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ESCOLA DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Turma: CPIV A 12023


Disciplina/Matéria: DIREITO PENAL
Sessão: 06 - Dia 03/05/2023 - 08:00 às 09:50
Professor: ELISA RAMOS PITTARO NEVES

06 Tema: Da Periclitação da Vida e da Saúde I. 1) Considerações gerais: a) Definição de perigo.


Teorias; b) A subsidiariedade em relação aos crimes de dano. Bem jurídico tutelado; c) Diferença
entre crimes de perigo abstrato e concreto; d) Diferença entre crimes de perigo individual e crimes
de perigo comum; e) O elemento subjetivo nos crimes de perigo individual. 2) Crimes de perigo
individual (artigos 130 a 132 do CP): sujeitos do delito. Tipicidade objetiva e subjetiva. 3)
Aspectos controvertidos. 4) Concurso de crimes. 5) Pena e ação penal.

1ª QUESTÃO:
CAIO, sabendo que determinada prostituta já tinha apresentado, antes, quadro de moléstia venérea,
mantém com ela relação sexual, sem adotar qualquer medida protetiva. Posteriormente, se relaciona
sexualmente com sua companheira.
a) Realizou CAIO algum tipo penal?
A solução se alteraria, caso:
b) A companheira de CAIO fosse imune à doença ou consentisse no contágio?
Fundamente as suas respostas.

RESPOSTA:
a) O relacionamento sexual com prostituta não acarreta, em regra, contágio de moléstia venérea.
Portanto não se apresentam os elementos subjetivos: "que sabe ou deve saber". Pelo simples fato de
haver mantido contato com mulher pública, não está o agente obrigado a presumir seu estado de
contaminação, de modo a ver-se jungido a abstenções, até plena comprovação de sua higidez sexual.
O fato de CAIO saber que a prostituta já tinha apresentado, antes, quadro de moléstia venérea, há
incremento da vinculação subjetiva de CAIO, mas ainda não se realiza o tipo do artigo 130, CP,
porque é preciso que se comprove que o réu sabia ou deveria saber de sua contaminação.

b) Sendo o crime de perigo concreto, o fato de a vítima ser imune à doença ou já estar contaminada
afasta a tipicidade do comportamento. Os crimes de perigo concreto admitem a prova em contrário.
É irrelevante que a ofendida tenha conhecimento de que CAIO encontra-se contaminado e aceite o
risco de contágio. A vítima estará colocando em risco a saúde pública, pois poderia tornar-se veículo
de contágio.

2ª QUESTÃO:
J, portador do vírus da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS), ciente de sua condição
clínica, resolve ter relações sexuais, sem uso de qualquer preservativo, com M, pessoa que não
possuía a referida moléstia ao tempo da ação, sem se importar com o perigo de contágio - assumindo,
portanto, o risco da transmissão.
Aproximadamente dois meses após a única cópula, M descobriu por meio de amigos em comum que
João era soropositivo, fato que a desesperou. Feito o teste, descobriu que passara a ser portadora da
doença.
Qual foi a conduta típica praticada por J? Justifique.

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RESPOSTA:
STJ: HC 160982 / DF - Ministra LAURITA VAZ - Julgado em 17/05/2012:

