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Você sabe quais são as

pistas para identificar


uma via aérea difícil para
intubação?

1.1 INTRODUÇÃO
A oxigenação e o suporte ventilatório adequado são pontos
fundamentais no sucesso do atendimento às emergências
cardiopulmonares, e a adequada oxigenação para a manutenção
da vida depende de um suporte ventilatório artificial apropriado.
Vários são os dispositivos utilizados para esse suporte, e alguns
deles serão abordados a seguir.
1.2 DISPOSITIVOS DE OXIGENAÇÃO
1.2.1 Cânula nasal
Este dispositivo pode fornecer até 44% de oxigênio. É
preconizado como dispositivo inicial para situações de hipoxemia
leve a moderada. A cânula nasal, também conhecida como
cateter de oxigênio, é um sistema de baixo fluxo, em que o
oxigênio ofertado se mistura com o ar ambiente.
#importante
Vale lembrar que pacientes muito
dispneicos têm respiração oral
predominante, e o desempenho da
cânula nasal fica prejudicado. Nessas
situações, é recomendado o uso de
máscara de oxigênio.

A oferta de oxigênio estimada aumenta de 3 a 4% com o aumento


do fluxo em 1 L:
▶ 1 L/min: 24%;
▶ 2 L/min: 28%;
▶ 3 L/min: 32%;
▶ 4 L/min: 36%;
▶ 5 L/min: 40%;
▶ 6 L/min: 44%.
Figura 1.1 - Cânula nasal
Fonte: Claudio Van Erven Rispinskas.

1.2.2 Máscara de Venturi


Dispositivo para controlar, de maneira mais precisa, as frações
inspiradas de oxigênio.

#importante
A máscara de Venturi permite um ajuste
mais preciso da FiO2 oferecida ao
paciente. Nos indivíduos com
hipercapnia crônica (retentores de CO2),
a sua utilização reduz a chance de
induzir narcose por hiperóxia indesejada.

As concentrações de oxigênio são de 24 a 50%, seguindo uma


tabela-padrão. Com a troca da válvula reguladora, é possível um
ajuste mais preciso da fração oferecida de oxigênio.
Figura 1.2 - Máscara de Venturi

Legenda: azul 24%, amarelo 28%, branco 31%, verde 35%, vermelho 40% e laranja
50%.
Fonte: adaptado de Dario Lo Presti.

1.2.3 Máscara facial


Pode fornecer até 60% de oxigênio; é um sistema de alto fluxo,
em geral ajustado entre 6 e 15 L/min. É mais eficiente em
pacientes com hipoxemia moderada/severa, principalmente nos
pacientes taquipneicos que respiram pela boca.
Figura 1.3 - Máscara facial

Fonte: WhiteJack.

1.2.4 Máscara facial com reservatório de oxigênio


Fornece até 90 a 100% de oxigênio. Sua utilização demanda alto
fluxo de oxigênio (10 a 15 L/min) para manter o reservatório de
oxigênio sempre repleto do gás; caso contrário, o dispositivo
perde a sua eficiência.
Figura 1.4 - Máscara facial com reservatório de oxigênio
Fonte: ICUnurses.

1.2.5 Cânula nasal de alto fluxo


A cânula nasal de alto fluxo (CNAF) é um dispositivo utilizado via
nasal através de uma cânula alimentada por oxigênio mistura do a
um fluxo elevado de ar umidificado (20 a 80 L/min). Isso gera uma
elevação discreta da pressão em vias aéreas e um suporte
respiratório mais efetivo com redução da resistência da via aérea
e do trabalho respiratório do paciente.
Figura 1.5 - Cânula nasal de alto fluxo
Fonte: adaptado de The use of high-flow nasal cannula in the pediatric
emergency department, 2017.

1.3 DISPOSITIVOS DE VENTILAÇÃO


1.3.1 Máscaras de ventilação
Uma máscara bem ajustada é um dispositivo simples e efetivo
para uso em ventilação artificial. Deve ser feita de material
transparente, para a detecção de regurgitação, e ajustar-se
firmemente à face do paciente, permitindo boa vedação do ar,
cobrindo a boca e o nariz. Além disso, permite ao socorrista
aplicar pressão positiva no paciente por meio de sua própria
expiração por uma válvula unidirecional, o que impede o contato
com o ar exalado. Trata-se de um dispositivo que permite a
respiração boca-máscara no suporte básico de vida, fornecendo
volume corrente maior e mais efetivo do que a ventilação bolsa-
máscara (AMBU®).

