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O QUE É CONCORRÊNCIA?

APRESENTANDO O ESTADO DA ARTE DA TEORIA


CLÁSSICO-MARXISTA DA CONCORRÊNCIA

WHAT IS COMPETITION? PRESENTING THE STATE OF THE ART OF CLASSICAL-


MARXIST THEORY OF COMPETITION

Vitor da Silva Marinho1


Giliad de Souza Silva2

Resumo
Este texto tem por objetivo apresentar, ainda que de modo introdutório, a noção de competição na
economia capitalista a partir da abordagem clássico-marxista de concorrência. Para tanto, faz uso de
revisão bibliográfica, a fim elencar convergências e divergências na mesma e de compreender
regularidades derivadas da competição capitalista. Esta revisão de literatura também tem por
objetivo identificar os padrões das evidências empíricas. As principais considerações são: i)
concorrência compreende todo circuito capitalista e não apenas na circulação de mercadorias; ii)
concorrência resulta do motivo-lucro e da acumulação de capital, que cria novos capitais e expande
os capitais existentes, e isto ocorrendo de modo turbulento; iii) concorrência a nível intra-setorial
hierarquiza taxas de rentabilidade em função da lei dos preços correlatos e do capital regulador; iv)
concorrência a nível intersetorial equaliza taxas de lucro (equalização não é igual a convergência)
mediante mobilidade de capital. Cabe salientar que a condição de produção, alvo dos novos
investimentos, é estabelecido pelo capital regulador; v) esta interpretação é robusta, tanto do ponto
de vista lógico (interno) do ponto de vista das evidências empíricas (manifestação aparente do
fenômeno). Conclui-se que a economia capitalista possui um turbulento processo de competição,
divergente da noção convencional de concorrência baseada em estruturas de mercado.
Palavras-chave: concorrência capitalista; capital regulador; taxa de lucro.

Abstract
This paper aims to present, even if in an introductory way, the notion of competition in the capitalist
economy from the classical-Marxist approach to competition. To this end, it uses a bibliographic
review in order to list convergences and divergences in it and to understand regularities derived
from capitalist competition. This literature review also aims to identify the patterns of empirical
evidence. The main considerations are: i) competition comprises the whole capitalist circuit and not
only in the circulation of commodities; ii) competition is ruled by the profit motive and the capital
accumulation, which creates new capital and expands existing capital, and this occurs in a turbulent
way; iii) intra-sectoral competition hierarchizes profitability rates according to the law of related
prices and regulating capital; iv) competition at the inter-sectoral level equalizes profit rates
(equalization is not equal to convergence) through capital mobility. It should be noted that the
production condition, the target of new investments, is established by the regulating capital; v) this
interpretation is robust, both from a logical (internal) point of view from the point of view of
empirical evidence (apparent manifestation of the phenomenon). This paper concludes that the
capitalist economy has a turbulent competition process, diverging from the conventional notion of
competition based on market structures.
Keywords: capitalist competition; regulating capital; profit rate.

1
Estudante de graduação de Economia da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). E-mail:
vitormarinho@unifesspa.edu.br.
2
Professor de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Desenvolvimento Urbano e Regional na
Amazônia (PPGPAM) da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). E-mail:
giliad.souza@unifesspa.edu.br.
INTRODUÇÃO

Diversos conceitos e categorias, na Ciência Econômica, não são consensuais entre


acadêmicos e operadores (públicos ou privados) da economia. Com a concorrência capitalista não
seria diferente. A economia capitalista é movida pelo motivo-lucro (realização de lucro-extra), ou
seja, a busca constante por auto-expansão, que impele aos capitais procurar a maior rentabilidade
acessível (MARX, 1986). Qualquer unidade, econômica estruturada nos marcos do capitalismo, ou
mesmo Estados Nacionais levam em conta estes elementos para formularem suas políticas internas
e externas de atuação. Tanto para os gestores das unidades econômicas quanto para formuladores de
políticas públicas dos Estados Nacionais, o motivo-lucro, determinação elementar dos
investimentos privados (individual ou macroeconômico), está no centro das tomadas de decisão. O
efeito direto resultante é a busca sistemática por maiores taxas de lucro por parte das unidades
econômicas.
Este movimento incessante de busca por rentabilidade resulta em diversas regularidades
econômicas, dentre as quais a competição entre capitais se apresenta como relevante. A teoria da
concorrência real visa explicá-la, entendendo-a como uma característica inerente das economias
capitalistas pela qual a apropriação de riqueza é tangenciada. Os diversos capitais travam uma
“batalha” constante à procura da maior parcela do mercado e/ou taxa de lucro.
A concorrência é um fenômeno amplamente debatido pelas ciências econômicas e
conceituada por diversas vertentes teóricas e, como afirma McNulty (1967), entrou em debate a
partir do senso comum, mas que hoje é uma peça central no entendimento das economias
capitalistas. A teoria a qual este texto se apoia entende concorrência como um processo, uma guerra
de todos contra todos que leva a diversas regularidades econômicas (SHAIKH, 2016).
Este texto possui 2 objetivos: o primeiro é revisar a literatura seminal da abordagem
clássico-marxista que fundamentam a Teoria da Concorrência Real; e o segundo é revisar a
literatura contemporânea que consolida a Teoria da Concorrência Real, buscando identificar os
padrões conceituais e sintetizar as evidências empíricas. Para isto, se organiza em 3 partes, além
desta introdução e das considerações finais, a saber, i) breve resumo da teoria da concorrência real;
ii) o nível intra-setorial da concorrência e o caso do capital regulador; iii) o nível intersetorial da
concorrência e; iv) síntese das principais evidências empíricas da teoria.

1. TEORIA DA CONCORRÊNCIA REAL: BREVE RESUMO

A competição é maneira pela qual a economia aloca seus recursos entre os capitais, sendo
este um processo pelo qual as leis do capitalismo são evidenciadas. A busca pelo lucro extra se
figura como uma destas leis e é pelas movimentações dos capitais e interações entre si que se
determina a distribuição do lucro. As principais interpretações acerca da concorrência são a
clássico-marxista, que este texto busca evidencia, e a neoclássica.
Na visão neoclássica a competição é conceituada como de natureza estática e buscar analisar
os acontecimentos no momento e não ao longo do tempo. Direciona-se sempre em observar os
comportamentos momentâneos das empresas vendo como elas se estruturam e concorrem entre si.
Essa análise de concorrência está relacionada com o padrão de competição que ao longo do tempo
leva a um ajustamento passivo rumo ao equilíbrio de mercado.
Na concepção clássica, a concorrência é entendida como processo conflituoso e turbulento
que está intrinsecamente ligado a rivalidade entre as empresas no mercado global, ou seja, “uma
guerra” que possui como propósito taxas de lucro mais elevadas. Essa luta constante em virtude de
interesses individuais constitui um infindável processo competitivo dinâmico no mercado. Segundo
Smith,

“Every man, as long as he does not violate the laws of justice, is left perfectly free
to pursue his own interests in his own way, and to bring both his industry and his
capital into competition with those of any other man” (SMITH, Wealth, p. 687,
Apud TSOULFIDIS, 2011, p. 3).

Marx (1986), por sua vez, demonstra um aprimoramento ou alargamento das análises sobre
concorrência elaboradas pelos autores clássicos. Nesta concepção, a concorrência se equipara a um
“conflito de guerra”, evidenciando a natureza instável das leis capitalistas que acarreta em uma
relação de choques de interesses particulares versus interesses particulares. Isto deriva da procura
pela expansão do capital e pela sua própria permanência no mercado.

