material, Interpretação e Síntese. EXEMPLO: EXEMPLO: INTERPRETAÇÃO:
Algumas das obras de Wegman são indiscutivelmente
adoráveis, inclusive as fotos de lindos filhotes de cães que não só aparecem nas coleções de museus como estão disponíveis em calendários, cartões e camisetas. Uma arte que é tão facilmente apreciada pelo público precisa de interpretação? Tais esforços de interpretação produzem revelações que valem a pena?
Os críticos que escrevem sobre a obra de Wegman
frequentemente incluem informações biográficas sobre o artista e seus animais. Em geral, é verdade que os críticos modernos oferecem mais informações contextuais sobre os artistas e como sua obra evoluiu do que faziam os críticos de 50 anos atrás, que focavam principalmente (se não exclusivamente) na própria obra de arte. Apesar de tudo, os críticos contemporâneos acham particularmente interessante a vida de Wegman. Eles costumam perceber na obra do artista uma relação entre ele e seus cães que faz você desejar conhecer melhor a vida de ambos, ou sua obra os deixa especialmente curiosos em relação ao seu criador.
Embora todos estes críticos interpretem a obra de
Wegman, eles também reconhecem que não a entendem perfeitamente e que ela não é totalmente compreensível. Jerry Saltz escreve que “em cada uma das técnicas [fotografia, vídeo, desenho e pintura], o significado jamais é exatamente localizado ou enfaticamente estabelecido. Os objetos e as situações cotidianas são examinados e invertidos de modo confuso. Uma confusão de referências, piadas e intenções improvisadas espera pelo observador desavisado, pronta para lhe pegar. De certo modo, Wegman subverte aquilo que nos é familiar, sem ser pedante ou didático. Tudo isso contribui para produzir um prazer frequentemente inexplicável mas esteticamente palpável em sua obra.”14 Quais conclusões podem ser tiradas desses textos que interpretam a obra de William Wegman? Em primeiro lugar (e provavelmente o que é mais importante de tudo), a obra de Wegman, que parece ser transparente e que, sem dúvida, é cômica, tem merecido uma atenção considerável por parte de vários críticos. Os temas de sua obra identificados por esses críticos são o “antidesign” de um ego sobre outro e o “antidesign” em relação à técnica estética dos primeiros vídeos e fotografias em preto e branco do artista. Os críticos consideram a estética de sua obra posterior, com fotografias Polaroid coloridas, impecável. Eles interpretam que a obra seja misteriosa e sobre o mistério do Outro. Todos consideram que a obra de Wegman faça comentários sobre a arte e a fotografia e interpretam as Polaroids como fotografias sobre as fotografias de moda e publicidade. Assim, até mesmo a arte que pode ser apreciada no The Tonight Show pode ser interpretada de modo sério por críticos profissionais. Qualquer obra de arte pode tanto gerar como aceitar múltiplas conjecturas sobre seu significado. A obra de Wegman é um bom exemplo desse princípio. Sua arte imediatamente prende a atenção das crianças que a veem em Vila Sésamo e dos críticos de psicanálise que lhe fazem leituras muito mais profundas. Os espectadores do Late Show de David Letterman apreciam os vídeos e as fotos de Wegman, assim como os leitores da revista Artforum. Os significados das obras de Wegman não apenas podem ser descobertos (em um sentido arqueológico): eles também são gerados por observadores ativos, engajados e articulados. Nenhum destes críticos afirma entender totalmente a obra de Wegman. Suas admissões suportam outro princípio: nenhuma intepretação única exaure os significados que podem ser revelados em uma obra de arte. As interpretações são argumentos persuasivos. Esse princípio talvez possa ser melhor descrito se dividido em dois: as interpretações são argumentos, e os críticos tentam ser persuasivos. Como os críticos buscam ser persuasivos, suas interpretações raramente saltam aos olhos como argumentos lógicos com premissas que levam a uma conclusão. Os críticos realmente se baseiam em evidências para fazer suas interpretações, sejam elas obtidas de observações feitas sobre a obra de arte sejam de informações sobre o mundo e o artista. Mas eles apresentam suas interpretações como se fossem ensaios literários e persuasivos, não como argumentos lógicos. Assim, as interpretações podem (e devem) ser analisadas como argumentos, para que vejamos se são persuasivas, em função tanto das evidências que apresentam como da linguagem pela qual são escritas.
Algumas interpretações são melhores do que outras. Esse
princípio vai contra uma objeção que muitas vezes ouvimos – “Essa é apenas sua interpretação” – que em geral significa que nenhuma interpretação é melhor do que as outras e, além disso, que nenhuma interpretação está mais correta do que as outras. Muito pelo contrário: as interpretações não são todas iguais. Algumas interpretações têm argumentos melhores, são mais bem embasadas em evidências e, portanto, mais razoáveis, mais corretas e mais aceitáveis do que outras. Algumas interpretações realmente não são muito boas porque são subjetivas demais, muito restritas, não consideram suficientemente o que está na obra de arte, são irrelevantes à obra, não levam em conta o contexto no qual a obra foi criada ou simplesmente não fazem sentido.
As boas interpretações da arte falam mais sobre a obra de
arte do que sobre o crítico. As boas interpretações claramente pertencem ao mundo da arte. Os críticos entram no mundo da arte com seus próprios históricos, conhecimentos, crenças e preconceitos, que podem e devem afetar o modo como veem uma obra de arte. Todas as interpretações revelam algo sobre o crítico. Mas o crítico também deve mostrar ao leitor que sua interpretação se aplica àquilo que todos nós podemos perceber na obra de arte ou sobre ela. Este princípio se protege das interpretações que são subjetivas demais – isto é, que nos falam mais do crítico do que da obra de arte.