#importante
A melhor vedação da máscara é obtida
quando o resgatista fica na posição
cefálica do paciente (Figura 1.6).

1.3.2 Dispositivo bolsa-válvula


O dispositivo bolsa-válvula consiste em uma bolsa autoinflável e
em uma válvula unidirecional e pode ser utilizado em conjunto
com máscara, tubo endotraqueal ou outros dispositivos de via
aérea. A maioria tem volume de 1.600 mL. Quando se utiliza a
bolsa-válvula com um dispositivo que não veda completamente a
via aérea (máscara laríngea, por exemplo), o risco de distensão
gástrica e de regurgitação torna-se uma preocupação. Um
conjunto razoável deve ter as seguintes características:
▶ Bolsa autoinflável;
▶ Sistema de válvula antitrava que permita fluxo de oxigênio de
30 L/min;
▶ Válvula de pico de pressão (evita que a pressão do sistema
desconecte o conjunto);
▶ Conectores de 15 e 22 mm;
▶ Reservatório de oxigênio (permite administrar frações elevadas
de oxigênio);
▶ Material resistente a intempéries (água, chuva, calor).
Figura 1.6 - Posicionamento correto da máscara facial

Fonte: acervo Medcel.

1.3.3 Bolsa-valva-máscara (AMBU®)


Trata-se de uma ferramenta para a ventilação de pacientes com
ou sem dispositivo avançado de vias aéreas. Pode-se ventilar com
máscara ou diretamente no tubo orotraqueal. Quando se usa o
reservatório de oxigênio, a fração inspirada de oxigênio (FiO2) é de
praticamente 100%. A ventilação com máscara é indicada a
procedimentos rápidos ou à pré-oxigenação para a obtenção de
via aérea avançada e pode ser realizada por um ou dois
socorristas.

#importante
Deve-se lembrar de que a ventilação
com máscara pode provocar distensão
gástrica e vômitos.

Este problema pode ser minimizado com compressões suaves da


bolsa durante as ventilações assistidas.
A forma adequada de utilização da unidade bolsa-valva-máscara
requer posicionamento apropriado do reanimador atrás da
cabeça da vítima e a utilização de dispositivo para assegurar a
permeabilidade da via aérea (Figura 1.7).
Figura 1.7 - Ventilação com bolsa-valva-máscara
Fonte: acervo Medcel.

1.3.4 Outros
Além dos dispositivos citados para auxílio na ventilação dos
pacientes, existem outros meios de fornecer oxigênio
suplementar para pacientes críticos que apresentem ventilação
espontânea. Cada dispositivo pode oferecer determinada fração
de oxigênio e deve ser usado de acordo com a necessidade. Em
geral, a terapêutica é guiada pela oximetria de pulso e pela
mensuração arterial de gases no sangue — gasometria arterial
(Figura 1.8).
Figura 1.8 - Tipos de exames
Legenda: (A) oximetria de pulso; (B) gasometria arterial.
Fonte: (A) Myibean; (B) acervo Medcel.

1.4 DISPOSITIVOS DE VIA AÉREA


Os dispositivos invasivos de via aérea como cânula orofaríngea ou
nasofaríngea facilitam a manutenção da patência da via aérea
para a ventilação assistida através de bolsa-valva-máscara. Já a
máscara laríngea, a cânula laríngea, o Combitube® e o tubo
traqueal são dispositivos supraglóticos que permitem maior
controle da via aérea de forma prolongada.
1.4.1 Cânula orofaríngea (Guedel)
Seu uso tem o objetivo de manter a língua afastada da parede
posterior da faringe. É feita de plástico semicurvo, com lúmen que
permite a passagem do ar, e está disponível em diferentes
tamanhos, tanto para crianças como para adultos.

#importante
A escolha do tamanho é realizada
mensurando-se a distância da rima labial
ao lóbulo da orelha ipsilateral da vítima.

Somente pode ser utilizada entre pacientes com rebaixamento do


nível de consciência ou intubados pelo risco de
desencadeamento do reflexo de vômito. A colocação do
dispositivo demanda cuidado, em razão de se poder deslocar
posteriormente a língua em direção à hipofaringe (Figura 1.9).
Figura 1.9 - Colocação da cânula orofaríngea
Legenda: (A) tipos de cânula de Guedel; (B) posição final.
Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 1.10 - Etapas para a colocação da cânula orofaríngea


Legenda: (A) escolhendo o tamanho do Guedel; (B) colocando a cânula com a
concavidade voltada cranialmente, com tração anterior da mandíbula; (C) a cânula
é rodada em 180° enquanto é introduzida; (D) posicionamento final da cânula.
Fonte: acervo Medcel.