“Competition is the completest expression of the battle of all against all which
rules in modern civil society. This battle, a battle for life, for existence, for
everything, in case of need a battle of life and death, is fought not between the
different classes of society only, but also between the individual members of these
classes. Each is in the way of the other, and each seeks to crowd out all who are in
his way, and to put himself in their place. The workers are in constant competition
among themselves as are the members of the bourgeoisie among themselves. The
power-loom weaver is in competition with the hand-loom weaver, the unemployed
or ill-paid hand-loom weaver with him who has work or is better paid, each trying
to supplant the other” (ENGELS, Condition of the Working Class in England,
1845, Apud TSOULFIDIS, 2011, p. 15).

A sobrevivência de cada produtor dependerá de sua capacidade de competir, mediante a


redução de seus preços ao mínimo possível, uma vez que a concorrência pelo lucro força a
movimentação dos capitais frente aos preços de seus concorrentes. A condição necessária para tal se
estabelece reduzindo custos unitários, comumente por introdução de inovações tecnológicas 3. Neste
sentido, é do próprio funcionamento da acumulação de capital (transformação da mais-valia em
capital novo ou expansão do capital existente) que se deriva a concorrência. Ou seja, é resultado das
leis do capitalismo quando a análise leva em consideração a existência de muitos capitais. Nos
termos de Marx (1986, p. 546),

“O que reside na natureza do capital só é realmente posto para fora dele, como
necessidade exterior, pela concorrência, que nada mais significa que os muitos
capitais impõem uns aos outros e a si próprios as determinações imanentes do
capital” (MARX,1986, p. 546).

No capitalismo, os produtores individuais só sabem se seus produtos atenderão a uma


necessidade social à medida que tentam vendê-los no seu espaço-mor de socialização, a saber, no
mercado. Nesta abordagem, tanto empresas grandes quanto pequenas são entendidas como agentes
que formam preços mediante redução agressiva de custos unitários e aumento da participação de
mercado. A concepção Marxista de concorrência centra-se na ideia de firmas formadoras de preços
de mercado que são atraídas a formação de um preço setorial pela concorrência.
Cabe ressaltar a diferenciação entre firmas e capitais. A primeira é responsável pela
determinação dos preços e por operar as condições de produção. Estas condições empregadas pelos
capitais se figuram como uma forma social particular de riqueza, que tem como matriz intrínseca de
sua existência a necessidade de auto-expansão, o motivo lucro (SOUZA SILVA, 2017). Por isso,
esta teoria compreende a dinâmica competitiva não apenas na instância das firmas, podendo esta
operar diversos capitais e os mesmo estarem concorrendo entre si mesmo, estando dentro da mesma
estrutura hierárquica.
O quadro 1 a seguir apresenta como se dá a formação dos preços a partir desta abordagem.

Quadro 1 – Valor e Preços em Marx


VALOR E PREÇOS FÓRMULAS
Valor do Capital Mercadoria c’ + v + m
Preço de Custo c’ + v
Preço de Produção c’ + v + l’·(c+v)
Preço de Venda c’ + v + l’·(c+v), a taxa de lucro varia com a oferta e
demanda
c: capital constante;
c’: capital constante consumido (capital constante circulante + depreciação do capital fixo);
v: capital variável;
m: mais-valia;
3
“Tem de revolucionar as condições técnicas e sociais do processo de trabalho, portanto o próprio modo de produção, a
fim de aumentar a força produtiva do trabalho, mediante o aumento da força produtiva do trabalho reduzir o valor da
força de trabalho, e assim encurtar parte da jornada de trabalho necessária para a reprodução deste valor.” (MARX,
1996, p. 431).
l’: taxa média de lucro.
Fonte: Poli, 2019.

A teoria marxista (1986) aponta que o preço de produção4 atua como um centro de
gravitacional para o preço de mercado, assim as variações de oferta e demanda causam desvios
destes em torno de centros móveis de gravidade. Os preços de mercado divergem do preço de
produção, mas são “puxados” pela gravidade causada pela concorrência. Os preços de mercado, por
sua vez, não convergem ao preço de produção, mas se aproximam de forma turbulenta devido a
batalha entre os capitais que constantemente os modifica devido a dinâmica dos capitais frente aos
seus concorrentes.
Neste sentido, a concorrência clássica é entendida como um processo ativo e turbulento,
cujas firmas atuam visando rebaixar os preços, mediante rebaixamento de seus custos unitários.
Como afirma McNulty (1967), a concorrência não é um estado ou um momento em que os agentes
partícipes têm ação passiva, mas sim um processo ativo de tomada de decisão por parte de cada
firma. É por isto que, conforme Moudud (2013), estruturas de mercado ou número de firmas em
uma indústria não cumpre qualquer papel na caracterização do processo competitivo, pois este se dá
em instâncias entre capitais, podendo firmas de outro setor se apresentarem como possíveis
concorrentes a depender da taxa de lucro do setor.
No processo produtivo, a concorrência aparece relacionada à redução dos custos de
produção, mediante processo de inovação tecnológica. Essa redução dos custos conduz à realocação
do capital (transferência de mais-valia) para firmas e indústrias mais competitivas. A competição
entre firmas de uma mesma indústria (concorrência intra-setorial) equaliza o preço de venda (preço
de mercado), mesmo que as condições de produção das unidades produtivas se diferenciem. Por sua
vez, a competição entre diferentes indústrias (concorrência intersetorial) tende a equalizar as taxas
de lucros desses diferentes setores, mediante a formação dos preços de produção.
Este é o padrão mais elementar da competição, segundo Shaikh (2016), posto que, por um
lado, equaliza dos preços em um setor e, por outro, equaliza a taxa de lucro entre as indústrias. Essa
dinâmica contraditória é possível dado que a concepção de concorrência clássico-marxista entende
o processo em dois níveis, setorial e intersetorial. Isto ocorre de modo turbulento, distintamente da
noção de equilíbrio como um estado de repouso.
Os preços dos distintos vendedores são equalizados mediante a tentativa executada por cada
unidade individual em levar vantagem sobre seu concorrente 5. A taxa de lucro sobre novos
investimentos é equalizada num período de tempo mais longo. O resultado deste padrão elementar
4
Preço de Produção = Custo de Produção + Lucro Médio. “[...] só a concorrência dos capitais nas diversas esferas traz à
luz o preço de produção que equaliza as taxas de lucro entre as diversas esferas. Neste caso é necessário um grau mais
elevado de desenvolvimento do modo de produção capitalista do que no anterior.” (MARX, 1986, p.140).
5
“Competition pits seller against seller, seller against buyer, and buyer against buyer. It pits capital against capital,
capital against labor, and labor against labor. It operates not only on prices and profits but also on wages and rents .”
(SHAIKH, 2016, p. 260).
(equalização dos preços entre empresas de uma mesma indústria e das taxas de lucro entre os
setores) é uma flutuação perpétua de preços de mercado e da taxa de lucro individual em torno de
diversos centros “móveis” de gravidade.
Os centros móveis de gravidade são capitais dentro de um setor que possuem as melhores
condições de produções replicáveis. Shaikh (2016) conceitua como capital regulador, conceito que
será melhor elaborado a frente. A equalização das taxas de lucro intersetoriais ocorrem entre estes
capitais, que são responsáveis também pela equalização dos preços de produção, uma vez que
possuem as melhores condições de produção os demais capitais seguem a sua precificação.
Os movimentos de oferta e demanda são importantes, pois os demandantes se dirigem para
preços mais baixos, mas não decisivos na determinação dos preços. Isto porque ambas, oferta e
demanda, podem mudar em resposta à redução dos preços e à mobilidade de capital. Este padrão da
concorrência real deriva de ações individuais não planejadas, buscando lucros maiores e representa
uma propriedade emergente quintessencial. As firmas, no bojo da competição real, devem valer-se
de táticas e estratégias, buscando o crescimento. O lucro – motivação da firma, em última instância
– deve ser defendido a médio prazo contra todos os tipos de predadores.
No campo de batalha que é a competição real, a mobilidade de capital seria como o
movimento das tropas de um terreno a outro; o desenvolvimento e adoção de tecnologias seria
como uma corrida armamentícia; e a luta pela expansão do lucro e da participação no mercado seria
a batalha em si (SHAIKH, 2016; MOUDUD, 2013; TSOULFIDIS, TSALIKI, 2013).

