígio por presenciar ou ouvir dizer.

IV) imprópria ou instrumental: que não presta depoimento sobre o mérito da ação penal.
Ex.: presenciou a apresentação de um preso em sede policial

V) numerária: testemunha regularmente compromissada (Art. 203)

VI) informante: dispensadas compromisso por presunção jure et jure de que são suspeitas
suas declarações (Art. 206), não se computam no número máximo para cada rito (Art. 401, § 1°,
do CPP).

VII) direta: presenciou os fatos.

VIII) indireta: não presenciou os fatos, mas soube ou ouviu dizer.

370
B) NÚMERO MÁXIMO DE TESTEMUNHAS:

I) Oito: procedimento comum ordinário (Art. 401, § 1°), júri (Art. 406, §2° e §3°), crimes de
responsabilidade funcionário público (Art. 518), crimes contra honra (Art. 519), crimes contra
propriedade imaterial (Art. 524), crimes de comp. Tribunais dos Estados, Regionais Federais e
Superiores (Art. 9° da Lei n° 8.038/90 c/c Lei n° 8.658/93), crimes eleitorais punidos com pena
máxima igual ou superior a 4 anos.

II) Três: crime abuso autoridade (Art. 2°, par. único, Lei n° 4.898/65).

III) Cinco: procedimento comum sumário (Art. 532), crimes falimentares (Art. 185 Lei n°
11.101/05 c/c Art. 532 do CPP), juizados especiais criminais (inaplicável o Art. 34, pois específico
ao juizado esp. cível), lei de drogas (Arts. 54 e 55, §1°, Lei n° 11.343/06), crimes eleitorais
punidos com pena máxima inferior a 4 anos.

OBSERVAÇÃO

Para acusação, o número de testemunhas é definido segundo a quantidade de fatos


imputados, não importando o número de agentes. Para defesa, leva-se em conta não
apenas a quantidade de fatos como também de réus.

Exemplo: dois réus acusados de um roubo terão o direito de arrolar cada um oito,
totalizando dezesseis, mesmo com defensor único. O mesmo n° será facultado para o
caso de um só réu responder por dois crimes de roubo. Já se os dois réus responderem
a dois crimes de roubo, o n° máximo permitido será trinta e dois = oito para cada fato
atribuído.

Não se computarão no número máximo permitido as testemunhas referidas, não


compromissadas, as judiciais e as que nada souberem que importe à decisão da causa
(Art. 401, § 1°, e art. 209, caput e § 2°).

C) TESTEMUNHAS NÃO SUJEITAS A COMPROMISSO – ART. 208 DO CPP

Doentes mentais, menores de 14 anos e parentes do réu enumerados no artigo 206 do


Código de Processo Penal: ascendentes, descendentes, irmão e cônjuge, ainda que separado
judicialmente, e, por fim, os afins em linha reta (sogro).

371
C.1) AUSÊNCIA DE REGRA ESPECÍFICA NA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL:

1) não há menção a amigo íntimo e inimigo capital, tampouco aos parentes da vítima.
Logo, devem prestar compromisso, mas na prática forense isso não ocorre.

2) os, primos, sobrinhos e cunhado do réu prestam compromisso, pois são parentes
colaterais - legítimos e por afinidade - não incluídos no artigo 206 e artigo 208 do Código de
Processo Penal.

- CONTRADITA: impugnar a narrativa de testemunhas arroladas.

I) testemunha que não deva prestar compromisso (Art. 208 do CPP). Acolhida a contradita,
o efeito é a dispensa de compromisso.

II) pessoa que seja proibida depor em razão do ofício ou profissão (Art. 207 do CPP).
Acolhida, o efeito é a exclusão da testemunha, não pode depor (padre, psicólogo, etc.).

- ARGUIÇÃO DE DEFEITO: quando tiver ciência de fatos que tornem a testemunha


indigna de fé ou suspeita de parcialidade (parentes da vítima, amigo íntimo ou inimigo).
Consigna-se no termo de audiência.

D) CARACTERÍSTICAS DA PROVA TESTEMUNHAL:

I) oralidade: pode fazer breve consulta a apontamentos (Art. 204)

II) objetividade: em regra depõe sobre fatos, não sobre impressões pessoais, salvo
quando inseparáveis da narrativa ou for abonatória.

III) individualidade: ouvidas de forma individual (Art. 210).

IV) incomunicabilidade: reserva de espaço separado (Art. 210 CPP)

V) retrospectividade: depoimento sobre fatos passados, jamais futuros. Exceção:


informações técnicas: médico prognóstico de recuperação.

VI) obrigatoriedade de comparecimento: condução coercitiva, pagamento de despesas,


multa e crime de desobediência.

Exceções: pessoas doentes e enfermas e determinados cargos, que ostentam


prerrogativas (Art. 220, Art. 221, caput, § 1°, do CPP).

372
VII) obrigatoriedade: em regra, não tem direito ao silêncio. Providências judiciais em caso
de falso testemunho.

E) HIPÓTESES LEGAIS DE INVERSÃO DA ORDEM DE OITIVA DAS TESTEMUNHAS:

I) Testemunhas deprecadas (Arts. 400, 411, 531 e 222).

II) Possibilidade de perecimento da prova ou de dificuldade posterior de sua produção (Art.


225).

III) Ausência de testemunha de acusação no procedimento sumário (Art. 536).

OBSERVAÇÃO

Ante a atual redação do artigo 212 do Código de Processo Penal, o sistema


presidencialista deixou de ser adotado, havendo a possibilidade de perguntas
diretamente pelas partes. Neste sentido adveio debate doutrinário quanto ao momento
em que o juiz deve realizar as suas perguntas, uma vez que segundo o aludido artigo
o magistrado somente pode inquirir de forma complementar às partes. Para Nucci e
Avena nada mudou - quem começa a ouvir a testemunha é sempre o juiz, como de
praxe forense. Entretanto, na prática há desrespeito a essa regra, exigindo a
jurisprudência a demonstração do prejuízo para fins de nulidade de tal inquirição. Neste
sentido, o STJ possui entendimento consolidado (Ed. 69 Nulidades no Processo Penal)
que A inquirição das testemunhas pelo Juiz antes que seja oportunizada às partes a
formulação das perguntas, com a inversão da ordem prevista no artigo 212 do Código
de Processo Penal, constitui nulidade relativa.

A expedição de carta precatória não suspende a instrução criminal, consoante artigo 222,
§ 1°, do Código de Processo Penal.

Necessidade de fixar prazo para cumprimento do ato deprecado - entre 30 e 90 dias.


Eventual descumprimento possibilita que seja proferida sentença independente do retorno da
precatória (Art. 222, § 2°), sem implicar nulidade, consoante entendimento jurisprudencial.

Se retornar após a sentença, deve ser remetida ao Tribunal para que seja acostada ao
recurso, intimando-se as partes para aditarem suas respectivas razões.

373
Não há necessidade de intimação das partes para audiência a ser realizada no juízo
deprecado, sendo suficiente a intimação da expedição da carta precatória (Súmulas 273 STJ e
155 STF).

23.10. Reconhecimento Pessoas e Coisas – Arts. 226 a 228 do CPP


A) FORMALIDADES LEGAIS:

1) a pessoa convidada a fazer o reconhecimento deverá descrever a pessoa que deva ser
reconhecida (Art. 226, inciso I)

2) em seguida, deverá o reconhecedor apontá-la entre outras que com ela guardarem
semelhança, “se possível” (inciso II). Com efeito, o STJ não reconheceu ilegalidade no
posicionamento do réu sozinho.

3) ao final, lavrar-se-á o auto, subscrito pela autoridade, reconhecedor e por duas


testemunhas presenciais (inciso IV).

4) havendo receio de que, por intimidação, a pessoa chamada para o reconhecimento não
fale a verdade, a autoridade poderá providenciar para que não seja vista por quem deva ser
reconhecido (inciso III).

Ao reconhecimento de coisas aplicam-se as mesmas regras, no que for cabível,


abstraindo-se a previsão contida no inciso III, do Art. 226.

O STJ possuía entendimento consolidado (Ed. 69 – Nulidades no Processo Penal) que as


irregularidades relativas ao reconhecimento pessoal do acusado não ensejam nulidade, uma vez
que as formalidades previstas no Art. 226 do CPP são meras recomendações legais.

Entretanto recentemente o STJ, no HC 597886 do STJ, entendeu pela ilegalidade do


reconhecimento efetuado fora do padrão do artigo 226 CPP, reconhecendo que tal
reconhecimento ilegal não pode justificar uma condenação.

23.11. Busca e Apreensão – Arts. 240 a 250 CPP


A) NATUREZA JURÍDICA:

a.1) meio de prova: uso nas investigações e processo criminal.

374
a.2) assecuratório de direitos: arresto para garantir êxito na reparação civil dos danos causados
pela infração penal.

B) CLASSIFICAÇÃO:

i) domiciliar

ii) pessoal.

Amplitude de conceito normativo de casa: supera-se o conceito previsto no artigo 70 e 72,


ambos do Código Civil. Utiliza-se o artigo 150, § 4°, do Código Penal e artigo 246 do Código de
Processo Penal. Abrange pátio de residência, boleia de caminhão, trailers, cabine de barcos,
barracas, motorhome, repartições públicas, quartos de hotel, pensão, motel e congêneres.

Necessidade de ordem judicial: fundadas razões para busca e apreensão domiciliar =


exigência de indícios convincentes, indicação do local no qual será realizada e objeto da
providência (Art. 240, § 1°).

Para busca pessoal, basta fundada suspeita = subjetivo (Art. 240, § 2°).

C) ASPECTOS IMPORTANTES

Fora das hipóteses de flagrante, desastre, socorro e consentimento do morador, a


exigência do mandado é dispensada quando o próprio juiz competente para expedi-lo realizar a
busca pessoalmente, acompanhado de policiais, nos termos do artigo 241, § 2°. Entretanto, tal
dispositivo deve ser interpretado com ressalva, sob pena de violação ao sistema acusatório e
resgate da figura do juiz-inquisidor.

Cabimento da busca e apreensão domiciliar: Taxatividade do rol previsto no artigo 240,


§ 1°, do Código de Processo Penal.

Desobediência ou recalcitrância do morador: possibilidade de ingresso forçado na


casa, arrombamento da porta (Art. 245, § 2°). Se houver resistência física do morador, poderá
ser preso em flagrante por crime de desobediência, resistência ou desacato.

Auto de apreensão: lavratura de auto circunstanciado, assinando-o com duas


testemunhas presenciais, salvo se executado ou lugar ermo (Art. 245, § 4° e § 7°, do CPP).

D) REGRAS ESPECIAIS

Revista de mulher (Art. 249 do CPP).

375
Busca em território de jurisdição distinta: seguimento pessoa (Art. 250).

E) JULGAMENTO DO RE 603616

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, na sessão de 05/11/2015, o


julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 603616, com repercussão geral reconhecida, e, por
maioria de votos, firmou a tese de que “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só
é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente
justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob
pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos
atos praticados”.

23.12. Questões sobre provas

56) QUESTÃO 1 – XXVIII EXAME


Matheus conduzia seu automóvel em alta velocidade. Em razão de manobra indevida, acabou
por atropelar uma vítima, causando-lhe lesões corporais. Com a chegada da Polícia Militar, foi
solicitado que Matheus realizasse exame de etilômetro (bafômetro); diante de sua recusa, foi
informado pela autoridade policial, que comparecera ao local, que ele seria obrigado a realizar o
exame para verificar eventual prática também do crime previsto no Art. 306 da Lei nº 9.503/97.
Diante da afirmativa da autoridade policial, Matheus, apesar de não desejar, viu-se obrigado a
realizar o teste do bafômetro. Após conclusão do inquérito policial, com oitiva e representação
da vítima, foi o feito encaminhado ao Ministério Público, que ofereceu denúncia imputando a
Matheus apenas a prática do crime do Art. 303, da Lei nº 9.503/97, prosseguindo as
investigações com relação ao crime do Art. 306 do mesmo diploma legal. Ainda na exordial
acusatória, foi requerida a decretação da prisão preventiva de Matheus, pelo risco de reiteração
delitiva, tendo em vista que ele seria reincidente específico, já que a única anotação constante
de sua Folha de Antecedentes Criminais, para além do presente processo, seria a condenação
definitiva pela prática de outro crime de lesão corporal culposa praticada na direção de veículo
automotor. No recebimento da denúncia, o juiz competente decretou a prisão preventiva.
Considerando as informações narradas, na condição de advogado(a) de Matheus, responda aos
itens a seguir.

376
A) Poderia Matheus ter sido obrigado a realizar o teste de bafômetro, conforme informado
pela autoridade policial, mesmo diante de sua recusa? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual requerimento deveria ser formulado, em busca da liberdade de Matheus, diante da
decisão do magistrado, que decretou sua prisão preventiva em razão de sua reincidência?
Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

57) QUESTÃO 1 – IV EXAME


Maria, jovem extremamente possessiva, comparece ao local em que Jorge, seu namorado,
exerce o cargo de auxiliar administrativo e abre uma carta lacrada que havia sobre a mesa do
rapaz. Ao ler o conteúdo, descobre que Jorge se apropriara de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
que recebera da empresa em que trabalhava para efetuar um pagamento, mas utilizara tal
quantia para comprar uma joia para uma moça chamada Júlia. Absolutamente transtornada,
Maria entrega a correspondência aos patrões de Jorge. Com base no relatado acima, responda
aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal
pertinente ao caso.
A) Jorge praticou crime? Em caso positivo, qual(is)? (Valor: 0,35)
B) Se o Ministério Público oferecesse denúncia com base exclusivamente na
correspondência aberta por Maria, o que você, na qualidade de advogado de Jorge,
alegaria? (Valor: 0,90)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

377
58) QUESTÃO 2 – XXI EXAME
No dia 03 de março de 2016, Vinícius, reincidente e específico, foi preso em flagrante em razão
da apreensão de uma arma de fogo, calibre .38, de uso permitido, número de série identificado,
devidamente municiada, que estava em uma gaveta dentro de seu local de trabalho, qual seja,
o estabelecimento comercial “Vinícius House”, do qual era sócio-gerente e proprietário.
Denunciado pela prática do crime do Artigo 14 da Lei nº 10.826/03, confessou os fatos, afirmando
que mantinha a arma em seu estabelecimento para se proteger de possíveis assaltos. Diante da
prova testemunhal e da confissão do acusado, o Ministério Público pleiteou a condenação nos
termos da denúncia em alegações finais, enquanto a defesa afirmou que o delito do Art. 14 do
Estatuto do Desarmamento não foi praticado, também destacando a falta de prova da
materialidade. Após manifestação das partes, houve juntada do laudo de exame da arma de fogo
e das munições apreendidas, constatando-se o potencial lesivo do material, tendo o magistrado,
de imediato, proferido sentença condenatória pela imputação contida na denúncia, aplicando a
pena mínima de 02 anos de reclusão e 10 dias-multa. O advogado de Vinícius é intimado da
sentença e apresentou recurso de apelação. Considerando apenas as informações narradas,
responda na condição de advogado(a) de Vinicius:
A) Qual requerimento deveria ser formulado em sede de apelação e qual tese de direito
processual poder ia ser alegada para afastar a sentença condenatória proferida em
primeira instância? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Confirmados os fatos, qual tese de direito material poderia ser alegada para buscar
uma condenação penal mais branda em relação ao quantum de pena para Vinicius?
Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

59) QUESTÃO 3 – XXI EXAME


Mário foi surpreendido por uma pessoa que, mediante ameaça verbal de morte, subtraiu seu
celular. No dia seguinte, quando passava pelo mesmo local, avistou Paulo e o reconheceu como
sendo a pessoa que o roubara no dia anterior. Levado para a delegacia, Paulo admitiu ter
subtraído o celular de Mário mediante grave ameaça, mas alegou que estava em estado de
necessidade. O celular não foi recuperado e Paulo foi liberado em razão da ausência da situação
de flagrante. Oferecida a denúncia pela prática do delito de roubo, Paulo foi pessoalmente citado

378
e manifestou interesse em ser assistido pela Defensoria Pública. No curso da instrução, a vítima,
única testemunha arrolada pelo Ministério Público, não foi localizada, assim como Paulo nunca
compareceu em juízo, sendo decretada sua revelia. A pretensão punitiva foi acolhida nos termos
do pedido inicial, tendo o juiz fundamentado seu convencimento no que foi dito pelo lesado e
pelo acusado na fase extrajudicial, aumentando a pena-base pelo fato de o agente ter ameaçado
de morte o ofendido e deixando de reconhecer a atenuante da confissão espontânea porque
qualificada.
A) Qual a tese jurídica a ser apresentada nas razões de apelação de modo a buscar a
absolvição de Paulo? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Quais as teses jurídicas a serem apresentadas em sede de apelação de modo a buscar
a redução da pena aplicada, caso mantida a condenação? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

60) QUESTÃO 4 – XXII EXAME


Chegou ao Ministério Público denúncia de pessoa identificada apontando Cássio como traficante
de drogas. Com base nessa informação, entendendo haver indícios de autoria e não havendo
outra forma de obter prova do crime, a autoridade policial representou pela interceptação da linha
telefônica que seria utilizada por Cássio e que fora mencionada na denúncia recebida, tendo o
juiz da comarca deferido a medida pelo prazo inicial de 30 dias. Nas conversas ouvidas, ficou
certo que Cássio havia adquirido certa quantidade de cocaína, pela primeira vez, para ser
consumida por ele, juntamente com seus amigos Pedro e Paulo, na comemoração de seu
aniversário, no dia seguinte. Diante dessa prova, policiais militares obtiveram ordem judicial e
chegaram à casa de Cássio quando este consumia e oferecia a seus amigos os seis papelotes
de cocaína para juntos consumirem. Cássio, portador de maus antecedentes, foi preso em
flagrante e autuado pela prática do crime de tráfico, sendo, depois, denunciado como incurso
nas penas do Art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. Considerando os fatos narrados, responda, na
qualidade de advogado(a) de Cássio, aos itens a seguir.
A) Qual a tese de direito processual a ser suscitada para afastar a validade da prova
obtida? (Valor: 0,65)
B) Reconhecidos como verdadeiros os fatos narrados, qual a tese de direito material a ser
alegada para tornar menos gravosa a tipificação da conduta de Cássio? (Valor: 0,60)

379
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

61) QUESTÃO 1 – XXIV EXAME


No dia 11/01/2016, Arnaldo, nascido em 01/02/1943, primário e de bons antecedentes, enquanto
estava em um bar, desferiu pauladas na perna e socos na face de Severino, nascido em
30/03/1980, por acreditar que este demonstrara interesse amoroso em sua neta de apenas 16
anos. As agressões praticadas por Arnaldo geraram deformidade permanente em Severino, que,
revoltado com o ocorrido, foi morar em outro estado. Denunciado pela prática do crime do Art.
129, § 2º, inciso IV, do Código Penal, Arnaldo confessou em juízo, durante o interrogatório, as
agressões; contudo, não foram acostados aos autos boletim de atendimento médico e exame de
corpo de delito da vítima, que também não foi localizada para ser ouvida. As testemunhas
confirmaram ter visto Arnaldo desferir um soco em Severino, mas não viram se da agressão
resultou lesão. Em sentença, diante da confissão, Arnaldo foi condenado a pena de 03 anos de
reclusão, deixando o magistrado de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos em virtude da violência.
Considerando a situação narrada, na condição de advogado(a) de Arnaldo, responda aos
itens a seguir.
A) Em sede de recurso de apelação, qual argumento poderá ser apresentado em busca da
absolvição de Arnaldo? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Ainda em sede de apelação, existe algum benefício legal a ser requerido pela defesa de
Arnaldo para evitar a execução da pena, caso sejam mantidas a condenação e a sanção
penal imposta? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

