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2ª edição

Copyright ©2023 by Jéssica Macedo

Todos os direitos reservados. É proibido o armazenamento ou a


reprodução de qualquer parte desta obra - física ou eletrônica -, sem
autorização prévia do autor. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na Lei nº 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código
Penal.

Projeto Gráfico de Capa e Miolo

Jéssica Macedo

Revisão

Sonia Carvalho

Esta é uma obra de ficção. Nomes de pessoas, acontecimentos e


locais que existam ou que tenham verdadeiramente existido em
algum período da história foram usados para ambientar o enredo.
Qualquer semelhança com a realidade terá sido mera coincidência.
Sumário
Prólogo
Parte 1
Meu sonho coreano.
Um
Dois
Três
Quatro
Cinco
Seis
Sete
Oito
Nove
Dez
Parte 2
Nós temos uma história juntos
Onze
Doze
Treze
Quatorze
Quinze
Dezesseis
Dezessete
Dezoito
Dezenove
Vinte
Vinte e um
Vinte e dois
Vinte e três
Epílogo
Agradecimentos
Sobre a autora
Outras obras
Sinopse
Minha viagem para a Coreia não deveria passar de uma
experiência cultural e artística, mas ela mudou a minha vida inteira.
Como artista plástica, eu sempre me encantei pelas cores e formas
do oriente, mas isso não foi a única coisa que me seduziu por lá.
Conheci o Shin, um futuro médico gentil que evitou vários micos
meus pela diferença de cultura. Ou, pelo menos, tentou…
Passamos algumas noites juntos e, como toda viagem tem
um fim, voltei para o Brasil. Só que, ao chegar aqui, descobri que
estava grávida de um homem que morava do outro lado do mundo.
Prólogo
Cinco anos atrás...

Suspirei ao olhar para a imagem que surgiu no plano de fundo do


meu celular, antes de me ajeitar no sofá da sala do apartamento e
puxar o balde de pipoca das mãos da minha colega de quarto.

— Amiga, não sei o que você vê nesses caras. — Jaqueline revirou


os olhos ao apontar com o nariz para a imagem no meu celular. —
Eles são todos tão iguais.

— Não são, não. — Guardei o celular. — A boca desse em


particular parece desenhada a nanquim.

— Se fosse para pintar, eu preferia o Magic Mike. — Jogou


algumas pipocas na boca ao voltar a prestar atenção no filme sobre
strippers americanos que estávamos vendo.

— Bom que sobram mais para mim. — Dei de ombros.

— Você não tá pegando nem os brasileiros! — Gargalhou ela.

— Ah, Jaq! Vai caçar quem te quer. Sabe bem que eu tenho um
namorado, o Felipe. — Empurrei-a pelos ombros.

— Tem muitos que me querem. — Deu uma piscadela.

— Vamos ou não ver o filme? — Desconversei tentando relevar a


autoestima exacerbada dela.

— Você que tá babando por um ator de Dorama.


Mastiguei a pipoca em silêncio.
Parte 1

Meu sonho coreano.

Dois anos atrás...


Um

Havia dois dias que eu tinha chegado a Seul, capital da Coréia do


Sul, e não poderia estar mais apaixonada pelo lugar. Tinha me
programado para chegar durante a primavera, com o florescer das
cerejeiras. Era estonteante a beleza das árvores em flor. Com o vento,
as pétalas se soltavam enchendo o caminho como um verdadeiro
tapete.

Já era noite quando entrei em um dos restaurantes mais


recomendados na internet. Até o momento, eu só havia comido em
barraquinhas de rua, não que as refeições fossem menos saborosas,
mas eu queria comemorar a ótima notícia que recebera de um velho
amigo curador. Mal começara a minha série de pinturas a óleo, tendo
a Coréia como tema central, e ele já tinha possíveis compradores,
querendo marcar uma exposição para exibi-las.

Havia me formado em Artes Visuais há pouco mais de três anos e,


desde então, era artista plástica. Não poderia ter feito outra escolha.
Nada me gratificava mais do que eternizar um pouco da beleza do
mundo para as outras pessoas.

Cheguei ao restaurante e procurei uma mesa vazia. O lugar estava


cheio e eu levei um tempo para encontrar um local para me sentar.
Coloquei minha bolsa na cadeira ao lado e ajeitei a saia do meu
vestido. Observei melhor meu entorno. Ele possuía paredes e tetos
pintados de branco, cruzados harmoniosamente por colunas de
madeira escura. As luminárias tinham um estilo rústico, feitas de metal
envelhecido, que combinavam bem com a madeira das colunas e das
mesas. Por fim, as cadeiras eram de ferro, pintadas de preto. Era um
restaurante de churrasco coreano, então havia uma espécie de grelha
ou chapa no centro de todas as mesas.

Levantei o braço e comecei a acenar, a chamar, a gesticular,


porém, nenhum dos garçons parecia dar a menor bola para mim. Sair
do Brasil para ser ignorada do outro lado do mundo não era a melhor
experiência de todas.

— Oi! Alguém? — chamei em inglês.

Um homem me encarou desconfiado, parou ao meu lado e


pressionou um botão na lateral da mesa.

— 벨을 눌러 . — Ele olhou para mim e eu não fazia ideia do que


havia falado. Minhas habilidades em coreano se resumiam a um “bom
dia”.

— Desculpa, não falo coreano.

— Pressione a campainha. Assim, o garçom virá atendê-la —


traduziu em um inglês perfeito.

— Obrigada! — Encarei-o com um sorriso amarelo e coloquei uma


mecha do meu cabelo castanho-acobreado atrás da orelha.

Fiquei olhando para ele. Estava com uma calça azul e uma camisa
social branca. O cabelo preto estava cortado curto, mas tinha volume
o suficiente para erguer algumas mechas. Não era tão liso quanto o
da maioria dos nativos. As sobrancelhas eram grossas e
contrastavam com os olhos finos que me olhavam de lado, com um ar
de curiosidade e receio. Os lábios dele eram grossos e simétricos. O
contorno parece ter sido feito com calma e com toda a precisão de um
compasso, formando curvas perfeitas.

— O restaurante está cheio, por que não se senta aqui comigo? —


Finalmente consegui dizer algo ao sair da minha momentânea
paralisia.

Antes que ele respondesse à minha pergunta, o garçom se


aproximou de nós e me entregou um cardápio. Todo em coreano. Por
que imaginei que seria diferente?

— Gosta de porco? Recomendo a barriga, é muito saborosa.

— Obrigada! Meu salvador.

Ele abriu um sorrisinho e, por um momento, achei que suas


bochechas ficaram coradas. Ou talvez fosse uma ilusão provocada
pelas minhas mãos suando frio.

Pedi ao garçom em inglês e ele pareceu entender, afastando-se.

O homem, que havia me ajudado, olhou em volta mais algumas


vezes e percebeu que todas as mesas estavam cheias. Ou esperava
ou aceitava o convite de se sentar comigo.

— Com licença! — Abaixou a cabeça brevemente antes de puxar a


cadeira e sentar-se diante de mim.
— Toda! — Mordi os lábios para não ficar sorrindo demais. Fiquei
parada enquanto meu interior estava histérico. Contenha-se!, ordenei
a mim mesma em pensamentos, mas era difícil diante do meu tipo de
cara. Ele era muito bonito. — Sou brasileira... — puxei assunto sem
saber por onde começar.

— É fácil perceber que você não é daqui — comentou. Eu não


soube dizer se isso era bom ou ruim.

Ele mexeu no cabelo, passando os dedos pelo topete e o


empurrando para trás, fazendo com que eu suspirasse
involuntariamente.

— Sou Alissa, mas todos me chamam de Lis. Qual o seu nome?

Ele ficou me olhando por alguns minutos e eu estalei os dedos de


nervoso, perguntando-me se não havia sido incisiva demais. A cultura
deles era muito mais reservada do que a nossa. Deveria parecer
menos afobada, porém, estava ridiculamente sem saber como agir
diante de um cara oriental com uma cultura muito diferente da minha.

— Kim Ji Won.

— Prazer! — Estendi a mão para ele, que ficou me fitando metade


de um século antes de segurar.

— Prazer, Aghassi Alissa.

O garçom veio, começou a preparar o churrasco de porco na nossa


mesa e pedi a ele uma garrafa de Soju, uma bebida destilada de
origem coreana. Já que estava lá, eu queria provar um pouco de tudo,
enquanto o Kim Ji Won apenas bebia água.

Foi difícil quebrar o gelo com ele. Toda vez que eu dizia algo, tinha
medo de estar cometendo uma gafe enorme. Só não queria que ele
saísse correndo com medo da brasileira louca.

— Com o que você trabalha, Kim Ji Won? — Girei o copinho entre


os meus dedos e tomei mais um gole de Soju que desceu queimando
a minha garganta, provocava um ardor semelhante ao da pinga.

— Estou terminando a residência. Me torno um cirurgião geral no


fim do ano.

— Uau! Parabéns!

— E você?

Fiquei surpresa em ouvi-lo fazer uma pergunta, já que todas


partiam apenas de mim. Estava imaginando em qual momento ele se
levantaria da mesa e iria embora.

— Sou uma artista plástica.

— Isso é incrível! — Ele abriu um sorriso com os dentes largos e


perfeitamente brancos.

— Não tanto quanto ser um médico.

— Cada profissão tem o seu valor.

— Tem razão.
— Tenho que ir. — Tocou a campainha para chamar o garçom. —
Preciso estudar.

— Mas a essa hora? — Puxei meu celular e conferi que horas


eram. Passava das dez da noite.

— Sim — respondeu antes de se virar para o garçom e pedir a


conta. Ao menos imaginei que fosse, já que ele pegou a carteira.

— Deixa que eu pago a minha parte. — Estendi a mão para ele.

— Você paga da próxima vez.

Mais um detalhe sobre os coreanos que eu havia esquecido, eles


não dividiam as contas como nós. Mas fiquei contente por ouvir um da
próxima vez.

— Então pode me dar o seu número? — Estendi meu celular. —


Seria bom ter ajuda de alguém que mora por aqui.

— Sim. — Ele o digitou e me devolveu o celular. — Até mais,


Aghassi Alissa.

Mordi o lábio inferior, mas tive certeza de que um sorrisinho


escapou pelos meus lábios. Certamente, aquele jantar tinha sido
melhor do que eu imaginava.

Fiquei mais um tempo na mesa terminando o churrasco, até voltar


para o local onde eu estava hospedada.
Dois

Eu me espichei assim que um raio de sol entrou pela janela e bateu


diretamente no meu olho. Bati com a mão no chão, desacostumada
com a cama ser tão baixa. Era praticamente apenas um colchão no
chão. É claro que tinham hotéis com camas tradicionais, mas eu
queria experimentar ao máximo possível da cultura local.

O celular estava vibrando embaixo do travesseiro e eu o peguei


para ver quem era. Havia umas cinco mensagens da minha mãe, três
da minha irmã mais nova e outras trinta e cinco da Jaqueline. Passei
as mãos pelo rosto tentando afastar o sono e me sentei. Ainda me
perguntava por que continuávamos amigas depois da faculdade.
Talvez os opostos se atraíssem mais do que poderia imaginar.

Lis:

Bom dia!

Jaque:
Para mim ainda é boa noite.

Lis:

Esqueço que estou a doze horas na sua frente.

Jaque:

Como estão as coisas aí? Quando você volta? Já estou com


saudades.
Lis:

Volto no fim do mês. É tudo tão lindo quanto imaginava.

Jaque:

Inclusive os caras?

Lis:

Principalmente eles rsrsrs.

Jaque:

Não concordo tanto, mas a minha opinião nunca valeu muita coisa
mesmo.

Sabe quem apareceu aqui no ateliê hoje?

Lis:

Quem?

Jaque:

O Felipe.

Lis:

O que ele queria? :(

Jaque:

Falar com você, ué! Já que não atende ele. O coitado quer voltar.

Lis:
¬¬ Como se tivesse sido eu quem terminou. Eu realmente gostava
dele, Jaque, mas para mim não tem essa coisa de dar um tempo.

Jaque:

Acho que ele está arrependido. Talvez mereça uma segunda


chance.

Lis:

Estou do outro lado do mundo agora. Converso com ele quando


voltar.

Jaque:

Aproveita e pensa.

Lis:

Tá! Beijos, falamos mais depois.

Parei de responder a minha amiga. Não queria pensar no Felipe


agora, pois isso me deixava triste. Namoramos durante anos, até que
ele simplesmente decidiu que tinha algo mais interessante para fazer
do que continuar comigo. Passei por uma bad terrível e, quando
finalmente estava bem, ele cismava de me querer de volta. Ah,
francamente!

Estava na Coréia e tudo o que não queria era pensar no meu ex.

Abri um sorriso ao me recordar do homem que eu havia conhecido


no restaurante na noite anterior. Ele era a representação perfeita de
todos os meus sonhos. Não contive o suspiro, certamente meus
pensamentos e minha atenção estavam bem longe do Felipe.

Peguei o celular outra vez e mandei uma mensagem para o número


que ele tinha me passado.

Lis:

Hi! Quando terei a oportunidade de pagar o nosso jantar?

Kim Ji Won:

Aghassi Alissa. É você?

Lis:

Sim! Pode me chamar apenas de Lis? Acho Alissa feio lol:D

Kim Ji Won:

Apenas Lis?

Lis:

Sim! Por favor...

Kim Ji Won:

Okay!

Quer ir a um café comigo hoje?

Lis:

Eu adoraria:D!
Kim Ji Won:

Encontro você no Mouse Rabbit Coffee às oito da noite.

Lis:

Combinado.

Ele não mandou nenhuma outra mensagem, imaginei que estivesse


no hospital. Estava ansiosa para reencontrá-lo, ainda que fosse
apenas para conversamos. Seria bom fazer um amigo ali, talvez ter
um pouco mais do que isso... Não que ele precisasse saber da minha
queda enorme por caras com o seu perfil.

Já que só o veria à noite, decidi seguir minha programação para o


dia: ir até o Museu Nacional da Coréia, que ficava em Seul. Acreditava
que o local pudesse me trazer várias inspirações para as minhas
obras.

Fui até o banheiro e lavei o rosto para espantar um pouco do sono


que estava sentindo. Escovei os dentes e troquei meu pijama por
outra roupa. Olhei-me no espelho e dei uns tapinhas nas bochechas
para que elas ficassem mais coradas. Esperava encontrar um tempo
para comprar os cosméticos tão famosos das coreanas.

— Bom dia, Aghassi Alissa! — cumprimentou o dono da hospedaria


quando eu desci para o café da manhã.

— Bom dia, Lee Myung-Dae. — Abri um breve sorriso e curvei


levemente a cabeça antes de puxar a cadeira em frente a uma das
mesas do pequeno restaurante.

Aquele lugar era bem mais humilde do que um restaurante cinco


estrelas, mas eu gostava de ambientes dessa forma, mais caseiros e
intimistas.

— Aonde irá hoje, Aghassi?

— Ao Museu Nacional.

Ele veio até mim e me entregou uma torrada com ovo e atum, o
mais perto do café da manhã que eu estava acostumada a tomar, uma
vez que eles comiam um verdadeiro almoço ao acordar, o que era
pesado demais para mim.

Dei uma boa mordida na torrada antes de voltar a prestar atenção


no homem, um senhor vários anos mais velho do que eu, talvez vários
anos a mais do que o dobro da minha idade. Ele tinha os cabelos
grisalhos e uma generosa entrada de calvície, mas era gentil e me
trazia uma grande paz.

Tomei uma golada de um leite fermentado sabor banana que se


assemelhava ao nosso, porém, não poderia garantir se era feito da
mesma forma.

Olhava para as paredes claras e para a luz do sol que entrava pela
janela junto com algumas flores de cerejeira que eram sopradas pelo
vento ao bater na árvore próxima. Não conseguia evitar que meus
pensamentos desviassem para a ansiedade do encontro daquela
noite. Não que fosse exatamente um encontro, mas...
— Está pensativa, Aghassi.

— Ansiosa para ir ao museu — menti ao secar a ponta gordurosa


dos meus dedos em um guardanapo.

— Tenho certeza de que irá gostar.

— Ah, eu também! — Peguei o lixo e coloquei no cesto antes de


entregar a louça suja para ele. Recordando-me de sempre fazer isso
com as duas mãos, ainda que o impulso fosse de fazer com uma das
mãos só.

— Faça um bom passeio, Aghassi.

Sorri e me despedi com um aceno de cabeça ao sair da hospedaria


e tomar o caminho para a rua. Ao caminhar, ficava um pouco
agoniada com a falta de passeios nas ruas e surpresa com o quanto
tudo era tão limpo. O céu estava claro e havia muitas cerejeiras
floridas no caminho para o metrô. Tinha baixado no meu celular um
aplicativo de metrôs, já que o google maps não funcionava no país.

Não levou muito tempo para que eu chegasse em frente ao museu.


Ele era ainda mais deslumbrante do que visto pelas fotos na internet,
no entanto, não esperava menos do maior museu da Ásia. Na frente
havia um lago enorme de águas turvas e esverdeadas. O que eu via
de longe era uma enorme construção branca, retangular e, ao chegar
mais perto, vi as escadas que levavam ao interior feito de paredes de
vidro.
Fiquei imersa nas exposições e obras de arte daquele lugar por
horas. Era um verdadeiro paraíso. Poderia ficar ali para sempre. Já
estava cheia de ideias e com muita vontade de produzir. Nem esperei
voltar para o local onde eu estava hospedada. Sentei-me em um
banco, peguei meu caderno de esboços, um carvão no formato de
lápis, que carregava sempre comigo na bolsa, e comecei a desenhar
a visão além das paredes de vidro do museu.

Algumas pessoas que passavam por mim andavam mais devagar


para observar o que eu estava fazendo, e outras simplesmente
ignoravam. Às vezes estalava os dedos, outras, me movia no banco
em busca de uma posição melhor, mas não desviei meu foco. Devo
ter desenhado por horas, pois quando dei por mim, percebi que o sol
já estava a oeste e minha barriga roncava de fome. Parei em uma
lanchonete antes de voltar para a hospedaria e me arrumar para sair
com o Kim Ji Won.
Três

A noite estava seca, entretanto, o vento que soprava meu cabelo


na altura dos ombros era fresco. A saia do meu vestido de cetim e
renda, na altura dos joelhos, se movia como as flores de cerejeira
dançando no ar antes de caírem no chão.

Como não sabia onde ficava a cafeteria, caminhei até uma avenida
mais movimentada e peguei um táxi. Pela janela eu observava as
pessoas caminharem tranquilamente pelas ruas, ainda que o sol já
tivesse se posto.

Alguns minutos depois, cheguei ao local combinado. Ajeitei a alça


da bolsa no ombro e sequei as mãos suadas na lateral do vestido. Eu
estava ansiosa, ri de mim mesma ao perceber o quanto estava
parecendo uma adolescente diante do seu primeiro encontro. Era
apenas um café com um desconhecido, mas isso não fazia com que
eu parasse de sentir um friozinho na barriga.

Quando o Felipe terminou comigo, eu preferi me afundar no


trabalho a me preocupar em sair com outras pessoas, entretanto,
naquele momento, eu me sentia pronta. Mas precisei lembrar a mim
mesma que a palavra encontro nunca havia sido mencionada. E se
ele tivesse uma namorada, ou pior, fosse casado?

Balancei a cabeça tentando afastar esses pensamentos negativos


que tanto me perturbavam. Respirei fundo e subi as escadas cinzas
que levavam à entrada do café. Tive medo de que Kim Ji Won não
estivesse me vendo, contudo, após uma breve vasculhada com o
olhar, eu o encontrei sentado em uma mesa próximo à parede dos
fundos. Ele abriu um sorriso para mim quando me viu. Fui até ele e
me sentei na sua frente.

— Oi, Kim Ji Won! Como você está?

— Olá, Lis.

Sorri ainda mais por ele ter atendido o meu pedido e me chamado
apenas de Lis, como eu gostava.

— Estava no hospital? — Ajeitei minha bolsa no cantinho da mesa


enquanto não tirava os olhos dos lábios dele.

Kim Ji Won fez que sim com a cabeça.

— E você o que fez durante o dia?

— Fui ao Museu Nacional. É maravilhoso! As obras, as esculturas,


as porcelanas...

— É sim, imagino que para você, que é artista, seja ainda mais.

— Terei muito trabalho ao voltar para o Brasil.

— É uma pena que tenha que voltar.

Fiquei em silêncio. Não sabia se ele estava flertando comigo ou


apenas brincando. Queria que fosse a primeira opção.

— Às vezes tenho vontade de ficar.


— Não seria ruim.

— Não mesmo. — Desviei o olhar, fitando a mesa de madeira entre


nós dois. — Além de ser médico o que mais você faz? Tem alguma
namorada? — Não consegui conter a pergunta que estava corroendo
a minha língua. Torci para que ele não se assustasse.