2. NÍVEL INTRA-SETORIAL DA CONCORRÊNCIA E CAPITAL REGULADOR

Marx (1986) desenvolve a teoria de concorrência, a fim de compreender quais os efeitos e


tendências a concorrência causa a economia capitalista. A teoria aponta que concorrência ocorre
simultaneamente em duas instâncias: intra-setorial e intersetorial. Os dois processos causam efeitos
contrários sobre as taxas de lucro. Na concorrência intra-setorial as taxas de lucro tendem a impor
uma hierarquia entre os capitais do mesmo setor e na concorrência intersetorial as taxas de lucro
aproximam-se de uma equalização entre diversos setores (MALDONADO, 1989). Estes efeitos
ocorrem devido às diferentes composições dos capitais e a mobilidade de novos investimentos entre
os mesmos, respectivamente. Nesta seção será abordado sobre a concorrência no nível intra-setorial
e sobre uma forma particular de capital: o capital regulador.

2.1. Concorrência Intra-setorial


O efeito inicial da concorrência a nível intra-setorial, conforme Marx (1986), Maldonado
(1989) e Shaikh (2016), é a criação do preço de regulador das vendas (preço de venda). Dentro de
um setor, as firmas definem um preço pelo qual sua produção será transacionada. Esta precificação
individual é baseada nos custos unitários de cada capital, sendo definido com base nas suas
capacidades produtivas. É neste ponto que concorrência cria diferenciais de rentabilidade entre as
firmas, já que a composição produtiva de cada capital possui custos unitários distintos. Logo ao
precificarem de acordo com seus custos os retornos esperados por cada capital será diferente entre
si. Como destaca Moudud (2013) todas as firmas, independente de seus tamanhos, buscam formular
preço e o que sustenta a precificação são os custos mínimos individuais. Este processo gera diversos
preços que serão levados ao mercado e o conflito entre os capitais irá definir um preço setorial.
Os capitais instalados (ou condição de produção) que possuem menor custo unitário podem
praticar preços mais agressivos a fim de expulsarem capitais com maior custo. Esta tendência
impele outras firmas (ou plantas industriais de mesma firma) a pratiquem preços correlatos mesmo
com custo unitários distintos.
Desta forma os diversos preços individuais estabelecidos pelas firmas, tendem a se
aproximar de um preço geral para se manter no mercado. Esta tendência à equalização dos preços
de venda é definida por Marx (1986) como Preço de Venda e Shaikh (2016) conceitua como Lei
dos Preços Correlatos (LPC).
O segundo efeito da concorrência a nível intra-setorial, segundo Marx (1986), é a criação de
diferenciais de rentabilidade. Como os capitais possuem composição orgânica 6 distintas, suas taxas
de lucro também serão distintas, pois a precificação se baseia nos seus custos individuais, mas os
preços que serão exercidos convergem ao preço de venda. Já que a concorrência força a prática de
preços correlatos, capitais que possuem custos mais baixos podem praticar preços menores e
conquistar mercado, outros capitais com custos elevados são forçados a praticarem preços
semelhantes, o que diminui sua margem de lucro ou caso o preço seja impraticável, dado seus
custos, os forçam a deixar aquele mercado. Marx (1986) afirma que os diferenciais intra-setorias de
lucro são consequências da organização capitalista. Segundo ele,

[...] em função da diferente composição orgânica dos capitais e, dentro dos


limites indicados, também em função de seus diferentes períodos de rotação,
reinam taxas de lucro desiguais a diversidade das taxas médias nos diferentes
ramos industriais de lucro não existe nem poderia existir, sem abolir todo o
sistema de produção capitalista. (MARX, 1986, p 118).

6
Sinteticamente, conforme Marx (1996), Composição Orgânica do Capital é uma relação de divisão entre Capital
Constante (gastos com meios de produção no processo de produção) e Capital Variável (gastos com força de trabalho
no processo de produção), ou composição-valor do capital, explicada pela composição técnica – relação entre os meios
de produção (sob ótica material) e trabalho concreto (em horas trabalhadas necessárias). Ou seja, composição orgânica
do capital é a composição-valor em função da composição técnica do capital.
A diversidade na composição de capitais cria diferentes taxas de retorno e por isso, como
propõe Maldonado (1989), a concorrência cria hierarquias nas taxas de lucro do mesmo setor. É
justamente estes diferenciais que irão motivar a mobilidade de novos investimentos interindustrial,
para composições com maior taxa de lucro. Esta é a outra instância da concorrência (a concorrência
intersetorial) e impõe uma batalha não mais entre capitais (ou condições de produção), mas entre os
capitais que estabelecem as condições de precificação dentro de cada indústria ou capital regulador.
Isto se reflete em um processo de mobilidade de capital entre os ramos industriais.
O corte de custos torna-se central para a sustentabilidade das firmas em meio a esta
turbulenta guerra concorrencial, que só é possível através de inovações tecnológicas que
possibilitam minimizar os custos. Assim, como se vê em Marx (1986), Moudud (2013), McNutty
(1967) e Shaikh (2016), a concorrência é entendida como um processo que é agressivo e endógeno
a estrutura capitalista, que força os capitais a competir através de rebaixamento de preço e
conquistas do mercado de outros capitais. Nesta guerra de todos contra todos a vantagem vai para o
capital com menor custo (SHAIKH, 2016). Os capitais com menores custos unitários e maiores
possibilidades de replicação, como será visto na noção de capital regulador, são aqueles que têm
maiores condições de receber investimentos intersetoriais.
Dado que a principal ferramenta utilizada pelos capitais para competir é o corte de custos,
Moudud (2010) aponta a capacidade ociosa como uma das ferramentas no controle dos custos. Ele
descreve esta capacidade ociosa como planejadas e não planejadas, ex ante e ex post
respectivamente. Esta ociosidade permite um intervalo de decisões do capitalista em relação a
mercadoria força de trabalho, que o permite diminuir seus custos laborais. Esta capacidade ociosa é
normal às economias capitalistas, tendo em vista que trabalhar em capacidade máxima acarretaria
em altos custos laborais e de manutenção, pois segundo o autor:

Of course, total fixed capital cost per unit output will fall as output rises as a
consequence of nighttime or weekend operations. If the higher costs that are thus
incurred from additional shifts and/or additional repair/ maintenance work exceed
the falling average fixed costs then the plant will be deliberately kept idle during
nighttimes or weekends. The normal or optimal level of capacity utilization that is
chosen ex ante by the entrepreneur is that range of output at which these two
opposing sets of unit costs more or less balance each other. Under- or
overutilization of the capital stock is defined with respect to this normal rate of
capacity utilization (MOUDUD, 2010, p 12)

Assim, o controle de capacidade ociosa também se configura em uma das armas utilizadas
nesta guerra concorrencial. Esta percepção contrapõe a noção convencional de competição, cujo
estado “ótimo” da economia está no ponto em que todos os recursos são plenamente utilizados.
Como afirma Moudud (2010), a ociosidade é modus operandi do capitalismo e se configura como
uma das ferramentas de pressionar os custos laborais do mercado de trabalho.
A noção de teoria da concorrência real compreende que todas as firmas, grandes ou
pequenas, buscam formular preço e controlar custos. Elas se figuram como instituições agressivas
frente aos demais capitais, buscando constantemente, através dos cortes nos preços, expulsar seus
concorrentes do mercado a fim de obterem a maior taxa de lucro (MOUDUD, 2013).
Cabe adenda o que se define como a melhor condição de produção ou a que possui a maior
taxa de lucro e como a dinâmica intra-setorial de precificação acontece. As tabelas a seguir
demonstram os efeitos concorrenciais intra-industrial sobre as taxas de lucro desta economia
fictícia.