HABEAS CORPUS. ART. 129, § 2.º, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL. PACIENTE
QUE TRANSMITIU ENFERMIDADE INCURÁVEL À OFENDIDA (SÍNDROME DA
IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA). VÍTIMA CUJA MOLÉSTIA PERMANECE
ASSINTOMÁTICA. DESINFLUÊNCIA PARA A CARACTERIZAÇÃO DA CONDUTA.
PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA UM DOS CRIMES PREVISTOS NO CAPÍTULO
III, TÍTULO I, PARTE ESPECIAL, DO CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE.
SURSIS HUMANITÁRIO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DAS INSTÂNCIAS
ANTECEDENTES NO PONTO, E DE DEMONSTRAÇÃO SOBRE O ESTADO DE SAÚDE DO
PACIENTE. HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO,
DENEGADO.
1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 98.712/RJ, Rel.
Min. MARCO AURÉLIO (1.ª Turma, DJe de 17/12/2010), firmou a
compreensão de que a conduta de praticar ato sexual com a finalidade
de transmitir AIDS não configura crime doloso contra a vida. Assim
não há constrangimento ilegal a ser reparado de ofício, em razão de
não ter sido o caso julgado pelo Tribunal do Júri.
2. O ato de propagar síndrome da imunodeficiência adquirida não é
tratado no Capítulo III, Título I, da Parte Especial, do Código
Penal (art. 130 e seguintes), onde não há menção a enfermidades sem
cura. Inclusive, nos debates havidos no julgamento do HC 98.712/RJ,
o eminente Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, ao excluir a possibilidade
de a Suprema Corte, naquele caso, conferir ao delito a classificação
de "Perigo de contágio de moléstia grave" (art. 131, do Código
Penal), esclareceu que, "no atual estágio da ciência, a enfermidade
é incurável, quer dizer, ela não é só grave, nos termos

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doart.
131".
3. Na hipótese de transmissão dolosa de doença incurável, a conduta
deverá será apenada com mais rigor do que o ato de contaminar outra
pessoa com moléstia grave, conforme previsão clara do art. 129, §
2.º inciso II, do Código Penal.
4. A alegação de que a Vítima não manifestou sintomas não serve para
afastar a configuração do delito previsto no art. 129, § 2, inciso
II, do Código Penal. É de notória sabença que o contaminado pelo
vírus do HIV necessita de constante acompanhamento médico e de
administração de remédios específicos, o que aumenta as
probabilidades de que a enfermidade permaneça assintomática. Porém,
o tratamento não enseja a cura da moléstia.
5. Não pode ser conhecido o pedido de sursis humanitário se não há,
nos autos, notícias de que tal pretensão foi avaliada pelas
instâncias antecedentes, nem qualquer informação acerca do estado de
saúde do Paciente.
6. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa extensão, denegado.
(*) Questão e gabarito mantidos em razão do memorando interno n.º 150/2017

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Turma: CPIV A 12023


Disciplina/Matéria: DIREITO PENAL
Sessão: 07 - Dia 03/05/2023 - 10:10 às 12:00
Professor: ELISA RAMOS PITTARO NEVES

07 Tema: Da Periclitação da Vida e da Saúde II. O crime de rixa. 1) Crimes de perigo individual
(artigos 133 a 136 do CP): sujeitos do delito. Tipicidade objetiva e subjetiva. 2) Aspectos
controvertidos. 3) Concurso de crimes. 4) Pena e ação penal. 5) O crime de rixa: a) Considerações
gerais; b) Definição e evolução histórica. Bem jurídico tutelado. Sujeitos do delito. Tipicidade
objetiva e subjetiva; c) Aspectos controvertidos.

1ª QUESTÃO:
CAIO, em viagem para Curitiba, observa, à margem da rodovia, um ciclista ferido, ao que tudo
indica, vítima de atropelamento. O local é deserto e CAIO resolve seguir viagem, com receio de ser
responsabilizado pelo atropelamento.
a) Realizou CAIO algum tipo penal?
A solução se alteraria, caso:
b) CAIO tivesse observado que outro motorista estava parando para socorrer a vítima?
c) CAIO fosse médico ou policial?
d) CAIO estivesse parando para socorrer a vítima e surgissem várias pessoas armadas, dizendo que
iriam linchá-lo, por acreditarem que ele era o atropelador?

