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DIREITO DAS COISAS

Prof. Dr. José Isaac Pilati


Acadêmica: Marjorie Carvalho de Souza

NOÇÕES INTRODUTÓRIAS DA DISCIPLINA

A disciplina está baseada no Direito romano que, na perspectiva do professor, é um


direito emancipado, que está preocupado em resolver o conflito, não apenas o mito da
segurança jurídica. Para eles jus era o direito, não directus. Direito é um termo judaico muito
posterior. Para o romano, jus é retirar do conflito a justiça, e ter procedimento para isso. Não é
um discurso, para o romano, mas uma coisa efetiva do dia-a-dia. Como o romano incorporava
as novas conquistas do dia-a-dia? Pela jurisdição. Nós incorporamos pela lei, mas nós
sabemos quem determina o que é a lei. Quem aprovava a lei era o povo romano, não os
representantes. Nós atualizamos o nosso dia-a-dia pela lei de acordo com determinados
interesses que estão instalados em um sistema jurídico desequilibrado, cujos vazios são
aproveitados pelo mais forte. Por mais que o sistema de jurisdição romano fosse privado, na
verdade o privado romano era tão público quanto o público era privado. Era um sistema de
democracia direta.

Situando a disciplina em relação ao código civil, sabemos que a parte geral compreende
pessoas, bens (são os objetos em todas as relações jurídicas) e fatos. A parte especial
compreende obrigações, empresa, coisas, família e sucessões. O direito das coisas é um livro
que está bem no meio da parte especial.

1 Objeto do Direito das coisas

Do que trata o direito das coisas? De todas as relações jurídicas que envolvem coisas
corpóreas, bens corpóreos. Corpóreo é algo que pode ser tocado. Mas bens corpóreos que
estejam no patrimônio dos particulares, suscetíveis de apropriação e que se mensura por um
valor econômico de avaliação econômica. Os bens da Universidade, por exemplo, estão fora do
comércio, são regidos pelo direito administrativo.
Uma vez que o Direito das coisas trata das relações estabelecidas entre o sujeito e a
coisa, se um objeto for alugado, a relação é pessoal, não de direito das coisas. A relação do
proprietário no caso não é com a mesa, mas com o arrendatário da mesa.

As coisas quando estão nos nossos patrimônios se envolvem em várias relações


jurídicas. As relações de direito real que o código prevê são:

Posse Propriedade Direitos reais de gozo Direitos reais de garantia

A posse é a exteriorização, o lado visível de um outro direito real: a propriedade. Um


outro exemplo: se eu concedo o usufruto de um bem ao meu avô, meu avô tem um direito real
sobre a coisa, chamado direito real de gozo, assim como eu também o tenho, pois conservo a
propriedade. Já os direitos de garantia se referem, por exemplo, à hipoteca. Se alguém tem
um bem hipotecado, mas o devedor deve para Deus e o mundo, o credor entra em uma
disputa. Nós estudaremos a hierarquia dos créditos. As garantias não se esgotam no direito
das coisas (existem também, por exemplo, os privilégios legais). A lei estabelece uma
vantagem dentro da hierarquia dos créditos para determinadas pessoas. O direito é sempre
um privilégio de alguém perante outras pessoas, uma pretensão vencedora que tem potencial
para prevalecer.

Vale dizer, todavia, que se o objeto do direito das coisas são os direitos corpóreos, para
o romano essa noção era diferente. Tudo que que existia fora do corpo era coisa, mas nem
todas as coisas eram bens (Júpiter não é um bem, mas é coisa). Esse é um tipo de raciocínio,
mas o nosso, pela codificação, muda. Os bens estão na parte geral, mas a coisa é um tipo de
bem específico que tem um livro especial no código civil e que diz respeito às relações de
posse, de propriedade, de direitos reais de gozo e de garantia. Alguns autores com muita
razão dizem que o livro de direito das coisas não devia se chamar direito das coisas, mas que
devia se chamar posse e direitos reais. Posse, o lado visível; e direitos reais (em coisa própria,
a propriedade; e em coisas alheias, o gozo e a garantia).

O direito das coisas se estabelece em cima da dicotomia direito real x direito pessoal. O
direito pessoal é firmado entre duas pessoas, estabelecido de várias maneiras,
contratualmente ou não. Por exemplo, se alguém bate no meu carro, o direito de indenizar é
direito pessoal também. Mas essa ação pessoal reflete no patrimônio. Um contrato de aluguel
é entre duas pessoas e só envolve o imóvel indiretamente.

2 Direitos reais

O direito real é aquela situação jurídica em que a subordinação da coisa ao titular é


direta e imediata. Ou seja, o sujeito é quem decide o que fazer com a coisa.
É também oponível erga omnes. A preferência do direito real se relaciona com a
anterioridade do direito (se eu coloquei o usufruto depois da hipoteca, vale primeiro a
hipoteca) e está estabelecida no registro do imóvel.
Disso decorre o i) direito de sequela e o ii) direito de preferência. Este último se refere à
preferência no registro e na ordem de crédito1. Já o direito de reivindicar contra quem quer
que injustamente possua e detenha a coisa relaciona-se com a ideia de que “a coisa minha,
onde a encontro, ali a reivindico”. Aquilo que me pertence, onde estiver eu reivindico. Esse
injustamente, todavia, não vale por exemplo para o inquilino que detém a coisa justamente
pelo contrato, a coisa então deve ser reivindicada pela lei do inquilinato.
Os direitos reais são só aqueles que taxativamente a lei prevê (numerus clausus,
número fechado). O primeiro deles é a propriedade, depois superfície, e por aí vai. Todo o
direito real que é criado a lei manda colocar no código civil.

Os direitos reais se diferem dos direitos pessoais (obrigações) porque estes são
relações jurídicas interpessoais e podem surgir de um dever jurídico criado pela lei, por
manifestações da vontade humana (atos jurídicos, negócios jurídicos ou atos ilícitos) ou
decorrente de enriquecimento sem causa. Já os direitos reais, por outro lado, tratam da
relação entre uma pessoa e uma coisa, não entre duas pessoas.

Existe uma figurinha chamada obrigações propter rem. São obrigações que afetam a
pessoa do proprietário pelo fato de ser proprietário. São obrigações da própria coisa. A coisa
que deve. Por exemplo, o imposto. Se eu tenho um imóvel e esse imóvel paga imposto. Se o

1 A título de informação, os credores quirografários não têm nenhuma garantia, por conta disso até que existe o
instituto da fraude contra credor. O credor pignoratício possui preferência no recebimento da dívida em face da
entrega da garantia em caso de inadimplência ou descumprimento da obrigação assumida pelo devedor original.
cidadão renunciar à propriedade, renuncia também à dívida, pois quem deve é a coisa, não o
sujeito. A coisa tem os seus compromissos e quem deve primordialmente é ela. Um exemplo:
compramos uma casa que deve o condomínio. No momento que assinamos a escritura sem a
negativa de débitos, dali em diante o novo proprietário responde pela dívida. Essas
obrigações propter rem são ambulantes. Acompanham a coisa. Como toda propriedade que é
vendida, todos os compromissos dela a título de direito real acompanham juntamente com as
obrigações propter rem.

3 Cronograma de atividades
Introdução à disciplina. Direito das Coisas. Direitos reais. Noção geral.
Posse: conceito, hist., separação da propriedade e da detenção, regras básicas
Posse: classificação, aquisição, perda, constituto possessório
Posse: efeitos. Ações possessórias.
Posse: encerramento do ponto
Propriedade: conceito, histórico, princípios, extensão.
Propriedade: classificação e função social (da posse e da propriedade)
Propriedade: aquisição de imóvel por registro
Propriedade: usucapião
Propriedade: acessão, invasão de construção
Propriedade: perda e tutela. Responsabilidade proprietária. Propr. aparente
Propriedade imóvel: encerramento do ponto
Propriedade móvel: aquisição, perda, tutela
Direito de Vizinhança
Condomínio voluntário e condomínio necessário
Condomínio edilício
Parcelamento do solo: loteamento e desmembramento
11. 10 Primeira prova (matéria toda até condomínio edilício)
8.11 Segunda prova (de parcelamento do solo até alienação fiduciária e leasing)

POSSE

1 Histórico e conceito
Foram os romanos que deram autonomia à situação de fato. Foi uma decorrência de
como era organizada a jurisdição romana. Elegia-se um pretor que era o titular da jurisdição.
Uma vez investido no cargo, eleito, era poderosíssimo e podia baixar editos porque havia o jus
edicendi (o direito de editar normas de jurisdição). Quando surgiam problemas envolvendo
dinheiro emprestado, começando um embrião de direito bancário em Roma. Quem
normatizou? O pretor, na jurisdição. Eles não baixavam lei para isso. Eles iam criando ações,
exceções, baixando algumas normas de interesse específico para resolver os conflitos. Mas
esse pretor recebia as partes, balizava a lide, fixava o fato, a contestação, exceções, e
encaminhava a lide assim balizada no formulário a um particular, que julgaria. Depois
retornava para ele. De outro modo ele se tornaria muito poderoso. Ele era obrigado a delegar
para que um particular desse a sentença. Era uma opinião. Era o seu sentir sobre o caso.
As partes então compareciam diante do pretor. O autor falava a sua razão, a sua
petição. Era um processo oral testemunhado. E depois a outra parte também dava as suas
respostas, alegações, que eram revertidas ao formulário para nomear o juiz. Havia algumas
casas com um problema complicado. Por exemplo: os dois romanos estão disputando uma
junta de bois. Até julgar, era preciso encontrar um critério para saber o que fazer com os bois.
Não havia antecipação de tutela, ele não podia abusar do seu poder. Ele tinha que arrumar um
critério para ver o que fazer com os bois enquanto não sobrevinha a sentença mas que não
interferisse no mérito. A melhor saída era deixar com um dos dois. Se um dos dois estivesse
com o boi há mais tempo, ele concedia uma liminar para que ele mantivesse o boi, desde que
não houvesse um vício na posse, não tenha sido obtida de maneira violenta, ilícita ou precária.
A posse então adquire certa autonomia pois ela era protegida por um edito do pretor. A posse
era reconhecida pelo pretor durante a demanda quando se tratava de ação possessória.
A ordem do pretor se chamava “interdictum”, que significa dito entre duas pessoas.
Uma ordenança do pretor fora da ordem do processo. Não era uma decisão de mérito. Assim a
posse ganha autonomia em relação à propriedade. Os alemães, pelo contrário, nunca fizeram a
separação entre posse e propriedade. Mas os romanos precisaram tratar a coisa em relação ao
conflito com uma complexidade social maior. Conquistas, avanços, muitos estrangeiros em
Roma. Foram obrigados a sofisticar o seu direito. As famílias germânicas, os grupos, eram
muito mais simples, não chegaram a essa separação entre posse e propriedade.

Isso dito, podemos passar dois conceitos de posse: o do código civil italiano e o do
código civil brasileiro.
Art. 1140/Código civil italiano de 1942: Posse é o poder sobre a coisa
que se manifesta em uma atividade correspondente ao exercício da
propriedade ou de outro direito real. Esse direito real nem sempre existe,
pode ser também uma posse para obter esse direito real.

Art. 1.196/Código civil brasileiro de 2002: Considera-se possuidor todo


aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes
inerentes à propriedade.

Ambos os códigos dizem quase a mesma coisa com palavras diferentes. É possível estar
na posse de alguma coisa como proprietário, usufrutuário, inquilino ou em uma série de
situações que exteriorizam o poder sobre a coisa, independentemente da condição de dono ou
de titular de outro direito real qualquer. A posse espelha um direito real na sua complexidade,
nas diversas situações fáticas. Podemos citar o exemplo da composse entre marido e mulher
sobre um terreno no âmbito da sociedade conjugal.
Art. 1.199. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma
exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros
compossuidores.

Por isso é que se o marido sai da casa, ele ainda tem posse, porque a sua compossuidora
ainda está na casa. Nesses casos, também basta que um possuidor entre com alguma ação e
ela valerá para todos os outros. Outra circunstância é a propriedade indígena, que é coletiva,
não a título singular. Por isso um indígena não pode usucapir uma parte da terra contra os
outros indígenas.
Há outras situações jurídicas que compõem o universo e complementam o conceito de
posse. Detentor, por exemplo, é aquele que, mesmo tendo a aparência de possuidor,
exteriorizando o poder sobre a coisa, não é assim considerado e não goza de proteção
possessória. É o caso do caseiro que usa as ferramentas da empresa ou do hóspede que se
beneficia de simples atos de tolerância ou de hospedagem. Outra categoria é a do
desapossado, aquele que tendo perdido a posse tem o direito de recuperá-la. Enquanto não o
fizer, não voltará a possuir mas o Direito assegura-lhe o uso dos interditos possessórios. Outra
situação de interface é a do proprietário não possuidor que pretende imitir-se na posse, pela
via petitória, com base no direito real, a teor do art. 1228 do CC.
Os códigos civis do mundo dividem-se em duas correntes: os que seguem a teoria de
Jhering e os que seguem a teoria de Savigny. Cada um vai ter uma visão do direito de acordo
com a sua história de vida e seu lugar na sociedade. Tem as suas certezas, as suas questões e
as suas respostas. Existem muitos autores com que às vezes nos identificaríamos mais, mas o
sistema se identifica com alguns outros. Todo o modelo de propriedade e posse da
modernidade fecha com Savigny e Jhering. Mas aqueles que discordam ficam em segundo
plano.

Aqueles que seguem a teoria de Savigny (italiano, francês, espanhol) consideram


possuidor somente aquela pessoa que possui com ânimo de dono; o inquilino, o usufrutuário,
o credor pignoratício são meros detentores para eles, porque não têm animus domini; mas
isso não significa que não possam invocar os interditos possessórios, ainda que na condição
de detentores.
Os Códigos da outra corrente, como o alemão e o brasileiro, seguem a teoria objetiva de
Jhering; para eles, o inquilino, o comodatário, o usufrutuário são considerados possuidores e
por isso com direito a invocar os interditos possessórios. O inconveniente desta teoria que
adotamos é o desdobramento da posse em indireta e indireta.

2 Separação entre posse (possessório) e propriedade (petitório)

A separação entre o petitório e o possessório decorre da autodeterminação da posse,


que é a prerrogativa de proteger-se a si mesma, com ações próprias, sem qualquer vínculo
com a propriedade. Um é o campo possessório, do “Jus possessionis” e suas ações, que são os
interditos possessórios. Outro é o campo da propriedade, com o “Jus possidendi” e suas ações
petitórias, das quais a mais importante é a ação reivindicatória, de que se serve o proprietário
nos casos em que o possuidor a possui ilegitimamente. Então: em termos de exteriorização
posse e propriedade são iguais, pois ambas representam submissão de uma coisa a uma
pessoa, conforme figurado no quadro abaixo; mas o possuidor que é possuidor e proprietário
ao mesmo tempo tem uma situação muito mais vantajosa do que aquele que possui sem ser
proprietário. Porque o proprietário possuidor, quando agravado em seu direito, pode optar
entre o caminho possessório e o petitório para defender-se; e em optando pelo possessório, se
não obtiver sucesso, poderá voltar à carga pela via petitória, fazendo valer a sua condição de
proprietário. Já o possuidor não-proprietário esgota as forças no campo possessório.
Um exemplo disso é um caso visto na jurisprudência catarinense de um casal
paupérrimo que chega de ônibus no final da tarde em uma cidade do interior sem ter para
onde ir. Um senhor que estava observando o ônibus oferece uma das suas casas para o casal
morar e sai contando para os amigos. É um contrato de comodato verbal. Todavia, o casal
avacalhou com a propriedade, e o senhor queria despejá-los. Mas por isso ele teria que
revogar a concessão, sendo que eles tinham expectativas em relação à ocupação, ainda que
gratuita. Eles estavam ali num ato de liberalidade, mas tinham direitos, independentemente
da propriedade. A posse se separa da propriedade absolutamente. O casal, então, utiliza o “Jus
possessionis” para reintegrar a posse. O juiz concede o interdito. O que o advogado da família
provou é que eles entraram lá com o beneplácito dessa pessoa que deu inclusive uma cesta
básica e uma semana depois pediu de volta.
Por outro lado, aquele senhor generoso era o proprietário da casa e, por conta disso,
poderia optar também pela ação reivindicatória. O proprietário de um apartamento pode sê-
lo por herança, por compra de registro de imóveis, por usucapião, por casamento. O
proprietário sempre tem um modo de aquisição que ele tem que provar. Agora, para a posse
cabe provar se ela ainda dura e se é legítima em relação ao adversário, isto é, se não foi
adquirida de forma violenta, ilegítima ou precária.

2.1 Jus possessionis = ações possessórias


O Jus possessionis é o direito nascido da própria posse: quero continuar possuindo
porque possuo. A ação decorrente do Jus possessionis é defensiva: procura manter o statu quo
alterado. Seus efeitos são temporários, pois se sobrevier ação petitória contrária, a sentença
daquela é absorvida pela petitória. A coisa julgada da possessória não tem eficácia contra a
petitória. As ações possessórias são os interditos de Manutenção e de Reintegração de Posse e
o Interdito Proibitório.

2.2 Jus possidendi = ações petitórias


O Jus possidendi é o direito à posse emanado do direito de propriedade e seus
desmembramentos. Tem intento ofensivo: recuperar o domínio. É definitiva: não encontra
obstáculo na coisa julgada possessória. São ações petitórias: a Reivindicatória, a de Imissão de
Posse (apesar do nome), a Confessória, a Negatória, entre outras.

3 Separação entre posse e detenção (polêmica Savigny e Jhering)


Na aparência, posse e detenção também são iguais: ambas apresentam-se como um
fato que exterioriza poder sobre a coisa. Como distinguir uma da outra? Pela doutrina de
Savigny, posse é a soma de animus e corpus. Logo, não basta deter a coisa, sem o animus, a
intenção, pois então não será possuidor. É o caso de um fanático torcedor de um time que está
dormindo e sobre cuja cabeça os colegas colocam o boné do time rival. Para Savigny, ele não
tem a posse do boné, mas somente a detenção, pois não tinha o animus, a intenção. Ele
sustenta que só existe um possuidor e que os outros são apenas detentores, mas com direito
de ação. Apesar disso, para o autor os detentores também têm direito a ação possessória, pois
existe ali algum vínculo. Assim é o código italiano.

Já o Jhering, que foi aluno do Savigny, contrapõe-se a essa teoria dizendo que ela é
subjetiva e que se a seguíssemos teríamos que olhar para dentro do sujeito para saber se
existe posse. Ele então defende uma teoria objetiva. Para ele, basta o corpus, pois no corpus já
está embutido o animus. Todo o ato de apoderamento da coisa é posse. Só não será posse, será
detenção, se estiver previsto na lei.
O Código brasileiro traz alguns casos de detenção.
Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência
para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou
instruções suas.
Parágrafo único. Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este
artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o
contrário.

Por exemplo, os atos de mera permissão ou tolerância. A pessoa passou pelo meu
terreno, porque eu deixei passar. Outro dia passou de novo. Vem aqui na minha janela, bate,
pergunta. Volta e meia ele faz isso. Não tem posse de servidão porque na verdade a lei diz que
os atos de mera permissão ou tolerância não induzem posse. Também não tem posse quem se
apodera da coisa de forma violenta. São casos de detenção. Outro caso de detenção, o
empregado, subordinado, tem a coisa na relação de emprego, também não é possuidor, é
detentor. Para Jhering, a regra geral: todo poder sobre a coisa é posse, mesmo que elas sejam
meramente recorrentes de direito pessoal. Basta classificar a posse como direta e indireta.

4 Regras básicas da posse


a) A posse deve ser separada da propriedade, pois ambas têm campos distintos de
tutela. Posse tem proteção própria, tem uma autonomia em relação à propriedade: jus
possessionis. É o direito de proteção à posse que é feito por ações possessórias, mais
tecnicamente pelos interditos possessórios. O estado de fato é autônomo, pode se defender
sozinho, tem uma ação própria. Mas se eu quiser me defender como proprietário, é o campo
do jus possidendis, das ações petitórias. Às vezes eu me defendo como possuidor, às vezes
como proprietário.
b) Posse é regra e detenção é exceção;
c) O caráter da posse não pode ser alterado unilateralmente. O caráter da posse é o
motivo pelo qual ela se instalou. Se adquirida de herança, esse é o caráter da posse e não pode
ser alterado. Se entrou como inquilino, inquilino será sempre (CCB, art. 1203). Se não, não
poderia alugar porque o cara iria sempre usucapir.
d) A ação possessória é de cognição parcial: cuida do fato, apenas, deixando a questão de
fundo para a cognição petitória;
e) A posse tem natureza dúplice (CPC, art. 556): o réu, na contestação, alegando que foi o
ofendido em sua posse, pode demandar a proteção possessória e a indenização pelos
prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor.
f) Quem nunca teve posse não tem direito à proteção possessória;
g) Só se tem posse onde se pode ter propriedade. Se o camarada se apropria de uma ponte
pública, ele não pode fazer uma ação possessória, porque não pode usucpair. Abre-se uma
exceção quando dois particulares disputam e o poder público não está nem aí. Também não
existe posse sobre um órgão de transplante, um rim, nem de uma sepultura -- pois o que
importa são os restos mortais -- , são todos direitos de personalidade, insuscetíveis de posse e
de usucapião.
h) duas pessoas não podem possuir in solidum (sozinhas) ao mesmo tempo (o que não se
confunde com a composse nem com o desdobramento da posse em direta e indireta). Vale
dizer, ou a posse nova extingue a posse anterior; ou a posse velha prevalece, sem que se
instale a posse nova.
Obs.: a execução da sentença possessória será por mandado (uma ordem judicial).

5 Classificação
5.1 Justa e injusta
Trata-se da categoria mais importante da classificação e diz respeito aos vícios objetivos
da posse (quando o proprietário a perde contra a sua vontade): violência, clandestinidade e
precariedade.
Art. 1.200. É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.

Justa é a posse que foi adquirida sem a mácula de qualquer um desses vícios, como, por
exemplo, quando o possuidor entra com o beneplácito do proprietário por meio de um
contrato. Essa distinção é importante, pois somente quem tem ou teve posse justa tem direito
aos interditos possessórios. O possuidor injusto só tem esse direito se a sua posse for justa em
relação ao seu adversário.
Os vícios objetivos têm uma característica fundamental: são relativos e temporários.
Relativos porque só podem ser alegados pela pessoa que sofreu a violência, clandestinidade
ou precariedade. O ladrão só tem posse injusta em relação à vítima e só a vítima pode alegar
posse injusta por violência. Pode existir um sujeito que tenha uma posse justa em relação a
uma pessoa e injusta em relação a outra. Temporários porque podem convalescer com o
tempo, já que a posse pode assumir o papel de antidireito, marchando para a usucapião.
Cessada a violência ou a clandestinidade, a posse se instala, embora viciada, disparando
tempo para a usucapião.
Pensemos na situação do fulano que tem um imóvel em Florianópolis invadido durante
as Olimpíadas quando vai para o Rio de Janeiro por um ciclano de Maravilha, do oeste do
Estado, de maneira violenta e clandestina. Quando retorna e toma conhecimento,
imediatamente deve tomar as medidas necessárias para reavê-la. Caso o fulano vença a ação
possessória, recupera a posse como se nunca a tivesse perdido, pois a posse só foi suspensa,
mas nunca interrompida. Agora, caso a perca, a partir do momento que havia cessado a
violência e a clandestinidade, é desde lá que começa a contar o reloginho para a usucapião.
A precariedade, por outro lado, não convalesce jamais, pois deriva de uma relação
jurídica anterior. Pode ser exemplificada pelo comodatário ou inquilino que quer usucapir.
Todavia, deve-se fazer atenção aos casos: i) de o detentor alienar posse a terceiro de boa fé,
hipótese em que o possuidor somente poderá recuperar a coisa pela via petitória (CCB, art.
1.2122); ou então, ii) de o detentor precário desapossar violentamente o possuidor, sem que
este tome as medidas de recuperação da posse (é hipótese em tudo semelhante à do art.
12243).
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não
autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a
violência ou a clandestinidade.

A posse será violenta quando adquirida pela força, seja ela física ou moral. Quando
adquirida às escondidas, ou seja, de maneira oculta, sem que o legítimo possuidor se dê conta,
será considerada posse clandestina. Por sua vez, é precária a posse quando se verifica abuso
de confiança. O possuidor direto se nega a restituir a coisa e passa a agir como se dono fosse.
Na hipótese de turbação, o possuidor tem direito a ser mantido na posse; de esbulho, de
ser restituído; de violência iminente, de ser segurado; caso haja justo receio de ser molestado
(conforme art. 1210). O possuidor turbado ou esbulhado poderá manter-se ou restituir-se por
sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir
além do indispensável à manutenção ou restituição da posse (§ 1o). A alegação de propriedade
não obsta a manutenção ou restituição da posse (§ 2o). A norma desse artigo prevalece na
situação do art. 1211, segundo a qual quando mais de uma pessoa se disser possuidora,
manter-se-á provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de
alguma das outras por modo vicioso.
Vale destacar que a perda da posse por invasão clandestina deve ser distinguida de uma
situação muito comum: quando um cidadão se encanta por uma pessoa estrangeira e resolve
permanecer no exterior e de repente uma família ocupa um seu imóvel pensando que está
abandonado. Aquele que não presenciou o esbulho porque não estava presente, não
necessariamente abandonou. Como o soldado que foi cumprir uma missão no Haiti e deixa o
seu imóvel temporariamente. Possuidor é aquele que se comporta como se comporta o

2 Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o terceiro, que recebeu a
coisa esbulhada sabendo que o era.
3 Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se

abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido.


proprietário. Se em um tipo de propriedade é normal não aparecer por 4 anos mas em outro
não, temos que analisar no caso concreto.

5.2 De boa-fé/má-fé
Enquanto a posse é justa ou injusta pela sua origem, a noção de má-fé ou boa-fé diz
respeito ao conhecimento da (i)licitude que permeia essa origem. Esta classificação é relativa
aos vícios subjetivos da posse e tem importância para os efeitos da posse quanto a frutos,
benfeitorias e perda ou deterioração da coisa, sobretudo no momento em que o possuidor
deixa o imóvel. Se ele estava de boa-fé tem um tratamento nessa hora, se estava de má-fé,
receberá outro.

Considera-se de boa-fé o possuidor que ignora o vício ou obstáculo à aquisição. A boa-


fé é presumida quando há justo título. Título aqui no sentido de causa.
Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede
a aquisição da coisa.
Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo
prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.

Vale destacar que não se deve confundir justo título para interdito (de que trata este
artigo 1.201) com justo título para usucapião. No primeiro caso, basta que a aquisição não
tenha sido violenta, clandestina ou precária – aliada a uma causa de aquisição – e já se tem a
presunção. Exemplo, a ocupação de uma res nullius (coisa de ninguém). Já no caso da
usucapião, o justo título é aquele hábil a transmitir a propriedade conforme os requisitos
legais (conferir mais adiante a distinção de posse ad interdicta e posse ad usucapionem.

Pelo art. 1202, a posse de boa-fé pode perder este caráter “no caso e desde o momento”
em que circunstâncias autorizem presumir “que o possuidor não ignora que possui
indevidamente”. Pelo CCB, alguém pode estar de boa-fé e perder esta condição
posteriormente, como por exemplo, ao se deparar com prova inconteste, ou mesmo durante a
demanda, mediante situações objetivas, como a citação ou a contestação. Esta perda da boa-fé,
e o momento em que ocorre, costumam ser objeto de acesa controvérsia nas disputas
judiciais, e a decisão vai depender da prova, das circunstâncias e dos argumentos.
Já o código italiano, na linha romana, não possui semelhante regra. Basta que tenha
havido boa-fé na aquisição, e tal situação não se altera por circunstância ou fato posterior,
perdurando até a devolução da coisa. Diz a última alínea do art. 1147 do CCI: “A boa-fé é
presumida, e basta que existisse ao tempo da aquisição”. De qualquer forma, o CCB, no art.
1.203 estabelece como regra geral a inalterabilidade do caráter com que foi adquirida a posse.
A perda da boa-fé durante a demanda é exceção – e como tal deve ser tratada – perante a
regra geral.

A boa-fé só é decisiva em termos de aquisição da posse no caso do art. 1.212


(isentando o terceiro de boa-fé da ação de esbulho ou de indenização se ignorava o vício). É a
situação do Cunha Porã, amigo do Maravilha (aquele sujeito que havia obtido a posse de um
terreno de maneira clandestina e violenta enquanto o proprietário estava nas Olimpíadas no
Rio de Janeiro). O Maravilha diz pra ele que tem um terreno muito bacana em Florianópolis e
que ele pode vir morar ali, ao que ele aceita de boa vontade. A posse dele não é violenta, não é
clandestina e ele tem justo título. Por isso fica imune em relação ao Maravilha se este ingressa
uma ação possessória contra ele. Mas o proprietário de Florianópolis pode entrar com ação
petitória reivindicatória e ganha.
5.3 Posse direta/indireta
Posse plena é a posse de uma única pessoa. A partir do momento que a propriedade
legítima pertence a uma pessoa, mas a posse está nas mãos de outra -- como na situação de
um imóvel que tenha sido locado -- podemos dividir a posse entre direta (do possuidor) e
indireta (do proprietário).
Posse direta é a posse daquele que a exerce diretamente sobre a coisa, tendo o contato
físico com ela. Já a posse indireta é a do possuidor que entrega a coisa a outrem em virtude de
uma relação jurídica existente entre eles, como no caso do contrato de locação, comodato. O
possuidor que aluga ou dá em usufruto uma coisa a outra pessoa, continua a ter posse
“indireta” sobre o bem, em relação a terceiros, sem prejuízo da posse direta, que transmite ao
usufrutuário ou inquilino. É o desdobramento da posse, que não se confunde com a composse,
pois nela ambos têm posse plena e simultânea.
No desdobramento, o possuidor direto é o detentor da coisa, com direito a interdito,
inclusive contra o possuidor indireto; mas este último, não detém a coisa, apenas permanece
com o direito de invocar os interditos em caso de ameaça, turbação ou esbulho de terceiros.
Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente,
em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida,
podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.

Não existe posse direta sem indireta. Quando alguém se apropria de uma res nullius,
por exemplo, não passa a ter posse direta e sim plena. O desdobramento da posse acontece
quando o possuidor se “demite” voluntariamente da posse, investindo outra pessoa. Exemplo:
aluga a coisa. Uma vez transferida voluntariamente a posse direta, só pode ser recuperada se
o ato de desdobramento for desconstituído. Se a situação é de um comodato por prazo
indeterminado, deve interpelar ou notificar a outra parte, para por fim à relação jurídica
reinante e constituir o comodatário em esbulho, legitimando a retomada pela reintegração de
posse. Quando cessa o desdobramento (rescisão do contrato de aluguel, por exemplo), o
possuidor direto perde a posse direta e o indireto volta a ter posse plena.
Agora, quando o possuidor pleno é desapossado contra a vontade, o que acontece é a
perda da posse, que se remedia pelos interditos (ou então pela via petitória, ou ainda pela
defesa direta, desde que o faça logo, nos termos do art. 1210, § 1º do Código Civil).

Esse desdobramento da posse em direta e indireta é um artificialismo do CCB. Os


códigos de inspiração savignyana (como o italiano) são mais práticos: o inquilino é um
detentor, pois o possuidor é o locador; a pessoa está lá baseada em um contrato, não em
posse. Vale dizer, como só existe um proprietário para cada coisa (sem prejuízo do
condomínio), também existe um único possuidor (sem prejuízo da composse), para cada
coisa. Mas os códigos que seguem Savigny também permitem a ação possessória ao detentor,
que pode invocá-la em face de terceiros e do próprio possuidor.

5.4 Própria/imprópria
Essa distinção então é muito importante para usucapião. Posse própria é de quem tem
ânimo de dono. Se pesca o peixe no rio, se apropria dele, tem animus domini. Posse imprópria
é a daquele que tem posse subordinada à de outra pessoa, que tem posse própria. Por
exemplo: como um imóvel e passo a morar nele, tenho então posse própria. Se invado um
imóvel, passo a morar nele, portando-me como dono, e a pessoa desapossada não reage, tenho
então posse própria. Alugo este mesmo imóvel invadido para “B”, “B” tem posse imprópria, ao
passo que eu tenho posse própria, apesar de injusta, indireta e de má-fé. O meu inquilino “B” ,
que ignora o vício, tem posse imprópria, mas justa e de boa-fé. Eu posso chegar à usucapião
com a minha posse viciada e própria, mas o meu inquilino não, - porque a posse dele é
imprópria. A posse própria é a que leva para o usucapião, porque a posse imprópria é de
quem tem a título que não leva a usucapião, como o inquilino. Ele não pode usucapir a coisa
porque ele tem uma posse pessoal, derivada de contrato. Comodatário jamais poderia
usucapir o bem também.

5.5 Posse originária e derivada


Posse originária é aquela que não é adquirida de ninguém, mas começa do zero: não há
vínculo de aquisição com possuidor anterior. Por exemplo, se alguém acha um objeto no lixo,
gosta e leva para casa, a sua posse será originária, pois se apoderou com animus domini de
uma res derelicta.
A posse derivada, por outro lado, é aquela adquirida de outro possuidor. Assim, o
inquilino tem posse derivada. Da mesma forma, a pessoa que compra um apartamento e vai
morar nele. Sua posse é própria, justa, de boa-fé, mas derivada, em face do vínculo com o
antigo titular.
Havendo algum vício nas mãos anteriores, isso pode afetar a situação jurídica ou os
direitos do adquirente, seja porque ninguém transmite mais direitos do que tem (v. Art.
1212), seja porque a posse anterior viciada pode contaminar a posse não viciada do accipiens.
É o caso de evicção: perda parcial ou total de um bem por motivo de decisão judicial ou ato
administrativo que se relacione a causa preexistente ao contrato. Um exemplo é a venda de
um automóvel pela pessoa A a uma pessoa B, sendo que posteriormente se verifica que na
verdade o automóvel pertence a C. A pessoa B pode sofrer evicção e ser obrigada por
sentença judicial a restituir o automóvel a pessoa C. Alegado o vício, a prova de existência ou
não de boa-fé da pessoa B será decisiva para que ela possa exigir ou não indenização ou para
que ele se torne imune à ação indenizatória da pessoa C.
Outro ponto relevante: na aquisição derivada pode haver soma do tempo de posse
anterior ao tempo de posse do accipiens; na aquisição originária isso não é possível, pois a
posse estará sendo inaugurada. Por exemplo, o Cunha Porã poderia somar o seu tempo de
ocupação com o do Maravilha para usucapir.

5.6 Ad interdicta/ad usucapionem


A posse ad interdicta é aquela que faz jus à defesa pelas ações possessórias. O inquilino
tem tão-somente posse ad interdicta. Posse ad usucapionem é aquela que autoriza a aquisição
por usucapião. No primeiro caso, basta que ela não seja violenta, clandestina ou precária,
frente ao oponente. Já no segundo, não basta: para se adquirir por usucapião é necessário,
além do fato da posse, que ela seja própria, com animus domini, mansa e pacífica, pelo prazo
mínimo de lei, entre outros requisitos, conforme a espécie de usucapião de que se cogite.
Quem tem posse ad usucapionem, que é o mais, tem com certeza posse ad interdicta, que é o
menos; mas a recíproca não é verdadeira, como se observa no caso mencionado, do inquilino.

5.7 Com ação de força nova/forca velha


Toda posse justa, dentro de um ano de desapossamento ou turbação, é tutelada por
ação possessória com força nova, ou seja, o direito de manutenção ou reintegração de rito
especial, com direito a liminar de reintegração ou manutenção (CPC, art. 560-566). Se o
possuidor, desapossado ou turbado, não invocar a tutela possessória no prazo, perderá o
direito à tutela de força nova, sem prejuízo da ação ordinária de posse, que se chama ação de
força velha. Perderá, apenas, o direito à ação especial com liminar. Se continuar inerte,
poderá perder a coisa no prazo da usucapião pertinente. Isso está previsto no art. 558 do
Código de Processo Civil de 2015:
Art. 558. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas
da Seção II deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da turbação
ou do esbulho afirmado na petição inicial.
Parágrafo único. Passado o referido prazo do caput, será comum o procedimento, não
perdendo, contudo, o caráter possessório.

Na situação do imóvel do Florianópolis, uma vez iniciada a ocupação viciada e injusta


pelo Maravilha, o proprietário pode entrar com ação de força nova antes de ano e dia; depois,
terá direito apenas a ação de força velha.

Vale destacar que não é necessário ter ano e dia de posse4 para ter direito à ação
especial de força nova; basta que seja justa em relação ao oponente e que o agravo à posse não
tenha ocorrido há mais de ano e dia. Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, diz o
art. 1211 a propósito, “manter-se-á provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver
manifesto que a obteve de alguma das outras por modo vicioso”.
É necessário apontar, ainda, que não se perde a posse depois de ano e dia, e sim no
momento em que se é desapossado, cessada a violência ou clandestinidade. Nem o esbulhador
passa a ter a posse depois de ano e dia, pois a posse ele já tem desde a usurpação não
remediada, embora viciada. Os meios de defesa do antigo possuidor é que vão diminuindo:
primeiro o direito de defesa direta (CC, art. 1210, § 1º), depois a ação especial com direito de
liminar; enfim, a ação ordinária de posse, sem perder o caráter possessório. Se nada fizer e
permitir correr os prazos de lei, poderá perder definitivamente a coisa por usucapião.
No caso de turbação da posse, o prazo de ano e dia conta do último ato de gravame. Se
forem vários atos ou uma continuidade de atos, o prazo se conta sempre do último
molestamento. Se houver a perda da posse, o prazo corre a partir do esbulho.

5.8 Posse comum/posse trabalho


A posse comum é o simples poder sobre a coisa. A posse trabalho é mais do que isso. A
posse trabalho ou posse útil é uma posse especial. Quem tira do imóvel rural ou urbano o seu
sustento, tem nesse imóvel a sua moradia e a da sua família e/ou faz nela investimentos de
interesse social e econômico, tem a posse trabalho com função social e recebe então um
tratamento privilegiado: encurta-se o prazo da usucapião (art. 1238 e art. 1242, parágrafos
únicos). Um exemplo de posse útil é a recuperação de um terreno que era uma cratera lunar e
que havia sido usado indevidamente por leigos.

5.9 Posse singular/composse


A mesma posse pode ter um (posse singular) ou mais de um possuidor (composse). Os
princípios e regras da composse são diferentes. É o caso que uma pessoa que mora e deixa a
herança para vários herdeiros, que terão uma composse a título de herança regida pelo direito
de sucessões. Se uma pessoa ficar morando no imóvel da herança e os outros estão fora, ela é
possuidora direta? Ou não? Quando várias pessoas tem uma única posse, um deles estando no
imóvel, é como se todos os outros estivessem. Ele não é possuidor direto, todos são
possuidores plenos.
Aí que vem o problema do artigo 1240-A do Código civil, da usucapião no código civil,
quando fala da usucapião pelo cônjuge sobre a propriedade que dividia com o ex-
companheiro que abandona o lar.
Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição,
posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e
cinquenta metros quadrados) cuja propriedade dividia com ex-cônjuge ou ex-
companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família,
adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel
urbano ou rural.