380
62) QUESTÃO 3 – XXX EXAME
Eduardo foi preso em flagrante no momento em que praticava um crime de roubo simples, no
bairro de Moema. Ainda na unidade policial, compareceram quatro outras vítimas, todas narrando
que tiveram seus patrimônios lesados por Eduardo naquela mesma data, com intervalo de cerca
de 30 minutos entre cada fato, no bairro de Moema, São Paulo.
As cinco vítimas descreveram que Eduardo, simulando portar arma de fogo, anunciava o assalto
e subtraía os bens, empreendendo fuga em uma bicicleta. Eduardo foi denunciado pela prática
do crime do Art. 157, caput, por cinco vezes, na forma do Art. 69, ambos do Código Penal, e, em
sede de audiência, as vítimas confirmaram a versão fornecida em sede policial.
Assistido por seu advogado Pedro, Eduardo confessou os crimes, esclarecendo que pretendia
subtrair bens de seis vítimas para conseguir dinheiro suficiente para comprar uma motocicleta.
Disse, ainda, que apenas simulou portar arma de fogo, mas não utilizou efetivamente material
bélico ou simulacro de arma. O juiz, no momento da sentença, condenou o réu nos termos da
denúncia, sendo aplicada a pena mínima de 04 anos para cada um dos delitos, totalizando 20
anos de pena privativa de liberdade a ser cumprida em regime inicial fechado, além da multa. Ao
ser intimado do teor da sentença, pessoalmente, já que se encontrava preso, Eduardo tomou
conhecimento que Pedro havia falecido, mas que foram apresentadas alegações finais pela
Defensoria Pública por determinação do magistrado logo em seguida à informação do
falecimento do patrono. A família de Eduardo, então, procura você, na condição de advogado(a),
para defendê-lo.
Considerando apenas as informações narradas, responda, na condição de advogado(a)
de Eduardo, constituído para apresentação de apelação, aos itens a seguir.
A) Existe argumento de direito processual, em sede de recurso, a ser apresentado para
desconstituir a sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Diante da confirmação dos fatos pelo réu, qual argumento de direito material poderá
ser apresentado, em sede de apelação, em busca da redução da sanção penal aplicada?
Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

381
63) QUESTÃO 4 – XXX EXAME
Maria foi denunciada pela suposta prática do crime de descaminho, tendo em vista que teria
deixado de recolher impostos que totalizavam R$ 500,00 (quinhentos reais) pela saída de
mercadoria, fato constatado graças ao lançamento definitivo realizado pela Administração
Pública. Considerando que constava da Folha de Antecedentes Criminais de Maria outro
processo pela suposta prática de crime de roubo, inclusive estando Maria atualmente presa em
razão dessa outra ação penal, o Ministério Público deixou de oferecer proposta de suspensão
condicional do processo. Após a instrução criminal em que foram observadas as formalidades
legais, sendo Maria assistida pela Defensoria Pública, foi a ré condenada nos termos da
denúncia. A pena aplicada foi a mínima prevista para o delito, a ser cumprida em regime inicial
aberto, substituída por restritiva de direitos. Maria foi intimada da sentença através de edital, pois
não localizada no endereço constante do processo.
A família de Maria, ao tomar conhecimento do teor da sentença, procura você, na condição
de advogado(a) para prestar esclarecimentos técnicos. Informa estar preocupada com o
prazo recursal, já que Maria ainda não tinha conhecimento da condenação, pois
permanecia presa. Na condição de advogado(a), esclareça os seguintes questionamentos
formulados pela família da ré.
A) Existe argumento de direito processual para questionar a intimação de Maria do teor
da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual argumento de direito material poderá ser apresentado, em eventual recurso, em
busca da absolvição de Maria? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

64) QUESTÃO 3 – XXIX EXAME


Em patrulhamento de rotina, policiais militares receberam uma informação não identificada de
que Wesley, que estava parado em frente à padaria naquele momento, estaria envolvido com o
tráfico de drogas da localidade.

382
Diante disso, os policiais identificaram e realizaram a abordagem de Wesley, não sendo, em um
primeiro momento, encontrado qualquer material ilícito com ele. Diante da notícia recebida
momentos antes da abordagem, porém, e considerando que o crime de associação para o tráfico
seria de natureza permanente, os policiais apreenderam o celular de Wesley e, sem autorização,
passaram a ter acesso às fotografias e conversas no WhatsApp, sendo verificado que existiam
fotos armazenadas de Wesley portando suposta arma de fogo, bem como conversas sobre
compra e venda de material entorpecente.
Entendendo pela existência de flagrante em relação ao crime permanente de associação para o
tráfico, Wesley foi encaminhado para a Delegacia, sendo lavrado auto de prisão em flagrante.
Após liberdade concedida em audiência de custódia, Wesley é denunciado como incurso nas
sanções do Art. 35 da Lei nº 11.343/06. No curso da instrução, foram acostadas imagens das
conversas de Wesley via aplicativo a que os agentes da lei tiveram acesso, assim como das
fotografias. Os policiais foram ouvidos em audiência, ocasião em que confirmaram as
circunstâncias do flagrante. O réu exerceu seu direito ao silêncio.
Com base nas fotografias acostadas, o juiz competente julgou a pretensão punitiva do estado
procedente, aplicando a pena mínima de 03 anos de reclusão, além de multa, e fixando o regime
inicial fechado, já que o crime imputado seria equiparado a hediondo. Ainda assim, substituiu a
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
Considerando as informações narradas, responda, na condição de advogado(a) de
Wesley, intimado(a) para apresentação de recurso de apelação.
A) Existe argumento a ser apresentado para questionar as provas utilizadas pelo
magistrado como fundamento para condenação? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Mantida a condenação, qual o argumento a ser apresentado para questionar a sanção
penal aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

383
65) QUESTÃO 1 – XXVI EXAME
Insatisfeito com a atividade do tráfico em determinado condomínio de residências, em especial
em razão da venda de drogas de relevante valor, o juiz da comarca autorizou, após requerimento
do Ministério Público, a realização de busca e apreensão em todas as centenas de residências
do condomínio, sem indicar o endereço de cada uma delas, apesar de estas serem separadas e
identificadas, sob o argumento da existência de informações de que, no interior desse
condomínio, haveria comercialização de drogas e que alguns dos moradores estariam envolvidos
na conduta.
Com base nesse mandado, a Polícia Civil ingressou na residência de Gabriel, 22 anos, sendo
apreendidos, no interior de seu imóvel, 15 g de maconha, que, de acordo com Gabriel, seriam
destinados a uso próprio. Após denúncia pela prática do crime do Art. 28 da Lei nº 11.343/06,
em razão de anterior condenação definitiva pela prática do mesmo delito, o que impossibilitaria
a aplicação de institutos despenalizadores, foi aplicada a Gabriel a sanção de cumprimento de
10 meses de prestação de serviços à comunidade. Intimado da condenação e insatisfeito, Gabriel
procura um advogado para consulta técnica, esclarecendo não ter interesse em cumprir a medida
aplicada de prestação de serviços à comunidade.
Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado de Gabriel,
esclareça os itens a seguir.
A) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado em sede de recurso para
questionar a apreensão das drogas na residência de Gabriel? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Em caso de descumprimento, por Gabriel, da medida de prestação de serviços à
comunidade imposta na sentença condenatória pela prática do crime do Art. 28 da Lei nº
11.343/06, poderá esta ser convertida em pena privativa de liberdade? Justifique. (Valor:
0,65)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

384
66) QUESTÃO 1 – XXIII EXAME
José Barbosa, nascido em 11/03/1998, caminhava para casa após sair da faculdade, às 11h da
manhã, no dia 07/03/2016, quando se deparou com Daniel, ex-namorado de sua atual
companheira, conversando com esta. Em razão de ciúmes, retirou a faca que trazia na mochila
e aplicou numerosas facadas no peito de Daniel, com a intenção de matá-lo. Daniel recebeu
pronto atendimento médico, foi encaminhado para um hospital de Niterói, mas faleceu 05 dias
após os golpes de faca.
Já no dia 08/03/2016, policiais militares, informados sobre o fato ocorrido no dia anterior,
comparecem à residência de José Barbosa, já que um dos agentes da lei era seu vizinho. Apesar
de não ter ninguém em casa, a janela estava aberta, e os policiais puderam ver seu interior,
verificando que havia uma faca suja de sangue escondida junto ao sofá. Diante disso, para evitar
que José Barbosa desaparecesse com a arma utilizada, ingressaram no imóvel e apreenderam
a arma branca, que foi devidamente apresentada pela autoridade policial.
Com base na prova produzida a partir da apreensão da faca, o Ministério Público oferece
denúncia em face de José Barbosa, imputando-lhe a prática do crime de homicídio consumado.
Considerando a situação narrada, na condição de advogado(a) de José Barbosa, responda
aos itens a seguir.
A) Qual argumento a ser apresentado pela defesa técnica do denunciado para combater a
prova decorrente da apreensão da faca? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Existe argumento de direito material a ser apresentado em favor de José Barbosa para
evitar o prosseguimento da ação penal? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

385
67) QUESTÃO 3 – XVIII EXAME
Fernando foi pronunciado pela prática de um crime de homicídio doloso consumado que teve
como vítima Henrique. Em sessão plenária do Tribunal do Júri, o réu e sua namorada, ouvida na
condição de informante, afirmaram que Henrique iniciou agressões contra Fernando e que este
agiu em legítima defesa. Por sua vez, a namorada da vítima e uma testemunha presencial
asseguraram que não houve qualquer agressão pretérita por parte de Henrique.
No momento do julgamento, os jurados reconheceram a autoria e materialidade, mas optaram
por absolver Fernando da imputação delitiva. Inconformado, o Ministério Público apresentou
recurso de apelação com fundamento no Art. 593, inciso III, alínea ‘d’, do CPP, alegando que a
decisão foi manifestamente contrária à prova dos autos. A família de Fernando fica preocupada
com o recurso, em especial porque afirma que todos tinham conhecimento que dois dos jurados
que atuaram no julgamento eram irmãos, mas em momento algum isso foi questionado pelas
partes, alegado no recurso ou avaliado pelo Juiz Presidente.
Considerando a situação narrada, esclareça, na condição de advogado(a) de Fernando, os
seguintes questionamentos da família do réu:
A) A decisão dos jurados foi manifestamente contrária à prova dos autos? Justifique.
(Valor: 0,60)
B) Poderá o Tribunal, no recurso do Ministério Público, anular o julgamento com
fundamento em nulidade na formação do Conselho de Sentença? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

68) QUESTÃO 1 – XVII EXAME


Rodrigo, primário e de bons antecedentes, quando passava em frente a um estabelecimento
comercial que estava fechado por ser domingo, resolveu nele ingressar. Após romper o cadeado
da porta principal, subtraiu do seu interior algumas caixas de cigarro. A ação não foi notada por
qualquer pessoa. Todavia, quando caminhava pela rua com o material subtraído, veio a ser
abordado por policiais militares, ocasião em que admitiu a subtração e a forma como ingressou
no comércio lesado. O material furtado foi avaliado em R$ 1.300,00 (um mil e trezentos reais),
sendo integralmente recuperado. A perícia não compareceu ao local para confirmar o
rompimento de obstáculo. O autor do fato foi denunciado como incurso nas sanções penais do
Art. 155, § 4º, inciso I, do Código Penal. As únicas testemunhas de acusação foram os policiais

386
militares, que confirmaram que apenas foram responsáveis pela abordagem do réu, que
confessou a subtração. Disseram não ter comparecido, porém, ao estabelecimento lesado. Em
seu interrogatório, Rodrigo confirmou apenas que subtraiu os cigarros do estabelecimento,
recusando-se a responder qualquer outra pergunta. A defesa técnica de Rodrigo é intimada para
apresentar alegações finais por memoriais.
Com base na hipótese apresentada, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir.
A) Diante da confissão da prática do crime de furto por Rodrigo, qual a principal tese
defensiva em relação à tipificação da conduta a ser formulada pela defesa técnica? (Valor:
0,65)
B) Em caso de acolhimento da tese defensiva, poderá Rodrigo ser, de imediato,
condenado nos termos da manifestação da defesa técnica? (Valor: 0,60)
Obs.: O examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

69) QUESTÃO 1 – XXXIV EXAME


Geraldo, 30 anos, constrangeu Eugênia, desconhecida que passava pela rua, mediante grave
ameaça, a transferir R$ 2.000,00 (dois mil reais) para sua conta. Diante da grave ameaça,
Eugênia compareceu ao estabelecimento bancário com Geraldo e fez a transferência devida,
sendo liberada em seguida. Eugênia, nervosa, compareceu à sede policial e narrou o ocorrido,
sendo instaurado inquérito para identificação do autor do fato. Ocorre que Geraldo, no dia
seguinte, antes de qualquer denúncia, arrependeu-se de sua conduta e transferiu de volta para
a conta de Eugênia todo o valor antes obtido de maneira indevida. Confirmada a autoria, o
Ministério Público ofereceu denúncia em face de Geraldo pela prática do crime de extorsão
simples consumada (Art. 158, caput, do Código Penal), sendo decretada sua prisão preventiva,
em razão da gravidade do fato e da reincidência. Durante audiência de instrução e julgamento,
foi ouvida a vítima, que confirmou os fatos narrados na denúncia. O réu permaneceu em sala de
audiência, e o reconhecimento foi realizado ao final da oitiva da vítima, ainda no local, sob o
argumento de que, como havia muitos presos no Fórum, não haveria policiais suficientes para
transporte de presos até a sala de reconhecimento. Assim, Eugênia apenas apontou para o
denunciado e disse que ele seria o autor. As demais testemunhas esclareceram que não
presenciaram o ocorrido. Com base no reconhecimento realizado, foi o réu condenado nos
termos da denúncia, sendo aplicada pena base de 04 anos; pena intermediária de 04 anos e 03
meses em razão da reincidência, não sendo reconhecidas atenuantes ou outras agravantes; na

387
terceira fase, não foram reconhecidas causas de aumento ou de diminuição de pena. O regime
inicial aplicado foi o fechado. Intimado da sentença, esclareça, na condição de advogado de
Geraldo em atuação em recurso de apelação, os itens a seguir.
A) Qual argumento de direito processual poderá ser apresentado para questionar a
produção probatória em audiência? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual argumento de direito material poderá ser apresentado, caso mantida a
condenação, em busca da redução da pena aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

70) QUESTÃO 2 – XXXIV EXAME


Flávio figurava como indiciado em procedimento em que se investigava a prática do crime de
concussão. Após não mais ter disponíveis outros meios de investigação, o Ministério Público
formulou requerimento de interceptação das conversas telefônicas de Flávio, sendo o pedido
deferido pela autoridade judicial pelo prazo de 10 dias. No período interceptado, todas as
conversas de Flávio foram transcritas. Em uma das conversas interceptadas, Flávio mantinha
contato com seu advogado João e confessava a autoria do crime de concussão, solicitando
orientação jurídica, sendo possível perceber que João não teria qualquer conhecimento anterior
sobre aquela prática delitiva. A partir do teor das transcrições das conversas de Flávio, o
Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor do mesmo, imputando-lhe a prática do crime
previsto no Art. 316 do Código Penal. Ao tomar conhecimento da denúncia, Flávio contata seu
advogado, que tem acesso ao procedimento, inclusive ao teor das transcrições obtidas a partir
da interceptação das conversas telefônicas. Durante a instrução, após requerimento do
Ministério Público, o juiz determina, sem anuência do acusado e de sua defesa técnica, que seja
realizada perícia de voz em Flávio para confirmar que ele seria um dos interlocutores da
conversa, intimando-o para apresentar gravação a servir de paradigma para o exame.

388
Considerando apenas as informações expostas, responda, na condição de advogado(a) de
Flávio, aos itens a seguir.
A) Qual o argumento a ser apresentado para questionar a prova obtida a partir da
interceptação das comunicações telefônicas? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Existe argumento a ser apresentado para questionar a decisão do magistrado que
determinou a realização da perícia de voz, com apresentação de gravação que servisse de
paradigma à perícia? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação

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Recurso de apelação

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 29/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

24.1 Conceito

É o recurso interposto da sentença definitiva ou com força de definitiva, para a segunda


instância, com o fim de que se proceda ao reexame da matéria, com a consequente modificação
parcial ou total da decisão.

24.2 Identificação

PEDIU PRA PARAR

Palavra mágica:
Sentença

PAROU!

NÃO ESQUECER!

É peça bipartida: interposição + razões

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Exemplos de como identificar a peça extraídos de recursos de apelação já cobrados pela
FGV:
Peça XXXV Exame: Após apresentação da manifestação cabível pelas partes, o juiz
proferiu sentença condenando o réu nos termos da denúncia. No momento de aplicar a pena
base, reconheceu a existência de maus antecedentes, aumentando a pena em 03 meses, tendo
em vista que, na Folha de Antecedentes Criminais, acostada ao procedimento, constava uma
condenação de Júlio pela prática do crime de tráfico, por fato ocorrido em 20 de abril de 2019,
cujo trânsito em julgado ocorreu em 10 de março de 2020. Na segunda fase, reconheceu a
presença da agravante do Art. 61, inciso II, alínea b, do Código Penal, aumentando a pena em
05 meses, já que o meio empregado por Júlio poderia resultar perigo comum. Não foram
reconhecidas atenuantes da pena. Na terceira fase, não foram aplicadas causas de aumento ou
de diminuição de pena, sendo mantida a pena de 03 anos e 8 meses de reclusão e multa de 15
dias, a ser cumprida em regime semiaberto, não sendo substituída a privativa de liberdade por
restritiva de direitos com base no Art. 44, III, do CP. Intimado da sentença, o Ministério Público
se manteve inerte, sendo a defesa técnica de Júlio intimada em 11 de julho de 2022, segunda-
feira

Peça XXXIII Exame: Após apresentação de manifestação derradeira pelas partes, foi
proferida sentença condenatória nos termos da denúncia, conforme requerido pelo
Ministério Público. Na primeira fase, fixou o magistrado a pena base dos crimes de roubo e
corrupção de menores acima do mínimo legal, em razão da personalidade do réu, que seria
voltada para prática de crimes, conforme indicaria sua folha de antecedentes criminais, restando
a pena do roubo em 4 anos e 06 meses de reclusão e 12 dias multa e da corrupção em 01 ano
e 02 meses de reclusão. Na segunda fase, não foram reconhecidas agravantes e nem
atenuantes. Na terceira fase, a pena base do crime de corrupção de menores foi confirmada
como definitiva, enquanto a pena de roubo foi aumentada em 2/3, em razão do emprego de arma
de fogo, diante das previsões da Lei nº 13.654/18, restando a pena definitiva do roubo em 07
anos e 06 meses de reclusão e 20 dias multa, já que não foram reconhecidas causas de
diminuição de pena. O regime inicial fixado foi o fechado, em razão da pena final de 8 anos e 8
meses de reclusão e 20 dias multa (Art. 70, parágrafo único, CP). O Ministério Público, intimado
da sentença, manteve-se inerte. Você, como advogado(a) de Breno, é intimado(a) no dia 03
de dezembro de 2019, terça-feira, sendo o dia seguinte útil em todo o país, bem como
todos os dias da semana seguinte, exceto sábado e domingo.

