Você está na página 1de 20

Introdução a Optometria

Comportamental
Terapia Visual Optométrica

Responsável pelo Conteúdo:


Profº Esp. Núbia Albergoni

Revisão Textual:
Prof. Me. Claudio Brites
Terapia Visual Optométrica

• O que é Terapia Visual Optométrica – Comportamental;


• Plasticidade Cerebral;
• Programa de Terapia Visual.


OBJETIVOS

DE APRENDIZADO
• Aprender como funciona a dinâmica do Programa de Terapia Visual Comportamental e
porque a plasticidade cerebral é essencial nesse processo;
• Aprender as principais ferramentas utilizadas no dia a dia e quando é necessário fazer
terapia visual são alguns dos temas que veremos aqui.
UNIDADE Terapia Visual Optométrica

O que é Terapia Visual Optométrica –


Comportamental
O programa de Terapia Visual Comportamental é planejado após a avaliação
­visual e perceptiva, entendendo como o sistema visual do paciente comporta-se frente
aos estímulos visuais e como estão alterando seu rendimento nas atividades diárias.
Em caso de alteração nas vias de entrada ou processamento, mesmo que o paciente
tenha se organizado para “dar um jeito” de conseguir seguir em frente com seus ob-
jetivos, são realizadas sessões de terapia visual para reorganizar essas funções.

As atividades propostas durante o tratamento têm como principal objetivo colo-


car o paciente em seu máximo rendimento visual, com o mínimo gasto energético.
­Essas  atividades são trabalhadas principalmente no sistema top-down de proces-
samento, ou seja, de cima para baixo, dos centros de controle cerebrais para os
olhos, onde o cérebro aprende a comandar os olhos, não apenas para fortalecer os
músculos. Existem também atividades bottom-up, como a integração dos reflexos
primitivos e Fototerapia Syntonic.

Estímulos tanto de cima para baixo quanto de baixo para cima são necessários
para a construção do pensamento visual, para que as vias de entrada sejam trabalha-
das de maneira que levem informação nítida, integrada e fusionada para o cérebro
e que seu processamento, entendimento das imagens vistas quanto associação com
outras áreas do processamento e aprendizagem sejam feitos da melhor maneira.

As atividades feitas pelo terapeuta visual comportamental são previamente elabo-


radas de acordo com as alterações visuais e interesses do paciente. É possível ter ses-
sões de terapia visual que sejam alegres, despertem interesse, não apenas com sets
de repetições. É de fundamental importância que o paciente participe ativamente
das sessões e crie um vínculo afetivo com as atividades apresentadas. Dessa forma,
será feita de forma consciente e integrativa

Às vezes, é difícil entender o porquê de fazer terapia visual, principalmente para


pais e educadores, já que, até hoje, o que foi divulgado é que, se há problemas de
visão, põe-se óculos e resolve.

Pensando nesse conceito ultrapassado, eu escrevi um livro informativo chamado “Visão


e Aprendizagem: muito além dos óculos”, com intuito de levar essa “nova” informa-
ção para a população, principalmente para quem cuida de crianças, já que estão em seu
pleno desenvolvimento.

8
Figura 1
Fonte: Acervo do conteudista

Tanto não é comum pensar que problemas visuais são passíveis de serem acom-
panhados e melhorados, que Richard Gregory (1966) escreveu em seu livro Olho e
Cérebro a seguinte frase presente em que Kandel et al. (2013):
Estamos tão familiarizados com a visão, que é preciso um salto de ima-
ginação para perceber que existem problemas a serem resolvidos. Mas
considere isso. Recebemos imagens minúsculas e distorcida da cabeça
para baixo nos olhos e vemos objetos sólidos separados no espaço cir-
cundante. A partir dos padrões de estimulação na retina percebemos um
mundo de objetos, e isso não é nada menos que um milagre.

A partir da afirmação apresentada, é mais fácil entender que a visão é passível de


ter problemas, mas a boa notícia é que a Optometria Comportamental tem as chaves
para resolver esses problemas.

É preciso entender, antes de tudo, que quem será trabalhado nas atividades durante
a terapia não são os músculos extraoculares, ficando mais fortes ou mais sabidos,
e sim o cérebro, que é quem coordena os estímulos visuais. Se o trabalho for feito
apenas na via bottom-up, pode-se até se obter certa melhora, mas, com muita fre-
quência, os problemas voltarão, pois foi o trabalho quem executa o movimento, não
quem dá o comando.