1.4.2 Cânula nasofaríngea


É de grande utilidade entre pacientes com trismo, mordedura,
reflexo nauseoso exacerbado ou trauma maxilofacial. O uso deve
ser cauteloso na suspeita de fratura da base do crânio. Entre os
mais despertos, essa cânula é mais bem tolerada. Quando muito
longa, pode desencadear tosse, náuseas ou vômitos. É um tubo
de borracha bastante flexível, de aproximadamente 15 cm de
comprimento. A extremidade distal posiciona-se na faringe
posterior, e a proximal fica na altura da narina, permitindo que o ar
atinja o trato respiratório inferior.
Figura 1.11 - Cânula nasofaríngea

1.4.3 Tubo laríngeo


Trata-se de um dispositivo invasivo da via aérea com lúmen
simples e tem diversos tamanhos, sendo escolhido a partir do
peso presumido do paciente. A principal vantagem é a inserção
“às cegas”, pela cavidade oral, sem o auxílio de nenhum
instrumento. Veio em substituição ao Combitube, que não é mais
comercializado. O dispositivo apresenta dois cuffs: um menor e
distal, que fica posicionado no esôfago, e outro maior, proximal,
que fica posicionado na hipofaringe. Entre os cuffs existe a
abertura da luz do tubo laríngeo. Quando os cuffs são insuflados,
o espaço entre eles é selado, e o ar consegue ser insuflado
indiretamente pela glote aos pulmões, de forma semelhante ao
uso da máscara laríngea.
Figura 1.12 - Tubo laríngeo

Legenda: tubo laríngeo com o cuff distal o proximal e a abertura para passagem
do ar entre eles.
Fonte: Marcin Domagala.

1.4.4 Máscara laríngea


Trata-se de um dispositivo supraglótico para ventilação pulmonar,
composto por um tubo na porção proximal e por uma máscara
com balonete na porção distal (Figura 1.14 - A). O tubo é
introduzido “às cegas” pela faringe, até que uma resistência seja
percebida quando a sua porção distal se encontra na hipofaringe
(Figura 1.14 - B). Equivale ao tubo endotraqueal em termos de
ventilação, porém não oferece proteção a broncoaspirações. Na
maioria das tentativas, há sucesso na ventilação, no entanto são
necessárias alternativas para suporte da via aérea em caso de
insucesso.
#importante
A máscara laríngea é útil nos casos em
que há a necessidade do controle da via
aérea por curtos períodos e tem a
vantagem de dispensar o laringoscópio
para a sua inserção, além da rapidez e da
praticidade na sua utilização.

Complicações associadas incluem inadequação de ventilação por


acoplamento inapropriado à via aérea, regurgitação e aspiração
de conteúdo gástrico (Figura 1.13) Um dispositivo derivado é a
máscara fast track, que, além de permitir o controle da via aérea,
possibilita a sua troca por tubo traqueal, como mostrado na
Figura 1.14.
Figura 1.13 - Máscara laríngea
Fonte: (A) Michael Pervak; (B) Narin phapnam.

Figura 1.14 - Máscara laríngea fast track


Nota: após sua aplicação, este dispositivo permite a intubação do paciente sem a
visualização direta da via aérea.
Fonte: Endotracheal Intubation in Children: Practice Recommendations, Insights,
and Future Directions, 2018.

Figura 1.15 - Posicionamento adequado em duas visões diferentes


Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 1.16 - Etapas da aplicação da máscara


Legenda: (A) desinsuflar o cuff completamente com uma seringa; (B) colocar o
dedo indicador próximo ao cuff (segurar a máscara como um lápis); (C) estender a
cabeça do paciente e iniciar a aplicação da máscara; (D) a máscara deve seguir a
curvatura natural, sempre guiada pelo dedo indicador; (E) com a outra mão,
estabilizar a máscara; (F) após colocá-la, insuflar o cuff para estabilizá-la.
Fonte: Airway Management, 2012.