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Peça XXX Exame: (...) Após manifestação das partes, o juiz em atuação perante a 3ª Vara
Criminal da Comarca de São Gonçalo/RJ, em 10 de julho de 2019, julgou totalmente
procedente a pretensão punitiva do Estado e, apesar de afastar o excesso de velocidade,
afirmou ser necessária a condenação de Carlos em razão da imperícia do réu, conforme
mencionado no exame pericial. No momento da dosimetria, fixou a pena base de cada um dos
crimes no mínimo legal e, com relação à vítima Mário, na segunda fase, reconheceu a agravante
prevista no Art. 61, inciso II, alínea h, do CP, pelo fato de ser criança, aumentando a pena base
em 3 meses. Não havendo causas de aumento ou diminuição, reconhecido o concurso material,
a pena final ficou acomodada em 04 anos e 09 meses de detenção. Não houve substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em razão do quantum final, nos termos do
Art. 44, inciso I, do CP, sendo fixado regime inicial fechado de cumprimento da pena, com
fundamento na gravidade em concreto da conduta. O Ministério Público foi intimado e manteve-
se inerte. A defesa técnica de Carlos foi intimada em 18 de setembro de 2019, quarta-feira,
para adoção das medidas cabíveis.
Peça XXV Exame, aplicado em Porto Alegre/RS: “(...) Durante a instrução, todos os fatos
acima descritos são confirmados pelas testemunhas, não tendo sido o réu interrogado, já que,
apesar de intimado, apresentou problemas de saúde no dia e não pôde comparecer à audiência.
Ainda durante a audiência de instrução e julgamento, após a instrução, as partes apresentaram
suas alegações, sendo consignado pela defesa o inconformismo com a ausência do réu, já que
foi apresentado atestado médico, e, em seguida, o juiz proferiu sentença condenatória nos
termos da denúncia, condenando o agente pela prática dos dois delitos em suas modalidades
consumadas. No momento de fixar a pena-base, aumentou o magistrado a pena do estelionato
em 02 meses, destacando que o comportamento de Breno não deixa qualquer dúvida de que
agiu com dolo. Já a pena do uso de documento falso foi aplicada em seu patamar mínimo. Na
segunda fase, não foram reconhecidas atenuantes, mas foi reconhecida a agravante da
reincidência, aumentando a pena de cada um dos delitos em mais 02 meses de reclusão. No
terceiro momento, não foram reconhecidas causas de aumento ou de diminuição. Assim, foi
fixada a pena de 01 ano e 04 meses de reclusão e 14 dias-multa, no que tange ao crime de
estelionato, e 02 anos e 02 meses de reclusão e 12 dias-multa para o crime de falsificação de
documento equiparado ao público, restando a pena final em 03 anos e 06 meses de reclusão e
26 dias-multa. O regime inicial de cumprimento de pena aplicado pelo magistrado foi o
semiaberto e não houve substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, tudo
fundamentado na reincidência do agente. Intimado da decisão, o Ministério Público apenas

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tomou ciência de seu teor, não apresentando qualquer medida. Já a defesa técnica de Breno
foi intimada de seu teor em 06 de dezembro de 2017, quarta-feira, sendo quinta-feira dia
útil em todo o país. Considerando apenas as informações narradas, na condição de
advogado(a) de Breno, redija a peça jurídica cabível, diferente de habeas corpus e embargos de
declaração, apresentando todas as teses jurídicas pertinentes. A peça deverá ser datada no
último dia do prazo para interposição. (Valor: 5,00)”

Peça XXII Exame: “(...) Em sentença, o juiz julgou procedente a pretensão punitiva estatal. No
momento de fixar a pena-base, reconheceu a existência de maus antecedentes em razão da
representação julgada procedente em face de Leonardo enquanto era inimputável, aumentando
a pena em 06 meses de reclusão. Não foram reconhecidas agravantes ou atenuantes. Na
terceira fase, incrementou o magistrado em 1/3 a pena, justificando ser desnecessária a
apreensão de arma de fogo, bastando a simulação de porte do material diante do temor causado
à vítima. Com a redução de 1/3 pela modalidade tentada, a pena final ficou acomodada em 4
(quatro) anos de reclusão. O regime inicial de cumprimento de pena foi o fechado, justificando o
magistrado que o crime de roubo é extremamente grave e que atemoriza os cidadãos de Belo
Horizonte todos os dias. Intimado, o Ministério Público apenas tomou ciência da decisão. A irmã
de Leonardo o procura para, na condição de advogado, adotar as medidas cabíveis. Constituída
nos autos, a intimação da sentença pela defesa ocorreu em 08 de maio de 2017, segunda-
feira, sendo terça-feira dia útil em todo o país.”

Peça XVIII Exame: “No dia 25 de junho de 2015 foi proferida sentença pelo juízo competente,
qual seja a 1ª Vara Criminal da Comarca de Natal, condenando Caio à pena privativa de liberdade
de 10 anos e 06 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado. Na sentença
consta que a pena base de cada um dos crimes deve ser aumentada em seis meses pelo fato
de Caio possuir maus antecedentes, já que ostenta em sua FAC duas condenações pela prática
de crimes, e mais 06 meses pelo fato de o acusado ter desrespeitado a liberdade sexual da
mulher, um dos valores mais significativos da sociedade, restando a sanção penal da primeira
fase em 07 anos de reclusão, para cada um dos delitos. Na segunda fase, não foram
reconhecidas atenuantes ou agravantes. Afirmou o magistrado que atualmente é o réu maior de
21 anos, logo não estaria presente a atenuante do Art. 65, inciso I, do CP. Ao analisar o concurso
de crimes, o magistrado considerou a pena de um dos delitos, já que eram iguais, e aumentou
de ½ (metade), na forma do Art. 71 do CP, justificando o acréscimo no fato de ambos os crimes

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praticados serem extremamente graves. Por fim, o regime inicial para o cumprimento da pena foi
o fechado, justificando que, independente da pena aplicada, este seria o regime obrigatório, nos
termos do Art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90. Apesar da condenação, como Caio respondeu ao
processo em liberdade, o juiz concedeu a ele o direito de aguardar o trânsito em julgado da
mesma forma. Caio e sua família o (a) procuram para, na condição de advogado (a), adotar as
medidas cabíveis, destacando que estão insatisfeitos com o patrono anterior. Constituído nos
autos, a intimação da sentença ocorreu em 07 de julho de 2015, terça-feira, sendo quarta-feira
dia útil em todo o país.”

Peça XIII Exame: “(...) O Juiz, então, proferiu sentença em audiência condenando Diogo pela
prática do crime de violação de domicílio em concurso material com o crime de furto qualificado
pela escalada. Para a dosimetria da pena o magistrado ponderou o fato de que nenhum dos bens
subtraídos fora recuperado. Além disso, fez incidir a circunstância agravante da reincidência,
pois considerou que a condenação de Diogo pelo crime de estelionato o faria reincidente. O total
da condenação foi de 4 anos e 40 dias de reclusão em regime inicial semiaberto e multa à
proporção de um trigésimo do salário-mínimo. Por fim, o magistrado, na sentença, deixou claro
que Diogo não fazia jus a nenhum outro benefício legal, haja vista o fato de não preencher os
requisitos para tanto. A sentença foi lida em audiência. O advogado(a) de Diogo, atento(a) tão
somente às informações descritas no texto, deve apresentar o recurso cabível à impugnação da
decisão, respeitando as formalidades legais e desenvolvendo, de maneira fundamentada, as
teses defensivas pertinentes. O recurso deve ser datado com o último dia cabível para a
interposição. (Valor: 5,0)”

Peça XII Exame: “(...) Finda a instrução criminal, o magistrado proferiu sentença em
audiência. Na dosimetria da pena, o magistrado entendeu por bem elevar a pena base em
patamar acima do mínimo, ao argumento de que o trânsito em julgado de outra sentença
condenatória configurava maus antecedentes; na segunda fase da dosimetria da pena o
magistrado também entendeu ser cabível a incidência da agravante da reincidência, levando em
conta a data do trânsito em julgado definitivo da sentença de estelionato, bem como a data do
cometimento do furto (ora objeto de julgamento); não verificando a incidência de nenhuma causa
de aumento ou de diminuição, o magistrado fixou a pena definitiva em 4 (quatro) anos de reclusão
no regime inicial semiaberto e 80 (oitenta) dias-multa. O valor do dia-multa foi fixado no patamar
mínimo legal. Por entender que a ré não atendia aos requisitos legais, o magistrado não

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substituiu a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos. Ao final, assegurou-se à
ré o direito de recorrer em liberdade. O advogado da ré deseja recorrer da decisão. Atento ao
caso narrado e levando em conta tão somente as informações contidas no texto, elabore o
recurso cabível. (Valor: 5,0)”

24.3 Base legal

Considerando que em todas as provas caiu apelação contra sentença condenatória, a base
legal será o artigo 593, I, do CPP.

Art. 593, inciso I, CPP

24.4 Cabimento da apelação nas sentenças do juiz singular – art. 593

• Das sentenças definitivas de condenação ou absolvição proferidas por juiz singular

Cabe apelação nas sentenças definitivas de condenação ou absolvição. São as decisões


que põe fim à relação jurídica processual, julgando o seu mérito, quer absolvendo, quer
condenando o acusado. Sua base legal é no art. 593, inciso I do CPP.

• Das decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz singular
nos casos não previstos no capítulo anterior (art. 593, inciso II, CPP)

Nos termos do artigo 593, II, do CPP, cabe apelação das decisões definitivas, ou com
força de definitivas, proferidas por juiz singular nos casos não previstos no capítulo anterior.

Em outras palavras, cabe, ainda, apelação das sentenças que, julgando o mérito, põe fim
à relação jurídica processual ou ao procedimento, sem, contudo, absolver ou condenar o
acusado.

Logo, no caso, consistem na hipótese de decisões interlocutórias mistas (definitivas ou


com força de definitivas), que não integram o rol do art. 581 do CPP, sendo, assim, cabível, na
forma residual, portanto, o recurso de apelação, previsto no inciso II do art. 593.

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DECISÕES DEFINITIVAS: também denominadas terminativas de mérito, são aquelas que
encerram o processo, incidental ou principal, com julgamento do mérito, sem, no entanto,
absolver ou condenar.

Exemplo: procedência ou improcedência da restituição de coisa apreendida (art. 120, §


1º, CPP); decisão que autoriza o sequestro de bens (art. 127 do CPP).

DECISÕES COM FORÇA DE DEFINITIVAS: são aquelas decisões que encerram o


processo, sem julgamento do mérito (decisão interlocutória mista terminativa) ou uma etapa
procedimental (decisão interlocutória mista não terminativa).

Exemplo: decisão de impronúncia, que é apelável (art. 416, CPP).

24.5 Prazo

O prazo para interposição do Recurso de Apelação, é, em regra, de 05 dias, conforme o


art. 593, CPP. Conta-se da intimação. E é de 08 dias o prazo para oferecer as razões do recurso
(art. 600, CPP).

Considerando que a FGV sempre exigiu a interposição do recurso de apelação, já com as


razões inclusas, priorize o prazo de 05 dias.

No rito da lei 9.099/95 (Juizado Especial Criminal), o prazo será de 10 dias, pela previsão
do art. 82, § 1º da referida norma.

Nos termos da Súmula 710 do STF: “No processo penal, contam-se os prazos da data da
intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou carta precatória ou ordem”.

No caso do réu, devem ser intimados ele e seu defensor, iniciando-se o prazo após a
última intimação.

24.6 Legitimidade do assistente à acusação

A legitimidade do assistente de acusação está prevista no artigo 598 do CPP. O assistente


à acusação, pode ser:

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a) habilitado nos autos: quando já atuava nos autos, razão pela qual vinha sendo intimado
dos atos processuais, podendo, nessa condição, interpor recurso no prazo de 05 dias.

b) não habilitado nos autos: quando passa a atuar nos autos a partir da sentença, não
sendo até então, portanto, intimado dos atos processuais, razão pela qual terá o prazo mais
dilatado para interpor recurso de apelação, qual seja, 15 dias, nos termos do artigo 598,
parágrafo único, do CPP.

A contagem do prazo para o assistente de acusação interpor recurso segue a regra


disposta na Súmula 448 do STF: “O prazo para o assistente recorrer, supletivamente,
começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público”.

24.7 Conteúdo

O que buscar no enunciado, criatura de Deus....

O recurso de apelação pode exigir do candidato desenvolver teses relacionadas a


preliminares e/ou matérias de mérito.

• Preliminares

As questões preliminares são aquelas que não observam aspectos formais de


determinado ato processual, gerando, invariavelmente, nulidade. Aqui, por questão de
organização, recomenda-se que as causas extintivas de punibilidade, notadamente prescrição,
sejam abordadas no campo destinado às preliminares.

• Mérito
O conteúdo da apelação guarda estreita relação com as teses que podem ser invocadas
em memoriais. Isso porque, em última análise, a apelação constitui instrumento processual
próprio para rediscutir os argumentos expostos nos memoriais, mas não acolhidos pelo juiz
singular, devolvendo, por meio do recurso de apelação, ao Tribunal a análise das teses
invocadas.
Conforme já mencionado, nas peças práticas profissionais deverão ser buscadas no
enunciado teses que, ao final, viabilizarão a formulação do correspondente pedido. Ou seja,

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aborda-se na peça aquilo que, ao final, poderá ser objeto de pedido. No caso da apelação contra
decisão proferida por juiz singular, as teses de mérito guardam relação com as hipóteses que
ensejam a absolvição, previstas no artigo 386 do CPP.
Considerando que o pedido de absolvição deve observar um dos incisos do artigo 386, a
matéria de mérito consistirá, necessariamente, na discussão, acerca da materialidade, autoria,
tipicidade, ilicitude, culpabilidade, além de teses subsidiárias, formando aquilo que
convencionamos representar pela sigla “MATICS”.

No XXII exame, caiu também como tese a desistência voluntária, ao passo que no XXV
Exame, na prova aplicada em Porto Alegre, caiu princípio da consunção, com absolvição em
face do crime meio.

• Subsidiariedade
Além das preliminares e das questões de mérito, deve-se buscar no enunciado
informações que permitam identificar alguma tese subsidiária. As teses subsidiárias consistem,
basicamente, nas hipóteses em que, uma vez condenado, permitem ao réu ter sua situação
amenizada.
Como forma de facilitar a identificação, convencionarmos considerar a ordem estabelecida
no art. 59 do CP. Trata-se de espécie de checklist.
a) na quantidade de pena: Art. 59, II: verificar o sistema trifásico (art. 68 do CP).

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* buscar no enunciado informações para sustentar a pena-base no mínimo legal (afastar,
por exemplo, maus antecedentes);
* Apontar atenuantes (previstas no artigo 65 do CP); afastar agravantes (previstas no
artigo 61 e 62 do CP);
* Apontar causas de diminuição de pena (ex: tentativa – art. 14, parágrafo único, do CP);
afastar causas de aumento de pena.
* Afastar qualificadoras

b) regime carcerário mais brando: Art. 59, III, do CP

* Verificar o artigo 33 do Código Penal e artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90 (O STF declarou
inconstitucional esse dispositivo).

c) Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos: Art. 59, IV,
do CP

* Verificar o artigo 44 do CP e artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 (ver Resolução nº 05 do


Senado).

d) Sursis – Art. 77 do CP

e) Desclassificação do delito

24.8 Pedido

No campo destinado aos pedidos, deve-se formular pedido específico para cada uma das
teses desenvolvidas ao longo da peça.

Exemplo: Se sustentou a tese da nulidade da sentença, deve-se, ao final, formular pedido


expresso de que seja declarada a nulidade da sentença.

Se desenvolveu tese acerca da prescrição, ao final deve formular pedido expresso de


extinção da punibilidade, com base no artigo 107, IV, do Código Penal.

Isso vale também para as matérias de mérito e teses subsidiárias.

Se sustentou, por exemplo, princípio da insignificância, deve-se formular pedido expresso


de absolvição, com base no artigo 386, inciso III, do CPP. Se sustentou, subsidiariamente, que

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o réu não é reincidente, deve-se, ao final, formular pedido expresso para afastar a reincidência,
com a consequente diminuição da pena... e assim por diante.

Não esquecer de formular pedido de conhecimento, provimento e reforma da decisão.

O pedido de absolvição tem como base uma das hipóteses do artigo 386 do CPP.

24.9 Estrutura do recurso

O recurso de apelação é uma peça bipartida, havendo: a) peça de interposição do recurso;


b) as razões de recurso.

INTERPOSIÇÃO – para juiz de 1º grau

a) endereçamento: Juiz de Direito da Vara Criminal (se crime não doloso contra a vida da
competência da Justiça Estadual) ou Juiz Federal da Vara Criminal da Seção Judiciária (se crime
não doloso contra a vida da competência da Justiça Federal); Juiz de Direito da Vara do Juizado
Especial Criminal (se for infração de menor potencial ofensivo);

b) preâmbulo: nome (desnecessário qualificar, pois já qualificado nos autos), capacidade


postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento legal (art. 593, inciso __, 416 se
absolvição sumária ou impronúncia, ou artigo 82 da Lei 9.099/95, se tratar de infração de menor
potencial ofensivo), nome da peça (Recurso de apelação), frase final (pelos fatos e fundamentos
jurídicos a seguir expostos);

c) parte final (Nesses termos, requer o processamento do presente recurso. Pede


deferimento, data, advogado e OAB).

Observação: o recurso de apelação não tem efeito regressivo.

RAZÕES

a) Endereçamento: para Tribunal ou Turmas Recursais (se for infração de menor potencial
ofensivo).

400
Tribunal de Justiça do Estado... (se da competência da Justiça Estadual); Tribunal
Regional Federal (se da competência da Justiça Federal). Turmas Recursais (Se for infração de
menor potencial ofensivo);

b) identificação: apelante, apelado, nº processo;

c) saudação:

Justiça Estadual: Egrégio Tribunal de Justiça – Colenda Câmara Criminal

Justiça Federal: Egrégio Tribunal Regional Federal – Colenda Turma

d) corpo da peça (I. Dos fatos: breve relato; II. Do Direito: preliminares, mérito e teses
subsidiárias);

e) pedido: conhecimento + provimento e reforma da decisão, além dos pedidos


específicos;

f) parte final: termos em que pede deferimento, local, data, advogado e OAB.

401
24.10 Peça bipartida

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DA


COMARCA DE... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DE... (se crime da competência da Justiça Federal)

Processo nº...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência, inconformado com a decisão de fls..., interpor o presente RECURSO DE
APELAÇÃO, com base no artigo 593, I, do Código de Processo Penal.
Assim, requer seja recebido e processado o recurso, já com as razões
anexas, remetendo-se os autos ao Tribunal de Justiça do Estado... / Tribunal Regional
Federal.
O presente recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 5 dias,
na forma do artigo 593, caput, do Código de Processo Penal.

Nestes termos,
pede deferimento.

Local..., data...
Advogado...
OAB...

402
Estruturação: peça das razões recursais, endereçada ao tribunal competente:

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO... (se da competência da Justiça


Estadual); ou
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA... REGIÃO (se da competência da
Justiça Federal).

Apelante: Fulano de Tal


Apelado: Ministério Público

Processo nº

RAZÕES DE RECURSO DE APELAÇÃO

Egrégio Tribunal de Justiça ou Egrégio Tribunal Regional Federal


Colenda Câmara Criminal (Justiça Estadual) ou Colenda Turma (Justiça Federal)

I) DOS FATOS

II) DO DIREITO
A) DAS PRELIMINARES
B) DO MÉRITO
C) SUBSIDIARIAMENTE

III) DO PEDIDO

Ante o exposto, requer seja CONHECIDO e PROVIDO o recurso, com a reforma da


decisão de 1º grau, para o fim ...:
I) preliminares (nulidades, incompetência, prescrição, etc – acompanhar a ordem das
preliminares);

403
II) absolvição, com base no artigo 386, inciso..., do CPP;
III) diminuição da pena, regime carcerário, substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, “sursis” (se não cabível a restritiva de direitos).

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...

Advogado...
OAB...

Observações:
• Atenção: o enunciado pode pedir a interposição no último dia do prazo;
• Fazer breve relato dos fatos ocorridos, conforme os dados do enunciado (não inventar nada
nem simplesmente transcrever o enunciado);
• Aqui também sugere-se dividir os fundamentos jurídicos em preliminares e mérito;
• No mérito, busca-se afastar a materialidade e autoria do delito, bem como arguir uma das
causas excludentes do crime: exclusão da tipicidade, ilicitude e culpabilidade. Lembrar:
“MATICS”.

404
Estruturação no JECrim: peça de interposição - endereçada ao juízo de 1º grau:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL
CRIMINAL DA COMARCA DE...
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DO JUIZADO ESPECIAL
CRIMINAL DA JUSTIÇA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE...

Processo nº ...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, a presença de Vossa
Excelência, inconformado com a decisão de fls., interpor o presente RECURSO DE
APELAÇÃO, com base no artigo 82 da Lei 9.099/95.
O presente recurso é tempestivo, visto que interposto dentro do prazo de 10
dias, na forma do artigo 82, § 1º, da Lei 9099/95. Assim, requer seja recebido e processado
o recurso, já com as razões anexas, remetendo-se os autos às Turmas Recursais.

Nestes termos,
pede deferimento.

Local..., data...
Advogado...
OAB...

405
Estruturação no JECrim: peça das razões recursais, endereçada às turmas recursais
EGRÉGIA TURMA RECURSAL
Apelante: Fulano de Tal
Apelado: Ministério Público
Processo nº ...
RAZÕES DE RECURSO DE APELAÇÃO
Egrégia Turma Recursal
Eméritos Julgadores
I) DOS FATOS
II) DO DIREITO
A) DAS PRELIMINARES
B) DO MÉRITO
C) SUBSIDIARIAMENTE

III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja CONHECIDO e PROVIDO o recurso, com a reforma da decisão
de 1º grau, para o fim ...:
I) preliminares (nulidades, incompetência, prescrição, etc – acompanhar a ordem das
preliminares)
II) absolvição, com base no artigo 386, inciso ..., do CPP
III) diminuição da pena, regime carcerário, substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, “sursis” (se não cabível a restritiva de direitos).