— Não, não tenho uma namorada. — O olhar dele sobre mim se


tornou mais pesado, como se pudesse enxergar além dos meus
olhos. Encostei as costas na cadeira, mas parei de encará-lo. —
Imagino que você também não tenha namorado?

Finalmente ele foi direto ao ponto e eu assenti com um sorriso.


Estava livre e desimpedida do outro lado do mundo, graças ao Felipe.
Ali, flertando com um coreano, o término me pareceu uma dádiva e
até esqueci as últimas semanas de choro e de coração despedaçado,
enquanto me sentia chutada.

— O que vamos beber? — Kim Ji Won mudou de assunto ao


perceber que eu fiquei calada e eu odiei a impressão que isso poderia
ter passado.

— O que você sugere?

— Tem um café com chantilly que é ótimo.

— Então vamos pedir dois. — Eu me levantei para ir até o balcão e


ele veio logo atrás de mim.

Kim Ji Won se escorou sobre o balcão e disse algo para a


atendente em coreano que eu não consegui compreender. Aprender
coreano estava cada vez mais alto na minha lista de prioridades. A
atendente falou um valor e eu paguei sem saber exatamente pelo quê.

— Lis, vamos voltar para a mesa. Ela vai nos servir lá. — Kim Ji
Won apontou o caminho e ou o segui de volta.

— Posso chamá-lo apenas de Ji Won? — Apoiei o queixo nas


costas da mão esquerda e fitei um outro casal que estava a duas
mesas de nós, próximos à parede. Estava com medo da possível
resposta dele. Na Coréia, não era comum chamarmos as pessoas
pelo primeiro nome como fazíamos no Brasil. Isso era feito apenas por
pessoas muito próximas e da mesma idade. Sabia que no trabalho se
referiam às pessoas pelo cargo e o sobrenome, que no caso dele era
Kim. Sim, ao contrário de nós, eles usam o sobrenome antes do
nome.

— Sim, Lis, pode me chamar de Ji Won. — Um sorriso malicioso


surgiu nos lábios dele. Senti como se o gelo que ainda pudesse existir
entre nós dois tivesse se dissolvido no calor daquele sorriso.

A garçonete chegou com nossos pedidos e, quando olhei para o


meu café, não contive o ohmm. Havia um coração desenhando na
espuma do chantilly e tive certeza de que fora Ji Won quem pediu.
Tive certeza de que eu não era a única a fim de algo. Ri ao perceber o
quanto aquilo me provocava um frio na barriga e me fazia recordar
dos tempos de adolescente, comendo pelas beiradas, com medo de
que algo desse errado e acabasse o afastando.
— Por que não terminamos esse café e vamos caminhar na rua?
Ouvi dizer que é seguro andar à noite e imagino que as cerejeiras
também sejam lindas ao luar.

— Como desejar. — Terminou o café em algumas goladas e me


estendeu a mão para que eu a segurasse.

Meu coração disparou com o ato dele. Se Jaqueline estivesse ao


meu lado, ela estaria tendo convulsões de tanto rir. Pegar na mão de
um cara havia deixado de ser relevante quando eu tinha dez anos.
Com vinte e cinco, deveria ser ridículo me importar com esse ato tão
simples, mas os sul-coreanos não demostravam afeto em público e
imaginei o quanto deveria significar para ele me estender a mão. Eu
me senti uma depravada por não conseguir pensar em outra coisa
que não fosse beijar aqueles lábios perfeitos.

As ruas mais para o centro eram muito iluminadas, cheias de


placas, telões e outdoors como naqueles filmes futuristas. Essas
placas cobriam toda a fachada externa de alguns prédios e estavam
dispostas também em totens pela rua. A única coisa que me agoniava
era a falta de passeio. Quando um carro veio em nossa direção, eu
me encolhi junto ao peito de Ji Won num reflexo, com medo de ser
atropelada. Ele riu e eu torci os lábios, não vendo graça alguma.

— Vocês precisam de um espaço para os pedestres.

— Temos espaço para os pedestres.

Revirei os olhos e apertei os dedos dele entre os meus.


Passamos perto de uma rua menos luminosa e mais vazia, quase
um beco. Eu o puxei comigo e joguei para o espaço todo o medo que
eu sentia de afastá-lo de mim. No pior dos casos, poderia antecipar a
minha passagem de volta para o Brasil.

Pressionei-o contra a parede, ainda que ele fosse uns dois palmos
mais alto do que eu, e passei meus braços ao redor do seu pescoço.
Ele poderia até ser tímido ou tradicionalista, porém, diante da minha
atitude, envolveu a minha cintura com os braços e me apertou contra
o seu peito, arrancando de mim um suspiro. Senti o meu sangue
ferver em um misto de desejo e ansiedade. Eu estava comendo o cara
com os olhos desde o primeiro momento que o vira, louca para roubar
um beijo dele, mas não precisei, pois Ji Won abaixou o rosto e
esfregou os lábios nos meus.

Por mais reservada que fosse a cultura dele, acho que atração era
algo universal. Eu estava super a fim e, a forma como ele apertou
meu corpo aos contornos do dele, me mostrou que também estava. O
frio na minha barriga não diminuiu, pelo contrário, ficou ainda mais
intenso quando pressionei minha língua contra o encontro dos seus
lábios macios. Subi minha mão pela sua nuca e embrenhei meus
dedos no cabelo preto e macio.

Talvez fosse o misto de ansiedade, frio na barriga e medo de


sermos pegos, coisas que eu não me lembrava de sentir há muito
tempo, mas aquele foi o melhor beijo que dei desde que conseguia
me lembrar. As mãos dele permaneceram na minha cintura, foi mais
respeitoso do que eu gostaria, no entanto, o gosto da sua boca era
muito bom.

Alguém passou por nós e ele me afastou como se tivéssemos


tomado um choque. Olhei de lado, sobre meu ombro, e vi um senhor
passar. Ele falava coisas que eu não conseguia entender e nos olhava
com uma expressão de pavor e desaprovação.

— O que ele disse? — perguntei ao Ji Won enquanto mantinha


uma das mãos sobre o ombro dele.

— É melhor você não saber.

Engoli em seco enquanto as piores coisas passavam pela minha


cabeça.

— Os mais velhos não acham adequado trocarmos afeto em


público.

— Alguém já disse para eles que são uns chatos?

Ji Won apenas riu sem dizer nada. Não soube se ele concordava
ou não comigo.

— Onde você está hospedada? Meu carro está perto da cafeteria.


Posso levá-la de volta.

Quando o Ji Won disse aquilo, eu soube que a minha noite tinha


sido melada pelo velhinho cheio de pudor. Tudo o que queria eram
mais beijos e amassos, entretanto, achei melhor avançar um sinal por
vez.
— Agradeço a sua carona.

Seguimos de volta ao café e entramos no carro dele, que estava


estacionado em frente. O veículo era branco e moderno, mas eu não
reconheci a marca. Estava impecavelmente limpo, talvez por
pertencer a um médico. Dei o endereço de onde estava hospedada e
Ji Won dirigiu em silêncio até lá. Ele não parecia tenso, mas eu torcia
para que aquele não fosse o nosso último encontro.

Ao paramos em frente à hospedaria, apoiei a mão na porta e sorri


para ele.

— Boa noite, Ji Won.

— Boa noite, Lis. — Ele se curvou sobre o banco do carona e me


deu um selinho.

Saí do carro suspirando. Minha noite havia sido melhor do que eu


esperava.

Lis, contenha-se! Foi só um beijo, advertiu o meu cérebro enquanto


o meu coração traçava planos infundados. Por mais que estivesse
adorando os momentos com ele, precisava me lembrar de que minha
estadia na Coréia tinha prazo para terminar.
Quatro

Pela manhã, eu saí em uma excursão para o Complexo de Palácios


de Ch'angdokkgung e depois de acompanhar o tour, me sentei para
desenhar em um banco, observando as cerejeiras. Enquanto sentia a
brisa fresca soprar meus cabelos presos em um rabo de cavalo, eu
me dei conta de que o contorno da árvore que eu deveria estar
desenhando, havia se tornado a forma e o rosto de Ji Won.

Não havíamos conversado desde o nosso encontro na noite


anterior e eu estava me corroendo por dentro, perguntando-me se
mandava ou não uma mensagem para ele. Acabei prometendo a mim
mesma que esperaria até a uma da tarde antes de me pronunciar. No
entanto, quando estava terminando os traços da boca dele, meu
celular vibrou no bolso e o puxei ansiosa.

Ji Won:

Oi! Posso ver você hoje?

Lis:

Sim! Onde?

Ji Won:

Em outra cafeteria. Termino o plantão mais tarde hoje, mas


podemos nos ver às 22h.
Lis:

Estou ansiosa.

Ji Won:

Eu também.

Ao guardar o telefone, eu estava sorrindo. Estava muito a fim do Ji


Won e nosso lance estava tornando a minha viagem para a Coréia
ainda mais incrível. Sempre tive uma queda enorme por orientais e
me envolver com ele era a realização de parte dos meus devaneios.
Sabia que quando voltasse para o Brasil em uma semana,
provavelmente nunca mais voltaria a vê-lo, porém, enquanto estava
livre e desimpedida na Coréia, eu queria curtir com um nativo muito
gato.

Passei o resto da manhã e parte da tarde no parque. Fiz vários


desenhos do complexo de palácios e outros tantos do Ji Won. Esses
certamente nunca seriam expostos. Eu os guardaria para mim como
uma parte deliciosa daquela viagem.

O lugar onde eu estava era visualmente maravilhoso, havia várias


árvores com cores vibrantes do verde ao vermelho espalhadas entre
as construções feitas no melhor estilo oriental antigo. Os telhados
pontiagudos, sustentados por altas colunas vermelhas, eram uma
coisa que eu só achava ser possível ver em filmes. Levantei-me do
banco e caminhei até o gazebo que ficava às margens de um lago
com várias flores de lótus. Algumas pessoas, que passavam próximas
a mim, estavam vestidas com roupas tradicionais. O “quimono”
coreano era chamado de Hanbok, o que significa literalmente: "roupa
coreana", e era caracterizado por cores vibrantes e linhas simples. O
usado pelas mulheres consiste no jeogori, numa blusa ou casaco e a
saia comprida. Já o masculino, consiste no jeogori e na bagi, que são
calças bastante largas. Fiquei me perguntando se estavam a passeio
ou se trabalhavam ali.

Eu só não tive vontade de ficar lá para sempre porque queria muito


ver o Ji Won. Quando o sol já estava começando a se pôr, ajeitei a
minha bolsa no ombro e guardei meu material de desenho dentro
dela, antes de dar uma última olhada ao meu redor, sentindo os
últimos raios baterem nos meus olhos.

O Brasil tinha lugares lindos, certamente tão quanto aqueles, mas


eu não conseguia ficar menos deslumbrada.

O guia acenou do ônibus e eu saí do meu devaneio ao caminhar


até o transporte que estava esperando por mim e os demais turistas
daquela excursão.
Pontualmente às dez da noite, ele estava na porta da hospedaria
para me buscar. Ji Won estava perto do carro com o celular na mão,
talvez mandando uma mensagem para mim. Usava uma calça jeans
preta com uma camisa branca sob uma jaqueta marrom com as
mangas na altura dos cotovelos e um relógio no pulso direito.

— Oi! — Caminhei até ele em um passo após o outro,


extremamente arrependida de ter escolhido um sapato de salto.

— Boa noite! — Ji Won ficou olhando para mim e eu me perguntei


se meu decote estava grande demais, pois uma coisa que eu havia
aprendido antes de chegar lá, era que saia curta podia, mas decote e
ombros de fora eram vistos como obscenos. Vai entender...

— Está tudo bem? — Parei diante dele, o encarando.

— Sim! — Sorriu e eu respirei aliviada.

— Podemos ir?

Ji Won fez que sim e abriu a porta do carro para que eu entrasse.
Aconcheguei-me no banco e coloquei a bolsa sobre as minhas
pernas. Estava com um vestido bonina curto, e ao me sentar percebi
que talvez estivesse curto demais, pois tive que puxá-lo pelas
beiradas.

Como era ele quem iria pagar dessa vez, eu não fiz perguntas
sobre aonde estávamos indo. Chegamos diante de uma grande
construção de madeira e vidro. De fora, era possível ver a luz das
luminárias em formato oriental que estavam presas no teto na parte
de dentro do local. As telhas eram escuras e a construção, por mais
moderna que fosse, assemelhava-se um pouco aos palácios que eu
havia visto mais cedo.

Subimos por uma escada de metal até a entrada que ficava no


segundo pavimento. Sentei-me na mesa diante dele e peguei o
cardápio. Sorri ao perceber que tinha uma versão em inglês, com
pratos que eu conhecia.

— Quero um croissant, um capuccino e uma rosquinha — pedi.

Ji Won apertou a campainha na mesa e o garçom veio nos atender,


anotou nossos pedidos e se afastou em seguida.

— Como foi no trabalho hoje, oppa? — Fitei seus olhos escuros,


fazendo-o olhar para mim de volta.

Ele corou instantaneamente quando eu o chamei daquela forma.


Talvez tivesse sido uma indireta direta demais. Mordi os lábios e
segurei a respiração até que ele ousasse quebrar o silêncio.

— Foi bom. — Ele colocou uma das mãos sobre a mesa e segurou
a minha. — Fiz uma cirurgia em uma garotinha pela manhã, mas
correu tudo bem.

— Fico feliz.

— E você, o que fez durante o dia?

— Fui ao Parque dos Palácios e fiz alguns desenhos.

— Eu posso ver?
— Não estou com eles aqui. — Não era uma mentira, realmente,
não os havia carregado comigo, porém, não tinha certeza se queria
que ele visse os desenhos que eu havia feito dele. Talvez me achasse
uma stalker.

— Pode me mostrar depois?

— Posso.

O garçom trouxe nossos pedidos e eu fiquei bebericando o café


enquanto mordiscava o meu croissant.

— Posso perguntar quantos anos você tem?

— Para o resto do mundo ou aqui na Coréia ? — Riu como se eu


tivesse contado uma piada.

— Ambos?

— Tenho 29 aqui na Coréia e 27 no restante do mundo.

— Eu tenho 25 para o resto do mundo. — Gargalhei.

— Teria 26 ou 27, dependendo do ano e do mês que você nasceu.

— Interessante...

— Sei que, para você, pode parecer confuso.

— Estou tentando ser gentil.

Nós dois caímos no riso como se estivéssemos falando da coisa


mais divertida do mundo, o que, obviamente, não era.
Ele colocou a outra mão sobre a minha e o gesto fez com que eu
erguesse a cabeça e encarasse seus olhos escuros e penetrantes.
Eram como um buraco negro que me puxavam com uma força
arrebatadora.

— O que acha de irmos a um lugar mais reservado?

Aquela frase na minha cabeça só poderia significar uma coisa e me


surpreendi por talvez ele não ser tão tímido quanto eu imaginava.

Passei a língua pelos lábios e abri um sorriso malicioso.

— Eu adoraria.

Ji Won soltou as minhas mãos e acertou a conta antes que


deixássemos o café. Voltamos para o carro dele e o Coreano Gato
dirigiu até um motel. Yes! Um motel... Tudo bem se eu parecesse uma
pervertida, mas estava muito a fim desde que havia botado os olhos
nele da primeira vez. Iria embora em menos de uma semana e queria
muito aquelas lembranças.

Passamos pela recepção e ele escolheu um quarto. Sentia minhas


pernas aquecerem só por estar ao lado dele. A recepcionista não fez
perguntas e entregou uma chave. O quarto ficava no segundo andar,
então subimos uma escada lateral e caminhamos por um corredor
parcialmente escuro até encontrarmos a porta certa. Ao entrarmos, vi
uma cama no centro, com uma luz fraca que vinha debaixo, alguns
espelhos e uma mesa redonda num canto, além de uma porta que
imaginei levar para um banheiro. Nada muito diferente do que via nos
motéis brasileiros.
Soltei minha bolsa sobre a mesa e voltei a encará-lo. Gostei do
olhar que encontrei, um que me lembrou de que éramos dois adultos
e não dois adolescentes.

Ji Won veio até mim e me segurou pela cintura, me puxando com


força contra o seu corpo. Suspirei. Estava muito ansiosa para ver o
que ele era capaz de fazer quando não tinha ninguém olhando. Sua
boca prendeu a minha e eu mordi o seu lábio inferior. Minha língua
encontrou a dele com ferocidade enquanto meus dedos subiam pelo
seu peito e puxavam a jaqueta para o chão. Ele escorregou a mão e
eu senti a pressão dos seus dedos apertando a minha bunda. Gemi
contra os seus lábios enquanto meu coração batia num misto de
aperto e euforia. Sem controle preciso das minhas próprias mãos, que
estavam tremendo, puxei a camiseta dele para cima, fazendo-o
levantar os braços para que eu tirasse a peça e a jogasse sobre a
cadeira vazia junto à mesa, onde estava a minha bolsa. A boca dele
desceu até o meu pescoço e o que era fogo se transformou em
calafrios que me arrepiaram inteira. Joguei a cabeça para trás e não
me preocupei em conter os gemidos quando as suas mãos saíram da
minha bunda e foram parar sobre os meus seios. Toda a atração que
senti por ele no primeiro momento estava se intensificando ainda mais
a cada toque.

Eu me afastei e ele me virou de costas, levantou o meu cabelo e


beijou a minha nuca. Meu corpo todo estremeceu com a sensação
que me percorreu de uma ponta a outra. Ji Won abriu o zíper do meu
vestido e puxou a peça para que ela escorregasse até o chão,
deixando-me de salto e lingerie preta. Sua boca foi de um ombro ao
outro enquanto meus olhos se reviravam com a sensação. Se
soubesse que ele poderia deixar qualquer acanhamento de lado no
momento em que ficássemos sozinhos, talvez tivesse antecipado
aquele encontro. Sua língua desceu pelas minhas costas como se
tivesse um pedaço de gelo na ponta. Espichei-me e me contorci ao
morder os lábios. Era como se ele estivesse inflamando e congelando
cada terminação nervosa minha.

Virei-me de frente, assim que me recuperei da tormenta que me


assolou e me deixou sem ar, e o puxei de volta, beijando-o enquanto
dava passos para trás até a cama. Caí sentada e ele se ajoelhou
entre as minhas pernas, debruçando-se sobre mim. Estiquei o braço
apenas para puxá-lo pelo pescoço e trazer sua boca de volta para a
minha.

As mãos velozes e quentes de Ji Won traçaram o caminho pela


lateral do meu corpo até a minha calcinha. Ele escorregou a boca pelo
meu pescoço, pelos meus seios, que subiam e desciam com a
respiração descompassada, até morder a face interna da minha coxa
enquanto tirava a minha calcinha. Jogou a peça ao nosso lado na
cama. Levantei meu corpo e o ajudei a abrir o cinto para tirar a calça,
e o restante das suas roupas, que viraram uma pilha no chão.

— Lis...

Calei a sua boca com a minha antes que ele mudasse de ideia e
puxei seu corpo para o meu. Ele me penetrou e me estiquei contra a
cama, contorcendo-me inteira. Meu corpo todo vibrou e comemorou
por finalmente tê-lo dentro. Senti vontade de apertá-lo, e o envolvi
com os meus braços, pressionando-o contra os meus seios. A cada
vez que ele se movia eu o apertava mais e meus gemidos também
iam ficando mais altos.

Escorreguei as unhas pelas suas costas e mordi sua orelha,


arrancando dele um gemido que me fez estremecer.

Girei-nos na cama, ficando em cima dele. Soltei meu sutiã e Ji Won


agarrou meus seios. Tomei controle, subindo e descendo em
movimentos circulares. Cada vez que eu o sentia entrar bem fundo,
era como se meu corpo fosse se derreter de dentro para fora. O
prazer banhava minhas veias a cada estocada. Eu me deixei levar
pelas doces e enlouquecedoras ondas de êxtase. Eu comecei a gozar
e intensifiquei ainda mais meus movimentos, desejando que a magia
durasse para sempre. Os músculos do Ji Won endureceram e o senti
gozar dentro de mim. Droga! Só me lembrei da camisinha quando já
era tarde demais e não quis me levantar de imediato, queria curtir um
pouco mais, aproveitar as sensações até que elas parassem
completamente.

Rolei para o lado da cama e deitei-me ao lado dele enquanto


inspirava e expirava profundamente. Ele se virou de lado e ficou
olhando para mim, sem dizer palavra alguma até que me levantei e fui
ao banheiro me lavar.
— Parece conhecer bem os motéis. — Voltei rindo com se tivesse
feito alguma piada.