4 Na verdade para os romanos era de um ano, one jour foi acrescentado pelos franceses.
Para o professor, é um erro técnico absurdo, pois o bem do casal se trata de composse.
Logo, se um dos cônjuges permanece no imóvel, o outro ainda é possuidor, pois ambos têm a
posse plena enquanto o outro permanecer. Não se pode, portanto, falar em posse direta neste
caso. A redação do artigo deveria ser corrigida.

6. Aquisição da posse (art 1204-1209)


Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício,
em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.
Esse dispositivo refere-se também à aquisição de posse de qualquer direito real
(usufruto, superfície, servidão) desde que em nome próprio (e não como servidor da posse,
por exemplo).

O ato de aquisição pode ser praticado por representante, e até mesmo por terceiro
sem mandato, desde que haja ratificação.
Art. 1.205. A posse pode ser adquirida:
I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;
II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.

A posse transmite-se aos herdeiros com os mesmos caracteres, por isso não pode
alegar, em princípio, boa-fé se boa-fé não tinha, por exemplo, o de cujus.
Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os
mesmos caracteres.

Agora, ao sucessor a título singular é facultado unir sua posse à do antecessor, ou


iniciar uma posse nova.
Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao
sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.

No caso de violência ou clandestinidade, a posse não é adquirida enquanto não


cessarem esses vícios – mas de qualquer modo, será uma aquisição viciada. Os atos de mera
permissão ou tolerância também não operam aquisição de posse, pois o detentor não tem o
“poder” sobre a coisa. Quem passa por um terreno por mera deferência do proprietário não
tem posse de servidão de passagem, e o fato enquadra-se na figura da mera permissão ou
tolerância.
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não
autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a
violência ou a clandestinidade.

A posse de imóvel faz presumir a posse das coisas móveis que nele estiverem (CCB, art.
1209).

Há casos em que a aquisição da posse se dá solo animo, ou seja, com dispensa da


tradição. É o caso, por exemplo, do empregado que compra a ferramenta de trabalho que
detém. Ele que tinha o objeto como detentor, passa a tê-lo como possuidor e proprietário. É a
chamada traditio brevi manu, meramente consensual. A situação inversa é a do constituto
possessório (que veremos no capítulo perda da posse), mas se dá quando o possuidor passa à
condição de detentor da coisa que a possuía ou a possuir sob outro título menos vantajoso.
7. Efeitos da posse (art. 1210-1222)
O efeito por excelência da posse é o direito à tutela jurídica interdital. Mas também se
apontam entre eles a usucapião e os reflexos quanto a frutos, benfeitorias, perda e
deterioração da coisa. O possuidor sempre estará numa situação mais favorável em relação à
coisa, e o seu desapossamento pode ser acompanhado de indenizações e até direito de
retenção, dependendo das especificidades do caso concreto.

7.1 Tutela

7.1.1 Autotutela
Duas são as hipóteses de autotutela pelo possuidor: i) legítima defesa, quando a posse
é turbada; ii) desforço imediato, quando a posse é perdida por esbulho. Turbação é qualquer
embaraço ao exercício da posse, sem acarretar na perda: entro no imóvel e tiro lenha contra a
vontade do possuidor, por exemplo; ou emito fumaça para dentro da sua casa, perturbando-o.
Pode ser provada por meio de fotografias, cercas cortadas, fios no chão, terra mexida, dentre
outros modos. Esbulho é o ato que acarreta a perda da posse, de modo violento, clandestino ou
precário. A violência pode ser física ou moral. A clandestinidade significa ação às ocultas, na
ausência da pessoa. Posse precária é a adquirida com abuso de confiança: entrego meu relógio
para disputar uma partida de futebol e o detentor se apodera dele.
Os atos de defesa não podem ir além do indispensável à manutenção ou restituição da
posse.
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação,
restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser
molestado.
§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua
própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir
além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.

7.1.2 Interditos possessórios


Se não tomou essas medidas imediatamente, recorre aos interditos possessórios:
i) Manutenção de posse no caso de turbação;
ii) Reintegração é no caso do esbulho, como o Florianópolis quando perde a posse;
iii) Proibitório: no caso de grave ameaça, um perigo iminente para posse de turbação e
esbulho. Aí o possuidor pode requerer ao juiz preventivamente a defesa possessória.
Então o juiz já comina uma pena previamente.

Conforme visto na distinção entre força velha e força nova, se o esbulhado propuser a
ação até ano e dia, tem direito a liminar; passado o prazo, será comum o procedimento, não
perdendo contudo o caráter possessório.

Caso mais de uma pessoa se proclamar possuidora, a posse será mantida com a que
tiver a coisa, salvo se estiver manifesto que a pessoa a obteve de modo vicioso.
Art. 1.211. Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á
provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de alguma
das outras por modo vicioso.

A ação de esbulho, ou de indenização, pode ser proposta contra o terceiro, “que


recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era” (CCB, art. 1212). Se o terceiro estiver de boa-
fé, só restará ao esbulhado a via petitória contra aquele.

No caso das servidões, a proteção possessória só é cabível se forem aparentes (art.


1213 e Súmula 415 do STF), salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do
prédio serviente ou daqueles de quem este o houve. Por exemplo: não posso impedir que o
vizinho construa, tirando-me a bela vista para o mar; porém, se adquiri dele uma servidão
neste sentido, poderei impedir que ele edifique.
Art. 1.213. O disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões não
aparentes, salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do prédio
serviente, ou daqueles de quem este o houve.

7.1.3 Exceção de domínio


Não raras vezes, o possuidor, além de ter o direito à proteção possessória, ele
também tem o domínio (direito de possuir a coisa). Normalmente, quem entra com ação
possessória também alega que é dono. Este fato, entretanto, é irrelevante para a possessória.
Ocorre que, excepcionalmente, podia a questão do domínio ser versada no juízo
possessório, tendo em vista que as partes finais do art. 505[1] do CC/1916 e do art. 923[2] do
CPC de 1973 (redações originais) determinavam ao juiz que não deferisse a posse a quem
evidentemente não pertencesse a propriedade e que a deferisse àquele a quem pertencesse
evidentemente o domínio, respectivamente. Nestes casos, ao invés de remeter os litigantes a
nova ação, o juiz poderia outorgar a posse àquele a quem, evidentemente, pertencesse o
domínio.
Assim, a jurisprudência vinha limitando a duas hipóteses a permissão para exame,
pelo juiz e dentro da esfera possessória, da questão da propriedade: a) quando ambos os
litigantes disputavam a posse com fundamento em prova de domínio; b) quando o exame da
prova não tinha sido capaz de dissipar a dúvida no que respeita ao verdadeiro possuidor.
A Súmula 487 (STF) dispunha: "será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o
domínio; se com base neste ela for disputada".
Entretanto, a fim de conciliar a contradição existente entre a impossibilidade de se
discutir domínio no seio da ação possessória e as duas partes das referidas disposições legais,
veio a Lei 6.820/80 (primeiro momento), a qual suprimiu a segunda parte do artigo 923 do
CPC de 1973, razão pela qual parte da jurisprudência já havia começado a se posicionar no
sentido da revogação do art. 505, CC/16 e da superação da Súmula 487 STF, a fim de extinguir
a exceção de domínio em nosso ordenamento.
O Código Civil de 2002 estabeleceu a absoluta separação entre os juízos petitórios e
os possessórios.
Art. 1.210. § 2o Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de
propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.

O Novo CPC, de 2015, resolveu a controvérsia. Não se admite nas ações possessórias a
discussão sobre o domínio da coisa a cujo respeito foi intentada a ação (vide art. 557, CPC).
Significa que na ação possessória não pode ser decidido o domínio, nem intentada ação
reivindicatória, por exemplo, exceto se a ação for deduzida em face de terceira pessoa
(art. 557, caput, final).
Assim, nem o autor da ação possessória nem o réu poderão discutir entre si o
domínio do bem, mas tão somente a posse. Contudo, qualquer um dos dois poderá questionar
a propriedade em face de terceiro, de modo que a ação de natureza petitória poderá ser
intentada enquanto pendente ação possessória, desde que não envolva as duas partes
dessa ação.
No entanto, se as partes disputarem a posse com base na alegação de serem
proprietárias do bem, o juiz deve decidir o conflito em favor da parte que prove esse domínio,
porém declarado apenas incidentalmente na motivação da sentença (art. 557, parágrafo
único, do CPC). Ou seja, a alegação de domínio pode justificar o ajuizamento da ação
possessória, podendo o Magistrado conceder ou não a tutela possessória com base nessa
alegação e em outros elementos. O que não poderá adentrar é na discussão de domínio.
Convém ressalvar que o título de domínio, embora não seja o objeto principal da ação,
poderá ser indício de que há posse em favor do seu titular, podendo o autor valer-se de tal
documentação como prova da sua posse, sem que isso implique em discussão sobre o
domínio.

7.1.4 Liminar de posse e antecipação de tutela


O pretor romano no início da ação queria proteger a coisa mas não queria deixar na
mão de terceiros. Então estabelecia um critério distinto para conceder a liminar ou negar. Ele
pergunta: com quem está a coisa? Há quanto tempo? Se fosse há mais de um ano, deixava, pois
se o outro aguentou até agora, aguenta até o final da demanda. Se foi em relação à outra parte,
de forma violenta, clandestina e precária, manda devolver. Com isso tinha um critério para
decidir quem ficaria com a coisa enquanto não fosse decidida a questão de mérito. A ação
possessória é uma ação só para ver quem fica com a coisa enquanto não se decide o mérito.

Vale distinguir, todavia, estes institutos processuais: na i) liminar de posse o juiz


antecipa a posse a um dos contendores, confirmando-a ou não no final. A ii) tutela antecipada
(Lei 8952/94) pode ser concedida no momento da postulação ou no curso do processo de
conhecimento, antecipando – como o próprio nome diz – a satisfação do direito afirmado.
Portanto, os requisitos são diversos e a finalidade também. Se você, propondo uma
ação possessória, requereu ao juiz a manutenção ou reintegração liminar initio litis, o juiz vai
conceder. Mas se você fizer um outro pedido de tutela antecipada, vai fazer provando o que
está requerendo, apresentando os subsídios, o fumus boni iuris, estará trabalhando dentro da
antecipação de tutela, que é um instituto processual autônomo em relação à liminar de posse.
Cada qual no seu lugar. Se você requerer um outro, vai ter que apresentar ao juiz um subsidio
de posse.
Exemplo: “A” propõe ação de reintegração contra “B”, objetivando recuperar a posse
de uma vasta área, com infraestrutura própria à realização de rodeios de grande porte; sem
saber que teria problemas com “B”, firmara contratos milionários com empresários e canais
de televisão para realização de um famoso evento naquele local, conforme já divulgado. Agora,
perante o conflito inesperado, “A” corre o risco de não recuperar o imóvel a tempo, o que lhe
acarretará multas e prejuízos milionários injustificáveis. Em tal situação ele, fazendo prova
inequívoca da verossimilhança da alegação, demonstrando o fundado receio de dano
irreparável ou de difícil reparação, formulará pedido autônomo de antecipação total ou
parcial da tutela possessória, no sentido de ser autorizado a realizar o evento no imóvel
objeto do litígio possessório. O juiz, sem prejuízo da audiência de justificação prévia e da
tramitação da possessória, poderá antecipar a tutela, somente para a realização do rodeio.
Com isto, o magistrado estará protegendo ambas as partes contra prejuízos de grande monta.
Não há, portanto, incompatibilidade entre a liminar initio litis na posse e a antecipação da
tutela. São pedidos autônomos e cada um tem os seus requisitos.

7.1.5 Rito das ações possessórias


As ações possessórias são caracterizadas pelo princípio da fungibilidade, conforme
previsto no caput do art. 554. Às vezes entrei com uma ação de reintegração e era
manutenção; o juiz vai dar a proteção correspondente. Isso principalmente no código
anterior, quando entrou em vigor, era um horror. Mas hoje está muito mais fácil. No caso do
Florianópolis, por exemplo, que perdeu a posse para o Maravilha e entrasse com ação de
manutenção de posse, se ficasse provado nos autos que foi esbulho e que ele deveria ter
entrado com reintegratória de posse, o juiz não vai prejudicá-lo por isso.
Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o
juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos
pressupostos estejam provados.

Os parágrafos desse dispositivo constituem uma das maiores inovações do novo


Código ao estabelecerem regras facilitadoras de citação dos réus. No caso de ação possessória
em que figure no polo passivo grande número de pessoas, será feita a citação pessoal dos
ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais; será ainda
determinada a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de
hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública.
§ 1o No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de
pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e
a citação por edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério
Público e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da
Defensoria Pública.

Neste caso, o oficial de justiça procurará os ocupantes no local por uma vez e os que
não forem identificados serão citados por edital.
§ 2o Para fim da citação pessoal prevista no § 1o, o oficial de justiça procurará os
ocupantes no local por uma vez, citando-se por edital os que não forem encontrados.

Ainda, o juiz dará ampla publicidade acerca da existência da ação e dos respectivos
prazos processuais, podendo se valer de anúncios em jornais ou rádios locais, publicação de
cartazes na região dos conflitos e de outros meios.
§ 3o O juiz deverá determinar que se dê ampla publicidade da existência da ação
prevista no § 1o e dos respectivos prazos processuais, podendo, para tanto, valer-se de
anúncios em jornal ou rádio locais, da publicação de cartazes na região do conflito e de
outros meios.

Além do pedido possessório, pode ser cumulado o pedido de perdas e danos e


indenização dos frutos, além do que prevê o parágrafo único:
Art. 555. É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:
I - condenação em perdas e danos;
II - indenização dos frutos.
Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e
adequada para:
I - evitar nova turbação ou esbulho;
II - cumprir-se a tutela provisória ou final.

Já o art. 556 regula a defesa do réu nas possessórias, o que caracteriza o caráter dúplice
do procedimento: o réu pode receber tutela jurisdicional equivalente à do autor no mesmo
processo. É uma espécie de reconvenção, mas automática. Basta que ele se defendendo alegue
que a posse é dele. É claro que para fazer esse tipo de pedido, não basta só contestar, mas
reivindicar a posse, deve provar todos os requisitos que o autor teve que provar na petição
inicial.
Art. 556. É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse,
demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da
turbação ou do esbulho cometido pelo autor.

O art. 557, conforme estudado no tópico exceção de domínio, reforça a diferenciação


entre as ações possessórias, em que se discute exclusivamente a posse, e as ações petitórias,
que tem como único fundamento a propriedade. Segundo o caput do referido artigo, na
pendência de ação possessória, é vedado, tanto ao autor quanto ao réu, propor ação de
reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa.
Art. 557. Na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor quanto ao réu,
propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face
de terceira pessoa.
Parágrafo único. Não obsta à manutenção ou à reintegração de posse a alegação de
propriedade ou de outro direito sobre a coisa.

Conforme estudado no tópico sobre força velha e força nova, o novo código manteve a
dinâmica existente entre as ações ajuizadas dentro do prazo de um ano e um dia da data do
esbulho e turbação, ações estas chamadas de força nova. Tais ações continuarão seguindo o
procedimento especial, que se encontra previsto na Seção II do Capítulo dedicado às
possessórias. Já as ações ajuizadas após um ano e um dia da data do esbulho ou turbação,
ações estas de força velha, seguirão o procedimento ordinário, sem, contudo, perder o seu
caráter possessório.
Art. 558. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas
da Seção II deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da turbação
ou do esbulho afirmado na petição inicial.
Parágrafo único. Passado o prazo referido no caput, será comum o procedimento, não
perdendo, contudo, o caráter possessório.

No que diz respeito ao art. 559, determina que, deferida a liminar de reintegração ou
de manutenção na posse, e demonstrado pelo réu que o autor carece de idoneidade financeira
para, no caso de sucumbência - caso a demanda seja julgada improcedente – responder por
perdas e danos, deverá o réu prestar caução, real ou fidejussória, sob pena de ser depositada a
coisa litigiosa, ressalvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente.
Art. 559. Se o réu provar, em qualquer tempo, que o autor provisoriamente mantido ou
reintegrado na posse carece de idoneidade financeira para, no caso de sucumbência,
responder por perdas e danos, o juiz designar-lhe-á o prazo de 5 (cinco) dias para
requerer caução, real ou fidejussória, sob pena de ser depositada a coisa litigiosa,
ressalvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente.

Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e
reintegrado em caso de esbulho.

Art. 561. Incumbe ao autor provar:


I - a sua posse;
II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a
perda da posse, na ação de reintegração.

O artigo 562 confere poderes ao juiz para deferir, sem ouvir o réu (inaudita altera
parte), a liminar pleiteada ou, caso entenda necessário, designar audiência de justificação para
que autor justifique suas alegações, devendo o réu ser citado para comparecer a esta
audiência.
Art. 562. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o
réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário,
determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para
comparecer à audiência que for designada.

Salienta-se que tal regra não é aplicável às ações movidas em desfavor das pessoas
jurídicas de direito público, sendo imperativa a prévia oitiva dos respectivos representantes
judiciais.
Parágrafo único. Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a
manutenção ou a reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos
representantes judiciais.
Art. 563. Considerada suficiente a justificação, o juiz fará logo expedir mandado de
manutenção ou de reintegração.

Art. 564. Concedido ou não o mandado liminar de manutenção ou de reintegração, o


autor promoverá, nos 5 (cinco) dias subsequentes, a citação do réu para, querendo,
contestar a ação no prazo de 15 (quinze) dias.

Contudo, a maior inovação trazida pelo Novo Código de Processo Civil está prevista no
artigo 565, artigo este que dispõe acerca de litígios coletivos pela posse de imóvel. Segundo o
artigo em epígrafe, nos litígios coletivos em que o esbulho ou turbação tenha ocorrido há mais
de ano e um dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão de medida liminar, deverá
designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 dias.

Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação
afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de
apreciar o pedido de concessão da medida liminar, deverá designar audiência de
mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2o e 4o.

Já o § 1o preceitua que caso concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de
1 (um) ano, a contar da data de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação,
seguindo o disposto nos parágrafos seguintes. Ou seja, a realização de audiência de mediação
passa a ser um ato obrigatório quando se tratar de litígio coletivo pela posse.
§ 1o Concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar da
data de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação, nos termos dos §§
2o a 4o deste artigo.

Ainda, nestes casos, o Ministério Público será intimado para comparecer à audiência de
mediação, e a Defensoria Pública será também intimada sempre que houver parte beneficiária
da gratuidade da justiça.
§ 2o O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria
Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça.

Há ainda a previsão expressa da realização de inspeção judicial pelo juiz, que poderá
comparecer à área do objeto de litígio quando sua presença se fizer necessária à efetivação da
tutela jurisdicional.
§ 3o O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer
necessária à efetivação da tutela jurisdicional.

Por fim, o § 4° do referido artigo inova ao prever que órgãos responsáveis pela política
agrária e política urbana da União, Estados, Distrito Federal e Municípios onde se situe a área
objeto do litígio poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu
interesse na causa e a existência de possibilidade de solução do conflito possessório.
§ 4o Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de
Estado ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio
poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse
no processo e sobre a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório.
§ 5o Aplica-se o disposto neste artigo ao litígio sobre propriedade de imóvel.

Já o Interdito Proibitório visa proteger preventivamente a posse que está sofrendo


ameaça de ser molestada ou sob iminência de sofrê-la. São pressupostos para essa ação: que o
autor esteja na posse do bem, que haja a ameaça de turbação ou esbulho por parte do réu e
que haja o justo receio de que tal ameaça se configure.
Art. 567. O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser molestado na
posse poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente,
mediante mandado proibitório em que se comine ao réu determinada pena pecuniária
caso transgrida o preceito.

O rito do Interdito proibitório é da Manutenção e Reintegração de posse, pelo menos


no começo, até a liminar.
Art. 568. Aplica-se ao interdito proibitório o disposto na Seção II deste Capítulo.

7.2 Efeitos perante os frutos (1214- 1216)


Entende-se por fruto a produção normal e periódica da coisa, sem detrimento da
substância. O legislador quer saber se o possuidor está de boa-fé ou má-fé. O possuidor de
boa-fé tem direito, enquanto a posse durar, aos frutos percebidos (frutos naturais que colheu,
frutos civis que recebeu). Cessada a boa-fé, deve restituir os frutos naturais então pendentes,
deduzidas as despesas de produção e custeio.
Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser
restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também
restituídos os frutos colhidos com antecipação.

Se Florianópolis não entrou com ação possessória contra Cunha Porã, mas entrou com
ação petitória e o juiz não deu antecipação de tutela, o Cunha Porã fica no imóvel até o
trânsito em julgado. Pensando que o processo tramitou 8 anos, o Cunha Porã não indenizará
os frutos consumidos durante todo esse tempo, tampouco aqueles que ele deixou apodrecer
no pé. É como se o proprietário estivesse no imóvel o tempo todo. Agora, ele é obrigado a
deixar os frutos pendentes, aqueles que estão no pé. E os frutos colhidos por antecipação
devem ser restituídos (como as maçãs que ainda estão no pé mas já tinham sido vendidas).
Terá direito à indenização do custeio, dos insumos, dos investimentos que fez por ter frutos
na área.

Já o possuidor de má-fé responde por todos os frutos que colheu e percebeu, e bem
assim, por aqueles que por culpa sua deixou de perceber, deduzidas as despesas de produção
e custeio (art. 1216).
Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos,
bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se
constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.

Se a ação for contra o Maravilha de má-fé, a solução é: ele indeniza todos os frutos que
consumiu e os que não quis, que deixou apodrecer. Indeniza oito anos de frutos, além de
outras perdas e danos. Se tiver fruto pendente com o trabalho dele, aí ele tem direito à
indenização do custeio, porque se não seria enriquecimento sem causa da outra parte. Se tem
uma coisa que o legislador odeia mais que a má-fé, é o enriquecimento sem causa, à custa do
trabalho alheio. Então o custeio é indenizado.

Obs: Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos logo que são
separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia (art. 1215).

7.3 Perda ou deterioração da coisa


O possuidor de boa-fé recebe tratamento de proprietário pelo Direito. Se a coisa se
perde ou sofre deterioração a que não deu causa, é como se tal tivesse ocorrido nas mãos do
proprietário.
Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a
que não der causa.
Já o possuidor de má-fé é responsabilizado sempre que a coisa se deteriora ou perece,
até por perda acidental ou força maior, a menos que prove que o fato teria ocorrido do mesmo
modo, nas mãos do reivindicante, como nos casos de enchente. Agora, se um incêndio atinge o
quarteirão do possuidor de má-fé e não o do reivindicante (onde a coisa não teria perecido, se
estivesse), ele é responsabilizado, ainda que não tenha dado causa.
Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda
que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse
do reivindicante.

7.4 Benfeitorias (1219-1222)


As benfeitorias podem ser necessárias (quando indispensáveis), voluptuárias (quando
fúteis) e úteis (é aquela que aumenta a utilidade da coisa).
Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.
§ 1o São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual
do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.
§ 2o São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem.
§ 3o São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.
Art. 97. Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos
ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor.

O possuidor de boa-fé tem direito à indenização pelas benfeitorias necessária e útil.


Enquanto não recebê-la, não sai do imóvel. As voluptuárias, se o reivindicante quiser pagá-las,
ele vai ter que aceitar o dinheiro. Se não quiser pagar, tem direito de levantá-las e levá-las
consigo desde que na prejudique a coisa.
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias
e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando
o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das
benfeitorias necessárias e úteis.

O possuidor de má-fé não terá direito à indenização pelas voluptuárias e úteis. Tem
direito apenas à indenização pelas benfeitorias necessárias, mas sem direito de detenção.
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias
necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de
levantar as voluptuárias.

Sobre a possibilidade de compensação das benfeitorias com os danos:


Art. 1.221. As benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao ressarcimento
se ao tempo da evicção ainda existirem. (Vide Decreto-lei nº 4.037, de 1942)

O reivindicante pode escolher o valor mais favorável entre o valor atual e o custo das
benfeitorias; mas o possuidor de boa-fé será indenizado “pelo valor atual”, já que recebe o
mesmo tratamento do proprietário (art. 1222).
Art. 1.222. O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé,
tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo; ao possuidor de boa-fé
indenizará pelo valor atual.

8 Perda da posse (art. 1223-1224)


Perde-se a posse quando cessa o poder sobre a coisa, embora contra a vontade do
possuidor.
Art. 1.223. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o
poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196.
O possuidor que não presenciou o esbulho perde a posse quando recebe a notícia e se
abstém de retomar a coisa ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido. Deste
momento em diante, o esbulhador passa a ter a posse, embora viciada.
Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho,
quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é
violentamente repelido.

Perde-se a posse, também, pelo constituto possessório. Exemplo: vendo o imóvel e


permaneço nele como caseiro do adquirente, ou como inquilino. Em termos objetivos,
continuo no terreno, mas como simples detentor, demitindo-me solo animo, ou seja, do
elemento subjetivo da posse; ou ainda como possuidor direto, com posse imprópria, como no
exemplo do inquilino.

9 Função social
O Código Civil não faz referência expressa à função social da posse ad interdicta,
embora trate da Posse Trabalho para fins de usucapião, no art. 1228. Não é necessário. Em
princípio, só se pode ter posse onde é possível ter propriedade, e sobre a propriedade pesa o
pressuposto da função social. Assim, toda posse, especialmente de bens de produção, deve
perfilhar-se com a função social que pesa sobre todos os bens imóveis, nos termos dos art.
182, § 2º da Constituição da República Federativa do Brasil (imóvel urbano frente ao plano
diretor) e 185 e incisos (no caso de imóvel rural exigem-se aproveitamento racional e
adequado, com preservação do meio ambiente, com respeito às disposições que regulam as
relações laborais, e exploração que favoreça proprietários e trabalhadores). O simples
possuidor do imóvel não está dispensado, evidentemente, do cumprimento de tais
pressupostos, sob pena de comprometimento da tutela interdital e todas as consequências da
não observância do princípio. No conflito possessório, a função social informa a legitimidade
do uso perante interesses maiores da sociedade (estampados na Constituição da República e
na lei).

10 Aula de Revisão de posse – Dúvidas dos Colegas

10.1 A precariedade não convalesce?


Não. No art. 1208 a precariedade não é mencionada, apenas a “violência e a
clandestinidade” autorizam a aquisição depois de cessadas. Isso porque a precariedade é
derivada de uma relação jurídica anterior. Se uma pessoa, resolveu colocar alguém no seu
imóvel firmando um contrato de aluguel ou de comodato, ora, a partir daí, essa relação é
regida por este contrato. Às vezes pode ser até oral, mas a pessoa entrou no imóvel autorizada
pelo possuidor e dali em diante o que rege as partes é esse acordo. Isso valerá até
rescindirem. A precariedade se configura quando a pessoa que tem esse tipo de acordo, de
contrato, de repente alega mais direito do que está ali, como pretendendo usucapião, por
exemplo. Aí é que incide o vício da precariedade, que é um vício objetivo. O inquilino ou
comodatário não poderá usucapir porque está vinculado ao contrato.
Outra coisa diferente é perder o imóvel ou o bem contra a vontade. Se o imóvel foi
invadido, como aconteceu no exemplo do Florianópolis perante o Maravilha, o possuidor
perde a posse do imóvel clandestina e violentamente, contra a vontade dele, estando ausente
ou não. Neste caso, o Florianópolis pode recorrer à autodefesa, sob pena de se instalar a posse
e começar a correr o prazo de ano e dia para ação de força nova e correr o reloginho da
usucapião. Agora, o generoso que colocou a família do cachorro no seu imóvel o fez
voluntariamente, estabelecendo um acordo de comodato. Aqui, a situação está estática, caso a
família do cachorro queira usucapir, incide em vício de precariedade e não há reloginho
nenhum correndo.
Podemos pensar ainda na hipótese de que um dia o comodante, o possuidor indireto,
que colocou a família do cachorro no imóvel, vai visitá-los e é expulso. Aí, já não é mais
precariedade, porque a precariedade é alegar mais do que o título autoriza. Nesse caso, já
houve violência. Então, tem que se defender, recuperar a posse ou pela autotutela ou
interditos. Se ele não se defender, perde a posse. Já não se trata mais de comodato, mas de
violência. Então, a precariedade é um vício que não convalesce jamais. Agora cuidado,
violência sim.
O que o legislador quer com tudo isso? Primeiro, que cada coisa tenha um dono.
Segundo, que o dono cuide dela. Se o dono não cuidar, o direito vai lhe dar o apoio:
possibilidade de autotutela, prazo de ano e dia para ação com direito a liminar, depois o
direito a uma ação ordinária de posse, até a usucapião. Agora, depois de todas essas chances,
aí o legislador abandona-o. Porque agora tem novo dono. Então vai prestigiar o novo
proprietário. Se uma pessoa teve todas essas oportunidades e não se defendeu, o legislador
entende que o outro vai fazer melhor.

10.2 Perda da posse por ausência x Abandono da propriedade


O art. 1224 fala das situações de possuidores ausentes, que não presenciam o esbulho.
Bem, há situações e situações. Uma coisa é estar no imóvel e sair temporariamente. Quando
retorna e toma conhecimento, caso não faça nada, perde a posse. Se ao tomar conhecimento,
se defende desde logo, conseguindo autotutela, não haverá interrupção na posse.
Mas há certas situações em que não aplicamos a regra do ausente, como no caso de
abandono. O abandono é quando a pessoa objetivamente deixa o imóvel, ausentando-se
definitivamente. Isso está previsto como causa de perda da propriedade. Nesses casos o
imóvel pode ser ocupado por um outro particular que terá direito a usucapião ou, caso não se
encontre na posse de ninguém, poderá ser arrecadado como bem vago e passar, três anos
depois, à propriedade do Município ou à do Distrito Federal.

10.3 Renúncia da propriedade


O imposto não é um compromisso do dono, mas da coisa. Mas se você ocupar uma
coisa e dela tiver só a posse, já será responsável por pagar esse imposto também. O município
poderá inclusive acioná-lo no executivo fiscal em caso de inadimplência. Se você não quiser
pagar, você sai, pois quem deve é a coisa, não você. Para você continuar na coisa, tem que
pagar o imposto. E inclusive se entra num apartamento recém-comprado, que deve dez anos
de condomínio, você responde até a prescrição pelo condomínio atrasado. Quando entra no
imóvel, está respondendo pelo imposto atrasado

10.4 Que efeitos a posse tem?


Conforme visto anteriormente, o efeito por excelência da posse é o direito à tutela
jurídica interdital. Mas também se apontam entre eles a usucapião, direito de preferência e os
reflexos quanto a frutos, benfeitorias, perda, deterioração da coisa.
Quanto aos interditos possessórios, são o meio pelo qual a posse se defende como tal
na sua autonomia perante a propriedade (manutenção, reintegração de posse e interdito
proibitório).
Mas pode acontecer também de o possuidor, depois de um certo tempo de posse, seja
obrigado a desocupar o bem. Por exemplo, vamos falar do Florianópolis, que entra com uma
ação petitória contra o Cunha Porã ao descobri-lo na posse do seu imóvel. Ele entrou com
ação contra o Cunha Porã. É claro que o Cunha Porã não tinha argumentos para enfrentar um
título de propriedade, pois tinha apenas um documento do esbulhador Maravilha. Será
obrigado a sair do imóvel. Por ser um possuidor de boa-fé a sair do imóvel, Maravilha não
responderá pelos frutos colhidos, mas terá de deixar os pendentes. Agora, se ele trabalhou
para produzir aqueles frutos, com insumos, mão-de-obra, tem direito a indenização do
custeio, da despesa investida. Esse é um direito dele. Então veja: ele tem esse direito em
função da boa-fé. Isso acontece também com as benfeitorias (necessárias, uteis, voluptuárias).
Caso estivesse de má-fé, teria de indenizar todos os frutos, inclusive aqueles que não
consumiu; se houvesse pendentes, deveria deixá-los, obtendo apenas a indenização pelo
custeio. Em relação às benfeitorias, só tem direito a indenização pelas necessárias, sem
retenção. Não têm pelas voluptuárias, nem pelas úteis. O possuidor de má-fé também indeniza
a coisa que pereceu ainda que não tenha culpa disso. Se temos um animal de raça com o
possuidor de má-fé e o animal morre, só não deverá indenizar o proprietário se provar que o
animal pereceu por força maior e que se estivesse com a outra parte naquele momento teria
perecido também. Por exemplo, enchente, incêndio que devastou a cidade e esse tipo de coisa.
A boa-fé é presumida: o possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé,
salvo prova em contrário (art. 1201, parágrafo único). A posse só perderá este caráter de boa-
fé no caso e desde o momento em que as circunstâncias façam entender que o possuidor não
ignora que possui indevidamente (art. 1202). Entende-se manter a posse o mesmo caráter
com que foi adquirida, salvo prova em contrário (art. 1203). A má-fé, por outro lado, tem que
ser provada.
Dois exemplos de posse de boa-fé que se transforma em posse de má-fé. O primeiro
deles era relativamente aos frutos. Na história do Cunha Porã ele estava de boa-fé,
evidentemente. Os frutos pendentes deveriam ser deixados por ele no pé. Caso os tenha
recolhido, fê-lo de má-fé. A colheita dos frutos só pode ser feita por antecipação caso os frutos
sejam indenizados aos possuidor, ainda que deduzidos os gastos com manutenção e custeio.
Segundo exemplo: uma colonizadora do paraná fez um contrato com o Governo e
recebeu uma área para colonização, onde fez uma serie de benfeitorias. Em um dado
momento, o Governo do Paraná rescinde o contrato. O Judiciário paranaense entendeu que
todas as benfeitorias feitas a partir da resolução do contrato, foram feitas de má-fé. Se o poder
publico rescindiu o contrato, cessa a boa fé.

Por vezes estando visível a boa-fé, a ação possessória tem poucas chances, restando ao
proprietário entrar apenas com ação petitória. Na situação do amigo generoso, que notificou a
família de que o comodato estava extinto, se for propor ação própria para tirar do imóvel,
pode optar: entrar com ação de reintegração de posse ou ação reivindicatória. Ele escolhe:
qual é a vantagem da possessória? A liminar de posse. Se ele entrar com ação petitória, vai ter
que pedir uma tutela antecipada ou vai amargar a família ate o final. É necessário refletir no
caso concreto. Certamente a ação possessória é exitosa contra a pessoa que cometeu esbulho
contra o autor. Agora, como no caso o Cunha Porã, que ignorou o vício, há riscos de
comprometer a ação possessória, porque ele não cometeu nenhuma violência contra o
Florianópolis.
Em uma outra hipótese: se um traficante invade o imóvel de alguém e tempos depois é
expulso de lá por outro sujeito, o traficante pode entrar com ação possessória e será
provavelmente acatada pelo juiz, que reconhecerá a posse do traficante. Isso porque o
esbulho do traficante não foi contra esse sujeito; o sujeito que está cometendo uma violência
contra o traficante. A posse do traficante em relação ao resto do mundo é justa, ela é injusta
apenas contra quem ele cometeu esbulho.
Reforçando o conceito de precariedade: se o comodatário requereu ação de usucapião,
você vai contestar a ação dizendo que ele não tem posse própria, que a posse dele é
imprópria. Se o comodatário renega comodato, é aconselhável que o comodante o interpele
antes de entrar com qualquer ação. Mas mesmo que não tenha interpelado, pode alegar que o
comodato não existia mais. Aí a posse do comodatário será ilegítima, porque a ação
reivindicatória e a possessória só prevalecem contra posse injusta (que de alguma forma
tenha sido violenta, injusta e precária).

PROPRIEDADE

1 Histórico
O Direito que você ensina depende do conceito de propriedade que você tem. A
propriedade romana não era uma propriedade dominial como a nossa. Era voltada para a
família. A família romana foi pré-cívica, já existia antes da fundação da cidade. Para nós é
diferente, a polis já está estabelecida, não podemos mudar a propriedade.
Hoje, a propriedade para nós tem uma função econômica. Isso é muito diferente. A
dimensão jurídica dela é uma forma apenas, mas no núcleo dela está o desígnio filosófico, o
valor, a destinação desta civilização. Nós temos uma economia de troca, visamos o lucro.
Nossa dimensão política é uma democracia representativa, justamente o modelo político
adequado a esse tipo de sociedade com esse desígnio de propriedade. Então, ao estudar a
propriedade você deve ter a noção da dimensão do plano do valor, a dimensão econômica, a
dimensão política, a dimensão social.
Para o direito, a propriedade das coisas é metafísica. Para o direito, as árvores, os
terrenos, as casas, os bens móveis de uma maneira geral estão em uma dimensão jurídica, que
é uma versão, não corresponde à dimensão natural. Essa versão é historicamente construída.
O direito romano foi um grande salto de organização nessa história.
Devemos então ter uma noção global desta matéria, não apenas essa visão
compartimentalizada. A propriedade que nós praticamos hoje, a propriedade do código civil, é
a propriedade dominial. Isso se sacramenta com a revolução francesa. A partir daí nós temos
uma propriedade em uma economia de troca que é o mundo do negócio jurídico, da
autonomia da vontade, da iniciativa privada. É isso que nós vamos estudar. Agora, esse
modelo vem se tornando cada vez mais complexo. A dimensão constitucional nos mostra isso.
Então, qual é o grande problema da propriedade como bem corpóreo? É que ele não
tem as dimensões coletivas que a constituição traz. Isso gera grandes vazios jurídicos. Se você
a propriedade é a instituição central, onde está o meio ambiente com esta propriedade? O
meio ambiente não passa de um caso de polícia. Ele entra em cena quando é violado. Na
verdade, não é um direito, não tem a mesma autonomia. Quando um juiz decide uma causa em
uma comarca do interior, a tendência é julgar tudo a favor de um e o diabo para outro.
Na teoria pós-moderna do direito, você mexe nesse esquema da propriedade corpórea
para liberar a complexidade que vem vindo aí e que já aparece na constituição: é necessário
incluir mais uma categoria na classificação de bens. O código civil, que começa com a
revolução francesa, é público-privado. Então, o meio ambiente ficou na alçada do Estado.
Agora, se você colocar público, privado e coletivo, o meio ambiente é um bem jurídico
pertencente a todos. E a sociedade é o seu titular, e não o Estado.
A propriedade patrimonial começou com a revolução francesa. Era diferente no
período feudal, onde quem nascia servo, morria servo; quem nascia senhor, morria senhor.
Era já diferente do mundo romano. Democracia representativa foi complementada pelos
americanos, pela constituição americana de 1776. Ou seja, vários estados. Hoje em dia, nós
podemos fazer tudo diretamente. Podemos mudar o sistema, porque hoje temos comunicação
com toda facilidade. Aquela desculpa hoje é esfarrapada, ou pelo menos está completamente
desatualizada, não tem mais lugar.
As propriedades hoje são todas especiais constitucionais: urbana, rural, indígena,
quilombola, resex (reserva extrativista). O Código Civil é direito comum, traz regras gerais
sobre a propriedade corpórea. A propriedade intelectual é uma propriedade incorpórea, por
exemplo. Nós estudaremos a propriedade do Código Civil, que se aplica a todas as demais
subsidiariamente.

2 Conceito

Orlando Gomes diz que o conceito de propriedade é uma soma de três conceitos: a)
sintético; b) analítico; c) descritivo.

O conceito sintético se deve a Windscheid: “a propriedade é a submissão de uma coisa


em todas as suas relações a uma pessoa”. Que vantagens pode me trazer um automóvel? Posso
vir para aula, passear, viajar, alugar. Em todas as suas relações é submetido ao proprietário,
titular, dono. Essa coisa terá um impacto no ambiente e estará no meio de outras
propriedades, mas nós veremos essas limitações depois.