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...
Advogado...
OAB...

406
Observações:
• Atenção: o enunciado pode pedir a interposição no último dia do prazo;
• Fazer breve relato dos fatos ocorridos, conforme os dados do enunciado (não inventar nada nem
simplesmente transcrever o enunciado);
• No mérito, busca-se afastar a materialidade e autoria do delito, bem como arguir uma das
causas excludentes do crime: exclusão da tipicidade, ilicitude e culpabilidade. Lembrar:
“MATICS”;
• Dica: para lembrar dos pedidos voltados a melhorar a situação do réu, sugere-se seguir a
sequência dos incisos do art. 59 do CP:
• Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade
do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao
comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação
e prevenção do crime:
I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;
II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos [buscar atenuantes (arts. 65 e 66
CP) e causas de diminuição da pena - tentativa, por exemplo, art. 14, II CP); b) afastar causas
de aumento da pena e qualificadoras];
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade (art. 33 CP);
IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível
(art. 44 CP).
• ART. 77, CP (SURSIS)

407
24.11. Questões sobre Recurso de apelação

71) QUESTÃO 2 – XXX EXAME


Carleto foi denunciado pela prática do injusto de homicídio simples porque teria desferido
disparos, com sua arma regular, contra seu vizinho Mário durante uma discussão, causando-lhe
as lesões que foram a causa da morte da vítima. Logo que recebida a denúncia, Carleto foi
submetido à exame de insanidade mental, tendo o laudo concluído que ele se encontrava nas
condições do Art. 26, caput, do Código Penal. Finda a primeira etapa probatória do procedimento
dos crimes dolosos contra a vida, no momento das alegações finais, a defesa técnica de Carleto,
escorada em uma das vertentes da prova produzida, alegou que o réu atuou em legítima defesa.

408
O juiz, ao final da primeira fase do procedimento, absolveu sumariamente o acusado em razão
da inimputabilidade reconhecida, aplicando a medida de segurança de internação pelo prazo
mínimo de 01 ano. A família de Carleto, insatisfeita com a medida de segurança aplicada, procura
você, como advogado(a), para a adoção das medidas cabíveis.
Considerando o caso narrado, responda, na condição de advogado(a) de Carleto, aos itens a
seguir.
A) Qual o recurso cabível para a defesa combater aquela decisão? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Qual a tese jurídica de direito processual que a defesa de Carleto poderá alegar para
combater a decisão respectiva? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

72) QUESTÃO 2 – IV EXAME


Caio é denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de homicídio qualificado por
motivo fútil. De acordo com a inicial, em razão de rivalidade futebolística, Caio teria esfaqueado
Mévio quarenta e três vezes, causando-lhe o óbito. Pronunciado na forma da denúncia, Caio
recorreu com o objetivo de ser impronunciado, vindo o Tribunal de Justiça da localidade a manter
a pronúncia, mas excluindo a qualificadora, ao argumento de que Mévio seria arruaceiro e,
portanto, a motivação não poderia ser considerada fútil. No julgamento em plenário, ocasião em
que Caio confessou a prática do crime, a defesa lê para os jurados a decisão proferida pelo
Tribunal de Justiça no que se refere à caracterização de Mévio como arruaceiro. Respondendo
aos quesitos, o Conselho de Sentença absolve Caio. Sabendo-se que o Ministério Público não
recorreu da sentença, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos
apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

409
A) A esposa de Mévio poderia buscar a impugnação da decisão proferida pelo Conselho
de Sentença? Em caso positivo, de que forma e com base em que fundamento? (Valor:
0,65)
B) Caso o Ministério Público tivesse interposto recurso de apelação com fundamento
exclusivo no artigo 593, III, “d”, do Código de Processo Penal, poderia o Tribunal de
Justiça declarar a nulidade do julgamento por reconhecer a existência de nulidade
processual? (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

410
Contrarrazões de apelação19

Aula prevista para ocorrer no dia 30/03/2023.

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

25.1 Introdução

Nos termos do artigo 593 do CPP, se não concordar com a sentença proferida, a parte
irresignada deverá apresentar a petição de interposição da apelação no prazo de 05 dias. Na
sequência, conforme dispõe o artigo 600 do CPP, se recebida a apelação, intima-se o apelante
para apresentar suas razões do recurso de apelação, sendo, posteriormente, o apelado
intimado para apresentar as CONTRARRAZÕES DO RECURSO DE APELAÇÃO ou RAZÕES
DO APELADO.

Logo, haverá sentença, apelação pelo Ministério Público, sendo a defesa intimada para
oferecer as contrarrazões de apelação.

25.2 Identificação

PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica: Peça:


“Apelação pelo Ministério Contrarrazões de
Público...” apelação

PAROU!

19
Contrarrazões de recurso de apelação também está correto.

411
Haverá sentença, apelação pelo Ministério Público, sendo a defesa intimada para
oferecer as contrarrazões de apelação.

Exemplos de como identificar a peça extraídos de contrarrazões de apelação já cobradas


pela FGV:

Peça XXVII Exame: “(...) O juiz, após a devida manifestação das partes, proferiu sentença
julgando parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal. Em um primeiro momento,
absolveu o acusado do crime de associação para o tráfico por insuficiência probatória. Em
seguida, condenou o réu pela prática do crime de tráfico de drogas, ressaltando que o réu
confirmou a destinação das drogas à ilícita comercialização. No momento de aplicar a pena, fixou
a pena base no mínimo legal, reconhecendo a existência da atenuante da confissão espontânea;
aumentou a pena em razão da causa de aumento do Art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06 e
aplicou a causa de diminuição de pena do Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, restando a pena
final em 1 ano, 11 meses e 10 dias de reclusão e 195 dias multa, a ser cumprida em regime
inicial aberto. (...) Já o acusado e a defesa técnica, intimados do teor da sentença, mantiveram-
se inertes, não demonstrando interesse em questioná-la. O magistrado, então, recebeu o
recurso do Ministério Público e intimou, no dia 05 de novembro de 2018 (segunda-feira),
sendo terça-feira dia útil em todo o país, você, advogado(a) de João, a apresentar a medida
cabível. Com base nas informações expostas na situação hipotética e naquelas que podem ser
inferidas do caso concreto, redija a peça cabível, excluídas as possibilidades de habeas corpus
e embargos de declaração, no último dia do prazo, sustentando todas as teses jurídicas
pertinentes. (Valor: 5.00)”

412
Peça XIX Exame: “(...) Ao final da instrução, após alegações finais, a pretensão punitiva do
Estado foi julgada procedente, com Rodrigo sendo condenado a pena de 05 anos e 04 meses
de reclusão, a ser cumprida em regime semiaberto, e 13 dias-multa. O juiz aplicou a pena-base
no mínimo legal, além de não reconhecer qualquer agravante ou atenuante. Na terceira fase da
aplicação da pena, reconheceu as majorantes mencionadas na denúncia e realizou um aumento
de 1/3 da pena imposta. O Ministério Público foi intimado da sentença em 14 de setembro de
2015, uma segunda-feira, sendo terça-feira dia útil. Inconformado, o Ministério Público
apresentou recurso de apelação perante o juízo de primeira instância, acompanhado das
respectivas razões recursais, no dia 30 de setembro de 2015, requerendo: i) O aumento da pena-
base, tendo em vista a existência de diversas anotações na Folha de Antecedentes Criminais do
acusado; ii) O reconhecimento das agravantes previstas no Art. 61, inciso II, alíneas ‘h’ e ‘l’, do
Código Penal; iii) A majoração do quantum de aumento em razão das causas de aumentos
previstas no Art. 157, §2º, incisos I e II, do Código Penal, exclusivamente pelo fato de serem
duas as majorantes; iv) Fixação do regime inicial fechado de cumprimento de pena, pois o roubo
com faca tem assombrado a população do Rio de Janeiro, causando uma situação de
insegurança em toda a sociedade. A defesa não apresentou recurso. O magistrado, então,
recebeu o recurso de apelação do Ministério Público e intimou, no dia 19 de outubro de
2015 (segunda-feira), sendo terça feira dia útil em todo o país, você, advogado(a) de
Rodrigo, para apresentar a medida cabível. Com base nas informações expostas na situação
hipotética e naquelas que podem ser inferidas do caso concreto, redija a peça cabível, excluída
a possibilidade de habeas corpus, no último dia do prazo, sustentando todas as teses jurídicas
pertinentes. (Valor: 5.00)”

25.3 Base legal

Art. 600, CPP

25.4 Prazo

Conforme o artigo 600 do CPP, o prazo para apresentar contrarrazões de apelação é de


08 dias.

413
8 dias

25.5 Conteúdo

Deve-se buscar no enunciado informações que permitem desenvolver teses voltadas à


manutenção da decisão recorrida, bem como refutar os argumentos lançados pela acusação.

Exemplo do XIX Exame da OAB:

“Inconformado, o Ministério Público apresentou recurso de apelação perante o juízo de


primeira instância, acompanhado das respectivas razões recursais, no dia 30 de setembro de
2015, requerendo: i) O aumento da pena-base, tendo em vista a existência de diversas
anotações na Folha de Antecedentes Criminais do acusado; ii) O reconhecimento das
agravantes previstas no Art. 61, inciso II, alíneas ‘h’ e ‘l’, do Código Penal; iii) A majoração do
quantum de aumento em razão das causas de aumentos previstas no Art. 157, §2º, incisos I e II,
do Código Penal, exclusivamente pelo fato de serem duas as majorantes; iv) Fixação do regime
inicial fechado de cumprimento de pena, pois o roubo com faca tem assombrado a população do
Rio de Janeiro, causando uma situação de insegurança em toda a sociedade.”

É possível, ainda, que o enunciado forneça informações para desenvolver tese preliminar,
como, por exemplo, de não conhecimento do recurso da acusação, porque interposto fora do
prazo legal.

25.6 Pedidos

O pedido, fundamentalmente, deve ser de não conhecimento do recurso, improvimento


do recurso e manutenção da decisão recorrida. A FGV, nas duas vezes que caiu a peça
contrarrazões de recurso de apelação (XIX e XXVII exame) não exigiu pedidos específicos.

25.7 Estrutura da peça

A peça de contrarrazões de apelação é bipartida, havendo: a) petição de juntada; b) as


razões de recurso de apelação.

414
Petição de juntada: para juiz de 1º grau

a) endereçamento: Juiz de Direito da Vara Criminal (se crime não doloso contra a vida da
competência da Justiça Estadual) ou Juiz Federal da Vara Criminal da Seção Judiciária (se crime
não doloso contra a vida da competência da Justiça Federal); Juiz de Direito da Vara do Juizado
Especial Criminal (se for infração de menor potencial ofensivo);

b) preâmbulo: nome (desnecessário qualificar, pois já qualificado nos autos), capacidade


postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento legal (art. 600 do CPP), nome da
peça (Contrarrazões de Recurso de apelação), frase final (pelos fatos e fundamentos jurídicos a
seguir expostos);

c) parte final (Nesses termos, requer o processamento do presente recurso. Pede deferimento,
data, advogado e OAB).

CONTRARRAZÕES DE APELAÇÃO OU RAZÕES DO APELADO

a) endereçamento: para Tribunal ou Turmas Recursais (se for infração de menor potencial
ofensivo)

Tribunal de Justiça do Estado... (se da competência da Justiça Estadual); Tribunal Regional


Federal (se da competência da Justiça Federal). Turmas Recursais (se for infração de menor
potencial ofensivo);

b) identificação: apelante, apelado, nº processo;

c) saudação:

Justiça Estadual: Egrégio Tribunal de Justiça – Colenda Câmara

Justiça Federal: Egrégio Tribunal Regional Federal – Colenda Turma

d) corpo da peça (I. Dos fatos: breve relato; II. DO DIREITO: preliminares, mérito e teses
subsidiárias);

e) pedido: não conhecimento + improvimento e manutenção da decisão;

f) parte final: termos em que pede deferimento, local, data, advogado e OAB.

415
Petição de juntada:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DA


COMARCA DE... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DE... (se crime da competência da Justiça Federal)

Processo nº...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência, oferecer20 as presentes CONTRARRAZÕES DE APELAÇÃO, com base no
artigo 600 do Código de Processo Penal, requerendo sejam recebidas, com posterior
remessa dos autos ao Tribunal de Justiça do Estado... (ou Tribunal Regional Federal).
As presentes contrarrazões de apelação são tempestivas, já que oferecidas
no prazo de 8 dias, conforme previsto no artigo 600 do Código de Processo Penal.

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...

Advogado...
OAB...

20
Também é correto usar a expressão “apresentar”

416
Contrarrazões de apelação ou razões do apelado:
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO... (se da competência da Justiça
Estadual); ou
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA... REGIÃO (se da competência da Justiça
Federal).

Apelante: Ministério Público


Apelado: Fulano de Tal

Processo nº

CONTRARRAZÕES DE APELAÇÃO

Egrégio Tribunal de Justiça do Estado...ou Egrégio Tribunal Regional Federal


Colenda Câmara Criminal (Justiça Estadual) ou Colenda Turma (Justiça Federal)

I) DOS FATOS
II) DO DIREITO
III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer NÃO SEJA CONHECIDO o recurso e, no
mérito, seja IMPROVIDO o recurso de apelação interposto, MANTENDO-SE, por
conseguinte, a decisão recorrida nos seus exatos termos.

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...

Advogado...
OAB...

417
Observações:
• Atenção: as contrarrazões de recurso de apelação também são compostas de petição de
juntada e de razões para manutenção da decisão;
• Fazer breve relato dos fatos ocorridos, conforme os dados do enunciado (não inventar nada),
bem como da decisão recorrida;
• Pode-se dividir em preliminares e mérito. Em preliminar, buscar, invariavelmente, informações
no enunciado para desenvolver tese para o não conhecimento do recurso (exemplo:
intempestividade do recurso interposto). No mérito, buscar informações para desenvolver teses
voltadas a Expor argumentos contrários aos invocados nas razões de apelação (informados no
enunciado da questão), defendo, em síntese, a manutenção da decisão recorrida;
• Requerer o não conhecimento, improvimento do recurso de apelação e a manutenção da
decisão recorrida.

418
Do Procedimento do Tribunal do Júri – 1ª Fase

Aula prevista para ocorrer no dia 03 e 04/04/2023.

Procedimento da primeira fase – Sumário da Culpa (judicium accusationis)


artigos 406 ao 421, todos do Código de Processo Penal

26.1 Do procedimento do tribunal do júri

É rito procedimento destinado para processor e julgar crimes dolosos contra a vida,
previsto nos artigos 406 a 497, todos do Código de Processo Penal. A competência constitucional
está firmada no artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal/88.

Nos termos do artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea “d”, da Constituição Federal/88, o
procedimento do Tribunal do Júri é o procedimento destinado a processor e julgar crimes dolosos
contra a vida, que são, segundo o artigo 74, § 1º, e artigo 394, §3º, ambos do Código de Processo
Penal:

a) Homicídio (art. 121, CP)


b) Induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio (art. 122, CP)
c) Infanticídio (art. 123, CP)
Aborto (art. 124 a 128, CP

DICA: Não é de competência do Júri o julgamento de crimes culposos contra a vida.

DICA: Latrocínio, “roubo seguido de morte”, é crime contra o patrimônio, portanto, não é de
competência de julgamento do Júri.

419
O rito procedimental para os processos de competência do Júri comporta duas fases: a
primeira fase inicia-se com o oferecimento da denúncia e se encerra com a decisão de pronúncia
(judicium accusationis ou sumário de culpa); já a segunda tem início com o recebimento dos
autos pelo juiz presidente do tribunal do júri, e termina com o julgamento pelo Tribunal do Júri
(judicium causae).

26.1.1 Recebimento da denúncia: art. 406, CPP

O Juiz, ao receber a denúncia, abre prazo para a defesa responder, no prazo de 10 (dez)
dias. A defesa poderá arguir preliminares e alegar tudo que interesse à sua defesa, oferecer
documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, até o
máximo de 8 (oito), qualificando-as e

Lembre-se: A base legal da Resposta à Acusação no procedimento do Júri é o artigo 406 do


Código de Processo Penal e não o artigo 396 do Código de Processo Penal.

26.1.2 Indispensabilidade da Resposta à Acusação: art. 408, CPP

Não apresentada a resposta no prazo legal, o juiz nomeará defensor para oferecê-la em
até 10 (dez) dias, concedendo-lhe vista dos autos.

26.1.3 Contraditório: Específico do Procedimento do Júri: art. 409, CPP

Apresentada a defesa, o juiz ouvirá o Ministério Público ou o querelante sobre preliminares


e documentos, em 5 (cinco) dias.

26.1.4 Providências judiciais: art. 410, CPP

Recebida a defesa prévia e, eventualmente, a manifestação do órgão acusatório acerca


de preliminares que tenham sido levantadas ou documentos juntados, deve o magistrado
deliberar a respeito do encaminhamento a ser dado o processo.

Em seguida, determinará as diligências cabíveis (produção de prova pericial,


reconstituição do crime, entre outros). O mais relevante será designar a audiência de instrução
e julgamento, uma vez que as partes, quase sempre, arrolam testemunhas.

420
Observe que não há previsão expressa de absolvição sumária antes da audiência de
instrução e julgamento, visto que neste procedimento a possibilidade de absolvição sumária está
prevista como uma das decisões que encerram a primeira fase do Júri. Logo, há discussão
doutrinária a respeito do cabimento, existindo dois posicionamentos:

a) É possível a aplicação da absolvição sumária para evitar a audiência de instrução,


aplicando subsidiariamente o artigo 397 do Código de Processo Penal21, por força do parágrafo
4º do artigo 394 do Código de Processo Penal;

b) Não é possível, pois somente se utilizam as regras do procedimento comum ordinário


de forma subsidiária. No caso, há previsão expressa de aplicação do instituto para evitar o
Plenário. Dessa forma, já se manifestou o STJ.

Inobstante os posicionamentos acima, é importante verificar nos enunciados as


informações constantes, pois somente será o caso de pedir em eventual Resposta à
Acusação que seja o acusado Absolvido Sumariamente, nos termos do artigo 397 do
Código de Processo Penal, aplicando-se subsidiariamente a regra do procedimento
comum ordinário (Art. 394, §4º, do CPP), se houver indicação de causa manifesta que
permita um juízo de certeza, antes mesmo da audiência de instrução, do contrário,
seguiremos as regras expressas para o Procedimento Especial do Júri.

26.1.5 Instrução concentrada: art. 411, CPP

O juiz determinará a inquirição das testemunhas e a realização das diligências requeridas


pelas partes, no prazo máximo de 10 (dez) dias. Os esclarecimentos dos peritos dependerão de
prévio requerimento e de deferimento pelo juiz. Todas as provas serão produzidas em uma só
audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias.

Nenhum ato será adiado, salvo quando imprescindível à prova faltante, determinando o
juiz a condução coercitiva de quem deva comparecer. A audiência terá a seguinte ordem: 1°)

Nesse sentindo: Nestor Tavora e Rosmar Alencar sustentam: “Entendemos possível a antecipação da absolvição
21

sumária para momento anterior à audiência de instrução, com esteio no artigo 397 do CPP, aplicado
analogicamente com base no artigo 2º do mesmo Código.” in: Curso de Direito Processual Penal. Editora
JusPodivm. 2017. P. 1235.

421
declarações do ofendido, se possível; 2°) declarações de testemunhas; 3°) interrogatório do
acusado; 4°) debates; 5°) decisão.

As alegações escritas foram substituídas por debates orais, concedendo-se a palavra,


respectivamente, à acusação e à defesa, pelo prazo de 20 minutos, prorrogáveis por mais 10;
havendo mais de um acusado, o tempo previsto para a acusação e a defesa de cada um deles
será individual; ao assistente do Ministério Público, após a manifestação deste, serão concedidos
10 minutos, prorrogando-se por igual período o tempo de manifestação da defesa.

Lembre-se: É possível converter as alegações orais por Memoriais, no prazo de 5 dias,


utilizando-se da regra contida no artigo 394, §5°, do Código de Processo Penal, ou seja das
disposições do procedimento comum ordinário (Arts. 403, §3º e 404, parágrafo único,
ambos do CPP).