Tabela 1 – Competição Intra-industrial

Na tabela 1, o capital C representa a melhor condição de produção dessa economia, pois


possui a maior taxa de lucro a um preço corrente de 100. O método de produção D é a segunda taxa
de lucro mais atrativa deste setor, mas diferente do método C seu custo unitário de produção é
inferior aos demais capitais o que o torna como capital com melhores condições de competição
frente a seus concorrentes, já que este pode fazer cortes agressivos dos preços ao mínimo a fim de
expulsar seus concorrentes do mercado.

Tabela 2 – Efeitos da Redução dos Preços Sobre as Taxas de Lucro Relativas

A segunda tabela apresenta os efeitos de redução nos preços sobre a taxa de lucro relativa,
efeitos derivados dos cortes nos preços empregado pela concorrência. Neste cenário, o preço
corrente foi reduzido a 89,5 tornando o método de produção D com taxa de lucro equivalente ao
método C. No entanto o custo unitário de D é de 76 frente ao custo de 78 do capital C que antes se
apresentava com a maior taxa de lucro, o preço corrente neste segundo cenário é crítico para os
demais capitais a qualquer movimento de corte nos preços exercidos pelo capital D pode levar os
demais concorrentes a sair deste mercado.

2.2. A noção de capital regulador

Em situações normais de concorrência, ou seja, cujas condições de produção são replicáveis,


a mobilidade de capital aplica-se aos capitais novos, já que em capitais antigos não existe a
possibilidade de corte de custo por aumento da produtividade do trabalho. A questão é, dado que a
mobilidade de capitais ocorre, para onde estes irão migrar? De acordo com Marx (1986), a
migração de novos capitais ocorrerá para um capital específico, que Shaikh (2016) denomina de
capital regulador. Este seria o capital que está expresso nas melhores condições de produção
replicável em uma indústria, que operam com os menores custos replicáveis possíveis e regulam a
concorrência intra-setorial e intersetorial. Neste sentido, capitais reguladores não são apenas aqueles
de menores custos, mas aqueles que têm os menores custos replicáveis.
A qualidade de ser replicável é fundamental, pois novos investimentos devem ser capazes
reproduzir as condições daqueles capitais particulares. Por isso os novos capitais necessariamente
devem de ser capazes de reproduzir as condições dos capitais de setores que possuam taxas de
lucros crescentes. As taxas de lucro dos capitais reguladores serão o foco dos novos investimentos.
Quando as taxas de lucro dos capitais reguladores de uma indústria são maiores que as de outras,
novos investimentos migram aceleradamente e vice-versa.
Esta condição de ser replicável é importante e dita a dinâmica de mobilidade dos capitais e
sua expansão pois, reproduzir as condições de produção mesmo com perda de qualidade, dá acesso
aos lucros crescentes acessados por determinados capitais. Caso tal capital não seja replicável os
lucros auferidos pelo mesmo serão crescentes até as barreiras à entrada naquele setor sejam
fragilizadas. Como afirma Moudud (2013), as barreiras à entrada ao longo do tempo sofrem com
um processo de porosidade, cujos novos capitais se aproveitam de tais brechas para entrar em
concorrência pelo lucro.
Para fins didáticos, Marx (1986) trabalha com a ideia de que o capital regulador será aquele
que possui condições médias de produção. Logo este capital pode empregar o preço de produção do
setor, no entanto não aufere superlucro, já que seus custos não estão a baixo do preço de produção,
mas podem se manter concorrendo já que seus custos não são superiores ao preço médio.
Shaikh (2016), por sua vez, afirma que as condições médias como capital regulador só
podem ocorrer se as formas de produzir de uma indústria sejam próximas ou iguais. Se Marx
(1986), ao trabalhar em um nível elevado de abstração, apresenta o capital regulador como aquele
que possui as condições médias de produção, Shaikh (2016) traz a discussão teórica para o campo
empírico. Neste sentido, para ele, o capital regulador não está no capital médio, mas no capital
modal. Isto quer dizer que o capital regulador de uma dada indústria se figura como aquele que mais
se repete entre as firmas de uma mesma indústria e não a média daquele setor. Esta concepção
reforça a ideia de que a replicabilidade do capital é importante para novos investimentos, já que um
capital modal possivelmente será, dentre os que auferem maiores taxas de lucro, o mais facilmente
replicável mesmo que haja ajuste de qualidade.
Moudud (2010), ao analisar os estudos de pesquisadores de Oxford, aponta que as
conclusões dos mesmos convergem com a noção clássico-marxista de competição, mesmo que estes
não tenham a tomado como base e formulam a ideia de líderes de preço em uma indústria. Este
grupo chega à conclusão que, dentro das indústrias, existe o que denominam price leaders (líderes
de preços), que são firmas que lideram a precificação de um setor.

Now, since competition within an industry produces approximately equal prices, it


follows that the above normal profits correspond to the most cost-efficient firms,
which become the targets of potential new investment. It is the selling prices of
these most efficient firms that determine the long- run industry supply- price. In
short, it is the so- called ‘price leaders’ within each industry that may face the
ignominy of losing their market shares to new entrants. This aspect of Andrews’s
theory of competition bears a striking resemblance to the notion of a regulating
capital. (MOUDUD, 2010, p 20).

É interessante notar que firmas mais eficientes são alvos de novos investimentos. Para
Shaikh (2016), novos investimentos têm como alvo principal a taxa de lucro mais elevada. No
entanto, estes novos investimentos só podem ser concretizados como capital instalado caso este
possua a condição de se replicar. Segundo ele, o capital regulador pode ter várias formas, como as
condições médias de uma indústria. Esta condição, a mesma trabalhada por Marx, é a mais simples
e exige que a tecnologia de produção seja bem próxima entre as firmas.
Há também a possibilidade de que os capitais de maiores custos regulem o setor, cujos
capitais que têm as melhores condições não são replicáveis 7. Este é o caso de setores com barreiras