O conceito analítico tiramos do Código Civil: “ser proprietário é poder usar, gozar,
dispor e reivindicar de quem quer que injustamente possua ou detenha (art. 1228/CC)”. Usar
significa servir-se da coisa, como dirigir um automóvel ou ocupar um imóvel. Gozar é
sinônimo de fruir, desfrutar a coisa no sentido de tirar proveito econômico dela. Dispor é o
poder de hipotecar o bem, dar em garantia, vender, alienar, renunciar. Reivindicar é o poder
de reaver a coisa, como seria o caso do Florianópolis, despassado pelo Maravilha, a quem seria
facultado entrar com ação reivindicatória inclusive contra o Cunha Porã, que ocupa a coisa de
boa-fé. Já que a ação possessória é mais difícil de ser obtida no caso de possuidor de boa-fé, é
mais certeiro entrar diretamente com a reivindicatória. Injustamente significa a posse
adquirida por violência, clandestinidade ou precariedade.

O conceito descritivo pode ser pensado em um acróstico:


Complexo. Segundo Orlando Gomes é um conceito complexo porque compreende o
direito de usar, gozar, dispor e reivindicar. É uma soma de poderes elementares, de
faculdades. Por isso é um direito complexo.
Absoluto. Quem decide o que fazer com a coisa com exclusividade é o proprietário. Não
é o Governo, nem a lei, que diz o que ele deve plantar no seu terreno. É um poder potestativo e
absoluto sobre o bem. Até hoje não param de cair as pedras e ovos jogados no código francês
por causa da função social. Mas sem essa característica, a propriedade não é propriedade. No
nosso código, a propriedade presume-se “plena e exclusiva”, mas não absoluta, porque se
dissesse cairia o mundo. Segundo o professor, ela continua absoluta, ainda que padeça de
limitações.
Perpétua. Dura enquanto dura o objeto. Se o faraó fosse vivo até hoje, a pirâmide ainda
seria dele. Mas a propriedade ainda poderia ser Resolúvel, que são aquelas que têm escrito
no seu título o período de duração (como a propriedade de fideicomisso5).
Exclusiva. Isso significa que terceiros estão proibidos de exercer sobre a coisa qualquer
senhorio.

3 Objeto

5 É o exemplo da cláusula no testamento do proprietário dizendo que a propriedade só será de um casal se eles
tiverem filhos.
O objeto são os bens corpóreos. Significa dizer as coisas que podem ser tocadas. Sobre
elas incidem esses direitos que apenas citamos.

4 Princípios
a) Corporeidade: o bem deve ser determinado;
b) Individualização: defende a singularidade da coisa, embora admita que a essa sejam
outras aderidas;
c) Acessoriedade (subordina ao bem principal todos os seus acessórios).
Art. 1.232. Os frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando separados, ao
seu proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a outrem.

5 Extensão e conteúdo
5.1 Plano extrínseco
A extensão é no plano extrínseco. Sob esse aspecto, consiste o problema em determinar
os limites que circunscrevem objetivamente o poder do proprietário. Para sua solução, há que
distinguir a propriedade mobiliária da imobiliária. Se a propriedade recai em móveis,
nenhuma dificuldade surge, porque tais bens, além de suscetíveis de perfeita individualização
que permite determinação específica, ocupam, no espaço, lugar precisamente definido,
podendo ser materialmente isolados, como um relógio no pulso, por exemplo. Mas se a
propriedade incide em coisas imóveis, o problema de sua extensão complica-se, porque,
embora possa ser delimitada horizontalmente, confinando-se entre vizinhos, sua extensão
vertical é objeto de controvérsias, que serão examinadas à parte. Se olharmos lá da lua não
veremos cerca na terra, a terra é uma unidade. Mas na verdade todo território ocupado se
extrema com os outros. Mas também devemos ver até onde vai a propriedade para cima e
para baixo.
Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes,
em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a
atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que
não tenha ele interesse legítimo em impedi-las.

Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos
minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros
bens referidos por leis especiais.
Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais
de emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação
industrial, obedecido o disposto em lei especial.

5.2 Plano intrínseco (1229, 79, 92, 93)


Sob o aspecto intrínseco, o conteúdo do direito de propriedade pode ser encarado de
dois ângulos diversos. Do primeiro, consiste em determinar as faculdades inerentes a esse
direito, firmando-se, em resumo, a extensão dos poderes do proprietário como direito
complexo que é. Do seguindo, em fixar as limitações que a ordem jurídica impõe ao seu
exercício.
6 Limitações e função social (1231, parágrafos do 1228)
6.1 Voluntárias:
A limitação ao direito de propriedade pode dar-se por ato de vontade de seu próprio
titular e, geralmente, ocorre pela constituição de outro direito real sobre o bem. Pode ocorrer,
portanto, pela instituição de um direito de superfície ou pela imposições de determinadas
cláusulas no momento de transferir o bem. É o caso do sofro que faz doações a genros e noras
com cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade.
6.2 Função Social:
O proprietário tem um direito subjetivo, que é um direito absoluto de fazer o que bem
entender. Mas em alguns aspectos, em algumas relações, não exerce esse poder subjetivo
plenamente, pois precisa cumprir uma função social. É o exemplo do sujeito que é obrigado a
permitir em seu terreno a construção de um prédio público determinada pelo prefeito no
plano diretor da cidade.

7 Classificação
7.1 Comum e especial
A propriedade comum é a que está no código civil, isto é, as regras que são aplicadas
para todas as propriedades. A propriedade especial tem raiz na constituição, regulada por lei,
e administrada por órgãos públicos especiais. São diferentes entre si no objeto, no titular, na
forma de constituição. Elas são diferentes até no registro. Então hoje não é mais possível
estudar a propriedade só pelo código civil.

7.2 Móvel e imóvel


Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força
alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.
Art. 83. Consideram-se móveis para os efeitos legais:
I - as energias que tenham valor econômico;
II - os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes; (penhor)
III - os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.
Exemplo: crédito contra alguém que bateu no seu carro.
Art. 84. Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados,
conservam sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da
demolição de algum prédio.
Exemplo: telhas.

A grande diferença entre bens móveis e imóveis é a aquisição e a perda. O bem móvel
se adquire por um acordo de vontade e tradição (entrega da coisa). O bem imóvel depende de
escritura pública e registro. O direito confere um cuidado maior quando se trata de imóveis
porque envolve moradia, geralmente o local de trabalho, etc. Não se pode, todavia, colocar a
mesma formalidade e segurança jurídica para a venda de uma bola de futebol, uma garrafa e
um terreno rural.
Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou
artificialmente.

Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais:


I - os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram;
II - o direito à sucessão aberta.

Art. 81. Não perdem o caráter de imóveis:


I - as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem
removidas para outro local;
II - os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se
reempregarem.

Art. 1.260. Aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente
durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a propriedade.

7.3 Resolúvel e ad tempus


A propriedade resolúvel é uma propriedade temporária cujo título prevê essa
temporariedade. Nós temos vários casos: pacto de melhor comprador, venda a contento,
alienação fiduciária em garantia, fideicomisso.
Art. 1.359. Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo advento do
termo, entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e
o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicar a coisa do poder de
quem a possua ou detenha.

Existe também a propriedade resolúvel ad tempus. É a propriedade transmitida em


caráter perpétuo mas que se torna temporária por algum motivo. Ex: donatário ingrato,
herdeiro indigno.
Art. 1.360. Se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o possuidor,
que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será considerado proprietário
perfeito, restando à pessoa, em cujo benefício houve a resolução, ação contra aquele
cuja propriedade se resolveu para haver a própria coisa ou o seu valor.

Propriedade aparente é diferente. Pensemos em uma família de tio e sobrinho. O tio


tem 90 anos, o sobrinho tem 40. O sobrinho cuida do tio, leva para exames, geriatra,
cardiologista, barbearia, jogar carta com os amigos. Até que o tio falece e o sobrinho pensa ser
o proprietário e até vende alguns bens. Mas depois se descobre que uma criança nasce sua
filha. Pronto, toda a herança vai para a filha. O tio não herda mais nada. Bom, todo o
patrimônio é do proprietário verdadeiro, mas como o proprietário aparente estava de boa-fé,
tudo o que foi vendido em caráter oneroso precisará ser devido para o proprietário na forma
do dinheiro recebido; o que foi doado será recuperado e devolvido, seja lá com quem esteja.
Mas o proprietário aparente será remunerado pela sua administração.

7.4 Pública (DL 9760/46, lei 9636/98 e lei 11.481/07) e privada (CC 98-103)
É regida pelo direito administrativo, não pelo direito das coisas. São estatutos federais
apresentando diretrizes para estados e municípios. Todo estado membro tem uma lei
específica tratando dos seus bens. Então, aquilo que for público terá lei que o regula, e o que
não tiver lei, é privado (regido então pelo código civil).

7.5 Propriedade plena e restrita


A propriedade privada é plena e irrestrita. Todavia, desdobramentos da posse e da
propriedade a restringem, como uma hipoteca ou outro direito de garantia de terceiro.
8 Propriedades especiais
O código civil se aplica a elas subsidiariamente. Elas são produto do fenômeno de
constitucionalização do direito civil.

8.1 Urbana e rural


Os critérios para distinção de zona urbana e zona rural são a localização e a finalidade.
O que está na zona urbana pagará IPTU e o que está na zona rural pagará ITR. O rural se
destina à agricultura, pecuária, extrativismo, agronegócio.

O Código Tributário Nacional, promulgado pela Lei 5.172/66, fala da competência


dos Municípios sobre o IPTU e define zona urbana e zona rural:
Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e
territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de
bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na
zona urbana do Município.
Pode ser uma casa de moradia ou um prédio, apartamento. Lote urbano é um pedaço
de terra proveniente de um loteamento do solo que tem serviços: esgoto, coleta de lixo,
internet; isso envolve o Estado.
§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei
municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em
pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:
I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;
II - abastecimento de água;
III - sistema de esgotos sanitários;
IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;
V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros
do imóvel considerado.
§ 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão
urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à
habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas
nos termos do parágrafo anterior.
Art. 29. O imposto, de competência da União, sobre a propriedade territorial rural
tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza,
como definido na lei civil, localização fora da zona urbana do Município.

8.1.1 Urbano

A política pública para a área urbana na Constituição Federal, que inclui plano direto
municipal, as desapropriações, a função social da propriedade e a usucapião:
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público
municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus
habitantes. (Regulamento) (Vide Lei nº 13.311, de 11 de julho de 2016)
§ 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com
mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e
de expansão urbana.
§ 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
§ 3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização
em dinheiro.
§ 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída
no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não
edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado
aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I - parcelamento ou edificação compulsórios;
II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;
III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão
previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em
parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros
legais.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros
quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua
moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de
outro imóvel urbano ou rural. (Regulamento)
§ 1º O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher,
ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2º Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Esses dois dispositivos constitucionais são regulamentados pelo Estatuo da Cidade (Lei
10.257/01), que estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras previdências.
A Lei 4.591/64 dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações
imobiliárias.
A Lei 6766/79 dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano.
8.1.2 Rural
A Constituição Federal também dedica um capítulo à política agrícola e fundiária e
sobre a reforma agrária, onde dispõe sobre desapropriação, função social da propriedade
rural, política agrícola, destinação de terras devolutas, destinatários da reforma rural, dentre
outras definições.
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma
agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e
justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor
real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e
cuja utilização será definida em lei.
§ 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.
§ 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma
agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação.
§ 3º Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito
sumário, para o processo judicial de desapropriação.
§ 4º O orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim
como o montante de recursos para atender ao programa de reforma agrária no
exercício.
§ 5º São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de
transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária.

Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:


I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu
proprietário não possua outra;
II - a propriedade produtiva.
Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará
normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social.

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,


simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos
seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Art. 187. A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a
participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores
rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes,
levando em conta, especialmente:
I - os instrumentos creditícios e fiscais;
II - os preços compatíveis com os custos de produção e a garantia de comercialização;
III - o incentivo à pesquisa e à tecnologia;
IV - a assistência técnica e extensão rural;
V - o seguro agrícola;
VI - o cooperativismo;
VII - a eletrificação rural e irrigação;
VIII - a habitação para o trabalhador rural.
§ 1º Incluem-se no planejamento agrícola as atividades agro-industriais, agropecuárias,
pesqueiras e florestais.
§ 2º Serão compatibilizadas as ações de política agrícola e de reforma agrária.

Art. 188. A destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com a política
agrícola e com o plano nacional de reforma agrária.
§ 1º A alienação ou a concessão, a qualquer título, de terras públicas com área superior
a dois mil e quinhentos hectares a pessoa física ou jurídica, ainda que por interposta
pessoa, dependerá de prévia aprovação do Congresso Nacional.
§ 2º Excetuam-se do disposto no parágrafo anterior as alienações ou as concessões de
terras públicas para fins de reforma agrária.

Art. 189. Os beneficiários da distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária


receberão títulos de domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de dez
anos.
Parágrafo único. O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem
ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil, nos termos e condições
previstos em lei.

Art. 190. A lei regulará e limitará a aquisição ou o arrendamento de propriedade rural


por pessoa física ou jurídica estrangeira e estabelecerá os casos que dependerão de
autorização do Congresso Nacional.

Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como
seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não
superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família,
tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

O Estatuo da Terra é estabelecido pela Lei 4.504/64.


A Lei 8.629/93 dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais
relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal, e
prevê um conceito de Imóvel Rural:
Art. 4o. Para os efeitos desta lei, conceituam-se:
I – Imóvel Rural – o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua
localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária,
extrativista vegetal, florestal ou agro-industrial;

O órgão da Administração Pública responsável por realizar a reforma agrária, manter o


cadastro nacional de imóveis rurais e administrar as terras públicas da União é o INCRA
(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), criado pelo decreto 1110/70.

8.2 Propriedade intelectual


8.2.1 Propriedade industrial
A Lei que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial foi
promulgada em 14 de maio de 1996 sob o número no 9.279. Essa proteção efetua-se
mediante i) concessão de patentes; ii) de registro de desenho industrial; iii) de registro de
marca; iv) repressão à concorrência desleal.
O primeiro acordo internacional relativo à Propriedade Intelectual foi assinado em
1883, em Paris. Deu origem ao hoje denominado Sistema Internacional da Propriedade
Industrial, e foi a primeira tentativa de uma harmonização internacional dos diferentes
sistemas jurídicos nacionais rleativos à Propriedade Industrial. O Brasil foi um dos 14 países
signatários originais.

8.2.2 Direitos autorais


A Lei de direitos autorais atualmente vigente foi promulgada em 19 de fevereiro de
1998 sob o no 9610. Não protege ideias, mas somente formas de expressão. O tema foi
originalmente assentado na Convenção de Berna relativa à proteção das obras literárias e
artísticas, também chamada Convenção da União de Berna, que estabeleceu o reconhecimento
do direito de autor entre nações soberanas, em 1886 na cidade de Berna, Suíça.

8.3 Propriedade étnica


Propriedade que vincula o território a uma etnia, ao seu ethos, aos seus valores, aos
seus saberes, de modo que de dois faz um: de um grupo étnico e um território faz um tipo de
propriedade completamente atípica.

8.3.1 Indígena
O direito dos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam são um direito
congênito legitimo por si só. Vem desde o Brasil Colônia, reconhecido pelo papa. É uma
propriedade que o ordenamento jurídico e a constituição brasileira só podem proteger, não
podem restringir. São reconhecidos na Constituição Federal:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças
e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam,
competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter
permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à
preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua
reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse
permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos
lagos nelas existentes.
§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a
pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados
com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes
assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos
sobre elas, imprescritíveis.
§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, "ad referendum" do
Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua
população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso
Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por
objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a
exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes,
ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei
complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações
contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de
boa fé.
§ 7º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.
As populações indígenas também são protegidas pelo Estatuto do Índio foi promulgado
em 1973 com a Lei no 6001.

8.3.2 Quilombola
O artigo 68 da ADCT - Artigo das Disposições Constitucionais Transitórias -, o direito
dos remanescentes das comunidades de quilombos às terras que estejam ocupando (artigo
regulamentado pelo Decreto 4.887/03).

8.3.3 Reservas Extrativistas


Assim como os indígenas e os quilombolas têm direitos territoriais especialmente
previstos na Constituição, outras populações tradicionais também lograram esses direitos, a
partir da criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável (UCUS), previstas na
legislação federal brasileira.
As Reservas Extrativistas, também conhecidas como REx ou RESEX, são áreas
brasileiras protegidas do grupo das unidades de conservação. De domínio mínimo, são áreas
utilizadas por populações tradicionais cuja sobrevivência baseia-se no extrativismo e
complementarmente na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte.
Tem como objetivos básicos proteger os meios da vida e a cultura dessas populações, e
assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade. As áreas particulares incluídas
em seus limites devem ser desapropriadas.
No Brasil, a Reserva Extrativista é gerida por um conselho deliberativo, presidido pelo
órgão responsável por sua administração e constituído por representantes de órgãos
públicos, de organizações da sociedade civil e das populações tradicionais residentes na área,
conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da unidade. As reservas
extrativistas federais são administradas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade.
Elas foram instituídas pela Lei 9.985/00 regulamenta o art. 225, 1o , I, II, III e VII da
Constituição Federal, instituindo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza.

8.3.4 Faxinalense:
Os Faxinalenses são grupos sociais que compõe territórios específicos da região Centro
e Centro-Sul do Estado do Paraná. Sua organização está baseada em normas próprias,
acatadas de maneira consensual pelas relações sociais internas à comunidade, que controlam
os recursos básicos essenciais através dos acordos comunitários e uso comum e apropriação
privada dos recursos naturais. Pela disposição e organização social, além da conservação
ambiental que lhes é consequente, os faxinais são considerados uma forma de organização
camponesa e gestão dos recursos naturais no sul do Brasil.
Seu modo de vida está relacionado com a interação dos recursos naturas paisagístico
do Bioma Floresta com Araucária e pelo uso comum da terra e outros recursos naturais
disponível na forma de criadouro comunitário intimamente associado a área de cultivo
agrícola mesmo que separados por cercas.

8.3.5 Caçara
Denominam-se caiçaras os habitantes tradicionais do litoral das regiões Sudeste e Sul
do Brasil, formados a partir da miscigenação entre índios, brancos e negros e que vivem da
pesca artesanal, da agricultura de subsistência, da caça, do extrativismo vegetal e do
artesanato.

8.4 Propriedade Público-privada


A Constituição atribui o domínio dos recursos minerais à União e, concomitantemente,
outorga a propriedade do minério extraído ao particular, cria uma figura jurídica moderna.
Ao mesmo tempo em que assegura o controle do Estado sobre o patrimônio mineral,
define a quem compete o exercício da atividade mineral. Reflete o interesse do Estado em
garantir a soberania sobre o subsolo mineralizado e a importância da atividade privada para a
produção de bens minerais. Como contrapartida, criou a Compensação Financeira pela
Exploração dos Recursos Minerais.

São bens da União:


V – os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;
VI – o mar territorial
VII – os terrenos de marinha e seus acrescidos;
IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo.

Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de


energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de
exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a
propriedade do produto da lavra.
§ 1º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a
que se refere o "caput" deste artigo somente poderão ser efetuados mediante
autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa
constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na
forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se
desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 6, de 1995)
§ 2º É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na
forma e no valor que dispuser a lei.
§ 3º A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as autorizações
e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou transferidas, total ou
parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente.
§ 4º Não dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento do potencial de
energia renovável de capacidade reduzida.

Art. 177. Constituem monopólio da União:


I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos
fluidos; (Vide Emenda Constitucional nº 9, de 1995)
II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;
III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das
atividades previstas nos incisos anteriores;
IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados
básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto,
de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem;
V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o
comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos
radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob
regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21
desta Constituição Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 49, de
2006), 176-177.

A Lei 9.478 de 1997 dispõe sobre a política energética nacional, as atividades relativas
ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência
Nacional do Petróleo.

A Lei 8.901 de 1994 regulamenta o § 2º do art. 176 da Constituição Federal e altera


dispositivos do Decreto-Lei n° 227 – Código de Mineração, adaptando-o às normais
constitucionais.

8.5 Propriedade coletiva extrapatrimonial


Esses bens coletivos, aqueles que não são do Estado, são a alma da função social, pois
preservam a cultura, o patrimônio histórico e cultural. Não pertencem a um particular, mas
aos particulares coletivamente, e o Estado tem dever para com esses bens.
O principal deles é o ambiente. Direito ao ambiente equilibrado é uma propriedade
especial extrapatrimonial. Se não for protegida, fica sempre a mercê da vontade do
proprietário ou da ação do voluntarismo estatal que geralmente não aparece.

9 Aquisição da propriedade
9.1 Modos de aquisição
A aquisição da propriedade pode ser originária ou derivada; é originária quando a
propriedade é adquirida sem vínculo com o dono anterior, de modo que o proprietário
sempre vai adquirir propriedade plena, sem nenhuma restrição, sem nenhum ônus (ex:
acessão, usucapião e ocupação); a aquisição é derivada quando decorre do relacionamento
entre pessoas (ex: contrato registrado para imóveis, contrato com tradição para móveis,
sucessão hereditária) e o novo dono vai adquirir nas mesmas condições do anterior (ex: se
compra uma casa com hipoteca, vai responder perante o Banco; se herda um apartamento
com servidão de vista, vai se beneficiar da vantagem). A aquisição derivada inter vivos de
imóveis requer escritura pública e registro do título.

9.2 Histórico
O problema da aquisição da propriedade consiste em saber se basta o ato constitutivo
da relação jurídica para que se produza efeito translativo ou é necessário outro ato para que a
aquisição se torne pronta e acabada? Em outras palavras: o contrato ou outro ato jurídico
transfere de si só o domínio de uma coisa? Três são os sistemas que respondem a essa
pergunta: i) o romano; ii) o francês e o iii) alemão.

Pelo sistema romano, não basta a existência do título, é preciso que esse ato jurídico
se concretize pela observância de uma forma, que transfere o domínio da coisa. “Traditionibus
et usucapionibus dominia rerum, non nudis pactis transferuntur” (o domínio das coisas
transfere-se por tradição e usucapião, não por simples pactos. O sistema romano funcionava
da seguinte forma. A emptio venditio (compra e venda romana) era consensual quanto à
formação: estando presentes a coisa, o preço, o acordo e as vontades, a compra e venda era
perfeita e acabada. Mas era necessário dar conhecimento a toda a comunidade. Aí que o
romano estabeleceu uma formalidade para dar conhecimento a toda Roma de que o imóvel ou
o escravo tinha sido vendido: a mancipatio. O seu ritual clama a presença de no mínimo cinco
testemunhas convocadas para o ato e o libripens intervêm como portador da balança. Na
presença do alienante (mancipio dans) e das pessoas já mencionadas, o adquirente (mancipio
accipiens) coloca a mão sobre a coisa ou pessoa a adquirir ("daí mancipatio, mais antigo:
mancipium de manus [mão] e capere [pegar]") e recita a fórmula : hunc ego hominem ex iure
Quiritium meum esse aio isque mihi emptus esto hoc aere aeneaque libra (Eu afirmo que este
escravo é meu de acordo com a lei dos cidadãos romanos, e ele é comprado por mim com este
pedaço de dinheiro e balanças de bronze). Ao mesmo tempo que pronuncia a fórmula, o
adquirente pesa o cobre na balança, que representa certa quantia em dinheiro, e o libripens
bate com o metal (raudusculum) na balança para se certificar da qualidade do mesmo e
entrega o cobre já pesado ao alienante. Tudo se passa sob a inspeção do portador da
balança.Havia também a in iure cessio, que consistia em um processo simulado[1], mais
especificamente um processo fictício de reivindicação[2], no qual as duas partes (aquele que
transferia e aquele que adquiria) fingiam contestar a propriedade de determinada coisa,
objeto de compra e venda. O processo se realizava perante um magistrado e resumia-se no
seguinte: o adquirente tocava a coisa comprada, declarando, por meio de uma fórmula, que ela
lhe pertencia em virtude do direito quiritário, após o que o alienante abstinha-se de contestar,
tacitamente reconhecendo o direito do comprador reivindicante.[3] O magistrado dava, assim,
ganho de causa ao adquirente, que dessa forma adquiria a propriedade sobre o bem.
Resumindo: o contrato não bastava, a forma era indispensável à transmissão do
domínio.

Já os franceses, no auge da revolução, código de 1804, entenderam que a propriedade


se transmite pelo simples contrato, pela mera emptio venditio, não pelo registro. O registro só
dá conhecimento, mas a propriedade se transmite no momento que se faz o negócio, pela
autonomia da vontade. O modelo liberal vicejando na sua infância. Qual foi o problema? Que
algumas pessoas vendiam seis vezes a mesma coisa. Aí os franceses colocaram no código de
processo civil, de alguns anos depois, um artigo dizendo que em caso de venda sucessiva, valia
o que registrasse, mas não o contrato. Com isso eles equilibraram o sistema deles. De
qualquer modo, nesse sistema, a venda trasmite por si mesma a propriedade, sem que
seja necessária a tradição.
Para o romano, o contrato é constitutivo. Para o francês, espanhol, italiano, o contrato
é translativo, mas daí eles admitiram que para poder dispor é preciso registrar. O registro
deles é meramente declaratório, não constitutivo de direito. A pessoa me vendeu, eu já sou
dono, mas se eu quiser hipotecar no banco é que tenho que registrar.

Pelo sistema alemão, o ato jurídico que cria a obrigação de transferir a propriedade é
independente do ato pelo qual a propriedade se transfere. O contrato, que serve de causa à
aquisição da propriedade, não é suficiente para produzi-la. Outro negócio se faz necessário e é
por seu intermédio que se verifica a inscrição no Registro Imobiliário, de que resulta a
transmissão do domínio. Distingue-se do sistema romano porque neste há vinculação do
modo ao título; a causa não é abstraída; e não é necessário outro negócio jurídico.
A Alemanha passou pelo período feudal mais longo da Europa. Eles em vez de ter a
mancipatio ou in cesso jure, criaram um cadastro. Três estados alemães fizeram o seguinte:
criaram um cadastro com todos os imóveis e criaram um livro. Então disseram que a
transmissão se dava não pelo contrato, mas pelo registro do contrato no livro. Se no livro está
escrito que o terreno tal é do professor Pilati e ele o vende para a Letícia, ele teria que chegar
com uma assinatura dos dois para registrar.
Hoje o nosso registro de imóveis é um grande cadastro. O BGB de 1896 que entrou em
vigor em janeiro de 1900 adotou essa ideia. Estabeleceu que a compra e venda não era
translativa, era um negócio de direito pessoal entre os dois. Agora, para levar o registro, é
necessário fazer uma escritura e chegar no registro com essa escritura. E lá nós assinamos de
novo. Eu como vendedor, ela como compradora, pelo direito das coisas, que é para dar o
conhecimento do modo de aquisição. Então, uma coisa é o contrato firmado com a Leticia.
Outra coisa é no registro de imóveis assinar outro documento no livro. É como o nosso
computador: “Você tem certeza que quer deletar esse arquivo?”. Porque então não volta mais.
O registro de imóveis germânico é constitutivo para os efeitos (não há propriedade
sem o registro). Exige duas assinaturas, uma em documento pessoal outra em registro. E uma
vez registrado, não admite prova em contrário. Ou seja, o registro deles têm a abstração da
causa, abstração da forma, esquece a escritura. O que vale é o assinado no registro, aquilo é a
segurança jurídica que vale para todo mundo. Não exige uma segunda assinatura.

O direito brasileiro seguiu o sistema romano. Você pode firmar um compromisso


particular com outra pessoa de compra e venda de imóvel. Agora, na hora de transmitir a
propriedade você tem que firmar uma escritura pública, pois o registro só admite escritura
púbica, em regra. Então você vai no tabelião e assina a escritura. Depois essa escritura é
encaminhada para o registro de imóveis, onde foi registrada. Este sistema é constitutivo de
direito, pois sem o registro não transmite a propriedade. Mas o efeito é juris tantum,
presunção relativa que admite prova em contrário.
Mas vale destacar que se nós fizermos um contrato entre nós, ele é perfeito e acabado.
Se a propriedade não for transmitida, não é nulo por conta disso, pois ele é obrigatório. Obriga
as partes. Se não cumprir, resolve em perdas e danos, por inadimplemento. Em uma prova
para magistratura, havia uma questão que narrava uma história. O fulano firmou um contrato
vendendo um imóvel sem a assinatura da mulher. Depois ela se recusou a assinar a escritura.
Então, ele fez um contrato perfeitamente válido, havia a coisa, o preço, o acordo e a vontade.
Só que não foi adimplido, então resolve com perdas e danos. Os que responderam que o
contrato era nulo porque não tinha a assinatura da mulher, erraram. Quem firma um
compromisso para vender mas depois não firma a escritura, resolve por inadimplemento.

9.3 Registro de imóveis


A lei n. 317/1843 cria o registro geral de hipotecas. O registro de imóveis brasileiros
não foi criado para proteger os proprietários, mas para reger os bancos. O mundo funciona
assim: o econômico puxando na frente.
A grande lei do registro brasileiro é a lei 6015/73. Ela trata do registro de pessoas
naturais. Trata também do registro de pessoas jurídicas, títulos e documentos e registros de
imóveis.
Em 2009, é promulgada a Lei 11.977 do Programa Minha Casa e Minha Vida. Essa lei
introduziu no Brasil o registro eletrônico. E para operacionalizar, porque foi dado um prazo
de cinco anos, e realmente um pouco de atraso, foi garantido pelo provimento n. 47/15 do CNJ
(ver art. 6o) , que estabelece diretrizes gerais para o sistema de registro eletrônico de imóveis.
A finalidade do registro de imóveis é a publicidade e a segurança jurídica. A finalidade
dele é dar conhecimento e certos atos jurídicos de interesse da coletividade para daí decorrer
a segurança jurídica. Se eu for comprar um imóvel, tenho que saber se está enrolado ou não.
Os princípios são: publicidade, fé pública, segurança jurídica, continuidade do registro
(todo registro faz referência ao anterior e assim até o inicio do titulo; geralmente termina em
um titulo da União ou do estado) e legalidade.

A escritura pública está prevista na lei 6015/73, mas os seus requisitos estão
principalmente na lei 7433/85, arts. 104-105 do CC.

O registro de imóveis tem 5 livros: i) protocolo; ii) registro geral; iii) registro auxiliar;
iv) indicador real; v) indicador pessoal.

No livro II, encontramos os seguintes elementos: matrícula, registros e averbação.


Cada imóvel tem uma matrícula. A matrícula ganha o número na primeira vez que o imóvel
chega no registro. Por exemplo, se você fez um loteamento de uma grande área, cada novo lote
recebe uma matrícula. Além de matrícula, existem os registros. O art. 167, I, são os casos de
registro. Por exemplo: registro de aquisição, de hipoteca, de usufruto. Agora, o art. 167, II traz
os casos de averbação. Quando o sujeito tem um terreno vazio e constrói em cima do imóvel
uma casa, vai no registro de imóveis para averbar a casa. Informa ao registro que não é
apenas um terreno, mas também tem uma casa.

O registro Torrens. Um cidadão chamado Sir. Richard Torrens, na Austrália, foi


contratado pelo governo para instituir um sistema de registro mais seguro do que o registro
dele. Então, esse Sir criou um procedimento segundo o qual se você entra em juízo dizendo-se
proprietário do imóvel, juntando os documentos para que o juiz declare de certeza que você é
o proprietário, que aquela é a metragem, e depois de ouvir o ministério público, testemunhos,
se julgar procedente o pedido e manda turbinar a matrícula. A sentença turbina o registro.

MODOS DE AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE IMÓVEL: USUCAPIÃO

1 Conceito e etimologia
Usucapião é uma forma de aquisição de algum direito real pelo decorrer do tempo. O
Código Civil anterior dava impressão de que só se adquire por usucapião a propriedade, mas
na verdade é qualquer direito real. Se dá pela posse longeva (provém do latim usu [uso]e
capere [tomar, pegar], com intenção de adquirir, mansa, pacífica e ininterrupta, pelo prazo e
os requisitos da lei. É posse própria porque há ânimo de dono pelo possuidor, o que não
acontece no caso do comodatário e do inquilino, por exemplo. É mansa a que não sofre
contestação; pacífica no sentido de publicamente exteriorizada e aceita, e não oculta, como a
do ladrão. E ininterrupta quer dizer que se o prazo for interrompido começa a fluir
novamente, perdendo-se o tempo anterior.
Na verdade, interessa ao Direito que cada coisa tenha um dono, que cuide dela e lhe dê
a destinação socialmente útil. Quando o proprietário deixa de exercer o seu papel, ou não
demonstra interesse na retomada da coisa, o Direito tem instrumentos para providenciar um
dono. O decurso do tempo assume, nesse caso, grande relevância, seja negativamente para
extinguir pretensões após um lapso de inércia, como ocorre na prescrição (CCB art. 189); seja
para criar direito novo depois de certo tempo, como no caso da usucapião (art. 1.238).

2 Modo originário
A usucapião é modo de aquisição porque, efetivamente confere o direito; e é modo
originário porque a aquisição não se dá por transmissão de eventual proprietário anterior, e
sim pelo cumprimento dos requisitos objetivos previstos na lei. A sentença declara-o, e o
registro da carta de sentença no álbum imobiliário dá-lhe publicidade; ou seja, a anotação no
Registro não é constitutiva do direito, mas sem ela o usucapiente não pode dispor da
propriedade como proprietário, como por exemplo, dar o imóvel em hipoteca, ou instituir
usufruto. De fato, sem o registro prévio da nova aquisição, como dar conhecimento desses
novos direitos reais a terceiros? Sem o registro o usucapiente é dono, pode alegar o direito em
juízo, mas enquanto não registra só dispõe como possuidor.
É claro, portanto, o conceito de Silvio Rodrigues: é o modo originário de aquisição do
domínio ou outros direitos reais através da posse mansa (em que não há mais hostilidade da
outra parte), pacífica (à vista de todos), ininterrupta e com animus domini por determinado
tempo estabelecido por lei. Só adquire por usucapião, então, quem tem posse própria.
A usucapião é positiva, tem força geradora. Por isso é um modo de aquisição da
propriedade, tanto móvel quanto imóvel. Um dos reflexos da ideia de posse é justamente que
ela serve como forma de aquisição de um direito. No nosso código, poucas são as formas de
adquirir a propriedade que não se dão por meio da posse, sobretudo intervivos. É aí que entra
a usucapião.

Também a usucapião tem outras finalidades, outros fins. Serve para consolidar outras
aquisições e pacificar situações patrimoniais. Como o registro de imóveis admite prova em
contrário, para se ter certeza da propriedade verifica-se, além do registro, o tempo de posse.
Sana o vício das aquisições e estabiliza a propriedade. Então, como torno uma propriedade
inquestionável? Não é pelo registro de imóveis, mas pela consolidação da posse pela
usucapião. Por isso muitas vezes o banco, o juiz, pedem uma certidão decenária, etc, eles
querem saber se o teu registro recente tem prazo maior que a usucapião. Então, o modo mais
seguro de adquirir é a usucapião.

3 Fundamento objetivo: utilidade social

O fundamento da usucapião é objetivo: utilidade social; arranjar um dono para a coisa.


Proprietário relapso que abandona o bem é preterido pelo direito, de um ponto em diante, em
favor daquele que dá à coisa a destinação social de utilidade. Mas a usucapião serve, ainda,
para consolidar as aquisições, pacificar os conflitos, dar segurança e estabilidade à
propriedade, além de servir de meio de prova. Significa dizer: depois de um certo tempo você
não pode remexer no passado.
Por isso, quem já preencheu os requisitos pode alegá-lo como matéria de defesa
(súmula 237 do STF, lei 6.969/81, art. 7º e lei 10.257/01 art. 13) 6; e pode defender-se como

6Art. 13 da lei 10.257/2001: A usucapião especial de imóvel urbano poderá ser invocada como
matéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título para registro no cartório de
registro de imóveis.
proprietário do bem (e não só como possuidor) antes mesmo de propor a ação de usucapião.
Estamos falando da ação publiciana, que decorre da autonomia desse modo de aquisição. Foi
criada por um pretor romano chamado Publicius. É uma tutela judicial da propriedade de que
dispõe o proprietário que adquiriu pela via originaria da usucapião, mas que não teve a ação
declaratória ou sentença. Não tem título, mas é proprietário; o juiz deve analisar então se já há
a posse. A usucapião não tem efeitos erga omnis, não serve para ir ao cartório para mudar o
nome no registro do imóvel; ele terá que mover a ação de usucapião para ter a sentença
declaratória, que tem força para alterar o registro imobiliário.

4 Requisitos: pessoais, reais e formais


Para se requerer a usucapião devem-se preencher os requisitos, pertinentes à pessoa,
à própria coisa e a aspectos formais.
a) Pessoais: a pessoa não pode ter nenhum impedimento legal.
O pretendente deve ser capaz e ter a qualidade para adquirir o direito no caso concreto
(1244 e 197-198). Segundo a Lei 5.709/71, por exemplo, o estrangeiro não pode adquirir
imóvel rural que exceda a 50 (cinquenta) módulos, em área contínua ou descontínua (art.
3º); e só pode adquirir por escritura pública (art. 8º), não por usucapião. O condômino não
tem direito de usucapir contra os demais, e quando permanece na coisa sem oposição
presume-se administrador dos demais (CCB, art. 1.324)7. Contra o absolutamente incapaz
(art. 198) não corre prazo de prescrição8; nem entre descendente e ascendente (art. 197)9.
b) Reais:.
O objeto deve ser suscetível de posse, sob o regime jurídico do direito das coisas; os
bens que estão fora do comércio, que são regidos por outro estatuto, como os bens
públicos10 e os órgãos humanos para transplante não se adquirem por usucapião. As
terras indígenas são insuscetíveis de apropriação particular, inclusive por indígenas, mas
eles podem usucapir terras particulares (Lei 6.001/73, art. 33 e parágrafo). Não se
adquirem por usucapião servidões não aparentes, a não ser que haja título proveniente do
possuidor do prédio (CCB, art. 1.213). A cláusula de inalienabilidade não obsta a
usucapião, mas cumpre velar contra fraude das partes11. A lei admite usucapião de
moradia em terra pública (art. 1225, XI), e de linha telefônica (STJ, Súmula 197).

c) Formais:
c.1 Comuns: posse ad usucapionem e prazo

7 A regra é não se admitir usucapião entre condôminos; para admitir exceção é necessário um
motivo a mais, incontestável, além da posse exclusiva e excludente; por exemplo, uma
permuta não formalizada, que tenha gerado a posse; que e transcorrido o prazo, não seja
possível, digamos, sacramentá-la pela via da escritura.
8 O incapaz pode adquirir por usucapião pelo seu representante legal; mas no polo passivo ele

está protegido pelo art., 198: não corre prescrição contra ele. Assim como contra os que se
ausentam do país a serviço público ou das forças armadas em tempo de guerra.
9 O art. 197 do CCB: não corre prescrição entre os cônjuges, na constância da sociedade

conjugal (exceção do art. 1240-A); entre ascendentes e descendentes, durante o poder


familiar; entre os tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou
curatela.
10 Art. 183, 3º e 191 parágrafo ínico da CRFB e Dec. n. 22.785/1933. Mas a MP 2220/01 e a lei

n. 11.481/07 e CCB art. 1.225, XI, permitem usucapião de direito de moradia perpétua em
terra pública.
11 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas. 7 ed. São Paulo:

Saraiva, 2012, p. 278.