26.1.6 Fase de apreciação da admissibilidade da acusação

O procedimento da primeira fase, de acordo com o artigo 412 do Código de Processo


Penal, terá duração de 90 (noventa) dias.

Finda a instrução do processo relacionado ao Tribunal do Júri, cuidando de crimes dolosos


contra a vida e infrações conexas, o magistrado possui quatro opções:

a) pronunciar o réu;

b) impronunciá-lo;

c) absolvê-lo sumariamente;

d) desclassificar a infração penal.

26.1.7 Pronúncia: art. 413, CPP

É decisão interlocutória mista não terminativa, que julga admissível a acusação,


remetendo o caso à apreciação do Tribunal do Júri.

Na pronúncia, há um mero juízo de prelibação, pelo qual o juiz admite ou rejeita a


acusação, sem penetrar no exame do mérito. No caso de o juiz se convencer da existência do

422
crime e de indícios suficientes da autoria, deve proferir sentença de pronúncia, fundamentando
os motivos de seu convencimento.

Observe que a decisão de pronúncia atualmente possui uma função bem determina em
lei, pois o artigo 476 do Código de Processo Penal diz que a acusação está atrelada aos limites
da denúncia ou de eventuais decisões de recursos que a tenham confirmado.

26.1.8 Impronúncia: art. 414, CPP

É a decisão interlocutória mista de conteúdo terminativo, visto que encerra a primeira fase,
deixando de inaugurar a segunda, sem haver juízo de mérito. Assim, inexistindo prova da
materialidade do fato ou não havendo indícios suficientes de autoria, deve o magistrado
impronunciar o réu, que significa julgar improcedente a denúncia e não a pretensão punitiva do
Estado.

IMPORTANTE: Recurso de Apelação


Art. 416 do CPP: Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária caberá
apelação.

26.1.9 Absolvição sumária: art. 415, CPP

Ocorrerá quando estiver provada a inexistência do fato, provado não ser o réu autor ou
partícipe do fato, o fato não constituir infração penal ou estiver demonstrada causa de isenção
de pena ou de exclusão do crime.

No caso de inimputáveis, com base no art. 26 do CP, o Juiz somente poderá absolver
sumariamente COM BASE NESTE ARGUMENTO, se a inimputabilidade for a única tese
defensiva. Por exemplo, se a defesa sustentar a negativa de autoria e a inimputabilidade em
razão de doença mental, não poderá o magistrado absolvê-lo sumariamente em razão da
inimputabilidade, pois neste caso resultaria na aplicação de medida de segurança. Portanto, se
o juiz não acolher a negativa de autoria deverá pronunciar, assim os jurados na segunda fase
julgariam o caso, podendo escolher qualquer das teses, inclusive a negativa de autoria e absolvê-
lo genuinamente, sem aplicar qualquer sanção penal.

423
26.1.10 Desclassificação: art. 419, CPP

O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da constante da acusação, embora o
acusado fique sujeito a pena mais grave. Quando o juiz se convencer, em discordância com a
acusação, da existência de crime não doloso contra a vida e não for competente para o
julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja, ficando à disposição deste o acusado preso.

26.1.11 Emendatio libelli: art. 418, CPP

O Juiz não está adstrito à classificação feita pelo órgão do Ministério Público e o réu não
se defende da definição jurídica do fato, mas, sim, dos fatos imputados.

Logo, se, no momento de pronunciar, verificar o magistrado que não se trata de


infanticídio, mas de homicídio, desde que todas as circunstâncias estejam bem descritas na
denúncia, pode pronunciar, alterando a classificação, ainda que o réu fique sujeito a pena mais
grave.

26.1.12 Intimação da decisão de pronúncia: art. 420, CPP

O acusado será intimado pessoalmente, esteja preso ou solto.

O defensor nomeado (dativo ou defensor público) e o Ministério Público (Art. 420, inciso I,
do CPP). Quanto ao defensor constituído, ao querelante (por seu advogado) e ao assistente do
Ministério Público (também é o advogado contratado pelo ofendido), pode-se fazer a intimação
pela imprensa. Por fim, se o acusado estiver solto e não for localizado para a intimação, far-se-
á por edital.

424
26.2 Resposta à acusação

26.2.1 Identificação
PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica: Peça:


“Citação” Resposta à acusação

PAROU!
26.2.2 Base legal

Art. 406, CPP

26.2.3 Prazo

10 dias

26.2.4 Conteúdo
Nos termos do artigo 406, § 3º, do Código de Processo Penal, na resposta, o acusado
poderá arguir preliminares e alegar tudo que interesse a sua defesa, oferecer documentos e
justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito),
qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário.
Em síntese, além de eventuais nulidades, deve-se buscar no enunciado informações
relacionadas a causas evidentes de exclusão de ilicitude, tipicidade e culpabilidade, salvo a
inimputabilidade por doença mental.

26.2.5 Pedido
No procedimento do júri, não há previsão legal de absolvição sumária logo após o
oferecimento da resposta à acusação. Neste procedimento, a possibilidade de absolvição
sumária está prevista após o encerramento da instrução, nos termos do artigo 415 do Código de
Processo Penal.

425
Todavia, sugere-se, para esse caso excepcional, adotar, por analogia, o artigo 397
do Código de Processo Penal. É o entendimento de Gustavo Badaró, segundo o qual “Embora
o procedimento especial dos crimes dolosos contra a vida haja a previsão de uma ‘absolvição
sumária’ ao término do juízo da acusação (Art. 415 do CPP), isso não impede de que seja
aplicado o artigo 397 do Código do Processo Penal, sendo possível ao juiz, logo após o
oferecimento da resposta, absolver sumariamente o acusado. Aliás, o § 4º do artigo 394 do
Código de Processo Penal prevê que “as disposições dos artigos 395 a 398 deste Código
aplicam-se a todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não regulados neste
Código". Aplica-se, pois, o art. 397 ao procedimento dos crimes dolosos contra a vida”.22

22
BADARÓ, Gustavo Henrique. Processo Penal. 3ª ed. São Paulo: RT. 2015, p. 656.

426
Estruturação

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DO


TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DA
JUSTIÇA FEDERAL DO TRIBUNAL DO JÚRI DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE... (se crime da
competência da Justiça Federal)

Processo nº ...

FULANO DE TAL, nacionalidade..., estado civil..., profissão..., RG nº...,


endereço eletrônico..., residente e domiciliado ..., por seu procurador infra-assinado, com
procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência apresentar,
dentro do prazo de 10 dias, previsto no artigo 406 do Código de Processo Penal RESPOSTA
À ACUSAÇÃO, com base no artigo 406 do Código de Processo Penal pelos fatos e
fundamentos jurídicos a seguir expostos:

I) DA TEMPESTIVIDADE
A presente peça é tempestiva, uma vez que apresentada dentro do
prazo de 10 dias, na forma do artigo 406 do Código de Processo Penal.

I) DOS FATOS23

II) DO DIREITO24
a) Das preliminares
b) Do mérito

23
Fazer um breve relato dos fatos. Não inventar dados. Relatar como ocorreu a prisão.
24
Buscar no enunciado informações que permitam desenvolver teses voltadas à ilegalidade formal e/ou material.

427
III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer o denunciado:
a) Seja rejeitada a denúncia;
b) Nulidades (referir todas as nulidades enfrentadas na peça);
c) Absolvição, com base no artigo 397 e inciso correspondente (por analogia);
d) A produção de provas, com designação de audiência de instrução e julgamento e oitiva
das testemunhas arroladas.

ROL DE TESTEMUNHAS
A) Fulano de tal...
B) Fulano de tal...

Local..., data...

ADVOGADO...
OAB...

428
26.3 Memoriais ou alegações finais por memoriais
26.3.1 Considerações iniciais

Embora não tenha previsão na lei, admite-se, no procedimento do júri, a substituição dos
debates orais em memoriais escritos, por analogia aos artigos 403, § 3º e 404, ambos do Código
de Processo Penal. Aliás, foi o que ocorreu na peça da OAB 2010-01 e no XXXII Exame.

Em relação à base legal propriamente dita, na peça profissional do Exame XXXII, em


2021, foi permitida a indicação como fundamento legal dos memoriais propostos o artigo 403, §
3º ou o 404, ambos do Código de Processo Penal.

26.3.2 Base legal

Art. 403, § 3º, CPP ou Art. 404, parágrafo único, CPP

26.3.3. Prazo

5 dias

26.3.4. Identificação
Os memoriais são oferecidos após a instrução e antes da decisão de impronúncia,
absolvição sumária ou desclassificação.

PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica: Peça:


“encerrada a instrução”
MEMORIAIS

PAROU!

429
26.3.5. Conteúdo
Assim como nas demais peças, deve-se buscar no enunciado preliminares e mérito.

Preliminar

Como já referido, as questões preliminares são aquelas que não observam aspectos
formais de determinado ato processual, gerando, invariavelmente, nulidade.

Aqui, por questão de organização, recomenda-se que as causas extintivas de


punibilidade, notadamente prescrição, sejam abordadas no campo destinado às preliminares.

Mérito

Finda a instrução do processo relacionado ao Tribunal do Júri, cuidando de crimes dolosos


contra a vida e infrações conexas, o magistrado poderá proferir decisão de:

a) Pronúncia
b) Impronúncia
c) Absolvição sumária
d) Desclassificação

Conforme abordado, nas peças práticas profissionais deverá ser desenvolvida uma tese
que, ao final, viabilizará o correspondente pedido. Ou seja, somente se aborda na peça aquilo
que, ao final, poderá ser objeto de pedido.

No caso dos memoriais escritos do procedimento do júri, as teses de mérito guardam


relação com as hipóteses que podem ensejar decisão de: a) impronúncia (Art. 414 do CPP); b)
absolvição sumária (Art. 415 do CPP); c) ou desclassificação (Art. 419 do CPP).

Para melhor visualização do conteúdo dos memoriais do júri, convém destacar as


hipóteses de decisões que podem ser proferidas nesta primeira fase do procedimento do Tribunal
do Júri:

• Pronúncia: art. 413, CPP


É decisão interlocutória mista não terminativa, que julga admissível a acusação,
remetendo o caso à apreciação do Tribunal do Júri.

430
Na pronúncia, há um mero juízo de admissibilidade, pelo qual o juiz admite ou rejeita a
acusação, sem penetrar no exame do mérito. No caso de o juiz se convencer da existência do
crime e de indícios suficientes da autoria, deve proferir sentença de pronúncia, fundamentando
os motivos de seu convencimento.

Assim, nos termos do artigo 413, § 1º, do Código de Processo Penal, a decisão de
pronúncia deve se limitar à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios
suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar
incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento
depena.

Se o Magistrado se aprofundar na análise do mérito, extrapolando na linguagem,


enfatizando, por exemplo, ser o réu efetivo autor do delito ou que não agiu sob o amparo de
excludente de crime, caracteriza-se o que se denomina eloquência acusatória, gerando nulidade
da decisão de pronúncia.

• Impronúncia: art. 414, CPP


É a decisão interlocutória mista de conteúdo terminativo, visto que encerra a primeira fase,
deixando de inaugurar a segunda, sem haver juízo de mérito. Assim, inexistindo prova da
materialidade do fato ou não havendo indícios suficientes de autoria, deve o magistrado
impronunciar o réu, que significa julgar improcedente a denúncia e não a pretensão punitiva do
Estado.

• Absolvição sumária: art. 415, CPP


A absolvição sumária ocorrerá quando estiver provada a inexistência do fato, provado não
ser o réu autor ou partícipe do fato, o fato não constituir infração penal ou estiver demonstrada
causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. No caso de inimputáveis, a absolvição
sumária só é possível, agora por disposição expressa, se a inimputabilidade for a única tese
defensiva.

Nos termos do artigo 415 do Código de Processo Penal, o juiz absolverá, desde logo
(sumariamente, portanto), o acusado quando:

431
Provada não ser ele o Prova indiscutível de que o réu
não cometeu ou participou de
autor ou partícipe do fato sua execução

Provada a inexistência Prova cabal de que os fatos


narrados na inicial acusatória
do fato não aconteceram

O fato não constituir Fato atípico


infração penal

Demonstrada causa de
Vide notas de excludentes de
isenção de pena ou de ilicitude e culpabilidade
exclusão do crime

De acordo com o parágrafo único do artigo 415 do Código de Processo Penal, “não se
aplica o disposto no inciso IV do caput do art. 26 do CP, salvo quando esta for a única tese
defensiva”.

Dessa forma, ainda que a inimputabilidade se encontre comprovada por exame de


insanidade mental, o Código de Processo Penal faz restrições à absolvição imprópria do agente,
pois esta implicará na imposição de medida de segurança, o que poderá ser prejudicial ao réu,
uma vez que não lhe será viabilizado demonstrar em plenário do Júri, outras teses defensivas
em favor da sua inocência, sem a imposição de qualquer medida restritiva.

Assim, havendo outra tese defensiva e não sendo caso de absolvição sumária por outro
fundamento, o Magistrado deverá pronunciar o réu, para que seja submetido a julgamento pelo
plenário do Júri. Agora, se, por conta dessa outra tese, ficar evidenciada hipótese de absolvição
sumária, que não a inimputabilidade, o juiz deverá absolver o réu sumariamente, sem imposição
de medida de segurança (absolvição própria).

De outro lado, se a inimputabilidade for a única tese da defesa, admite-se a absolvição


sumária imprópria, com a imposição de medida de segurança.

No caso de não haver convencimento por parte do magistrado acerca da autoria, ainda
que o acusado seja inimputável, deverá ser impronunciado, pois a medida de segurança só

432
poderá ser imposta se ficar provada a prática de um fato típico e ilícito. Desta forma, melhor
alternativa ao acusado seria a impronúncia.

IMPORTANTE

Não confundir a absolvição sumária prevista no Art. 397 do CPP (que decorre da resposta
à acusação), com a absolvição sumária do Art. 415 do CPP, aplicável somente ao
Procedimento do Júri.

• Desclassificação: art.419, CPP


Nos termos do artigo 419 do Código de Processo Penal, quando o juiz se convencer, em
discordância com o que consta na peça acusatória, da existência de crime não doloso contra a
vida e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja, ficando à
disposição deste o acusado preso.

Exemplo: o agente ser denunciado por crime de homicídio doloso e, ao final, constatar-se
que agiu sem a intenção de matar, passando a ser, em tese, homicídio culposo.

26.3.6. Pedido
No campo destinado aos pedidos, deve-se formular pedido específico para cada uma das
teses desenvolvidas ao longo da peça.

Exemplo: Se sustentou alguma preliminar, nulidade, por exemplo, deve-se, ao final,


formular pedido expresso no sentido de que seja declarada a nulidade.

No que tange ao mérito, o pedido deve guardar relação com a(s) tese(s) invocadas:

a) Impronúncia, com base no artigo 414 do Código de Processo Penal; e/ou


b) Absolvição sumária, com base no artigo 415 do Código de Processo Penal; e/ou
c) Desclassificação, com base no artigo 419 do Código de Processo Penal.

o procedimento do júri, as teses e pedidos subsidiários guardam relação,


invariavelmente, com o afastamento da qualificadora ou causa de aumento de pena.

433
434
Estruturação
A) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ... VARA CRIMINAL
DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA... (se crime da competência da Justiça
Estadual)
B) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ... VARA CRIMINAL
DA JUSTIÇA FEDERAL DO TRIBUNAL DO JÚRI DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE... (se
crime da competência da Justiça Federal)

Processo nº ...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência apresentar, dentro do prazo de 5 dias, previsto no artigo 403, § 3º, do Código
de Processo Penal, MEMORIAIS, com base no artigo 403, §3º, parágrafo único do
Código de Processo Penal, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos:

I) DA TEMPESTIVIDADE
A presente peça é tempestiva, uma vez que apresentada dentro do prazo
de 5 dias, na forma do artigo 403, § 3º, do Código de Processo Penal.

II) DOS FATOS25


III) DO DIREITO
A) DAS PRELIMINARES
B) DO MÉRITO
* Impronúncia: ausência de prova da materialidade e não restar provada a autoria (Art.
414 do CPP);
* Absolvição sumária (Art. 415 do CPP)
* Desclassificação: fato imputado não constitui crime doloso contra a vida (Art. 419 do
CPP)
C) SUBSIDIARIAMENTE26

25
Narrar o fato, fazendo um breve relato. Não inventar dados nem simplesmente transcrever o enunciado. Abordar
a tempestividade
26
Afastar qualificadora ou causa de aumento de pena.

435
VI) DO PEDIDO27

a) Preliminares (nulidades, prescrição, etc – acompanhar a ordem das preliminares);


b) Impronúncia, com base no artigo 414 do Código de Processo Penal;
c) Absolvição sumária, com base no artigo 415 do Código de Processo Penal;
d) Desclassificação, com base no artigo 419 do Código de Processo Penal;
e) Afastar qualificadora ou causa de aumento de pena.

Nestes termos,
Pede deferimento.
Local..., data...28
ADVOGADO...
OAB...

Obs: conforme o enunciado da peça ou da questão, os pedidos podem ser alternativos


28
A FGV pode pedir para que seja apontado o último dia do prazo.

436
Recurso em sentido estrito29

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 05/04/2023.

27.1 Introdução

É o recurso cabível contra decisões interlocutórias, quando se tratar de uma das hipóteses
expressamente prevista em lei (arts. 581 a 592).

O cabimento do recurso em sentido estrito prevê rol taxativo, ou seja, contra as decisões
expressamente previstas no artigo 581 do CPP, podendo, eventualmente, ser adotada
interpretação extensiva, para alcançar hipótese que não desborde sobremaneira da natureza da
decisão recorrida, como, por exemplo, recurso em sentido estrito contra decisão rejeitou o
aditamento da denúncia ou queixa.

Convém registrar que algumas decisões que constam no rol do artigo 581 não comportam
mais recurso em sentido estrito, passando a ser cabível agravo em execução:

a) concessão, negativa ou revogação da suspensão condicional da pena (inc. XI),


lembrando que, quando a concessão ou negativa se der na sentença condenatória, cabe
apelação;
Não cabe RESE

b) concessão, negativa ou revogação do livramento condicional (XII);

c) decisão sobre unificação de penas (XVII);

d) Decisões relativas a medidas de segurança (XIX, XX, XXI, XXII e XXIII);

e) Conversão da multa em detenção ou em prisão simples (art. 581, XXIV).

A hipótese de conversão deixou de subsistir após a Lei 9.268/96, que modificou o art. 51
do CP.

29
Estruturaremos a peça recurso em sentido estrito levando em conta a decisão de pronúncia, uma vez que em
todas as vezes que caiu RESE foi contra decisão de pronúncia.

437
27.2 Hipóteses de cabimento

I) Da sentença que não receber/rejeitar a denúncia ou queixa:

Cabe recurso em sentido da decisão que rejeitar a denúncia ou queixa, por conta da
incidência de uma das hipóteses do artigo 395 do CPP.

De regra, do recebimento da denúncia não cabe qualquer recurso, apenas impetração de


Habeas corpus, ante a absoluta falta de previsão legal.

DICA MISSIONEIRA

No caso das infrações penais de competência do juizado especial criminal, não cabe
recurso em sentido estrito da decisão que rejeitar a denúncia ou queixa, mas apelação, com
prazo de 10 dias (art. 82, caput, da Lei 9.099/95).

O STF firmou entendimento, por meio da Súmula 707, no sentido de que: “Constitui
nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto
da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo”.

II) Da decisão que concluir pela incompetência do juízo:

É o caso do reconhecimento ex officio da incompetência pelo próprio juiz, que determina


a remessa dos autos ao juízo competente, nos termos do art. 109 do CPP. Se o juiz se dá por
incompetente, acolhendo exceção (caso de incompetência relativa), aplica-se o inciso III do artigo
581.

No procedimento do júri, da decisão de desclassificação do fato para crime não doloso


contra a vida (art. 419 do CPP), cabe recurso em sentido estrito com base neste inciso, pois o
juiz estará, em última análise, concluindo pela incompetência do Tribunal do Júri para julgar a
causa.

Da decisão do juiz dando-se por competente não cabe qualquer recurso, podendo a parte
prejudicada intentar apenas habeas corpus.