RESPOSTA:
a) Sim. A hipótese encontra tipicidade no artigo 135 do CP. A hipótese é dolosa, porque CAIO supôs
corretamente que o ciclista estava ferido e dolosamente deixou de prestar assistência à pessoa ferida,
sendo-lhe possível fazê-lo sem risco pessoal.
b) A obrigação de prestar socorro é solidária. Se uma das pessoas o presta, exime a responsabilidade
dos demais. Porém se o socorro é insuficiente, os outros continuam obrigados e a abstenção de
atividade realiza o tipo do artigo 135 do CP. No caso, dependerá CAIO de que o socorro seja prestado
à vítima.
c) No caso de ser médico ou policial, CAIO, diante da situação de perigo para o ciclista, não poderia
omitir-se. Registre-se a discussão sobre o "omitente ausente", que é o caso do médico chamado para o
atendimento que se recusa a ir, apesar de convencido da situação de perigo vivida pelo ferido. A
doutrina defende a responsabilidade penal do "omitente ausente". Álvaro Mayrink da Costa no seu D
Penal - V. II - Tomo I - 4. ed. - p. 314 afirma: "quando certo médico foi avisado pela polícia de que
um jovem estava em estado gravíssimo após um tiroteio e que precisava de cuidados imediatos, tendo
o mesmo se recusado a dar assistência ao ferido por se tratar de um delinqüente, o qual veio a falecer
no local, advogamos a condenação do omitente, por homicídio." No caso em estudo, o médico e o
policial encontram-se na posição de garantidor, tendo a obrigação de agir, mesmo em férias, quando
possível fazê-lo sem risco pessoal. Ao se omitirem, assumindo dolosamente o resultado morte ou
lesão corporal, respondem pela conduta comissiva: homicídio ou lesão corporal. (omissão imprópria -
artigo 13, § 2º, "a", CP. Destaque-se a possibilidade de culpa em casos semelhantes."
d) Tal fato pode caracterizar o risco pessoal para o agente que o eximiria do socorro direto, mas não
impede o socorro indireto - pedir o socorro da autoridade pública - que se não for solicitado, realiza o
tipo.

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2ª QUESTÃO:

Numa arquibancada de um estádio de futebol, de repente, surge uma briga desordenada em que várias
pessoas lutam entre si. Ao final, a polícia intervém para desapartar os contendores, restando CAIO,
MARIO, TÍCIO, MÉVIO, menor de 16 anos, e SIMPRÔNIO presos em flagrante, tendo este último
sofrido lesões de natureza grave.
Não ficou apurado o motivo da briga, mas sim que havia, pelo menos, uns quatro grupos brigando
entre si. Restou apurado, também que PAULO e JOÃO participaram da briga, mas dela se afastaram
antes da chegada da Polícia e antes da ocorrência da lesão gravosa.
Pergunta-se:
a) Qual o crime praticado pelos agentes?
b) Quem é o sujeito passivo deste crime?
c) A situação se modificaria se tivessem sido identificados dois grupos lutando entre si?
d) A situação inicial se modificaria se fosse descoberto que CAIO foi o autor das lesões graves contra
SIMPRÔNIO?
e) A situação se modificaria se JOSÉ tivesse ficado fora da briga, orientando MÁRIO, inclusive
fornecendo-lhe um pedaço de pau para agredir MÉVIO, seu inimigo?

RESPOSTA:

a) CAIO, MÁRIO, TÍCIO, MÉVIO (ainda que inimputável), Simprônio (ainda que vítima das lesões),
PAULO e JOÃO responderiam por rixa qualificada, malgrado tenham se retirado antes da ocorrência
da lesão.
b) As mesmas pessoas são sujeitos ativos com relação às demais e sujeitos passivos das condutas
praticadas pelos demais. Secundariamente, também pode- se admitir como sujeito passivo a ordem e
tranqüilidade públicas.
c) Sendo dois grupos, não se fala em crime de rixa, mas lesão corporal, tentativa de homicídio, perigo
de vida, dependendo do dolo.
d) Identificado o autor das lesões, todos continuam a responder por rixa qualificada, e o autor por rixa
qualificada e lesão corporal grave (posição da exposição de motivos) ou lesão corporal grave e rixa
simples (posição de parte da doutrina, para evitar o bis in idem).
e) JOSÉ seria partícipe do crime de rixa qualificada.

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