1.4.5 Tubo traqueal


Durante o atendimento em emergências, quando é necessária a
ventilação assistida, é comum a insuflação gástrica, que pode
desencadear vômito, aspiração e até mesmo restrição
respiratória pela distensão do diafragma. Desta forma, a
colocação da via aérea definitiva (tubo endotraqueal, máscara
laríngea ou tubo laríngeo) torna-se imprescindível. Uma via aérea
definitiva implica sonda endotraqueal com balonete (cuff)
insuflado (ou outro dispositivo invasivo de via aérea, como a
máscara laríngea ou tubo laríngeo), conectada a um sistema de
ventilação assistida, com mistura enriquecida de oxigênio, e
mantida em posição por meio de fixação apropriada.
A intubação orotraqueal é a técnica mais eficaz para a proteção e
o controle das vias aéreas, e a preferência pelo tubo traqueal
existe pelos seguintes fatores: permite a administração de
frações elevadas de oxigênio, mantém a via aérea pérvia, permite
a administração de algumas drogas por meio da via aérea
(Vasopressina, Atropina, Naloxona, Epinefrina e Lidocaína —
VANEL) e protege a via aérea da aspiração gástrica ou de
secreções ou sangue da orofaringe. Apesar de ser possível a
administração de drogas por essa via, alternativas como o acesso
intraósseo são melhores e mais efetivas para a administração
destas e de outras drogas em condições de emergência,
tornando essa via de administração obsoleta e em desuso.
As indicações para a intubação envolvem situações em que é
impossível ventilar adequadamente o paciente inconsciente com
outros dispositivos e situações em que não há reflexos de
proteção da via aérea (coma ou parada cardiorrespiratória).
Figura 1.17 - Tubo traqueal com fio-guia

Fonte: site Dahlhausen.

A intubação traqueal deve ser sempre precedida de


hiperoxigenação. Quando o paciente ventila espontaneamente, a
oxigenação deve ocorrer durante 3 minutos; quando a ventilação
é ineficiente, é necessária a ventilação com bolsa-valva-máscara
para garantir a hiperoxigenação. A tentativa de intubação não
deve exceder 30 segundos. Caso seja necessária nova tentativa,
é preciso novo período de ventilação e oxigenação. O tamanho do
diâmetro interno do tubo que serve para a maioria dos homens é
de 8 a 8,5 mm e de 7 a 7,5 mm para a maioria das mulheres. O uso
de fio-guia é opcional e recomendado para os mais inexperientes.
É importante lembrar que, quando utilizado, não deve ultrapassar
o limite distal da cânula, por causa do risco de lesão mecânica da
via aérea. A posição mais favorável para a visualização das cordas
vocais é a “do farejador”, em que há hiperextensão cervical e
projeção anterior da cabeça (Figura 1.19). Essa posição favorece o
alinhamento dos planos oral, faríngeo e laríngeo, facilitando a
visualização do espaço glótico (Figura 1.20). A colocação de coxim
suboccipital também favorece a visualização da glote durante a
laringoscopia. Mais adiante, a técnica de laringoscopia será
descrita. O balonete é então insuflado com o volume adequado
para o tubo em questão, com a percepção da boa vedação da via
aérea com a parada do som de escape de ar.
Figura 1.18 - Alinhamento dos planos
Fonte: acervo Medcel.

Figura 1.19 - Posição ideal (“do farejador”) para a intubação orotraqueal


Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 1.20 - Anatomia das vias aéreas


Fonte: Designua e Soleil Nordic.
Após a inserção do tubo, a confirmação da colocação correta na
via aérea deve ser feita por meio das avaliações primária e
secundária, visando identificar rapidamente a intubação
esofágica. A avaliação primária envolve a ausculta das seguintes
regiões durante a insuflação com dispositivo bolsa-valva, nesta
ordem: epigástrio, base do hemitórax esquerdo, base do
hemitórax direito, ápice direito e ápice esquerdo. Essa sequência
se justifica pela necessidade do reconhecimento imediato da
intubação esofágica e pela maior frequência de intubação
seletiva de brônquio-fonte direito, determinando a ausência de
murmúrio vesicular à esquerda. Outro sinal importante é a
observação da condensação de vapor d’água na parede do tubo
na expiração do paciente.
A checagem secundária da colocação correta e da manutenção
da via aérea definitiva no local correto deve ser realizada por meio
da detecção de CO2 e deve ser feita por meio da colocação de
capnógrafo acoplado ao tubo. Os métodos de detecção
qualitativa (detectores descartáveis de CO2) ou detectores de
intubação esofágica com a aplicação de pressão negativa na
cânula traqueal não são mais indicados como métodos de
checagem secundária da intubação.
Figura 1.21 - Progressão do laringoscópio na intubação traqueal para visualização
da glote
Fonte: acervo Medcel.