III) Da decisão que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição:

Recurso voltado para a acusação.

438
O art. 95 do CPP enumera as cinco exceções oponíveis, a saber: suspeição,
incompetência do juízo, litispendência, ilegitimidade de parte e coisa julgada.

Note-se que o cabimento do recurso em sentido estrito está restrito à decisão que acolher
a exceção oposta pelo réu, ou seja, julgar procedente a exceção. Se rejeitada a exceção, a
decisão é irrecorrível, podendo ensejar eventual HC.

Acolhida ou rejeitada a exceção de suspeição, não cabe qualquer recurso, pois não se
pode forçar o juiz que se considera suspeito a julgar a causa.

IV) Da decisão que pronunciar:

A decisão de pronúncia trata-se de uma decisão interlocutória mista não terminativa, que
encerra uma fase do procedimento, sem julgar o mérito, isto é, sem declarar o réu culpado.

Como, em relação à peça, a probabilidade de cair recurso em sentido estrito contra


decisão de pronúncia é maior, estudaremos essa hipótese em apartado.

A decisão de impronúncia, com a edição da Lei 11.689/2008, passou a comportar o


recurso de apelação (art. 416).

V) Da decisão que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança,


indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder liberdade
provisória ou relaxar a prisão em flagrante:

Nessa parte, a lei prevê tanto situação favorável ao réu, quanto desfavorável. Assim,
concedida a fiança ou fixado um valor muito baixo, pode o MP recorrer. Negada, cassada ou
considerada inidônea, cabe ao acusado apresentar o seu inconformismo.

Por outro lado, quando o juiz conceder liberdade provisória, cabe ao MP interpor o RESE.
Se não conceder a liberdade provisória, não cabe RESE, por ausência de previsão legal,
devendo o acusado impetrar habeas corpus contra a decisão que negou o requerimento de
liberdade provisória.

Finalmente, quando a prisão, por ser ilegal, mereça ser relaxada, caso o juiz o faça,
proporciona ao MP a interposição de recurso em sentido estrito. Quando houver a negativa ao
relaxamento, pode-se impetrar habeas corpus.

VI) Absolvição sumária (REVOGADO):

439
Essa decisão era impugnada por recurso em sentido estrito. Com a edição da Lei
11.689/2008, o recurso cabível passou a ser apelação.

VII) Da decisão que julgar quebrada a fiança ou perdido o seu valor:

São situações desfavoráveis ao réu, sendo-lhe permitido o recurso em sentido estrito,


porque, realmente, são decisões interlocutórias, merecedoras do duplo grau de jurisdição.

Entretanto, quando houver o quebramento, implicando a obrigação de se recolher à


prisão, poder dar ensejo à impetração de HC.

VIII) Da decisão que decreta a prescrição ou julga, por outro modo, extinta a
punibilidade do acusado:

Trata-se de sentença terminativa de mérito, isto é, que encerra o processo com julgamento
do mérito, sem absolver ou condenar o réu.

Cabe recurso em sentido estrito contra a decisão terminativa que, no processo de


conhecimento, declara extinta a punibilidade do acusado.

O recurso em sentido estrito relativo a este inciso tem aplicação residual, ou seja,
somente é cabível nos casos em que a extinção da punibilidade não tenha ocorrido no
corpo da sentença ou no âmbito da Vara de Execuções Criminais.

Com efeito, se ocorrer a extinção da punibilidade no corpo da sentença penal, o recurso


cabível será o de apelação, conforme dispõe o art. 593, § 4º, CPP. Exemplo: imagine que o réu
esteja sendo processado por dois delitos. O Juiz absolve o réu pela prática de um deles e declara
a prescrição em relação ao outro. Nesse caso, o recurso do MP ou assistente à acusação (na
inércia do MP) será o de apelação, com base no artigo 593, I, do CPP, inclusive em relação à
decisão que decretou a prescrição. É o que se extrai do artigo 593, § 4º, do CPP

Quando a decisão for proferida na fase de execução criminal, o recurso cabível será o
agravo em execução, previsto no art. 197 da LEP (Lei 7.210/84).

Assim, somente cabe recurso em sentido estrito quando a decisão de extinção da


punibilidade for proferida fora do âmbito da sentença penal e da execução criminal. Exemplo:
Extinção da punibilidade no curso do processo em face da prescrição do crime (art. 107, inciso
IV, do CP).

440
Salienta-se que essa legitimidade é supletiva, ou seja, o assistente somente poderá
recorrer se o Ministério Público não interpuser recurso (art. 584, § 1º, do CPP).

* Absolvição sumária pela extinção da punibilidade (art. 397, inciso IV, do CPP):

Diante da previsão legal atípica no sentido de considerar a possibilidade de sentença


absolutória na hipótese de causa extintiva da punibilidade, parte da doutrina passou a aventar a
possibilidade de interposição do recurso de apelação contra tal decisão.

Assim, diante do paradoxo criado pelo legislador, o entendimento doutrinário prevalente é


no sentido de que o juiz deverá, simplesmente, declarar a causa extintiva de punibilidade,
independentemente do veredicto absolutório, ou seja, declara a causa extintiva de punibilidade
e simplesmente absolve o réu, com base no artigo 397, inciso IV, do CPP, cabendo, contra essa
decisão, recurso em sentido estrito.

IX) Da decisão que indeferir pedido de extinção de punibilidade:

É a contraposição do inciso anterior. Negada a extinção da punibilidade, o processo


seguirá seu curso normal. Trata-se, portanto, de decisão interlocutória simples. Diante da
previsão expressa da lei, caberá recurso em sentido estrito.

Da mesma forma do inciso anterior, o recurso em sentido estrito contra decisão que
indeferir pedido de extinção de punibilidade somente poderá ser manejado de forma residual, ou
seja, quando a decisão não ocorrer na própria sentença condenatória (cabendo apelação) ou em
sede de execução criminal (quando será cabível agravo em execução).

Convém ressaltar que o Código de Processo Penal, especificamente no artigo 648, inciso
VII, prevê a possibilidade de impetração de habeas corpus quando incidente causa de extinção
da punibilidade. Nesse sentido, a regra deverá ser o uso do RSE, uma vez que o habeas corpus
não deve ser usado como sucedâneo de recurso.

Todavia, em caso de evidente constrangimento ilegal, na qual o reconhecimento da causa


extintiva de punibilidade não reclama aprofundamento da prova, afigura-se possível – e na
prática é a providência mais comum – a adoção do habeas corpus.

X) Da decisão que conceder ou negar a ordem de habeas corpus:

O dispositivo refere-se à decisão do juiz de primeira instância, da qual, na hipótese de


concessão, cabe também recurso ex officio (art. 574, I).

441
No caso de decisão denegatória proferida em única ou última instância, pelos Tribunais
Regionais Federais e pelos tribunais dos Estados, caberá recurso ordinário para o STJ (art. 105,
II, “a”, CF).

Se a decisão denegatória for proferida em única instância (somente em única instância)


pelos tribunais superiores, caberá recurso ordinário ao STF (art. 102, II, “a”).

XI) Da decisão que conceder, negar ou revogar a suspensão condicional da pena:

Esse dispositivo tem aplicação prejudicada.

A decisão que não concede o sursis invariavelmente integra a própria sentença


condenatória, comportando, por isso, apelação, por conta do disposto no artigo 593, § 4º, do
CPP.

Após o trânsito em julgado da condenação, cabe agravo em execução (art. 197 da LEP).

XII) Da decisão que conceder, negar ou revogar livramento condicional


(REVOGADO):

Cabe agravo em execução, estando o dispositivo em questão revogado (art. 197 da LEP).

XIII) Da decisão que anular a instrução criminal no todo ou em parte:

Reconhecida essa hipótese, que é típica decisão interlocutória, cabe à parte inconformada
em ter que reiniciar a instrução ou reproduzir determinados atos, impugnar a decisão anulatória
pelo recurso em sentido estrito.

De outro lado, se condenado, nada impede que o interessado argua a nulidade em


preliminar de eventual recurso de apelação.

Por interpretação extensiva ao artigo 581, inciso XIII, do CPP, é cabível o recurso em
sentido estrito contra decisão que declarar ilícita a prova juntada aos autos.

XIV) Da decisão que incluir ou excluir jurado na lista geral:

Tendo em vista a imparcial formação da lista de jurados, o procedimento deve ser de


conhecimento geral, publicando-se o resultado final na imprensa e afixando-se no fórum. Logo,
é possível que qualquer pessoa questione a idoneidade de um jurado, incluído na lista (art. 426,
§ 1º).

442
Nesse caso, pode o juiz, acolhendo petição da parte interessada, excluí-lo da lista, o que
dá margem ao inconformismo daquele que foi extirpado. Por outro lado, a inclusão de alguém,
impugnada e mantida pelo magistrado, dá lugar à interposição de recurso em sentido estrito.
Nesse caso, em caráter excepcional, segue o recurso ao Presidente do TJ.

Excepcionalmente, em relação a essa decisão, o prazo para interpor o recurso é de 20


dias, devendo ser dirigido ao Presidente do Tribunal de Justiça.

XV) Da decisão que denegar a apelação ou julgá-la deserta:

No caso da apelação, o juízo de prelibação (admissibilidade) deve ser feito tanto na


primeira, quanto na instância superior. Assim, se entender não preenchido algum pressuposto
recursal objetivo ou subjetivo, o juiz de 1º grau pode deixar de receber a apelação (o que equivale
a denegá-lo),

Nessa hipótese, cabe recurso em sentido estrito contra o despacho denegatório da


apelação. Note-se que o recurso não se volta contra a sentença apelada, mas exclusivamente
contra o despacho que negou seguimento à apelação.

XVI) que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial:

As questões prejudiciais estão previstas nos artigos 92 e 93 do CPP.

Questão prejudicial é aquela que deve ser decidida antes do julgamento da questão
principal de forma definitiva, no mesmo ou em outro processo com ela relacionado.

Exemplo de prejudicialidade obrigatória: ação de anulação de casamento no crime de


bigamia. Deve-se primeiro definir a questão da anulação de um dos casamentos, para depois
resolver o mérito do delito de bigamia.

Exemplo de prejudiciais facultativa: a verificação do direito de propriedade nos crimes de


furto, estelionato; da posse, no de esbulho e invasão de domicílio, etc.

Se o juiz determinar a suspensão do processo para solução da questão prejudicial,


obrigatória ou facultativa, cabe recurso em sentido estrito.

XVII) que decidir o incidente de falsidade:

O incidente de falsidade está previsto no artigo 145 a 148 do CPP.

443
XVIII) que recusar homologação à proposta de acordo de não persecução penal,
previsto no art. 28-A desta Lei:

A Lei no 13.964/2019 incluiu mais uma hipótese de cabimento de recurso em sentido


estrito. Na hipótese de o juiz recusar o acordo de não persecução penal, porque não atendeu
aos requisitos legais ou quando não for realizada a adequação por parte do Ministério Público
(CPP, art. 28-A, § 7º), caberá à parte interessada interpor recurso em sentido estrito, com base
no art. 581, XXV, do CPP.

27.3 Prazo

Interposição Razões
5 dias 2 dias

O recurso em sentido se procede em dois momentos distintos, um para interposição


(fundamental para atestar a tempestividade) e outro para apresentação das razões. Ou seja, via
de regra, primeiro o recorrente interpõe o recurso, o juiz recebe e, após, determina a intimação
para oferecimento das razões (ressalta-se, contudo, que, para fins do exame de ordem, a peça
de interposição e as razões de recurso são apresentadas simultaneamente).

27.4 Legitimidade

Ministério Público

Querelante

Defesa

Próprio réu

Assistente de acusação

444
O Ministério Público, o querelante (ação penal privada), a defesa, o próprio réu e, ainda,
o assistente de acusação podem interpor recurso em sentido estrito.

Observação: Conforme dispõe o artigo art. 584, § 1º, c/c art. 581, VIII, do CPP, o assistente
de acusação poderá recorrer em sentido estrito somente da decisão que “decretar a prescrição
ou julgar, por outro modo, extinta a punibilidade”, já que tal decisão impede a formação de título
executivo para eventual reparação do dano.

O assistente de acusação pode ser habilitado nos autos, hipótese que, nessa condição,
será intimado de todos os atos e poderá recorrer, caso não o faça o Ministério Público, no prazo
de 05 dias.

No caso de assistente de acusação não habilitado, considerando que ainda não tinha
tomado ciência dos atos praticados no processo e, portanto, não foi intimado das decisões, terá
o prazo de 15 dias para interpor o recurso em sentido estrito (art. 584, §1º, c/c 598, parágrafo
único, do CPP).

A contagem do prazo para o assistente de acusação interpor recurso segue a regra


disposta na Súmula 448 do STF: “O prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa
a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público”.

27.5 Peça bipartida

A interposição do recurso deve ser dirigida ao juiz de primeiro grau que proferiu a
decisão, para que este possa rever a decisão, em sede de juízo de retratação.

As razões de recurso devem ser endereçadas ao Tribunal competente (Tribunal de


Justiça, se da competência da Justiça Comum Estadual; ou Tribunal Regional Federal, se da
competência da Justiça Federal).

445
Interposição: ao juízo de 1º grau Razões: ao tribunal competente

Crime doloso contra a vida da competência da Justiça


Estadual: Egrégio Tribunal de Justiça
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da ... Vara Colenda Câmara Criminal
do Tribunal do Júri da Comarca de...

Crime doloso contra a vida da competência da


Justiça Federal: Egrégio Tribunal Regional Federal
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal da ...
Vara da Justiça Federal do Tribunal do Júri da Colenda Turma
Secção Judiciária ...

Crime de competência da Justiça Estadual: Egrégio Tribunal de Justiça


Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da ...
Vara Criminal da Comarca de... Colenda Câmara Criminal

Crime de competência da Justiça Federal:


Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal da ... Egrégio Tribunal Regional Federal
Vara Criminal da Justiça Federal da Secção Colenda Turma
Judiciária de ...

27.6 Efeito regressivo (Juízo de retratação)

Na hipótese de manutenção da decisão recorrida, ou, ainda, se houver retratação e agora


a outra parte impugnar a nova decisão, o recurso passará a ter efeito devolutivo, devolvendo a
discussão de toda a matéria ao Tribunal Competente.

Além do efeito devolutivo, o RESE possui efeito regressivo, uma vez que a interposição
do recurso obriga o juiz que prolatou a decisão recorrida a reapreciar a questão, mantendo-a ou
reformando-a, conforme dispõe o artigo 589, caput, do CPP.

No tocante ao efeito regressivo do recurso: recebendo os autos, o juiz, dentro de dois dias,
reformará ou sustentará a sua decisão, mandando instruir o recurso com as cópias que lhe
parecerem necessárias. A falta de manifestação do juiz importa em nulidade, devendo o tribunal
devolver os autos para esta providência. O juízo de retratação será sempre fundamento. A
fundamentação deficiente do juiz também obriga o tribunal a convencer o julgamento em
diligência para esse fim.

446
Se o juiz mantiver o despacho, remeterá os autos à instância superior; se reformá-la, o
recorrido, por simples petição, e dentro do prazo do prazo de cinco dias, poderá requerer a subida
dos autos. O recorrido deverá ser intimado, no caso de retratação do juiz.

447
27.7 Estruturação: peça de interposição endereçada ao juízo de 1º grau
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE ... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DE... (se crime da competência da Justiça Federal)

Processo nº...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência, inconformado com a decisão de fls., interpor o presente RECURSO EM
SENTIDO ESTRITO, com base no artigo 581, (indicar o inciso), do Código de Processo
Penal.
Nesse sentido, requer seja recebido o recurso e procedido o juízo de
retratação, nos termos do artigo 589 do Código de Processo Penal. Se mantida a decisão,
requer seja encaminhado o presente recurso, já com as razões inclusas, ao Tribunal de
Justiça do Estado... ou Tribunal Regional Federal, para o devido processamento.
O presente recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 5 dias,
previsto no artigo 586 do Código de Processo Penal.

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...
Advogado...
OAB

448
Estruturação: peça de razões endereçada ao tribunal competente
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO... (se da competência da Justiça
Estadual); ou
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA... REGIÃO (se da competência da Justiça
Federal).

Recorrente: Fulano de Tal


Recorrido: Ministério Público

Processo nº

RAZÕES DE RECURSO EM SENTIDO ESTRITO


Egrégio Tribunal de Justiça do Estado...ou Egrégio Tribunal Regional Federal
Colenda Câmara Criminal (Justiça Estadual) ou Colenda Turma (Justiça Federal)
I) DOS FATOS
II) DO DIREITO
a) Das preliminares
b) Do mérito
c) Subsidiariedade

III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja CONHECIDO e PROVIDO o presente recurso, com a reforma
da decisão de 1º grau, para o fim de que:
a) seja reconhecida a prescrição, com extinção da punibilidade, nos termos do artigo 107,
IV, do Código Penal.
b) seja recebida a queixa-crime;

449
Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...
Advogado...
OAB...

Observações:
• Importantíssimo fazer referência ao juízo de retratação previsto no artigo 589, CPP;
• Cuidar quando o enunciado pedir o último dia do prazo recursal;
• Fazer breve relato dos fatos ocorridos, conforme os dados do enunciado (não inventar nada nem
simplesmente transcrever o enunciado);
• Conforme o enunciado da peça ou da questão, os pedidos podem ser cumulativos.

450
27.8 Recurso em sentido estrito contra decisão de pronúncia
27.8.1 Introdução
A decisão de pronúncia é aquela que encerra a primeira fase do procedimento do Tribunal
do Júri, aplicado em relação aos crimes dolosos contra a vida, previstos no artigo 74, § 1º, do
Código Penal, segundo o qual § 1º Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes
previstos nos arts. 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127, do Código
Penal, consumados ou tentados.
Nos termos do artigo 413 do Código de Processo Penal, o magistrado, ao se convencer
acerca da materialidade do delito e da existência de indícios suficientes de autoria ou de
participação, proferirá decisão de pronúncia, encaminhando o réu para ser submetido a
julgamento perante o Plenário do Júri.
Não é possível ao juiz aprofundar a análise do mérito, sob pena de nulidade da decisão,
devendo se limitar a simplesmente à indicação da materialidade do fato e da existência de
indícios suficientes de autoria ou de participação, declarando o dispositivo legal em que julgar
incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de
pena.
Vê-se, pois, que não há análise do mérito e muito menos sentença penal condenatória.
Por isso, não se afigura necessário elaborar teses subsidiárias voltadas, por exemplo, à
diminuição da pena, já que ainda não é o momento para o juiz fixar eventual pena ao réu.

27.8.2 Identificação
Se, ao final da primeira fase do procedimento do júri, o juiz proferir uma decisão de
pronúncia, contra essa decisão cabe recurso em sentido estrito.

PEDIU PRA PARAR

Peça:
Expressão mágica:
Recurso em sentido
“Decisão de pronúncia” estrito

PAROU!

451
Exemplos de como identificar a peça extraídos de recursos em sentido estrito já cobrados
pela FGV:

Peça XXXIV Exame: Após recebimento da denúncia, citação e apresentação de defesa, foi
designada audiência de instrução e julgamento, na primeira fase do procedimento do Tribunal
do Júri, para oitiva das testemunhas de acusação e defesa, além do interrogatório do réu. Os
policiais responsáveis pelas investigações e pela oitiva dos envolvidos, arrolados como
testemunhas pelo Ministério Público, informaram ao magistrado que se atrasariam para o ato
judicial, pois estavam em importante diligência. Não querendo fracionar a colheita da prova, o
magistrado determinou a oitiva das testemunhas de defesa antes das de acusação, apesar do
registro do inconformismo da defesa. Ao final, o réu foi interrogado. As provas colhidas indicaram
que a versão apresentada por Rodrigo ao seu advogado era totalmente verdadeira.
Considerando que foi constatado o desferimento do soco e do empurrão por parte de Rodrigo
em João, após manifestação das partes, o juiz pronunciou o acusado nos termos da
denúncia. Intimado, o Ministério Público se manteve inerte. Rodrigo e sua defesa técnica foram
intimados da decisão em 05 de abril de 2021, segunda-feira.

