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A Pressa é inimiga da Negociação !

Em
Tecnologia mais ainda...

Reges Bronzatti

Advogado - Direito de Tecnologia | Mestre em Ciência da Computação |


Conselheiro Adm IBGC | Consultor & Mentor LGPD | Empreendedor | DPO | Criador
de Valor e Segurança Jurídica para Negócios com Tecnologia
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29 de março de 2022
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Negociar não é um jogo, onde um lado ganha e o outro perde ! Buscar


interesses mútuos sempre foi o objetivo de um bom acordo.

Muitos negociadores e vou me referir, aqui, principalmente, aos habilidosos


vendedores e compradores de tecnologia, esquecem que após uma negociação
de TI (tecnologia da informação) existe a entrega e/ou a execução daquilo que
foi acordado e que, invariavelmente, testará tudo aquilo que foi pactuado,
inclusive, nos mínimos detalhes.

Não é exagero afirmar, depois de mais de 25 anos atuando neste mercado, que
temos um elevado percentual de insatisfação em negócios de tecnologia
realizados e com contrato assinado, pois a entrega do serviço ou produto não
está alinhada ao interesse, comumente, do contratante, apresentada durante a
negociação.

Quantas promessas não são cumpridas após a assinatura do contrato ?

Muitas disputas judiciais, em tecnologia, trilham os caminhos das perícias


técnicas infindáveis para provarem culpa ou má-fé de uma parte ou outra mas
que são impulsionadas, geralmente, por acordos mal feitos, expectativas
suprimidas e propostas técnicas recheadas de artifícios comerciais.

Fatores como ambição exacerbada, pressa, comunicação truncada, falta de


preparo, ausência de planejamento da aquisição, potencializam e conduzem
sempre a uma péssima negociação em TI.

Negociar tecnologia pode parecer simples e fácil quando você está somente
com o olhar no futuro, imaginando o quê aquela aquisição trará de benefícios
ao negócio. O foco, deste formato, parece estar somente nas vantagens
percebidas, esquecendo-se que para colher os louros da vitória existe um
caminho cheio de obstáculos a serem percorridos após o fechamento
do acordo. Ter consciência destes percalços é o primeiro grande trunfo no
processo.

A vida real, nas aquisições de tecnologia, não acontece em um piscar de olhos.


O futuro, invariavelmente, não acontece por um acontecimento de sorte. Ele
precisa ser construído com muito esforço. Vale para vida pessoal e vale para
contratos de TI.

Nenhuma tecnologia se incorpora ao dia a dia de uma organização de forma


voluntária, sem a intervenção humana, sem o ajuste em processos,
configurações, customizações ou até mesmo com uma profunda readequação
cultural dentro da corporação contratante. Não importa o acrônimo criado: IA,
Big Data, Scrum, App, Metaverso, ERP, CRM, Blockchain, SmartContracts. Nada
disso acontece ou potencializará os benefícios pretendidos sem um bom
esforço e uma boa comunicação entre seus pares.

A fase da negociação existe, justamente, para garantir e para amadurecer quais


são os sonhos, perspectivas, prazos e interesses dos negociadores, de ambos os
lados.

O desfecho de um bom negócio concretizado acontece se nesta etapa crucial


houver um processo claro, uma análise de cenários, dos mais simples aos mais
complexos, com objetivos, requisitos documentados, se possibilidades de
interrupção são aceitáveis, se existem formas de encerramento ou de contorno
prudentes quando uma entrega se tornar inaceitável ou se existem métricas
claras de mensuração de qualidade da entrega entre outros muitos fatores
inerentes ao escopo adquirido.

Se esta etapa for executada de forma superficial e açodada, fatalmente,


o pesadelo contratual de um conflito se estabelecerá com custos adicionais,
perda de energia e tempo, com enormes prejuízos para todos os envolvidos.

Talvez isso explique, para alguns gestores, porque alguns profissionais afirmam
que a TI é uma “caixa-preta”. Melhor não saber como foi feito, quem fez e
porquê fez. Vamos esquecer o passado e começar novamente. É uma saída,
sempre mágica, para erros de negociação.

Muitas pessoas, durante a negociação, não são sensíveis a executarem uma


metodologia ou estratégia previamente alinhada entre pares internos e
externos. Sim, existe metodologia de negociação para TI ( algumas inclusive
com certificação como a ISO/IEC 12207, a IEEE 1062:1998, o MPS-Br ou no
próprio PMBOK há o guia de aquisição, etc).

A prática nos demonstra que o tempo e o planejamento de uma aquisição de TI


são relativizados por ambos os lados: comprador e o fornecedor. Querem
antecipar etapas com a ansiedade de fechar o contrato, pois entendem que
negociar é apenas uma tarefa que atrasa a execução.

