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ESCOLA DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Turma: CPI C 12023


Disciplina/Matéria: DIREITO PENAL
Sessão: 10 - Dia 06/02/2023 - 18:00 às 19:50
Professor: CLAUDIA DAS GRACAS MATOS DE OLIVEIRA PORTOCARRERO

10 Tema: A Relação de Causalidade. 1) Importância do tema: limitação à responsabilidade penal. 2)


Teoria da equivalência dos antecedentes causais ou conditio sine qua non: definição de causa,
processo hipotético de eliminação, crítica à teoria, limitações legais e doutrinárias ao alcance da
teoria. 3) Teoria da causalidade adequada: definição, características normativas, críticas; o artigo
13, § 1º do Código Penal Brasileiro. 4) Teoria da relevância jurídica: definição, características e
alcance. 5) Problemas particulares da causalidade: a dupla causalidade e outras hipóteses.

1ª QUESTÃO:
PEDRO, com a finalidade de matar PAULO, preparou-lhe uma emboscada e disparou um tiro de
revólver em seu peito. Socorrida a tempo, a vítima foi colocada numa ambulância e levada ao hospital
mais próximo.
Diante das situações abaixo descritas, responda se o resultado poderá ser imputado a PEDRO.
Situação A) Chegando PAULO ao hospital, o único médico de plantão não pôde atendê-lo
prontamente porque estava operando um outro paciente. Em razão da longa espera, PAULO não
resistiu ao ferimento e veio a falecer.
Situação B) PAULO foi operado e veio a morrer dois dias depois, por causa de uma infecção
hospitalar.
Situação C) PAULO morreu em face de o médico plantonista ter se recusado a atendê-lo, alegando
estar em greve.

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RESPOSTA:
Situação A) O resultado morte deve ser imputado a PEDRO porque ele se encontrava na mesma linha
de desdobramento causal ou mesma linha de perigosidade, de forma que não se pode falar, aqui, em
surgimento de um novo curso causal (causa superveniente relativamente independente).
Situação B) A resposta é a mesma da hipótese acima. A infecção hospitalar se encontra na mesma
linha de temibilidade da conduta praticada por PEDRO, de forma que não se poderá falar no
surgimento de uma causa superveniente relativamente independente.
Caso o professor considere conveniente, poderá tecer considerações sobre a teoria da causalidade
adequada, uma vez que boa parte da doutrina considera que o parágrafo primeiro do artigo 13, do
Código Penal, seja uma hipótese de aplicação da citada teoria;
Situação C) Nesse caso, o resultado morte não poderia ser imputado a PEDRO, que teria que
responder apenas por tentativa de homicídio qualificado. Entretanto há quem entenda que PEDRO
responderia por homicídio doloso, pois foi sua conduta que deu causa ao evento morte.
A teoria da causalidade adequada demonstra, a nosso juízo, mais claramente a razão pela qual o
evento não poderá ser imputado a ele, na medida em que não era previsível, no momento da conduta,
que o médico fosse recusar-se ao atendimento.
Nesta hipótese, de qualquer modo, não haveria concurso de pessoas porque o médico responderia por
homicídio doloso consumado, com fulcro no artigo 13, § 2º, do Código Penal, por ser garantidor;

As principais críticas direcionadas para a teoria da equivalência dos antecedentes causais ou teoria da
conditio sine qua non é a enorme extensão do conceito de causa, pois estabelece como causa o
antecedente de ínfima importância, em relação ao qual o resultado é totalmente imprevisível.
A rigor, salienta Fragoso, a própria fabricação da arma é causa do homicídio.
Como diz Zaffaroni, "Adão e Eva também deram causa a vários resultados, em razão do pecado
praticado".
Assim sendo, a citada teoria conduz a um regresso causal até o infinito, o que levou a doutrina a criar
mecanismos de delimitação de sua aplicação.
A teoria finalista, por exemplo, sustenta que a limitação se dá com a verificação do dolo e da culpa,
dependendo da estrutura típica.
Poderá o professor, caso queira, discutir, também, o problema da chamada "dupla causalidade". A
enorme extensão do conceito de causa, segundo a teoria da equivalência dos antecedentes causais,
tem sido a principal censura a ela endereçada, pois estabelece como causa o antecedente de ínfima
importância, em relação ao qual o resultado é totalmente imprevisível.