A usucapião comum tem o procedimento do CPC. As usucapiões especiais têm o
consentimento da própria lei.
Quanto à posse, só é apta a gerar usucapião a que reúne, legitimamente, os caracteres
enunciados no conceito: mansa, pacífica, contínua e ininterrupta, e com animus domini. Se a
ocupação provém de título que exclui este animus e obriga à devolução, esbarramos no vício
da precariedade; ninguém pode alterar unilateralmente o caráter da sua posse (CCB, art.
1203). E não importa o tempo da posse ou detenção. Só existem duas situações de exceção: ou
a inversão do título, em que o prescribente adquire e alega direito de terceiro; ou pela força de
oposição sem resistência12.
O tempo ou prazo de posse necessário à aquisição do direito é o lapso previsto em lei
para cada espécie de usucapião. Mas o Direito faculta somar o tempo dos antecessores em
posse contínua e condizente, a bem de completá-lo; é a chamada acessio possessionis, que se
aplica na sucessão inter vivos e não ao sucessor universal, cuja figura é a da successio
possessionis (CCB, art. 1207). Quanto aos requisitos especiais ou complementares: justo título
e boa-fé,

c.2 Especiais: justo título, boa-fé e outros


Concorrem da mesma forma que a posse trabalho, para diminuir os prazos. Eles só
produzem efeito quando se apresentam cumulados. Justo título é o título idôneo, hábil e
formalmente perfeito, como a escritura pública registrada, mas que não transfere a
propriedade ao adquirente em razão, por exemplo, de provir a non domino. Quem vendeu e
empossou era um homônimo do verdadeiro proprietário. Por isso, uma escritura de posse não
é justo título, é mero instrumento de transmissão e soma de posse. O justo título aqui na
usucapião, bem entendido, refere-se à transmissão do domínio como direito real, e não da
posse, que é mero fato. O possuidor que tiver justo título, dele se presume a boa-fé. Vale
destacar, por fim, a diferença entre o justo título para efeitos meramente ad interdicta, que é
outra coisa, conforme estabelece o parágrafo único do art. 1201 do CC13.
Retomando, o outro requisito especial é a boa-fé, que vem definida no art. 1201: É de
boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa. Se
concorrerem ambos na espécie, a boa-fé e o justo título, a soma deles tem o condão de reduzir
em cinco anos o prazo da usucapião extraordinária, sob nomen iuris, então, de usucapião
ordinária.

5 Espécies: comuns e especiais


Intervenções de cunho social, no Brasil, estabeleceram um divisor de águas entre as
espécies tradicionais de usucapião de imóveis, as comuns (extraordinária e ordinária), e as
especiais ou constitucionais. Começou pela CF de 1934 (art. 125), que introduziu a usucapião
pro labore, mantida nas Cartas de 1937 (art. 151, § 3º) e 1946 (art. 156, § 3º); reproduzida nas
leis 4504/64 (art. 98) e 6969/81, e bipartida em urbana e rural pela CRFB/88 (art. 183 e
191), com reflexo no Estatuto da Cidade (art. 9º e 10), na MP 2220/2001 (concessão de uso
especial para fins de moradia) e, enfim, no CCB (art. 1239 e 1240), e nas leis 12.424/2011
(usucapião entre cônjuges) e 11.977/2009 (usucapião extrajudicial). E finalmente, a lei
13.105/2015 do CPC generaliza o reconhecimento extrajudicial.

12 RUGGIERO, Roberto de. Instituições, v. 2, p. 585. Assim, se o inquilino, por exemplo,


apropriar-se do imóvel e passar a comportar-se como dono, alugando, dando em comodato o
imóvel, em evidente ato de esbulho, cumpre ao locador tomar as providências, pois, está
perdendo a posse e com isso caminhando para perder também a propriedade por usucapião.
13 Art. 1201, parágrafo único do CC: O possuidor com justo título tem por sai a presunção de

boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.
6 Comuns: extraordinária e ordinária
Usucapião comum Extraordinária é a do art. 1238, que estabelece a aquisição da
propriedade em 15 anos de posse ad usucapionem, dispensados os requisitos suplementares
da boa-fé e do justo título. Esse prazo pode ser reduzido para 10 anos mediante a posse
trabalho do parágrafo único14, caso o possuidor tenha estabelecido no imóvel sua moradia
habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. É usucapião comum por
dispensar qualquer outro requisito, não importando a extensão do imóvel, a condição
patrimonial do possuidor e a ausência de título e boa-fé. Assim, às vezes a pessoa que não
logra sucesso em usucapião especial pode retomar a pretensão pela via comum
extraordinária, caso preencha os requisitos do art. 1238.
O prazo é em anos, mas a contagem é em dias, não contando o primeiro e sim o último,
nos termos do art. 224 do CPC15. Começa a fluir da ocupação com posse mansa e pacífica;
consequentemente, da perda da posse pela outra parte, se houver. No caso do ausente, que
não presenciou o esbulho, aplica-se o art. 1224 do CCB: quando tendo notícia dele, se abstém
de retomar a coisa, ou tentando recuperá-la é violentamente repelido. Ausente aqui, como
observamos, é o possuidor vigilante e cioso da posse; no caso de abandono comprovado, o
prazo flui desde a ocupação, observado o citado artigo 224 do CPC. A regra da perda da posse
vale também para possuidor indireto, que sofre oposição do possuidor direto: deve reagir
desde o esbulho, nos termos do art. 1210 e §§ do CCB.
A Usucapião comum Ordinária é a do art. 1242 do CCB, que se completa em 10 anos
mediante justo título e boa-fé, ou até mesmo em 5 anos, se, além disso, concorrer posse-
trabalho16 (moradia e/ou atividade produtiva). Diz o art. 1242: adquire também a propriedade
do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez
anos. Portanto, é usucapião comum, com a concorrência dos requisitos complementares: justo
título e boa-fé. Justo título, como define mito bem o Código espanhol17, é aquele que baste para
transferir o domínio ou direito real de cuja prescrição se trate. Não dispensa registro no caso
de imóveis18 e no plano formal é um título perfeito: mas que não transmite o direito real por
defeito, como o de proceder a non domino.
O parágrafo do artigo consagra a hipótese de redução desse prazo da usucapião
ordinária, de dez para cinco anos, se ademais o imóvel houver sido adquirido, onerosamente,
com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os

14 Parágrafo único do art. 1.238 do Código Civil: O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á
a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel sua moradia habitual, ou nele realizado
obras ou serviços de caráter produtivo.
15 Quanto à questão se o prazo pode ser computado durante a tramitação do feito, em

princípio sim. Não só em face do art. 493 do CPC, mas e principalmente, porque a sentença de
improcedência por esse único motivo, não interrompe a prescrição. Obrigar, então, a parte a
nova demanda seria muito formalismo e pouco apreço à economia processual. Mutatis
mutandis, é o mesmo argumento que justifica a exceção de domínio.
16 Art. 1242, parágrafo único do Código Civil: Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se

o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo
cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua
moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.
17 Código espanhol, art 1952: Entiendese por justo título ele que legalmente baste para

transferir el dominio o derecho real de cuya prescipción se trate. Os espanhóis chamam de


usucapião tabular, como usucpio secundum tabulas.
18 DINIZ, Maia Helena, Curso, v. 4, p. 188; MONTEIRO, Washington de Barros. Curso, v. 3, p.

127.
possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse
social e econômico. Não interessa a extensão da área, se urbana ou rural, nem se a pessoa do
prescribente possui ou não outros imóveis, ou se já foi beneficiada anteriormente por
usucapião. O parágrafo outorga o direito por ter em conta o desígnio constitucional do art. 6º
da CRFB; segundo o qual são direitos sociais a moradia, o trabalho e a alimentação entre
outros, assim prestigiados no reconhecimento da usucapião.

7 Especiais

As usucapiões especiais têm origem na Constituição de 1934 (art. 125), 1937 (art. 148)
e 1946 (art. 156 § 3º), dita pro labore; reduzia o prazo para dez anos, se a ocupação fosse
produtiva, a fixar o homem no campo. O art. 98 do ET estabeleceria: Todo aquele que, não
sendo proprietário rural nem urbano, ocupar por dez anos ininterruptos, sem oposição nem
reconhecimento de domínio alheio, tornando-o produtivo por seu trabalho, e tendo nele sua
morada, trecho de terra com área caracterizada como suficiente para, por seu cultivo direto
pelo lavrador e sua família, garantir-lhes a subsistência, o progresso social e econômico, nas
dimensões fixadas por esta Lei, para o módulo de propriedade, adquirir-lhe-á o domínio,
mediante sentença declaratória devidamente transcrita.

A lei 6.969/81 reduziu o prazo para cinco anos de posse, estendeu o cabimento para
imóveis urbanos e rurais, particulares ou devolutos (art.1º e 2º); estabeleceu o rito
sumaríssimo para essa modalidade de usucapião especial – assegurada a preferência à sua
instrução e julgamento (art. 5); e no caso de terras devolutas, previu que poderia, inclusive, ser
reconhecida administrativamente. Nessa esteira a CRFB/88 separou as duas espécies, urbana
(art. 183) e rural (art. 191), restringindo-as a terras particulares, conforme os respectivos
parágrafos19. E nos termos do ar. 6º e outros, deu lastro à legislação infraconstitucional para
utilizar a usucapião como instrumento de regularização fundiária, direito de moradia, função
social e outros desígnios que se manifestam nas diversas modalidades20.

Quanto às terras devolutas, a lei n. 6383/76 estabelece o respectivo Processo


Discriminatório, de sorte que é o Poder Público que deve obter a indisponibilidade como terra
pública, presumindo-se ao demais, como suscetíveis de ocupação particular todos os imóveis
vagos, urbanos ou rurais, a teor do art. 1276 e §§ do CCB. Na Faixa de Fronteira, o DL 9760/46
diz no art. 5º, que só não se incorporam ao domínio privado as que estiverem aplicadas a
algum uso público federal, estadual territorial ou municipal21. A lei n. 13.178/2015, inclusive,

19 As terras devolutas somente são consideradas terras públicas mediante processo discriminatório,
administrativo ou judicial, realizado nos termos da lei n. 6.383/1976 (art. 1º e parágrafo único). Vale dizer, é o
poder público que deve provar a condição de devoluta, pois que as terras sem dono se presumem sujeitas à
ocupação particular, a teor do art. 1276 e §§.
20 A lei n. 11.977/09 (Minha Casa Minha Vida), no art. 47, inciso VII, letra c, permite a utilização de terra pública

de qualquer das esferas da Federação em processo de regularização fundiária de interesse social para pessoas de
baixa renda, sempre que declaradas em projetos dessa natureza.
21 O art. 5º do DL 9.760/46 especifica: não se incorporaram ao domínio privado:

a) por força da Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850, Decreto nº 1.318, de 30 de janeiro de 1854, e outras leis e
decretos gerais, federais e estaduais; b) em virtude de alienação, concessão ou reconhecimento por parte da União
ou dos Estados; c) em virtude de lei ou concessão emanada de governo estrangeiro e ratificada ou reconhecida,
expressa ou implicitamente, pelo Brasil, em tratado ou convenção de limites; d) em virtude de sentença judicial com
força de coisa julgada; e) por se acharem em posse contínua e incontestada com justo título e boa fé, por termo
superior a 20 (vinte) anos;
ratifica os registros referentes a concessões estaduais de imóveis rurais na faixa devoluta de
fronteira. E a CRFB art. 225, § 5º, não dispensa ação discriminatória para arrecadar terras
devolutas necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.

Usucapião especial urbana (art. 1240 do CC, art. 9º do Estatuto da Cidade e 183 da
CRFB/88): Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinquenta metros
quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou
de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano
ou rural. Dispensam-se, pois, justo título e boa-fé, mas se acrescem outros requisitos, como a
posse trabalho e o de não ter outra propriedade e não ter sido beneficiado anteriormente pelo
mesmo direito (§ 2º). Quem usucapiu uma vez por esse especial não tem mais direito, pois a
Constituição quer que ele arranje a moradia. Gonçalves22 lembra, o benefício é em favor da
família, o que afasta a pessoa jurídica; e a morte de um dos cônjuges ou do convivente na
monoparental não prejudica o direito dos demais integrantes.
O aspecto personalíssimo dos requisitos não impede acessio possessionis (união da
posse) na usucapião especial urbana (nem na rural, por via de consequência). O argumento
contrário, escorado em precedentes jurisprudenciais e respeitável doutrina, seria o de evitar a
comercialização da posse, o que descaracterizaria esse instituto como remédio social de
distribuição e aproveitamento da terra23. Ora, se a propriedade e consequentemente o direito
de obtê-la configura-se como direito fundamental, aquele que preenche todos os requisitos
para a união de posse em usucapião especial urbana ou rural, tem sim esse direito de somar
as posses, pois a Constituição e as leis nada dizem em contrário. Negar acessio é prejudicar
injustamente tradens e accipiens da cessão de posse.

A natureza constitucional do instituto permeia diversas situações. Assim se alguém


tem outra posse, e não outra propriedade, isso não impedirá a declaração do direito. No caso
de a lei municipal estabelecer unidade mínima maior do que 250m2 deve prevalecer a
usucapião constitucional. Mas não se admite requerer usucapião de 250m2 em área de posse
contínua maior, pois nesse caso falta requisito básico e a via correta é a usucapião comum.
Não há obstáculo legal à usucapião urbana em zona rural, em face do art. 4º da lei 8.629/93;
se o imóvel é utilizado para moradia ou comércio, é considerado urbano por destinação. O rito
judicial é o sumário (art. 14 do EC), mas se preenchidos os requisitos legais dos art. 1071 e
318 do CPC e 216-A da LRP, poderá ser extrajudicial.

Usucapião especial rural (art.1239 do CCB, 191 da CRFB e art. 1º da lei 6969/81 24).
Diz o art. 1.239: Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como

f) por se acharem em posse pacífica e ininterrupta, por 30 (trinta) anos, independentemente de justo título e boa fé;
g) por força de sentença declaratória proferida nos termos do art. 148 da Constituição Federal, de 10 de Novembro
de 1937.
22 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas, p. 263 e 297.
23 Op. cit, p. 297.

24 Reza o art. 1º da lei 6969/81: Todo aquele que não sendo proprietário rural nem urbano, possuir como sua, por
5 (cinco) anos ininterruptos, sem oposição, área rural contínua, não excedente de 25 (vinte e cinco) hectares, e a
houver tornado produtiva com seu trabalho e nela tiver sua moradia, adquirir-lhe-á o domínio, independentemente
de justo título e boa-fé, podendo requerer ao juiz eu assim o declare por sentença, a qual servirá de título para
transcrição no Registro de Imóveis. Por essa lei, a usucapião especial abrange terras devolutas em geral (art. 2º)
excetuando-se áreas indispensáveis à segurança nacional, terras habitadas por silvícolas, áreas de interesse
ecológico, consideradas como tais as reservas e parques assim declarados, assegurada aos atuais ocupantes a
sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a
cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua
moradia, adquirir-lhe-á a propriedade. É um instrumento de função social, protege o grupo
familiar25, o direito à moradia, ao trabalho e ao sustento; por esse motivo, e por não haver
norma expressa em contrário, admite a união de posses (accessio possessionis)26, desde que o
cessionário da possa preencha os mesmos requisitos. O rito judicial é o Sumário (art. 5º da lei
6969/81), caso não seja possível obtê-lo extrajudicialmente27.

Usucapião Coletiva Urbana (art. 10 do Estatuto da Cidade, Lei 10257/01). Reza o artigo:
As áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupadas por população
de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não
for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem
usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel
urbano ou rural. O objeto são áreas da zona urbana, ou seja, pela localização, ou por
destinação, vale dizer área rural ocupada com moradia e comércio por uma comunidade de
pessoas de baixa renda28; as frações presumem-se iguais, a menos que os litisconsortes
admitam expressamente as diferenças que houver.
Se um dos prescribentes não preencher pessoalmente os requisitos, concorrerá pela
modalidade comum a que fizer jus, sem prejuízo do direito dos demais. Porque o § 4º dispõe
que o condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de extinção, salvo
deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de execução
de urbanização posterior à constituição do condomínio. A regularização fundiária da lei
11.977/09 e a possibilidade de usucapião extrajudicial do CPC/2015 facilitarão o
acomodamento de situações jurídicas como essa. Se não for o caso, a usucapião coletiva será
declarada por sentença levada a registro (§2º). O § 1º permite, expressamente, acessio
possessionis para contagem do prazo, contanto que ambas [as posses] sejam contínuas.

Concessão de uso especial para fins de moradia (art. 183, § 1º da CRFB, MP 2220/01,
lei 11481/07 e CCB art. 1225, XI). Aquele que tiver possuído por cinco anos ininterruptos e
sem oposição, área de até 250 m2 de imóvel público29 situado em área urbana, utilizando-a
para sua moradia ou de sua família, tem direito à concessão de uso especial para fins de
moradia em relação ao bem objeto da posse, por via judicial ou administrativa (e registro no

preferência para assentamento em outras regiões, pelo órgão competente (art. 3º). No caso de terras devolutas
pode ser reconhecida administrativamente (art. 4º, § 2º).
25 Lei 11.977/09, art. 1º, §1º, inciso I, introduz esta expressão para abranger todas as formas de família e

entidade familiar.
26 Em sentido contrário, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas, v. 5, p. 263. Mas

sem consistência jurídica, data vênia. Ademais, existe norma expressa permitindo a accessio em instituto
semelhante, que é a concessão de uso especial para fins de moradia, conforme §2º do art. 9º da MP 2220/01, in
verbis: O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu
antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.
27
Observação: o art. 22, §5º da lei 4947/66, com a redação da lei 10.267/01 dispõe o seguinte: Nos casos de usucapião,
o juiz intimará o INCRA do teor da sentença, para fins de cadastramento do imóvel rural.

28 No caso de regularização fundiária, alei municipal pode declarar qualquer área como objeto de tal providência,
nos termos dos art. 46 e 47 e incisos da lei Minha Casa Minha Vida, n. 11.977/09. A lei 8.629/93 e o Estatuto da
Terra, ambos no art. 4º, inciso I, conceituam: Imóvel Rural - o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a
sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou
agro-industrial. Se as pessoas tiverem convertido em vila a área, com moradia e comércio, será considerada
urbana pela destinação.
29 O DL 271/67 trata de concessão de uso de terreno público e particular. No mesmo sentido o Estatuto da Cidade

no § 1º do art. 10, o que, parece-nos, encerra o assunto.


álbum imobiliário); desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de
outro imóvel urbano ou rural. O direito é gratuito; mas só pode ser concedida uma única vez
ao mesmo concessionário (art. 1º, § 2º), seja a mulher, seja o homem, sejam ambos, permitida
a acessio possessionis se as posses forem contínuas30.
A Concessão é transferível por ato inter vivos (art. 7º) e mortis causa (art. 1º, §3º), mas na
sucessão hereditária é caso anômalo: tem direito o herdeiro que já resida no imóvel por
ocasião da abertura da sucessão; se o falecido deixar cinco herdeiros, e um deles somente
estiver na posse da concessão, os outros quatros não têm direito. A Concessão também pode
ser hipotecada (art. 1473, VIII do CCB, introduzido pela lei n. 11.481/07); no caso de execução
forçada, certamente poderá arrematar o bem pessoa que preencha todos os requisitos legais
da Concessão. Em caso de risco aos moradores (art. 4º) e de interesse público referido no art.
5º, é facultado à autoridade pública assegurar o exercício do direito em outro local: projeto de
urbanização, estrada, represa, defesa nacional, ou do ambiente.
O título pode ser obtido por via administrativa ou sentença (art. 3º e 4º), também para
fim comercial (art. 9º), e será extinto se o concessionário der destinação diversa ou adquirir
outro imóvel urbano ou rural. O precedente deste instituto é a concessão de direito real de
uso do DL n. 271/67 (CCB, art. 1.225, inc. XII) : É instituída a concessão de uso de terrenos
públicos ou particulares, remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como
direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social,
urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das
várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras
modalidades de interesse social em áreas urbanas (art. 7o, Decreto Lei 271/67, com a redação
da lei n. 11.481/2007).

Concessão coletiva de uso especial para fins de moradia. O art. 2º da Medida


Provisória n. 2.220/01 admite a forma coletiva da Concessão de Uso Especial para fins de
moradia: em áreas públicas urbanas maiores do que 250m2, ocupadas por pessoas de baixa
renda, por cinco anos de posse ininterrupta e sem oposição, onde não for possível identificar os
terrenos ocupados por possuidor [omissis], desde que os possuidores não sejam proprietários ou
concessionários, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural; e que a fração ideal de cada
possuidor não seja superior a 250 m2. O mesmo direito é facultado a ocupantes regularmente
inscritos em imóveis públicos, que preencham tais requisitos, segundo o art. 3º da MP. Mas o
Poder Público não fica de mãos atadas.
De fato, o instituto da Concessão de Uso Especial para fins de moradia foi vetado no
Estatuto da Cidade e reeditado pela MP 2220/01 exatamente por esse motivo, de incluir
dispositivos que permitam ao Poder Público em caso de necessidade remover os ocupantes,
garantindo-lhes o direito em outro lugar; seja no caso de a ocupação acarretar risco à vida, à
saúde dos ocupantes (art. 4º), seja na hipótese de imóvel: de uso comum do povo, destinação
a projeto de urbanização, defesa nacional, preservação ambiental e proteção dos ecossistemas
naturais; reservados à construção de represas e obras congêneres; ou situados em via de
comunicação (art. 5º da referida MP). Ao demais, aplicam-se os mesmos dispositivos,
requisitos e restrições pertinentes à modalidade a título singular.

Da mesma forma, a MP estabelece para ambas as modalidades que o direito pode


extinguir-se, cancelando-se o registro, se o concessionário der destinação diversa ao imóvel
ou vier a adquirir propriedade ou concessão de uso de outro imóvel urbano ou rural (art. 8º).
A concessão de uso especial para fins de moradia é direito que pode ser hipotecado, conforme
art. 1473, VIII do CC; porém, nesse caso, só poderá ser arrematado por quem preencha os

30É o § 2º do art. 9º: o possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à
de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.
requisitos da lei, evidentemente. Pode ser alienado e herdado (art. 7º), observando-se, porém,
a destinação social desse tipo de direito, voltado a proteger pessoas de baixa renda e a
moradia. No caso de herança, a sucessão é anômala, com preferência para o herdeiro que se
encontre na posse, sem direito dos demais a teor do § 3º do art. 1º da MP.

A lei 11.977/09 estabelece algumas alterações31 na Concessão de Uso Especial para


fins de moradia, no seu art. 71-A: O poder público concedente poderá extinguir, por ato
unilateral, com o objetivo de viabilizar obras de urbanização em assentamentos irregulares de
baixa renda e em benefício da população moradora, contratos de concessão de uso especial para
fins de moradia e de concessão de direito real de uso firmados anteriormente à intervenção na
área. Mas isso quando efetivamente necessário e justificado em procedimento próprio (§1º). E
o direito deverá ser assegurado, preferencialmente na área objeto de intervenção, por meio de
contrato que lhe assegure direitos reais sobre outra unidade habitacional, observado32 o art. 13
da lei 11.481/07.
Usucapião entre cônjuges ou usucapião familiar (art. 1240-A e lei 12424/2011). Em
caso de abandono voluntário de imóvel urbano de até 250m2, por um dos cônjuges
conviventes, poderá o parceiro abandonatário, que não tiver outro imóvel nem tiver sido
beneficiado anteriormente pelo mesmo direito, usucapir a fração do outro mediante dois anos
de posse ininterrupta com moradia ou de sua família, contados a partir do ato de abandono.
Tanto faz o imóvel ser propriedade ou simples posse ad usucapionem do casal33. O abandono
tem que ser injustificável e voluntário e não por ordem judicial. E a declaração da usucapião,
modo originário de aquisição, independe da ação de divórcio. Ademais, é gritante a
impropriedade técnica no art. 1240-A, na expressão: posse direta.34
Usucapião extrajudicial da lei 11.977/2009 (art. 46 et seq) e CPC/2015. Aqui a
usucapião é instrumento de regularização fundiária de assentamentos de pessoas de baixa
renda, localizados em áreas urbanas. A regularização – seja de interesse social (art. 53) seja
específico (art. 61) – pode incluir imóvel público, e permite a averbação do auto de
demarcação no Registro de Imóveis, com concessão de título de legitimação de posse aos
ocupantes cadastrados (art. 58 e § 1º); o que assegura e constitui direito à moradia aos que
não tenham outro imóvel e não tenham gozado de idêntico benefício anterior (art. 59 e § 1º).
A usucapião é obtida após cinco anos de posse, extrajudicialmente, perante o oficial do
Registro de Imóveis (art. 60). Na falta dos requisitos especiais, o prazo será o da espécie a que
faz jus.

31 Incluídas pela lei n. 12.424/2011. Altera a Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, que dispõe sobre o Programa
Minha Casa, Minha Vida - PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas, as
Leis nos 10.188, de 12 de fevereiro de 2001, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 6.766, de 19 de dezembro de 1979,
4.591, de 16 de dezembro de 1964, 8.212, de 24 de julho de 1991, e 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil;
revoga dispositivos da Medida Provisória no 2.197-43, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências.
32 Diz o art. 13 da lei n. 11.481/2007: A concessão de uso especial para fins de moradia, a concessão de direito real

de uso e o direito de superfície podem ser objeto de garantia real, assegurada sua aceitação pelos agentes
financeiros no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação - SFH.
33 Não há como concordar com Enunciado n. 500 do Conselho Federal de Justiça, que restringe o objeto à

propriedade comum: A modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A do Código Civil pressupõe
a propriedade comum do casal e compreende todas as formas de família ou
entidades familiares, inclusive homoafetivas. http://www.altosestudos.com.br/?p=49033, acesso em 26 de março
de 2016.
34 Posse direta é a do desdobramento da posse tratada no art. 1.197 do CCB. No caso dos cônjuges ou

companheiros que residem sob o mesmo teto, o que se tem é composse ou condomínio decorrente da sociedade
conjugal, bem mais de acordo com o art. 1.199 do CCB. Tanto que o Enunciado 502 do CJF declara: O conceito de
posse direta referido no art. 1.240-A do Código Civil não coincide com a acepção empregada no art. 1.197 do
mesmo Código. Disponível em http://www.altosestudos.com.br/?p=49033 acesso em 26 de março de 2016.
O CPC/2015 (art. 1.071, e LRP, art. 216-A) estende a via extrajudicial ou administrativa
a todos os casos de usucapião, como primeira opção. Toda a usucapião pode ser feita hoje
extrajudicialmente. A usucapião extrajudicial da lei n. 11.977/09 é de cunho social, amparada
nos desígnios dos art. 182-183 e 6º da CRFB, e no art. 2º da Lei n. 10.257/2001, o Estatuto da
Cidade; envolve política de governo, pessoas de baixa renda e presença ativa das autoridades
urbanísticas e da própria Sociedade, nos termos do Plano Diretor do Município. A usucapião
extrajudicial do CPC é de direito comum, voltada às demais espécies de usucapião, sempre que
forem preenchidos os requisitos; se faltar algum requisito, o processo será judicial, pelo rito
próprio da espécie de que se trate, seja da usucapião comum, seja da especial, singular ou
coletiva.

Usucapião de direitos reais sobre coisa alheia de gozo: assim como se adquire
propriedade também se adquirem, por usucapião, direitos limitados de gozo, como usufruto
(CCB, art. 1391) e superfície, por exemplo35. Qual é o prazo e qual é o procedimento? O mesmo
da usucapião correspondente da propriedade, salvo o caso de direito real de servidão
aparente: dez anos de posse na ordinária e vinte anos na extraordinária (CCB, art. 1379 e
parágrafo). Assim, a posse de usufruto sobre área urbana de até 250 m2, com moradia e sem
outra propriedade, confere usucapião especial em cinco anos. Se o objeto for terreno de dois
milhões de m2 de terras, por exemplo, a usucapião só poderá dar-se pela modalidade comum,
vale dizer, ordinária ou extraordinária36 dos art. 1238 e 1242.
Casos anômalos de usucapião: em princípio usucapião recai somente sobre coisas, no
sentido técnico jurídico, ou seja, sobre bens corpóreos, que estão no patrimônio privado e que
sejam suscetíveis de posse e propriedade. Todavia, não é incomum estender-se o cabimento a
situações que escapam desse figurino, como é o caso da concessão de uso especial para fins de
moradia (cujo objeto é bem público). No Brasil, o direito pretoriano criou, também, a
usucapião de linha telefônica, conforme súmula 193 do STJ. Com maior razão até do que na
concessão de uso especial de moradia, criado por lei, este é um caso anômalo, considerando
que se trata de criação de direito real sobre bem incorpóreo, como o é uma linha telefônica (o
bem principal); e pela via jurisprudencial.
Desapropriação judicial: o art. 1228, §§ 4º e 5º do CCB permite que em autos de ação
reivindicatória, tendo por objeto extensa área, ocupada por mais de cinco anos por
considerável número de pessoas, de forma ininterrupta e de boa-fé, com realização, em
conjunto ou separadamente, de obras e serviços considerados de interesse social e econômico
relevante, o juiz possa, ao julgar procedente a ação reivindicatória, fixar o valor da justa
indenização devida ao proprietário; e os réus, pagando tal preço, obterem, pela sentença, o
título de propriedade para levar ao Registro. Observemos que por falta de algum requisito,
essas pessoas não lograram direito a usucapião especial; seja pela extensão da área, seja pela
condição de serem proprietários de outros imóveis e não terem justo título.
Retificação de área: após as leis 11.977/09 e 12.424/11 instituindo a usucapião
extrajudicial, e do CPC/2015 estendendo a prática a todas as espécies de usucapião, começa a
perder razão o entendimento do STJ que rejeitava pretensão de Retificação de Área prevista

35 A concessão de uso especial para fins de moradia é também usucapião de direito real limitado; mas possui rito
próprio de legislação especial. O enfoque, nessa altura da exposição, são os direitos reais limitados que não se
apresentam com essa tipicidade legal.
36 Essa técnica de estender uma ação a outros casos ou circunstâncias distintos daqueles que motivam a ação

original, os romanos chamaram de ações úteis (actiones utiles). GARCÍA GARRIDO, Manuel Jesús. Diccionario de
jurisprudencia romana. Madrid: Dikinson, 2006, p. 21. Um exemplo pode ser encontrado nas Instituições de
Justiniano, 4.3.16, a propósito da Lex Aquilia de damno. Cabia a ação contra quem corpore suo damnum dederit,
tivesse causado o dano com o próprio corpo; mas o costume estendeu-a contra quem o causou por qualquer
outro modo. INSTITUIÇÕES DE JUSTINIANO: origem do direito brasileiro. São Paulo: Ícone, 1999, p. 279.
Podemos dizer, então, comparando, que a ação de usucapião de direitos reais limitados de gozo é uma actio utilis.
no art. 212 e seguintes da Lei 6015/73, simplificada pela lei 10.931/04, no caso de acréscimo
significativo. Com efeito, o STJ vem decidindo assim37: A ação de retificação de registro não se
presta para a aquisição de propriedade de imóvel sem o correspondente título dominial, nem
tampouco para o acréscimo significativo da área original. Ora, se a usucapião que é mais pode
ser feita em cartório, porque não o pode a retificação não impugnada? E que sequer faz coisa
julgada? Quando incide em situações possessórias consolidadas e pacíficas?
A ação publiciana foi criada pela jurisdição romana para proteger a quem não era
proprietário quiritário, mas tinha direito a usucapião38. Um exemplo no Direito atual: uma
pessoa cumpriu todos os requisitos, mas por algum motivo, ainda não requereu usucapião a
que tem direito; já é proprietária, porque os modos de aquisição são autônomos entre si e a
sentença de usucapião é meramente declaratória. Se nessa situação, perder a posse, e o
esbulhador, depois vier a transferir a posse para terceiro, que ignora o vício a teor do art.
1212 do CCB? Não obteria sucesso em ação possessória contra o terceiro com posse justa e de
boa-fé (em relação a ele), e só lhe restaria agir recorrer à via petitória, no caso, a ação
publiciana, com amparo na propriedade ainda não declarada, mas existente.
É ação petitória de emergência, em que, na falta de comprovação de propriedade pelo
Registro de Imóveis, a usucapião é invocada como meio de prova da titularidade, meramente;
tanto que, recuperada a posse com base no direito de propriedade decorrente de usucapião,
incumbe ao interessado tratar da ação competente para regularizar, definitivamente a sua
situação; para poder dispor do imóvel como dono (onerar, alienar) e usufruir de todos os
direitos pertinentes ao ius possidendi, outorgados a quem possui propriedade registrada. A
origem da ação, portanto, é pretoriana, e sua natureza explica-se pelo direito romano. É uma
espécie de tutela ad hoc, em que a justiça confronta o direito de usucapião com uma posse
justa e de boa-fé, mas que não reúne, ainda, o tempo de usucapião.
Diversas Súmulas disciplinam matéria pertinente à usucapião. Súmula 340 STF, no
sentido de que bens dominicais públicos não podem ser adquiridos por usucapião desde o
CC/16; a Súmula 263 STF, dizendo que o possuidor deve ser citado pessoalmente na ação; a
Súmula 391 do STF da mesma forma, quanto ao confinante; a Súmula 11 do STJ, dizendo que
a presença da União ou de qualquer de seus entes não afasta a competência do foro da
situação do imóvel; a Súmula 99 STJ estabelecendo que o MP tem legitimidade para recorrer,
mesmo que não haja recurso da parte; a Súmula 150 STJ a firmar a competência da Justiça
Federal nas ações de interesse da União. E a Súmula 42 do STJ define a competência estadual,
caso o réu seja Sociedade de Economia Mista39.

8. Rito processual
Quanto ao procedimento, o art. 1071 do CPC admite, sem prejuízo da via jurisdicional,
o reconhecimento extrajudicial da usucapião, nos termos do art. 216-A da LRP, o qual será
processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver
situado o imóvel usucapindo, a requerimento do interessado, representado por advogado. O
tempo de posse do requerente e antecessores é atestado em ata notarial do tabelião; juntam-
se planta e memorial descritivo, assinados por profissional habilitado, pelos titulares de
direitos reais sobre o imóvel e pelos confinantes; certidões negativas dos distribuidores da
comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente; justo título e outros documentos
relevantes, tudo conforme os incisos I a IV, do artigo.

37 Superior Tribunal de Justiça, Resp. nº 689.628/ES. Quarta Turma, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, julgado em
06 de dezembro de 2005.
38 GARCÍA GARRIDO, Manuel Jesús. Diccionario de jurisprudencia romana, p. 14-15.
39 O Ato n. 103/2004/PGJ do Ministério Público de Santa Catarina, em seu art. 3º, desobriga a intervenção do

Parquet em casos de usucapião de móveis (inciso XII) e de imóveis registrados, ressalvando-se as hipóteses da Lei
n. 10.257, de 10 de julho de 2001.
O pedido é autuado (§ 1º); o Oficial promove eventuais complementações
relativamente à manifestação de consentimento faltante (§2º); dá ciência à União, Estado,
Distrito Federal e Município (§3º); publica edital para ciência de terceiros interessados (que
terão 15 dias para manifestar-se, §4º); solicita ou realiza eventuais diligências de elucidação
(§ 5º); e estando presentes todos os elementos, registra a aquisição do imóvel com as
descrições apresentadas, inclusive com abertura de matrícula se for o caso (§6º); sem
prejuízo de suscitação de dúvida por eventual interessado (§ 7º); e da rejeição do pedido se a
documentação não estiver em ordem (§8º). A rejeição do pedido não impede o ajuizamento da
ação (§9º); mas os autos de qualquer modo são remetidos a juízo (§ 10).

Na impossibilidade de obter o consenso e a documentação necessários à usucapião em


cartório, a usucapião, seja comum, seja especial deverá ser judicial e seguirá cada qual o seu
rito; para a comum o procedimento comum de todas as causas, nos termos do art. 318 do CPC.
Para a especial, geralmente, o sumário (v.g. art. 14 do Eci) ou outro, nos termos da lei própria,
o qual é mantido pelo art. 318 do CPC, que diz: procedimento comum, salvo disposição em
contrário deste Código ou de lei. A desjudicialização tem raiz na EC 45/04, seguida da lei
10.931/04 (retificação de registro), 11.441/07 (inventário e divórcio),
11.481/07 (regularização fundiária de zonas de interesse social) e 11.977/09 (regularização
40

fundiária do Programa Minha Casa MV).

9. Usucapião como defesa


A arguição de usucapião como defesa, permitida pela Súmula 237 do STF, é menos
impactante na usucapião comum do que na especial. Na comum, a jurisprudência vem
dispensando a presença do Ministério Público, apesar do dispositivo expresso do art. 944 do
CPC/7341; e a procedência da arguição encerra o processo, devendo o prescribente promover
a ação autônoma de usucapião, posteriormente. Já na usucapião especial a presença do MP é
sempre obrigatória, também na alegação como defesa (art. 12, § 1º do Eci e art. 5º, §5º da Lei
6969/81), e a sentença que a reconhecer vale como título para o Registro de Imóveis (Lei
6969/81, art. 7º e Eci art. 13). Não interessa o tipo de feito, a questão constitucional da
usucapião é prioritária, nos termos do art. 11 do Estatuto42.

9 Efeitos da sentença
A usucapião é um modo de aquisição autônomo em relação ao registro do título,
completando-se tão somente com o preenchimento dos seus requisitos, independente da
Sentença judicial, que é meramente declaratória. Seus efeitos operam desde logo, retroagindo
ao primeiro dia de posse para todos os fins: frutos, benfeitorias, indenizações. O usucapiente
redime-se da condição possuidor injusto e de má fé. Tanto que a sua renúncia deve ser
expressa e não prejudicar os eventuais credores. As hipotecas pendentes do período anterior,
do antigo proprietário, perecem com a perda da propriedade, já que não são obstáculos à
aquisição por usucapião. Em princípio seria melhor cancelar a matrícula e abrir nova,
encerrando a fase pregressa.

40 A lei 11.481/07 trata da regularização fundiária para zonas especiais de interesse social.
41 RJTJSP 110/366, Apelação Cível APC 20020110567964 disp.
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/1392589/arguicao-de-usucapiao-em-defesa, acesso em 13 de março
2016. A Súmula 237 do STF: O usucapião pode ser arguido em defesa.
42 Diz o art. 11 do Estatuto da Cidade: Na pendência da ação de usucapião especial urbana, ficarão outras

sobrestadas quaisquer ações, petitórias ou possessórias, que venham a ser propostas relativamente ao imóvel
usucapiendo. Essa preferência da usucapião excepciona, inclusive, a prioridade do art. 557 do CPC, relativamente
às ações possessórias.
MODOS DE AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE IMÓVEL: ACESSÃO (CC 1248)

Registro de título, usucapião e acessão são os modos de aquisição de imóvel que o


Código Civil contempla no Direito das Coisas. Pode adquirir também por casamento, mas é
direito de família; por herança, mas aí é sucessão. Nesta aula estudaremos a situação
específica da acessão.