7
Este é o caso da agricultura e mineração, por exemplo. A ampliação da produção em curto prazo, nestas atividades só
é feita caso haja disponibilidade de novas minas e terras agricultáveis (condições de produção elementares). Em regiões
com diagnóstico agronômico e geológico completo, as melhores condições já estão em uso. Havendo demanda para
estes produtos agrícolas e minerais, a ocupação de novas terras e minas se dará nas de pior qualidade. Desse modo, estas
condições de produção assumem o lugar de capital regulador no interior das indústrias agrícolas e minerárias. Cabe
salientar que a mesma análise pode ser feita para qualquer atividade cuja condição de produção elementar não é
replicável, como aquelas que são protegidas pelo direito de propriedade intelectual. Para maiores aprofundamentos, ver
Marx (1986, Seção VI “Metamorfose do Sobrelucro em Renda Fundiária”).
à entrada em função do monopólio sobre a condição mais elementar de produção. Pra Marx (1986),
estas indústrias com monopólio não participam da equalização das taxas setoriais de lucro, em que
pese que os capitalistas que invistam nestes setores o fazem visando auferir ao menos a taxa média
de lucro. Shaikh (2016) afirma que a margem de cultivo/extração será a condição de regulação para
estes casos, o que implica um superlucro, ou renda da terra (rendimento dos proprietários), nos
termos de Marx, para as condições de produção de menos custos.
Por fim, os capitais de menor custo podem ser reguladores. Isso ocorre quando há capitais
antigos no setor que não são mais competitivos, dado suas condições. Nestes casos, capitais com
menores custos são os reguladores – obviamente entendendo que tais condições são replicáveis.
Estas são as principais formas que Shaikh (2016) destaca, para o que ele conceitua como Condições
Reguladoras de Produção.
A concorrência a nível intrasetorial tem como ponto central o corte nos custos, sendo este
processo de alta agressividade entre os capitais, comparável a uma guerra. Por consequência
causam desequilíbrio nas taxas de lucro, criando uma hierarquização destas taxas que é diretamente
proporcional ao nível da composição orgânica do capital. Alguns capitais dentro das indústrias
regulam a mobilidade intersetorial, de modo que suas as taxas de lucro passam pelo processo de
equalização ao longo do tempo.

3. NÍVEL INTERSETORIAL

A concorrência a nível intra-setorial cria um efeito de desequilíbrio das taxas de lucro e


equalização nos preços de venda de um setor. Por sua vez, a concorrência intercapitalista ou a nível
intersetorial equaliza as taxas de lucro entre os diversos setores. Este contrabalanço deriva-se, pois,
da necessidade de auto expansão do capital (motivo lucro), coloca-o em movimento, a fim de se
alocar nos circuitos que possuem a maior rentabilidade, independe de qual seja sua produção. Por
isso a mobilidade de capitais entre setores é fundamental para manutenção dos níveis de
acumulação do capital.
Os gráficos 1 e 2 a seguir ilustram esse processo de equalização. Para isto, são apresentadas
as taxas de lucro de três setores (1, 2 e 3), com nove capitais (A, B, C ... J) cada, de modo a
evidenciar a mobilidade de capital entre estes três setores desta economia hipotética.
Percebe-se que o capital F (amarelo) do segundo setor possui a maior taxa de lucro dessa
economia. Assumindo que o capital F é o regulador do setor 2 e que haja livre mobilidade de
capital, a concorrência impele que os novos investimentos dos capitais com taxas de lucro baixas
(ex. capitais dos setores 1 e 3, sobretudo o capital C e I) naquele capital 8. Logo os capitais C e I
8
Esta inversão só é possível caso exista um sistema financeiro que possibilite tal movimentação. Ademais, a aplicação
do capital dinheiro (forma “líquida” do capital) não precisa, necessariamente, ocorrer mediante conversão em capital
transferem seu capital latente na forma de investimento para o setor 2 em busca da taxa de lucro
mais elevada, admitindo que este capital seja replicável.

Gráfico 1: Taxas de lucro de capitais antes da equalização

A
B G H J

C I

Fonte: Elaboração Própria.

O movimento intersetorial dos capitais C setor 1 e I setor 3, por exemplo, aumenta a


produção no setor 2 em relação a demanda, à medida que novos capitais se movimentam em direção
a maior taxa de retorno, a implementação de novos circuitos e/ou expansão dos circuitos existentes
irá rebaixar os preços e consequentemente as taxas de lucro. Mas o que ocorre, por exemplo, com o
Capital G setor 2? A dinâmica deste capital orbita em torno do capital regulador do setor, que por
hipótese, é o capital com maior taxa de lucro. Neste caso, a sobrevivência do capital G depende da
agressividade com a qual os demais capitais cortam seus preços e/ou de sua capacidade de
inovação.
A concorrência a nível intra-setorial, ao impor uma hierarquia nas taxas de lucro, motiva que
outros capitais se instalem no setor de maior rentabilidade. Este processo acarreta em uma migração
constante entre setores de novos investimentos (concorrência intersetorial). Na medida em que as
taxas de lucro reagem a migração, os capitais também reagem e se põe em movimento rumo às
novas estruturas de maior lucro. Como o capitalismo está em constante expansão a concorrência
intersetorial não chega a convergência e sim a equalização.
Por resultados desses movimentos a teoria de concorrência real aponta que a taxa de lucro da
economia é levada a equalização. O gráfico 2 demonstra esta tendência. Após um longo período de
transferência de capital intersetorial, percebe-se que devido a oscilação constante a entrada e saída
de investimentos ao rebaixar e ampliar o volume de produção intrasetoriais provocam um processo
de equalização das taxas de lucro nos capitais que recebem estes novos investimentos.

produtivo, mas na forma de ativos financeiros. Para maiores aprofundamentos, ver Shaikh (2016, cap. 10).
Gráfico 2: Taxas de lucro de capitais após a equalização

Fonte: Elaboração Própria.

Como a concorrência a nível intra-setorial garante que as taxas de lucros entre aquelas
indústrias sejam diferentes, a nível intersetorial a mobilidade de capital é motivada por estes
diferenciais, já que capitais de outras indústrias podem auferir um lucro maior. A teoria afirma que,
a nível intersetorial, a tendência é que estes diferenciais entre indústrias oscilem em torno de zero
pois a mobilidade de capitais faz com que taxas de lucros crescem e decrescem constantemente.
Marx (1986) afirma que esta tendência irá ocorrer em países com capitalismo mais avançado, pois
assume-se que barreiras a entradas de capital em setores não monopolistas são menores ou que tais
empecilhos são suavizados. Conforme Semmler (1985)

De acordo com essa teoria, a oferta e procura nunca são iguais. As diferenças nas
taxas de lucro causadas pelas diferenças na produtividade, razão capital/ produto,
parcelas de salário e taxas de crescimento de indústrias podem ser explicadas pelas
diferenças no tempo levado para ajustar a oferta e procura; ou seja, o tempo para
construir a nova capacidade, para produzir e circular as mercadorias, onde a taxa de
lucro é alta, e para reduzir a capacidade e retirar capital das indústrias com baixas
taxas de lucro. (SEMMLER, 1985, p 20).

Cabe salientar que, como apontam Tsoulfidis e Tsaliki (2013) e Vaona (2011), tendência à
equalização não é identidade a tendência à convergência, mas sim de gravitação. O fato de as
distintas taxas de lucro gravitarem em torno de uma taxa média permite que oportunidades de
lucratividade sejam exploradas, no caso, que capitais cujo setor produza rentabilidade baixa migre
para aquele com rentabilidade mais elevada. Uma concepção de convergência impossibilita este
movimento, já que, ocorrendo a igualdade, qualquer desequilíbrio nas taxas de lucro seria causado
por fatores exógenos. Logo, o comportamento dos capitais de buscar de modo persistente as
maiores taxas de lucro (motivo-lucro) inexistiria.
As figuras 1 e 2 evidenciam a diferença entre gravitação e convergência. Na figura 1, os
desvios em relação a taxa de lucro média tendem a convergir por hipótese, enquanto que, na figura
2, por sua vez, os desvios tendem a gravitar por hipótese.