2ª QUESTÃO:
Prova Especializada de Direito Penal do XXIV concurso para ingresso na classe inicial da carreira do
MPRJ, aplicada no dia 03/04/2016
Após uma partida de futebol na fria e chuvosa noite de 02 de agosto de 2013, o vascaíno Marcelo, em
meio a uma briga entre torcidas, com ânimo de lesionar, desfere um poderoso chute em direção ao
flamenguista Rafael que, por reflexo, consegue se desviar do golpe, acabando por esbarrar com seu
ato de esquivo na ambulante Lourdes, grávida de 7 (sete) meses, que cai no chão molhado, ferindo
levemente a sua perna no meio-fio.
Ocorre que, após a queda de Lourdes, esta, na tentativa de se levantar acaba esbarrando em um fio de
eletricidade desencapado que, por conta da tormenta, encontrava-se rompido e solto no meio da rua,
sendo atingida por fulminante descarga elétrica que retira a vida desta e a do feto que albergava em
seu ventre.
Considerando que Rafael saiu ileso do episódio, indaga-se sobre as consequências jurídico-penais do
fato. Resposta objetivamente fundamentada.

RESPOSTA:

Quanto a Marcelo
Ele deverá responder pelo crime de lesão corporal, na sua forma tentada, não podendo responder pelo
resultado que ocorreu em relação a Lourdes, pois se trata de causa relativamente independente que,
por si só, produziu o resultado.

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Sobre o tema Cezar Roberto Bittencourt ensina que: "Mas ainda se poderá perguntar: se uma causa é
relativamente independente, como poderá causar, por si só, o resultado? A situação deve ser
interpretada da seguinte forma: quando alguém coloca em andamento determinado processo causal
pode ocorrer que sobrevenha, no decurso deste, uma nova condição - produzida por uma atividade
humana ou por um acontecer natural - que, em vez de inserir no fulcro aberto pela conduta anterior,
provoca um novo nexo de causalidade. Embora se possa estabelecer uma conexão entre a conduta
primitiva e o resultado final, a segunda causa, a causa superveniente, é de tal ordem que determina a
ocorrência do resultado, como se tivesse agido sozinha, pela anormalidade, pelo inusitado, pela
imprevisibilidade da sua ocorrência." (Tratado de Direito penal, volume 2, 15ª edição, editora
Saraiva, página 323)

Quanto a Rafael
Ele não responderá por nenhum crime, na medida em que não há conduta a ser imputada a ele, já que
ele não teve dolo nem culpa na morte de Lourdes e de seu feto. Com efeito, ele agiu somente com ato
reflexo à agressão perpetrada por Marcelo.

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Turma: CPI C 12023


Disciplina/Matéria: DIREITO PENAL
Sessão: 11 - Dia 06/02/2023 - 20:10 às 22:00
Professor: CLAUDIA DAS GRACAS MATOS DE OLIVEIRA PORTOCARRERO

11 Tema: O Crime Comissivo Doloso I. 1) Elementos estruturais: sujeitos, ação, nexo causal e
resultado (de dano e de perigo). Crime qualificado pelo resultado. 2) Composição do tipo
subjetivo: o elemento geral (dolo) e os elementos especiais: a) Dolo: definição e evolução teórica;
b) O elemento cognoscitivo, cognitivo ou intelectual do dolo: definição e requisitos;
conhecimentos requeridos pelo dolo quanto aos elementos descritivos e normativos (a valoração
paralela na esfera do leigo ou do profano); c) Os desvios relevantes e irrelevantes sobre a
causalidade: consequências. O dolo geral; d) O elemento volitivo do dolo: sua importância; a
diferença entre vontade e desejo; teoria da vontade, teoria da representação e teoria do
consentimento. Críticas. Análise do Código Penal Brasileiro. e) Dolo sem vontade.

1ª QUESTÃO:
FELIX é irmão de PALOMA e administrador do Hospital San Magno, e ambos são descendentes do
sócio majoritário do hospital, CÉSAR.
PALOMA, após ficar ciente de que poderia doar parte de seu fígado a PAULINHA, sua enteada,
concordou em submeter-se à cirurgia no referido hospital a fim de efetivar a doação, estabelecendo
como condição que o procedimento fosse realizado por LUTERO, médico renomado que trabalha e é
sócio minoritário daquele hospital.
JACQUES, médico jovem e ambicioso, dirigiu-se a FELIX e afirmou que LUTERO já estava com
idade avançada e que por isso poderia colocar em risco a vida de PALOMA, sugerindo então, que
fosse ele o médico responsável pela realização da cirurgia.
FÉLIX, com o objetivo de matar PALOMA, pois desde a infância sente muita inveja em relação a ela,
não autorizou JACQUES a realizar a cirurgia no lugar de LUTERO.
Na ocasião da cirurgia, LUTERO deixou de observar regra técnica da medicina e com isso provocou
grande sangramento em PALOMA, levando-a a óbito.
Tipifique, de forma fundamentada, as condutas de FELIX e LUTERO.