1 Conceito
A palavra acessão significa o aumento da coisa que constitui objeto de propriedade,
seja por produção, seja por união, sem alteração no direito do proprietário. Esse aumento
pode se dar no volume ou no valor do bem. Deve-se a forças internas da própria coisa (por
produção de frutos é a chamada acessão discreta) ou a forças externas (por união é a chamada
acessão contínua – um dos modos de aquisição da propriedade). A acessão discreta não é
acessão propriamente dita, seguem a regra do “acessório segue o principal”.
A acepção restrita, por outro lado, é a acessão propriamente dita: o aumento do volume
ou do valor do objeto da propriedade devido a forças externas. Dá-se a acessão, quando com à
coisa que é propriedade de alguém, se une e incorpora outra coisa que lhe não pertencia, por
ação humana ou causa natural. O proprietário da coisa principal adquire a propriedade da
coisa acessória, que se lhe uniu ou incorporou. Há

2 Modalidades
A acessão contínua realiza-se por três modos:
a) Imóvel a imóvel (aluvião; avulsão e formação de ilhas em rio);
b) Móvel a imóvel (plantações e construções);
c) Móvel a móvel (comistão, confusão, adjunção e especificação).
A matéria-prima é acrescida por uma obra de arte.

4 Classificação
4.1 Natural
4.1.1 Formação de ilhas
Há formação de ilha quando, por força natural, surge um trato de terra em um rio. A
regra dominante é que as ilhas formadas nos rios pertencem aos proprietários ribeirinhos
fronteiriços, desde que não sejam navegáveis, pois então são de domínio público. Nos
navegáveis, a acessão verifica-se em proveito da pessoa de direito público em cujo domínio se
encontrem (União, Estado ou Município).
O problema da acessão consiste em determinar a quem pertencem. São duas hipóteses:
i) ilhas que se formam no meio do rio; ii) ilhas que se formam entre a linha que divide o álveo
em duas partes iguais e uma das margens. No primeiro caso, pertence aos proprietários dos
terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção de suas testadas, até a
linha que dividir o álveo em duas partes iguais. No segundo caso, pertence ao proprietário do
terreno ribeirinho fronteiro do mesmo lado.
Há ainda a hipótese de se formarem ilhas pelo desdobramento de um novo braço do
rio. Nesse caso não se pode falar em acessão, pois não há acréscimo, e o proprietário continua
a ser dono do que lhe pertencia.
Art. 1.249. As ilhas que se formarem em correntes comuns ou particulares pertencem
aos proprietários ribeirinhos fronteiros, observadas as regras seguintes:
I - as que se formarem no meio do rio consideram-se acréscimos sobrevindos aos
terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção de suas testadas,
até a linha que dividir o álveo em duas partes iguais;
II - as que se formarem entre a referida linha e uma das margens consideram-se
acréscimos aos terrenos ribeirinhos fronteiros desse mesmo lado;
III - as que se formarem pelo desdobramento de um novo braço do rio continuam a
pertencer aos proprietários dos terrenos à custa dos quais se constituíram.

4.1.2 Aluvião
Aluvião é o depósito lento de terras que o rio deixa naturalmente nos terrenos
ribeirinhos, assim como o que se forma pelo desvio das águas. O aumento é sempre do
proprietário da “testada”, isto é, aquele que faz testa com o rio. Se a área aumentou,
automaticamente é dele.
Há duas espécies de aluvião: própria e imprópria. A primeira é o acréscimo que se
forma pelos depósitos ou aterros naturais nos terrenos marginais do rio. A segunda é o
acréscimo que se forma quando parte do álveo se descobre em razão do afastamento das
águas.
Art. 1.250. Os acréscimos formados, sucessiva e imperceptivelmente, por depósitos e
aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou pelo desvio das águas destas,
pertencem aos donos dos terrenos marginais, sem indenização.
Parágrafo único. O terreno aluvial, que se formar em frente de prédios de
proprietários diferentes, dividir-se-á entre eles, na proporção da testada de cada um
sobre a antiga margem.

4.13 Avulsão
Diferente da aluvião, a avulsão é violenta, é de uma vez só. É o desprendimento, por
força natural violenta, de uma porção de terra que se vai juntar ao terreno de outro
proprietário. A regra é que as terras desprendidas continuam a pertencer ao proprietário do
terreno do qual se desprenderam. Perde-a, porém, se o dono do terreno acrescido quiser
indenizar a avulsão.
Art. 1.251. Quando, por força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um
prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a propriedade do acréscimo, se
indenizar o dono do primeiro ou, sem indenização, se, em um ano, ninguém houver
reclamado.
Parágrafo único. Recusando-se ao pagamento de indenização, o dono do prédio a que
se juntou a porção de terra deverá aquiescer a que se remova a parte acrescida.

5.4 Abandono de álveo [de leito de rio]


No álveo abandonado há total e permanente abandono do antigo leito. O lei do rio fica
inteiramente descoberto: as águas abrem no curso. A figura do álveo abandonado supõe a
ação de forças naturais para ser tida como forma de acessão. Se a mudança de corrente se faz
artificialmente, por motivo de utilidade pública, o proprietário do terreno para o qual foi
desviado o curso do rio deve ser indenizado, não se verificando a acessão em proveito do
proprietário do terreno marginal do antigo leito, que passa a pertencer à posse de direito
público que o houver desapropriado. Quando, porém, o rio abandonar o álveo por força
natural, pertencerá este, por acessão, aos proprietários ribeirinhos das duas margens. A
aquisição da propriedade do álveo abandonado se dá, quer o rio seja público ou particular.

Art. 1.252. O álveo abandonado de corrente pertence aos proprietários ribeirinhos das
duas margens, sem que tenham indenização os donos dos terrenos por onde as águas
abrirem novo curso, entendendo-se que os prédios marginais se estendem até o meio
do álveo.

O processo de divisão do álveo abandonado, entre os proprietários confinantes da


mesma margem é o das perpendiculares tiradas dos extremos de cada terreno até a linha
mediana do álveo. A divisão entre os proprietários dos terrenos situados nas margens opostas
se faz por metade, pois está estabelecido que os prédios marginais se estendem até o meio do
álveo.

4.2 Artificial ou industrial


Decorre da vontade humana e realiza-se pela construção e pela plantação. Aplica-se-
lhe o princípio de que o acessório segue o principal. Sendo o solo coisa principal, o que se lhe
incorpora passa a pertencer ao seu dono. E, assim, toda construção ou plantação existente em
um terreno se presume feita pelo proprietário e à sua custa.
Art. 1.253. Toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita
pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário.
Todavia, essa presunção não é absoluta. Admite prova em contrário. É possível semear,
plantar ou construir sem que as sementes, plantas ou materiais de construção pertençam ao
dono do terreno e neste sejam empregadas. São três as hipóteses: i) semeadura, plantação ou
construção em terreno próprio com sementes, plantas ou materiais alheios; ii) semeadura,
plantação ou construção em terreno alheio com sementes, plantas ou materiais próprios; iii)
semeadura, plantação ou construção em terreno alheio com sementes, plantas ou materiais
alheios.
Em duas hipóteses, as coisas móveis são alheias. Numa, próprias. E nas duas hipóteses,
também, a coisa imóvel é alheia. Numa, pertence a quem planta ou edifica.
Para melhor conhecer o jogo das regras aplicáveis a essas situações, tem-se de levar
em conta que o emprego de sementes, plantas ou materiais pode ser feito de boa-fé ou de má-
fé, isto é, sabendo ou desconhecendo, quem as emprega, se pertencem a outrem ou se o
terreno é o alheio.
Aquele que semeia planta ou constrói em terreno próprio com sementes, plantas ou
materiais alheios: i) se agiu de boa-fé, fica obrigado apenas a pagar ao dono das sementes,
plantas ou materiais o seu valor; ii) mas se agiu de má-fé, isto é, sabendo que as sementes,
plantas ou materiais não lhe pertenciam, além do pagamento do valor desses bens responderá
por perdas e danos. O ônus da prova incumbe ao proprietário das sementes, plantas ou
materiais.
Art. 1.254. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com sementes,
plantas ou materiais alheios, adquire a propriedade destes; mas fica obrigado a pagar-
lhes o valor, além de responder por perdas e danos, se agiu de má-fé.

Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio com sementes, plantas ou
materiais próprios, perde, em proveito do proprietário do solo, as sementes, plantas e
construções. i) se agiu de boa-fé, tem direito à indenização, mas, ii) se obrou de má-fé, não
terá direito à indenização alguma, e poderá ser constrangido a repor as coisas no estado
anterior, bem como a pagar os prejuízos.

Pode-se dar o caso de que o proprietário do terreno e o dono das sementes, plantas ou
construções estejam de má-fé. Nesta hipótese o proprietário do solo adquire a propriedade
das sementes, plantas ou construções, mas fica obrigado a pagar o valor destas a seu dono.
Art. 1.256. Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as sementes,
plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões.
Parágrafo único. Presume-se má-fé no proprietário, quando o trabalho de construção,
ou lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação sua.

Finalmente, se o proprietário do terreno estava de má-fé e o dono das sementes,


plantas ou materiais de boa-fé, nem por isso deixa aquele de adquirir a propriedade destes
bens, mas responde por perdas e danos. Em nenhuma hipótese, por conseguinte, o
proprietário das sementes, plantas ou materiais adquire a propriedade do imóvel. A má-fé do
proprietário do solo pode ser provada por presunção. A lei presume-a quando o trabalho de
construção ou lavoura se fez em sua presença e sem sua impugnação. O parágrafo único do
art. 1255 admite aquisição da propriedade do solo se houver boa-fé e a construção ou a
plantação exceder consideravelmente o valor do terreno.
Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito
do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá
direito a indenização.
Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do
terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo,
mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.
Aquele que semeia, planta ou constrói em terreno alheio com sementes, plantas ou
materiais alheios, perde-os em proveito do proprietário do solo. i) se quem empregou as
sementes, plantas ou materiais alheios estava de boa-fé tem direito a receber o seu valor; ii)
nada recebe se estava de má-fé. O proprietário das sementes, plantas ou materiais que outrem
empregou em terreno alheio pode cobrar do proprietário do solo o valor dos mesmos, quando
não possa havê-los de quem plantou ou construiu.
Art. 1.257. O disposto no artigo antecedente aplica-se ao caso de não pertencerem as
sementes, plantas ou materiais a quem de boa-fé os empregou em solo alheio.
Parágrafo único. O proprietário das sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do
proprietário do solo a indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou
construtor

Do exposto verifica-se que o princípio da acessão se aplica em toda a linha. O dono do


solo sempre adquire a propriedade das sementeiras, plantações e construções. A boa ou a má-
fé influi, tão somente, no direito à indenização.

7 Invasão de construção
Quando por erro uma construção invade o terreno vizinho, admite-se, em certas
circunstancias, que o invasor se torna proprietário da parte ocupada mediante pagamento de
indenização. Essa desapropriação privada justifica-se para evitar demolições antieconômicas.
A aplicação das regras da acessão conduziria ao reconhecimento de que o proprietário do
terreno invadido adquiriria a propriedade da parte correspondente do edifício, quando não se
fosse mais adiante ao se lhe assegurar o direito de exigir sua demolição. Essa solução seria
inconveniente, mormente quando ordinariamente é insignificante a área invadida.
A solução nova apresenta-se como exceção ao princípio de que o acessório segue o
principal, modificando a tradicional regra da acessão. Bem consideradas as coisas, porém,
parece que o reafirma. Certas edificações modernas são mais importantes economicamente
do que os terrenos onde se levantam. Tornam-se, por assim dizer, bem principal, por seu
valor.
Art. 1.258. Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo alheio em
proporção não superior à vigésima parte deste, adquire o construtor de boa-fé a
propriedade da parte do solo invadido, se o valor da construção exceder o dessa parte,
e responde por indenização que represente, também, o valor da área perdida e a
desvalorização da área remanescente.

Autores como Orlando Gomes defendem que só se pode admitir que o construtor tenha
esse direito quando estiver de boa-fé, mas o código civil prevê que o construtor de má-fé
possa adquirir também a propriedade, desde que pague em décuplo as perdas e danos.
Parágrafo único. Pagando em décuplo as perdas e danos previstos neste artigo, o
construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo que invadiu, se em
proporção à vigésima parte deste e o valor da construção exceder consideravelmente
o dessa parte e não se puder demolir a porção invasora sem grave prejuízo para a
construção.

Essa possibilidade par ao construtor de má-fé, contudo, não é permitida caso a invasão
do solo alheio exceder a vigésima parte do terreno.
Art. 1.259. Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio exceder a
vigésima parte deste, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde por
perdas e danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da
área perdida e o da desvalorização da área remanescente; se de má-fé, é obrigado a
demolir o que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão devidos
em dobro.
PERDA DA PROPRIEDADE IMÓVEL (CC 1275)
1. Alienação
Faz parte do ius abutendi, dentre os direitos de gozo (ius utendi e fruendi).
É sempre voluntária, por um documento escrito. Para alienação é preciso de uma
escritura pública levada ao registro. Toda escritura faz referência a um livro do cartório onde
o tabelião escreveu um contrato assinado pelas cartas e por ele próprio com fé pública. A
escritura é só um traslado.

2. Renúncia
Também deve ser feita por escritura pública.
Tio Jair tinha muitos campos em Nonói e um comércio no centro. Como aquelas terras
não valiam nada, ele nunca pagou imposto. Um dia ele foi executado com a cobrança de todos
os impostos atrasados. Somando a dívida, superava o valor dos campos e inclusive do
comércio. Então ele foi para Sarandi contratar um advogado, João Límpio, que o aconselhou a
renunciar os imóveis. Isso porque o imposto é uma obrigação propter rem, paga pelo
proprietário só porque ele ó dono. Caso ele não seja mais o dono, a dívida não é mais sua.
Vale destacar que o credor hipotecário tem preferencia. Não é possível renunciar sem
avisá-lo. Todavia, o proprietário também não é obrigado a ficar com a casa só porque está
hipotecada.

3. Abandono (art. 1276)


Não se faz por escritura. É um fato. Quando a coisa é abandonada, se a coisa for
ocupada por outra pessoa, esta última a adquire por usucapião.
Caso não tenha sido ocupado por ninguém, é necessário verificar se o imóvel é urbano
ou rural. Se for urbano, o procurador do município deve baixar um edital declarando vago o
imóvel e espera que o dono apareça num prazo de três anos. Se o dono não aparecer, o imóvel
passa a pertencer ao município ou Distrito Federal.
Se o imóvel for rural, também baixa edital, declara vago e três anos depois passa à
União Federal. Aqui temos o INCRA, órgão responsável. Esses bens serão destinados à reforma
agrária.
O Código ainda diz que se houver paralisação no pagamento de imposto, presume-se o
abandono.

4. Perecimento
O Código de 1916 tinha um art. (77) falando sobre isso, mas o Código atual não o
repetiu.

5. Desapropriação
Perda compulsória de um bem a favor de uma autoridade expropriante, que declara o
imóvel ou de utilidade pública, ou de interesse social. A desapropriação por utilidade pública
é regida pelo Decreto-Lei 3365/41 e a indenização é cabal, em dinheiro. A ação de indenização
é irresistível e precedida por um decreto da autoridade executiva. Uma vez declarada não é
possível contestá-la, apenas contestar a indenização.
A desapropriação por interesse social é a Lei 4.132/62 e foi um dos motivos da queda de
João Goulart. É uma lei que está em vigor até hoje mas não foi “emplacada”. Depois da CF,
temos a desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, que é
regulamentada pela lei 9629/93 e LC 76/93. Cabe, então, ao INCRA cuidar desses assuntos.
A expropriação punitiva é sem pagamento e é prevista no art. 243 da CF e na Lei 8257/91,
que trata da perda de imóvel onde foram cultivadas plantações ilícitas.
6. Requisição (art 22, III, CF)
É quando a autoridade requisita um bem temporariamente para uma finalidade
pública, como em tempos de guerra, ou em uma perseguição policial.

7. Tutela da propriedade
7.1 Ação reivindicatória
Quando a propriedade é atingida no todo, a ação que tutela é a reivindicatória. É uma
ação imprescritível. É a primeira das ações, entre os romanos, as prescritíveis foram criadas
depois pelo pretor. É a ação que o proprietário move contra um possuidor que está na posse
indevidamente.
7.2 Ação publiciana
Como a reivindicatória, esta também é petitória. Por meio dela você prova que é
proprietário e assim o juiz confere uma proteção de proprietário também. Se o Florianópolis
não tem ação reivindicatória contra o Maravilha porque não tem escritura, mas tem a posse
há quatro anos, ele pode entrar com essa ação ad hoc, contra uma pessoa específica, e depois
entrar com usucapião.
Maria Helena Diniz fala que essa ação não existe mais, que não há mais razão de ser,
mas o professor acredita que ela esteja redondamente enganada, pois no tipo de situação
descrito, não há outra alternativa.
7.3 Ação negatória
Proprietário entra para negar direitos que outras pessoas reivindicam indevidamente,
como a extensão do uso, etc.
7.4 Ações de vizinhança
Ação demarcatória para firmar divisas com o vizinho, por exemplo, mas existem
outras.
7.5 Ações condominiais
Que os condôminos entram um contra o outro.
7.6 Outras
Declaratórias, de indenização, etc, que protegem a propriedade a outros tipo que não a
propriedade em si diretamente.

AQUISIÇÃO E PERDA DA PROPRIEDADE MÓVEL


São modos de aquisição da propriedade dos bens móveis: i) usucapião; ii) ocupação;
iii) tradição; iv) especificação; v) comistão; vi) confusão; vii) adjunção. A ocupação e a
usucapião são modos originários. Os outros, derivados.
1 Usucapião
1.1 Extraordinária
Art. 1.261. Se a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, produzirá usucapião,
independentemente de título ou boa-fé.
É necessário posse mansa, pacifica e ininterrupta por 5 anos, independentemente de
boa-fé.
1.2 Ordinária
Art. 1.260. Aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente
durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a propriedade.
Justo título é um título formalmente perfeito. É um título idôneo, adequado, mas que
contém um vício qualquer que não gera a transmissão.
1.1 Perda de depósitos bancários
Se não mexesse em 30 anos no dinheiro, perderia o dinheiro para o banco. Lei 370/37 e
2313/54
2 Ocupação
Ocupar é assenhorar-se de coisa sem dono, ou porque nunca foram apropriadas, ou
porque foram abandonadas por seu dono. Aquele que se apropria de uma dessas coisas, com a
intenção de se tornar seu proprietário, adquire-lhe domínio. Para haver ocupação, é
necessária: i) que quem apreenda a coisa tenha o ânimo de lhe adquirir a propriedade; ii) que
o objeto da apreensão seja res nullis ou res derelicta; iii) que a ocupação não seja defesa por
lei.
2.1 Ocupação propriamente dita
Tem por objeto seres vivos e coisas inanimadas. Recai em animais, realizando-se sob a
forma de caça ou pesca, assim como sobre substâncias minerais, vegetais ou animais
arrojadas às praias pelo mar. São suscetíveis de ocupação stricto sensu os animais bravios, os
mansos e domesticados sem dono, os enxames de abelhas e as substâncias mencionadas. Os
animais podem ser apropriados pela caça ou pela pesca.
O descobridor ocupa, se torna proprietário da coisa achada, porque foi abandonada. A
ocupação são de coisas sem dono (res nullius) e as coisas abandonadas (res derelictae). Agora,
se o dono não aparece, a autoridade vai procurar. Vai baixar um edital, 15 dias. Dependendo
do valor do bem, publica no jornal. Mas também o fórum tem um local para as publicações.
Baixa esse edital e no dia, se o dono aparecer, tá resolvido. Se o dono não aparecer, a coisa
deve ser vendida e o dinheiro vai para o município. É mais um motivo para o procurador do
município ter um setor encarregado dos imóveis abandonados e das coisas móveis achadas e
sem dono.
Como diferenciar uma coisa perdida de uma coisa abandonada? Se passa no lixão, vê o
busto do Teixeira de Freitas. 3 anos e uma semana depois a polícia bate na porta atrás do
busto dizendo que foi roubado do antiquário. Ele diz que tem justo título de boa-fé porque
adquiriu por usucapião.

2.2 Descoberta
Quando se encontra coisa alheia perdida. Por exemplo: quando encontra uma joia no
pátio do CCJ. Não é o lugar de a joia estar. Diz o art. 1233: “ii”.. Se você encontrar ess ajoia e
ficar para você é crime, inclusive (art. 169 paragrafo unico, II do CP). “NAo o conhecendo, o
descobridor o fará por encontra-lo; se nao encontra-lo, entregará a coisa perante a autoridade
competente”. Geralmente essas coisas sao levadas ao conhecimento de um juiz. Aquele que
restituiu a coisa tem direito a uma recompensa. Essa recompensa chama-se achádego, que é
no míimo 5% do valor da coisa. Se ele se negar a pagar a recompensa, o juiz arbitra e ele paga.
Agora, ele pode também preferir não pagar e abandonar a coisa. Aí nós passamos para o item
3.

2.3 Achado de tesouro


1264 – 1266
Enfiteuto
3 Tradição
art. 1267 art. 1268
A tradição é a entrega da coisa com consentimento, acordo de vontades, para transmissão do
direito real de propriedade. No imóvel é diferente. No móvel é a efetiva entrega da coisa.
Tradição real: entrega efetiva
Tradição simbólica:
Tradição ficta ou consensual: é aquela em que não há entrega efetiva da coisa
Você ja é inquilino. Aí eu vendo para você. Nós não fazemos tradição, porque você já está nela.
4 Especificação
art 1269 art 1271
ideia é a transformação da matéria-prima em uma coisa nova. Entende-se que a matéria-
prima pereceu.

5 Comistão, confusão e adjunção


Comistão: mistura de coisas secas involuntariamente. O proprietário de uma carga e de outra
terão condomínio. Como por exemplo: duas cargas de trigo, de laranja.
Confusão: quando acontece isso com os líquidos.
Adjunção: coleção e selo.
Coleção vale mais que selo. Indeniza o selo.

DIREITO DE VIZINHANÇA CC 1277-1313

1 Noções gerais e teorias


2 Princípio dominante
3 Natureza jurídica
São limitações legais ao direito de propriedade. Entram na categoria das obrigações in
rem scriptae, isto é, quem está na coisa tem que obedecer. Cada morador tem que se
comportar e respeitar as normas.

4 Categorias estratégicas
4.1 Vizinho
Vizinho é um termo técnico: é aquele que está a uma distância (de porta ou a 10km de
distância) que pode incomodar pela proximidade.

4.2 Interferência
É o resultado de um ato que é praticado de um lado e atinge o outro. O código anterior
chamava de imissão (do latim imitere). Essa interferência pode ser com barulho, mau cheiro,
risco de árvores caírem, produtos perigosos.
4.3 Saúde, sossego e segurança
Não poder dormir porque há barulho do outro lado, é interferência ao sossego. Uma
construção invasiva pode ameaçar a segurança. Um estoque de agrotóxicos pode afetar a
saúde e assim por diante. Então: o vizinho pode provocar interferência que vai afetar saúde,
sossego e segurança.
4.4 Conflito e vizinhança
Disso tudo pode decorrer um conflito. Por isso é necessário que alguém ceda.

5 Classificação
5.1 Onerosos
Se você está encravado, o vizinho é socialmente responsável por te desencravar. Se o
terreno é trancado, você só pode passar pelo terreno do vizinho. Exige, então, uma passagem
forçada, pela qual pagará uma indenização. Ou ainda, passar canos pelo terreno de vizinho.
5.2 Gratuitos
Um exemplo é não fazer barulho.

6 Soluções aventadas
Juiz, árbitro ou alguma outra figura procura reestabelecer o equilíbrio. Santiago Dantes
tem uma obra clássica sobre direito de vizinhança que diz que o direito de vizinhança tem
interfaces com outros ramos do Direito para procurar soluções. Existem casos em que se pode
recorrer à polícia, por exemplo. Ou o juiz manda tolerar, manda indenizar, manda fazer obras,
manda permitir.

7 Tratamento legal no CC
7.1 Uso anormal
Uso que vai além da normalidade e causa interferência/desassossego no vizinho. Art
1278: “O proprietário tem o direito..”.
7.2 Arvores (1282)
7.3 Passagem forçada e passagem de tubos (1285 e 1286)
7.4 Aguas (1287)
7.5 Limites e passagens (1297)
7.6 Direito de construir (1299)

Na zona rural, uma casa ficará distante da outra seis metros, se somarmos os três que um tem
que deixar e três do outro:
Art. 1.303. Na zona rural, não será permitido levantar edificações a menos de três
metros do terreno vizinho.

Art. 1.304. Nas cidades, vilas e povoados cuja edificação estiver adstrita a alinhamento,
o dono de um terreno pode nele edificar, madeirando na parede divisória do prédio
contíguo, se ela suportar a nova construção; mas terá de embolsar ao vizinho metade do
valor da parede e do chão correspondentes.

Art. 1.305. O confinante, que primeiro construir, pode assentar a parede divisória até
meia espessura no terreno contíguo, sem perder por isso o direito a haver meio valor
dela se o vizinho a travejar, caso em que o primeiro fixará a largura e a profundidade do
alicerce.
Parágrafo único. Se a parede divisória pertencer a um dos vizinhos, e não tiver
capacidade para ser travejada pelo outro, não poderá este fazer-lhe alicerce ao pé sem
prestar caução àquele, pelo risco a que expõe a construção anterior.

CONDOMÍNIO – CC – 1314 – 1330


1 Conceitos e teorias
O condomínio é uma propriedade com mais de um proprietário. Temos um termo
genérico que precede o condomínio que é a comunhão (de interesses, de herdeiros..). Sempre
que um direito pertence a mais de uma pessoa, é uma composse, uma posse com mais de um
possuidor. Coautor, no direito autorial, é um direito com mais de um autor. Coenfiteuta
significa dizer que alguém tem enfiteuse sobre algo junto com uma outra pessoa.
2 Histórico
O romano era dono das coisas e podia desmanchar o condomínio na hora que quisesse. O
alemão tinha outro tipo de condomínio que imita muito o sistema político da polis grega. O
grego nascia na polis, a polis ele não podia mudar. A polis era um condomínio político.
Algo que já estava estabelecido e que ele não podia mudar. A república romana era dos
romanos e eles podiam modificar. A visão política espelha a visão da propriedade.

Então, condomínio de mão comum é uma espécie de corporação. O condomínio é fundado


e você é um dos condôminos. No dia que você quiser sair, você sai e o condomínio fica.
Aquele que não estiver satisfeito e quiser ir embora, que vá. É uma propriedade coletiva. O
condomínio de mão comum é isso. Ele é uma instituição em si, uma pessoa jurídica em si.
A pessoa individualmente não pode desmanchá-lo se não pelo seu estatuto.
Na verdade existem duas espécies de condomínio. Os romanos tinham as duas, só que os
alemães se dedicaram mais a essa que dizemos que é o condomínio alemão, que é o
condomínio de mão comum.

3 Classificação
3.1 Geral
3.1.1 Voluntário (1314)
Tem sua origem na vontade das partes.

Pro indiviso. Todos usam a coisa toda mas cada um tem uma fração. Às vezes a fração
é igual, às vezes a fração de um é maior que a do outro.

Pro diviso. Na escritura ainda é um condomínio dividido, mas de fato já é dividido,


com cercas. Mas se um incomodar o outro pode entrar com ação possessória. Ou um
deles resolve entrar com ação de divisão.

Critérios para dividir: benfeitorias, licitações e outro (pesquisar).


Um pai de família, uma família italiana, construiu um prédio. Ficou morando ali com
sete filhos, cada um em um apartamento. Construiu no regime de condomínio
voluntário pro diviso. Qual é a grande dificuldade dele? Para contratar alguém para
trabalhar aqui, precisa de autorização dos outros. Se quiser dar para um terceiro
administrar, tem que colocar em votação. O voto de cada um é o da fração. Às vezes
somando esse dá mais que aquele.

3.1.2 Necessário (1327


CONDOMÍNIO ESPECIAL EDILÍCIO (art. 1331 e Lei das Incorporações 4.531/64)
1. Noção conceitual
Geralmente a incorporação é um regime de construção de prédios para venda de
unidade em regime edilício. O condomínio edilício é um modelo de propriedade em que
convivem três elementos: i) unidades autônomas (que são propriedades como outras
qualquer); ii) partes comuns (acessórios da unidade autônoma: corredor, elevador,
encanamentos); iii) frações ideais (é o parâmetro: no dia que derrubar o prédio, qual a fração
no terreno; se houver um incêndio, qual a porcentagem do seguro; participação nas eleições).
O critério da fração ideal é determinado no momento da aprovação da convenção do
condomínio. Às vezes a fração corresponde à metragem da área, mas nem sempre, pois em
algumas vezes o apartamento está em uma condição mais favorável.
2. Histórico
Em 1776 houve um incêndio na França onde um casario foi totalmente destruído. Para
reconstruir, colocaram vários apartamentos no mesmo terreno, um em cima do outro. É uma
grande otimização dos terrenos. O Código de Napoleão de 1804 ignorou solenemente o
condomínio edilício, tratou somente do condomínio necessário. No Brasil, o código de 1916
também ignorou. Apenas em 1928 foi emanado um decreto regulamentando-o, que
permaneceu vigente até a Lei de incorporações de 1964. Em 2002 o Código Civil tratou do
assunto nos dois artigos citados acima.
3. Elementos
Então, é um regime de propriedade que tem três elementos. A unidade é um direito
como outro qualquer. Pode inclusive ser usucapida, e as partes comuns a seguem como
acessório. A fração ideal, como visto, é o parâmetro.

4. Instituição do condomínio
Normalmente a instituição do condomínio se dá no momento da construção do prédio
e aprovação pela prefeitura.
Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento,
registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato,
além do disposto em lei especial:
I - a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva,
estremadas uma das outras e das partes comuns;
II - a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao
terreno e partes comuns;
III - o fim a que as unidades se destinam.
Art. 1.333. A convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita
pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais e torna-se, desde
logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos
sobre elas tenham posse ou detenção.
Parágrafo único. Para ser oponível contra terceiros, a convenção do condomínio
deverá ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis.

5. Convenção
É mais do que um contrato, é um estatuto. Vale para qualquer um que morar no prédio,
inclusive os não proprietários, como inquilinos; e também para estranhos (como por exemplo
um caminhão de mudança).
Art. 1.334. Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados
houverem por bem estipular, a convenção determinará:
I - a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para
atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio;
II - sua forma de administração;
III - a competência das assembléias, forma de sua convocação e quorum exigido para as
deliberações;
IV - as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores;
V - o regimento interno.
§ 1o A convenção poderá ser feita por escritura pública ou por instrumento particular.
§ 2o São equiparados aos proprietários, para os fins deste artigo, salvo disposição em
contrário, os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às
unidades autônomas.
5.1 Alterações
É necessária a aprovação de 2/3 para instalação da assembleia e dos mesmos 2/3
confirmando a alteração.
Art. 1.351. Depende da aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a
alteração da convenção; a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária,
depende da aprovação pela unanimidade dos condôminos. (Redação dada pela Lei
nº 10.931, de 2004)

6. Direitos e deveres
Art. 1.335. São direitos do condômino:
I - usar, fruir e livremente dispor das suas unidades;
II - usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a
utilização dos demais compossuidores;
III - votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite.

Art. 1.336. São deveres do condômino:


I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais,
salvo disposição em contrário na convenção; (Redação dada pela Lei nº 10.931, de
2004)
II - não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;
III - não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;
IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de
maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons
costumes.

Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus
deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos
restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor
atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das
faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.
Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento
antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou
possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do
valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação
da assembleia.

Art. 1.338. Resolvendo o condômino alugar área no abrigo para veículos, preferir-se-á,
em condições iguais, qualquer dos condôminos a estranhos, e, entre todos, os
possuidores.
Art. 1.339. Os direitos de cada condômino às partes comuns são inseparáveis de sua
propriedade exclusiva; são também inseparáveis das frações ideais correspondentes as
unidades imobiliárias, com as suas partes acessórias.
§ 1o Nos casos deste artigo é proibido alienar ou gravar os bens em separado.
§ 2o É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a
outro condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato
constitutivo do condomínio, e se a ela não se opuser a respectiva assembléia geral

7. Pessoalidades

Art 1336.
§ 1o O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios
convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois
por cento sobre o débito.
§ 2o O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a
IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser
superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das
perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia
geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança
da multa.
Art. 1.340. As despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo de um condômino, ou
de alguns deles, incumbem a quem delas se serve.

8. Obras
Art. 1.341. A realização de obras no condomínio depende:
I - se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos;
II - se úteis, de voto da maioria dos condôminos.
§ 1o As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas,
independentemente de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou
impedimento deste, por qualquer condômino.
§ 2o Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e importarem em
despesas excessivas, determinada sua realização, o síndico ou o condômino que
tomou a iniciativa delas dará ciência à assembleia, que deverá ser convocada
imediatamente.
§ 3o Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem em
despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da
assembleia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou
impedimento deste, por qualquer dos condôminos.
§ 4o O condômino que realizar obras ou reparos necessários será reembolsado
das despesas que efetuar, não tendo direito à restituição das que fizer com
obras ou reparos de outra natureza, embora de interesse comum.
Art. 1.342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já
existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da
aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas
construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por
qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns.

Art. 1.343. A construção de outro pavimento, ou, no solo comum, de outro


edifício, destinado a conter novas unidades imobiliárias, depende da aprovação
da unanimidade dos condôminos.

9. Seguro
Art. 1.346. É obrigatório o seguro de toda a edificação contra o risco de
incêndio ou destruição, total ou parcial.

10. Administração
10.1 Síndico
Eleito a cada dois anos. Anualmente apresenta o orçamento do condomínio em
assembleia.

Art. 1.347. A assembléia escolherá um síndico, que poderá não ser condômino,
para administrar o condomínio, por prazo não superior a dois anos, o qual
poderá renovar-se.

Art. 1.348. Compete ao síndico:


I - convocar a assembléia dos condôminos;
II - representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou
fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns;
III - dar imediato conhecimento à assembléia da existência de procedimento
judicial ou administrativo, de interesse do condomínio;
IV - cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as
determinações da assembléia;
V - diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela
prestação dos serviços que interessem aos possuidores;
VI - elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano;
VII - cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as
multas devidas;
VIII - prestar contas à assembléia, anualmente e quando exigidas;
IX - realizar o seguro da edificação.
§ 1o Poderá a assembléia investir outra pessoa, em lugar do síndico, em poderes
de representação.
§ 2o O síndico pode transferir a outrem, total ou parcialmente, os poderes de
representação ou as funções administrativas, mediante aprovação da
assembléia, salvo disposição em contrário da convenção.
Art. 1.349. A assembléia, especialmente convocada para o fim estabelecido no §
2o do artigo antecedente, poderá, pelo voto da maioria absoluta de seus
membros, destituir o síndico que praticar irregularidades, não prestar contas,
ou não administrar convenientemente o condomínio.
Art. 1.350. Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembléia dos
condôminos, na forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das
despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e
eventualmente eleger-lhe o substituto e alterar o regimento interno.
§ 1o Se o síndico não convocar a assembléia, um quarto dos condôminos poderá
fazê-lo.
§ 2o Se a assembléia não se reunir, o juiz decidirá, a requerimento de qualquer
condômino.

10.2 Conselho Fiscal


É optativo.
11. Assembleia
As deliberações se dão em assembleia, ordinária ou extraordinária. É convocada pelo
síndico, mas na sua omissão pode ser feita por 5% dos condôminos ou autorização judicial.
Existem vários quóruns no condomínio. Alguns requerem unanimidade, como transformação
da destinação do prédio de moradia para comercial.

PARCELAMENTO DO SOLO

1 Política urbana

A Constituição Federal de 1988, dedicou um capítulo à Política Urbana, inserido no


Título VII (Da Ordem Econômica e Financeira). Neste capítulo estão presentes os artigos 182 e
183.
A Lei nº 10.257/2001, conhecida por Estatuto da Cidade, regulamenta os artigos 182 e
183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e cria normas de
ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem
coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu em seu art. 182, § 1º, a obrigatoriedade do
plano diretor para cidades com mais de 20.000 habitantes. Por sua vez o Estatuto da Cidade
declara obrigatoriedade para além da hipótese constitucional, para municípios integrantes de
regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, locais onde o Poder Público municipal deseja
utilizar o preceituado no §4º, do art. 182, da Constituição, municípios integrantes de áreas de
interesse turístico, e por fim de áreas de influência de empreendimento ou atividades com
significativo impacto ambiental.
Tal documento deve ser aprovado pela respectiva câmara municipal, constituindo-se
no instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. Assim, o plano
diretor deve instrumentalizar o cumprimento da função social do território urbano, mediante
um planejamento da expansão da malha urbana e do estabelecimento de porções espaciais de
usos diversos.
O plano diretor inclui o zoneamento ambiental, os planos de desenvolvimento
econômico e social, além da disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo, o que
fez do plano diretor o principal instrumento da política urbana brasileira.

2 Histórico do parcelamento do solo urbano e rural


A primeira norma jurídica a cuidar do parcelamento do solo foi o Decreto-Lei 58, de
1937, que regulava apenas o loteamento, espécie do instituto parcelamento do solo, tanto
rural quanto urbano, sem sequer definir o seu conceito. A meta de tal Decreto-Lei era,
primeiramente, regular a venda de terrenos e não, especificamente, tratar da questão do solo
urbano. Diante disto, surge a proliferação de loteamentos clandestinos em todos os centros
urbanos do país, com serios prejuízos aos adquirentes de lotes e à ordenaçao das cidades.
Tal situaçao normativa se arrasta ate 1967, quando, em plena ditadura militar, foi
editado o Decreto-Lei 271, que estabeleceu regras sobre os parcelamentos do solo urbano,
dispondo, principalmente, sobre a responsabilidade do loteador e definindo termos ainda não
conceituados pelas legislações anteriores. Esse decreto detalhou aspectos da normativa
anterior, introduzindo no Brasil o direito real de superfície, o parcelamento de áreas rurais
como urbanas, a concessão de uso e outros dispositivos.
Alguns anos antes foi criado, também pelo governo militar, o Estatuto de Terras (Lei
4.504/64), com o objetivo de frear e controlar as reivindicações populares e tensões sociais
que cresciam de maneira acentuada e desviar o foco do conflito. A principal finalidade era
evitar a eclosão de uma revolução camponesa e, estrategicamente, tranquilizar os grandes
proprietários de terra.
Por fim, em 19 de dezembro de 1979, foi publicada a Lei 6.766, que se tornou o
referencial jurídico do parcelamento do solo urbano ate os dias atuais, tratando o tema de
forma mais sistematizada e coerente. Hoje está um pouco ultrapassada, pois o problema é
muito mais dinâmico.
A Lei 11.977/09 instituiu, não só a regularização fundiária, mas também o Programa
Minha Casa Minha Vida (PMCMV), do Governo Federal, que se destina ao custeio de moradia
à populaçao de baixa renda.
O Estatuto da Cidade (Lei 10.257/1) criou uma série de instrumentos para que a
cidade pudesse buscar seu desenvolvimento urbano, sendo o principal o plano diretor, que
deve articular a implementação de planos diretores participativos, definindo uma série de
instrumentos urbanísticos que têm no combate à especulação imobiliária e na regularização
fundiária dos imóveis urbanos seus principais objetivos.
Além de definir uma nova regulamentação para o uso do solo urbano, o Estatuto prevê
a cobrança de IPTU progressivo de até 15% para terrenos ociosos, a simplificação da
legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a aumentar a oferta de lotes, e a
proteção e a recuperação do meio ambiente urbano.