1.5 INDICAÇÕES DE INTUBAÇÃO


ENDOTRAQUEAL
Há várias indicações para a intubação endotraqueal: desde a
ventilação dos que serão submetidos a cirurgia de rotina até
quadros agudos que levam a insuficiência respiratória e
necessitam dessa prática na urgência. As principais indicações
são:
▶ Perda de reflexos de proteção das vias aéreas, com risco de
aspiração (Glasgow menor ou igual a 8):
▷▷ Lesão neurológica (trauma cranioencefálico, acidente vascular
cerebral, doenças degenerativas etc.);
▷▷ Choque anafilático, edema de glote;
▷▷ Intoxicação exógena (álcool, drogas).
▶ Obstrução aguda das vias aéreas (na impossibilidade por via
aérea difícil, considerar via aérea cirúrgica);
▶ Trauma (mandíbula, laringe);
▶ Lesão inalatória (direta ou indireta), incluindo inalação de gases
tóxicos ou aquecidos;
▶ Aspiração de corpo estranho;
▶ Hematomas;
▶ Tumores de cabeça e pescoço;
▶ Infecções;
▶ Epiglotites em geral;
▶ Abscessos retrofaríngeos;
▶ Insuficiência respiratória aguda;
▶ Broncoespasmo (crise de asma, exacerbação da doença
pulmonar obstrutiva crônica);
▶ Pneumonias;
▶ Lesões aspirativas (pneumonite química);
▶ Edema agudo de pulmão (cardiogênico, hipertensivo);
▶ Hipoventilação (lesão neurológica, doenças neuromusculares,
falência muscular);
▶ Complicações mecânicas (pneumotórax, atelectasias,
hipersecreção pulmonar).
1.6 VIA AÉREA DIFÍCIL
Por via aérea difícil compreende-se a situação na qual um médico
treinado tem dificuldades na ventilação manual sob máscara
facial, na intubação traqueal ou em ambas. A ventilação difícil sob
máscara é aquela em que é impossível manter saturação arterial
de oxigênio acima de 90%, mesmo com suporte de oxigênio a
100% e ventilação com bolsa-valva-máscara em um paciente cuja
saturação é normal. Além disso, inclui a impossibilidade de evitar
cianose, ausência de CO2 exalado, ausência de expansibilidade
torácica ou distensão gástrica durante a ventilação com pressão
positiva. A laringoscopia difícil é definida pela impossibilidade de
visualização completa das pregas vocais. A intubação
endotraqueal difícil ocorre quando há a necessidade de mais de
três tentativas ou duração superior a 10 minutos para obter o
correto posicionamento do tubo traqueal, utilizando-se da
laringoscopia convencional. Para ser considerado experiente no
manejo de vias aéreas, um médico deve ter mais de três anos de
prática nesse procedimento.
O reconhecimento da via aérea difícil começa por anamnese
completa, utilizando-se história, exame físico e condições atuais
do paciente. Muitas vezes, no atendimento de emergência, não há
tempo hábil para realizar essa avaliação. No entanto, quando
possível, deve ser aplicada com atenção especial para as
seguintes características: história prévia de cirurgia ou trauma na
região cervical, dispneia, disfagia e intubação difícil prévia são
indicadores de possíveis problemas na abordagem da via aérea.
Quadro 1.1 - Exame físico
1.6.1 Parâmetros clínicos para identificar uma possível
via aérea difícil
1.6.1.1 Classificação de Mallampati

Baseia-se no grau de exposição da úvula e dos pilares


amigdalianos durante a abertura da cavidade oral (Figura 1.22),
além de relacionar o tamanho da língua com a orofaringe. A
manobra deve ser realizada solicitando abertura da cavidade oral,
colocando a língua para fora sem vocalizar nenhum som. As
escalas III e IV de Mallampati indicam maior probabilidade de via
aérea difícil.
Figura 1.22 - Classificação de Mallampati
Fonte: Jmarchn.
Quadro 1.2 - Classificação de Mallampati

1.6.1.2 Distância tireoide-mento

Avalia a distância entre a cartilagem tireoide e o mento. Quando


essa distância for menor do que 6 cm ou menor do que três dedos
do examinador, provavelmente será impossível visualizar a laringe
durante a intubação.
Figura 1.23 - Distância tireoide-mento
Fonte: acervo Medcel.