RESPOSTA:
FELIX = atípico. Tratado de Direito penal, Cezar Roberto Bitencourt, volume 1: "A vontade,
incondicionada, deve abranger a ação ou omissão (conduta), o resultado e o nexo causal. A vontade
pressupõe a previsão, isto é, a representação, na medida em que é impossível querer algo
conscientemente senão aquilo que se previu ou representou na nossa mente, pelo menos,
parcialmente. A previsão sem vontade é algo completamente inexpressivo, indiferente ao Direito
Penal, e a vontade sem representação, isto é, sem previsão, é absolutamente impossível.
A vontade de realização do tipo objetivo pressupõe a possibilidade de influir no curso causal,
pois tudo o que estiver fora da possibilidade de influencia concreta do agente pode ser desejado
ou esperado, mas não significa querer realizá-lo. Somente pode ser objeto da norma jurídica
algo que o agente possa realizar ou omitir.

LUTERO = art. 121, §§3º e 4º do Código Penal.

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2ª QUESTÃO:
Tipifique, de forma fundamentada, as condutas abaixo descritas:

a) ELIZE, sabedora de que o seu marido MARCOS a estava traindo com uma prostituta, resolve
matá-lo. Para tanto, aguarda a sua filha menor dormir, vai até o seu quarto e pega uma arma de fogo
de que tem posse e porte.
Ato contínuo, ELIZE desfere três tiros em MARCOS, tendo apenas um deles atingido a vítima na
cabeça, fazendo com que ele caísse imediatamente ao chão e ficasse totalmente imóvel, de forma que
ELIZE acreditou que ele estaria morto.
Com intuito de encobrir os fatos, ELIZE decide esquartejar o corpo e colocá-lo em uma mala, o que
foi efetivamente feito.
Realizada a perícia no corpo, constatou-se que MARCOS somente faleceu na ocasião em que o
ELIZE cortou a cabeça quando esquartejava o seu corpo.

b) CÉSAR, com intuito de matar PILAR, sua esposa, pois desejava casar-se com sua amante ALINE,
coloca raticida no doce "brigadeiro" que estava dentro da geladeira, pois sabia que ele seria
consumido por PILAR após o almoço. Depois de colocar o raticida, CÉSAR sai para o trabalho que
exerce, na direção do hospital São Magno.
PILAR decide que naquele dia não iria comer aquele "brigadeiro".
Tão logo CÉSAR chega a casa, vindo do trabalho, visualiza PILAR, imóvel, deitada na cama e,
acreditando que ela estava morta, para comemorar tal fato, desfere um tiro em sua cabeça, causando-
lhe a morte em razão daquele tiro.

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RESPOSTA:
a) homicídio doloso (art. 121 do CP), com base no dolo geral.
"Fala-se em dolo geral (dolus generalis), segundo Welzel, "quando o autor acredita haver consumado
o delito quando na realidade o resultado somente se produz por uma ação posterior, com a qual
buscava encobrir o fato", ou, ainda, na definição de Hungria, "quando o agente, julgando ter obtido o
resultado intencionado, pratica segunda ação com diverso propósito e só então é que efetivamente o
dito resultado se produz".
Exemplificando, os insignes juristas trazem à colação caso do agente que após desferir golpes de faca
na vítima, supondo-a morta, joga os eu corpo em um rio, vindo esta, na realidade, a falecer pro
afogamento. A discussão travada na Alemanha cingia-se ao fato de que, com a primeira conduta, o
agente não havia alcançado o resultado morte, razão pela qual deveria responder por um crime
tentado; em virtude de seu segundo comportamento, isto é, o fato de jogar o corpo da vítima num rio,
seria responsabilizado por homicídio culposo.
Rejeitando essa conclusão, ou seja, de duas ações distintas com duas infrações também distintas,
Welzel se posicionava no sentido de que o agente atuava com o chamado dolo geral, que
acompanhava sua ação em todos os instantes, até a efetivação do resultado desejado ab initio.
Dessa forma, se o agente atuou com animus necandi (dolo de matar) ao efetuar os golpes na vítima,
deverá responder por homicídio doloso, mesmo que o resultado morte advenha de outro modo que
não aquele pretendido pelo agente (aberratio causae), quer dizer, o dolo acompanhará todos os seus
atos até a produção do resultado, respondendo o agente, portanto, por um único homicídio doloso,
independentemente da ocorrência do resultado aberrante"
(Curso de Direito Penal, Rogério Greco, volume I, editora Impetus, 6ª edição, página 202).

b) homicídio culposo (art. 121, §3º do CP). Com efeito, houve quebra do nexo de causalidade, já que
a primeira conduta praticada por CESAR foi um irrelavante penal, que não colocou em risco a vida da
vítima, razão pela ele deverá responder apenas pela segunda conduta descuidada ao deixar de
verificar se PILAR estava realmente morta antes de lhe desferir o tiro.

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