— São populares por aqui. — Sentou-se na cama enquanto olhava


pelo quarto, talvez procurando onde havíamos jogado as nossas
roupas. — Como a maioria de nós ainda mora com os pais, é onde
nos encontramos para fazer sexo.

— Você ainda mora com seus pais? — Não consegui evitar ficar de
boca aberta.

— Não, mas eles morreram há anos em um acidente e eu não


tenho irmãos.

— Sinto muito.

— Tudo bem. Mas moro com os meus tios, e foi a morte deles que,
de certa forma, me levou a querer ser médico.

— Isso é incrível. — Peguei a minha calcinha e o sutiã e comecei a


me vestir.

— Incrível é você! — Ji Won me puxou pela cintura e fez com que


eu me sentasse no colo dele.

Comecei a beijá-lo, e quando me dei conta, estávamos transando


de novo.
Cinco

— Boa noite, bom dia! Seja lá que horas são aí.

— Bom dia, Jaque. São doze horas de diferença, não é difícil fazer
conta. — Apoiei o celular no ombro e caminhei até a janela para abrir
as cortinas e inundar o quarto com a luz do sol.

— Que seja! Acho que você precisa voltar logo antes que o Felipe
surte ou eu, o que acontecer primeiro. Acredita que ontem ele passou
o dia todo aqui no ateliê, esperando que você aparecesse, sei lá,
magicamente? Disse que você está na Coréia, mas ele pareceu não
acreditar muito.

— Ele não tem que acreditar em nada. — Bufei.

— Explica isso para ele, porque eu já cansei.

— Ontem eu transei até as minhas pernas ficarem bambas e tudo o


que eu não quero é ficar pensando no meu ex-arrependido.

— Transou?! — Podia jurar que a minha amiga estava de boca


aberta do outro lado da linha. — Como assim?! Com quem?

— Com um coreano que conheci aqui. Saímos alguns dias e fomos


para um motel ontem.

— Aposto que ele só queria comer a estrangeira gata. Esses


homens devem achar que todas as brasileiras são fáceis.
— Amiga, todas eu não sei, mas já pensou no fato de que eu só
queria dar para o coreano gato? Só quero transar com ele e tudo bem
se ele só quiser transar comigo. — Comecei a rir. — Saímos do motel
era quase de manhã, e ele me deixou aqui no hotel onde estou
hospedada. Pode ser que ele nunca me ligue de novo, mesmo se
ligar, daqui a alguns dias eu volto para o Brasil e é provável que nunca
voltaremos a nos ver. Me surpreende você, que sempre foi defensora
do sexo casual e das relações que duravam pouco.

— Porque eu deixava o romantismo para você. O que aconteceu?

— Felipe me deu um pé na bunda. Quer saber, tô feliz! O Ji Won...


— Mordi os lábios enchendo a minha mente com cenas do que
fizemos na noite passada. — Eu iria adorar repetir a dose antes de ir
embora.

— Lis, é realmente você? Que bicho estranho te mordeu?

— Estou bem, Jaque. Agora, preciso ir ou vou acabar perdendo o


ônibus da excursão para a N Seoul Tower.

— Bom passeio, espero que você volte logo. Estamos todos com
saudades.

— Falta pouco. Beijos!

— Até mais.

Afastei o celular do rosto e me surpreendi com uma mensagem do


Ji Won. Talvez Jaque estivesse um pouco errada sobre ele, não que
eu me importasse se estivesse certa, não havia vindo até a Coréia
para arrumar um marido no final das contas. Para mim, estava tudo
bem em termos passado apenas uma noite gostosa juntos.

Ji Won:

Oi!

Lis:

Oi, oppa!

Ji Won:
♥♥♥

Aonde quer ir hoje?

Lis:

O que acha de um lugar para dançarmos?

Ji Won:

Tem algumas boates boas em Gangnam. Podemos ir em alguma


delas.

Lis:

Vou adorar.

Ji Won:

Posso buscar você às 22?

Lis:
Sim.

Repetir a dose me pareceu uma ótima ideia. Passei a língua pelos


lábios, umedecendo-os, sem conter o sorriso que os tomou. Ji Won
estava sendo a companhia perfeita para aqueles meus dias na Coréia.
Tudo bem que ele quisesse se aproveitar de mim, como a Jaqueline
temia tanto, eu não era assim uma coelhinha indefesa e com certeza
queria me aproveitar dele também. Não esperava voltar da Coréia
com um anel e um pedido de casamento. Nem sei por que cheguei a
pensar nisso, era ridículo. É óbvio que ele também não ia querer nada
sério. Passei tempo demais presa a um cara só e precisava me tocar
que um caso era só um caso, mesmo que fosse com um coreano
lindo. Nós nos conhecíamos apenas há três dias. Ele seria uma parte
boa da minha viagem, ótima, para ser sincera. Mas quando eu
voltasse para o Brasil, os momentos juntos e o sexo seriam resumidos
apenas a boas lembranças.

Puxei a bolsa que estava sobre um aparador perto da porta e me


encarei no espelho acima dele. Joguei para trás o meu cabelo e
passei um batom rosa antes de deixar o quarto. Estava ansiosa para
visitar a torre de Seul. A visão incrível da cidade que eu poderia ter de
um monumento tão alto poderia me proporcionar imagens
maravilhosas para retratar nos meus quadros.

O ônibus passou para me pegar na hospedaria no exato horário


que haviam marcado comigo. Quando entrei, me dirigi a um banco
bem ao fundo. Ainda estava mascando um pedaço de torrada com
ovo e isso chamou atenção das outras pessoas que estavam lá
dentro, porém, não me importei.

A excursão seguiu com o guia falando coisas sobre a cidade que


eu não estava prestando muita atenção. Meus olhos não conseguiam
se focar em outra coisa que não fosse a beleza das cerejeiras floridas,
e eu não era a única, pois o casal à minha frente não só olhava, como
apontava.

Namsan Tower, como é comumente conhecida, é uma torre de


comunicação e observação localizada na montanha Namsan, no
centro de Seul. É a principal torre de ondas de rádio da Coréia do Sul,
fornecendo transmissão de TV e rádio.

Eu me permiti turistar um pouco. Enquanto o teleférico que eu


peguei para subir até a montanha começava a andar, eu tirei várias
fotos de tudo que via e julgava importante para as minhas obras. A
vista panorâmica era esplêndida.

Dei zoom na máquina para tirar foto da cerca que era repleta de
cadeados. Como em outros lugares do mundo, me lembrava de ter
visto uma em Paris, ali, as pessoas penduravam cadeados para
simbolizar amor eterno. Achava algo romântico e fofo, uma pena que
fofo nunca foi um adjetivo que combinou muito com o Felipe. Ao
contrário do Ji Won, que era muito...

Entrei na torre e caminhei até o lago dos desejos que ficava no


segundo andar. Peguei uma moeda na minha bolsa e fiz um pedido:
que parte da Coréia voltasse comigo para o Brasil. Era um pedido
idiota e quase impossível de ser realizado, mas nunca levei muito a
sério fontes do desejo antes.

Passei o dia todo ali, tirei muitas fotos, fiz inúmeros desenhos e tive
ideias incríveis para a exposição. Tinha certeza de que o curador iria
ficar muito empolgado com o material que eu teria para apresentar
quando voltasse.

Quando Ji Won chegou para me buscar naquela noite, eu já estava


sentada do lado de fora da hospedaria. Estava ansiosa? Talvez,
apenas um pouquinho, mas esperava não ser julgada por isso.

— Boa noite! — Ele jogou o cabelo preto e liso para trás antes de
estender a mão para mim.

— Parece um pouco cansado. — Olhei bem para o Ji Won e vi que


seus olhos estavam fundos e as olheiras levemente disfarçadas com
uma base.

— Hoje foi um dia difícil. Teve um acidente grave no interior e parte


dos feridos foram transferidos para o hospital. Ligaram para mim
assim que eu te deixei aqui pela manhã. Passei o dia em cirurgias
complicadas e acabamos perdendo dois pacientes.

— Acho que não é o melhor dia para irmos a uma balada, não é?
Por que não vamos a outro lugar, um mais calmo onde você possa
descansar um pouco?

— Você não se importa? Queria muito passar essa noite com você.

— Ainda podemos ficar juntos. — Sorri para ele.

— Podemos ir para a minha casa? Comer um lámen, talvez.

Apenas fiz que sim com um movimento de cabeça. Sabia que


comer um lámen tinha um duplo sentido às vezes, e confesso que
torci para isso. Entretanto, com o cansaço estampado no semblante
dele, eu não apostaria todas as minhas fichas.

Entrei no carro e Ji Won dirigiu por uns vinte minutos até um bairro
mais distante e residencial. Parou o carro em frente a um portão com
arquitetura sul-coreana medieval que me deixou de boca aberta. Era
como se eu tivesse voltado para ao Parque dos Palácios.

— Você vive aqui sozinho? — Lembrei que ele tinha falado da


morte dos pais em um acidente de carro.

— Não. Eu tenho um tio casado que tem um filho. Mas eles estão
no interior do país visitando a família da esposa dele. Essa casa
pertence à minha família há gerações.

— É linda!
Ele abriu o portão e parou com o carro em um pátio central, onde
havia um lago e um jardim nos moldes orientais, com direito a uma
enorme cerejeira florida. Era a casa mais linda em que eu já havia
estado em toda a vida.

Subi os degraus atrás dele e entramos no local. Ele acendeu a luz


e eu observei as paredes todas brancas sustentadas por tiras de
madeira escura. Paramos diante de um degrau e ele tirou os sapatos,
eu fiz o mesmo. Desci do salto voltando a ficar consideravelmente
mais baixa do que ele. Coloquei a pantufa que ele me entregou e
seguimos para o interior da casa. Ao passar pela sala eu vi a mesa
baixa e alguns móveis que me transportaram para um filme antigo.

— Pode deixar sua bolsa ali. — Apontou para um móvel no


pequeno hall.

Assenti e a tirei do ombro.

Continuamos andando para o interior da casa, eu observava cada


entalhe e quadro nas paredes, bem como o interior de cada cômodo
que estava com a porta aberta. Paramos em um que eu julguei ser o
quarto dele. Era perfeitamente limpo, organizado e claro. Fora a pilha
enorme de livros sobre a escrivaninha, não havia nada particular no
quarto, poderia pertencer a qualquer outra pessoa.

— Está com fome? — Ele me encarou após longos minutos.

— Não, mas aceito um copo d’água.

— Vou buscar.
Assenti e entrei para o quarto. Sentei-me na cama dele, não era
como uma cama ocidental. Era baixa, como se fosse praticamente o
colchão no chão sobre um tapete bonito. Diante dele havia uma
televisão. Imaginei que pudéssemos ficar ali o restante da noite.

Ji Won voltou com o copo de água para mim e ligou a televisão


antes de se sentar ao meu lado.

Agradeci com um movimento de cabeça e dei algumas goladas.

— Tem algo em inglês para assistirmos? — O que estava passando


na televisão estava em coreano e eu me sentia como um bebê
olhando para imagens que não faziam muito sentido sem o áudio.

— Acho que encontraremos algo, mas vai precisar aprender


coreano.

Vou? Não externei aquela pergunta, mas ela me deixou um pouco


confusa. Por que tinha que aprender coreano se iria embora do país
em alguns dias? Ele colocou um filme americano que estava em
inglês com legendas em coreano e eu comecei a assistir e deixei os
questionamentos para lá. Estávamos no quarto dele e eu me sentia
super ansiosa para que rolasse alguma coisa, porém, quando me virei
de lado, percebi que ele estava escorado em mim, com a cabeça no
meu ombro, dormindo. O cansaço que eu havia notado nele era mais
do que apenas uma simples impressão. Ajeitei-o no meu colo, para
que pudesse dormir da forma mais confortável possível, ainda o
mantendo perto de mim.
Fiquei mais tempo olhando para ele do que prestando atenção no
filme. O Ji Won era muito bonito, tanto quanto os caras dos Doramas
que eu babava. Ele era ainda mais fofo dormindo...

Fiquei acariciando o cabelo dele, escorregando os dedos pelos fios


macios, enquanto ele continuava no sono profundo. Por um momento,
senti como se fôssemos um casal. Precisei me lembrar de que era só
um caso. Estávamos tendo ótimos momentos juntos, mas era só isso.
Esses pensamentos ridículos não deveriam estar passando pela
cabeça dele. Como a Jaqueline havia falado: eu era só a estrangeira
fácil.

Observei o quarto, impecavelmente limpo e organizado, e pensei o


quanto ele surtaria se visse o meu. Quase ninguém além de mim se
encontrava na minha bagunça.

O filme já estava quase acabando quando Ji Won espreguiçou e


abriu os olhos puxados.

— Desculpe. — Voltou a sentar.

— Tudo bem. Você estava cansado.

Ele abriu um sorriso e curvou o corpo na minha direção esfregando


os lábios nos meus. Passei os braços ao redor do pescoço dele e
intensifiquei o beijo, pressionando a minha língua, pedindo passagem.
Saboreei os lábios dele, o incitei e o provoquei enquanto Ji Won ia
avançando com o corpo dele sobre o meu, até que eu me deitasse na
cama.
Ele inundou a mão dentro da saia do meu vestido, escorregando-a
pelo interior da minha coxa e me fazendo ser tragada pelo desejo. A
pulsação crescente ia se tornando quase enlouquecedora. Meu corpo
todo queria provar mais dele. Era como se eu sentisse saudades
ainda que nem tivesse ido embora.

— Temos que usar camisinha. — Pressionei meus lábios contra a


orelha dele assim que Ji Won começou a baixar a minha calcinha.

Ele assentiu e afastou-se de mim indo buscar uma.

Acordei com um despertador e o som daquele barulho me fez


praguejar. Por qual motivo tinha um despertador no meu quarto? Me
conhecia bem e sabia o quanto odiava acordar cedo, por isso havia
programado todas as minhas atividades para o período da tarde e da
noite. Quando o sol caía, era quando a minha mente se tornava mais
produtiva.

— Bom dia!

Abri os olhos por reflexo quando ouvi a voz do Ji Won. Foi quando
virou uma chave na minha cabeça e me dei conta de que havia
dormido com ele e que estava na sua casa. Minhas pupilas se
acostumaram à luz do sol que entrava pela janela e eu o vi abrindo
um guarda-roupa e puxando uma camisa branca.

Espreguicei e cocei os olhos enquanto bocejava.

— Está indo trabalhar?

— Sim, preciso estar no hospital em meia hora.

— Pode me deixar no hotel antes?

— Posso sim.

Levantei ainda sonolenta, passando a mão no meu vestido que fora


parar no meio do quarto. Comecei a colocá-lo e parei quando Ji Won
estendeu meu sutiã para mim. Abri um sorriso amarelo e vesti a roupa
na ordem certa dessa vez.

— Vou preparar um lámen para mim. Você quer? — Ele me roubou


um selinho.

— De manhã? — Torci os lábios em uma careta. — Tem alguma


torrada ou um pedaço de pão?

— Posso ver o que acho na cozinha. — Estendeu-me a mão. — É


a minha tia quem compra os mantimentos da casa.

— Tudo bem se não tiver. Como algo quando chegar ao hotel.

— Venha comigo.

Assenti e caminhamos até a cozinha. Ele colocou água para


esquentar e eu pensei em me escorar na parede, mas tive medo de
que ela caísse comigo, então apenas cruzei os braços e fiquei
observando.

Enquanto a água esquentava ele abriu os armários, procurou um


pouco até que achou algumas torradas.

— Um pouco de queijo também?

Assenti com um sorriso.

Ji Won preparou o sanduíche para mim e o seu lámen com a água


quente. Fomos até a mesa baixa na sala e comemos em silêncio.
Depois disso, ele foi trabalhar e me deixou na hospedaria onde eu
estava.

Cheguei suspirando, o que chamou atenção do dono que estava


sentado em uma poltrona na recepção lendo um jornal. Parei no meio
do caminho, dei um meio giro e respondi a ele que tivera uma ótima
noite com um coreano agradável. Pela careta que ele fez e a
expressão de desdém em seu rosto, eu imaginei que tivesse deduzido
que havia sexo no meio, contudo, não dei a mínima para o julgamento
conservador dele.
Seis

— Feche os olhos. — Ji Won passou as mãos pelo meu rosto


enquanto estávamos sozinhos no seu quarto outra vez.

Assenti ao pedido dele, sentindo um calafrio percorrer minha


espinha. Meu coração disparou e minhas pernas ficaram bambas.
As sensações que ele provocava em mim eram deliciosas e me
faziam querer mais e mais, para sempre...

— Abra a boca.

Ele esfregou algo doce contra os meus lábios e ao morder


senti o gosto de chocolate. Um bombom...

— Você gosta?

Fiz que sim.

Ele colocou outro chocolate na minha boca e beijou meu


pescoço me fazendo ofegar e arrancando de mim um gemido...

Aquela foi uma noite muito saborosa.

Despertei da lembrança com um calafrio ao me dar conta de que já


havia voltado para o quarto da hospedaria onde eu estava.

Passei mais dois dias na Coréia na companhia do Ji Won. A


aguardada ida à boate foi trocada pela cama dele ou a de um motel.
Não estava arrependida, de forma alguma. Havia muito tempo em que
não me sentia tão bem ao me envolver com um cara. Não era apenas
o sexo. Ele era gentil, atencioso e me deixava suspirando como uma
adolescente. Às vezes em que simplesmente caminhamos juntos
entre as cerejeiras me fizeram querer congelar aquele momento e
certamente seria uma das pinturas que guardaria para mim.

Senti uma dorzinha no peito quando puxei o celular debaixo do


travesseiro e vi a data. Meu voo para o Brasil seria em algumas horas
e eu teria que deixar o meu sonho na Coréia para trás e acordar para
a vida real. Eu precisava ir embora, mas não tinha coragem de me
despedir dele pessoalmente. Era só um caso com data certa para
acabar, mas meu coração estava apertado.

Ia soltar o celular em cima da cama outra vez quando ele vibrou.

Ji Won:

Quer tentar a balada hoje? Ou...

Lis:

Não dá ☹ .

Ji Won:

Por que não? Eu fiz algo de errado?

Lis:
Não é isso. Por que faria algo de errado, oppa? Mas eu tenho que
ir.

Ji Won:

Para onde?

Lis:

Para casa. Brasil.

Ji Won:

Já? Achei que fosse ficar mais tempo.

Lis:

O Tempo passa rápido quando estamos nos divertindo. Eu amei a


sua companhia e os momentos que passamos juntos.

Ele ficou um tempo sem responder, minutos, muitos minutos que se


transformaram em uma hora, o que me deixou com uma dor no peito
provocada por uma angústia. Será que ele tinha ficado com raiva ou
apareceu algo importante no hospital?

Ji Won:

Boa viagem de volta.

Engoli em seco ao ler, não imaginava que aquela resposta seca


fosse o último contato que eu teria com ele, mas Ji Won não disse
mais nada. A sensação que eu tive era que ele havia ficado irritado,
no entanto, que culpa eu tinha? Era uma estrangeira a passeio ali,
voltaria para o Brasil em um momento ou outro, isso era óbvio para
qualquer um.

Espera! Eu estava fazendo inferências desnecessárias. Era um


caso e ele provavelmente não deveria se importar com o fato de eu ir
embora.

Passei a manhã até o horário do check out da hospedaria em lojas


próximas. Aproveitei para comprar presentes para a minha família e
amigos, que acabariam me esfolando se eu não levasse nada do
Oriente para eles.

No meio da tarde, o táxi me deixou em frente ao aeroporto


internacional. Entrei no saguão puxando uma mala de rodinha e com
uma outra bolsa menor pendurada no ombro, com alça se embolando
na minha mochila. Segui até o balcão da companhia aérea para
despachar a bagagem maior. Hora ou outra, eu olhava para trás numa
tola esperança de ver o Ji Won. Era ridículo, mas Jaqueline tinha
razão, eu tinha um lado romântico, um que tentei ignorar
completamente enquanto estava com ele.
Sabe aqueles filmes megaromânticos com finais felizes em que o
cara aparece no aeroporto e impede a garota de pegar o voo que vai
levar ela embora para sempre? Então, sonhei com isso enquanto
despachava a minha bagagem. A cada som eu virava para trás, a
ponto de começar a parecer paranoica para as pessoas que estavam
próximas a mim.

Obviamente, ele não apareceu. Nós não tínhamos nada! Não ia


levar muito tempo para se esquecer de mim.

Entreguei o meu cartão de embarque com um meio sorriso nos


lábios e seguia para dentro do avião. Procurei a minha poltrona e
sentei. Olhei pela janela para a Coréia pela última vez e me despedi
em pensamentos.
Sete

Comecei a rir quando saí pelo portão do desembarque e dei de


cara com Jaqueline e minha irmã segurando um cartaz com o meu
nome.