Os sentimentos são guias das interpretações. Com esta
discussão sobre as razões e evidências e os argumentos convincentes e persuasivos e a prevalência da objetividade em relação à subjetividade na interpretação da arte, corremos o risco de perder de vista o fato de que os sentimentos também são importantes para o entendimento da arte. A habilidade de uma pessoa em responder a uma obra de arte é tão emocional quanto intelectual, tão visceral quanto mental. A dicotomia entre pensamento e sentimento é falsa; pelo contrário, pensamento e sentimento estão inevitavelmente relacionados entre si. Se um crítico tem uma sensação visceral ou uma forte resposta emocional, é importante que ele articule isso por meio da linguagem, de modo que os leitores possam compartilhar tais sentimentos. Também é importante que o crítico relacione o sentimento àquilo que está na obra de arte. Um sentimento que não se refere à obra pode ser irrelevante ou considerado como tal. A relação entre o sentimento visceral e aquilo que é evocado pela obra de arte é crucial.
Pode haver interpretações diferentes, concorrentes e
antagônicas de uma mesma obra. Este princípio reconhece que uma obra de arte pode gerar muitas interpretações boas e distintas. As interpretações também podem competir entre si, encorajando o leitor a fazer uma escolha entre elas, especialmente se forem contraditórias. Este princípio também incentiva uma variedade de interpretações por parte de uma diversidade de observadores e pontos de vista. Ele valoriza uma obra de arte como um rico repositório de expressão que permite uma grande variedade de respostas. Apesar dessa apreciação da diversidade, talvez não seja logicamente possível para uma pessoa fazer todas as interpretações sobre uma obra, caso tais interpretações sejam mutuamente exclusivas ou contraditórias.
As interpretações frequentemente se baseiam em uma visão
de mundo e teoria da arte específicas. Todos nós vivemos com um conjunto mais ou menos articulado de pressupostos sobre a condição humana e a arte, e é por meio desses que interpretamos tudo. Alguns críticos têm uma visão de mundo e teoria estética mais bem articuladas e coerentes do que outros, baseadas, por exemplo, no estudo da filosofia ou psicologia. Às vezes os críticos tornam explícitas suas suposições básicas, mas, na maioria das vezes, as deixam implícitas. Uma vez identificada a visão de mundo do crítico – esteja ela explícita ou não – precisamos fazer uma escolha: aceitamos a visão de mundo e a interpretação de que ela influencia ou rejeitamos tanto a visão de mundo e a interpretação; aceitamos a visão de mundo mas discordamos de como ela é aplicada à obra de arte, ou rejeitamos a visão de mundo geral mas aceitamos a interpretação específica que ela gera.
Uma obra de arte não trata necessariamente daquilo que o
artista queria que ela tratasse. Minor White, fotógrafo e professor de fotografia, certa vez comentou que os fotógrafos costumam fotografar melhor do que imaginam. Ele estava nos advertindo sobre o problema de prestar atenção excessiva naquilo que os fotógrafos diziam sobre sua obra. Em função de sua experiência com a condução de muitas oficinas de fotografia, ele sentia que as obras dos artistas muitas vezes eram bem diferentes daquilo que os fotógrafos pensavam – e inclusive eram melhores do que eles pensavam. Portanto, White minimizava a importância das interpretações que os artistas davam às suas próprias obras.
Um crítico não deve ser o porta-voz do artista. Isso significa
que o crítico deveria fazer muito mais do que meramente transcrever o que o artista disse sobre sua obra. Exige que os críticos critiquem. As interpretações devem apresentar a obra do modo mais favorável possível. Este princípio está de acordo com o espírito do “jogo limpo”, da generosidade de espírito e do respeito pelo rigor intelectual. O repúdio feito à obra de um artista por parte de um crítico é um exemplo contrário deste princípio. O objeto das interpretações são as obras de arte, não os artistas. Em uma conversa informal sobre a arte, são os artistas que frequentemente são interpretados e julgados, em vez de suas obras. Contudo, na crítica de arte, o que deveria ser interpretado e julgado são os objetos (as obras), não as pessoas que os fizeram. Este princípio não exclui as informações biográficas. Neste capítulo, muitas vezes os críticos citados mencionaram as vidas dos artistas. Essas informações biográficas, no entanto, buscam o esclarecimento das obras.
Toda obra de arte é, em parte, sobre o mundo no qual surgiu.
Toda arte é, em parte, sobre outra arte.
A interpretação é, em última análise, uma tarefa comum, e a
comunidade também é, em última análise, autocorretiva. Esta é uma visão otimista do mundo da arte e dos eruditos que sustentam que os críticos, historiadores e outros intérpretes sérios em determinado momento corrigirão interpretações não tão adequadas e oferecerão outras leituras melhores. Isso acontece tanto no curto como no longo prazo. Os textos apresentados em catálogos de exposição de obras de arte contemporânea podem parecer compilações feitas por estudiosos das melhores ideias sobre a obra de um artista até aquele momento. Um catálogo de exposição de uma retrospectiva histórica de um artista falecido é uma compilação das melhores ideias sobre a obra daquele artista feitas até então. Tal interpretação histórica nos daria interpretações mais plausíveis e rejeitaria aquelas menos instrutivas.
As boas interpretações nos convidam a ver com nossos
próprios olhos e a continuar por conta própria. Esse princípio complementa o anterior, mostrando uma motivação psicológica para que nos envolvamos com o significado na arte. Ele também pode servir como um objetivo para os intérpretes: seja simpático com os leitores, chamando a atenção deles e os envolvendo em uma conversa, em vez de impedindo a discussão fazendo pronunciamentos dogmáticos.