3 Espécies de parcelamento do solo urbano


Segundo a Lei Federal n.º 6.766/79, o parcelamento do solo urbano somente pode ser
levado a efeito mediante loteamento ou desmembramento (artigo 2º, “caput”). Consistem,
um e outro, na divisão de determinada gleba em lotes destinados à edificação. Distinguem-se,
no entanto, porque, no loteamento, há abertura de novas vias de circulação, de logradouros
públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes; enquanto, no
desmembramento, há aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na
abertura de novas vias ou em algum dos efeitos previstos na modalidade anterior.
No art. 3° dessa Lei, estão prevista as hipóteses em que não serão permitidos o
parcelamento do solo: I - em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as
providências para assegurar o escoamento das águas; Il - em terrenos que tenham sido
aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados; III - em
terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas
exigências específicas das autoridades competentes; IV - em terrenos onde as condições
geológicas não aconselham a edificação; V - em áreas de preservação ecológica ou naquelas
onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção.

Quanto ao reloteamento, não existe atualmente um conceito legal de reparcelamento


no direito brasileiro, embora a Lei 6.766 faça menção ao termo reloteamento como um
possível fundamento de desapropriação (art. 44). Esta lei define apenas os conceitos de
loteamento e de desmembramento, considerados modalidades de parcelamento do solo
urbano. A única menção existente a algo semelhante encontra-se no art. 44, segundo o qual o
Município, o Distrito Federal e o Estado poderão expropriar áreas urbanas ou de expansão
urbana para reloteamento, demolição, reconstrução e incorporação, ressalvada a preferência
dos expropriados para a aquisição de novas unidades. Nao ha, no entanto, qualquer
desenvolvimento do conceito de reloteamento ou previsao de um sistema de participaçao dos
proprietarios no empreendimento capaz de evitar os custos da desapropriaçao. Na ausencia
de um instituto proprio, a unica maneira de se proceder a um reparcelamento e mediante o
emprego sucessivo de outros institutos.

O desmembramento, a seu turno, diferencia-se da figura do desdobro (ou


fracionamento), na medida em que este último, espécie de parcelamento não contemplado
na Lei Federal n.º 6.766/79 (mas aceito pela Corregedoria-Geral da Justiça/RS – vide art. 1º
do Provimento n.º 28/2004, que instituiu o Projeto More Legal 3), é doutrinariamente aceito
se previsto em lei municipal de regência. O desdobro, vale dizer, é a divisão da área do lote
para formação de novo ou de novos lotes. Estes devem atender às exigências mínimas de
dimensionamento e índices urbanísticos para sua edificação.
Com relação ao desdobro (ou fracionamento), para exemplificar, ocorre o seguinte: se
um terreno de 6.000 m² for desmembrado em dez (10) partes iguais, na mesma quadra, cada
lote possuirá 600 m² – por óbvio –. Se o mínimo módulo urbano do município for 300 m², por
exemplo, admite-se o desdobro de cada lote de 600m² em dois de 300 m². Esta é a diferença
entre desmembramento e desdobro: o primeiro é a subdivisão da gleba; o segundo, do lote.

A regularização fundiária está prevista no artigo 46 da Lei nº 11.977/2009 e consiste


no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularizaçao
de assentamentos irregulares e à titulaçao de seus ocupantes, de modo a garantir o direito
social à moradia, o pleno desenvolvimento das funçoes sociais da propriedade urbana e o
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Em poucas palavras: a regularizaçao
fundiaria e um processo para transformar terra urbana em terra urbanizada (com
infraestrutura e integraçao à cidade).
São quatro as modalidades de regularização fundiária previstas na legislação
brasileira: a) regularização fundiária de interesse social (Lei n. 11.977/2009); b)
regularização fundiária de interesse específico (Lei n. 11.977/2009); c) regularização
fundiária inominada ou de antigos loteamentos (Lei n. 11.977, art. 71); e d) regularização
fundiária em imóveis do patrimônio público (Lei n. 11.481/2007).

5 Conceito de lote
Art. 2° § 4o/Lei 6.766/79. Considera-se lote o terreno servido de infraestrutura
básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano
diretor ou lei municipal para a zona em que se situe.

Lote não é apenas um quadrado de terra, mas um pedaço de terra medido dentro do
parcelamento do solo e que contém uma infraestrutura básica, mínima.

6 Requisitos para o loteamento


Art. 4º. Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos:
I - as áreas destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamento
urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão
proporcionais à densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou
aprovada por lei municipal para a zona em que se situem. (Redação dada
pela Lei nº 9.785, de 1999)
II - os lotes terão área mínima de 125m² (cento e vinte e cinco metros
quadrados) e frente mínima de 5 (cinco) metros, salvo quando o loteamento
se destinar a urbanização específica ou edificação de conjuntos habitacionais
de interesse social, previamente aprovados pelos órgãos públicos
competentes;
III - ao longo das águas correntes e dormentes e das faixas de domínio público
das rodovias e ferrovias, será obrigatória a reserva de uma faixa não-edificável
de 15 (quinze) metros de cada lado, salvo maiores exigências da legislação
específica; (Redação dada pela Lei nº 10.932, de 2004)
IV - as vias de loteamento deverão articular-se com as vias adjacentes
§ 1o A legislação municipal definirá, para cada zona em que se divida o
território do Município, os usos permitidos e os índices urbanísticos de
parcelamento e ocupação do solo, que incluirão, obrigatoriamente, as áreas
mínimas e máximas de lotes e os coeficientes máximos de
aproveitamento. (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999)
§ 2º - Consideram-se comunitários os equipamentos públicos de educação,
cultura, saúde, lazer e similares.
§ 3o Se necessária, a reserva de faixa não-edificável vinculada a dutovias será
exigida no âmbito do respectivo licenciamento ambiental, observados
critérios e parâmetros que garantam a segurança da população e a proteção
do meio ambiente, conforme estabelecido nas normas técnicas
pertinentes. (Incluído pela Lei nº 10.932, de 2004)

7 Procedimento e registro
Para os loteamentos e desmembramentos serem considerados legais, a planta e o
projeto devem ser previamente aprovados pela Prefeitura, obedecida a legislação pertinente
.Após a aprovação, devem ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis competente, nos
termos e na forma como dispõe o art.18 da lei 6.766/79. A execução das obras de
infraestrutura se dará segundo a respectiva aprovação.
Desta forma, o loteamento ou desmembramento só se tornará legal depois de
aprovado, executadas as obras de infraestrutura ou garantida a sua execução e submetido ao
registro imobiliário, conforme definido pela legislação vigente. O registro do parcelamento
deve ser pedido ao serviço imobiliário ao qual a área é atribuída, dentro de 180 (cento e
oitenta) dias a partir da aprovação pela autoridade administrativa competente.
O procedimento de registro do parcelamento do solo urbano tem natureza
administrativa, mas pode comportar uma fase jurisdicional. Da fase administrativa não se
pode prescindir. A fase jurisdicional só surgirá se houver impugnação ao registro pretendido.

O registro do desmembramento e do loteamento, diga-se, é sempre obrigatório (art. 18


da Lei Federal n.º 6.766/79). Já com relação ao registro do desdobro (ou desdobramento), o
art. 18 da Lei Federal n.º 6.766/79 nada dispõe a respeito, pois trata apenas de loteamento e
desmembramento.

A diferença do loteamento e do desmembramento é que o segundo não é


registrado, mas apenas averbado. Basta ser solicitado à prefeitura, aprovado, e então
procede-se a averbação no registro de imóveis sob a matrícula da gleba (da área que
está sendo parcelada).

8 Parcelamento rural: para fins urbanos ou fora da zona urbana


A Lei 6.766/99, que trata do parcelamento do solo urbano, prevê que o parcelamento para fins
urbanos poderá ser realizado apenas em zonas urbanas:
Art. 3o /Lei 6.766/99. Somente será admitido o parcelamento do solo para fins
urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica,
assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal.

A mesma lei prevê que, quando se tratar de imóvel rural, as alterações ficarão a cargo do
INCRA.
Art. 53. Todas as alterações de uso do solo rural para fins urbanos dependerão
de prévia audiência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária -
INCRA, do Órgão Metropolitano, se houver, onde se localiza o Município, e da
aprovação da Prefeitura municipal, ou do Distrito Federal quando for o caso,
segundo as exigências da legislação pertinente.

O Instituto elaborou a normativa 17-B para dispor tanto sobre o parcelamento de


imóveis rurais para fins urbanos quanto para fins agrícolas. Aprovado o projeto de
parcelamento, pela Prefeitura Municipal ou pelo Governo do Distrito Federal, e registrado no
Registro de Imoveis, o INCRA, a requerimento do interessado, procedera à atualizaçao
cadastral, conforme o disposto no item 2.3.
INCORPORAÇÃO (LEI 4591/64)

1 Conceito
Incorporação é o ato complexo de construir um prédio em regime edilício. O
incorporador compromete-se a construir o edifício e entregar, apto à habitação, a cada
adquirente, a unidade que este se comprometeu a comprar. Às vezes o compromisso é
assumido, em relação a alguns, quando o prédio já está em construção. Mas a incorporação é
economicamente um empreendimento que consiste em obter o capital necessário à
construção do edifício, geralmente mediante a venda, por antecipação, dos apartamentos de
que se constituirá. Daí a necessidade que tem o incorporador de colocar no mercado
imobiliário certo número de apartamentos, que promete construir, com as entradas dos
promitentes compradores, e não raro, com o financiamento obtido em um estabelecimento de
crédito A atividade do incorporador é de empresário, pois ele vende as unidades antes mesmo
de começar a construção.
Por ser em regime de condomínio edilício, conta com unidades autônomas, áreas
comuns e frações ideias. Dentro da incorporação se aprova, de regra geral, esse tipo de regime
jurídico.
A lei de Incorporações estabelece as normas para aprovar no município essa
incorporação, levar ao registro de imóveis e registrar o imóvel. A lei prevê inclusive a
possibilidade de arrependimento da compra, caso exista.

A definição legal está prevista no art. 28 da Lei 4.591/64 que dispõe sobre o
condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias.
Art. 28. As incorporações imobiliárias, em todo o território nacional, reger-se-ão
pela presente Lei.
Parágrafo único. Para efeito desta Lei, considera-se incorporação imobiliária a
atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação
total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades
autônomas, (VETADO).

2 Incorporador
É o grande responsável pelo empreendimento. Não é necessariamente o construtor,
mas muitas vezes verifica-se essa coincidência entre construtora e incorporadora. Às vezes
acontece também de a incorporadora ser uma pessoa e a construtora ser outra. O
incorporador será sempre o responsável, mas pode ser i) o proprietário do terreno onde será
construído o prédio; ii) o promitente comprador do terreno; iii) o cessionário deste, sejam
pessoas naturais ou jurídicas, e ainda o construtor ou o corredor de imóveis com CRECI
(Registro no Conselho Regional de Corretores de Imóveis). Não é qualquer um, portanto, é
necessário estar em uma dessas categorias.
Art. 29. Considera-se incorporador a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não,
que embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações
ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas,
(VETADO) em edificações a serem construídas ou em construção sob regime
condominial, ou que meramente aceite propostas para efetivação de tais transações,
coordenando e levando a termo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o
caso, pela entrega, a certo prazo, preço e determinadas condições, das obras concluídas.
Parágrafo único. Presume-se a vinculação entre a alienação das frações do terreno e
o negócio de construção, se, ao ser contratada a venda, ou promessa de venda ou de
cessão das frações de terreno, já houver sido aprovado e estiver em vigor, ou pender de
aprovação de autoridade administrativa, o respectivo projeto de construção,
respondendo o alienante como incorporador.

3 Procedimentos documentais
É necessário provar a propriedade com uma certidão atualizada, além de demonstrar
com certidão vintenária que a posse dessa unidade supera o prazo máximo de usucapião, de
modo que aquele imóvel estará garantido não só pelo registro de imóveis, mas também pela
usucapião. São necessários também documentos que provem que não deve impostos, projeto
de construção devidamente aprovado pelas autoridades, discriminação das frações ideias,
minuta da futura convenção do condomínio, minuta do contrato com o qual serão vendidas as
unidades (compromisso de compra e venda padrão previsto no art. 67 da lei), etc.

Art. 32. O incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas após
ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, os seguintes
documentos:
a) título de propriedade de terreno, ou de promessa, irrevogável e irretratável, de
compra e venda ou de cessão de direitos ou de permuta do qual conste cláusula de
imissão na posse do imóvel, não haja estipulações impeditivas de sua alienação em
frações ideais e inclua consentimento para demolição e construção, devidamente
registrado;
b) certidões negativas de impostos federais, estaduais e municipais, de protesto de
títulos de ações cíveis e criminais e de ônus reais relativamente ao imóvel, aos
alienantes do terreno e ao incorporador;
c) histórico dos títulos de propriedade do imóvel, abrangendo os últimos 20 anos,
acompanhado de certidão dos respectivos registros;
d) projeto de construção devidamente aprovado pelas autoridades competentes;
e) cálculo das áreas das edificações, discriminando, além da global, a das partes
comuns, e indicando, para cada tipo de unidade a respectiva metragens de área
construída;
f) certidão negativa de débito para com a Previdência Social, quando o titular de
direitos sôbre o terreno fôr responsável pela arrecadeção das respectivas
contribuições;
g) memorial descritivo das especificações da obra projetada, segundo modêlo a que
se refere o inciso IV, do art. 53, desta Lei;
h) avaliação do custo global da obra, atualizada à data do arquivamento, calculada
de acôrdo com a norma do inciso III, do art. 53 com base nos custos unitários referidos
no art. 54, discriminando-se, também, o custo de construção de cada unidade,
devidamente autenticada pelo profissional responsável pela obra;
i) discriminação das frações ideais de terreno com as unidades autônomas que a
elas corresponderão;
j) minuta da futura Convenção de condomínio que regerá a edificação ou o conjunto
de edificações;
l) declaração em que se defina a parcela do preço de que trata o inciso II, do art. 39;
m) certidão do instrumento público de mandato, referido no § 1º do artigo 31;
n) declaração expressa em que se fixe, se houver, o prazo de carência (art. 34);
o) atestado de idoneidade financeira, fornecido por estabelecimento de crédito que
opere no País há mais de cinco anos.
p) declaração, acompanhada de plantas elucidativas, sobre o número de veículos
que a garagem comporta e os locais destinados à guarda dos mesmos. (Alínea incluída
pela Lei nº 4.864, de 29.11.1965)

4 Patrimônio de afetação
Consiste na adoção de um patrimônio próprio para cada empreendimento.
Operacionalmente, terá a sua própria contabilidade, separada das operações da incorporada e
(ou) construtora, o que confere segurança aos adquirentes quanto à destinação dos recursos.
Tal acervo reveste-se de característica de um direito real da garantia da efetividade nas
incorporações imobiliárias e constituída em favor dos adquirentes.

Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime


da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem
como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio
do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da
incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos
adquirentes.(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 1o O patrimônio de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e
obrigações do patrimônio geral do incorporador ou de outros patrimônios de afetação
por ele constituídos e só responde por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação
respectiva.(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 2o O incorporador responde pelos prejuízos que causar ao patrimônio de afetação.
(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 3o Os bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação somente poderão ser
objeto de garantia real em operação de crédito cujo produto seja integralmente
destinado à consecução da edificação correspondente e à entrega das unidades
imobiliárias aos respectivos adquirentes. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 4o No caso de cessão, plena ou fiduciária, de direitos creditórios oriundos da
comercialização das unidades imobiliárias componentes da incorporação, o produto da
cessão também passará a integrar o patrimônio de afetação, observado o disposto no §
6o. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 5o As quotas de construção correspondentes a acessões vinculadas a frações
ideais serão pagas pelo incorporador até que a responsabilidade pela sua construção
tenha sido assumida por terceiros, nos termos da parte final do § 6 o do art. 35.(Incluído
pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 6o Os recursos financeiros integrantes do patrimônio de afetação serão utilizados
para pagamento ou reembolso das despesas inerentes à incorporação.(Incluído pela Lei
nº 10.931, de 2004)
§ 7o O reembolso do preço de aquisição do terreno somente poderá ser feito quando
da alienação das unidades autônomas, na proporção das respectivas frações ideais,
considerando-se tão-somente os valores efetivamente recebidos pela
alienação.(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 8o Excluem-se do patrimônio de afetação:(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
I - os recursos financeiros que excederem a importância necessária à conclusão da
obra (art. 44), considerando-se os valores a receber até sua conclusão e, bem assim, os
recursos necessários à quitação de financiamento para a construção, se houver; e
(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
II - o valor referente ao preço de alienação da fração ideal de terreno de cada
unidade vendida, no caso de incorporação em que a construção seja contratada sob o
regime por empreitada (art. 55) ou por administração (art. 58).(Incluído pela Lei nº
10.931, de 2004)
§ 9o No caso de conjuntos de edificações de que trata o art. 8o, poderão ser
constituídos patrimônios de afetação separados, tantos quantos forem os: (Incluído pela
Lei nº 10.931, de 2004)
I - subconjuntos de casas para as quais esteja prevista a mesma data de conclusão
(art. 8o, alínea "a"); e (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
II - edifícios de dois ou mais pavimentos (art. 8o , alínea "b").(Incluído pela Lei nº
10.931, de 2004)
§ 10. A constituição de patrimônios de afetação separados de que trata o § 9o deverá
estar declarada no memorial de incorporação.(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 11. Nas incorporações objeto de financiamento, a comercialização das unidades
deverá contar com a anuência da instituição financiadora ou deverá ser a ela
cientificada, conforme vier a ser estabelecido no contrato de financiamento.(Incluído
pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 12. A contratação de financiamento e constituição de garantias, inclusive
mediante transmissão, para o credor, da propriedade fiduciária sobre as unidades
imobiliárias integrantes da incorporação, bem como a cessão, plena ou fiduciária, de
direitos creditórios decorrentes da comercialização dessas unidades, não implicam a
transferência para o credor de nenhuma das obrigações ou responsabilidades do
cedente, do incorporador ou do construtor, permanecendo estes como únicos
responsáveis pelas obrigações e pelos deveres que lhes são imputáveis.(Incluído pela
Lei nº 10.931, de 2004)

5 Regime de construção
Existem dois regimes de construção para construir um prédio desses: i) administração
e ii) empreitada. Nesta última a construtora é contratada e entrega a obra pronta; na primeira,
a obra é conduzida pelos condôminos.
Art. 48. A construção de imóveis, objeto de incorporação nos moldes
previstos nesta Lei poderá ser contratada sob o regime de empreitada ou de
administração conforme adiante definidos e poderá estar incluída no contrato
com o incorporador (VETADO), ou ser contratada diretamente entre os
adquirentes e o construtor.

5.1 Empreitada

Art. 55. Nas incorporações em que a construção seja feita pelo regime de
empreitada, esta poderá ser a preço fixo, ou a preço reajustável por índices
préviamente determinados.
§ 1º Na empreitada a preço fixo, o preço da construção será irreajustável,
independentemente das variações que sofrer o custo efetivo das obras e
qualquer que sejam suas causas.
§ 2º Na empreitada a preço reajustável, o preço fixado no contrato será
reajustado na forma e nas épocas nêle expressamente previstas, em função da
variação dos índices adotados, também previstos obrigatóriamente no contrato.
§ 3º Nos contratos de construção por empreitada, a Comissão de
Representantes fiscalizará o andamento da obra e a obediência ao Projeto e às
especificações exercendo as demais obrigações inerentes à sua função
representativa dos contratantes e fiscalizadora da construção.
§ 4º Nos contratos de construção fixados sob regime de empreitada,
reajustável, a Comissão de Representantes fiscalizará, também, o cálculo do
reajustamento.
§ 5º No Contrato deverá ser mencionado o montante do orçamento
atualizado da obra, calculado de acôrdo com as normas do inciso III, do art. 53,
com base nos custos unitários referidos no art. 54, quando o preço estipulado
fôr inferior ao mesmo.
§ 6º Na forma de expressa referência, os contratos de empreitada
entendem-se como sendo a preço fixo.
Art. 56. Em tôda a publicidade ou propaganda escrita, destinada a promover
a venda de incorporação com construção pelo regime de empreitada
reajustável, em que conste preço, serão discriminados explìcitamente o preço
da fração ideal do terreno e o preço da construção, com indicação expressa da
reajustabilidade.
§ 1º As mesmas indicações deverão constar em todos os papéis utilizados
para a realização da incorporação, tais como cartas, propostas, escrituras,
contratos e documentos semelhantes.
§ 2º Esta exigência será dispensada nos anúncios "classificados" dos jornais.
Art. 57. Ao construtor que contratar, por empreitada a preço fixo, uma obra
de incorporação, aplicar-se-á, no que couber o disposto nos itens II, III, IV,
(Vetado) e VI, do art. 43.
5.2 Administração

Art. 58. Nas incorporações em que a construção fôr contratada pelo regime de
administração, também chamado "a preço de custo", será de responsabilidade
dos proprietários ou adquirentes o pagamento do custo integral de obra,
observadas as seguintes disposições:
I - tôdas as faturas, duplicatas, recibos e quaisquer documentos referentes
às transações ou aquisições para construção, serão emitidos em nome do
condomínio dos contratantes da construção;
II - tôdas as contribuições dos condôminos para qualquer fim relacionado
com a construção serão depositadas em contas abertas em nome do
condomínio dos contratantes em estabelecimentos bancários, as quais, serão
movimentadas pela forma que fôr fixada no contrato.
Art. 59. No regime de construção por administração, será obrigatório
constar do respectivo contrato o montante do orçamento do custo da obra,
elaborado com estrita observância dos critérios e normas referidos no inciso II,
do art. 53 e a data em que se iniciará efetivamente a obra.
§ 1º Nos contratos lavrados até o término das fundações, êste montante não
poderá ser inferior ao da estimativa atualizada, a que se refere o § 3º, do art. 54.
§ 2º Nos contratos celebrados após o término das fundações, êste montante
não poderá ser inferior à última revisão efetivada na forma do artigo seguinte.
§ 3º As transferências e sub-rogações do contrato, em qualquer fase da
obra, aplicar-se-á o disposto neste artigo.
Art. 60. As revisões da estimativa de custo da obra serão efetuadas, pelo
menos semestralmente, em comum entre a Comissão de Representantes e o
construtor. O contrato poderá estipular que, em função das necessidades da
obra sejam alteráveis os esquemas de contribuições quanto ao total, ao número,
ao valor e à distribuição no tempo das prestações.
Parágrafo único. Em caso de majoração de prestações, o nôvo esquema
deverá ser comunicado aos contratantes, com antecedência mínima de 45 dias
da data em que deverão ser efetuados os depósitos das primeiras prestações
alteradas.

Em toda construção ou incorporação de edifícios para oferta e venda ao público,


deverá ser constituída uma comissão de representantes dos adquirentes. 
 
 Estabelece o art.
3º da Lei que será designada no contrato de construção ou eleita em assembleia geral uma
Comissão de Representantes composta de três membros, pelo menos, escolhidos entre os
adquirentes, para representá-los perante o construtor ou incorporador, em tudo o que
interessar ao bom andamento da incorporação.
Art. 61. A Comissão de Representantes terá podêres para, em nome de todos os
contratantes e na forma prevista no contrato:
a) examinar os balancetes organizados pelos construtores, dos
recebimentos e despesas do condomínio dos contratantes, aprová-los ou
impugná-los, examinando a documentação respectiva;
b) fiscalizar concorrências relativas às compras dos materiais necessários à
obra ou aos serviços a ela pertinentes;
c) contratar, em nome do condomínio, com qualquer condômino,
modificações por êle solicitadas em sua respectiva unidade, a serem
administradas pelo construtor, desde que não prejudiquem unidade de outro
condômino e não estejam em desacôrdo com o parecer técnico do construtor;
d) fiscalizar a arrecadação das contribuições destinadas à construção;
e) exercer as demais obrigações inerentes a sua função representativa dos
contratantes e fiscalizadora da construção e praticar todos os atos necessários
ao funcionamento regular do condomínio.
Digamos que no regime de administração um dos condôminos não pague, prejudica a
construção. Nesse caso, a Comissão de Representantes é tão poderosa que pode constituir em
mora o inadimplente e passado o prazo para pagamento, tomar o apartamento e vender para
terceiros.
Art. 63. É lícito estipular no contrato, sem prejuízo de outras sanções, que a falta
de pagamento, por parte do adquirente ou contratante, de 3 prestações do
preço da construção, quer estabelecidas inicialmente, quer alteradas ou criadas
posteriormente, quando fôr o caso, depois de prévia notificação com o prazo de
10 dias para purgação da mora, implique na rescisão do contrato, conforme nêle
se fixar, ou que, na falta de pagamento, pelo débito respondem os direitos à
respectiva fração ideal de terreno e à parte construída adicionada, na forma
abaixo estabelecida, se outra forma não fixar o contrato.

DIREITOS AUTORAIS

1 Conceito
Direitos autorais são uma categoria que está dentro do gênero propriedade intelectual.
Dizem respeito às criações das pessoas, emanações dos espíritos, que por estarem impressas
em qualquer meio são protegidas pelo direito. “É o que tem o autor de obra literária, científica
e artística, de ligar o seu nome às produções do seu espírito e de reproduzi-las, ou transmiti-
las”. Um livro que você escreve, um motor que você inventa, um vegetal que você crie ou
pesquisa, tudo isso está protegido pela propriedade intelectual.
No sistema norte-americano, protege-se o direito de cópia. Nós seguimos a linha
francesa, protegendo a obra. O art. 7o da lei 9.610/98 diz que “São obras intelectuais
protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer
suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro” (art. 7o da LDA).
Exemplo: textos de obras literárias, artísticas ou científicas, conferencias, sermões, obras
gramáticas ou musicais, obras coreográficas, composições musicais, obras audiovisuais, obras
fotográficas e outras.
Para receber a proteção legal, a obra do espírito deve ser original e criativa, resultante
de uma certa modalidade de ideias, feita pessoalmente e objetivando a comunicação de uma
necessidade de ordem cultural (Rizzardo, 1991, v. 2, p. 768). A originalidade estará tanto na
visão, como na forma de apresentação específica da obra.

2 Histórico
A descoberta da imprensa e a facilidade de multiplicação dos escritos e obras de arte
tornaram possível a exploração industrial das produções do espírito e em consequência o
reconhecimento de um novo direito: o direito do autor.
A primeira lei que se tem conhecimento surge na Inglaterra, em 1709, conhecida como
“Statute of Anne”. Foi uma lei que protegia o direito dos autores, mas protegendo o direito à
cópia. Qualquer cópia de um livro poderia ser cobrada pelo autor e dependia da sua
autorização. Essa lei exige originalidade, criatividade, e fixação. É o sistema de copyright.
Na França do séc. XVI, a exploração de obras literárias era um privilégio concedido (e
revogado) pelo Rei. Um dia o rei autorizava alguém a poder vender uma obra, ganhar dinheiro
com ela. A mesma lógica quando Teixeira de Freitas escreveu a Consolidação das Leis Civis:
ganhou autorização do imperador para comercializá-la. Então era um privilégio legal, não um
direito subjetivo.
Somente em 1793 é que a Lei de 18 de julho foi editada na França e reconhece a
propriedade “dos direitos de escritores de todo o gênero, compositores de música, pintores e
desenhistas”. A proteção não era mais de direito de cópia e sim proteção à obra. Essa visão de
obra foi muito desenvolvida pelos alemães, que escreveram uma teoria de direito autoral em
cima da vertente francesa. Essa é a linha que seguimos, também protegemos no Brasil a obra.

No Brasil, a lei de 11.8.1827, criadora dos Cursos Jurídicos, estabeleceu o privilégio de


exploração exclusiva pelos professores, sobre seus compêndios, pelo prazo de 10 anos (art.
7o). Foi feita para incentivá-los a escreverem seus manuais. O Código Criminal de 1830 (art.
261) assegurou direitos autorias vitalícios a qualquer autor, extensíveis aos herdeiros por 10
anos. Então foi o primeiro direito subjetivo para todos os brasileiros. A CF de 1891 (art. 72, §
26) manteve tal direito, “pelo tempo que a lei dispusesse”; logo depois, a Lei 496, de 1 o.8.1898
estabeleceu o prazo de 50 anos de duração aos direitos do autor, contados de 1o. de jan. do
ano da publicação. O Código Civil de 1916, nos arts. 649-73, sob a designação de propriedade
literária, científica e artística, assegurou o gozo vitalício da obra ao autor e aos herdeiros por
mais de 60 anos, “a contar do dia de seu falecimento” (art. 649, § 2o). Após, surgiram diversos
atos, como: as Leis 4.790/24, 5.492/28, 4.944/66 e o Dec. 61.123/67. Essa legislação foi
substituída pela lei 5.988/73, primeira vez que tivemos uma lei de direitos autorais. Tal
legislação foi substituída pela lei atual de Direitos autorais.
A influência internacional faz-se sentir por meio da Convenção de Berna de 1886,
sucessivamente revista (em 1948, em 1971), da qual o Brasil tornou-se signatário pelo Dec.
34.954, de 10.1.1954; da Convenção Universal sobre Direitos do Autor, de Genebra, 1952; da
Convenção de Roma de 1961, sobre Proteção dos Artistas Intérpretes, Produtores de
Fonogramas e Organizações de Radiodifusão; do Tratado de Washington de 1989, sobre
Propriedade Intelectual em matéria de Circuitos Integrados.
Hoje vigora, a par do art. 5o, inc. 27-29 da CF, a Lei básica, n. 9.610, de 19 de fevereiro
de 1998, que revogou a de no 5.988, de 14.12.73. Diversos textos específicos contemplam
outras áreas, como: Lei 6533, de 26.5.78 (profissão de artista e técnico em espetáculos e
diversão); Lei 8.401 de 8.1.1992 (controle de autenticidade de cópias de obras audiovisuais
em videograma); Lei 9.456 de 25 de abril de 1997 (proteção de cultivares); Lei 9.609 de
19.02.98 (programa de computador), Lei 9.615 de 24.3.98 e D. 2574/98 (desporto).

3 Legislações
No art. 5o da Constituição a propriedade intelectual é protegida, mas a lei básica do
direito autoral é a 9.610/98. A Lei 9.609/98 diz respeito aos programas de computador, que
são protegidos como se fossem um livro. Basta que o cidadão tenha produzido um software
para ter direito autoral sobre ele. Se um empregado produzir um software na empresa, o
direito autoral é da empresa, não do empregado, a menos que no contrato de trabalho isso
fosse ressalvado. A lei 9.456/97 protege os cultivares.

4 Objeto
São as obras (“intelectuais”) consideradas criação do espírito, de qualquer modo
exteriorizadas, por exemplo, livros (mesmo que não tenham sido publicados)43, conferencias,
obras dramáticas, composições musicais, obras cinematográficas e fotográficas, desenhos,
pinturas, ilustrações, mapas, projetos de arquitetura, traduções, arranjos musicais, programas
de computador, coletâneas, antologias e assemelhados, desde que constituam, de alguma
forma, criação intelectual. O próprio nome de periódico (jornal) é protegido até um ano após o
último número, ou dois anos, se anual (art. 10, parágrafo único). A cópia de arte plástica goza
da mesma proteção do original (art. 9o).
Não o são: simples ideias, procedimentos normativos, esquemas, planos para realizar
atos mentais, jogos ou negócios; formulários, textos de leis e decisões judiciais; informações
de uso comum, como calendários; os nomes e títulos isolados; o aproveitamento industrial ou
comercial de alguma ideia da obra.

Vale destacar, aqui, a diferença entre propriedade industrial e direitos autorais, ambos
espécies do gênero propriedade intelectual. A primeira, prevista na lei 9.279/93, protege a
ideia e depende de registro. Santos Dummont inventou o avião. O registro é constitutivo. Se
não registrar, a ideia está no ar e qualquer um pode se apropriar. É uma ideia original, uma
invenção, cuja patente deve ser registrada. O registro é feito por uma autarquia chamada INPI
(Instituto Nacional de Propriedade Industrial), criada na década de 70.
Já os direitos autorais, diferente da propriedade industrial, gozam de proteção
automática, não precisam de registros. Protegem a dimensão estética, não a ideia. A ideia é
protegida apenas pela propriedade industrial. O direito autoral protege simplesmente pelo
fato de estar em um suporte tangível. O direito de autor é eterno, um trecho do Aristóteles
precisará ser citado eternamente, por mais que tenha caído em domínio público há muito
tempo.

5 Princípios
Os direitos autorais têm uma dimensão internacional desde o seu nascimento.
Descontando os passos iniciais, de 1709 e 1793 que foram internos naqueles países, desde
1883 e 1886 já tem uma dimensão internacional.

5.1 Princípios na órbita internacional


5.1.1 Princípio do tratamento nacional
Em todo e qualquer lugar do mundo qualquer obra é protegida automaticamente,
desde que seja externalizada. O tratamento dos nacionais é o mesmo de estrangeiros. A lei
aplicável é a do território onde se requer a proteção. Trata-se, portanto, da aplicação da lei
territorial de cada Estado para reger o exercício do direito de propriedade intelectual nos
respectivos territórios, quer seja o titular aí nacional ou estrangeiro.

5.1.2 Proteção da proteção Independente


O princípio da proteção independente igualmente ao princípio da proteção automática
está preconizado no Art. 5/2 da Convenção de Berna e prossegue o entendimento daquele
princípio. Se trata do trecho “esse gozo e esse exercício (dos direitos da Convenção)
independem da existência da proteção no país de origem das obras”.

43Não há necessidade de solicitar autorização para o biografado para escrever uma biografia.
A censura prévia viola o direito de liberdade de expressão. O que pode acontecer é, em não
concordando com o que foi escrito, o biografado exigir indenização judicial.
5.1.3 Princípio da proteção automática
O princípio da proteção automática está disposto na Convenção de Berna no Art. 5/2,
que preconiza: “O gozo e o exercício desses direitos não estão subordinados a qualquer
formalidade; este gozo e este exercício são independentes da existência de proteção no país
de origem da obra. Por conseguinte, afora as estipulações da presente convenção, a extensão
da proteção e os meios processuais garantidos ao autor para salvaguardar os seus direitos
regulam-se exclusivamente pela legislação do país onde a proteção é reclamada”.

5.2 Pelo TRIPS


O Acordo TRIPs (em inglês: Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual
Property Rights, em português: Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual
Relacionados ao Comércio) é um tratado Internacional assinado em 1994.

5.2.1 Princípio do tratamento nacional (reciprocidade)

5.2.2 Princípio da Nação Mais favorecida


O princípio da nação mais favorecida está previsto no Art. 4 do Acordo TRIPS que
preconiza: “Com relação à proteção da propriedade intelectual, toda vantagem,
favorecimento, privilégio ou imunidade que um Membro conceda aos nacionais de qualquer
outro país será outorgada imediata e incondicionalmente aos nacionais de todos os demais
Membros (...)”.

5.2.3 Compatibilidade da legislação interna


Cada Estado-membro devera incluir em seu ordenamento jurídico interno os padroes
mínimos de proteção garantidos pelo TRIPs.

5.2.4 Princípio da exaustão ou esgotamento nacional dos direitos


Está reservada no art. 6o do acordo a alçada interna de criação e extinção de direitos,
desde que não desrespeite o TRIPs. O Brasil pode criar regras mais rigorosas de direito
autoral, mas não pode afrouxar as normas que já existem no âmbito internacional.

5.2.5 Princípio da transparência


Qualquer regra ou decisão pertinente e do interesse dos signatários deve ser publicada
e traduzida para que qualquer usuário possa tomar conhecimento (INPI cuida disso quanto à
propriedade industrial e programas de computador). Se o Brasil promulgar uma lei sobre
direito autoral, é obrigado a traduzir para todas as línguas do mundo com os quais há tratado.
Então, se você é brasileiro, sabe as leis autorais da China, Madagascar, porque eles também
seguem a mesma orientação, então lá também traduzem para o português. Não há
necessidade de contratar um advogado chinês, pois é possível encontrar a tradução.

5.2.6 Cooperação técnica


Art. 67: “A fim de facilitar a aplicação do presente Acordo, os países desenvolvidos
Membros, a pedido, e em termos e condições mutuamente acordadas, prestarão cooperação
técnica e financeira aos países em desenvolvimento Membros e de menor desenvolvimento
relativo Membros. Essa cooperação incluirá́ ́ ássistênciá ná eláboráção de leis e regulámentos
sobre proteção e aplicação de normas de proteção dos direitos de propriedade intelectual, bem
como sobre a prevenção de seu abuso, e incluirá apoio ao estabelecimento e fortalecimento dos
escritórios e agências nacionais competentes nesses assuntos, inclusive na formação de pessoal”.
5.2.7 Interação entre os tratados internacionais sobre PI (art. 2o)
Art. 2o: “Nádá nás Pártes 1 á IV deste Acordo derrogárá ás obrigáções existentes que os
Membros possam ter entre si, em virtude da Convenção de Paris, da Convenção de Berna, da
Convenção de Roma e do Tratado sobre a Propriedade Intelectual em Matéria de Circuitos
Integrados”.

5.3 Princípios na órbita nacional


5.3.1 Especialidade da matéria (conteúdo próprio)
Direito de Autor apresenta conteúdo próprio, dotado de caracteres que o distinguem
em âmbito especial, cuja razão principal se encontra na defesa do criador intelectual. Daí a
regulamentação em leis especiais e a autonomia conceitual de que desfruta.

5.3.2 Protegibilidade da forma estética original (L. 5.805/72)


Protege-se a forma estética resultante do processo criativo, ou seja, o objeto
materializador da arte.

5.3.3 Exclusividade da exploração econômica


Garante-se o uso privativo da criação autoral a quem a idealizou. Trata-se da limitação
dos direitos patrimoniais de autor, que devem ficar concentrados nas mãos de quem detém a
autorização original ou secundária para realizar a sua exploração econômica. Nesse sentido,
institui-se a favor do criador monopólio para a utilização econômica, o que lhe possibilita
gozar das prerrogativas legais sobre sua propriedade, quais sejam, os direitos de autorizar o
uso e transmitir por sucessão os direitos sobre sua criação.
5.3.4 Limitabilidade no tempo
O direito de exploração econômica da obra autoral não é eterno. Trata-se de uma
prerrogativa individual com delimitação temporal de exercício, já que o aspecto patrimonial
dos direitos autorais se esvai depois de findos os prazos definidos na lei. Decorrido esse
período, a propriedade intelectual torna-se acessível a quaisquer interessados, de maneira
gratuita e permanente, já que a obra autoral cai no chamado domínio público, tornando-se
livre a sua utilização.

5.3.5 Restritividade da interpretação


Garantia legal da limitação interpretativa de negócios, acordos e demais atos jurídicos
relacionados ao Direito de Autor. O alcance dos contratos fica submetido aos respectivos
termos e às normas de ordem pública ditadas pela lei, prevalecendo em caso de dúvida o que
for mais favorável ao autor.

5.3.6 Tutelabilidade sob níveis distintos


O sistema de direito de autor permite o recurso a todos os níveis de proteção
existentes no sistema jurídico – seja nas esferas administrativa, cível ou penal – sem perder de
vista a especificidade de sua aplicação.