— Vocês estão de sacanagem, né? — Mordi o lábio e revirei os


olhos para elas.

— Deixa de ser chata, Lis! — Alexandra mostrou língua para mim.


— Estávamos com saudades de você e o cartaz era para mostrar o
quanto você é importante para nós. E antes de você continuar com
essa careta, saiba que a mamãe preparou para você uma festinha de
boas-vindas na casa dela.

— Ah, não, Alex!

— Ah, sim! — Ela pegou a mala da minha mão. — Treine seu


melhor sorriso no caminho de Confins até em casa.

— Só passei quinze dias longe e estou louca para voltar para


casa... Para a minha casa!

— Tem ideia do que a mamãe vai fazer conosco se eu não levar


você para lá?

— Não é problema meu. — Dei de ombros.

— É sim! Porque você ama muito a sua irmã e não quer que ela
seja assassinada aos vinte e três jovens anos.
— Acho que você deveria ser atriz, e não uma advogada.

— Você não faz ideia de quanto as duas profissões são


relacionadas.

Jaqueline colocou a mão na boca para conter o riso.

— Tá! — Bufei. — Meia hora, uma no máximo!

— Eu amo você, Lis. — Alexandra me abraçou.

— Também amo você, minha irmãzinha manipuladora.

Depois da Alex ganhar aquela batalha, nós seguimos até o


estacionamento do aeroporto onde estava estacionado o carro dela.
Colocamos as malas no porta-malas e entramos no veículo. O sol
estava muito forte naquela manhã e o interior parecia um verdadeiro
forno. Fui abrir a janela, mas a minha irmã deu um tapinha na minha
mão e ligou o ar-condicionado. Mostrei língua e puxei o cinto ao me
acomodar no banco do carona.

— Me conta como foi a viagem? — Ela manobrou o carro e seguiu


para fora do estacionamento.

— Ela já falou que andou transando com um coreano?

Virei a cabeça para trás e fuzilei a minha melhor amiga como se


tivesse a visão de calor do super-homem. Jaqueline se encolheu,
talvez arrependida do que tinha acabado de dizer.

— Como assim, Lis!? — Ela pisou no freio e nós três chacoalhamos


dentro do carro.
— Presta atenção! Você está dirigindo. — Tentei repreendê-la, mas
era óbvio que isso não seria o suficiente para que minha irmã
esquecesse aquele assunto.

— Você não perdoa um, Lis. — Deu uma risadinha travessa.

— Não é como se eu tivesse passado o rodo. Eu me envolvi com


um cara, foi bom, mas já acabou.

— Ele era bonito? O que fazia da vida? Artista também?

— Estou com a minha irmã ou uma juíza?

— Um pouco das duas. — Deu de ombros.

— Você é terrível.

— Desembucha logo, para não ficarmos o dia inteiro nessa.

— Ele tem vinte e nove anos na Coréia, e vinte e sete no resto do


mundo. — As duas contorceram o rosto em um ponto de interrogação,
mas nenhuma me interrompeu. — Sim, é muito bonito e é médico.

— Uau! Acho que a mamãe ficaria orgulhosa.

— Nem sonha em contar para ela ou juro que te afogo na privada,


como desejei quando éramos crianças.

— Jaque, você é minha testemunha da ameaça de morte que a


minha irmã acabou de fazer, né?

— Eu nem tô aqui. — Minha melhor amiga cobriu o rosto com as


mãos e eu caí na gargalhada.
— Não se pode contar com ninguém nesse mundo. — Minha irmã
balançou a cabeça em negativa, fazendo com que o rabo de cavalo
que usava balançasse de um lado para o outro.

— Menos, Alex, bem menos.

— Eu vou me casar daqui há três meses. Podemos transformar


isso em um casamento coletivo e terminar de surtar a minha sogra.

— Eu provavelmente nunca verei o cara outra vez. Parem de viajar,


vocês duas.

— Só estava torcendo pela sua felicidade. — Ela fez bico.

Superei e voltei meu olhar para fora, observando a Linha Verde que
nos levava de volta a Belo Horizonte.

Alexandra estacionou o carro diante da casa dos meus pais e eu já


quis dar meia-volta. Não que eu não gostasse deles, mas a nossa
mãe tinha a tendência de ser tão exagerada quanto a minha irmã
caçula. Não sabia como ela havia sobrevivido tanto tempo como
jornalista, se ela era tudo, menos imparcial.
— Quer deixar suas coisas aqui no carro? Depois levo vocês para
casa.

— Só se me prometer ir quando eu pedir.

— Tá... — Revirou os olhos. — Quando você quiser.

Eu não morava mais com os meus pais havia alguns anos.


Jaqueline e eu tínhamos alugado um apartamento para trabalharmos
em nossos projetos juntas, e acabamos nos mudando para lá. A
demanda aumentou com o tempo e criamos um ateliê, entretanto,
continuamos morando no apartamento.

Entramos na casa e aos poucos eu fui reconhecendo algumas


vozes. Odiei ter chegado num domingo e dar brecha o suficiente para
que as pessoas se reunissem contra a minha vontade. Uma coisa
seria se fossem meus amigos e pessoas que eu estava super a fim de
ver depois de um tempo fora do país, outra era ter certeza de que
eram parentes e amigos indesejados da minha mãe.

— Querida, que bom que você chegou! — Ela deixou o copo de


cerveja sobre um dos armários da sala e veio correndo me dar um
abraço.

Retribuí o carinho, mas a minha expressão era de poucos amigos.

— Sentimos tanto a sua falta.

— Mãe. — Afastei-a empurrando devagar. — Não foi a viagem


mais longa que eu já fiz.
— Ah, mas você entende. Com o casamento da Alex se
aproximando, você longe... Eu me sinto mais solitária do que nunca.

— Eu já voltei.

Olhei a minha expressão retorcida no espelho da sala e tentei


sorrir. Não estava nos meus melhores dias. O cansaço era evidente
nos meus olhos verdes caídos e no meu cabelo bagunçado como um
ninho de rato.

— Alex, me empresta um pente. — Virei-me para a minha irmã.

— Achei que nunca fosse pedir. — Abriu a bolsa e estendeu-o para


mim.

— Obrigada! — Penteei meus cabelos antes de dar o ar da graça


aos irmãos da minha mãe e aos amigos do jornal, que estavam todos
reunidos ao redor da churrasqueira.

Eu me escorei na parede enquanto sorria amarelo para aqueles


que me encaravam. Estava cansada demais para aquilo, maldita hora
em que aceitei que Alexandra me trouxesse para a tal festa que
poderia ser para qualquer um, menos para mim.

— Lis! — Ouvi uma voz que eu desejei não estar ouvindo.

Fechei os olhos na esperança de que, se o ignorasse, ele iria


embora.

— Lis! Será que pode olhar para mim?

— O que está fazendo aqui, Felipe? — Respirei fundo e o encarei.


Meu ex estava parado perto da porta, com as mãos dentro dos
bolsos da calça e de cabeça baixa. Uma mecha do cabelo estava
caída sobre os olhos castanhos e a barba estava por fazer. A pele
morena tinha um brilho de suor, como se ele tivesse chegado
correndo.

— Estava ansioso para ver você.

— Não posso dizer o mesmo. — Olhar para ele me causou uma


dorzinha no peito. Ainda estava sentida pela forma como havia
terminado comigo, talvez não o houvesse superado como cheguei a
acreditar.

— Nós precisamos conversar.

— Achei que já tivesse dito tudo quando me pediu um tempo. Você


não sabia mais se gostava de mim. Tudo bem, segui em frente.

— Fui um idiota, Lis...

— Não se julgue tanto. — Dei de ombros.

— Eu estava só esperando você voltar da Coréia para


conversarmos. Preciso que você me desculpe.

— Posso até aceitar as suas desculpas, Felipe, mas sabe que é


mais do que isso... — Passei os dedos pelo meu cabelo e o encarei
com meus olhos verdes.

— Lis...
— Acabei de chegar de viagem. Realmente não quero falar sobre
isso agora. — Cruzei os braços e mordi o lábio.

— Promete ir jantar comigo um dia desses?

— Agora não...

— Daqui há duas semanas, ou no fim do mês. O dia que você


puder.

— Vou pensar nisso depois.

— Obrigado! — Abriu o maior sorriso do mundo, como se a minha


resposta significasse alguma coisa.

Minha irmã passou por nós e eu a puxei pelo braço, colocando-a


entre mim e o Felipe.

— Disse que me levaria embora quando eu quisesse.

— Já quer ir?

— Sim.

— Eu posso levar você em casa — ofereceu Felipe.

— Deixa que eu levo. As coisas dela já estão no meu carro —


respondeu a Alex sem que eu precisasse.

Minha irmã sempre foi boa em me ajudar a escapar de pequenas


encrencas.

— Você me liga? — Felipe me prendeu com o olhar antes que eu


passasse por ele.
— Tá. — Virei o rosto e encontrei Jaqueline dando uma boa golada
num copo de cerveja. — Vamos embora.

Ela assentiu e seguimos para fora da casa.

— Beijos, mãe!

— Adeus, querida! — ela gritou quando eu já estava a meio


caminho da rua.

Alexandra levou a mim e a Jaqueline para o apartamento onde


morávamos. Foi um alívio enorme poder soltar meu corpo sobre a
minha cama macia e ouvir apenas o silêncio. Tudo estava em seu
devido lugar, inclusive a pilha de roupas sujas ao lado da porta.
Jaqueline levava a sério a ideia de não mexer nas minhas coisas.

— Vou fazer um chá para mim. — Ela apareceu na porta do meu


quarto trançando o cabelo loiro, quase platinado, que ela havia
adquirido no salão de beleza. Inclusive, a raiz castanha já estava
começando a aparecer, era hora de retocar. — Você quer?

— Quero sim. — Nem me mexi, continuei com a cabeça afundada


no travesseiro.

— Camomila ou chá verde?

— Ainda tem hibisco?

— Acho que sim. Se tiver, faço para você.

— Obrigada! Sabe que eu te amo, não é, Jaque?

— Interesseira... — saiu balbuciando, mas não dei importância.


Oito

Havia uma semana que eu havia retornado e a rotina começava a


voltar a ser a mesma. Naquele dia pela manhã, Jaqueline precisou
fazer algo da renovação da carteira de motorista dela e eu fui para o
ateliê sozinha. Estacionei como de costume do outro lado da rua e
desci com as chaves na mão. Estava com uma mochila pequena
escorada em apenas um ombro enquanto procurava pela chave certa
para abrir meu local de trabalho, senti a mochila escorregar e olhei
para o lado. Vi um homem com ela na mão e imaginei que havia
pegado para me entregar, mas quando dei um passo para pegar e
estava pronta para agradecer, percebi que ele estava sobre uma moto
e acelerou para longe.

Fiquei de boca aberta, abobada por uns dez minutos até a minha
ficha cair e eu entender que havia sido roubada. Meu caderno e
esboços mais recente, minha carteira e meu celular levados por um
estranho que já tinha sumido de vista.

Praguejei baixinho e bati a porta do carro com raiva. Ótima forma


de começar o trabalho! Por sorte, ao menos a chave do carro e do
ateliê ainda estavam nas minhas mãos.

Estava com uma dor de cabeça terrível desde que havia acordado
e ela ficou ainda mais intensa depois que isso aconteceu.
Massageando as têmporas, abri o ateliê e usei o telefone fixo para
ligar para a Jaqueline.

— Oi, Lis, está tudo bem aí?

— Não! Acabei de ser roubada.

— Como assim?! Você está bem?! Usaram arma? Foi no ateliê?

— Não. Eu estou bem. Estava distraída e um motoqueiro levou a


minha mochila. O tenso é que perdi todos os meus documentos,
cartões e o celular. Porque dinheiro mesmo, só tinha uns trinta reais.

— Precisa ligar para a polícia!

— Vou fazer um boletim de ocorrência pela internet e cancelar os


cartões. Pode comprar outro celular e um chip para mim? Ficar sem
vai ser tenso.

— Não acha melhor ir a uma loja da operadora e recuperar o


mesmo número?

— Não precisa. Bom que eu fico um tempo sem ser incomodada


pelo telemarketing, e pelo Felipe. Quando eu logar no e-mail, a nuvem
baixa os meus contatos.

— Como você quiser.

— Obrigada, amiga!

— Não por isso.

Desliguei o telefone e a cabeça não parava de doer. Meu estômago


também estava revirando e esperava que isso passasse logo.
Passei o dia cancelando cartões e pedindo novos, além de solicitar
uma segunda via da minha carteira de motorista, na esperança que
chegasse o mais rápido possível.

Ji Won

Escorei-me na parede da minha sala e puxei o celular do bolso.


Havia dias que ela tinha ido embora e eu ainda me sentia um tolo.
Sabia que ela era estrangeira e a possibilidade de voltar para o país
natal pairava sobre nós, porém, eu me deixei iludir. Acreditei que
houvesse algo a mais acontecendo entre nós dois.

Cliquei na foto dela e comecei a digitar a mensagem.

Ji Won:

Nunca deveria ter deixado você ir embora...

— Doutor Kim! — Uma enfermeira bateu na porta e entrou na


minha sala. — Já estão à sua espera na sala de cirurgia.

— Estou indo.

Esperei alguns minutos, mas não obtive resposta alguma. Então,


coloquei o celular em uma gaveta e puxei meu jaleco.
Lis

— Trouxe um chá para você. — Jaqueline entrou na sala


carregando uma bandeja.

Ergui os olhos do celular novo que estava configurando e a encarei.

— Obrigada.

Assim que me aproximei da xícara, meu estômago revirou de vez e


eu saí correndo para o banheiro. Deixei sair o vômito que estava
segurando o dia todo.

Jaqueline colocou a bandeja na mesa de centro e veio até mim.


Parou junto às minhas costas e puxou o meu cabelo para cima.

— Amiga, o que foi?

— Não sei. Estou com um mal-estar tem uns dois dias. A cabeça
doendo, o estômago embrulhando.

— Será que é alguma virose?

— Eu não sei. — Ainda estava tonta, com a cabeça virada para


baixo e a mão apoiada na parede.

— Vou levar você ao médico.


— Não precisa.

— Precisa sim! Nem que seja para ele dizer que é só uma virose e
mandar você tomar soro.

— Jaque...

— Vamos logo! — Passou a mão pela minha cintura e me levantou.

— Acho que ir ao médico é um exagero, tenho certeza de que devo


ter colocado para fora o que estava me fazendo mal.

— Amiga, sabe que eu prefiro pecar pelo excesso.

Torci os lábios e bufei, sabendo que nada iria fazer a Jaque mudar
de ideia. Quando o assunto era a preocupação exacerbada da minha
melhor amiga, eu era time vencido.

Fui até o meu quarto e peguei uma blusa, porque estava sentindo
um pouco de frio. Seguimos para a garagem do prédio onde estava o
meu carro. Eu ouvia cada barulhinho, do vizinho andando no
apartamento de cima ao cachorro da cobertura. Tudo ecoava dentro
da minha cabeça e alfinetava como se tivesse espinhos. Estava
enfrentando a pior ressaca da minha vida.

Cobri os olhos com as mãos quando as luzes da cidade


começaram a bater neles e incentivar a minha fotofobia. Jaqueline,
concentrada na direção, mal me notou encolhendo-me no banco do
carona.

Assim que ela estacionou em frente ao pronto socorro da clínica do


convênio médico, eu fui a primeira a sair do carro e ir cambaleando
para fora. Passei pela recepcionista, que me encarou com um ar de
surpresa, e segui para o banheiro que ficava depois do balcão.

— O que ela tem? — perguntou uma enfermeira à minha melhor


amiga, que veio logo atrás de mim.

Por sorte, eu não vomitei de novo, mas estava muito apertada para
fazer xixi. Saí do banheiro secando as mãos em uma toalha de papel
e até com um sorriso nos lábios.

— Ela está enjoada e com dor de cabeça. — Jaqueline se


debruçou sobre o balcão da recepção. — Acho que é alguma virose.

— Vou dar para você uma senha e quando chamar no telão, vocês
podem seguir para a triagem.

Jaqueline assentiu e me puxou para uma das cadeiras diante do


telão.

— Me dê a sua carteirinha do convênio e o documento. Vão pedir.

— Fui assaltada, lembra? Mas sei o número de cor.

Abri a bolsa e entreguei a minha identidade para ela, por sorte,


andava apenas com a carteira de motorista.

Respirei fundo. Estava com medo de que qualquer movimento


brusco me fizesse correr para o banheiro outra vez, por mais que
estivesse me sentindo um pouco menos enjoada.

O número da senha piscou no telão e seguimos para a sala


indicada. Lá uma enfermeira estava de pé ao lado da mesa e ajeitava
o estetoscópio ao redor do pescoço. Ela tinha os cabelos cacheados
soltos ao redor do rosto, no estilo black power, e um sorriso muito
gentil.

— Olá, sente-se aqui. — Ela apontou para a cama de hospital


coberta por um papel. — O que você está sentindo?

— Acho que ela está com virose. — Jaqueline parou ao meu lado e
atropelou a minha resposta.

Sentei-me no local indicado, em cima do papel, e segurei os joelhos


com as mãos quando o enjoo decidiu voltar. Esperava que parasse
logo, pois eu não tinha mais o que vomitar.

— Tem uns dias que estou com uma dor de cabeça horrível. Um
pouco de cólica também, e hoje comecei a vomitar. — Talvez a
Jaqueline tenha razão e eu tenha pegado alguma virose.

— Você tem se alimentado bem? — Aproximou-se de mim e


colocou o aparelho de medir pressão ao redor do meu braço.

Fiz que sim com um movimento de cabeça enquanto a encarava.

— Foi para algum lugar diferente nesses últimos dias?

— Eu estive na Coréia do Sul.

— Sabe se está tendo algum surto de gripe ou alguma doença por


lá?

— Não.

— Acha que está inchada? — Começou a apertar meu braço.


Pensei por alguns minutos enquanto observava o meu próprio
corpo.

— Estou...

— Teve relações sexuais nas últimas semanas?

— Tive. — Ergui as sobrancelhas sem entender aonde ela queria


chegar. Uma DST iria ser o fim...

— Quanto tempo desde a sua última menstruação?

Arregalei os olhos e prendi a respiração ao fazer rapidamente a


conta em minha cabeça. Estava tão atribulada com a minha volta e as
coisas que tinha que organizar no ateliê que me esqueci
completamente desse fato.

— Está atrasada... — Inspirei e comecei a ofegar.

— Pode não ser uma virose. Recomendo que faça um teste de


gravidez.

— Quê?! — Vi a Jaqueline cambalear para trás.

— Acha que eu estou? — Olhei para a minha barriga e senti um


calafrio varrer a minha espinha. Não esperava vir ao médico e receber
uma notícia dessas, mas precisava admitir que era possível.

— Podemos fazer um exame de sangue aqui mesmo.


Confirmaremos se é gravidez ou uma possível virose.

— Tudo bem.

— Vou buscar o material de coleta. Podem esperar aqui.


Jaqueline se sentou ao meu lado e me olhou atravessado.

— Grávida!?

— Pode ser que não. — Encolhi.

— Amiga, você e o coreano usaram camisinha, né?

— Na primeira vez, não. — Cobri o rosto com as mãos.

— Eu não acredito que você cometeu esse tipo de vacilo!

— Na hora, eu nem pensei, Jaque... — Comecei a respirar fundo,


tentando não entrar em desespero.

— Como não pensou? Camisinha é o básico para transar com um


desconhecido.

— Eu sei...

— Não é o que parece.

— Não adianta nada me olhar com essa cara agora. — Empurrei-a


pelos ombros, forçando-a a parar de me encarar como se fosse me
fuzilar.

— Costumava ser mais responsável do que isso, Lis. Não foi um


vacilo do tipo esquecer a carteira de motorista em casa.

— Dependendo da preliminar, é mais difícil esquecer a carteira.

— Acha que pode ser do Felipe?

— Sem chance! Não tive recaídas depois que ele terminou comigo,
e isso já faz meses.
— Teve outro cara antes de ir para Coréia?

Fiz que não.

— Puts! — Jaqueline começou a massagear as têmporas em algo


que me pareceu uma tentativa de não surtar. Algo que, pela
expressão dela, poderia acontecer a qualquer momento.

A enfermeira voltou e pediu para que eu descesse da cama e me


sentasse diante da mesa, com o braço apoiado. Apertou meu braço
com uma faixa de elástico e colheu dois frascos de sangue, antes de
colocar um algodão em cima do furo da agulha.

— Esperem na recepção. Pode levar algumas horas para o


resultado sair. Um médico irá chamá-la pelo nome.