Figura 1: Convergência de taxas simulada de lucro entre 2 indústrias

Fonte: Vaona (2011, p. 466).

Figura 2: Gravitação das taxas simuladas de lucro entre 2 indústrias

Fonte: Vaona (2011, p. 466).

A existência de diferenciais nas taxas de lucro implica que novos investimentos se movem
mais velozmente para indústrias com maiores taxas de lucro. Os novos investimentos irão acelerar a
produção daqueles capitais e, se a produção cresce mais do que a demanda, isso irá rebaixar as taxas
de lucro daquela indústria. Os novos investimentos irão acontecer até que o nível de produção
supere a demanda. Caso os novos investimentos não façam a produção superar a demanda os lucros
daquele setor irão crescer ainda mais. Caso haja este excesso da demanda se finde (o que se espera),
as taxas de lucro irão cair, como afirmam Marx (1986), Shaikh (2016), Moudud (2012) e
Maldonado (1989).
O que ocorre nas industriais cujo capital saiu é o efeito contrário. Como não há novos
investimentos, a produção irá cair em relação demanda, o que eleva os preços daquela indústria.
Assim, as taxas de lucro tendem a crescer nas indústrias de cujo capital saiu e tendem a decrescer
naquelas para onde ocorre a migração. Este processo ocorre constantemente por isso no longo prazo
a soma dos diferenciais entre indústrias aproxima-se de zero, de modo assintótico, até a introdução
de inovação tecnológica que altere a taxa de lucro as condições de produção que façam uso desta
nova tecnologia em relação àquelas que não fazem uso. Como o capitalismo está em constante
expansão as taxas de lucro não serão zero, mas os diferenciais entre as mesmas tendem gravitar em
torno de zero.
Como afirmam Tsoulfidis e Tsaliki (2013), as taxas de lucro orbitam tendencialmente em
torno de uma média, mas continuam sendo diferentes da média. A mobilidade interindustrial de
capital, ao causarem oscilações da taxa de lucro setorial em torno de uma média, permitem que os
diferenciais persistam, fazendo que as taxas de lucro orbitam em torno da média. Por fim, cabe
ressaltar que estes diferencias não irão se igualar a zero, mas sim que as taxas setoriais de lucro
tendem a se aproximam da taxa de lucro média da economia, criando diferenciais ora positivos e
ora negativos. Shaikh (1998) conceitua este movimento das taxas de lucro em torno de uma média
como arbitragem turbulenta.
Ademais, a concorrência a nível intersetorial produz algumas regularidades que atuam sobre
as unidades produtivas. As firmas que operam capitais reguladores liderarem os preços de seus
produtos frente aos concorrentes, denominados de líderes de preços (price-leaders) pelos
pesquisadores do grupo de Oxford e de condições reguladoras de produção por Shaikh (2016).
Firmas que operam capitais não-reguladores são seguidores de preços (price-followers) e devem se
adaptar aos preços de venda dos líderes de preço; seus lucros representam o resíduo: a margem de
lucro e a taxa de lucro dos capitais não-reguladores dependem de seus próprios custos. Este é o
primeiro grande efeito da competição real.
O segundo grande efeito é que mobilidade de capital conduz à equalização das taxas de
lucro dos capitais nas melhores condições replicáveis de produção em cada indústria. Assim, a
equalização ocorre mediante mobilidade de capital que tende a equalizar as taxas de lucro dos
capitais nas condições reguladoras. Este segundo efeito tem duas implicações: para os capitais
reguladores, a margem de lucro (razão lucro-produto) será maior nas indústrias com maior
intensidade do capital (razão capital-produto). Isto não significa competição imperfeita (ausência de
competição perfeita), mas competição real, e; a indústria com custos de investimento inicial maior
terá custos de entrada e de saída maiores, logo, tem maior capacidade de absorver as flutuações de
produção, pois lida melhor com variações na utilização da capacidade instalada (possui maior
capacidade de reserva) e tem preços mais estáveis (sofre menos por flutuações derivadas de
entradas e saídas de capitais). Isto não diz respeito a “falhas de mercado” ou estruturas
monopolistas ou oligopolistas. Isto é a competição real.
Outro fenômeno criado pela equalização das taxas de lucro dos capitais reguladores (ou
equalização das taxas de lucro setoriais) é uma condição momentânea de hierarquização. O fato de
as taxas de lucro não tenderem a convergência intersetorial (se igualarem), mas sim a gravitação em
torno de uma média, produz diferenciais persistentes de taxas de lucro de cada setor em relação à
média. Este fenômeno possibilita mobilidade incessante de capital latente (que ainda não se
converteu em condição de produção) entre distintos setores em busca de maiores taxas de
rentabilidade.
Em um dado período de tempo, setores cujo diferencial de taxa de lucro é positivo podem
ser atrativos e passam a assimilar blocos de investimento, enquanto que em setores, cujo diferencial
é negativo, ocorre o inverso. Ou seja, indústrias tornam-se atrativas para novas entradas de capitais
a depender do tamanho do diferencial positivo de taxa de lucro e de suas características técnicas.
Isto cria uma ordem de prioridade, ou condição momentânea de hierarquização, à mobilidade dos
novos capitais preferindo adentrar naquelas indústrias cujo diferencial de taxa de lucro é
positivamente elevado (ponderado por suas características técnicas) e sendo repelido daquelas cujo
diferencial é negativamente elevado.
As regularidades causadas pela concorrência podem ser sintetizadas no quadro a seguir:

Quadro 1: Efeitos da concorrência real


EFEITOS INTRASETORIAL INTERSETORIAL
Precificação diferenciada cria hierarquia nas taxas de
Preços Todas as empresas buscam formar preço lucro que impulsionam a migração intersetorial de
blocos de investimentos
Capitais com menor custo tem vantagem nesta Capital regulador, que se estrutura com diferenciais
Capital competição e os demais tendem a seguir sua positivos e reprodutibilidade, é alvo de equalização
precificação. (price-leaders) das taxas de lucro.
Formação do preço de venda de concorrência
A mobilidade de investimentos entre setores aumenta
dentro do setor, estabelecido pelo capital
Investimentos produtividade em relação a demanda e rebaixa taxa de
regulador, estimulando investimentos na
lucro.
condição de produção do capital regulador
Concorrência hierarquiza as taxas de lucro,
Equalização das taxas de lucro entre as indústrias com
Taxa de diferenciando as taxas de lucro dos capitais não
condições reprodutíveis.
reguladores em relação ao capital regulador
Efeito final Preço de Venda Equalizado Taxa Lucro Equalizada
Fonte: elaboração própria.