5.3.7 Facultatividade do registro


Diferentemente do que ocorre com as marcas e patentes cujo registro é
constitutivo de direito, e o certificado equivalente a uma escritura, matriculada de
propriedade (se válida), o registro de obra intelectual é meramente facultativo,
voluntário, mas pode servir como prova de anterioridade em relação à obra idêntica
publicada por terceiros sem autorização.
É facultado ao autor registrar sua obra no órgão público referido no art. 17 da lei 5.988
de 14.12.1973, mantido pelo art. 19 da lei atual. Conforme a natureza, o registro da obra será
feito: na Biblioteca Nacional, na Escola de Música, na Escola de Belas Artes da Universidade do
Rio de Janeiro, no Instituto Nacional do Cinema, ou no Conselho Federal de Engenharia,
Arquitetura e Agronomia. O legislador preferiu não unificar os registros.

5.3.8 Irrenunciabilidade do Direito Moral


São DIREITOS MORAIS do autor: O de reivindicar, a qualquer tempo, a
paternidade da obra; o ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou
anunciado na obra como sendo o autor, na utilização de sua obra; o de conservá-la
inédita; o de assegurar-lhe a integridade, opondo-se a quaisquer modificações, ou à
prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la, ou atingi-lo, como autor,
em sua reputação e honra; o de modificá-la, antes ou depois de circulação, ou de lhe
suspender qualquer forma de utilização já autorizada. Vale salientar que os direitos
morais são INALIENÁVEIS e IRRENUNCIÁVEIS.
São DIREITOS PATRIMONIAIS do autor: os que se referem ao uso econômico da
obra. Podem ser objeto de transferência, cessão, venda, distribuição, etc. Depende,
portanto de autorização do autor da obra intelectual qualquer forma de uso como a
edição, a tradução para qualquer idioma, a adaptação ou inclusão em fonograma ou
película cinematográfica, a comunicação ao público, direta ou indireta, por qualquer
forma ou processo.

5.3.9 Independência das modalidades de reprodução entre si


Art. 31/Lei 9.610/98: “As diversas modalidades de utilização de obras literárias,
artísticas ou cientificas ou de fonogramas são independentes entre si, e a autorização
concedida pelo autor, ou pelo produtor, respectivamente, não se estende a quaisquer das
demais”.

6 Aspectos da lei 9.610/98


A LDA estabelece que o autor pode identificar-se como tal através do nome ou
abreviatura, ou pseudônimo, ou ainda, por qualquer sinal convencional (art. 12). A autoria
prova-se por qualquer meio de prova e inclusive o registro, que não é obrigatório e tem
validade “juris tantum”(art. 18). Autor é aquele que indica ou anuncia tal qualidade, na
utilização da obra (art. 13). Também o é quem adapta ou traduz obra caída em domínio
público (art. 14).

6.1 Direitos morais e patrimoniais do autor


6.1.1 Autor:
A pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica, mas a proteção também
é concedida a pessoa jurídica “nos casos previstos” (art. 11). É autor o coautor, assim como
quem adapta, traduz ou arranja, cria desenhos, faz argumento literário ou musical e o diretor.
Considera-se autor aquele que, identificado (...), indica ou anuncia tal qualidade, em
conformidade com o uso.
Até prova em contrário (art. 13). Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais
sobre a obra (22).

6.1.2 Direitos morais:


Direito à reivindicação da paternidade da obra; de ter seu nome associado à obra em
qualquer utilização; de conservá-la inédita; à integridade da obra (v. art. 35); direito de
modificá-la quando o desejar; de retirá-la de circulação; de ter acesso a exemplar único e raro.
Os quatro 1os transmitem-se aos sucessores. A modificação e a retirada ressalvam
indenização a terceiros. A obra caída em domínio público fica sob proteção do Estado. No caso
do audiovisual, a proteção dos direitos morais cabe, exclusivamente, ao diretor.
Os direitos morais são inalienáveis e irrenunciáveis.

6.1.3 Direitos patrimoniais e sua duração (art. 28-45):


É direito exclusivo do autor utilizar, fruir e dispor da obra. Dependem de sua prévia e
expressa autorização quaisquer utilizações, como: edição, tradução, adaptação a fonograma
ou película, distribuição (inclusive para oferta mediante cabo fibra ótica, satélite), utilização
por representação, recitação ou declamação, execução musical, por alto-falante; radiodifusão,
sonorização ambiental, exibição audiovisual e cinematográfica, emprego de satélites, sistemas
óticos e de fios, exposição de obras de artes plásticas e figurativas, inclusão em base de dados,
microfilmagem, etc.
O titular da reprodução pode fazê-lo como quiser, a título oneroso ou gratuito (art. 30).
Às vezes é temporária (parágrafo 1o). Em qualquer modalidade de reprodução a quantidade
de exemplares será informada (parágrafo 2o). As modalidades de utilização são
independentes entre si (art. 31).
A obra em coautoria que não for divisível: depende do consentimento de todos os
autores, sob pena de perdas e danos; se houver divergência, os coautores decidirão por
maioria, mas o dissidente pode ser afastado das despesas e do lucro, assim como pode vetar o
seu nome na publicação. Mas cada coautor pode registrar e defender os seus próprios direitos
contra terceiros (art. 32).
Ninguém pode reproduzir obra alheia (não caída em domínio público) a pretexto de
comentá-la, sem autorização do autor; mas pode publicar comentários à parte (art. 33).
Se o autor tiver dado versão definitiva, os sucessores não podem reproduzir as
anteriores (art. 35).
Os escrito não assinados, publicados pela imprensa, pertencem ao editor, salvo
convenção em contrário. A autorização para publicação em diários e periódicos e sua
utilização econômica estende-se por 20 dias.
A aquisição do original não transfere os direitos patrimoniais do autor, salvo
convenção ou dispositivo legal (art. 37).
O art. 38 assegura o direito de sequência, de 5% sobre o aumento de cada revenda.
Este direito é irrenunciável. O vendedor (leiloeiro em certos casos) é considerado depositário
da quantia.
Os direitos patrimoniais do autor, excetuados os rendimentos decorrentes de sua
exploração econômica, não se comunicam salvo pacto antenupcial (art. 39).
O direito patrimonial de obra anônima cabe a quem a publica, salvo identificação (art.
40).

Esses direitos duram por toda a vida do autor. Os sucessores do autor gozarão dos
direitos patrimoniais, que se lhes transmitirem, pelo período de 70 anos, a contar de 1o de
janeiro do ano subsequente ao falecimento do autor, obedecida a ordem sucessória (art. 41).
Na obra produzida em coautoria e indivisível, o direito daquele que falece sem herdeiro
acrescer-se-á ao dos sobreviventes e o prazo de 70 anos flui da morte do último (art. 42 e
parágrafo único).

6.1.4 Domínio público:


Decorrido o prazo de proteção dos direitos patrimoniais, a obra cai no domínio
público; acontecerá o mesmo, e de imediato, se o autor não deixa herdeiros; assim como a
obra de autor desconhecido, salvo proteção legal aos conhecimentos étnicos e tradicionais
(art. 45).

6.2 Direitos conexos:


O que são? Estendem-se aos artistas, intérpretes e executantes, produtores
fonográficos e empresas de radiodifusão os mesmos direitos concedidos ao autor (art. 89).
Chama-se também direitos afins ou análogos. A propósito a lei 6.533, de 26.5.78, dispõe sobre
a regulamentação das profissões de artistas e técnicas em espetáculos de diversão.
O artista intérprete ou executante pode autorizar ou proibir a fixação, a reprodução, a
radiodifusão e qualquer modalidade de utilização de seu trabalho. Se for coletivo, os direitos
serão exercidos pelo direito do conjunto (art. 90, parágrafo 1o). O parágrafo 2o protege o
direito do dublador. O inciso IV do art. 93 foi vetado: os produtores de fonogramas
pretendiam incorporar, também, os direitos patrimoniais do art. 29, o que foi considerado um
exagero. O art. 94 harmoniza-nos com os países do Mercosul: o produtor fonográfico percebe
dos usuários (art. 68) e reparte com os artistas, na forma convencionada.

A duração de direitos conexos é de 70 anos, a partir de 1o de janeiro de sua realização


(art. 96).

6.2.1 Associação de titulares de direitos autorais


Para o exercício e defesa dos seus direitos, os titulares de direitos autorais, podem
associar-se, sem intuito de lucro, art. 97. É livre o direito de associar-se e de permanecer
associado (CF, art. 5o, XVII a XX), não prevalecendo o sistema anterior, do ECAD (extinto pelo
Decreto 99.180, de 15.3.1980). As associações manterão um escritório central de arrecadação
e distribuição (art. 99). O titular de direitos autorais pode praticar, pessoalmente, os atos de
sua defesa, mediante comunicação prévia à associação, de que deseja fazê-lo (art. 98,
parágrafo único). A tutela dos direitos, portanto, deixou de ser da alçada pública (à exceção
dos direitos morais da obra caída em domínio público, a teor do art. 24, parágrafo 2o da LDA).

6.3 Limitações do direito do autor:


Não constitui ofensa ao DA: I – a reprodução a) de notícia ou artigo informativo na
imprensa (com fonte); b) de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer
natureza (exemplo: Milton Santos recebe título e discursa na ocasião); c) de retrato ou
imagem feita sob encomenda, desde que pelo proprietário e sem oposição do representado ou
herdeiros: ex., quadro a óleo de Jorge Lacerda, encomendado pelo IHGSC; d) de obras para uso
exclusivo de deficientes visuais desde que em braile e sem fins comerciais; II – a reprodução,
em um só exemplar, de pequenos trechos para utilização privada do copista e sem intuito de
lucro; III – a citação para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim
a atingir e com as indicações necessárias; IV – o apanhado de lições de aula pelos discentes,
vedada a publicação sem autorização prévia; V – a utilização (em lojas) para demonstração à
clientela, de obras, fonogramas, transmissões, exclusivamente para demonstração à clientela
desde que comercialize os suportes ou equipamentos; VI – a representação teatral, musical,
no recesso familiar ou de ensino, sem intuito de lucro; VII – a utilização como prova
judiciária ou administrativa; VIII – a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos
de obra preexistente, de qualquer natureza, ou integral (quando de artes plásticas), sempre
que a reprodução não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a
exploração normal da obra reproduzida. Ex: reprodução de um desenho em obra que trata do
artista em enciclopédia; quadro na parede, em cenário de novela; personagem canta trecho de
música da época, em fonograma.
São livres as paródias e paráfrases, que não forem repetição da obra ou causarem o seu
descrédito.
Obras em logradouros públicos podem ser livremente reproduzidas. Ex: estátuas de
Aleijadinho nas igrejas, obra de Rodrigo de Haro na Reitoria da UFSC (art. 48).

6.4 Tutela
A violação dos direitos autorias é punida com a) sanções civis (art. 102-110) e b)
penais, arts. 184-186 e 189 do Código Penal.
As ações civis implicam apreensão dos exemplares, suspensão da divulgação e
indenização cabal (art. 102), quem edita sem autorização “do titular” perde os exemplares que
se apreenderem e pega o preço dos que tiver vendido (prefixados em 3000, se desconhecido o
número – art. 103). Quem distribui ou vende é solidariamente responsável (art. 104). A
transmissão ilícita deve ser imediatamente suspensa pelo juiz, com multa diária para o
descumprimento, com rigor maior para o reincidente (art. 105). Perda ou destruição do
equipamento utilizado, mediante sentença (art. 106). O art 107, além da perda de
equipamento e observado o valor mínimo do art. 103, pune com perdas e danos diversas
práticas: quem altera dispositivos de proteção contra pirataria, sonega informação sobre
gestão de direitos, distribui, importa ou utiliza obras que sabe alteras. Quem, na utilização,
deixa de fazer as indicações, responde por danos morais e é obrigado a fazer as publicações de
desagravo, previstas no art. 108. A execução pública feita em desacordo com a lei sujeita a
multa a 20 vezes o valor que deveria ser originariamente pago, sendo os proprietários
diretores, gerentes, empresários, etc., solidariamente responsáveis com os organizadores do
espetáculo (art. 110-111).
O Código Penal, no art. 184, pune o plágio.
Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos: (Redação dada pela
Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. (Redação dada pela
Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)
§ 1o Se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto
ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação,
execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou
executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente: (Redação
dada pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. (Redação dada pela Lei
nº 10.695, de 1º.7.2003)
§ 2o Na mesma pena do § 1o incorre quem, com o intuito de lucro direto ou indireto,
distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em
depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com
violação do direito de autor, do direito de artista intérprete ou executante ou do
direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de obra
intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de
quem os represente. (Redação dada pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)
§ 3o Se a violação consistir no oferecimento ao público, mediante cabo, fibra ótica,
satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da
obra ou produção para recebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por
quem formula a demanda, com intuito de lucro, direto ou indireto, sem autorização
expressa, conforme o caso, do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor
de fonograma, ou de quem os represente: (Redação dada pela Lei nº 10.695, de
1º.7.2003)
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº
10.695, de 1º.7.2003)
§ 4o O disposto nos §§ 1o, 2o e 3o não se aplica quando se tratar de exceção ou
limitação ao direito de autor ou os que lhe são conexos, em conformidade com o
previsto na Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, nem a cópia de obra intelectual
ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado do copista, sem intuito de lucro
direto ou indireto. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)
Há ainda os órgãos que tutelam, como o ECAD. O Ecad (Escritório Central de
Arrecadação e Distribuição) é uma instituição privada, sem fins lucrativos, instituída pela lei
5.988/73 e mantida pelas leis federais 9.610/98 e 12.853/13. Seu principal objetivo é
centralizar a arrecadação e distribuição dos direitos autorais de execução pública musical. Na
época do Collor houve essa mudança e o ECAD foi privatizado. Antes havia o Conselho
Nacional de Proteção ao Direito autoral, que foi desmanchado, e o ECAD foi privatizado. A
partir de então arrecada com cada vez maior eficácia e distribui com maior dificuldade.
O autor pode se defender; quando morre, os seus sucessores. Se cai em domínio
público, o Ministério Público. Entretanto, o autor também pode se filiar a uma associação
nacional ou internacional para cobrar seus direitos autorais. É importante frisar que, no
momento em que o titular de música se filia a uma associação, ele a torna sua mandatária para
a prática de todos os atos necessários à defesa de seus direitos autorais. Consequentemente, o
Ecad, por ser o escritório central criado pelas associações para este fim, se torna o
representante dos titulares para efetuar a cobrança e a distribuição dos direitos autorais.
Sendo assim, é importante esclarecer que o Ecad só representa os titulares filiados a uma das
associações que o administram. O Ecad conta com fiscais que passam em bailes, padarias,
motéis, hotéis, qualquer estabelecimento que toca música para cobrar os direitos autorais.

6.5 Transferência dos direitos do autor:


Pode ser total ou parcial, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou outro,
obedecidas as seguintes limitações: a transmissão total exclui os direitos de natureza moral e
aqueles expressamente excluídos por lei (v.g. o direito de sequência); transmissão total e
definitiva, somente pode ser feita por cláusula contratual escrita; só vale para o País, salvo
estipulação expressa; valerá para as modalidades de exploração então; não havendo
especificação sobre a modalidade de exploração, interpreta-se restritivamente o contrato
(apenas aquela indispensável ao cumprimento da finalidade da avença).
A cessão total ou parcial de DA é sempre por escrito e presume-se onerosa (art. 50). A
cessão pode ser averbada à margem do registro (art. 19) ou registrada em cartório de Títulos
e Documentos. O instrumento de cessão terá como elementos essenciais: objeto e condições
para o exercício do direito quanto a tempo, lugar e preço. A cessão de obras futuras é de 5
anos, reduzido o preço em proporção quando estipulado por tempo superior (art. 51).

6.6 Utilização de obras intelectuais e fonogramas


6.6.1 Contrato de edição: É aquele em que o editor se obriga a reproduzir e a divulgar a obra,
podendo publicá-la e explorá-la em caráter exlusivo (art. 53). Cada exemplar mencionaria:
título, autor, tradutor (e título original), ano, nome ou marca do editor. No silêncio do contrato
presume-se que é por uma edição, que serão 3.000 exemplares (art 56).
O preço do contrato se não estipulado terá por base os usos e costumes; o dos
exemplares, compete ao editor e não embaraçará a circulação (art. 57 e 60).
Obs: do art. 59 a 67 a lei dispõe sobre a execução do contrato: acesso a escrituração,
prestação de contas, esgotamento de edições, saldo de estoque, alterações e emendas,
atualizações, inadimplemento do editor, etc.
As obras de encomenda (art. 54 e também, CC art. 1347): se o autor falecer ou ficar
impedido, o contrato poderá ser rescindido, ainda que já entregue parte considerável; pode
ser publicada parte, com redução de preço; pode ser contratado outro autor para terminá-la,
se consentirem os sucessores ou o próprio autor não tiver se manifestado em sentido
contrário à publicação em parte.

6.6.2 Comunicação ao público:


Representações (teatro) e execuções públicas (música e fonogramas) dependem de
expressa autorização do autor ou titular (art. 68). A súmula 63 do STJ, a propósito, é clara:
“são devidos direitos autorais pela retransmissão radiofônica de músicas em
estabelecimentos comerciais”.
Antes (parágrafo 4o) ou depois (parágrafo 5o), o empresário comprovará o
recolhimento dos direitos autorais ao escritório central (art. 99), com relação completa dos
autores, artistas e produtores beneficiados (parágrafo 6o)”. As empresas cinematográficas e
de radiodifusão também manterão à disposição os documentos pertinentes à autorização e
remuneração dos direitos autorais (parágrafo 7o).
O autor tem direito de interferir e fiscalizar a representação ou execução da sua obra
(art. 70).

6.6.3 Utilização de obra de arte plástica:


Salvo disposição em contrário, a alienação do seu objeto transmite o direito de expor,
mas não o direito de reproduzi-la. Tal autorização deve ser feita por escrito e se presume
onerosa (art. 77 e 78).

6.6.4 Obra fotográfica:


Seu autor tem direito a reproduzi-la e coloca-la à venda observando restrições quanto
a retratos, e os direitos do autor, se o objeto for obra de artes plásticas protegidas. Tem direito
a indicação de seu nome, sempre que reproduzida por terceiro, vedada qualquer modificação
do original, sem autorização (art. 79).

6.6.5 Fonograma:
Nos cassetes, discos, videofonogramas e assemelhados, o produtor mencionará: título
da obra, autor, nome ou pseudônimo do intérprete, ano, além do nome ou marca que
identifique a ele, produtor.

6.6.6 Obra audiovisual:


A autorização para produção científica ou artística implica, salvo disposição expressa
em contrário, licença para utilização econômica. A exclusividade constante de clausula, cessa
em dez anos (sem prejuízo da continuidade da exibição).
O art. 82 traz uma série de requisitos do contrato de produção de audiovisual
tutelando os direitos dos envolvidos na obra coletiva. Salvo disposição contrária, os coautores
podem utilizar-se à parte, economicamente, da sua contribuição pessoal (art. 85). Os
responsáveis por locais, estabelecimentos ou emissoras serão responsáveis por direitos
autorais de execução de audiovisuais (art. 86).

6.6.7 Utilização de bases de dados: o direito patrimonial será exclusivo e sua utilização
dependerá de autorização, assim como tradução, adaptação, distribuição (no original ou em
cópias), ou comunicação (art. 87).

6.6.8 Utilização da obra coletiva:


O organizador tem obrigação de mencionar, entre outros requisitos, a relação de todos
os participantes. O coautor que for contrário à inclusão da sua participação deverá notificar
por escrito (art. 88).
COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA

1 Conceito
Inicialmente é preciso diferenciar a mera promessa de contratar, que se destina
apenas a criar a obrigação de um futuro contrair, que comumente prevê a hipótese de
arrependimento e a sua solução por meio da fixação de perdas e danos; do compromisso de
compra e venda, que é a possibilidade, prevista em lei, de se substituir o contrato definitivo
por uma sentença constitutiva, e pela atribuição, ao promitente comprador, de um direito real
sobre o bem que se comprometeu a comprar (o direito do promitente comprador é previsto
como direito real no art. 1.225 do Código Civil), que acarreta na paralisação do poder de
disposição do bem, que é um direito elementar do proprietário.

Segundo Orlando Gomes, o compromisso de venda não é verdadeiramente um contrato


preliminar. “Não é por diversas razões que completam a originalidade do seu escopo,
principalmente a natureza do direito que confere ao compromissário. Tem ele, realmente, o
singular direito de se tornar proprietário do bem que lhe foi prometido irretratavelmente à
venda, sem que seja inevitável nova declaração de vontade do compromitente. Bastará pedir
ao juiz a adjudicação compulsória, tendo completado o pagamento do preço. Assim sendo,
está excluída a possibilidade de ser o compromisso de venda um contrato preliminar, porque
só é possível adjudicação compulsória nas obrigações de dar, e, como todos sabem, o contrato
preliminar ou promessa de contratar gera uma obrigação de fazer, a de celebrar o contrato
definitivo”.
O compromisso é irretratável no sentido de que a recusa de lhe dar execução não
impede que o seu fim último seja alcançado através de ação peculiar, denominada adjudicação
compulsória, hoje admitida até para os compromissos que não foram levados a registro (feitos
por contrato particular). A lei atribui ao registro o efeito de emprestar ao direito do
compromissário a natureza de um direito real para lhe assegurar eficácia erga omnes, mas, a
rigor, é um direito pessoal que, por esse registro, se torna oponível a qualquer direito de
aquisição sobre o imóvel, posteriormente titulado. Levando-o ao registro de imóveis, torna-se
impossível a alienação do imóvel a terceiro.
A irretratabilidade da promessa e sua eficácia real não impedem a rescisão do contrato
por inexecução, nem a sua dissolução por mútuo consentimento. Se quem deve pagar as
prestações do preço se atrasa, a outra parte tem direito a rescindir o contrato, ainda que a
mora do devedor só se verifique após a interpelação. Rescindido o contrato, cancela-se a
anotação preventiva.

Loteado é a situação do lote enquanto não tem matrícula própria, está dentro da
barriga da mãe. Enquanto o lote está sendo pago e ainda não obteve matrícula, está dentro do
regime de loteado. Isso vale para desmembramento e incorporação também, não só para
loteamento. No dia em que se termina de pagar o lote e é transferida a propriedade em
definitivo, obtendo no registro matrícula própria, a partir daí, quando vendido para outra
pessoa, será vendido não loteado. A primeira situação é bem menos segura que a segunda.
2 Histórico
Quando começaram a pipocar os loteamentos no Brasil com o crescimento das cidades,
surgiram muitos loteamentos irregulares, pois não havia uma diretriz nacional. O Código Civil
de 1916 não tinha uma figura contratual para garantir a aquisição do lote. Então, o Código
previa um contrato preliminar, um pré-contrato que pressupunha uma renovação de
consentimento para o contrato definitivo. O contratante não era obrigado a fazer o segundo.
Poderia mudar de ideia, arrepender-se, pagar o que estava acordado na cláusula ou previsto
em lei e ir embora.
Disso advinham muitos problemas. O primeiro era o loteamento irregular: os sujeitos
chegam, cercam o terreno e começam a vender lotes e os incautos, precisando de moradia,
compram. Pensemos que o loteador vendia um lote a R$ 500,00 perto de São Nunca. Acontece
que a área começa a urbanizar-se e o lote, vendido em 36 prestações, valoriza-se. Então o
vendedor, ao receber o final das parcelas, não escriturava o terreno porque o lote valia muito
mais.
Outra coisa que poderia acontecer é que o vendedor vende em parcelas para um e
depois à vista para outro, aí chega o novo dono com a escritura e o comprador das parcelas
fica a ver navios.
Acontecia, ainda, de haver uma cláusula dizendo que se atrasasse um dia perderia a
compra. Não havia segurança nenhuma no código anterior. Não havia como assegurar o
promissário de que obteria a escritura definitiva.
Esse assunto começou a incomodar: a falta de um contrato típico previsto em lei para
resolver esse problema prejudicava muitos adquirentes. Era um problema muito sério. Para
resolvê-lo, encomendou-se de Valdemar Ferreira, um deputado jurista, que visitou o Uruguai
e conheceu uma lei de compra e venda de imóveis a plazo, o projeto de uma lei que previsse
esse tipo de contrato. O projeto, contudo, não foi adiante, pois Getúlio Vargas instaurou o
golpe. Como o clamor era muito grande, Vargas avocou para si o projeto e emanou o Decreto-
Lei 58/37.
O que essa lei fez em relação ao contrato foi, em primeiro lugar, criação de um contrato
especial, típico, que não era apenas um contrato preliminar, mas era já o contrato da venda.
Assim, o consentimento e a venda propriamente estão no Contrato de Compromisso de
Compra e Venda. Por mais que o lote ainda esteja na “barriga da mãe”, sem a matrícula, ele já é
definitivo e aguarda-se meramente a escritura pública para executar o que fora acordado. O
Compromisso não é um contratinho qualquer.
Esse decreto-lei também criou uma nova ação, chamada Ação de Adjudicação
Compulsória. Se firmado o compromisso de compra e venda e depois negada a escritura, o
promissário comprador, se efetuou todos os pagamentos, pode entrar com esta ação. O juiz
por sentença então determina a transferência do imóvel.
Outa coisa que o Decreto criou foi um direito real, o direito real de aquisição. É possível
levar o contrato ao registro de imóveis e registrá-lo previamente, não para se tornar dono,
mas para impedir o proprietário de dispor do imóvel. É para garantir a propriedade, pois no
dia em que acabar de pagar pode fazer a escritura. Alguns autores, como Orlando Gomes –
com o qual o professor concorda – acreditam que não é propriamente a criação de um direito
real, mas apenas uma medida de eficácia que assegura ao adquirente a transmissão efetiva do
bem uma vez pagas as prestações.
Outra coisa que esse decreto fez foi fixar a cláusula penal, que hoje é de 2%.
Definiu, ainda, que não bastava o inadimplemento para o cara perder o contrato, mas é
necessário constituir em mora. Se o cara não pagou 5 prestações, não perde automaticamente
o contrato. É necessário que seja constituído em mora pelo vendedor. Caso efetivamente
perca o direito de comprar o imóvel, tem direito a ser restituído pelas parcelas que já foram
pagas. Antes não recebia nada de volta.
Essa legislação bonita, como foi frustrada? Não se era obrigado a registrar o contrato
de compra e venda. A jurisprudência então disse que só haveria a possibilidade de requerer a
escritura se o contrato de compra e venda fosse registrado, caso contrário o vendedor só seria
obrigado a dar a escritura se quisesse. Isso só foi resolvido pelo STJ com a Constituição de
1988. Desde a década de 30 até essa data, a jurisprudência foi dura para o consumidor.

3. Evolução da Legislação
A primeira mudança veio pelo CPC de 1939, que alterou o art. 16 do Decreto-Lei 58/37,
alterando a ação de Adjudicação Compulsória e permitindo a execução de uma obrigação de
fazer.
Alguns anos depois, diante a alegação dos vendedores de que a Lei tratava de
compromisso de compra e venda de imóveis a prazo e que, portanto, caso o imóvel fosse pago
à vista não caberia aplicar a legislação, foi baixada a lei n. 649/1949. Essa lei tomou duas
providências: i) incluiu os imóveis pagos à vista. Foi uma resposta à alegação de que aquela
Lei tratava de compromisso de compra e venda de imóveis a prazo e que se fossem pagos à
vista os imóveis, não caberia aplicar a legislação44. Era um argumento ruim, pois se a lei foi
feita para proteger o comprador; se ele pagou à vista, tem mais razão para ser protegido. e ii)
criou a figura dos imóveis não loteados. O imóvel não loteado tem até uma altura a proteção
da mesma legislação, mas não tout court, pois como já conta com matrícula, não precisa das
mesmas medidas de segurança e proteção dos imóveis loteados que ainda aguardam o seu
número de matrícula.
O Estatuto da Terra (Lei 4.505/64) também trouxe uma série de alterações. Depois o
decreto-lei 271/67 diferencia loteamento de desmembramento; institui a concessão do
direito real de uso; introduz o direito real de superfície e impacta o compromisso de compra e
venda também.
O Decreto-Lei n. 745/69 vem resolver uma dúvida que existia quanto à interpelação.
Questionava-se se nos casos dos não loteados seria possível constituir em mora sem a
interpelação. Nos loteados sabia-se já que era necessária com o prazo de 30 dias para
realização do pagamento, sob pena de resolução do contrato. A partir de então passa a ser
necessária a interpelação para os não loteados também, mas o prazo será de 15 dias para
colocar em mora.
Depois veio o CPC de 1973, um código muito formalista. No art. 1218 era estabelecido
o rito sumaríssimo para a Adjudicação Compulsória, depois passou a sumário. Deixou clara a
obrigação de fazer nos art. 640, 641.
Depois a lei 6015/73, a Lei de Registros Públicos, que trouxe uma série de alterações,

44O próprio Decreto-Lei n. 58/37 tem como título: “Dispõe sobre o loteamento e a venda de terrenos para
pagamento em prestações”.
mas que hoje estão incorporadas na lei atual de parcelamento do solo. Por exemplo, começou
a chamar Contrato de Compromisso ou Contrato de Promessa de Compra e Venda em alguns
dispositivos. Variou um pouco a nomenclatura e tratou também do Registro de Loteamentos
Urbanos e Rurais.
Finalmente veio a Lei 6766/79, que modificou o Decreto-Lei no pertinente aos Imóveis
Urbanos. Essa Lei trata do Contrato de Compromisso de Compra e Venda no parcelamento dos
imóveis urbanos. E os imóveis rurais, o parcelamento e o contrato, ainda continuam sob o
Decreto-Lei 58/37. Mas, de qualquer forma não há que se preocupar com isso porque na
verdade o parcelamento de solo rural hoje é uma coisa muito rara.
Posteriormente, em 1990, a lei 8078, o código de defesa do consumidor, imprimiu o
regime de ordem pública e social para o compromisso de compra e venda, fixou a multa de
2% e nulificou a perda das prestações. As prestações não são perdidas, mas tem
responsabilidade com as multas e com outras despesas, juros, mas o saldo te é devolvido.
Posteriormente veio outra lei, 9.785/89, e alterou a lei 6.766/79 em diversos aspectos.
A principal mudança foi na adjudicação compulsória (prevista no art. 26, parágrafo 6o da lei
de 79), permitindo que fosse possível inaugurar a matrícula dos loteados depois de pagas
todas as prestações e apresentado o compromisso de compra e venda no Registro de Imóveis.
O compromisso vale como escritura, pois ele é um contrato padrão, no qual são vendidos
todos os lotes. Então, quando você compra apartamento de prédio, ou lote, você está em um
regime jurídico especial. O banco, se aceitar do loteador a hipoteca do lote ou de
apartamentos, ele sabe que pode estar lesando ou o promissário comprador do lote, ou o
apartamento. Se o apartamento for comprado e depois ou mesmo antes tiver sido hipotecado,
o STJ não aceita essa hipoteca. Vale para os dois, mas não contra o coitadinho que comprou o
apartamento enganado, pois é claro que o banco, antes de aceitar a hipoteca, tem que ver se
alguma pessoa tem contrato particular que não registrou. O banco e todo mundo sabe que
loteamento é um negócio diferente. Incorporação também é diferente. Por isso não se pode
colocar uma hipoteca sem considerar a situação de fato. Muito justa a jurisprudência,
portanto, nessa súmula. Agora, se eu vendi esse lote para o meu vizinho e ele me pagou, mas
não quer registrar, eu entro com adjudicação compulsória. Ela é para os não loteados. Muitas
vezes, na jurisprudência, uma decisão as vezes do tribunal superior mesmo, não faz distinção
entre loteado e não loteado. Isso porque a legislação especial e toda essa pesada e lenta
evolução, às vezes são desconsideradas. É necessário saber disso, às vezes é vital para a causa.
Depois o Código Civil de 2002 estabeleceu dois artigos (1417 e 1418) tratando de uma
coisa chamada direito do promitente comprador. E ai nesses dois artigos ele ignora toda a
legislação especial. E diz que é possível nesse compromisso de compra e venda o
arrependimento. Ai resolve assim: o código civil é direito comum e aquela legislação é
especial, por isso prevalece.
A Lei Minha Casa Minha Vida 11.977/9 trata dos parcelamentos urbanos, rurais,
interesse social e especifico. Essa legislação hoje permite, para pessoa de baixa renda, a
titulação não por compromisso de compra e venda, mas por usucapião extrajudicial. São dois
sistemas já completamente diferentes. O compromisso de compra e venda sendo substituído,
desautorizado, para determinado tipo de titulação, que o faz por usucapião.

4. Evolução da jurisprudência
O STJ fixou algumas súmulas.

Súmula 239 do STJ. O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao


registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.
Você compra um lote, seja como loteado ou não loteado, você não precisa registrar no
registro de imóveis para ter qualquer direito. O simples documento particular já dá todo
direito.

Súmula 76. A falta de registro do compromisso de compra e venda de imóvel


não dispensa a prévia interpelação para constituir em mora o devedor.
Seja o compromisso registrado ou aquele feito mediante instrumento particular, em
ambas as situações é necessário que o credor interpele o devedor antes de constituí-lo em
mora.
SÚMULA 84 do STJ - E ADMISSIVEL A OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO
FUNDADOS EM ALEGAÇÃO DE POSSE ADVINDA DO COMPROMISSO DE
COMPRA E VENDA DE IMOVEL, AINDA QUE DESPROVIDO DO REGISTRO.
Os embargos de terceiro foram uma virada espetacular em relação ao próprio Decreto-
Lei 58/67. O que está escrito aqui é o seguinte: imagina a hipótese do loteador que vende um
lote por contrato particular. Não registrou, mas o cliente está pagando as prestações. Aí o
loteador contrai uma dívida, entram com uma ação contra ele e penhoram o lote do cliente. É
possível, então, que o cliente embargue a execução, provando que tem um contrato e que tem
a posse. E ai o exequente vai ter duas opções: 1) enfrentar, e aí ele vai perder e ai ele vai pagar
custas, honorários; ou 2) ele aceita e desiste da execução, da penhora. Nesse caso quem vai
pagar as custas é o promissário comprador.

Súmula 308 do STJ. “A HIPOTECA FIRMADA ENTRE A CONSTRUTORA E O


AGENTE FINANCEIRO [o banco], ANTERIOR OU POSTERIOR À CELEBRAÇÃO
DA PROMESSA DE COMPRA E VENDA, NÃO TEM EFICÁCIA PERANTE OS
ADQUIRENTES DO IMÓVEL.”
O banco, para aceitar uma hipoteca em apartamentos, em prédios, do incorporador,
corre o risco de perder tudo, pois terá que olhar muito bem se não foi vendido ou se não será
vendido para ninguém. Agora, colocando-nos do outro lado, sem pensar que todo comprador
é santo: às vezes pode acontecer que tenho um inquilino que está pagando o aluguel, mas
estou sendo executado e penhora. Aí vou lá com ele, mau-caráter que nem eu, firmo um
contrato de compromisso de compra e venda com ele, entrego para ele, pago o advogado, ele
embarga, aí o juiz vai liberar o imóvel, vou lá rasgo o documento com ele, perdoo 2 meses de
aluguel dele e aí fraudamos o banco, fraudamos o credor. Então às vezes tem que observar
bem.

5. Casos controvertidos da jurisprudência


5.1 Resoluções por inadimplemento e mora
O simples atraso das prestações não leva à perda no contrato, é necessário constituição
em mora. Para os loteados, interposição em 30 dias (art. 14 do Decreto 58/37); para os não
loteados, interposição 15 dias (art. 1o, Lei 745/69). Essa interpelação pode ser pelo oficial do
Registro de Imóveis, pode ser por títulos de documentos, pode ser por uma carta escrita (AR)
ou então office boy leva lá o documento, entregando uma via e pegando assinatura na outra. E
poderá ser também judicial, por meio de um requerimento para o juiz para que o oficial de
justiça constitua em mora, mas é uma despesa ao Judiciário não recomendável.

Acontece também de atrasar 5 prestações e o outro lado diz que é 10. Mas não há
comprovantes. Nesse caso, você deposita as 5 que acha que deve e faz uma contrainterpelação
em relação ao restante, mandando uma carta dizendo que não vai pagar as demais porque já o
fez. A jurisprudência é maciça nesse sentido: se você está sendo executado, foi interpelado por
20 prestações, mas só deve 19, a interpelação vale e não é por 1 que você estará livre do resto.
Então, você deve pagar o que deve e contrainterpelar quanto ao restante. O professor só viu
um acórdão no sentido de que solicitar a mais invalida a interpelação perdido aí pelo país,
porque no mais a voz é uma só.

Outra situação é fazer um compromisso de compra e venda com o sujeito casado, que
assina sozinho, sem a participação da esposa. O contrato vale, mas só será adimplido se tiver a
assinatura dele e da esposa. Se não tiver a assinatura, inadimpliu, e será resolvido com perdas
e danos.

5.2 Adjudicação Compulsória


A execução do compromisso de venda cumpre-se de dois modos: i) pela escritura
definitiva de compra e venda; ii) pela sentença constitutiva de adjudicação compulsória. A
prova mais incisiva de que o chamado contrato definitivo constitui mera execução do contrato
precursor encontra-se na possibilidade de ser substituída a escritura por uma sentença com
iguais efeitos, requerida por meio da ação de adjudicação compulsória. Pode o
compromissário comprador ajuizá-la em relação ao titular do domínio do imóvel (que tenha
prometido vendê-lo através de contrato de compromisso de compra e venda e se omitiu
quanto à escritura definitiva) tendente ao suprimento judicial desta outorga. Assegura o
direito à declaração judicial que possibilita a transcrição e transferência do imóvel objeto do
contrato para o patrimônio do adquirente.
Seja loteado ou não loteado o objeto do compromisso de compra e venda, para propor
a ação de adjudicação compulsória não é necessário registro prévio do contrato.

Loteados: nesses sequer é necessária a ação de adjudicação compulsória, é possível ir


diretamente no registro de imóveis. Isso porque o compromisso de compra e venda é contrato
típico, próprio, criado por lei. Basta ir ao registro com o compromisso de compra e venda e
comprovantes de pagamentos para obter o número de matrícula, pois o contrato vale como
título para o registro de propriedade.
Art. 26. Os compromissos de compra e venda, as cessões ou promessas de cessão poderão ser
feitos por escritura pública ou por instrumento particular, de acordo com o modelo depositado na
forma do inciso VI do art. 18 e conterão, pelo menos, as seguintes indicações:
§ 6o Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão valerão como
título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando acompanhados da respectiva
prova de quitação. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

Não Loteados: ainda regidos pelo Decreto-Lei n. 58/37, onde está prevista a ação de
adjudicação compulsória:
Art. 22. Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e
venda e cessão de direitos de imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago no ato
de sua constituição ou deva sê-lo em uma, ou mais prestações, desde que, inscritos a
qualquer tempo, atribuem aos compromissos direito real oponível a terceiros, e lhes
conferem o direito de adjudicação compulsória nos termos dos artigos 16 45 desta lei,
640 e 641 do Código de Processo Civil.

5.3 Arrependimento
Loteados: Toda cláusula de arrependimento nos loteados é título inexistente; não se
admite, pois é irretratável. Isso não significa que ele possa ser inadimplido por
inadimplemento em mora, pois não se confunde uma coisa com a outra.
Não loteados: é admitido desde que expresso no compromisso de compra e venda e
que seja fixado até qual prestação pode se arrepender e desde que essa prestação seja antes
da metade do pagamento, pois se não o contrato já está adimplido.