Olhei para Jaqueline e, juntas, saímos da sala e fomos nos sentar


em uma das cadeiras da recepção. Ela ficou calada, gostava da forma
como ela percebia que eu precisava do meu espaço. Em um canto,
observei um cara encher o copo d’água e a forma como as bolhas se
formavam no galão enquanto o líquido se movia. Ocupei meu cérebro
com várias pequenas coisas, do menino jogando baralho no celular a
duas cadeiras de mim, a recepcionista que tinha o olhar vago e
perdido, porém não teve jeito. A ficha no meu cérebro caiu e eu
comecei a tremer. Ser mãe não era uma das minhas metas para os
próximos anos. Talvez tivesse pensado nisso enquanto namorava o
Felipe. Qualquer sonho que eu tinha de construir uma família foi
jogado ralo abaixo quando ele me disse que precisava curtir a vida.
Eu não consegui mais evitar que o rosto do Ji Won viesse à minha
mente, e o evitava desde que havia voltado. Comecei a rir e Jaqueline
olhou para mim como se eu fosse louca, no entanto, ela não sabia do
pedido insano que eu havia feito para um lago dos desejos que não
acreditava funcionar. Que parte da Coréia voltasse comigo para o
Brasil. Nunca pensei que meu pedido seria em forma de um bebê.
Poderia ter sido uma muda de cerejeira.

— Lis, você está bem? — Jaque segurou minha mão entre as dela
e me encarou com um ar mais compreensível e amoroso.

— Ainda um pouco enjoada.

— Será que você pode tomar um remédio para enjoo?

— Perguntaremos ao médico quando ele me chamar.

Assim que terminei de falar uma mulher vestida de jaleco branco


apareceu no corredor que levava para as salas e me chamou pelo
nome. Jaqueline e eu nos levantamos, a seguimos até uma porta bem
no fundo e acatamos o seu gesto de sentar-se nas cadeiras diante da
mesa.

— Alissa, como a enfermeira da triagem suspeitou, você realmente


está grávida.

Engoli em seco, mas não disse nada.

— Não há nada que indique virose ou outra alteração em seu


exame de sangue, então creio que tudo o que está sentindo são
sintomas da gravidez.
— E está tudo bem com o bebê?

— A gravidez ainda é muito recente, mas creio que sim. Agora


deve fazer um pré-natal para acompanhar o desenvolvimento do
bebê.

— Posso tomar remédio para enjoo?

— Posso receitar alguns, mas recomendo que tome algo mais


natural. É bom evitar medicação durante o desenvolvimento do seu
bebê.

No momento, eu achei que podia lidar com o enjoo.

— É isso, você pode voltar para casa, tome bastante líquido e


repouse.

— Obrigada, doutora. — Levantei-me ainda um tanto atordoada e


segui para o meu carro com Jaqueline atrás de mim.

Voltamos para o carro, eu abri a porta do carona e coloquei o cinto.

— Ainda não acredito que você está grávida — comentou enquanto


dava ré e ia para rua.

— Nem eu. — Coloquei as mãos sobre a barriga, sentindo-me sem


peso, como se eu estivesse anestesiada.

— Tem certeza de que é do coreano?

— A não ser que tenha entrado um espírito em mim e me


fecundado, não pode ser de outro cara.

— Você vai tirar?


— Quê!? Não! — Coloquei as mãos sobre a barriga outra vez. —
Sempre gostei de bebês. De ficar com eles, de cuidar deles. Talvez
seja o momento de ter o meu.

— Acha que o Felipe vai ficar de boa com isso?

Torci o nariz e os lábios e foi a minha vez de olhar para ela como se
fosse fuzilá-la.

— Ah, fala sério! Ele não tem que ter opinião nenhuma a respeito
disso. Nem dele esse bebê é. Tomara que seja um pretexto para
deixá-lo bem longe de mim.

— Você tem razão. Só achei que talvez fosse acabar voltando para
ele. Eu me lembro bem de quanto você chorou com esse término. Era
como se você nunca mais fosse gostar de outra pessoa no mundo.

— Nós namorávamos desde antes de entrarmos para a faculdade,


foram anos juntos. Mas eu superei. — Ergui o nariz, convencida.

— Com toda a certeza, superou. Já está até grávida de outro.

Abri um sorriso amarelo sentindo as minhas bochechas corarem.

— Não me julga!

— Não estou. É por isso que sabe que eu sou a sua melhor amiga.
Sabe que vai ter a minha ajuda caso precise. Eu sou ótima em trocar
fraldas. Ajudei muito a minha irmã quando o Pedro nasceu.

— Eu sei. — Sorri para ela e me contive para não tentar abraçá-la


enquanto dirigia.
— Vai contar para o coreano que está grávida dele?

Fiquei em silêncio com a pergunta dela. Contar ou não contar? Era


provável que ele estivesse com raiva de mim depois que eu fui
embora daquele jeito, para o Ji Won não era um segredo que eu
voltaria para o Brasil em um momento ou outro, porém, nunca disse
quando. Ou ele não estava nem se lembrando de mim também,
porque não era como se fôssemos namorados. Foi só um caso.

A verdade é que eu fugi sem saber, sem sequer perguntar. Não


tinha bola de cristal para saber o que se passava na mente dele. Fui
covarde... Imaginei que jamais voltaria a vê-lo. Ficar grávida do Ji Won
era algo que nunca pensei ser possível, ainda que estivéssemos
saudáveis e tivéssemos nos esquecido de usar camisinha da primeira
vez. Era uma loteria na qual eu tinha sido premiada, para bem ou para
mal.

Estava feliz com a gravidez, no entanto, não sabia que passo tomar
a seguir.

— Sei lá, Jaque! Ele está do outro lado do mundo. Nós só tivemos
um lance.

— Lance ou não, ele engravidou você.

— Não é como se tivéssemos transado contra a minha vontade.

— Eu sei disso, né? Mas ele é o pai. Acho que ele tem que saber,
mesmo que escolha não assumir.
— Não sei se vou conseguir lidar bem com isso. — Mordi os lábios
quando eles começaram a tremer.

— Ah, esqueceu a camisinha, agora lida com as consequências.

As palavras da Jaqueline me acertaram como um coice no peito e


não havia justificativas para dizer que ela estava errada. Ji Won era o
pai do bebê que estava crescendo dentro de mim, porém, dizer isso
para ele depois que eu tinha ido embora sem conversar, sem sequer
ter lhe dado a chance de dizer qualquer coisa, parecia a coisa mais
impossível do mundo.

Havia aproveitado cada instante ao lado dele como se fosse um


sonho, sonho do qual eu acordaria e talvez ter parte dele na minha
realidade não seria tão ruim.

— Vai me ajudar a decorar o quartinho? Acho que podemos tirar


aquelas coisas do ateliê que estão no terceiro quarto do nosso
apartamento e montar lá. Jogamos fora o que não usamos mais e
levamos o relevante para o ateliê.

— Claro que ajudo! — Jaqueline abriu um sorriso enorme. — Mas


acho melhor esperarmos para saber qual o sexo primeiro.

— Não quero nada de quarto rosa ou azul.

— Por que não?

— Estereotipado demais.

— Vermelho e azul, então?


— As cores da bandeira da Coréia? Gosto mais!

— Vai me adorar como consultora.

— Sei que não me deixará na mão.

Jaqueline estacionou na garagem do prédio e subimos de elevador


até o nosso apartamento.

— Quero ver só a surtada que a sua mãe vai dar quando descobrir
que você está grávida. — Colocou a mão na boca e deu uma
risadinha enquanto girava a chave na fechadura.

— Vamos lidar com um problema de cada vez, por favor?

— Tenho certeza de que ela vai querer se intrometer na decoração


do quarto.

— Podemos deixar ela fora disso. — Caminhei até o meu quarto e


entrei no banheiro. Precisava de um banho, queria relaxar um pouco.
Agora que sabia a causa dos enjoos, parecia até mais fácil de lidar
com eles, não que fossem menos incômodos.

Deixei as roupas na minha cama e fui para o banheiro. Abri o


registro e encostei a cabeça no azulejo, sentindo a água quente
escorrer do meu cabelo para o restante do corpo. Grávida... Voltei a
ficar em choque. Eu não estava nem perto de me sentir preparada
para ter um filho naquele momento. Era tão louco que imaginei
acordar e rir do sonho mais insano que tive na vida, entretanto, a volta
do enjoo mostrava que eu não estava sonhando. O que eu tinha vivido
na Coréia com o Ji Won era tão real que eu carregava parte dele
comigo.

Mas deveria contar para ele que estava grávida? Caso sim, como
fazer isso da forma certa?

Desliguei o chuveiro e puxei a toalha para dentro do box,


começando a me secar ainda aquecida pela fumaça. Ao voltar para o
quarto, peguei um caderno de esboços que havia levado para a
Coréia e fiquei encarando o rosto do Ji Won. Tão bonito...

— Lis, está tudo bem? — Jaqueline apareceu na porta.

— Está sim.

— Qualquer coisa você me chama, tá?

— Obrigada.

— Pelo quê? — Franziu o cenho.

— Por ser minha amiga.

— Vou cobrar os favores qualquer dia desse. — Gargalhou.

— Medo... — Encolhi.

— Boa noite, Lis! — Deu um tchauzinho e sumiu de vista.


Nove

Escorreguei o pincel pela superfície da tela enquanto me recordava


das cores daquela construção no Parque dos Palácios. Queria retratar
perfeitamente o contraste entre as folhas vermelhas da árvore e a cor
escura da madeira que compunha a construção, no entanto, a
verdade era que eu não conseguia me concentrar nem um pouco.
Todo o momento em que tentava pensar na Coréia para pintar, minha
mente me levava de volta ao Ji Won.

Estávamos caminhando por entre as cerejeiras em uma


rua próximo onde eu estava hospedada. Ainda era dia e ele
entrelaçou seus dedos nos meus, me dando a mão e suas
bochechas coraram. Eu sorri abobada, tirando os fios do
cabelo que voavam no meu rosto quando Ji Won me roubou
um selinho. Algumas pessoas passaram por nós com cara
feia, porém, eu tinha achado tão fofa a atitude dele que não
me importei com os demais olhares atravessados.

Fui correndo até a parte mais alta da rua para ver o pôr do
sol e o puxei comigo.

— Olhe como é bonito, oppa.

— Sim, é lindo... — Ele estava olhando mais para o meu


rosto do que para qualquer outra imagem que o céu poderia
estar exibindo.

Foi a minha vez de ficar extremamente corada.

— Lis!

Abri os olhos, piscando-os algumas vezes até me dar conta de que


Jaqueline estava parada na minha frente de braços cruzados.

— O que foi?

— Você ouviu o interfone?

Balancei a cabeça em negativa enquanto bocejava.

— É o curador da galeria?

— Quem dera. — Suspirou. — É o Felipe, está aqui para falar com


você. — Disse que está ocupada e não pode conversar agora, mas
ele é carne de pescoço, hein? Caramba! Parece que não vai embora
até você ir lá falar com ele. Se aceita o meu conselho, conta para ele
que está grávida e vê se ele desencana de uma vez.

Bufei e coloquei o pincel de volta na bancada. Eu não estava com


vontade de conversar com o meu ex naquele dia, porém, ele não era
do tipo que desistia fácil.

— Vou lá. — Passei pela Jaqueline e fui para a saleta que ficava na
entrada do nosso ateliê, a usávamos para conversar com clientes.

Felipe estava sentado em uma poltrona e se levantou por reflexo


quando eu apareci no raio de visão dele.
— Você não deveria estar no trabalho? — Coloquei a mão na
cintura, sem me preocupar se estaria sujando a minha roupa com a
tinta que estava nos meus dedos.

— É o meu horário de almoço.

Olhei para ele dos pés à cabeça. Estava de sapato e camisa social
com uma calça jeans escura, o cabelo estranhamente penteado para
trás e preso com gel. Felipe era contador em uma empresa não muito
longe do ateliê e eu me arrependi de em algum momento ter gostado
de tal proximidade.

Horário de almoço... Minha barriga revirou e eu me recordei de que


precisava almoçar também. Naquele momento, mais do que nunca,
não podia pular refeições como fazia comumente enquanto estava
trabalhando.

— O que você está fazendo aqui?

— No dia que você chegou e eu te encontrei na casa da sua mãe


você disse que iria me ligar, mas não ligou. Eu liguei para você ontem,
mas deixou chamar até cair na caixa postal.

— Foi na hora que eu estava no hospital.

— Hospital?! — Ele deu um passo para trás ao ficar pálido como a


flor do quadro que estava pendurado na parede atrás dele. — Você
teve alguma coisa?

— Nada com que deva se preocupar.


— Tem certeza? — Curvou o corpo ao tentar segurar a minha mão,
mas eu me esquivei dele.

— Tenho.

— Por que não vem almoçar comigo? Sei que está com fome,
mesmo quando diz que não está.

— Tudo bem, eu vou.

Ele arregalou os olhos, surpreso pelo meu aceite tão imediato.

— Mas quero um lugar com bastante salada.

— Pode escolher aonde vamos.

— Tem um restaurante na rua de cima muito bom. Mas você paga.

— Tá...

— Vou lavar as mãos. — Precisava tirar a tinta dos meus dedos.

Entrei para dentro do ateliê e voltei minutos depois chacoalhando


as mãos molhadas no ar.

— Vamos no meu carro? — Felipe tentou passar o braço ao redor


dos meus ombros, mas eu me esquivei.

— Não precisa, é logo ali. — Apontei, ainda que não desse para ver
o lugar.

— Você quem manda.

Caminhamos lado a lado na direção que eu apontava até que


Felipe finalmente se atreveu a abrir a boca.
— Eu me arrependo de tudo o que eu fiz.

Não disse nada até entrar no restaurante, puxar uma cadeira e


sentar-me na frente dele.

— Se arrepende? — Segurei o riso assim que um garçom se


aproximou de nós.

— O que desejam? — perguntou ao segurar um bloquinho de


anotações.

— Quero uma salada primavera com frango e um suco de laranja


natural.

— E o senhor? — o garçom encarou o Felipe.

— Quero um prato feito com bife, batata frita e uma coca.

O garçom assentiu e se afastou de nós.

Felipe cruzou as mãos sobre a mesa e me encarou profundamente.


Dessa vez, eu não tentei desconversar, apenas o encarei de volta.

— Comendo salada agora... Que bicho mordeu você?

— Preciso cuidar melhor da minha alimentação.

— Isso aconteceu por causa da sua ida à Coréia?

Assenti. Não era mentira.

— Senti muita falta sua enquanto esteve lá. Tive medo de que
nunca mais voltasse para mim.

Talvez eu não devesse ter voltado...


— Felipe, você já terminou comigo. Tudo bem. Agora cada um
segue seu caminho. É melhor assim.

— Não é melhor! — Ele puxou as minhas mãos e segurou-as entre


as suas. — Você não sabe o quanto eu estou arrependido daquele
dia.

Era uma lembrança que eu queria evitar, mas ela acabou


sendo ativada na minha mente pelos gatilhos na fala do Felipe.
Havíamos nos encontrado no shopping e o plano éramos ver um
filme, um lançamento que eu estava aguardando há muito
tempo. Caí na besteira de chegar antes e comprar os ingressos
para já deixar reservado. Ainda me sentia muito tola pelo que
aconteceu...

Felipe estava sentado na praça de alimentação, girando o


celular de um lado para o outro. Não encontrei o sorriso que
esperava nos lábios dele assim que me viu aproximar. Isso me
causou uma estranha dor no peito.

— Você demorou. — Ele me encarou com um certo ar de


distanciamento.

— Já estava aqui, só fui comprar os ingressos.

— Sobre o filme... — Ele não parou de mexer no celular para


olhar para mim e isso foi me deixando muito furiosa.

— O que tem o filme? — Estava começando a ficar irritada.


— Não vai dar para assistirmos.

— Por que não?

— Tem algo que precisamos conversar.

— Então levanta a cabeça e olha para mim. — Bati a mão na


mesa fazendo com que ele levasse um susto e me encarasse.

— Não sei como começar isso, então vou falar de uma vez.

— É o que eu estou esperando. — Puxei a cadeira na frente


dele e me sentei. Foi uma das melhores coisas que eu poderia
ter feito naquele momento.

— Lis, eu preciso de um tempo.

— Tempo de quê? — Ergui as sobrancelhas.

— De nós.

Fiquei boquiaberta, confusa e em choque. Não era uma coisa


que eu esperava ouvir dele, era para estar tudo bem entre nós.
Se algo aconteceu eu não percebi.

— Por quê?

— Nós namoramos há seis anos. Vivemos a vida inteira em


função do outro. Quero conhecer coisas novas, e acho que é o
momento para você fazer isso também.

— Vai terminar comigo para conhecer coisas novas? — Eu


estava segurando o choro. A minha vontade era fazer com que
ele engolisse os ingressos que eu estava embolando entre os
meus dedos.

— Não me leve a mal, Lis, ainda amo você. Mas vai acabar
percebendo que precisa disso também.

Saí da lembrança e o encarei. A raiva e a tristeza já haviam se


transformado em outro sentimento que parecia mais fácil de lidar.

O garçom voltou até nós e serviu nosso pedido. Mastiguei algumas


folhas de alface antes de voltar a fitar o Felipe.

— Sabe? Aproveitei a vida como você achou que deveríamos. —


Senti veneno escorrer pela minha língua e amargar a minha saliva. —
Fui para Coréia. Tirei as merecidas férias que eu não tinha há muito
tempo...

— Foram dias horríveis para mim. Foi quando mais me arrependi


da besteira que tinha feito.

— Mas, para mim, foram dias ótimos. Bons como não me lembro
de outros.

— Estou feliz de você ter voltado. — Apertou meus dedos entre os


seus, no entanto, eu os puxei de volta em um reflexo rápido.

— Talvez eu não devesse ter voltado.

— Por que está dizendo isso?


— Porque estou grávida — falei logo sem encontrar a melhor forma
de contar isso para ele.

— Grávida?! — Felipe soltou o corpo na cadeira e ficou pasmo. —


É meu?

— Não!

— Então de quem é? — Cerrou os dentes.

— De um cara que eu conheci na Coréia.

— Viajou para lá para abrir as pernas para o primeiro que


aparecesse?

— Imagino que tenha terminado comigo para comer a primeira que


abrisse as pernas. Acho que nós estamos quites.

Ele engoliu em seco, mas manteve os dentes cerrados.

— Você vai tirar, né?

Cuspi o tomate na minha boca, incapaz de acreditar no que ele


havia acabado de dizer.

Ergui a mão para chamar o garçom e senti falta do botão que havia
nas mesas da Coréia.

— Embrulha para viagem — pedi ao garçom que parou ao meu


lado e eu apontei para o Felipe — , a despesa é por conta dele.

— Lis, espera! — Ele segurou meu braço assim que me levantei da


mesa. — O que eu disse foi idiota.
— Que bom que você percebeu isso antes de se tornar um imbecil
ainda maior.

— Tudo bem. Vai ser incrível ter um filho com você. Podemos
morar juntos e eu registraria como meu filho.

— Claro que não! — Toquei a barriga. — Ele não é seu!

— E acha que um cara com quem você passou uma semana do


outro lado do mundo vai assumir?

— Essa não é a questão. Não estou preocupada com isso.

— Não precisa criar esse bebê sozinha, Lis.

— Não se preocupe. Não irei. — Peguei a marmita que o garçom


me entregou. — Agora, se me dá licença, tenho coisas do ateliê para
me preocupar.

— Eu não acredito que ele perguntou assim na cara dura se você ia


abortar. — Jaqueline desligou a máquina de cerâmica para prestar
toda a atenção em mim.

— Não foi a primeira pessoa que me sugeriu isso... — Olhei torto


para ela.
— Sabe que me arrependo disso.

— Não importa! Eu vou ter esse bebê porque quero ter.

— Isso aí! Pode contar comigo para tudo.

— Obrigada, Jaque! — Levantei-me da minha bancada e fui apertá-


la.
Dez

Fiquei rolando na cama. Não conseguia dormir, não importava em


quantas posições diferentes eu tentava ficar. Nem era pelo vento
soprando as árvores do lado de fora que intensificava o meu medo do
escuro, nem era luz apagada e nem fome.

Em algum momento, eu até pensei no Felipe e no suposto


arrependimento dele, mas minutos depois, todas as imagens que
vinham à minha cabeça me direcionavam a Ji Won. O sorriso e a
forma como ele me tocava, ora de um jeito delicado, ora de formas
provocativas que me arrepiavam inteira, me fazia duvidar se partia do
mesmo homem.

Eu me senti ainda mais estúpida por ter ido embora daquela forma.
A vontade era voltar correndo para ele e contar pessoalmente que eu
estava grávida, entretanto, não sabia que Ji Won encontraria caso
voltasse, nem se ia me querer por perto depois de tudo.