1.6.1.3 Distância interincisivos

Avalia a capacidade de abertura da articulação


temporomandibular, introduzindo-se três dedos do examinador
na linha média da cavidade oral (Figura 1.24). Quando somente um
ou dois dedos ocupam o espaço, considera-se laringoscopia
direta difícil.
Figura 1.24 - Distância interincisivos

Fonte: acervo Medcel.

1.6.1.4 Distância esterno-mento

Quando a distância entre esses dois pontos é menor do que 12,5


cm, com extensão cervical completa e a boca fechada, a via aérea
é difícil.
São fatores associados a intubação difícil:
▶ Macroglossia;
▶ Obesidade;
▶ Mallampati III e IV;
▶ Distância tireoide-mento menor que 6 cm;
▶ Trauma de face (fratura de mandíbula);
▶ Colar cervical/impossibilidade de mobilização cervical
(imobilidade do pescoço);
▶ Treinamento inadequado;
▶ Obstrução tumoral/hematomas.

1.6.1.5 Classificação de Cormack e Lehane

Esta classificação só é possível durante a laringoscopia, pois


avalia o quanto da glote é visualizada durante o procedimento
(Figura 1.25). Cormack e Lehane I ou II não adicionam dificuldade
ao procedimento. Os níveis III e IV relacionam-se com maior
dificuldade de intubação.
Figura 1.25 - Classificação de visão laringoscópica direta segundo Cormack e
Lehane
1.6.1.6 Mordida do lábio superior

A mobilidade anterior da mandíbula pode ser avaliada solicitando-


se ao paciente para morder o lábio superior. A limitação da
mordida classe III (impossibilidade de morder o lábio superior) é
sugestiva de uma via aérea difícil.
Figura 1.26 - Classes de mordida do lábio superior

Fonte: adaptado de Predicting difficult intubation: A comparison between upper


lip bite test (ULBT) and Modified Mallampati test (MMT), 2019.

1.6.1.7 Classificação de Cormack e Lehane

Quando a via aérea difícil é encontrada, recomenda-se a


observação da Figura 1.27.
Figura 1.27 - Conduta em caso de via aérea difícil
Fonte: elaborado pelo autor.

Quando há a impossibilidade de ventilação ou de intubação, deve-


se seguir o disposto na Figura 1.28.
Figura 1.28 - Conduta em caso de falha da ventilação/intubação
1 Ventilação transtraqueal a jato (VTTJ): punção cricoide associada ao dispositivo
(pistola) de fluxo de oxigênio a baixa pressão e alto volume.
2 Laringoscopia direta com outras lâminas, intubações nasal ou oral, fio-guia,
fibroscopia, intubação retrógrada ou cricotireostomia por punção. A VTTJ é uma
opção transitória de via aérea, sendo necessária outra forma de suporte
ventilatório em curto prazo (de 20 a 30 minutos); deve-se realizar, por exemplo, a
cricotireostomia.
Fonte: elaborado pelo autor.

Existe outra abordagem da via aérea difícil sugerida pela Difficult


Airway Society, que organiza de forma semelhante os passos para
resolução do problema, conforme descrito na Figura 1.29.
Figura 1.29 - Abordagem da via aérea difícil não reconhecida
Fonte: elaborado pelo autor.

#importante
O planejamento, o preparo e a pronta
disponibilização para as alternativas de
progressão entre os planos A, B, C e D
são essenciais para a abordagem da via
aérea potencialmente difícil.

Outra abordagem estruturada sugerida recentemente para a via


aérea envolve o conceito de vórtex ou espiral da via aérea.
Entende-se que o paciente parta de uma zona segura para ele
antes da intubação, vá para a ventilação por máscara facial,
progrida para tentativa de intubação traqueal ou máscara laríngea
e, em caso de insucesso, chegue à abordagem cirúrgica da via
aérea. Apesar das várias propostas de abordagem da via aérea,
todas envolvem a sequência de abordagem com intenção de
intubação traqueal seguida de dispositivo supraglótico em caso
de falha e cricostomia como medida final de resgate.