A Terapia Visual Optométrica envolve o uso de experiências ou atividades


sensório-motoras estruturadas e adequadamente sequenciadas com condições
visualmente controladas, utilizando filtros, prismas, oclusão para alternar o com-
portamento mente-corpo, imposto pelas atividades de terapia visual.

As seguintes habilidades são desenvolvidas e integradas em terapia visual:


• Resolução de problemas cognitivos;
• Habilidades visuoespaciais;

9
9
UNIDADE Terapia Visual Optométrica

• Habilidades da análise visual;


• Habilidades acomodativas;
• Habilidades oculomotoras;
• Habilidades de integração visuoespaciais;
• Habilidades de integração visuoauditivas;
• Binocularidade.

Figura 2
Fonte: Acervo do conteudista

Mas afinal, quando é indicada a Terapia Visual Optométrica?

Segundo Press (2008), o Programa de Terapia Visual Optométrica envolve melho­


rar a eficácia da função visual, sempre tendo como objetivo o melhor rendimento
com o menor gasto energético. Outro grande objetivo é que todas as habilidades
trabalhadas durante a terapia sejam automatizadas e os processos visuais aprendi-
dos, de maneira que o paciente integre as informações visuais com outros sistemas
visuais, facilitando as atividades com altas demandas visuais e de concentração.

A Terapia Visual Optométrica foi idealizada para trabalhar as seguintes altera-


ções: Ambliopia, Estrabismo, Disfunções da motilidade ocular, Organização dirigida,
Transtornos adquiridos do processamento visual da informação, Disfunções do pro-
cessamento da informação, Controle da miopia e Visão desportiva.

O que é Ambliopia?
Ambliopia, também chamada de olho preguiçoso, é quando há uma baixa acui-
dade visual de um ou ambos os olhos, sendo que a integridade anatômica dos olhos
está dentro do esperado; contudo, mesmo com a melhor correção óptica, não há
melhora significativa de nitidez.

Segundo Vergara (2014), a ambliopia é chamada de olho preguiçoso, mas defi­


nitivamente o problema não está nos olhos, eles estão perfeitamente saudáveis.
O problema está no cérebro, pois o que ocorre na ambliopia é uma interrupção e

10
mal funcionamento do processo neurológico da visão; e isso, como dito, se dá no
cérebro, não no olho.
Press (2008) explica que cerca de 2,5% da população possui ambliopia, sendo esse
número mais alto que baixa visão por doenças oculares e traumas somados. A Asso-
ciação Americana de Optometria – AOA afirma que a incidência de ambliopia é de 3
a 4%. Trazendo isso para um país como o Brasil – com 200 milhões de habitantes –, a
incidência seria de aproximadamente 8 milhões de pessoas, o que é um número muito
expressivo e, com muita frequência, o paciente sequer tem consciência do problema.
Em um estudo muito interessante, foi pesquisado sobre o déficit cortical em pacien-
tes com ambliopia estrábica. Observe a imagem cerebral na da Imagem A da Figura 3,
onde quem está fixando é o olho estrábico; mesmo sendo anatomicamente saudável,
as áreas de recepção são menores. Na imagem B, também da Figura 3, é o olho fi-
xador que está observando as imagens; sua atividade é menor se comparado ao olho
amblíope. Nesse estudo, fica claro como a ambliopia está no cérebro, e não nos olhos.
É sabido que existem vários tipos de ambliopia, incluindo as secundárias a pato-
logias, como a catarata, por exemplo. Mas a ambliopia que está sendo citada aqui
ressalta a ambliopia por anisometropia ou associada a estrabismos. A ambliopia é
um problema de desenvolvimento visual em um nível cortical, ou seja, a anatomia
está dentro da normalidade, mas a ativação neurológica para esse estímulo não tem
recepção cortical. É justamente nisso que a Terapia Visual Optométrica atua, cria
caminhos, novos campos receptivos e estimulando-os, criando áreas maiores de
recepção visual. Com isso, temos a melhora da acuidade visual e é possível a inte-
gração binocular, fazendo com que esse paciente obtenha visão estereocópica, já que
pacientes com ambliopia e estrabismo não possuem visão 3D.

Figura 3
Fonte: Adaptado de BARNES et al., 2001

É importante ressaltar que, durante o tratamento com a terapia visual, não é usa-
da oclusão total do olho amblíope. Quando é necessário utilizar oclusão, essa é feita
com filtro especial para que o olho ocluído também seja estimulado.