5.4 Cláusula penal


Vamos falar da hipótese do promissário comprador se arrepender. Se compra um lote,
um apartamento, é uma bola de neve. Deve hoje um valor, mês que vem é um valor maior e
por assim vai. Você pode desistir da aquisição e o que vai acontecer? O juiz poderá arbitrar
quanto você irá perder das prestações pagos. Você já pagou uma fortuna, mas deve outro
tanto. Já está quase na metade do pagamento e deve mais um pouco. Dependendo do caso
concreto, o juiz pode fixar até quando você vai perder e quanto terá de devolução. Isso
acontece muito. O percentual variará do seguinte modo:
Para os loteados, a cláusula penal é de 2%. Para os não loteados a cláusula penal pode
ser de multa até o valor do contrato (se o imóvel era 10 mil a cláusula será de 10 mil; se pagou
uma parcela de mil, a cláusula será de 9 mil). A lei 6766/79 estipulava cláusula de 10%, que
foi revogada pelo CDC.
6. Aspectos do art. 27 da Lei 6766/79
Art. 27. Se aquele que se obrigou a concluir contrato de promessa de venda ou
de cessão não cumprir a obrigação, o credor poderá notificar o devedor para
outorga do contrato ou oferecimento de impugnação no prazo de 15 (quinze)
dias, sob pena de proceder-se ao registro de pré-contrato, passando as
relações entre as partes a serem regidas pelo contrato-padrão.
§ 1º Para fins deste artigo, terão o mesmo valor de pré-contrato a promessa
de cessão, a proposta de compra, a reserva de lote ou qualquer, outro
instrumento, do qual conste a manifestação da vontade das partes, a indicação
do lote, o preço e modo de pagamento, e a promessa de contratar.
§ 2º O registro de que trata este artigo não será procedido se a parte que o
requereu não comprovar haver cumprido a sua prestação, nem a oferecer na
forma devida, salvo se ainda não exigível.

45 Art. 16. Recusando-se os compromitentes a outorgar a escritura definitiva no caso do artigo 15, o
compromissário poderá propor, para o cumprimento da obrigação, ação de adjudicação compulsória, que tomará o
rito sumaríssimo. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973). § 1 º A ação não será acolhida se a parte, que a
intentou, não cumprir a sua prestação nem a oferecer nos casos e formas legais. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de
1973). § 2 º Julgada procedente a ação a sentença, uma vez transitada em julgado, adjudicará o imóvel ao
compromissário, valendo como título para a transcrição. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973) § 3 º Das
sentenças proferidas nos casos deste artigo, caberá apelação. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973). § 4º Das
sentenças proferidas nos casos dêste artigo caberá o recurso de agravo de petição. § 5º Estando a propriedade
hipotecada, cumprido o dispositivo do § 3º, do art. 1º, será o credor citado para, no caso dêste artigo, autorizar o
cancelamento parcial da inscrição, quanto aos lotes comprometidos.
§ 3º Havendo impugnação daquele que se comprometeu a concluir o contrato,
observar-se-á o disposto nos arts. 639 e 640 do Código de Processo Civil .

Às vezes você pode cancelar um registro contra pessoas que estão em lugares incertos
e não sabidos. Por exemplo, uma moça comprou um lote meu em 36 prestações, pagou 4 e
sumiu. Vou então ao cartório de registros, faço uma interpelação por edital, devolvo as
prestações dela daquilo que foi pago, o oficial baixa o registro (extra administrativo) e aí
posso vender para outro.
DIREITOS REAIS SOBRE COISAS ALHEIAS
A mais importante classificação dos direitos reais é a que os divide em jus in re
propria e jura in re aliena. O direito na coisa própria é a propriedade. Os direitos na coisa
alheia, também chamados direitos limitados, são, as servidões, a superfície, o uso, o usufruto, a
habitação, a promessa irretratável de venda, o penhor, a anticrese, a hipoteca e a concessão de
uso e a concessão especial de uso para
fins de moradia.
Os direitos reais na coisa alheia subdividem-se em: i) direitos principais e acessórios
(penhor, anticrese e hipoteca); ii) direitos de gozo46 ou direitos de garantia (são os que
contam com direito de preferência: hipoteca, penhor e anticrese); iii) direitos pignoratícios
(nos quais se manifesta o direito de preferência) e os demais; dentre outras classificações.

Os direitos reais na coisa alheia seriam o resultado da decomposição dos diversos


poderes jurídicos contidos no direito de propriedade. O proprietário desmembraria um
desses poderes e o atribuiria a outra pessoa. Os direitos elementares do domínio ou poderes
jurídicos do proprietário são os direitos de usar, gozar e dispor da coisa. Destacando algum ou
mais de um desses direitos elementares, o proprietário constitui um direito real limitado. Se
desmembra o direito de usar, constitui o direito real de uso; se destaca o direito de usar e
gozar, constitui o direito real de usufruto, etc.
Todavia, essa concepção do modo de formação dos jura in re aliena se enraíza no
equívoco, ainda hoje difundido, de se considerar a propriedade uma osma de faculdades,
direitos ou poderes, ideia própria da concepção feudal de domínio. Atualmente o domínio
constitui um direito único, embora complexo. Haveria impropriedade em qualificar os direitos
reais na coisa alheia como formas de propriedade limitada, pois seriam, na verdade, limitações
ao direito único do proprietário.

1. Superfície
1.1 Conceito, prazo e aquisição
É o direito real temporário de construir ou plantar em terreno alheio concedido pelo
proprietário, para utilização durante certo tempo. O Código Civil fala em prazo determinado,
mas é uma regra apenas para imóvel rural, pois segundo o Estatuto das Cidades (art. 21 e

46 Pode-se adquirir por usucapião tanto o uso, usufruto, habitação, porque são direitos reais de gozo.
seguintes), é possível estabelecer prazo perpétuo.
É transmitido por escritura pública com registro obrigatório no Registro Imobiliário e
com pagamento do imposto de transmissão municipal de 2% no valor do imóvel.
Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de
plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública
devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único. O direito de superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se
for inerente ao objeto da concessão.

1.2 Onerosidade
A concessão pode ser gratuita ou mediante pagamento acordado.
Art. 1.370. A concessão da superfície será gratuita ou onerosa; se onerosa,
estipularão as partes se o pagamento será feito de uma só vez, ou
parceladamente.

Pela utilização, o superficiário deverá pagar todos os encargos e tributos que incidam
sobre o imóvel como um todo, terreno mais construção, como se proprietário fosse.
Art. 1.371. O superficiário responderá pelos encargos e tributos que incidirem
sobre o imóvel.

Esse direito pode ser transferido a terceiros, sem qualquer necessidade de autorização
do concedente (proprietário do terreno), transferindo-se também por sucessão.
Art. 1.372. O direito de superfície pode transferir-se a terceiros e, por morte do
superficiário, aos seus herdeiros.
Parágrafo único. Não poderá ser estipulado pelo concedente, a nenhum título,
qualquer pagamento pela transferência.

O concedente apenas possui direito de preferência na eventual alienação do direito de


superfície, visando primordialmente a consolidação da propriedade. Igualmente, o
superficiário tem preferência na aquisição do terreno em caso de sua venda pelo concedente.
Art. 1.373. Em caso de alienação do imóvel ou do direito de superfície, o
superficiário ou o proprietário tem direito de preferência, em igualdade de
condições.

1.3 Extinção
Quando se constrói um edifício nessas condições, o terreno pertence a um
proprietário; enquanto o prédio, a outro. Uma vez finda a concessão, a construção passará a
ser propriedade do concedente. Essa incorporação dar-se-á independentemente de
indenização, a não ser que as partes convencionem em contrário no contrato de concessão.
Art. 1.375. Extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena
sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização,
se as partes não houverem estipulado o contrário.

Antes do prazo, a concessão pode se rescindir em caso de destinação diversa ao


terreno que porventura venha a ser dada pelo superficiário.
Art. 1.374. Antes do termo final, resolver-se-á a concessão se o superficiário der
ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida.
1.4 Tutela
O proprietário pode entrar com as ações cabíveis, como petitória ou negatória, contra o
terceiro ou superficiário. A ação negatória objetiva provar que inexiste ônus real ou para
defender seus direitos contra o proprietário do imóvel dominante que, sem título, pretender
ter a superfície sobre o terreno, ou então ampliar os direitos já existentes. Já o titular do
direito real pode entrar com ação confessória contra o proprietário para que seja reconhecida
a existência do seu direito, quando negada ou contestada pelo proprietário.

2 Servidão
2.1 Conceito
Servidão é o direito real sobre a coisa imóvel, que impõe um ônus em proveito de
outra, pertencente a diferente dono. O prédio que suporta a servidão chama-se serviente. O
outro, em favor do qual se constitui, denomina-se dominante.
O encargo pode consistir na obrigação do possuidor do prédio servente de tolerar que
o possuidor do prédio dominante o utilize para certo fim, ou na obrigação de não praticar
determinado ato de utilização do seu bem (in patiendo e in non faciendo).
O ônus não é imposto a uma pessoa, mas a um prédio. Suporta-o quem tenha a sua
posse. Do mesmo modo, é estabelecido em proveito de um prédio, não de determinada
pessoa. Necessário, claro, que os prédios não pertençam ao mesmo dono.

2.2 Princípios
Ninguém serve a si mesmo. É sempre em terrenos ou proprietários diferentes.
A servidão não se presume. Só se constitui por escritura pública e registro de imóveis.
Deve comprar a servidão e registrar em cartório.

2.3 Classificação
As servidões classificam-se pela sua causa (legais, naturais e voluntárias), objeto
(servidões urbanas e rurais) e modo de exercício (positivas e negativas; contínuas e
descontínuas; aparentes e não aparentes).

Positivas – são as que conferem ao senhor ou possuidor do prédio dominante o poder


de praticar algum ato no prédio serviente como a servidão de trânsito.
Negativas – as que impõem ao senhor ou possuidor do prédio serviente o dever de
abster-se da prática de determinado ato de utilização, como a de não construir.
Aparentes – são as que se revelam por sinais exteriores, todas as pessoas conseguem
vê-las, como uma obra.
Não aparente – não têm sinal externo de sua existência, como o direito de vista.
Contínua – dispensam atos humanos para que subsistam e sejam exercidas, como a de
aqueduto.
Descontínua – as que dependem, para seu exercício, de atos do senhor ou possuidor do
prédio dominante, como a de passagem.
A distinção é importante porque se aplicam regras diferentes quanto à sua
constituição, execução e extinção. Se é certo que todas elas podem ser constituídas por acordo
de vontades, somente as servidões contínuas e aparentes se estabelecem pela usucapião. As
descontínuas extinguem-se pelo não uso durante certo lapso de tempo, o que não ocorre, por
certo, com as contínuas.

2.3 Formas de aquisição


As servidões constituem-se por ato voluntário de proprietários e por usucapião. O ato
voluntário pode ser unilateral (testamento e a destinação do pai de família ou destinação do
proprietário) ou bilateral (convenção). Todas as servidões, contínuas ou descontínuas,
aparentes ou não aparentes, podem ser estabelecidas mediante contrato.
As servidões contínuas e aparentes adquirem-se também por usucapião. O uso
prolongado de uma serventia, sem oposição, faz presumir o consentimento do proprietário
vizinho. Esta presunção não cabe quando a serventia é não aparente. Se houver título, o prazo
da usucapião é de 10 (dez) anos; continua sendo de 20 (vinte) anos na ausência de título.

2.4 Direitos e deveres das partes


As partes são o dominante (que se beneficia da servidão) e o serviente (quem a
suporta). A interpretação é restritiva a favor do serviente, o dominante deve usar com
civilidade, não pode agravar o ônus. Uma vez que consubstancia ônus ao direito de
propriedade, seu exercício há de conter-se nos limites da estrita necessidade do prédio
dominante. O dominante deve abster-se de todo ato que concorra para a agravação do
encargo. Por outro lado, cumpre-lhe fazer as obras necessárias ao uso da servidão e à sua
conservação.
O dono do prédio serviente tem uma obrigação negativa: a de não entravar ou
dificultar o exercício da servidão. Não lhe é permitido praticar qualquer ato prejudicial ao
direito do possuidor do prédio dominante. Nenhuma obrigação positiva lhe incumbe, em
princípio. Ele sofre a servidão.

2.5 Extinção (art. 1388 e 1389)


As servidões são perpétuas: como acessórias, acompanham o objeto. Extinguem-se,
entretanto, por modos comuns a outros direitos reais limitados e (convenção, perecimento do
imóvel, desapropriação) também pelos que lhes são peculiares. Os peculiares: a confusão e o
não uso. Verifica-se a confusão quando o prédio dominante e o prédio serviente passam a
pertencer ao mesmo dono. O não uso justifica-se em face do próprio fundamento do direito
real de servidão; se o direito não é usado, presume-se a sua inutilidade, não se justificando a
permanência da servidão. As servidões extinguem-se pelo não uso durante 10 anos contínuos.

2.6 Tutela
O titular do direito real de servidão defende-o por meio da ação que tem por fim o
reconhecimento judicial do seu direito, se contestado pelo dono do prédio serviente. Chama-
se ação confessória.
Por sua vez, o dono de qualquer prédio tem ação judicial para negar a existência de
pretensa servidão: ação negatória. Também podem ser propostos interditos possessórios
contra o dono do prédio serviente, não só quando este impede totalmente que o senhor do
prédio dominante exerça seu direito, mas, também, quando perturbe seu exercício.

3 Usufruto

3.1 Conceito
O conceito de usufruto é dado pela fórmula: “usar e fruir”. É o direito real de desfrutar
de um bem alheio como se dele se fosse proprietário, com a obrigação, porém, de lhe
conservar a substância, pois trata-se de direito temporário. Embora o exercício possa ser
cedido, o direito em si é intransmissível, tanto que o extingue a morte do usufrutuário
cedente.
Geralmente é concedido gratuitamente, quase sempre por testamento, com caráter
alimentar. É como o avô que recebe o direito de uso de um neto sobre um terreno para que
possa viver até o fim de seus dias. Todavia, vale destacar que isso não dá direito a dispor do
terreno; se quiser alterar a destinação econômica do imóvel é preciso solicitar a autorização
do proprietário.

3.2 Partes
A coisa é concedida ao usufrutuário pelo nu-proprietário, cujo direito de propriedade é
despido dos principais atributos enquanto perdura o usufruto.

3.3 Elementos
É possível entender o instituto a partir dos seus dois elementos principais da
propriedade: a substância e o proveito. O proprietário pode tê-los ambos ou abandonar o
proveito a outrem, concedendo-o o usufruto.

3.4 Natureza Jurídica


Da natureza real do usufruto deriva a temporaneidade do direito, que não se
conceberia constituído perpetuamente; a possibilidade de o fazer valer erga omnes, de onde
resulta a diferença com qualquer outro gozo de coisa alheia atribuído com base numa relação
obrigatória.

3.5 Função
O direito real de usufruto é o instituto mais utilizado na prática jurídica, especialmente
nas relações familiares, segundo a doutrina clássica, sua função é meramente alimentar, na
medida em que é constituído, em regra, para garantia do mínimo vital ao usufrutuário.

3.6 Objeto
O usufruto pode recair: a) numa coisa imóvel; b) numa coisa móvel; c) num
patrimônio; d) num direito.

3.7 Classificações
3.7.1 Pelo modo de aquisição
Divide-se em legal, voluntário e usucapião. Legal é o que a lei institui em favor de
determinadas pessoas, como o constituído sobre os bens dos filhos menores em proveito dos
pais. O voluntário se constitui mediante negócio jurídica, seja unilateral (como o testamento)
seja bilateral como o contrato. Há ainda o por usucapião.

3.7.2 Pelo objeto


Divide-se em usufruto próprio e impróprio. O primeiro tem por objeto coisas cuja
substância pode ser conservada, de modo que sejam restituídas, elas próprias, ao nu-
proprietário. O impróprio (ou quase-usufruto) incide em coisas consumíveis e fungíveis.

3.7.3 Pela extensão a título universal e singular


Diz-se universal o usufruto que recai em todo um patrimônio. A título universal,
quando incide numa cota-parte de um patrimônio. A título particular ou singular, quando tem
por objeto uma ou varias coisas individualmente determinadas.

3.7.4 Pela duração


Todo usufruto é por definição temporário. Mas pode durar toda a vida do usufrutuário,
extinguindo-se somente com a sua morte, ou pode ter a duração subordinada a termo certo. O
usufruto estabelecido para durar enquanto viver o usufrutuário chama-se vitalício.

3.8 Aquisição
O usufruto constitui-se por determinação da lei, por vontade do homem (negócio
jurídico inter vivos – contrato; ou mortis causa – testamento) e por usucapião. O usufruto
legal é previsto no Direito de Família (pátrio poder).
Quando o usufruto recai em coisas imóveis, é necessária a transcrição do título no
Registro Público. Para o usufruto das coisas móveis, basta a tradição.

3.9 Direitos e deveres


O usufruto pressupõe duas ordens de direitos na mesma coisa: os direitos do
usufrutuário e os direitos do nu-proprietário. Do mesmo modo, duas ordens de obrigações.
São direitos do usufrutuário: a) o de possuir a coisa ou o direito; b) o de fruir as suas
utilidades; c) o de perceber os frutos; d) o de administrá-la (não pode transformar a coisa,
nem lhe alterar a substância); e) o de ceder o exercício do usufruto (por mais que o direito
seja intransmissível, o exercício pode ser cedido). As pretensões do usufrutuário contra o nu-
proprietário: indenização por despesas feitas na qualidade de gestor de negócios e
levantamentos de benfeitorias.
As obrigações do usufrutuário são anteriores (inventariar os bens que receber e dar
caução de lhes velar pela conservação), simultâneas (conservar a coisa, fazer reparações
ordinárias, pagar certas contribuições) e posteriores ao usufruto (as que incumbem ao
usufrutuário em consequência da extinção do usufruto).
O nu-proprietário também tem direitos e obrigações. Correspondem, porém, feita a
necessária inversão, aos direitos e obrigações do usufrutuário.
Terceiros são obrigados a respeitar o direito do usufrutuário, que é real.

3.10 Tutela Possessória (possuidor direto e possuidor indireto)


Petitório (confessória e negatória)

3.11 Modificação
O usufruto pode sofrer modificações na própria relação jurídica (deriva do
inadimplemento da obrigação de prestar caução), no sujeito (a única possível é no usufruto
em favor de duas ou mais pessoas com a clausula de que acrescentará no quinhão dos que
sobreviverem ao que falecer) e no objeto (quantitativa ou qualitativa).

3.12 Extinção
Os modos de extinção concernentes ao sujeito são: a) a morte do usufrutuário; b) a
renúncia; c) a culpa do usufrutuário. Quanto ao objeto: a) a destruição da coisa; b) a
desapropriação. Relativos à relação jurídica: a) consolidação; b) o termo de sua duração ou
condição resolutiva; c) a cessão da causa de que origina; d) prescrição.

4 Uso
O direito real de uso confere a seu titular a faculdade de temporariamente fruir a
utilidade da coisa que agrava. Pode perceber os frutos apenas nas necessidades da família.
O direito real de uso se divide em três tipos: i) direito real de uso e habitação (art.
1412-1414 do CC); ii) concessão de direito real de uso (Decreto-Lei 271/67 e CC 1225); iii)
concessão de uso especial para fins de moradia (MP 2.2220/1; Lei 11.481/7).
No primeiro o uso é exclusivo de moradia, é gratuito para a casa morada. Não pode
nem vender os frutos. O que ele não precisar para se alimentar é do dono do imóvel.
O segundo pode ser exemplificado na situação em que proprietários de uma loja
maçônica prometem por um contrato para o casal que cuidava do patrimônio que um dia
dariam uma casa para eles. O casal morava em uma casinha dentro do próprio terreno. Foram
ficando velhos e doentes e queriam que fosse cumprida a promessa do contrato. O professor
diante dessa situação sugeriu fazer a concessão de direito real de uso. Pois é escriturado no
cartório, mas pode ser revogado a qualquer momento. Enquanto os dois velhos foram vivos, o
direito real foi mantido. Depois que morreu o segundo, aí a loja simplesmente foi fechada e
então revogou-se.
A terceira é para pessoas de baixa-renda em terrenos públicos. A Lei 11.481/7 prevê
medidas para a regularização fundiária de imóveis da União.

Direitos reais de uso e habitação


Noção geral e tutela
Concessão de direito real de uso (Dl 271/67; CC 1225, XII; Lei 11.481/7)

Art. 7o É instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares remunerada


ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel, para fins
específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização,
edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das
comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de
interesse social em áreas urbanas. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 1º A concessão de uso poderá ser contratada, por instrumento público ou
particular, ou por simples têrmo administrativo, e será inscrita e cancelada em livro
especial.
§ 2º Desde a inscrição da concessão de uso, o concessionário fruirá plenamente
do terreno para os fins estabelecidos no contrato e responderá por todos os encargos
civis, administrativos e tributários que venham a incidir sôbre o imóvel e suas rendas.
§ 3º Resolve-se a concessão antes de seu têrmo, desde que o concessionário dê
ao imóvel destinação diversa da estabelecida no contrato ou têrmo, ou descumpra
cláusula resolutória do ajuste, perdendo, neste caso, as benfeitorias de qualquer
natureza.
§ 4º A concessão de uso, salvo disposição contratual em contrário, transfere-se
por ato inter vivos , ou por sucessão legítima ou testamentária, como os demais direitos
reais sôbre coisas alheias, registrando-se a transferência.
§ 5º (Vide Medida Provisória nº 335, de 2006)
§ 5o Para efeito de aplicação do disposto no caput deste artigo, deverá ser
observada a anuência prévia: (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
I - do Ministério da Defesa e dos Comandos da Marinha, do Exército ou da
Aeronáutica, quando se tratar de imóveis que estejam sob sua administração;
e (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência de República, observados
os termos do inciso III do § 1o do art. 91 da Constituição Federal.

A Lei 11.481/2007 introduziu o inciso XII ao rol de Direitos Reais


previsto no Código Civil em seu art. 1225. Este novo direito real versa
sobre a concessão de direito real de uso.
A Concessão de Direito Real de Uso já existia em nosso ordenamento,
mas claro, ainda que já entendida como um direito real, não fazia parte
do referido rol no direito privado, já que se trata de instituto do
âmbito do direito administrativo, criado pelo Decreto -Lei
Nº271/1967.
Denota-se que o instituto tem por objetivo satisfazer filões específicos
de urbanização, industrialização, cultivo agrícola da terra ou outra
utilização de interesse social, sendo contratada, de maneira gratuita
ou onerosa, por meio de instrumento público, particular (terrenos
privados) ou por simples termo de cunho administrativo. Notável é a
aproximação do instituto em comento com o uso, notadamente em
decorrência da transmissão da posse direta de um bem a fim de que
possa cumprir a sua função social. Entrementes, o traço diferenciador
está no fato de que a concessão de uso não se limita à moradia
(permite-se a fruição total do bem), ao contrário do instituto do uso
que se encontra limitado ao benefício daquilo que corresponda às
necessidades do usuário e de sua família.
De acordo com o professor Helly Lopes Meirelles (apud VENOSA, 2013
p. 623) a concessão de direito real de uso: é o contrato pelo qual a
Administração transfere o uso remunerado ou gratuito de terreno
público a particular, como direito real resolúvel, para que dele se
utilize para fins específicos de urbanização, industrialização,
edificação, cultivou qualquer outra exploração de interesse social.
Concessão de uso especial para fins de moradia (MP 2220/1; CC 1225, XI; Lei 11.481/7)
A concessão especial de uso já existia, foi criada pela Medida
Provisória Nº2220 e tinha como objetivo regular a ocupação ilegal de
bens públicos para populações das chamadas “invasões”. Já a Medida
Provisória nº 335 buscou regularizar esses assentamentos também
em áreas da Marinha. A Lei 11.481/07 quando promulgada
acrescentou várias disposições.
De acordo com o art. 1º da Lei 11.481/07:
É o Poder Executivo autorizado, por intermédio da Secretaria do
Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão, a executar ações de identificação, demarcação, cadastramento,
registro e fiscalização dos bens imóveis da União, bem como a
regularização das ocupações nesses imóveis, inclusive de
assentamentos informais de baixa renda, podendo, para tanto, firmar
convênios com os Estados, Distrito Federal e Municípios em cujos
territórios se localizem e, observados os procedimentos licitatórios
previstos em lei, celebrar contratos com a iniciativa privada.

Art. 1o/MP Aquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco
anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinqüenta metros
quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para sua
moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de
moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou
concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural.

DIREITOS REAIS DE GARANTIA (CC art. 1419)


1 Introdução
Os créditos podem ser divididos entre simples (quirografários) e privilegiados. Os
primeiros não gozam de direito de preferência, privilégio ou garantia concreta. É crédito
simples sem qualquer vantagem. De regra, todo crédito é quirografário. Crédito garantido, por
outro lado, são os que se beneficiam i) de garantias reais ou ii) de privilégios creditórios
especiais. O privilégio creditório, conforme previsto no Código português, é “faculdade que a
lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registro,
de serem pagos com preferência a outros”. Estão previstos nos art. 964 4 965 do Código
Civil.47

47 Art. 964. Têm privilégio especial:


I - sobre a coisa arrecadada e liquidada, o credor de custas e despesas judiciais feitas com a arrecadação e
liquidação; II - sobre a coisa salvada, o credor por despesas de salvamento; III - sobre a coisa beneficiada, o credor
por benfeitorias necessárias ou úteis; IV - sobre os prédios rústicos ou urbanos, fábricas, oficinas, ou quaisquer
outras construções, o credor de materiais, dinheiro, ou serviços para a sua edificação, reconstrução, ou
melhoramento; V - sobre os frutos agrícolas, o credor por sementes, instrumentos e serviços à cultura, ou à colheita;
A garantia do pagamento desse crédito de uma maneira geral pode ser pessoal ou real.
As pessoais não vinculam nenhum tipo de bem material, são respaldadas na confiança, como a
fiança e o aval. Já as garantias reais vinculam um bem.
São garantias reais: o penhor, a anticrese e a hipoteca, além da alienação fiduciária.
Todavia, no rol de direitos reais do código, aparecem apenas os três primeiros. Também são
chamados de direitos reais pignoratícios, mas é uma terminologia inconveniente, pois dá
amplitude exagera ao penhor.

Cabe distinguir os direitos reais de garantia dos privilégios. Esses últimos são
preferências que a lei atribui a alguns credores sobre o patrimônio do devedor. Tem esses
credores direito a pagamento preferencial, tal como os titulares de direito real de garantia,
mas o direito do credor privilegiado estende-se a todo o patrimônio do devedor e é conferido
pela lei atenção à causa e à qualidade do crédito. O privilégio não outorga poder imediato
sobre as coisas, como se verifica com os direitos regais de garantia. Enquanto esses se
originam de acordo entre as partes, o privilegio resulta de determinação legal.

2 Conceito
Direito real de garantia é o que confere ao credor a pretensão de obter o pagamento da
dívida com o valor de bem aplicado exclusivamente à sua satisfação. O vinculo não se descola
da coisa cujo valor está afetado ao pagamento da dívida. Se o devedor a transmite a outrem,
continua onerada, transferindo-se, com ela, o gravame. Além disso, o credor tem direito a
pagamento preferencial, obtendo a satisfação do seu crédito antes de outros credores. O
credor não exerce direito algum na própria coisa, pois o direito que tem é ao seu valor, tanto
que a sua preferencia se exerce sobre o preço da venda judicial.

3 Distinções gerais entre hipoteca, penhor e anticrese


O penhor recai em coisas móveis, enquanto a hipoteca e a anticrese em bens imóveis.
Hoje essa distinção já não é muito segura.
No penhor e na anticrese, a coisa deve ser entregue ao credor, que passa a ser seu
possuidor direto. Na hipoteca, conserva-se em poder do devedor, ou de quem o dá em

VI - sobre as alfaias e utensílios de uso doméstico, nos prédios rústicos ou urbanos, o credor de aluguéis, quanto às
prestações do ano corrente e do anterior; VII - sobre os exemplares da obra existente na massa do editor, o autor
dela, ou seus legítimos representantes, pelo crédito fundado contra aquele no contrato da edição; VIII - sobre o
produto da colheita, para a qual houver concorrido com o seu trabalho, e precipuamente a quaisquer outros
créditos, ainda que reais, o trabalhador agrícola, quanto à dívida dos seus salários. IX - sobre os produtos do abate,
o credor por animais. (Incluído pela Lei nº 13.176, de 2015)

Art. 965. Goza de privilégio geral, na ordem seguinte, sobre os bens do devedor: I - o crédito por despesa de seu
funeral, feito segundo a condição do morto e o costume do lugar; II - o crédito por custas judiciais, ou por despesas
com a arrecadação e liquidação da massa; III - o crédito por despesas com o luto do cônjuge sobrevivo e dos filhos
do devedor falecido, se foram moderadas; IV - o crédito por despesas com a doença de que faleceu o devedor, no
semestre anterior à sua morte; V - o crédito pelos gastos necessários à mantença do devedor falecido e sua família,
no trimestre anterior ao falecimento; VI - o crédito pelos impostos devidos à Fazenda Pública, no ano corrente e no
anterior; VII - o crédito pelos salários dos empregados do serviço doméstico do devedor, nos seus derradeiros seis
meses de vida; VIII - os demais créditos de privilégio geral.
garantia. Não se verifica o deslocamento da posse.
O credor anticrético não pode vender a coisa, mas apenas retê-la. O penhor
pignoratício e o hipotecário podem, no caso de inadimplemento da obrigação, promover a
venda judicial da coisa gravada para com o preço satisfazer a dívida.
Nas linhas clássicas: penhor é direito real sobre coisa móvel cuja posse é transferida ao
credor, que fica com a faculdade de vendê-lo.
A hipoteca é direito real sobre coisa imóvel se conserva em poder do devedor, tendo o
credor a faculdade de promover a sua venda judicial e preferir outros credores, observada a
prioridade na inscrição.
A anticrese é o direito real sobre coisa imóvel, cuja posse é transferida ao credor para
que lhe perceba os frutos e rendimentos, que fica com o direito de retê-la em seu poder.

4 Princípios
Os direitos reais de garantia subordinam-se a princípios gerais:
Somente quem pode alienar pode empenhar, hipotecar ou dar em anticrese.
Somente as coisas que se podem alienar podem ser empenhados, hipotecadas ou dadas
em anticrese.
A coisa dada em garantia fica sujeita por vínculo real ao cumprimento da obrigação.
O pagamento de uma ou mais prestações da dívida não importa exoneração da
garantia.
Os credores pignoratícios, hipotecários ou anticréticos não podem ficar com o objeto
da garantia. Os dois primeiros devem vender, o último tem direito de retê-la.
A dívida considera-se vencida: se a coisa agravada deteriorar-se; se o devedor cair na
insolvência ou falir; se as prestações não forem pontualmente pagas; se perecer objeto dado
em garantia; se for desapropriada.

5 Hipoteca
Quando o devedor separa um bem principal do seu patrimônio para dar em garantia. A
dívida segue o bem principal.

5.1.1 Classificação
a) Convencional
b) Legal
c) Judicial. Hoje deixou de ser interessante perante a hipoteca legal. Mas antes era assim: você
ganhava uma ação, julgada procedente, você especializava a hipoteca para depois execuar.

5.1.2 Prazo
O prazo máximo é de 30 anos. Renova antes de vencer. Averba a prorrogação.

6 Penhor
5.2.1 Classificação
a) Legal
Dono de restaurante ou hotel, vem lá o hóspede que não paga a conta. O direito
autoriza que o próprio credor faça justiça e apreenda bens para pagar a dívida.
c) Especiais
Rural. Incide sobre roças trilhadeiras, equipamentos. O pecuário sobre animais. Por
exemplo, o gado leiteiro. É um penhor especial. É um penhor que tem uma série de regras
específicas. Antes era previsto um prazo mínimo. Hoje em dia já não tem mais. Existe também
o penhor industrial e o penhor mercantil. O penhor industrial: você tem em um frigorófico
depositados 2.000 frangos congelados. Você pode dar em penhor. O penhor mercantil: você
tem trigo guardado em um galpão. Penhor de máquinas, produtos agrícolas. Isso pode ser
dado também em penhor. Qual a diferença entre penhor rural, agropecuário e mercantil? Os
bens são registrados no registro de imóveis, apesar de ser penhor. Outra coisa: no penhor
agrícola, pecuário ou industrial, os bens ficam com o devedor. No penhor mercantil, fica no
depósito. Também temos penhor de direitos e títulos de créditos. O penhor fica com o título e
na hora da cobrança tem que notificar o devedor do devedor, que ele não pague o devedor,
mas pague o credor. Outra coisa: se aparecerem outros interessados que fiquem em penhor
em segundo, terceiro, quarto grau. Com a sogra pagar os outros. Então isso é o penhor de
títulos de crédito. Há o penhor de veículos. Você pode ir no banco, dar o automóvel em
penhor, e sair dirigindo. É um penhor especial previsto no art. 1641 do Código Civil. É o
penhor de veículos. Aí é registrado no documento do automóvel e também é vertido para o
documento que é registrado em títulos e documentos. O penhor de coisas perecíveis tem
algumas vantagens hoje: pode ser antecipada a venda. O credor pode também retirar bens
para abater a dívida. Aí o credor tira cópias; aluga para exposições. Esses valores podem ser
abatidos na dívida. Também o penhor pode ter o vencimento antecipado. No caso de uma
grande catástrofe, vai perecer. Então, pode ser antecipada a venda para evitar o prejuízo. O
devedor pode ficar com os frangos e substituir por outra garantia. A constituição do penhor
vai depender do tipo de penhor. Mas alguns são do registro de imóveis. O credor e o devedor
tem direito se deveres.
Direitos do credor: ter a posse da coisa em determinados penhores (nem todos, alguns ficam
com o credor). Mas pode realizar venda antecipada, retirar renda do próprio bem (art. 1433).
Extinção do penhor: extinção da obrigação, perecendo a coisa, quando o credor renuncia a
garantia e também na execução.

7 Supergarantias
6.1 Alienação fiduciária em garantia
É o negócio jurídico pelo qual uma das partes adquire, em confiança, a propriedade de
um bem, obrigando-se a devolvê-la quando se verifique o acontecimento a que se tenha
subordinado tal obrigação, ou lhe seja pedida a restituição. Ao alienante denomina-se
fiduciante. Ao adquirente, fiduciário.
Bens móveis e imóveis. Lei especial. Feição comum no código civil na propriedade
fiduciária. No final da propriedade. Nos EUA há dois tipos de leasing. Bancário, financeiro. E
existe o leasing operacional. Máquina de xerox, helicóptero.
Foi inventada na verdade pelos romanos. Chamava-se fidúcia com pacto de confiança
com o credor. Então assim: você me emprestava um direito em Roma e eu te transferia a
propriedade da casa. Passado um tempo, você arrumava dinheiro par ame pagar. Aí vendia de
volta. Então, era uma venda em confiança. Era só em garantia. Eu te transfiro a casa e você me
dá um dinheiro.
Com a lei de mercado e capitais, a lei 4728/65, esse modelo foi reintroduzido no
ordenamento jurídico brasileiro, de modo que é possível financiar um automóvel no banco,
passando a propriedade do automóvel ao banco. O banco passa a ser proprietário resolúvel.
Você pode andar por aí com o automóvel, anda que o proprietário seja o banco.
Recentemente houve uma lei que modificou bastante a alienação fiduciária em garantia.
Então: a você não pagou as prestações, o credor vai te citar, vai te notificar, vai te constituir
em mora. Aí você vai entrar no processo de execução que pelo rito dessa lei, que antes era o
decreto lei 911/69. Então, a notificação é por títulos e documentos, não é mais judicial, e
desde logo o notificando, após 5 dias, o credor já se torna dono definitivo da coisa. Esse é um
procedimento que corre extrajudicialmente, mas a versão original era uma ação de busca e
apreensão. O bem era obrigado a ser devolvido, e ai o credor vende a coisa. Vendida a coisa,
sobrou dinheiro, devolve o resto do dinheiro. Então ele não perde as prestações daquilo que
ele pagou. E a lei também introduziu que, se houver uma execução indevida, às vezes para
humilhar, então paga uma multa pesada de 50% do valor, pela improcedência da ação de
busca e apreensão que ele tenha proposto indevidamente. Vencido o contrato, a dívida, é
necessária a interpelação. É todo um procedimento que imita bastante a lei 9514/97
(alienação fiduciária de imóveis). La também, quando começa a execução, primeira coisa, ja
liminarmente, o juiz passa a propriedade de resolúvel para terminativa. Já executa o
proprietário. Daí só se a outra parte liquidar todos os débitos que restabelece o contrato, se
não a coisa já pode ser vendida para outros.
Hoje você compra imóvel geralmente com garantia ou de hipoteca, ou de alienação fiduciária
em garantia, ou leasing.

6.2 Arrendamento mercantil ou leasing


É a lei 6.099/74. Há dois tipos principais: i) leasing operacional. Você tem o direito de
ter um serviço de xerox e paga mensalmente. Ou então um helicóptero: mensalmente você
paga e o helicóptero está ali na porta. Não precisa ser necessariamente o mesmo. No final
renova ou não renova. Ii) leasing financeiro ou bancário: STJ: é contrato complexo consistindo
fundamentalmente em arrendamento mercantil com promessa de venda do bem apos
termino de contrato.
Vou na loja de automóvel, a financeira paga o automóvel e fica de dona. Arrenda para mim.
Saio dirigindo o carro arrendado. Vou pagando as prestações, mas o contrato prevê que
depois que eu pagar a ultima prestação, posso fazer uma opção de compra e transformar
aquele arrendamento numa aquisição. Aí eu pago um valor, previamente estabelecido, e faço a
opção de compra. E aí houve na verdade um financiamento. Qual é a vantagem do devedor?
Isso foi criado nos EUA em 1905. A IBN teve participação disso. E também o exercito
americano na última guerra. Então era em sistema de leasing. A indústria armamentista
mantinha por exemplo tantos tanques funcionando. Estraga um, substitui por outro. E os
americanos pagando então esse arrendamento. No final devolve tudo. E não tinha opção de
compra. A mesma coisa a maquina de xerox. Os bancos americanos não financiam pequenas
compras, só grandes negócios.

São 24 prestacoes. Paguei 3 e parei de pagar.


Se a pessoa atrasa, tem que ser interpelado, constituir em mora. A ação de retomada do bem é
ação de reintegração de posse. As prestações vincendas, então, não se paga. O que o comércio
brasileiro fez foi distribuir esse valor garantido, aquele valor da opção de compra dentro
desse contexto, e começou a distribuir ao longo das prestações. O que aconteceu? Estou
pagando o aluguel e já estou pagando a venda. Ai a jurisprudência começou a entender que
não é ramais leasing, mas compra e venda direta. Ai o STJ deu uma decisão dizendo que não
descaracteriza o leasing. Ai o que tem que fazer se for executado.

Outra coisa interessante é que existe uma expressão, que é o adimplemento substancial (no
direito das obrigações), quando você pagou mais da metade. A jurisprudência está indo na
direção de considerar que quando pgou mais da metade a compra e venda é consumada.
Executa nao perdendo as prestações a titulo de aluguel, mas trata como venda.
7 Outros

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