Enquanto namorava o Felipe, achava que ele era o melhor homem


do mundo e que ninguém além dele poderia me fazer feliz, entretanto
o término me abriu os olhos para outras possibilidades. Não que eu
tivesse ido para a Coréia atrás de um ficante, mas não me arrependo
de nada a não ser a forma como fui embora.

Acariciei a barriga pensando na vida que estava sendo formada ali


dentro. Grávida do Ji Won... tive medo da reação dele em relação a
possibilidade de ser pai. Não queria mais uma pessoa me
perguntando se eu iria tirar.

Jaqueline achava que eu tinha que contar para ele, no fundo era o
que parecia mais certo. Mas eu estava com medo.

Puxei meu celular debaixo do travesseiro e cliquei na foto do Ji


Won no aplicativo de mensagem. Fiquei me perguntando se ele tinha
tentado entrar em contato comigo, já que depois de ter sido assaltada
perdi o número antigo.

Lis:

Oi! É a Lis, estou com número novo. Tenho algo importante para
contar para você.

Fiquei esperando uma resposta, mas peguei no sono sem que meu
celular vibrasse.

Ji Won
Apoiei-me na bancada da pia e encarei-me diante do espelho. Meu
semblante estava cansado. Foram dias exaustivos no hospital, no
entanto, estava disposto a encarar seis horas em uma sala de
cirurgia, lutando para salvar a vida de um paciente a ter que voltar
para aquele encontro às cegas. Para os meus tios e amigos eu já
estava ficando velho e eles haviam começado uma campanha para
me arrumarem uma namorada. Aquele era o segundo encontro às
cegas que me convenciam a ir. Talvez eu devesse me empenhar em
gostar um pouco mais das candidatas que me apresentavam, mas eu
não queria... Não conseguia tirar a Alissa da cabeça, ainda que ela
sequer tivesse visualizado as últimas cinquenta mensagens que eu
havia lhe enviado.

Abri a torneira e lavei as mãos antes de sair do banheiro. Não


poderia ficar ali para sempre.

Ao voltar para o interior do restaurante, iluminado pela luz do sol


que entrava pelas grandes janelas de vidro, encontrei a Lee Min Jee
mexendo no meu celular e isso fez com que eu caminhasse mais
rápido até ela.

— O que está fazendo?

— Estava tirando fotos minhas para você. — Sorriu ao me devolver


o aparelho.

Abri um sorriso sem graça, mas não disse nada.

— Oppa, coma logo seu Kimchi antes que esfrie.


Guardei o celular no bolso antes de começar a comer torcendo
para que aquele almoço acabasse logo. Não que Lee Min Jee, filha de
uma amiga da minha tia, fosse uma candidata terrível. Ela era magra,
alta, delicada, com cabelos e olhos muito escuros e a pele clara.
Entretanto, não era a brasileira que estava me tirando o sono.
Enquanto não conseguisse tirar a Alissa da minha cabeça, qualquer
outro encontro seria inútil.
Parte 2

Nós temos uma história juntos

Dias atuais...
Onze
Ji Won

Saí da sala de operações, tirei as luvas e todas as roupas


cirúrgicas. Descartei-as na lixeira apropriada. Troquei meu jaleco por
um limpo e caminhei até a sala de espera do hospital onde os
familiares do garotinho que eu acabara de operar esperavam aflitos.

— Doutor Kim. — Uma mulher mais velha se levantou e caminhou


até mim assim que eu surgi em seu raio de visão. Parou na minha
frente, mantendo o mínimo de distância que a sociedade exigia. —
Como está o meu filho?

— Ahjumma, a cirurgia foi um sucesso. Seu filho ficará bem.

— Obrigada, doutor Kim! — Ela abaixou a cabeça em uma breve


reverência e saiu com um sorriso contente.

Voltei para a minha sala e peguei o celular que havia deixado sobre
a mesa, havia umas cinco ligações da Min Jee, pensei por uns dez
minutos se retornava ou não e acabei optando pelo que me pareceu
mais cordial.

— Oppa, estava em uma cirurgia? Não atendeu as minhas


chamadas. — Ela atendeu logo após dois toques.

— Sim, eu estava ocupado.

— Minha amiga dará uma festa hoje e quero que você vá comigo.

— Não sei se posso.


— Por favor, oppa...

— Vai depender do horário que eu sair do hospital.

— Estarei aguardando você vir me buscar.

— Avisarei caso não possa.

— Obrigada!

Desliguei o celular e massageei a testa, já arrependido de ter


concordado em ir à tal festa. Havia quase um ano desde que eu
cedera às pressões dos meus tios e começara a namorar a Min Jee.
Eu era um homem com mais de trinta anos e estavam preocupados
com o meu futuro. Min Jee era de família rica, assim como a minha e
modelo, parecia a esposa perfeita, mas não para mim.

Contra os meus impulsos, acabei indo com a Min Jee à festa de


alguns amigos dela. Era a reinauguração de uma loja em Gangnam.
Uma grife de moda de uma das amigas da Min Jee, com direito a
coquetel e a desfiles.

Desci do carro e entreguei a chave para um manobrista antes de


ajudar a Min Jee a descer. Havia alguns fotógrafos e muito barulho de
público, o que me gerou dor de cabeça. Min Jee enlaçou o braço dela
no meu enquanto sorria e acenava para as pessoas que gritavam por
ela.

Na entrada, fomos recepcionados por um garçom que nos ofereceu


uma taça de espumante. Apenas Min Jee pegou uma taça e nós
seguimos para o interior da loja, até que ela encontrou a amiga e dona
do lugar. Olhei um pouco em volta, observando as paredes brancas
com muitas luzes e prateleiras, cheias de roupas e outros acessórios.

— Oppa, tem um agente importante ali e vou falar com ele.

Min Jee soltou o meu braço e eu apenas assenti com um


movimento de cabeça.

Caminhei até um canto de espera com algumas poltronas e


revistas, como as que havia em consultórios. Inclusive tão velhas
quanto, constatei ao puxar uma delas. Era uma revista americana
sobre moda, arte e beleza. Sentei-me na poltrona e comecei a folheá-
la. Não havia nada que despertasse meu interesse até que eu me
deparei com uma foto da Alissa.

Brasileira chama atenção do mundo com bela exposição sobre


a Coréia.

A manchete da reportagem teria me feito seguir para a próxima


página se não fosse pela foto. Nela, Alissa estava entre vários
quadros. A reportagem falava sobre uma grande exposição dos
quadros dela que foram exibidos em uma ala do Museu de Arte de
São Paulo. Alguns chegaram a ser vendidos por quase 30 mil reais.
Ao que parecia, ela era mais famosa do que eu imaginava.

A reportagem era de quase um ano atrás, mas foi o suficiente para


me deixar com um aperto no peito. Ela sequer havia se despedido de
mim. Uma mensagem dizendo que iria embora não era o bastante.
Era como se algo inacabado pairasse entre nós dois.

— O que está fazendo? — Min Jee parou ao meu lado e, antes que
eu pudesse fechar a revista, ela a puxou das minhas mãos, sem que
eu pudesse segurá-la com os dedos.

— É ela? — Vi seus olhos ficarem marejados e furiosos como os de


um dragão.

Apenas fiz que sim com um movimento de cabeça.

— Faz dois anos que conheceu essa mulher e ainda consegue


pensar nela?

— A revista estava ali. — Apontei para a pilha. — Não estava


procurando nada sobre a Alissa.

Era verdade que, mesmo dois anos depois, eu não conseguia tirá-
la da cabeça.

Min Jee rosnou como um cão feroz e jogou a revista no chão,


atraindo olhares curiosos e surpresos com a atitude dela.

— Não quero mais que pense nela, nunca mais!


— Não pode decidir isso por mim.

— Você é meu namorado!

— Talvez isso tenha sido um erro desde o início.

— O que está dizendo? — Ela recuou um passo e me encarou


boquiaberta.

— Não deveríamos ter começado a namorar.

Algumas pessoas ao nosso redor cobriram a boca, surpresos com


o que eu havia acabado de dizer.

— Eu não acredito que está fazendo isso comigo!

— Min Jee, não precisamos fazer um escândalo aqui.

— Vai embora! — Começou a chorar e foi abraçada por uma


amiga.

— Tem certeza?

— Vai!

Levantei-me com todos olhando para mim e saí da loja. O meu


pressentimento de que aquela não seria uma boa noite acabou se
concretizando.
Doze
Lis

Enchi as bochechas de ar e soprei nela, que se contorceu na cama


e começou a rir. Os bracinhos e perninhas dela eram tão gordinhos
que me davam vontade de morder.

— Cadê a linda da mamãe?

— Ati — ela apenas balbuciou enquanto me encarava com os olhos


finos e profundamente escuros.

Se havia alguma dúvida de que estava grávida do Ji Won, essa


desapareceu no momento em que a Kin nasceu há cerca de um ano e
meio atrás. Minha filha, a qual eu havia chamado de Kin, o sobrenome
do pai que na tradução significava dourado, nome que não soaria
muito estranho no Brasil, se comparado a nomes próprios coreanos.
Queria que a minha bebezinha, com olhos escuros, puxados, e um
cabelo preto e liso, tivesse um pouco da sua origem também no
nome, já que o sobrenome era apenas o meu.

Era provável que depois de todo aquele tempo eu tivesse


esquecido o Ji Won e parado de suspirar por algo que não havia
passado de um caso, mas tendo a Kin, isso era impossível. O rostinho
dela me faria lembrar do pai e do que eu havia vivido na Coréia, para
sempre.
Ela se rolou na cama e sentou. Depois que tinha começado a
andar, há aproximadamente dois meses, o céu era o limite. Eu tinha
me certificado de colocar borracha no canto de todos os móveis e
cobrir todas as tomadas.

— Mamãe! — Puxou o meu cabelo e apontou para um brinquedo


de morder que estava em cima da cômoda.

Ela era pequena, tinha nascido com apenas um quilo e meio,


mesmo o parto não tendo sido prematuro, mas era espoleta e terrível,
sempre ligada no 220w. Piorava quando a minha mãe ou a minha irmã
estavam por perto, porque faziam todas as vontades dela. Era quase
impossível de controlar, por mais que eu tentasse.

— Mamãe!

— Tá filha, eu vou pegar. — Levantei-me da cama e fui pegar o


brinquedo que ela tanto queria.

Assim que entreguei a ela, Kin abriu um sorriso enorme com seus
pequenos dentinhos. Toda vez que ela sorria, o meu coração se
inflava de alegria e eu suspirava. Com certeza tinha trazido a melhor
parte da Coréia comigo em forma daquela bebezinha.

Beijei a testa dela e minha filha soltou o brinquedo para segurar o


meu pescoço. Abracei-a sem apertá-la demais e coloquei meu nariz
em cima da sua cabecinha, sentindo o cheiro suave da colônia para
bebês que eu havia passado depois do banho.
Uma das vantagens da profissão que eu havia escolhido era que
eu podia passar todos os momentos do meu dia ao lado da minha
filha. Eu a levava para o ateliê comigo e a deixava brincando no
cercadinho ao meu lado enquanto pintava.

— Lis, eu trouxe maçã, pera e algumas outras frutas para a Kin.


Vou colocar na geladeira, tá? — Felipe apareceu na porta do quarto
balançando as sacolas.

— Obrigada. — Sorri para ele ao me afastar da Kin para deixá-la


voltar a brincar.

Depois de todo esse tempo eu não tinha voltado com o Felipe, por
mais que em um momento ou outro uma recaída acabasse
acontecendo. A carne era mais fraca do que eu gostaria de admitir, ou
talvez eu só precisasse de um pouco de sexo e ele era o candidato
mais próximo. Felipe fez muito por mim e pela minha filha desde que a
Kin nasceu, com segundas intenções ou não, me ajudou a segurar a
onda em muitos momentos complicados. E ainda ajudava. Todos os
dias à noite, passava no apartamento para ver como eu e a Kin
estávamos, trazia comida ou brinquedos para ela, ainda que não
tivesse obrigação nenhuma. No fundo, sabia que ele tinha esperanças
de voltarmos a ficar juntos.

— A Jaque ainda não chegou? — Ele entrou no quarto amassando


uma banana em um pratinho e sentou-se na frente da Kin para dar a
ela. Não adiantava nada falar para o Felipe que não precisava mais
amassar as frutas, pois ele continuava fazendo. A Kin precisava se
acostumar a mastigar as coisas. Independente disso, a gulosa abriu a
boca sem pensar duas vezes, nem parecia que havia passado quase
meia hora sugando o meu peito.

— Hoje é sexta-feira, ela vai dormir no apartamento do noivo.

— Não acredito que ela vai se casar com aquele cara. Eles se
conhecem não tem nem um ano.

— Ah, o Ricardo parece um cara legal. Faz ela feliz, talvez não seja
tanta loucura assim. — Dei de ombros e peguei o pratinho da mão
dele para continuar alimentando a minha filha, que nem olhava para
nós, apenas para a comida.

— Eu faço você feliz? — Ele passou a mão pela minha face direita
e colocou uma mecha do meu cabelo solto atrás da orelha.

— Felipe... — Encolhi o rosto. Esquivando-me do toque dele. —


Não é o momento para isso.

— Vai ser quando? — Bufou. — Por tudo que é mais sagrado, Lis.
Eu estou tentando.

— Sei disso, Felipe. Mas nunca te pedi para tentar.

Ele engoliu em seco e eu percebi o quão babaca tinha soado a


minha fala.

— Desculpa. — Coloquei o prato ao meu lado e segurei as mãos


dele. — Você me ajudou muito e é bom para Kin. Sou grata por tudo o
que está fazendo, mas não quero que se iluda. Não sinto mais a
mesma coisa que sentia antes de terminarmos.
— Posso fazer você gostar de mim de novo se me der uma chance.
— Beijou as minhas mãos. Eu realmente não sentia nada, nenhum
calafrio, nenhum calor. Era como se o Felipe fosse só um amigo, ou
até um irmão.

— Sabe que as coisas não funcionam assim. — Soltei as mãos


dele.

— Está dizendo isso porque ainda sente algo pelo pai da Kin.

— Talvez eu sinta — confessei e vi um raio de fúria atravessar os


olhos castanhos do Felipe. — É inevitável não me lembrar dele toda
vez que olho para ela.

— Ele não deu a mínima para a filha.

— O Ji Won nem sabe da Kin. Só mandei algumas mensagens


dizendo que precisávamos conversar, nunca mencionei a Kin. Ele só
leu a primeira e depois as outras nunca foram entregues. Parece que
me bloqueou.

— E ainda consegue sentir algo por esse cara? — Balançou a


cabeça, inconformado.

— Eu não sei!

Virei-me para o lado e vi Kin enfiando as mãozinhas dentro do


prato. Peguei-a a tempo de fazer uma grande meleca na minha cama.

— Sua moleca! Não pode. — Limpei a mãozinha dela com um


lenço umedecido. — Espera que a mamãe vai dar para você.
— Banana.

— Isso, a banana, mamãe vai dar para você.

— Vem com o tio! — Felipe estendeu as mãos para ela e Kin


tombou o corpo na direção dele, não dando a mínima para mim. —
Espero que um dia perceba que eu posso ser mais do que só o tio
legal para a Kin. — Beijou-a no alto da cabeça.

Felipe ficou mais um tempo com a minha filha e terminou de dar a


banana para ela enquanto eu tomava um banho e preparava algo
para comer. Às vezes eu me sentia pressionada a voltar para o Felipe,
todos diziam que seria o melhor para mim e para minha filha, porém,
eu tinha a sensação de que acatar isso era como aceitar viver com um
prêmio de consolação, sem ter a vida que eu desejava de verdade,
mesmo não sabendo qual era ela.

Felipe foi embora uma hora depois e fiquei sozinha com a minha
filha. Brinquei com ela até que pegasse no sono, depois abri o Netflix
em um filme qualquer até que meus olhos também se fechassem.

Acordei no meio da noite com a Kin chorando. Virei-me na cama e


acendi o interruptor que ficava ao lado da cabeceira no momento em
que saltei para o chão. Nem coloquei o chinelo antes de correr até o
quarto dela. Assim que entrei a vi de pé no berço.

— O que foi, minha flor de cerejeira? — Peguei-a no colo e


continuou chorando.

Sentei-me na poltrona ao lado do berço e a sentei no meu colo.


Passei a mão pelo rostinho dela e senti que estava um pouco quente.
Imaginei que estivesse com febre, então fui até o guarda-roupa e
peguei um termômetro. 37,5ºC não era para desesperar.

— Mamãe vai preparar um banho para você se sentir melhor. —


Coloquei-a no berço e fui até o banheiro.

Montei a banheira no suporte e peguei água morna do chuveiro,


testando antes para ver se estava em uma temperatura agradável
para a Kin. Voltei para o quarto, tirei a roupinha dela e a levei para a
banheira. Assim que a coloquei lá, minha filha abriu um sorriso.

— Banho é sempre bom, filhinha.

Ela bateu a mão na água e olhou para mim antes de bater de novo.
Eu amava aquela menininha mais do que qualquer outra coisa no
mundo. Independentemente de qualquer coisa, eu sempre serei grata
ao Ji Won por ser parte dela, quase a maior parte. Porque a Kin não
se parecia em nada comigo.
Treze

Aquele sábado era aniversário da minha irmã e já que ela estava


grávida, nada de boate naquele ano. O que achei melhor, pois, da
última vez, eu não fui para ficar com a Kin. A festa iria se resumir a um
almoço na casa dela.

Acordei cedo, preparei as coisas da Kin e a amamentei antes de


sair de casa.

Jaqueline se resumiu a uma mensagem que dizia para que eu


aproveitasse a festa, mas que ela iria continuar na casa do Ricardo.
Felipe poderia não botar fé no noivo da minha melhor amiga, mas ela
estava feliz e isso era o suficiente para mim.

Estacionei na frente do prédio da Alexandra e coloquei a Kin num


carrinho, atravessei a rua e toquei o interfone. Não levou muito tempo
para que o porteiro permitisse a minha entrada. A rua estava mais
vazia que de costume e isso me causou certo estranhamento,
entretanto, logo me lembrei de que era feriado na terça-feira e muitas
pessoas deveriam ter viajado para aproveitar a folga prolongada.

Saí do elevador e dei de cara com meu cunhado parado na porta,


bebendo um copo de cerveja. Ele deveria estar esperando alguém
que certamente não era eu.

— Oi, Lis, tudo bem? — Ele me cumprimentou com um beijo no


rosto.
— Bem sim, e você?

— Bem demais. Entra aí. A Alex está lá na cozinha com a mãe de


vocês. Seu pai e uns amigos meus estão assistindo jogo da Seleção
lá no terraço.

— Certo, obrigada.

Passei por eles e deixei a mala da Kin no sofá da sala antes de


seguir até a cozinha.

— Feliz aniversário, Alex! — Sorri para a minha irmã e abri os


braços para ela assim que parei na porta ao lado do carrinho.

— Obrigada, Lis! — Veio até mim e nos abraçamos.

— Oi, Lis! — Minha mãe passou por nós e pegou a Kin do carrinho.
— Achei a minha neta mais linda.

— Quero ver se vai continuar falando isso quando a Valentina


nascer. — Alex torceu os lábios como se estivesse enciumada.

— Quando ela nascer vai ser a caçulinha, mas, por enquanto, a Kin
é a única netinha que eu tenho, então me deixem mimá-la.

— Mãe, não vai estragar a minha filha. — Cruzei os braços e a


olhei de esgueiro.

— Querida, avós existem para isso. — Deu de ombros e abraçou a


minha filha.

Lembrei como se fosse ontem do dia em que havia contado a ela


que estava grávida e a reação que teve contrária a qualquer uma das
minhas expectativas.

Já havia contado para a minha irmã e escolhi um domingo de


manhã, depois do almoço, esperando que ela tivesse tomado um
copo ou outro de cerveja antes de eu dizer qualquer coisa.

— Mãe. — Coloquei a mão sobre o ombro dela assim que


terminou de lavar a louça. — Podemos ir lá no quarto? Quero
conversar com você. Não vai demorar muito.

Ela levantou uma sobrancelha e me encarou confusa com seus


olhos verdes.

— Você não me chama para conversar assim desde que pintou


uma parede da escola e me pediram para pagar uma pintura
nova.

— Dessa vez, não terá que pagar nada. — Abri um sorriso


amarelo.

— Por que será que isso não me tranquiliza? Bom, vamos lá!
— Puxou-me pelo pulso e seguimos até o quarto dela.

Peguei um dos travesseiros e coloquei-o no colo enquanto


estalava os dedos uns com os outros.

— O que tem para me contar? — Encarou-me séria. Eu tinha


cutucado o vespeiro quando a havia chamado para conversar.
Agora tinha que aguentar as ferroadas.
— Mãe, eu estou grávida. — Fui direto ao assunto. Não sabia
outra forma de contar que não fosse aquela.