11
11
UNIDADE Terapia Visual Optométrica

O que é Estrabismo?
Estrabismo é caracterizado pelo desalinhamento dos eixos visuais, podendo ser
verticais, horizontais ou cíclicos. Da mesma forma que citamos na ambliopia, o
­estrabismo também é um problema de nível superior, já que menos de 3% dos estra-
bismos têm sua causa nos músculos extraoculares – essa informação é possível achar
nos livros de oftalmologia, inclusive. Observe a afirmação de Bicas e Jorge (2007):
“[...] por atuar nas consequências (músculos extraoculares) e não na causa (sistema
nervoso central), a cirurgia apresenta uma taxa de insucesso – hiper ou hipocorre-
ção – de cerca de 20 a 30%”.

Eles reconhecem que o problema não está nos músculos, mas sim no desenvolvi-
mento dessa visão no nível do sistema nervoso. Geralmente a cirurgia para estrabismo
é a primeira opção de tratamento para o estrabismo, mas é preciso levar em consi-
deração vários pontos antes de tomar essa decisão. Primeiro porque, na maioria dos
casos, os problemas não são musculares e a cirurgia será realizada neles. Segundo,
pois, mesmo que a estética seja recuperada, se for um olho amblíope, esse olho não
recuperará sua acuidade visual, será algo meramente estético. Pensando nisso, Vergara
(2014) listou alguns motivos sobre as desvantagens da cirurgia do estrabismo:
• Desvantagem 1: É possível que, após a cirurgia, os olhos não trabalhem como
uma equipe – binocularidade;
• Desvantagem 2: Com frequência é preciso fazer mais de uma cirurgia ou cirur-
gias de retoque para manter o alinhamento;
• Desvantagem 3: Há potenciais complicações devido à cirurgia;
• Desvantagem 4: Ausência de base científica do sucesso da cirurgia de estrabismo;
• Desvantagem 5: Aumenta a possibilidade de ter problemas de aprendizagem e
linguagem, assim como problemas cognitivos em outras etapas da vida.

Figura 4
Fonte: Getty Images

Plasticidade Cerebral
Tem um fluxo bidirecional de informações motoras do tronco encefálico para
o núcleo geniculado lateral (NGL) conectando-se à entrada da retina e às áreas de
maior associação, resultando em um circuito fechado que demonstra um alto grau de
plasticidade. O grau de interconectividade e plasticidade oferecem ao Optometrista

12
a oportunidade de influenciar o processamento visual em várias direções. Essas dife-
rentes direções têm muito mais em comum do que parecem (PRESS, 2008).

Essa plasticidade cerebral é a chave para o sucesso da terapia visual mesmo em


pacientes adultos. É justamente devido a ela que a Dr.ª Susan Barry conseguiu, mesmo
sendo adulta, obter a visão tridimensional – confira no Material Complementar o
conteúdo sobre Barry.

No livro de Kandel et al. (2013), há um experimento em ratos em que os autores


retiram o nervo óptico e implantam um nervo ciático no lugar, do olho até o colículo
superior. Após alguns dias, foi detectada a implantação de alguns pontos de comuni-
cação com colículos superiores.

Olha que informação interessante! Isso acontece graças à plasticidade.

Figura 5
Fonte: Adaptado de KENDEL et al., 2013

Programa de Terapia Visual


Cada paciente é estudado individualmente e é preparado um programa de
terapia visual de maneira muito pessoal. Apesar de ter algumas atividades que são
feitas para vários diagnósticos, todas as atividades são adaptadas de acordo com o
problema e os gostos pessoais de cada paciente.

Confira a seguir alguns dos instrumentos usados na prática de Terapia Visual


Optométrica.

Integração Visuoespacial
Foi explicada aqui a importância da integração visuoespacial, já que a visão e o
sistema motor estão intimamente ligados. É importante que seja feita essa integração
com o principal objetivo de que o paciente tenha consciência do próprio corpo e
etenda onde está localizado no espaço – esse, aliás, é um dos pré-requisitos para que
haja sincronia entre o olho e a mão.

13
13
UNIDADE Terapia Visual Optométrica

Nesse estágio, é usada com frequência a integração dos reflexos primitivos, uma
técnica que avalia e integra movimentos involuntários que deveriam ter sido integra-
dos, mas, por N motivos, continuam vindo à tona. Nesse caso, é preciso que esses
sejam estimulados para darem lugar a reflexos posturais.