O que importa é o preço e as condições de pagamento, pois a parte técnica


dominamos. É a mentalidade de ganhar, de competir, de ultrapassar a todos
porque é somente a velocidade que dá poder sobre a concorrência. Há que se
ter muito cuidado com este modo de gerir negócios em TI, pois a arrogância é
sempre um estopim para negócios fracassados.

Quando negociamos tecnologia jamais devemos esquecer da máxima, adaptada


ao contexto: “a vida não é uma competição de velocidade, mas de
resistência”. Com uma negociação é exatamente a mesma coisa. Paciência e
resiliência são as maiores virtudes que um bom negociador de TI possa ter.

Tenho, ao longo da carreira, uma quantidade enorme de processos judiciais que


envolvem temas de tecnologia, desde a atuação como advogado, perito ou
como assistente técnico. E, impreterivelmente, em todos, a causa número um de
litígios é comportamental, de um lado ou de outro. É a proposta mal redigida e
o contrato que contradiz as expectativas do contratante e, muitas vezes, do
próprio contratado que cede ao canto da sereia do cliente, para fugir dos seus
princípios, visando ser contratado novamente ou realizar um novo upsell. Ao
final da contenda, ambos saem ainda mais desgastados do que quando
iniciaram a disputa e nunca se tornam realmente satisfeitos, mesmo com o
desfecho final da batalha.

Alguns processos judiciais, que exigem muito conhecimento técnico, duram 10,
15 e até 20 anos. Mesmo em processos arbitrais não se resolvem contendas
complexas com menos de 4 a 5 anos. Imagina-se o desgaste, custos e energia
desperdiçadas das partes.

Com algumas poucas horas adicionais, durante a fase de negociação, com


conhecimento, com método, com clareza, com inteligência e técnica apurada,
nada disso teria acontecido. Mas, o ser humano, principalmente, no mundo
ocidental, no calor da tarefa prefere acelerar, ao invés de perguntar, questionar,
argumentar e estabelecer, de forma clara e transparente tudo o que foi
combinado, inclusive os detalhes, tais como o significado expresso de um
acrônimo que influenciará no reajuste de preços, no valor hora ou na renovação
do contrato em 12 ou 36 meses.
Detalhes em contratos de TI são o alicerce de um bom negócio. Sempre muita
atenção com a expressão, com a abreviatura, com o conceito.

Contratos de TI que não detalhem o processo de todas as intempéries que


possam acontecer durante todo o ciclo de vida do produto ou serviço
contratado é certeza de problemas para um lado ou para outro.

Quem se apressa em contratar em tecnologia, sem clareza de validação de


requisitos, necessidades, KPI´s, entregáveis, cronograma, trocas de equipe entre
tantas outras variáveis, vira refém das suas próprias vaidades.

É sempre preciso ouvir mais do que falar, analisar todos os detalhes de uma
oferta para depois começar a negociar.

Credibilidade se conquista e se demonstra durante uma negociação. Não é uma


marca ou um cartão de visita dourado que a garantem. Há meios de evidenciar
respostas confiáveis nas apresentações recheadas de sofisticação comercial que
levam a uma paixão avassaladora pela proposta ou pelo apresentador, mas
quase nunca pela garantia de entrega dos resultados a serem perseguidos. É
um grande defeito dos negociadores de TI.

Uma negociação de sucesso em tecnologia acontece quando todos os


envolvidos na negociação percebem que o processo de reuniões, troca de
documentos, diálogos acirrados permite a troca de ideias, interesses e
propósitos e as partes se ouviram. É quando o resultado obtido, durante a
negociação, permite a construção de relacionamentos duradouros, de
confiança, de longo prazo que permitem o fortalecimento de ambos os lados.

Sim, nestas horas, o contrato pode ser guardado em uma gaveta. Caso contrário
e, infelizmente, na sua maioria, as organizações precisam acordar todos os dias
com o contrato em cima da mesa para monitorar, controlar e auditar seus
parceiros de negócios. Isso gera custos adicionais e retrabalhos, tornando ainda
mais improdutivo um serviço ou produto que foi contratado justamente para
tornar mais ágil e produtivo este mundo corporativo.

É, infelizmente, o paradoxo da contratação de tecnologia que vivemos,


atualmente, nas corporações.

Ninguém precisa perder para fechar um bom negócio. Todos podem ganhar,
dentro das suas ambições e interesses, desde que se permitam o tempo e a
flexibilidade adequada para isso.

E tudo isso pode ser controlado com método e estratégia. Sem isso, é perda de
tempo e de dinheiro.
Bons negócios a todos.

O tempo de mudar está passando...

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