Ela ficou boquiaberta, curvou o corpo para a frente e ficou me


encarando por vários minutos antes de dizer alguma coisa.
Imaginei que estivesse processando a informação. Confesso que
até para mim levou alguns dias para que a ficha caísse
completamente.

— Não sabia que você e o Felipe tinham voltado.

— Não voltamos. — Mordi os lábios. Era de se esperar que ela


pensasse isso.

— Uma recaída, então?

— Não é dele, mãe.

— Está com um namorado novo que não me apresentou?

Fiz que não.

— Uai, então quem é o pai?

— Um cara que conheci na viagem para a Coréia. Vacilei com


a camisinha uma vez e engravidei dele.

Ela cobriu a boca e não foi a melhor forma de esconder a


surpresa.

— E vocês...

— Foi só um lance.
— Então vai ser mãe solteira?

Fiz que sim. Esperei que ela gritasse comigo e começasse a


dizer o quanto eu era irresponsável, já que havia dito aquela frase
durante muitos momentos da minha vida, principalmente quando
tinha feito coisas das quais eu me arrependi depois.

— Tenho certeza de que não era os planos que o seu pai tinha
para você.

— Por isso não contei para ele primeiro. Já não ficou muito
contente quando eu escolhi Artes Visuais ao invés da faculdade
de engenharia ou arquitetura.

— Filha. — Ela curvou o corpo para a frente e me abraçou. —


Sei que em várias vezes tivemos alguns desentendimentos, mas
saiba que eu sempre estarei aqui para você. Vou ajudar com o
que precisar com o seu filho.

— Obrigada, mãe! — Intensifiquei o nosso abraço.

— Agora tem que contar para o seu pai.

— Preciso?

— Sim.

— Fiz uma touquinha de tricô para ela que vai ficar muito fofa —
disse a minha mãe e me trouxe de volta ao presente.

— Está virando avó mesmo. — Minha irmã começou a rir.


— Mãe, está quente demais para uma touca de tricô. Ontem ela
acordou chorando e estava um pouquinho febril. Eu imagino que seja
esse calor todo.

— Bem que poderia chover.

Virei para trás e vi meu pai vindo até nós.

— Oi, filha! Oi, minha netinha. — Beijou a Kin no alto da cabeça. —


Acredita que o Brasil perdeu? — Sua expressão era de pura revolta e
me fez rir. — Ah, esse técnico tem que trocar aquele bando de perna
de pau e convocar uns caras que joguem com garra.

— Deixa eles para lá e vai fazer churrasco para nós agora, pai. —
Alex ignorou a reclamação do nosso pai e entregou a ele uma bacia
cheia de carne.

Coloquei a Kin no berço e fui buscar uma fruta que havia trazido em
sua malinha para que ela comesse. Provavelmente estaria com fome
já que fazia mais de três horas que eu lhe havia dado leite do peito.
Ao voltar para cozinha, eu me deparei com ela mastigando um
biscoito recheado.

— Quem deu? — Olhei feio para as duas, que olhavam para mim
com cara de paisagem.

Alex apontou para a minha mãe querendo tirar o dela da reta.

— Mãe!

— O biscoito é tão gostoso. Só dei um.


— Sabe que não quero que ela coma nada doce ou artificial demais
agora.

— Foi só um biscoito, Lis. Não é o fim do mundo.

Continuei olhando feio para ela enquanto me agachava ao lado do


carrinho e entregava um pedaço de pera para a Kin.

— Vamos trocar com a mamãe.

Puxei o biscoito e ela começou a chorar. Só parou longos minutos


depois quando a peguei no colo, porém, não deu a menor bola para o
pedaço de pera.

Continuei com cara feia e a minha mãe começou a rir.

— Dava biscoito e bolo para vocês duas e são pessoas muito


saudáveis.

— Não sei se posso concordar com isso — intrometeu-se a minha


irmã.

— Fica quieta, Alexandra!

Balancei a cabeça e deixei ela para lá, indo com a Kin para a sala
onde eu poderia tentar alimentá-la em paz.
Quatorze
Ji Won

A Min Jee não estava muito contente comigo pelo que havia
acontecido na festa, furiosa como se fosse uma coisa extremamente
terrível e degradante me ver apenas lendo uma reportagem sobre a
Alissa. O seu moderado escândalo havia saído em páginas de fofocas
na internet no dia seguinte, o que imagino tê-la deixado ainda mais
furiosa, já que se recusou a atender minhas chamadas e responder às
minhas mensagens.

Soava terrível, sabia disso, mas eu estava contente com a


possibilidade de um término. Nosso namoro nunca foi uma escolha
minha, apenas acabei cedendo à pressão da idade e ao respeito que
devia aos meus tios, as pessoas mais velhas de maior importância na
minha vida após a morte dos meus pais.

Peguei dentro de um livro da minha estante a página rasgada da


revista que eu involuntariamente havia ficado para mim. A foto da
Alissa ali era mais recente do que as que possuía no meu celular.

Ela continuava tão bonita como eu me recordava. Os olhos verdes


grandes e chamativos, assim como o sorriso encantador. Perguntei-
me como ela estaria naquele momento. Será que seus pais estavam
em uma campanha para casá-la assim como meus tios, ou ela já
estaria casada? Ainda que a resposta fosse afirmativa e isso me
causasse certo desconforto, desejava vê-la pessoalmente mais uma
vez. Porém, não sabia como encontrá-la, já que não respondia às
minhas mensagens e o Brasil era um país do tamanho de um
continente.

— Ji Won, fiz carne de porco. Venha jantar. — Minha tinha deu


duas batidas na porta do meu quarto.

— Já estou indo, Ahjumma. — Virei a cadeira na direção da porta e


me levantei.

Lis

Aproveitei o feriado para ficar em casa e descansar um pouco,


ainda que dormir até tarde tivesse virado uma irrealidade depois que a
Kin nasceu, porque ela sempre acordava bem cedo com fome ou
querendo simplesmente a minha atenção. Ainda que meu tempo
dormindo houvesse se reduzido consideravelmente, não trocaria os
momentos com a minha filha por nenhuma outra coisa no mundo.

Naquele domingo pela manhã, acordei e, após trocar a fralda dela,


fomos para a cozinha e eu a deixei solta. Kin já andava há alguns
meses, mas ainda não se sentia completamente segura, então usava
os móveis da cozinha e as paredes para recuperar o equilíbrio antes
de ir para outra extremidade. Para que ela não saísse da cozinha, eu
fechei a pequena porta de madeira que havia instalado ali após o
nascimento dela. Essa porta geralmente era para deixá-la longe da
cozinha e não dentro, mas, daquela vez, eu estava bem atenta aos
movimentos curiosos da minha pequena.

Peguei iogurte natural e separei em várias vasilhas e em cada uma


eu coloquei algumas gotas de anilina com cores distintas. Havia lido
na internet uma receita de tinta comestível e decidi fazer para que eu
e a Kin pudéssemos nos divertir pintando alguma coisa, ainda que ela
fizesse apenas uma grande bagunça.

Terminei de preparar as tintas e enquanto forrava o chão da sala


com um plástico, coloquei a Kin no cercadinho para que ela não
saísse correndo do alcance da minha visão.

Espalhei pelo chão algumas folhas de ofício e coloquei nos potes


de tinta alguns pincéis mais grossos. Aproveitei que ainda estava bem
calor e tirei o vestidinho da Kin, deixando-a apenas de calcinha e a
soltei perto da diversão que havia preparado.

Ela riu e pegou o pincel, balançando-o e jogando iogurte vermelho


para todos os cantos da sala. Inclusive no sofá, que eu não havia me
preocupado em cobrir. Limparia ele depois.

— É assim que faz, filha. — Peguei o pincel, o mergulhei na tinta


comestível e o passei em uma folha em branco que estava diante
dela.
Kin me observou, depois tentou replicar o que eu estava fazendo,
porém, ainda não tinha firmeza o suficiente nas mãozinhas para
segurar o pincel com a precisão correta. Ainda assim, escorregou o
pincel pelo papel.

O sorrisinho de quem estava se divertindo encheu meu coração de


alegria.

— A mamãe te ama, pequena.

Ela enfiou a mãozinha no pote de tinta azul e apertou a mão contra


a barra do meu short.

— Devo considerar isso como um “eu também”?

Ela olhou para mim sem entender o que eu havia acabado de dizer
e isso me fez rir.

Ouvimos a fechadura girar e viramos o olhar para a porta.


Jaqueline entrou e ficou boquiaberta com a sutil bagunça que eu e a
minha filha estávamos fazendo na sala.

— Parece que vocês estão tendo uma manhã incrível.

— Acho que incrível, provavelmente, foi a sua. — Reparei no


sorriso dela que ia de uma orelha à outra e a forma como seus olhos
castanhos brilhavam.

— Podemos dizer que sim. — Desviou o olhar, envergonhada.

— Achei que só fosse vir amanhã.


— O Ricardo saiu para consertar o carro do pai dele e senti que eu
precisava voltar para casa.

— A sua casa, em breve, vai ser o apartamento dele.

— Por enquanto, ainda é esse aqui. — Fez bico. — Ou já está me


expulsando antes que eu queira sair?

— Sabe que eu não a expulsaria nunca, amiga. Ainda mais depois


de tudo o que fez por mim e pela Kin.

— Oh, assim eu choro.

— Dinda! — Kin largou o pincel e chamou a Jaqueline com a mão,


que já estava meio roxa após ela ter misturado a tinta azul com a
vermelha.

— Não chora não. Vem pintar com a gente. — Ri.

— Depois dessa coisinha mais fofa me chamando dessa forma, fica


até difícil dizer não. — Jaqueline colocou a mochila sobre o sofá e se
juntou a nós.

Não saiu nada vendável do que pintamos naquele dia. Também


não imaginava quem compraria um quadro feito de anilina e iogurte,
que poderia apodrecer ou chamar muitas formigas, apesar de que
existiam loucos para tudo. Independente da qualidade das obras
produzidas, nós nos divertimos muito. Vi minha filha sorrir, se
lambuzar e comer tinta enquanto Jaqueline e eu seguíamos o ritmo
dela.
Limpar a bagunça foi outra história, ainda bem que tinha a minha
amiga para ajudar e a incrível invenção da humanidade que era a
máquina de lavar roupa.

— Lis, estou pensando em todas as minhas madrinhas estarem de


azul-marinho. O que você acha? — Jaqueline parou ao meu lado
enquanto eu estava colocando mistos na sanduicheira para o nosso
café da manhã.

— Eu prefiro cores claras. — Fui até a pia e coloquei pó de leite


ninho na mamadeira para dar a Kin. — Acho que torna um clima mais
amigável.

— Não acha que vai competir com o branco do meu vestido?

Fiz que não ao entregar a mamadeira para a minha filha, que já


estava com o bracinho estendido apenas esperando na sua
cadeirinha na cozinha.

— Acho que um azul-bebê ou um rosa-pêssego combinaria mais


com a minha pele. — Coloquei a mão no rosto e Jaqueline começou a
rir.
— O azul, então. — Ela pegou a água quente do fogão e coou o
café. — Nunca imaginei que me casaria antes de você.

— Isso poderia acontecer. Nem é o fim do mundo. — Afaguei o


ombro dela e Jaqueline sorriu para mim.

— Não se importa mesmo de ser madrinha com o Felipe?

— De forma alguma, sabe que para mim o importante é estar lá


com você.

— Obrigada, Lis! — Minha amiga me abraçou apertado. — Não sei


se era o momento para deixar você e a Kin sozinhas. Ela ainda é tão
pequenininha.

— Vamos ficar bem, Jaque. Além disso, você já esteve conosco


nos momentos mais difíceis. Quantas fraldas já trocou? Quantas
noites de sono já perdeu com as cólicas dela?

— Acho que estarei bem-preparada quando tiver os meus.

— Eu tenho certeza.

— Você não vai mesmo voltar para o Felipe, né?

Mordi os lábios e a minha expressão de felicidade e


companheirismo tomou um ar arredio e de desconfiança.

— Achei que esse assunto já tivesse morrido há pelos menos seis


meses.

— Vai ser difícil morrer enquanto ele ainda estiver rondando e você
dando brechas para isso.
— Às vezes ele diz que só quer ser meu amigo e ficar perto da Kin.
O problema é que a mentira acaba caindo por terra em um momento
ou outro.

— Mas você acabou dando uns pegas nele no último ano, num
momento ou outro.

— Transamos algumas vezes. Mas eu estava subindo pelas


paredes. Preciso de um pouco de afeto e sexo, como todo mundo.

— E vai ficar se aproveitando do rapaz?

— Não é bem assim. — Escorei na bancada onde ficavam dois


bancos e o micro-ondas e dei uma mordida no meu misto-quente.

— Vai mesmo ficar nessa de migalhas para sempre? Já ouviu


aquele ditado: ou caga ou sai da moita. Vocês dois não podem ficar
pra sempre nessa. Ele se iludindo e você achando que está tudo bem,
porque, amiga, vou ser sincera com você: não está nada bem.

— Não sei o que eu quero, Jaque.

— Tem certeza de que não? — Ela estava me empurrando contra a


parede com as palavras e isso começou a me deixar sem ar. —
Porque eu acho que sabe e está se enganando.

— Sabe o quê? — fiz-me de desentendida.

— O que você quer. Ah, Lis, francamente nenhuma de nós é uma


idiota. Acha que o pai da Kin vai aparecer misteriosamente na sua
porta?
— Faz dois anos, Jaque. Dois anos... Ele nem se lembra mais de
quem eu sou.

— Sabe bem que não é a mim que você precisa convencer disso.
Eu disse desde o início que deveria ter contado para ele que estava
grávida. Mesmo que ele não te quisesse, vocês têm uma filha.

— Eu tentei falar com ele. — Tomei o restante do meu café já


ficando irritada com aquele olhar dela.

— Meia dúzias de mensagens vagas não eram o suficiente. Você


deveria ter ligado para ele.

— Eu tentei alguns meses depois, mas a chamada não completa.


Talvez ele tenha perdido o telefone também e era o único contato que
eu tinha dele.

— Então é você quem decide. Vai ficar esperando por uma cara
que você provavelmente nunca vai voltar a ver ou vai aproveitar o que
está bem aqui do seu lado? Que seja arrumar um terceiro e
totalmente novo. Não vou te julgar por isso.

— Está me sugerindo sair por aí e paquerar?

— Estou!

— Jaque, eu tenho uma filha de um ano que precisa de mim.

— Amiga, posso cuidar dela por algumas horas para você dar uma
espairecida e uma paquerada. Só, por favor, não esqueça a camisinha
de novo! Estamos muito bem só com a Kin e pior do que isso, pode
acabar pegando uma doença.
— Nem planejei sair e você já está concluindo que eu vou transar
com quem quer que seja.

— Você está precisando.

— Vaca! Depois diz que é a minha melhor amiga.

— Sabe que eu sou. — Jaqueline colocou a mão na boca para


conter o riso e eu fiquei olhando para ela com expressão de desdém.

— Sei lá o que quero...

— Esquece seu sonho coreano e volta para a realidade.

Fiz bico e puxei uma banqueta, me sentando. Por mais que não
quisesse admitir, Jaqueline estava certa. Pai da minha filha ou não, a
possibilidade de voltar a acontecer algo entre mim e o Ji Won era
nula. Sequer o veria de novo.

— Quem sabe não encontre um parente superinteressante do


Ricardo no seu casamento e me apaixone perdidamente por ele, e
que o cara não dê a mínima para o fato de eu ser mãe solteira. Ao
contrário disso, caia de amores pela Kin.

— Sabe que não é difícil cair de amores por ela. — Jaque olhou
para a minha filha, que estava finalizando a mamadeira. — Mas não
exagere.

— Você quem botou pilha. — Escorei-me na bancada ao torcer os


lábios em uma careta.

— Não distorça as minhas palavras.


— Se eu ficar muito bêbada e acabar dando em cima de todos os
caras, a culpa vai ser exclusivamente sua.

— Nem sonhe com isso. — Fechou a cara. — Quer saber, vamos


parar de falar besteira. Se arruma e vamos no bufê, preciso decidir
logo o cardápio da festa.

— Por que o Ricardo não vai com você?

— Você sabe que os homens são péssimos para essas coisas e eu


estava contando com a minha melhor amiga e madrinha para me
ajudar nessa tarefa tão importante.

— E a Kin?

— Ela vai com a gente, ué!

Balancei a cabeça em negativa. Não queria passar a segunda-feira


do recesso experimentando pratos para um menu de casamento, mas
sabia que não conseguiria fugir disso.

— Tá bom...

— Lis, sabe que eu amo você, não é?

Olhei para ela de esgueiro e Jaqueline começou a rir.


Quinze
Ji Won

Por mais inacreditável que pudesse parecer, aquele estava sendo


um dia calmo no hospital. Era por volta das 22h e eu ficaria de plantão
até a manhã seguinte. Cirurgias não tendiam a ser marcadas para
aquele horário e nenhum caso muito grave aparecera na emergência.
Eu estava sozinho na minha sala, sentado na minha mesa e olhando
para o teto branco, onde acabei encontrando uma teia de aranha.

Ajeitei minhas costas contra o encosto da cadeira e puxei do jaleco


a página amassada de revista que ainda carregava comigo. Li a
reportagem mais uma vez, ainda que já tivesse decorado cada
palavra ali escrita. Não havia um contato dela, um número de telefone,
sequer um e-mail, entretanto, fora citado o nome do seu ateliê.

Coloquei a página da revista em um canto da mesa e liguei o


computador. Joguei o nome em um site de buscas e encontrei coisas
pouco relevantes. Lugares com nomes semelhantes ou situações que
se referiam a pincéis e sonhos. Era um nome genérico demais e após
meia hora cheguei à conclusão de que não me levaria a nada,
entretanto, eu não estava disposto a desistir tão fácil. Aquela
reportagem havia reacendido algo que há muito tempo estivera
adormecido em meu peito.

— Ji Won?
Ergui o olhar da tela do computador e vi a Min Jee entrar na minha
sala. Nós dois não conversávamos desde o que havia acontecido na
festa e confesso que não me esforcei para fazer isso. Ela era uma
excelente candidata a esposa, porém, eu não estava interessado.

— O que faz aqui esse horário? — Fechei a aba da pesquisa e me


levantei.

— Precisava falar com você. — Baixou o olhar, envergonhada,


porém, continuou de pé a centímetros da minha mesa.

— Como você voltou para casa naquela noite?

— De táxi.

— Está tudo bem com você?

— Não, não está. Acho que fui um pouco exagerada e peço


desculpas. Mas tenho ciúmes da brasileira. Não parava de falar dela
quando nós nos conhecemos e eu tenho medo de que ela se torne um
fantasma na nossa vida. Peço que... — Imaginei que fosse pedir
desculpas até que viu a reportagem amassada sobre a mesa. — O
que é isso? — Pegou a folha com os olhos escuros e finos enchendo-
se de lágrimas. — Você guardou?!

Engoli em seco, mas não havia mais motivos para continuar


mentindo para ela.

— Sim, eu guardei.

— Por quê? — Espremeu a folha entre os dedos com as lágrimas


escorrendo dos olhos.
— Porque quero encontrá-la — confessei. — Quero vê-la outra vez.

— Mas, Ji Won, e eu?

— Sinto muito, Min Jee, mas começarmos a namorar foi um grande


erro. Cedi à pressão dos meus tios e lamento por tê-la envolvido
nisso.

— Eu tenho certeza de que eles acham que eu sou uma esposa


muito mais adequada do que uma estrangeira.

— Presumo que sim. — Mantive a cabeça erguida e coloquei as


mãos dentro dos bolsos do jaleco. — Sei que devo ouvi-los, mas não
é justo com você se não consigo tirá-la da cabeça. Posso fazê-la
infeliz se nos casarmos.

— Você sequer tentou me fazer feliz! — Amassou a página da


revista em forma de bola e a arremessou contra mim.

— Acho que em algum momento eu tentei, porém, sinto que falhei


miseravelmente.

Min Jee cerrou os dentes e bufou.

— Então fique com a sua ilusão com uma estrangeira que está
muito longe de você e das nossas tradições. Estou cansada de
implorar por migalhas da sua atenção, Ji Won. Para mim chega!

— Desculpe-me, Min Jee!

Fingiu não ouvir o que eu acabara de falar e deu as costas,


caminhou até a porta e bateu-a atrás de si, sem se importar com o
barulho que não devia fazer em um hospital.

Soltei meu corpo sobre a cadeira e escorreguei até acomodar as


costas no encosto. Eu deveria estar me sentindo horrível, entretanto,
estava aliviado. Aquele término era melhor para a Min Jee do que
poderia parecer e esperava que ela percebesse isso com o tempo.