4. EVIDÊNCIA EMPÍRICA

A teoria de concorrência real possui uma vasta literatura com investigação empírica para as
hipóteses acima apresentadas. Esta seção expõe os principais trabalhos que testam qualificadamente
a tendência interindustrial de equalização das taxas de lucro. No entanto, cabe fazer alguns
destaques.
Primeiramente, até a década de 1980, os estudos empíricos sobre concorrência se baseava na
noção de estruturas de mercado neoclássica. O artigo de Shaikh (1982), neste sentido, é seminal
dado que o mesmo contrapõe a noção “vulgar” baseada na concepção de competição perfeita. Este
trabalho foi fundamental para a teoria de concorrência real, ao regatar a noção de McNulty (1967)
de concorrência como processo. A partir deste estudo, a década de 1980 torna-se um marco no
embate entre as vertentes teóricas de interpretação da concorrência, tendo a teoria de concorrência
real visando evidenciar a competição como um fenômeno de todo o processo produtivo (D – M ... P
... M’ – D’) e não apenas da instância de circulação das mercadorias, como propõe a teoria
mainstream.
O principal desdobramento desta argumentação é demonstrar que o conceito de estruturas de
mercado é insuficiente para explicar a dinâmica concorrencial, pois supõe diferençais positivos
persistentes as industrias oligopolistas/monopolistas, argumentação empiricamente invalidada,
conforme Semmler (1985) e Maldonado (1990). A partir da década de 1990, o interesse dos estudos
localizava-se em “microfundamentar” a teoria, sobretudo estabelecendo uma metodologia de
cálculo para taxa de lucro. Vale destacar a contribuição seminal de Shaikh (1995), cuja formulação
de metodologia de taxa de retorno sobre novos capitais apareceu pela primeira vez. A formulação
acabada da taxa de retorno incremental (Incremental Rate of Return – IROR) apareceu em Shaikh
(2008). Os principais estudos empíricos contemporâneos se baseiam em IROR, proxy que captura o
comportamento do capital regulador. A partir dos anos 2000, tornou-se central evidenciar
empiricamente a equalização intersetorial da taxa de lucro, onde se destaca Dumenil e Levy (2002).
Os trabalhos a seguir apontam de forma categórica a relevância da teoria de concorrência real para o
entendimento da economia capitalista.
Semmler (1985) traz importante contribuição ao analisar as afirmações das teorias clássico-
marxistas e neoclássicas, a partir da evidencia empírica. O estudo analisa a questão do “monopólio”
e os diferenciais de taxa de lucro. A pesquisa apresenta uma relação entre concentração da indústria
e diferenciais persistentes acima da média da economia, conforme defende a teoria mainstream de
monopólio/oligopólio. No entanto, Semmler afirma que os estudos que se pautaram nestas hipóteses
apresentam uma metodologia frágil e com um conjunto de base de dados insuficiente para
evidenciar diferencias persistentes ao longo do tempo. Tais estudos utilizam metodologias com
dados de corte transversal (cross-section), que não são apropriadas para uma análise de tendência
econômica. Além disso, os diferencias de lucro são resultantes do aumento de produtividade e não
evidenciam poder de mercado como aponta Tsoulfidis (2019).
Glick e Ehrbar (1988) são pioneiros na análise de equalização interindustrial, analisando
diversos países. A metodologia utiliza um modelo que verifica os diferenciais de taxa de lucro entre
setores e os distingue entre três métodos de cálculo para taxa de lucro, afim de refutar estudos de
estrutura de mercado que utilizam metodologias com dados de corte transversal. Os países
analisados foram Estados Unidos, França, Alemanha, Itália e Reino Unido e o período analisado foi
1949 a 1979. Os autores concluem que a metodologia de cálculo da taxa de lucro é central para
detectar uma tendência de longo prazo e seus resultados apontam um processo de longo prazo de
gravitação dos lucros.
Maldonado (1989) faz um estudo empírico para analisar os diferenciais de rentabilidade
entre diversos setores da economia brasileira. O período analisado foi de 1973 a 1985 através de
uma modelo auto-regressivo, com amostra de 45 indústrias. O teste buscou compreender se existem
diferenciais persistentes na taxa de lucro entre setores oligopolistas e setores competitivos. O estudo
concluiu não haver diferencias persistentes nas taxas de lucro das indústrias brasileiras, tanto entre
industrias oligopolistas quanto as concorrenciais.
Vaona (2011) faz sua análise com os países da OCDE a fim de evidenciar, se as taxas
incrementais de retorno sobre capitais (IRORs) apresentam convergência ou equalização rumo a um
valor correlato entres os países. Os países testados para hipóteses foram: Áustria, Finlândia,
Holanda, Itália, Noruega EUA e Alemanha Ocidental. A conclusão é que não há convergência ou
equalização entre os países, mas sim resultados para taxas internas de lucros dos países analisados.
No teste para indústrias manufatureiras as IRORs são tendencialmente equalizadas para Noruega e
Finlândia. Os demais países apresentam convergência. Segundo o autor, os resultados acima seriam
consequências de limitações da mobilidade de capital inter-setorial e custos muito altos de
ajustamento as melhores condições de produções. Por isso, os capitais ainda estariam utilizando
técnicas de produção defasadas, com limitação nas informações dos investidores, ausências de
setores inovadores dentro das industriais e a capacidade dos capitais de atrair novos investimentos.
Bahçe e Eres (2013) conduzem sua investigação de concorrência real para indústria
manufatureira Turca, no período de 1980 a 2001, com amostra de 28 indústrias. Nesta pesquisa,
assim como na maioria da literatura contemporânea, utiliza-se como metodologia para captar a
tendência de equalização a análise das taxas incrementais de retorno sobre capital (IRORs) proposta
por Shaikh (1995, 2008 e 2016). Os resultados indicam um turbulento processo competitivo, em
acordo com a abordagem clássico-marxista, evidenciado por um prolongado processo de mudança
nas hierarquias das taxas de lucro, como apontado em Maldonado (1989). Bahçe e Eres (2013)
aplicam uma metodologia inovadora de ranquear as indústrias por diferenciais de lucratividade em
três períodos 1981, 1990 e 2000, no qual ocorreu mudanças constantes no ranking das indústrias
turcas. Os resultados também sugerem que a indústria manufatureira turca está em conformidade
com a teoria clássico-marxista de concorrência, apresentando uma tendência à equalização das taxas
de lucro intersetoriais ao longo do período de 1980 a 2000.
Shaikh (2016), em um trabalho de fôlego para teoria de concorrência real, analisa 30
indústrias nos EUA no período de 1987 a 2005. Utilizou-se o método da IROR para testar a
hipótese de equalização intersetorial das taxas de lucro em relação à média da economia. A
evidência empírica aponta um forte agrupamento das IRORs em torno de uma tendência central.
Das 30 indústrias analisadas 18 delas apresentam comportamento de aproximação a média da
economia, enquanto outras 12 demonstram comportamento hora baixo, hora acima da média.
Trofimov (2018) analisa as taxas de retorno para 21 indústrias sul-coreanas, no período de
1970 a 2005. A metodologia utilizada é de taxa incremental de lucro estabelecida por Shaikh (1995,
2008 e 2016), que se baseia no conceito de capital regulador. A evidência empírica apresenta uma
tendência a equalização das IRORs. As mesmas mantiveram-se estáveis, entre 1970 a 1997, e
flutuaram relevantemente entre 1997 e 2012, mas retornando ao valor médio após períodos de
choque. Trofimov apresenta uma discussão extremamente qualificada e, com uma série de testes
econométricos únicos ante da literatura, refutou fortemente a ideia de convergência das taxas de
lucro. O autor conclui, categoricamente, que a tendência à equalização das IRORs está evidenciada
para a economia sul-coreana.
Cooney (2017) testa as hipóteses concorrenciais de Marx (1984) frente às teorias de
concorrências neoclássicas e kalekianas. Sua metodologia é inovadora e se baseia no cálculo dos
preços de produções entre setores. As variáveis utilizadas convergem com os demais estudos
(Estoque de Capital, Lucro), mas é inovadora na equação e na utilização dos salários como
ponderador. O cálculo de mark-up apresentado se baseia na metodologia proposta por Semmler
(1984). Seus resultados apontam para equalização turbulenta dos mark-up no período de 1958 a
1977. Além disso, afirma que não há correlação entre os diferenciais das taxas de lucro e a
concentração industrial assim como propõe Maldonado (1989). Ademais, há a existência de
correlação negativa entre as taxas de lucro e a relação capital produto.
Tsoulfidis e Tsaliki (2019), por sua vez, conduziram sua pesquisa para Grécia, no período
1959 a 1991, Japão, 1974 a 2008, e Estados Unidos, 1987 a 2015. A investigação se fez testando
duas hipóteses, a primeira, se há correlação entre concentração em uma indústria e sua taxa de
lucro. A segunda, se existe uma tendência gravitacional nas taxas de lucro da indústria através da
taxa incremental de lucro. A investigação empírica, ao testar a correlação entre o grau de
concentração e a lucratividade das indústrias, hipótese também levantada por Maldonado (1989)
para o Brasil verificou-se, como esperado pela teoria de concorrência real, que não existe correlação
estatística positiva para as duas variáveis. Por conseguinte, as evidências apontam que as IRORs
apresentam um comportamento gravitacional em torno da média (Tsoulfidis, 2013). Esta evidência
aponta a existência da tendência à equalização das taxas de lucro entre os capitais reguladores.
Mokre (2020) é inovador em sua pesquisa e utiliza as hipóteses de concorrência real, para
investigar a regulação dos salários interindustriais por um capital regulador. O trabalho é pioneiro
neste quesito, preenchendo uma lacuna e abrindo novas fronteiras de pesquisa para esta teoria. As
hipóteses testadas foram de regulação turbulenta dos salários intersetoriais, convergência, dispersão
e regulação do crescimento salarial. Seu estudo se aplica aos Estados Unidos, no período de 1987 a
2016, e se baseia na metodologia de Shaikh (1995, 2008 e 2016) do lucro incremental e nas
contribuições de Botwinick (2017). As suas conclusões apontam equalização turbulenta dos salários
em torno de uma média ao longo do período. Além disso, que o crescimento dos salários, a longo
prazo, é governado pelas leis concorrenciais identificadas pela teoria clássico-marxista.
O quadro 2 abaixo sintetiza os principais estudos empíricos da teoria de concorrência real,
as hipóteses levantas, o país e/ou grupo de estudo e o período de tempo analisado.