Peça XXXI Exame: “(...) De fato, foi marcada nova data para a realização do interrogatório,
ocasião em que Rômulo compareceu e permaneceu em silêncio. Após, as partes apresentaram
manifestação, reiterando, a defesa, o inconformismo com a realização da primeira audiência. Os
autos foram para conclusão, e foi proferida decisão pronunciando o réu nos termos da
denúncia. Pessoalmente intimado, o Ministério Público se manteve inerte. A defesa técnica e
Rômulo foram intimados em 10 de março de 2020, uma terça-feira.”

Peça XXVIII Exame: “(...) Com a juntada da documentação, de imediato, sem a adoção de
qualquer medida, o magistrado proferiu decisão de pronúncia nos termos da denúncia, sendo
publicada na mesma data, qual seja, 18 de junho de 2018, segunda-feira, ocasião em que as
partes foram intimadas.”

Peça XI Exame: “(...) Finda a instrução probatória, o juiz competente, em decisão devidamente
fundamentada, decidiu pronunciar Jerusa pelo crime apontado na inicial acusatória. O
advogado de Jerusa é intimado da referida decisão em 02 de agosto de 2013 (sexta-feira).”

452
27.8.3 Base legal
Se for recurso em sentido estrito contra uma decisão de pronúncia, a base legal será o
artigo 581, inciso IV, do Código de Processo Penal.

Art. 581, IV, CPP

27.8.4 Prazo

5 dias

O recurso em sentido se procede em dois momentos distintos, um para interposição


(fundamental para atestar a tempestividade) e outro para apresentação das razões. Ou seja, via
de regra, primeiro o recorrente interpõe o recurso, o juiz recebe e, após, determina a intimação
para oferecimento das razões (ressalta-se, contudo, que, para fins do exame de ordem, a peça
de interposição e as razões de recurso são apresentadas simultaneamente).

Em outras palavras, considerando que a defesa irá interpor o recurso já com as razões
inclusas, o prazo será de 05 (cinco) dias, conforme previsão do art. 586, CPP.

27.8.5 Efeito regressivo (Juízo de retratação)

Na hipótese de manutenção da decisão recorrida, ou, ainda, se houver retratação e agora


a outra parte impugnar a nova decisão, o recurso passará a ter efeito devolutivo, devolvendo a
discussão de toda a matéria ao Tribunal Competente.

Além do efeito devolutivo, o RESE possui efeito regressivo, uma vez que a interposição
do recurso obriga o juiz que prolatou a decisão recorrida a reapreciar a questão, mantendo-a ou
reformando-a, conforme dispõe o artigo 589, caput, do CPP.

453
No tocante ao efeito regressivo do recurso: recebendo os autos, o juiz, dentro de dois dias,
reformará ou sustentará a sua decisão, mandando instruir o recurso com as cópias que lhe
parecerem necessárias. A falta de manifestação do juiz importa em nulidade, devendo o tribunal
devolver os autos para esta providência. O juízo de retratação será sempre fundamento. A
fundamentação deficiente do juiz também obriga o tribunal a convencer o julgamento em
diligência para esse fim.

Se o juiz mantiver o despacho, remeterá os autos à instância superior; se reformá-la, o


recorrido, por simples petição, e dentro do prazo do prazo de cinco dias, poderá requerer a subida
dos autos. O recorrido deverá ser intimado, no caso de retratação do juiz.

27.8.6 Conteúdo
Assim como nos demais recursos, deve-se buscar no enunciado preliminares e mérito:
• Preliminares
Como já referido, as questões preliminares são aquelas que não observam aspectos
formais de determinado ato processual, gerando, invariavelmente, nulidade.
Aqui, por questão de organização, recomenda-se que as causas extintivas de
punibilidade, notadamente prescrição, sejam abordadas no campo destinado às preliminares.

• Mérito
Conforme abordado, nas peças práticas profissionais deverá ser desenvolvida uma tese
que, ao final, viabilizará o correspondente pedido. Ou seja, somente se aborda na peça aquilo
que, ao final, poderá ser objeto de pedido.
No caso do recurso em sentido estrito contra decisão de pronúncia, as teses de mérito
guardam relação com as hipóteses que podem ensejar decisão de: a) impronúncia (art. 414 do
CPP); b) absolvição sumária (art. 415 do CPP); c) ou desclassificação (art. 419 do CPP).

• Subsidiariedade
Eventuais teses subsidiárias podem consistir no afastamento da qualificadora e/ou de
causa de aumento de pena. Isso porque, nos termos do artigo 413, § 1º, do Código Penal, o
magistrado, ao pronunciar o réu, deverá apontar as qualificadoras e/ou causas de aumento de
pena em relação as quais o réu será submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri.

454
Logo, no caso, deve-se buscar afastar a qualificadora e/ou causa de aumento de pena,
para, na hipótese de ser pronunciado, o réu seja submetido a julgamento no Plenário do Júri pelo
crime imputado na sua modalidade simples, e não qualificada ou majorada.
Não se afigura necessário abordar teses subsidiárias voltadas à diminuição da pena ou
regime carcerário, por exemplo, uma vez que não é o momento processual para o juiz apreciar
temas envolvendo dosimetria da pena. Nesse caso, o juiz simplesmente proferirá decisão de
pronúncia, sem sequer apreciar eventual atenuante, agravante, causas de diminuição da pena
etc. Isso somente ocorrerá após o réu ser condenado em plenário do Júri, ou seja, no final da 2ª
fase do procedimento do júri.

27.8.7 Pedido
Quando se trata de recursos, deve-se formular pedido de CONHECIMENTO,
PROVIMENTO E REFORMA da decisão.
Além desses pedidos, deve-se, ainda, formular pedido específico para cada uma das
teses desenvolvidas ao longo da peça.
Exemplo: se sustentou alguma preliminar, nulidade, por exemplo, deve-se, ao final,
formular pedido expresso no sentido de que seja declarada a nulidade.
No que tange ao mérito, o pedido deve guardar relação com a(s) tese(s) invocadas:
a) impronúncia, com base no artigo 414 do Código de Processo Penal; e/ou
b) Absolvição sumária, com base no artigo 415 do Código de Processo Penal; e/ou
c) Desclassificação, com base no artigo 419 do Código de Processo Penal;
d) Afastamento da qualificadora ou causa de aumento de pena.

455
27.8.8 Estrutura do recurso em sentido estrito
A peça recurso em sentido estrito é bipartida: a) peça de interposição; b) razões de recurso
em sentido estrito:
INTERPOSIÇÃO
a) endereçamento: Juiz de Direito da Vara Criminal do Tribunal do Júri (se crime doloso contra a
vida) ou Juiz Federal da Vara Criminal do Tribunal do Júri da Justiça Federal da Seção Judiciária
(se crime doloso contra a vida da competência da Justiça Federal); Juiz de Direito da Vara
Criminal (se crime não doloso contra a vida da competência da Justiça Estadual) ou Juiz Federal
da Vara Criminal da Justiça Federal da Seção Judiciária (se crime não doloso contra a vida da
competência da Justiça Federal);
b) preâmbulo: nome (qualificação), capacidade postulatória (por seu procurador infra-assinado),
fundamento legal (art. 581, IV, do CPP), nome da peça (Recurso em sentido estrito), frase final
(pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos);
c) juízo de retratação, conforme artigo 589, CPP (importante);
d) parte final (Nesses termos, requer o processamento do presente recurso. Pede deferimento,
data, advogado e OAB);

RAZÕES
a) endereçamento:
Tribunal de Justiça do Estado...(se da competência da Justiça Estadual);
Tribunal Regional Federal (se da competência da Justiça Federal);

456
b) identificação: recorrente, recorrido, nº processo;
c) saudação:
Justiça Estadual: Egrégio Tribunal de Justiça do Estado... – Colenda Câmara Criminal
Justiça Federal: Egrégio Tribunal Regional Federal – Colenda Turma
d) corpo da peça (I. DOS FATOS: breve relato; II. DO DIREITO: preliminares e mérito);
e) pedido: Conhecimento + provimento do recurso + reforma da decisão + pedido específico;
f) parte final: Nestes termos, pede deferimento; local, data, advogado e OAB.

Estruturação: peça interposição

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA... VARA CRIMINAL DO


TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE ... (se crime da competência da Justiça Estadual)
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA... VARA CRIMINAL DO
TRIBUNAL DO JÚRI DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE... (se crime da competência da Justiça
Federal)

Processo nº...

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador infra-


assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência, inconformado com a decisão de fls., interpor, o presente RECURSO EM
SENTIDO ESTRITO, com base no artigo 581, inciso IV, do Código de Processo Penal.

457
Nesse sentido, requer seja recebido o recurso e procedido o juízo de
retratação, nos termos do artigo 589 do Código de Processo Penal. Se mantida a decisão,
requer seja encaminhado o presente recurso, já com as razões inclusas, ao Tribunal de
Justiça ou Tribunal Regional Federal, para o devido processamento.
O presente recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 5 dias,
previsto no artigo 586 do Código de Processo Penal.

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...

Advogado ...
OAB...

458
Estruturação: peça de razões endereçada ao tribunal competente

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO... (se da competência da Justiça


Estadual); ou
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA... REGIÃO (se da competência da Justiça
Federal).

Recorrente: Fulano de Tal


Recorrido: Ministério Público

Processo nº

RAZÕES DE RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

Egrégio Tribunal de Justiça do Estado... ou Egrégio Tribunal Regional Federal


Colenda Câmara Criminal (Justiça Estadual) ou Colenda Turma (Justiça Federal)

I) DOS FATOS

II) DO DIREITO
a) Das preliminares
b) Do mérito
Mérito para pedido de impronúncia (art. 414, CPP)
Mérito para pedido de absolvição sumária (art. 415, CPP)
Mérito para pedido de desclassificação (art. 419, CPP)

c) Subsidiariedade
Afastar qualificadora e/ou causa de aumento de pena.

459
III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja CONHECIDO E PROVIDO o presente recurso, com a reforma
da decisão de 1º grau, para o fim de que:
a) sejam reconhecidas as preliminares invocadas;
b) seja o réu impronunciado, com base no artigo 414 do Código de Processo Penal; e/ou
Seja o réu absolvido sumariamente, com base no artigo 415 do Código de Processo Penal;
e/ou
Seja desclassificado o delito, com base no artigo 419 do Código de Processo Penal,
remetendo-se os autos ao juízo competente;
c) Seja afastada a qualificadora e/ou causa de aumento de pena.

Nestes termos,
pede deferimento.
Local..., data...

Advogado...
OAB...

Observações:
• Importantíssimo fazer referência ao juízo de retratação previsto no artigo 589, CPP;
• Cuidar quando o enunciado pedir o último dia do prazo recursal;
• Fazer breve relato dos fatos ocorridos, conforme os dados do enunciado (não inventar nada nem
simplesmente transcrever o enunciado);
• Atentar para possibilidade de adoção de teses envolvendo nexo de causalidade (art. 13, § 1º,
CP) e desistência voluntária e arrependimento eficaz (art. 15), já que podem resultar em fatos
que não se coadunam com crimes dolosos contra a vida, persistindo, por exemplo, como crime
remanescente lesão corporal leve, grave ou gravíssima, levando, por conseguinte, à
desclassificação do delito e declinação de competência;
• Conforme o enunciado da peça ou da questão, os pedidos podem ser cumulativos;
• Referir novamente todas as preliminares, articulando o pedido na ordem que foram invocadas.

460
27.9. Questões sobre Recurso em sentido estrito

73) QUESTÃO 3 – EXAME 2010-02


Pedro, almejando a morte de José, contra ele efetua disparo de arma de fogo, acertando-o na
região toráxica. José vem a falecer, entretanto, não em razão do disparo recebido, mas porque,
com intenção suicida, havia ingerido dose letal de veneno momentos antes de sofrer a agressão,
o que foi comprovado durante instrução processual. Ainda assim, Pedro foi pronunciado nos
termos do previsto no artigo 121, caput, do Código Penal. Na condição de Advogado de Pedro:
I. Indique o recurso cabível;
II. O prazo de interposição;
III. A argumentação visando à melhoria da situação jurídica do defendido.
Indique, ainda, para todas as respostas, os respectivos dispositivos legais.
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

74) QUESTÃO 3 – XXXIII EXAME


Beatriz e seu esposo José, no dia 02/01/2021, enquanto celebravam o aniversário de casamento
em um restaurante, iniciaram uma discussão, por José entender que a esposa não lhe
dispensava a devida atenção. Durante a discussão, José desferiu um soco no rosto de Beatriz,
causando-lhe lesão corporal de natureza leve. Testemunhas presenciais do fato chamaram a
Polícia, sendo José preso em flagrante, mas posteriormente liberado pelo magistrado, em sede
de audiência de custódia. O Ministério Público ofereceu denúncia imputando a José a prática do
crime do Art. 129, § 9º, do Código Penal, havendo habilitação imediata de Beatriz, por meio de
seu advogado, como assistente de acusação, já que ela não aceitou ter sido agredida pelo então
marido. O magistrado em atuação no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
não recebeu a denúncia, afirmando a inexistência de fato culpável, escorado em laudo
apresentado pela defesa indicando que, no momento dos fatos, em razão da paixão, José era
inteiramente incapaz de determinar-se de acordo com seu entendimento. Destacou o magistrado
a possibilidade de rejeição da denúncia por não ser necessária a aplicação de medida de
segurança, já que, atualmente, não haveria incapacidade de José. Insatisfeita com o teor da
decisão, Beatriz procura você, como advogado(a), para a adoção das medidas cabíveis e
assistência técnica.

461
Na condição de advogado(a) de Beatriz, esclareça os questionamentos a seguir.
A) Para combater a decisão do magistrado, qual o recurso cabível? Justifique. (Valor: 0,60)
B) Existe argumento de direito material para questionar o conteúdo da decisão judicial?
Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

75) QUESTÃO 1 – 35º EXAME


Pedro, nascido em 20 de janeiro de 2000, foi condenado, definitivamente, pela prática do crime
furto simples à pena de 1 ano de reclusão em regime inicial aberto, tendo sua pena privativa de
liberdade substituída por pena de multa. O crime ocorreu no dia 14 de junho de 2018, e a
sentença condenatória transitou em julgado, no dia 20 de abril de 2019, tendo sido feito o
pagamento da multa no prazo legal. Ocorre que, no dia 23 de março de 2020, o agente foi preso
em flagrante, após empregar ameaça para subtrair o aparelho telefônico de Luiza. Os policiais
que efetuaram a prisão conseguiram evitar a consumação delitiva e, posteriormente, Pedro foi
denunciado pela prática do crime de roubo, em sua modalidade tentada. Finda a instrução, foi
condenado na forma do Art. 157, c/c. Art. 14, inciso II, ambos do Código Penal. Ao aplicar a pena,
o juiz fixou a pena-base no mínimo legal, pois favoráveis as circunstâncias judiciais. Na segunda
fase, manteve a pena no patamar de 4 anos, apesar de reconhecer a agravante da reincidência.
Isto porque observou a menoridade relativa do agente à data do fato. Aplicada a minorante da
tentativa em sua fração máxima, alcançou a pena definitiva de 1 ano e 4 meses de reclusão e
fixou o regime inicial semi-aberto, sendo negada a suspensão condicional da pena em razão da
reincidência. A defesa técnica de Pedro interpôs, assim, recurso de apelação, insurgindo-se
apenas quanto à negativa do sursis. O magistrado, no entanto, não admitiu o recurso,
sustentando que a via adequada era a do Recurso em Sentido Estrito, a teor do Art. 581, inciso
XI, do Código de Processo Penal. Considerando apenas as informações apresentadas,
responda, na qualidade de advogado(a) de Pedro, aos itens a seguir.

462
A) Aponte o recurso a ser interposto em face da decisão do juiz de primeiro grau que não
admitiu a apelação e o fundamento de direito processual penal a ser alegado para que o
apelo seja admitido. Justifique. (Valor: 0,65)
B) Existe alguma tese de Direito Penal material que permita a concessão da suspensão
condicional da pena no caso concreto? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: O(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

463
Efeito extensivo

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

28.1 Conceito
Conforme dispõe o artigo 580 do CPP, havendo dois ou mais réus, com idêntica situação
processual e fática, se apenas um deles recorrer e obtiver benefício, será este aplicado também
aos demais que não impugnaram a sentença ou decisão.

Exemplo: Theo e Russo são condenados por terem praticado crime de roubo majorado
por emprego de arma de fogo não apreendida, considerando o magistrado desnecessária a
perícia na arma. Theo interpõe recurso de apelação buscando também afastar a majorante do
emprego de arma de fogo. O provimento do recurso, afastando a majorante, se estende a Russo,
que não havia apelado.

O efeito extensivo não se aplica quando a matéria recorrida envolver somente


circunstância de caráter pessoal. Exemplo: Na situação acima, Theo interpõe recurso de
apelação voltado à diminuição da pena, porque não foi considerada a sua menoridade (menor
de 21 anos) à época do fato. Eventual provimento do recurso não alcançará Russo, pois se trata
de circunstância pessoal, nada relacionada ao fato praticado.

Esse efeito extensivo não se restringe unicamente à apelação, sendo cabível também nos
demais recursos.

464
Agravo em Execução

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 12/04/2023.

Prof.ª Letícia Neves


@prof.leticianeves

29.1 Cabimento e conteúdo


É recurso destinado à impugnação de decisões interlocutórias proferidas no curso da
execução criminal, disciplinada na Lei nº 7.210/84. Não há um rol taxativo, sendo cabível para
impugnar qualquer decisão proferida pelo juízo da execução penal, cuja competência é definida
no artigo 66 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84), como, por exemplo, em relação aos
seguintes temas:
• Decisão que concedeu ou nega a progressão de regime;
• Que determina a regressão do regime carcerário e perda dos dias remidos;
• Que indefere o pedido de unificação das penas, com base, por exemplo, na continuidade
delitiva;
• Que concede ou denega pedido de livramento condicional;
• Que indefere o pedido de saídas temporárias;
• Concede ou denega o pedido de indulto, comutação, remição.
• Base legal: art. 197 da Lei 7.210/84 (LEP)

• Identificação:
PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica: Peça:

“decisão pelo juízo da execução” AGRAVO EM EXECUÇÃO

PAROU!

465
29.2 Rito e competência para o julgamento
A Lei de Execução Penal não definiu o rito a ser seguido no agravo em execução,
definindo, apenas, no seu artigo 197, que “Das decisões proferidas pelo Juiz caberá recurso de
agravo, sem efeito suspensivo”.
Nesse sentido, a doutrina e jurisprudência amplamente dominante, adotam o
entendimento de que deve ser adotado o mesmo rito do recurso em sentido estrito, notadamente
no que se refere ao prazo, ao juízo de retratação e ao processamento.
Tal entendimento restou consagrado na Súmula 700 do STF, a qual: “É de cinco dias o
prazo para a interposição de agravo contra a decisão do juiz da execução penal”.
A interposição do recurso deve ser dirigida ao juiz de primeiro grau que proferiu a decisão,
para que este possa rever a decisão, em sede de juízo de retratação.
As razões de recurso devem ser endereçadas ao Tribunal competente (Tribunal de
Justiça, se da competência da Justiça Comum Estadual; ou Tribunal Regional Federal, se da
competência da Justiça Federal).

29.3 Prazo

Interposição: 05 dias
Razões: 02 dias

Como a FGV costuma cobrar a interposição e a apresentação das razões


simultaneamente, priorizar o prazo de 05 dias para interpor, já com as razões inclusas.

29.4 Efeitos
Assim como no recurso em sentido estrito, o agravo em execução possui efeito regressivo,
uma vez que a interposição do recurso obriga o juiz que prolatou a decisão recorrida a reapreciar
a questão, mantendo-a ou reformando-a, aplicando-se analogicamente o artigo 589, caput, do
Código de Processo Penal.
Se o juiz mantiver a decisão, determinará a remessa dos autos à instância superior; se
reformá-la, o recorrido, por simples petição, e dentro do prazo do prazo de cinco dias, poderá
requerer a subida dos autos. O recorrido deverá ser intimado, no caso de retratação do juiz.

466
Nos termos do artigo 197 da Lei de Execução Penal, o agravo em execução, em regra,
não tem efeito suspensivo. Ou seja, as decisões proferidas em sede de execução penal devem
ser, em regra, imediatamente executadas.

ATENÇÃO

Agravo em Execução e Medida de Segurança: artigo 179 da Lei de Execução Penal – atribui
excepcionalmente o efeito suspensivo nos casos de execução de Medida de Segurança.