Você sabe quais são as


pistas para identificar
uma via aérea difícil para
intubação?
Lembre-se de utilizar os critérios a seguir, quando
possível, para identificar maior probabilidade de
dificuldades na intubação:
▶ Macroglossia;
▶ Obesidade;
▶ Mallampati III e IV;
▶ Distância tireoide-mento menor que 6 cm;
▶ Mordida labial;
▶ Trauma de face (fratura de mandíbula);
▶ Colar cervical/impossibilidade de mobilização cervical
(imobilidade do pescoço);
▶ Treinamento inadequado;
▶ Obstrução tumoral/hematomas.
Comissão Estadual de Residência Médica da Bahia
Para a prova do CEREM-BA, o candidato irá encontrar 25
situações-problema, cada uma delas com três questões de
múltipla escolha. Como na maioria dos processos seletivos, são
abordadas cinco áreas de conhecimento: Clínica Médica, Cirurgia
Geral, Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria e Medicina Preventiva e
Social, com questões mistas, entre casos clínicos e perguntas
mais específicas, de “rodapé de livro”.
Estude com atenção os temas: Sistema Único de Saúde (SUS),
atenção primária à saúde e Estratégia Saúde da Família, estudos
epidemiológicos, Medicina Legal, medidas de frequência,
desenvolvimento, síndrome dos ovários policísticos, atendimento
inicial ao politraumatizado, trauma torácico e Medicina de Família
e Comunidade. Esses temas costumam aparecer com mais
frequência nas provas.
CEREM-BA | 2021
Paciente, sexo feminino, 30 anos de idade, vítima de queimadura
após explosão de botijão de gás dentro da cozinha, há uma hora, é
trazida ao Hospital Geral pelo SAMU. No exame inicial, A: Via
aérea pérvia, presença de hiperemia em orofaringe, mantido colar
cervical, SatO2: 91% com cateter de O2 15L/min; B: murmúrios
vesiculares diminuídos em base à direita, com roncos
bilateralmente, FR: 20 ipm; C: Bulhas rítmicas e normofonéticas,
FC: 88 bpm, PA: 112 x 72 mmHg, abdome indolor à palpação, pelve
estável e toque retal sem alterações; D: escala de coma de
Glasgow = 15, pupilas isocóricas e fotorreagentes; E: presença de
queimadura de segundo grau profundo em região anterior da
cabeça e pescoço, região anterior do tronco e região anterior do
membro superior esquerdo; queimadura de terceiro grau em
região anterior e posterior do membro superior direito. Diante
desse caso clínico, determine a primeira conduta terapêutica que
deve ser instituída.
a) toracostomia com drenagem em selo d’água à direita
b) intubação orotraqueal
c) lavagem das feridas e curativo com sulfadiazina de prata
d) reposição volêmica com ringer lactato
Gabarito: b
Comentários:
a) Não há evidência de pneumotórax ou hemotórax para indicar
drenagem torácica de urgência. No exame físico do enunciado, diz
apenas que os murmúrios estão diminuídos em base direita.
b) A lesão térmica da faringe e da via aérea provoca edema e
obstrução seguida de insuficiência respiratória. Caso se retarde a
intubação, o edema de via aérea será tão intenso que impedirá a
intubação orotraqueal e apenas restará outras formas de acessar
via aérea como cricotireoidostomia ou traqueostomia. São
indicações adicionais de IOT precoce: queimadura acima de 40 a
50% da superfície corporal, queimadura facial extensa e/ou
profunda, queimadura da mucosa oral, disfagia, sonolência,
rouquidão e estridor. Esta paciente do caso tem queimadura
extensa da cabeça e pescoço, e hipoxemia com necessidade de
administração de alta concentração de oxigênio suplementar,
roncos na ausculta - todos preditivos de edema de via aérea e
necessidade de intubação imediata.
c) Este cuidado com as feridas deve sim ser realizado porém não
neste momento inicial da abordagem do grande queimado. As
primeiras medidas devem sempre seguir a ordem ABC: primeiro
garantir vias aéreas, depois ventilação, em terceiro lugar
reposição volêmica para compensação hemodinâmica e apenas
após o cuidado com as feridas.
d) Reposição volêmica agressiva deve sim ser realizada em todo
grande queimado, porém a medida inicial e mais importante é
sempre garantir a patência da via aérea (neste caso do enunciado,
com intubação orotraqueal) pois a insuficiência respiratória pode
causar óbito em curto período de tempo.

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