Quadro 02 – Evidencias Empíricas de Equalização Turbulenta


Autor País Tempo de Análise Metodologia Hipótese
Semmler Revisão de Concentração da indústria e taxas de
Diversos Diversos Diversos
(1985) literatura lucro persistentes acima da média
Existência Diferenciais persistentes
Maldonado Serie
BRASIL 1973 a 1985 12 Anos entre os setores oligopolista e
(1989) Temporal
concorrenciais
Serie
Vaona (2011) OCDE 1975 a 2007 32 anos Gravitação e Convergência
Temporal
Bahçe e eres Serie
TURQUIA 1980 a 2000 20 anos Gravitação
(2013) Temporal
Tsoulfidis e Serie
GRÉCIA 1959 a 1991 32 anos Gravitação e Convergência
Tsaliki (2010) Temporal
Serie
Shaikh (2016) EUA 1987 a 2005 18 anos Gravitação
Temporal
Trofimov COREIA Serie
1970 a 2005 35 anos Gravitação e Convergência
(2018) DO SUL Temporal
Serie
Zacaris (2001) EUA 1947 a 1998 51 Anos Diferenciais e Equalização
Temporal
1983 a 2010 e Serie Gravitação, Convergência e
Vaona (2012) Diversos 62 Anos
1972 a 2007 Temporal Metodologias de Taxa de Lucro
Glick e Ehrbar EUA e Serie
1949 a 1979 30 Anos Diferenciais e Equalização
(1988) OCDE Temporal
Cooney Serie Gravitação, Diferenciais, Relação
EUA 1958-1977 20 Anos
(2017) Temporal Lucro e Capital-produto
Serie
Mokre 2020 EUA 1987-2016 29 Anos Equalização Salarial turbulenta
Temporal
Fonte: Elaboração Própria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A teoria de concorrência real evidencia um padrão antes não visto pela teoria econômica, a
concorrência se dá em todas as fases do circuito capital. É possível adendar tais conclusões sobre a
concorrência segundo a noção de clássico-marxista: i) concorrência compreende todo circuito
capitalista e se dá não apenas na fase de circulação de mercadorias como se propõe na noção
convencional; ii) concorrência resulta do motivo-lucro e da acumulação de capital, que cria novos
capitais e expande os capitais existentes, e isto ocorrendo de modo turbulento; iii) concorrência a
nível intra-setorial hierarquiza taxas de rentabilidade em função da lei dos preços correlatos e do
capital regulador (condição de produção replicável com maior rentabilidade); iv) concorrência a
nível intersetorial equaliza taxas de lucro (equalização não é igual a convergência) mediante
mobilidade de capital. Cabe salientar que a condição de produção, alvo dos novos investimentos, é
estabelecido pelo capital regulador; v) esta interpretação é robusta, tanto do ponto de vista lógico
(interno) do ponto de vista das evidências empíricas (manifestação aparente do fenômeno). Em
síntese, a concorrência real, ao ponto que equilibra e desequilibra taxas de lucro, intersetorial e
intra-setorial respectivamente, força que as taxas de lucro setoriais oscilam em torno da média da
economia.
A concorrência se deriva justamente do processo de acumulação de capital demonstrado que
o motivo lucro ao colocar os capitais em movimento, distribui seus excedentes através da força
competitiva de cada capital. A vantagem, neste processo turbulento, vai ao capital com menores
custos unitários, que pode sistematicamente rebaixar seus preços ao mínimo a fim de expulsar seus
concorrentes.
A abordagem clássico-marxista de concorrência evidencia dois níveis de concorrência,
macro (intersetorial) e micro (intra-setorial). A concorrência intra-setorial define um preço
correlatos para transação das mercadorias de diversos capitais com métodos produtivos distintos.
Em decorrência da Lei dos preços correlatos a concorrência hierarquiza as taxas de lucro intra-
setorial, uma vez que os custos unitários são distintos entre as firmas.
A nível intersetorial a mobilidade de capital é motivada devido a necessidade de auto-
expansão do capital que a fim de se colocar nos circuitos onde as taxas de lucro são mais elevadas
migra intersetorialmente. Uma vez que as dinâmicas microeconômicas criam hierarquias setoriais
nas taxas de lucro o capital se move rumo aos maiores níveis de rentabilidade. Este movimento de
entrada de capitais entre os setores resulta em uma tendência à equalização das taxas de lucro
intersetoriais, evidenciadas pela extensa literatura de empírica apresentada. Esta tendência não se
equivale a convergência uma vez que, se as taxas intersetoriais de lucro são convergentes, a
economia capitalista estagna, já que a necessidade de auto-expansão do capital cessaria. O papel do
capital regulador é fundamental nesta dinâmica, uma vez que as melhores condições de produção
replicáveis são alvos de novos investimentos, e é justamente em tais capitais que ocorre a
equalização das taxas de lucro.
A concorrência capitalista é, portanto, como evidência Shaikh (2016), uma guerra de todos
contra todos, cuja vantagem está para quem consegue ganhar mercado, atacando seus concorrentes.
O corte de custos e as inovações tecnológicas são as principais ferramentas de combate. Diferente
do que propõe a noção de estado de equilíbrio, para concorrência real, ociosidade e estruturas
produtivas distintas, são características intrínsecas a economia capitalista.

REFERÊNCIAS

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