Figura 6
Fonte: Acervo do conteudista

Vectograma
É uma ferramenta que precisa fazer uso de óculos polarizados específicos e aju-
dam na fusão, convergência, divergência e controle de supressão. É importante lem-
brar que, sempre ao fazer exercícios binoculares, é preciso ter o controle da supres-
são, para que o paciente esteja usando ambos os olhos e, em caso de supressão, ele
tenha controle do que está acontecendo e aprenda a “ligar” os olhos.

Figura 7
Fonte: Acervo do conteudista

14
Corda de Brock
A corda de Brock é uma atividade de baixo custo, a qual ajuda na consciência de
localização espacial, sincronia entre os dois olhos, fusão, convergência, divergência e
controle da binocularidade. Pode ser usada de diversas formas e distâncias. É algo que
o próprio paciente pode confeccionar e é muito utilizada na prática terapêutica diária.

Figura 8
Fonte: Acervo do conteudista

Flippers
São combinadas lentes positivas e negativas, calculadas segundo a distância de
trabalho a ser observada. Os flippers ajudam no controle e consciência do relaxar e
ativar o cristalino. Sua repetição levará à automatização e flexibilidade de foco.

Figura 9
Fonte: Acervo do conteudista

15
15
UNIDADE Terapia Visual Optométrica

Bola de Marsden
Uma bola que pode ter o fundo branco, vermelho, amarelo, meio verde meio
vermelho. Suspensa no ar, pode ser trabalhado apenas seguimentos, mas pode ser
combinado com: acomodação, movimentos sacádicos, versões, anti-supressivo, cor-
relação olho-mão.

No solo, deitado, em pé ou com equilíbrio, essa atividade possui inúmeras possibili­


dades. Lembrando sempre que é preciso criar consciência, repetição para automatização.

Figura 10
Fonte: Acervo do conteudista

Percepção Visual
O processamento visual é trabalho de forma que muda a construção do pensa-
mento visual. Isso é feito por meio de todas as ferramentas citadas nesta unidade e
outras mais. A questão é a maneira como esse serão reforçadas ou renovadas as vias
de acesso e percepção desse paciente. O importante na terapia visual como um todo
é gerar emoção. A emoção é a “cola” que integra todas essas habilidades. Foi refor-
çada durante toda esta disciplina a importância da repetição para o sucesso, até que
essa repetição seja automatizada e, nas atividades de percepção, muda-se a maneira
como o paciente percebe o mundo e o entende.

Figura 11
Fonte: Acervo do conteudista

16
Em Síntese
Caro aluno, agora uso o texto em primeira pessoa pois quero falar diretamente com
você. Aqui, tentei passar o máximo de informações que você já pode colocar em sua
prática clínica. O jeito comportamental de observar o paciente, entender suas demandas
visuais, a maneira de prescrever e como faz o acompanhamento em terapia são diferen-
tes do que você, possivelmente, já viu até aqui. Contudo, convido a participar e conhecer
mais profundamente essa área especializada da Optometria.
Talvez você não queira fazer terapia visual, e está tudo bem, mas todas as outras coisas
que a comportamental trás na vida diária em consultório com certeza mudará a sua vida
e, com isso, você mudará a vida de outras pessoas. Digo isso porque mudou a minha e
gostaria, do fundo do meu coração, que você tivesse essa oportunidade. E é justamente
a oportunidade que damos ao nosso paciente, só assim ele obterá o êxito.

17
17
UNIDADE Terapia Visual Optométrica

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Livros
Visão e aprendizagem: muito além dos óculos
ALBERGONI, N. Visão e aprendizagem: muito além dos óculos. Curitiba, PR;
2019.

 Vídeos
Optometria: enxergue essa causa
https://bit.ly/2D2qY7J

 Leitura
A vida com óculos 2D
História de Susan Barry.
https://bit.ly/39RQR6p
What Is Optometric Vision Therapy?
https://bit.ly/30aZ8Pm

18
Referências
BARNES, G. et al. The cortical deficit in humans with strabismic amblyopia. J Physiol,
v. 15, n. 533(Pt 1), p. 281-297, May. 2001.

BICAS, H.; JORGE, A. OFTALMOLOGIA. São Paulo: TecMed, 2007.

KANDEL, E. et al. Princípios de neurociências. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013.

VERGARA, P. Estrabismo y ojo vago: mitos, lendas e verdades. Madri: Graficas


Ceyde, 2014.

19
19

Você também pode gostar