29.5 Estruturação da peça Agravo em Execução


A estrutura do agravo em execução segue dois momentos, sendo a peça bipartida: a)
interposição do recurso (afirmar que pretende recorrer); b) razões do recurso de agravo em
execução.
• Interposição
a) Endereçamento: Juiz da Vara de Execuções Penais;
b) Preâmbulo: nome, capacidade postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento
legal (art. 197 da Lei nº 7.210/84 – Lei de Execução Penal), nome da peça (Agravo em
Execução), frase final (pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos);
c) Juízo de retratação, em analogia ao artigo 589, CPP (importante);
d) Parte final: “Nesses termos, requer o processamento do presente recurso. Pede deferimento,
data, advogado... e OAB...
• Razões
a) Endereçamento: Tribunal de Justiça;
b) Identificação: agravante/recorrente, agravado/recorrido, nº processo...
c) Saudação: Justiça Estadual: Egrégio Tribunal de Justiça – Colenda Câmara – Eméritos
Julgadores – Douta Procuradoria da Justiça;
d) Corpo da peça: breve relato, preliminares e mérito;
e) Pedidos: conhecimento e provimento do recurso, reforma da decisão e pedido específico
conforme o caso apresentado;
f) Parte final: “Termos em que pede deferimento”, local, data, advogado... e OAB...

467
Peça de interposição: endereçada ao juiz de 1º grau:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ... VARA DE EXECUÇÃO
PENAL DA COMARCA DE ... ESTADO ...

Processo nº...

FULANO DE TAL (não inventar dados), já qualificado nos autos, por seu
procurador infra-assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença
de Vossa Excelência, inconformado com a decisão das fls., interpor o presente AGRAVO
EM EXECUÇÃO, com base no artigo 197 da Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal).
O presente recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 5 dias,
nos termos da Súmula 700 do Supremo Tribunal Federal e artigo 586 do Código de
Processo Penal.
Nesse sentido, requer seja recebido o recurso e procedido o juízo de
retratação, nos termos do artigo 589 do Código de Processo Penal. Se mantida a decisão,
requer seja encaminhado o presente recurso, já com as razões inclusas, ao Tribunal de
Justiça do Estado..., para o devido processamento.

Nestes termos,
Pede deferimento.

Local..., data...
Advogado...
OAB...

468
Razões de agravo em execução: endereçadas ao tribunal competente
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO ... / TRIBUNAL REGIONAL
FEDERAL...

Agravante: Fulano de Tal


Agravado: Ministério Público
Processo nº ...

RAZÕES DE AGRAVO EM EXECUÇÃO


Colenda Câmara

I) DOS FATOS
II) DO DIREITO
* decisão que concede ou nega a progressão de regime;
* que determina a regressão do regime carcerário e perda dos dias remidos;
* que indefere o pedido de unificação das penas, com base, por exemplo, na
continuidade delitiva;
* que concede30 ou denega pedido de livramento condicional;
* que indefere o pedido de saídas temporárias;
* concede ou denega o pedido de indulto, comutação, remição.
Em síntese, hipóteses previstas no artigo 66 da LEP (Lei nº 7.210/84).

III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja CONHECIDO E PROVIDO o presente recurso, com a
REFORMA DA DECISÃO DE 1º GRAU, para o fim de que ...

Nestes termos,
Pede deferimento.
Local..., data...
Advogado...
OAB...

30
No Exame XVI a Banca atribuiu 0,20 para o pedido de expedição de alvará de soltura referente à concessão do
livramento condicional. Portanto, recomendável fazer o pedido neste caso.

469
29.6. Questões sobre Agravo em execução

76) QUESTÃO 2 – XIV EXAME


Mário foi condenado a 24 (vinte e quatro) anos de reclusão no regime inicialmente fechado, com
trânsito em julgado no dia 20/04/2005, pela prática de latrocínio (artigo 157, § 3º, parte final, do
Código Penal). Iniciou a execução da pena no dia seguinte. No dia 22/04/2009, seu advogado,
devidamente constituído nos autos da execução penal, ingressou com pedido de progressão de
regime, com fulcro no artigo 112 da Lei de Execuções Penais. O juiz indeferiu o pedido com base
no artigo 2º, §2º, da Lei8.072/90, argumentando que o condenado não preencheu o requisito
objetivo para a progressão de regime.

470
Como advogado de Mário, responda, de forma fundamentada e de acordo com o
entendimento sumulado dos Tribunais Superiores, aos itens a seguir:
A) Excetuando-se a possibilidade de Habeas Corpus, qual recurso deve ser interposto
pelo advogado de Mário e qual o respectivo fundamento legal? (Valor: 0,40)
B) Qual a principal tese defensiva? (Valor: 0,85)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

77) QUESTÃO 4 – XII EXAME


Marcos, jovem inimputável conforme o Art. 26 do CP, foi denunciado pela prática de determinado
crime. Após o regular andamento do feito, o magistrado entendeu por bem aplicar medida de
segurança consistente em internação em hospital psiquiátrico por período mínimo de 03 (três)
anos. Após o cumprimento do período supramencionado, o advogado de Marcos requer ao juízo
de execução que seja realizado o exame de cessação de periculosidade, requerimento que foi
deferido. É realizada uma rigorosa perícia, e os experts atestam a cura do internado, opinando,
consequentemente, por sua desinternação. O magistrado então, baseando-se no exame pericial
realizado por médicos psiquiatras, exara sentença determinando a desinternação de Marcos. O
Parquet, devidamente intimado da sentença proferida pelo juízo da execução, interpõe o recurso
cabível na espécie. A partir do caso apresentado, responda, fundamentadamente, aos itens a
seguir.
A) Qual o recurso cabível da sentença proferida pelo magistrado determinando a
desinternação de Marcos? (Valor: 0,75)
B) Qual o prazo para interposição desse recurso? (Valor: 0,25)
C) A interposição desse recurso suspende ou não a eficácia da sentença proferida pelo
magistrado? (Valor: 0,25)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

78) QUESTÃO 1 – XI EXAME


O Juiz da Vara de Execuções Penais da Comarca “Y” converteu a medida restritiva de direitos
(que fora imposta em substituição à pena privativa de liberdade) em cumprimento de pena
privativa de liberdade imposta no regime inicial aberto, sem fixar quaisquer outras condições. O

471
Ministério Público, inconformado, interpôs recurso alegando, em síntese, que a decisão do
referido Juiz da Vara de Execuções Penais acarretava o abrandamento da pena, estimulando o
descumprimento das penas alternativas ao cárcere. O recurso, devidamente contra-arrazoado,
foi submetido a julgamento pela Corte Estadual, a qual, de forma unânime, resolveu lhe dar
provimento. A referida Corte fixou como condição especial ao cumprimento de pena no regime
aberto, com base no Art.115 da LEP, a prestação de serviços à comunidade, o que deveria
perdurar por todo o tempo da pena a ser cumprida no regime menos gravoso. Atento ao caso
narrado e considerando apenas os dados contidos no enunciado, responda fundamentadamente,
aos itens a seguir.
A) Qual foi o recurso interposto pelo Ministério Público contra a decisão do Juiz da Vara
de Execuções Penais? (Valor: 0,50)
B) Está correta a decisão da Corte Estadual, levando-se em conta entendimento
jurisprudencial sumulado? (Valor: 0,75)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

472
Revisão criminal

Aula prevista para ocorrer ao vivo no dia 12/04/2023.

Prof.ª Letícia Neves


@prof.leticianeves

30.1 Conceito: art. 621, CPP


É uma ação penal de natureza constitutiva e sui generis, de competência originária dos
tribunais, destinada a rever decisão condenatória, com trânsito em julgado, quando ocorrer uma
das hipóteses do artigo 621 do Código de Processo Penal.
Permite-se, portanto, pela revisão criminal, que o condenado possa pedir a qualquer
tempo aos tribunais, nos casos expressos em lei, que reexamine o processo já findo, a fim de
ser absolvido ou beneficiado de alguma forma.
PRESSUPOSTO: pressuposto indispensável ao cabimento do pedido que a sentença
condenatória tenha transitado em julgado, ou seja, que da decisão não caiba qualquer recurso,
inclusive extraordinário.

Não é peça de interposição É AÇÃO

30.2 Identificação: art. 621, CPP

PEDIU PRA PARAR

Expressão mágica: Peça:


“sentença transitada em julgado...”/
REVISÃO CRIMINAL
“processo findo...”

PAROU!

473
30.3 Base legal

Artigo 621 do Código de Processo Penal

30.4 Cabimento/conteúdo: art. 621, CPP

a) quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal

A sentença condenatória é contrária à lei quando não procede como ela manda ou quando
nela não encontra respaldo para sua existência.
Exemplo: réu condenado por fato que não constitui crime ou condenação a pena superior
ao limite máximo previsto em lei.
Quando se tratar de interpretação controversa do texto de lei, não cabe revisão criminal,
para se buscar outra análise do mesmo preceito. A hipótese deste inciso é clara: afronta ao
texto expresso de lei – e não do sentido que esta possa ter para uns e outros.

b) contrariedade à evidência dos autos

Contrária à evidência dos autos é a condenação que não tem apoio em provas idôneas,
mas em meros indícios, sem qualquer consistência lógica e real.
Para ser admissível a revisão criminal, torna-se indispensável que a decisão condenatória
proferida ofenda frontalmente as provas constantes nos autos.
Exemplo: seria o equivalente a dizer que todas as testemunhas idôneas e imparciais
ouvidas afirmaram não ter sido o réu o autor do crime, mas o juiz, somente porque o
acusado confessou na fase policial, resolveu condená-lo. Não havendo recurso, transitou
em julgado a sentença.

474
c) quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou
documentos comprovadamente falsos

A lei utiliza a qualificação comprovadamente para denominar o falso dessas peças


constitutivas do conjunto probatório, determinante para a condenação.
Portanto, não é qualquer suspeita de fraude, vício ou falsidade que levará a reavaliação da
condenação com trânsito em julgado. Torna-se nítida a exigência de uma falsidade
induvidosa.
Não basta que seja a prova falha, precária ou insuficiente. Não fundamenta a revisão, por
exemplo, simples falta de fundamentação de laudo pericial.
Provada, todavia, a falsidade do testemunho, colhido eventualmente até sob coação, da
perícia ou do documento, não se justifica manter-se aquilo que constitui fraude à Justiça,
mesmo porque a CF prevê a inadmissibilidade em juízo de prova ilícita.
Com o pedido, o requerente deve apresentar a prova que possua para demonstrar a
falsificação, já que não se permite na revisão a reabertura do processo para a produção de
novas provas.

d) quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do


condenado ou de circunstâncias que determine ou autorize a diminuição especial
da pena

Prova nova é aquela produzida sob o crivo do contraditório, não se admitindo, por exemplo,
depoimentos extrajudiciais. É também aquela que já existia à época da sentença, mas
cuja existência não foi cogitada.
Surgindo novas provas que indiquem que o condenado deveria ser absolvido, ou de
existirem circunstâncias atenuantes ou causas de diminuição de pena não cogitadas, ou
não estarem presentes circunstâncias agravantes, qualificadoras ou causas de aumento de
pena indevidamente reconhecidas, deve ser deferido o pedido revisional.
Se as provas inéditas, surgidas depois da sentença condenatória definitiva ter sido
proferida, inocentarem o acusado, seja porque negam ser ele o autor, seja porque indicam
não ter havido fato criminoso, é de se acolher a revisão criminal.

475
30.5 Revisão e extinção da pena: art. 622, CPP
Permite a lei o pedido de revisão a qualquer tempo, inclusive após a extinção da pena.
Há, na hipótese, interesse de agir, pois, além do aspecto moral ínsito à revisão de uma
condenação, pode a decisão condenatória causar gravames ao condenado, não só na esfera
civil e administrativa, como também no campo penal (por exemplo, caracterização da
reincidência).
Impede-se a reiteração do pedido de revisão sem novas provas, evitando-se assim
simples repetição indefinida daquilo que já foi examinado. Assim, apenas um novo pedido com
pretensão diversa, ou alicerçado em novas provas, que possibilite nova apreciação por novos
fundamentos de fato e de direito, merece conhecimento.

IMPORTANTE!
A jurisprudência tem se manifestado no sentido da necessidade de Ação de Justificação
Criminal para a produção de prova nova. Vejamos o item 15 da Edição nº 63 da
Jurisprudência em tese do STJ: “A justificação criminal é a via adequada à obtenção de
prova nova para fins de subsidiar eventual ajuizamento de revisão criminal”.
Dessa forma observa-se o procedimento previsto no artigo 381 do CPC para a produção
probatória, visto que não há previsão no CPP para tal procedimento.

30.6 Legitimidade: art. 623, CPP


Como demonstra este artigo, trata-se de ação privativa do réu condenado, podendo ele
ser substituído por seu representante legal ou seus sucessores, em rol taxativo – cônjuge,
ascendente, descendente ou irmão. Nucci entende que companheiro(a) também pode.
Portanto, a revisão pode ser pedida pelo próprio réu, independentemente de estar
representado por seu procurador.
A revisão pode ser proposta por procurador legalmente habilitado, não se exigindo a
outorga ao advogado de poderes especiais.

30.7 Órgão competente para o julgamento da Revisão Criminal


É da competência originária dos tribunais, jamais sendo apreciada por juiz de primeira
instância. Se a decisão condenatória definitiva provier de magistrado de primeiro grau, julgará a
revisão criminal o tribunal que seria competente para conhecer do recurso ordinário.

476
Caso a decisão provenha de câmara ou turma de tribunal de segundo grau, cabe ao
próprio tribunal o julgamento da revisão, embora, nessa hipótese, não pela mesma câmara, mas
pelo grupo reunido de câmaras criminais.
Tratando-se de decisão proferida pelo Órgão Especial, cabe ao mesmo colegiado o
julgamento da revisão.
Cabe ao STF o julgamento da revisão criminal de sus julgados, em regra, os de
competência originária.
Da competência prevista pelo artigo 624 do Código de Processo Penal, deve-se excluir o
Tribunal Federal de Recursos (extinto) e acrescentar o Superior Tribunal de Justiça (Art. 105,
inciso I, alínea “e”, da CF/88) e os Tribunais Regionais Federais (Art.108, inciso I, alínea “b”, da
CF/88), que tem competência revisional.

30.8 Decisão na Revisão Criminal: art. 626, CPP


Em princípio, a revisão só pode ser julgada procedente havendo nulidade insanável no
processo ou erro judiciário. Mas, apesar do caráter taxativo do artigo 621 do Código de Processo
Penal, a decisão em que se julgar procedente a revisão pode alterar a classificação da
infração, absolver o réu, modificar a pena ou anular o processo, tendo como único
obstáculo a impossibilidade de se agravar a pena imposta pela decisão revista.
Assim, além de se rescindir complementarmente a sentença ou acórdão para absolver o
acusado, nada impede, por exemplo, conforme jurisprudência, que se desclassifique a
condenação de tentativa de homicídio culposo para lesão corporal culposa, ou de falsificação de
documentos para falsa identidade; que se reveja e reduza a pena; que se reconheça nulidade
absoluta, anulando-se o processo, embora a nulidade manifeste também possa ser atacada por
meio de habeas corpus.

30.9. Estruturação da Revisão Criminal


A) Endereçamento: Tribunal competente – Art. 624 do CPP;
B) Preâmbulo: nome e qualificação do requerente (qualificar, pois se trata de ação - não inventar
dados), capacidade postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento legal (Art. 621,
inciso...), nome da peça (Revisão Criminal), frase final (pelos fatos e fundamentos jurídicos a
seguir expostos);
C) Corpo da peça (dos fatos e do direito): Lembrem-se que se trata de uma ação;

477
D) Pedidos: (a) alteração da classificação do crime; (b) absolvição; (c) modificação da pena; (d)
nulidade do processo.

Observação: Pedido conforme o fundamento invocado


(VER ARTIGO 626, CPP)

E) Parte final: local, data, advogado e OAB.

IMPORTANTE!
COMO NÃO SE TRATA DE RECURSO, NÃO HÁ PEÇA DE INTERPOSIÇÃO.

• Pedido Liminar
É possível a postulação de pedido liminar quando, no caso concreto, for identificado que
há perigo em manter o erro diante da demora do julgamento, bem como diante do fundamento
indicado na peça resta plausível o direito alegado. Podemos pleitear a liminar por exemplo, para
suspender a execução de determinada pena, com a expedição de alvará de soltura, a fim de que
o interessado aguarde em liberdade o julgamento da Revisão Criminal.
Enfim, apesar de não ter um artigo específico é admitida a medida liminar, desde que
presentes os requisitos das medidas cautelares: fumus boni iuris e periculum in mora.

Jurisprudência:
HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO. SENTENÇA CONDENATÓRIA COM TRÂNSITO EM
JULGADO. "ERRO MATERIAL" EM RELAÇÃO AO REGIME PRISIONAL
RECONHECIDO PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REFORMATIO IN
PEJUS. INDEVIDA REVISÃO CRIMINAL PRO SOCIETATE. ORDEM CONCEDIDA. 1. Se
é certo que a fixação do regime inicial aberto para uma condenação por latrocínio (art.
157, § 3º, do Código Penal) com reprimenda de 18 (dezoito) anos de reclusão, caracteriza
evidente "erro material", não menos certo que, no caso concreto, houve o trânsito em
julgado da sentença sem que o órgão acusador opusesse embargos de declaração ou
interpusesse recurso de apelação. Dormientibus non succurrit jus. Tratando-se, com se
trata, de Direito Penal adjetivo não se pode falar em correção ex officio de "erro material",
máxime contra o réu. Tal instituto é próprio do Direito Processual Civil (art. 463, I, do CPC).
Na esfera penal prevalece o princípio do non reformatio in pejus que impede o
agravamento da situação do réu sem uma manifestação formal e tempestiva da acusação
nesse sentido. Inteligência da Súmula 160/STF. "Trata-se da cabal confirmação do
entendimento de que, neste, como noutros temas, o processo penal não é estruturado por

478
princípios comuns ao processo civil, senão por regras próprias, em razão da prevalência
dos interesses públicos que constituem a substância e o objeto permanente do conflito
jurídico típico que se presta a decidir e, sobretudo, por força do valor supremo do jus
libertatis, do qual o processo é concebido e disciplinado como instrumento de tutela". (STF,
HC 83.545/SP, Rel. Ministro CESAR PELUSO, Primeira Turma, DJ 3.6.2006). Nesse viés,
seja por nulidade absoluta, seja por "erro material", não se pode agravar
(quantitativamente ou qualitativamente) a situação do réu sem recurso próprio do
acusador, sob pena de configurar indevida revisão criminal pro societate. Precedentes do
STJ. Ordem concedida para, reconhecendo o trânsito em julgado da condenação, manter
o regime inicial aberto, como fixado na sentença.
(HC 176.320/AL, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro
JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/05/2011, DJe 17/09/2012).

479
Endereçamento: Presidente do Tribunal de Justiça ou do TRF:
A) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO... (se crime da competência da
Justiça Estadual)
B) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR FEDERAL
PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA ... REGIÃO... (se
crime da competência da Justiça Federal)

FULANO DE TAL, nacionalidade, profissão, estado civil, RG..., endereço


eletrônico..., (não inventar dados), por seu procurador infra-assinado, com procuração
em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, propor REVISÃO
CRIMINAL, com pedido liminar31, com base no artigo 621, inciso ..., do Código de
Processo Penal, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos:
I) DOS FATOS
II) DO DIREITO
III)DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja julgada procedente a presente ação de revisão criminal, a
fim de que seja:
• Pode solicitar a concessão liminar, se for o caso;
• Absolvido o revisando, com base no artigo 626 do Código de Processo Penal (pode
combinar com o artigo 386 do CPP); e/ou
• Anulado o processo, com base no artigo 626 do Código de Processo Penal;
• Alterada a classificação para o crime, com base no artigo 626 do Código de
Processo Penal;
• Modificada a pena, a fim de que (Ex: seha afastada a majorante; reconhecida a
causa de diminuição da pena)
• Reconhecido o direito do revisando à indenização, nos termos do artigo 630 do
CPP;
Nestes termos, Espera deferimento.
Local... e Data... ADVOGADO... OAB...

31
Pedido Liminar, se for preciso, na maioria das vezes é pertinente.

480
481
482

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