Coloquei o jeotgarak ao lado da tigela de lamén e encarei os meus


tios, que estavam sentados à mesa junto comigo. Meu primo havia
saído para algum lugar, que não me dei ao trabalho de perguntar qual,
e estávamos apenas nós três em um silêncio quase sepulcral,
sentados nas almofadas diante da mesa baixa e tradicional.

— Eu e a Min Jee terminamos.

— O quê?! Por quê? — Minha tia arregalou os olhos.

— Eu ainda penso na brasileira.

— Isso é um grande erro! — Minha tia começou a balançar a


cabeça em negativa, inconformada com o que eu acabara de lhe
confessar. — Deve parar com isso imediatamente e se casar com
uma coreana de boa família, como a Min Jee.
— Se eu me casar com a Min Jee, provavelmente nós não seremos
felizes.

— Felicidade é mais do que beleza e atração. Ela é a melhor


candidata para o seu futuro.

Eu fiquei em silêncio, era inadequado discutir com os mais velhos,


ainda que eu discordasse deles. Não queria a Min Jee. Casar-me
seria um grande erro, entretanto, minha tia, em toda a sua sabedoria,
não conseguia perceber isso.

— Deve ir atrás dela — pronunciou-se meu tio, que até o momento


estava calado apenas observando.

— Da Min Jee? — Franzi o cenho ao manter meu olhar no dele,


observando as rugas ao redor dos seus olhos se moverem à medida
que ele falava.

— Não, da mulher estrangeira.

— Chung-hee! — recriminou-o minha tia.

Ele a ignorou e continuou com a atenção em mim.

— Se é a estrangeira que continua querendo mesmo após terem


passado dois anos, vá atrás dela. Não perca mais tempo tentando
coisas que não quer fazer funcionar. Vá atrás do que quer!

— Não sei onde posso encontrá-la.

— Descubra.
— Não acredito que vá compactuar com isso — balbuciou a minha
tia.

— Vamos deixá-lo ser feliz, Yang mi.


Dezesseis
Lis

— “Onde fica a saída?", Perguntou Alice ao gato que ria.

“Depende”, respondeu o gato.

“De quê?”, replicou Alice.

“Depende de para onde você quer ir...”

Eu estava lendo para a Kin, mas a minha filha estava muito mais
interessada nas ilustrações do livro de Alice no País das Maravilhas
do que no que eu estava falando para ela. Com as mãozinhas, batia e
contornava a imagem do gato que possuía uma textura áspera.

— Gato!

— Isso, filha, um gatinho.

Me encarou com seus olhinhos escuros e puxados, então sorriu.

— Ga-gatinho.

— O gatinho da Alice.

— Gatinho mamãe. Gatinho Kin.

— Você quer um gatinho?

— Gatinho. — Continuou apontando para a ilustração do livro.

Às vezes, eu me surpreendia com a inteligência e a astúcia da


minha filhinha. Mesmo sem saber falar direito, ela já conseguiu me
pedir um gato. Estaria perdida quando estivesse um pouco mais
velha.

— Você só vai ganhar um gatinho quando for maiorzinha e puder


cuidar dele.

— Gatinho. — Apontou para a estante com os bichinhos de pelúcia


dela e eu comecei a rir quando entendi que ela não estava se
referindo a um gato de verdade, e sim a um dos brinquedos que tinha.

— Ah, o seu gatinho de pelúcia. Mamãe vai pegar para você. —


Sentei-a na poltrona onde nós duas estávamos e fui pegar o gato de
pelúcia.

Kin abriu um largo sorriso e balançou o brinquedo no ar.

— Gatinho.

— Sim, esse é o gatinho da Kin. — Ajoelhei-me diante da poltrona.

— Gatinho Kin.

— O que estão fazendo que essa sapeca ainda não foi dormir? —
Jaqueline apareceu na porta do quarto tomando uma caneca de um
chá quente fumegante.

— Estava lendo Alice no País das Maravilhas para a Kin. Ou


tentando.

— Ela parece muito animada com o ursinho de pelúcia.

— É um gato, o gato da Kin.


— Ah, tá! — Jaqueline franziu o cenho sem entender o que eu quis
dizer com aquela frase, porém não pediu que eu explicasse. — Aqui,
mudando de assunto, acha que a sua irmã ou a sua mãe podem ficar
com ela na sexta à noite?

— Por quê? — Voltei para a cadeira e aninhei a minha filha no meu


colo.

— Quero fazer uma pequena despedida de solteira e você precisa


ir.

— Preciso?

Fez que sim.

— Sabe que eu vou ficar extremamente chateada, magoada e com


o coração partido se você não for.

— Onde aprendeu todo esse melodrama? — Arregalei os olhos.

— Com você. — Beijou o próprio ombro.

— Vou ver com elas, mas eu não posso garantir nada.

— Já vou colocar o seu nome na lista.

Apenas balancei a cabeça em negativa e ela saiu sorrindo.


Minha irmã concordou em ficar com a Kin naquela noite. Não que
eu estivesse enfrentando alguma dificuldade para convencê-la. Alex
amava a sobrinha e os momentos com ela ajudavam-na a se preparar
para a própria filha que chegaria em breve.

Quando a Jaqueline falou que a despedida de solteiro dela seria


em uma boate, acho que ela se esqueceu de ser um pouco mais
específica, porque não era exatamente uma boate convencional. Era
dentro de um ônibus. Um muito colorido e chamativo, por sinal.

Ajeitei a alça da minha bolsa enquanto olhava para aquele ônibus


rosa e com luzes piscando dentro.

— Tem certeza de

que é aí que nós vamos? — Olhei de esgueiro para a minha melhor


amiga, um tanto receosa.

— Você vai adorar. — Ela me empurrou pelos ombros e eu quase


tropecei com o salto agulha que havia ficado preso em um
paralelepípedo da calçada.

Não tinha tanta certeza, mas segui para dentro do ônibus onde vi
alguns rostos conhecidos da faculdade e até mesmo o da minha mãe.
Entendi bem por que ela não poderia ficar com a Kin naquela noite.

Jaqueline foi até uma pequena mesa, pegou uma taça dourada de
plástico e encheu de espumante antes de entregá-la a mim.

— Jaque, eu não posso beber...


— A Kin já é grandinha, amiga, pode ficar alguns dias sem mamar
no peito enquanto você se desintoxica.

— Jaque...

— Amiga, você foi só a mãe pelo último ano. É a minha despedida


de solteiro hoje. Relaxa e curte um pouco.

Olhei feio para ela, entretanto, acabei aceitando a taça de


espumante. Alguns goles não me fariam mal.

— Isso! Tem algumas bebidas mais fortes ali no cooler, mas um


espumante é bom para começar.

Sentia o gosto do álcool e a sensação das bolhas de gás pela


minha língua e por todo o restante da boca. Tinha tanto tempo que
não bebia que mal me recordava do gosto e da sensação.

O ônibus começou a se mover e eu me escorei em alguma coisa


por puro reflexo. Levou alguns minutos para que eu percebesse ser
um pau de poli dance e me afastasse em meio a uma careta.
Jaqueline, em que encrenca você havia me metido?

Começou a tocar Macarena e a minha mãe foi a primeira a puxar a


coreografia junto com a mãe da Jaque e eu senti vergonha alheia.
Estava tomando o meu champanhe num canto quando ela me puxou
para junto da fila.

— Não! Eu não vou dançar isso.

— Deixa de ser careta, sua chata!


— Jaque!

— Hey, Macarena! — Puxou meus braços e começou a balançá-los


no ritmo da música quando me dei conta, estava fazendo sozinha e
ela dançando ao meu lado.

Parei de sentir vergonha e comecei a rir.

Assim que a música acabou, ela foi substituída por uma sirene
policial o que mudou a expressão de todas dentro do ônibus. Eu me
afastei um pouco e sentei-me em um banco ao lado de um pequeno
bar e fui seduzida por um shot de vodka.

O ônibus parou e entraram dois policiais. Bom, logo de cara eu


saquei que eles não eram exatamente policiais. Porque estavam com
uma roupa mais parecida com a dos policiais americanos do que os
militares comuns com quem esbarrávamos na rua. Atores ou não, eles
caminharam até o centro do ônibus, tiraram as armas e apontaram
para nós.

— Mãos para o alto! — disse um deles. — Vocês estão presas e


têm o direito de permanecerem caladas.

O outro caminhou até mim e se colocou entre as minhas pernas.


Arregalei os olhos com a atitude dele e me perguntei se a minha
calcinha não estaria aparecendo naquele ângulo. Foi uma péssima
ideia ter colocado um vestido tão curto, ou ao menos deveria ter saído
com um short por baixo.

Deixei o copo de vodka no balcão e fiquei olhando para ele.


— Ficar embriagada pode dar um tempo longo de reclusão. — Ele
pegou meus pulsos e ergueu na altura da minha cabeça.

Encarei-o, tinha profundos olhos castanhos, o rosto quadrado e a


barba bem-feita. Os músculos de quem era um frequentador assíduo
da academia se destacavam por debaixo do uniforme de policial.

— Quer saber qual vai ser sua punição? — A voz firme dele fez
com que eu estremecesse inteira.

Fiz que sim.

Ele aproximou o rosto do meu, enquanto mordia o lábio inferior e eu


imaginei que poderia me perder na dimensão daquele olhar. Então,
quando eu menos esperava, tirou a camisa em um puxão e o som de
sirene foi substituído por uma música de strip-tease.

— Onde está a noiva? — Ele soltou meus pulsos e eu caí como


gelatina contra o encosto.

Os dois falsos policiais foram até a Jaqueline e começaram a


dançar ao redor dela ao mesmo tempo que iam tirando a roupa. Se o
Ricardo visse aquilo, ele iria surtar, mas eu estava empolgada demais
para me preocupar com isso.

Depois de mais uns quatro, cinco... sei lá! Havia perdido a conta,
bom, depois de muitos shots de vodka, eu estava lá no meio dos
strippers me acabando. Esperava que a minha mãe estivesse tão
bêbada quanto eu para não me notar dançando até o chão com eles.
— Oi, Felipe! — Liguei para o primeiro contato de emergência que
eu tinha e que não deveria ter me chapado mais do que devia.

— Oi, Lis! Tudo bem?

— Acho que não. Minha cabeça está girando. — Saí cambaleando


até o ponto de ônibus.

Havia sido uma péssima ideia pedir para descer e a Jaqueline e


minha mãe estavam sem condições de me impedirem de fazer tal
burrada. Porém, depois de muita bebida e o corpo sarado dos stripers,
comecei a ficar depressiva.

Uma música de K-pop começou a tocar e caí em um choro terrível,


só porque ela me lembrou do Ji Won. Não tinha nada a ver com ele,
nem era o tipo de música que ele gostava, mas apenas pelo fato de
remeter a Coréia me deixou em prantos.

— O que estou pensando? — balbuciei ao sentar-me no banco do


ponto de ônibus. — Nunca mais vou ver ele.

— Lis, onde você está? — O tom de voz do Felipe mudou de


descontraído para preocupado.

— Sei lá. Desci atrás dos gogoboys depois que eles saíram do
ônibus-boate onde foi a despedida de solteiro da Jaqueline. Posso
estar em qualquer lugar e eu estou muito chapada para reconhecer.

— E a Kin?

— Está com a minha irmã. Só vou buscá-la amanhã.

— Tudo bem. Compartilha a sua localização comigo que eu irei


buscá-la.

— Não precisa. — Soprei uma mecha do meu cabelo que estava


caindo sobre os olhos enquanto balançava de um lado para o outro.
— Eu vou pegar um ônibus para casa.

— Lis, é mais de uma hora da manhã. Nem sei se tem mais ônibus
passando nesse horário. Me manda a localização que eu estou indo
buscar você.

— Tá... — Tirei o celular da orelha e mandei a localização para ele.

— Fica quietinha aí e toma cuidado, eu já estou indo.

Olhei em volta, as luzes da rua ofuscavam a minha visão e precisei


fechar os olhos em vários momentos. Fiquei agradecida por Felipe se
oferecer para me buscar, porque aquele lugar parecia deserto e muito
escuro.

Foi uma péssima ideia ter bebido e eu trataria de me lembrar disso


da próxima vez. Levou uns quinze minutos para que o Felipe
chegasse e parasse com o carro na minha frente. Ele baixou a janela
do motorista e me fitou com seus olhos castanhos.

— Entra no carro, Lis.


Assenti e dei a volta para sentar-me no banco do carona.

— Coloca o cinto.

Fiz o que ele me pediu e me encolhi com o ar-condicionado


resfriando os meus ombros nus.

— O que você estava pensando quando desceu sozinha em um


lugar desse? Não quero nem pensar se um marginal tivesse chegado
perto de você antes de mim.

— Eu sei, fiz besteira...

— Besteira eu faço quando deixo a comida dormir do lado de fora


da geladeira. Algo terrível poderia ter acontecido com você, Lis.

— Eu sei... — Mordi os lábios. A minha consciência estava me


arrastando no chão de tão pesada. — Obrigada por ter vindo me
buscar.

— Por nada. Você me deixou preocupado.

— Eu estou bem agora.

— Sei disso. — Soltou uma das mãos do volante e segurou a


minha.

— Agora eu só quero ir para casa e tomar um copo enorme de


café. — Debrucei-me sobre o porta-luvas ainda vendo tudo ao meu
redor girar. Isso que dava ficar tanto tempo sem beber e tentar tirar o
atraso todo em um único dia.
Felipe dirigiu até o meu apartamento e subiu comigo. Imaginei que
quisesse garantir que estava tudo bem antes de ir embora.

Abri a porta e cambaleei para dentro, mas antes que eu me


preocupasse em cair de fato, ele me segurou pela cintura.

— Toma cuidado.

— Muito obrigada mais uma vez.

— O que você quis dizer no telefone quando falou que nunca mais
vai ver ele? — Felipe fechou a porta atrás de nós e prendeu meu olhar
com o seu.

— O Ji Won.

— Quem? O pai da Kin?

Assenti.

— A Jaqueline tem razão, não adianta me iludir. Nunca mais vou


ver ele.

— Ainda queria ele? — Felipe entreabriu os lábios, surpreso.

— Sim. — Baixei o rosto envergonhada.

— Por isso não aceitava voltar comigo?

— Provavelmente — confessei sentindo os olhos se encherem de


lágrimas. Aquele era um sentimento que eu tentava esconder
inclusive de mim mesma.
— Ele está do outro lado do mundo. Talvez pode até ter se casado
com outra pessoa.

— Sei disso. — Fiquei olhando para baixo, envergonhada.

— Mas eu estou aqui. — Ergueu meu queixo e me forçou a encará-


lo. — Ainda amo você.

— Felipe...

Antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, aproximei meus lábios
dos seus e o beijei. Deixei a minha bolsa cair no chão quando ele me
segurou pela cintura e me apertou contra a parede. Senti um calor
gostoso, não era uma avalanche de sensações, mas fez com que eu
me sentisse amada e segura.

Escorreguei as mãos até a base da camisa dele e comecei a puxá-


la para cima, porém, quando ele se deu conta que eu pretendia tirar
sua camisa, ele se afastou.

— Lis, acho melhor não.

— Não está a fim de transar comigo? — Fiz bico como uma criança
mimada.

— Eu sempre estou, mas você está bêbada demais para fazermos


isso agora. Vamos só dormir.

Ele me pegou no colo e me levou para cama.


Acordei de manhã cedo com a minha cabeça latejando. Desde o
tempo da faculdade eu não sentia uma ressaca tão terrível, o que me
lembrava do quanto era horrível beber além da conta. Era como se
tivesse um prego sendo martelado contra as minhas têmporas.

Senti algo pesado contra a minha cintura e uma respiração contra o


meu pescoço e percebi que Felipe estava abraçado a mim, de
conchinha. Para completar a cereja do bolo da minha, com toda a
certeza, última experiência bêbada, eu tinha transado com meu ex?

— Bom dia, Lis! — Ele abriu os olhos e se espreguiçou ao perceber


que eu já estava acordada. — Dormiu bem? — Deu-me um rápido
selinho.

— A minha cabeça está doendo e latejando como se tivesse uma


bateria de escola de samba aqui dentro. Vou odiar a Jaqueline para o
resto da minha vida por ter me deixado beber desse jeito.

— Estarei lá para impedir da próxima vez.

— Acho que esse não foi o único erro da noite passada. —


Levantei-me da cama e fiquei surpresa ao notar que ainda estava
vestida. — Nós não deveríamos ter transado, Felipe...
— Nós não transamos, Lis. — Ele se sentou na cama, coçando o
queixo com a barba por fazer. — Você estava bêbada demais. Passei
a noite com você porque fiquei preocupado. Não poderia ter deixado
você sozinha daquele jeito.

Respirei fundo, de certa forma aliviada, porque tinha apenas flashs


vagos da noite anterior.

— Ainda bem que não rolou, esse lance de cobrir buracos precisa
acabar.

— Concordo com você. Não quero mais essa amizade colorida dos
últimos dois anos. O certo é voltar a ser a minha namorada como era
antes. Nós já estamos há anos do lado um do outro, tem que ser mais
importante do que os quinze dias que você passou com esse cara.

— Ele me deu a Kin.

— Eu posso criar ela e te dar mais filhos.

— Não sei se quero mais filhos. — Passei os dedos pelos cabelos


ondulados, penteando-os brevemente e os prendi em um rabo de
cavalo com a gominha que estava sobre a minha penteadeira.

— Não importa, Lis. Desde que me queria.

— Felipe...

— Só diz que sim.

Olhei para ele e para o chão uma centena de vezes. Em um


momento, ele já foi o final feliz que eu mais desejei no mundo, porém,
em outro, esse final acabou se transformando e ele não estava mais
incluso. Contudo, com o passar dos anos, ele não parecia mais o
homem perfeito, mas acabava se mostrando como o mais fácil. A
melhor escolha para mim e para a minha filha.

— Volta para mim, Lis. Você não vai se arrepender.

De alguma forma, não tinha tanta certeza quanto aquela afirmação


dele, no entanto, isso não pareceu relevante.

— Tudo bem. — Senti mais como se estivesse entregando os


pontos do que feliz de verdade. — Agora, levanta e escova os dentes!
Eu preciso ir buscar a Kin na casa da minha irmã.

— Posso ir com você?

— Sim! Eu iria ficar contente se dirigisse. Ainda estou com uma dor
de cabeça horrível. Vou odiar a Jaque até o ano que vem por ter me
deixado beber desse jeito.

— Eu posso supor que ela não esteja muito melhor do que você. —
Felipe cobriu a boca com a mão e deu uma risadinha.

— Levanta logo!

Ele ficou de pé e me deu um beijo que correspondi por puro reflexo,


sem saber se realmente queria ou não. Talvez precisasse só de um
tempo para voltar a me sentir como antes em relação a presença dele.
Chegamos ao apartamento onde a minha irmã morava por volta
das 10h da manhã. Eu usava óculos de sol porque os meus olhos
estavam com a pior tolerância possível à luz, porém, minha cabeça já
latejava bem menos e fiquei grata por isso. Toquei o interfone e subi
com o Felipe para o andar dela.

Bati na porta, que foi aberta um minuto depois pelo Tadeu, marido
da minha irmã.

— Bom dia! — Cumprimentei-o com um sorriso, mas tive medo que


esse acabasse mais como uma careta. — Onde está a Alex e a Kin?

— Estão lá no quarto. A Alex estava ajudando a Kin a usar o


piniquinho que compramos para a nossa filha.

— Obrigada! Posso entrar?

Ele deu um passo, afastando-se da porta e entrei na sala, sendo


seguida de perto pelo Felipe.

Fui até o quarto que a minha irmã havia preparado para receber a
filha que nasceria em breve e vi a minha andando de um lado para o
outro. Segurando apenas num momento ou outro em coisas como o
berço e o guarda-roupa.

— Kin! — Parei junto à porta.


— Mamãe! — Ela estendeu os bracinhos e veio praticamente
correndo até mim.

Eu a envolvi, abraçando-a bem apertado. Senti uma sensação de


calor no peito. Não havia coisa melhor no mundo do que estar perto
da minha filha.

— Se comportou com a tia Alex?

— Ela foi um amor — respondeu minha irmã. — Nem quero


devolvê-la para você. É tão fofa.

— Não começa, você vai ter a sua logo.

— Eu sei, mas essa já está prontinha. — Fez bico. — Ah, oi, Felipe!
— Só então ela percebeu a presença dele atrás de mim. — Como
você está?

— Melhor agora. — Ele colocou a mão sobre o meu ombro e minha


irmã franziu o cenho sem entender a atitude dele. — Nós voltamos.

— Ah! — Alex pareceu ainda mais surpresa. — Parabéns!

— Obrigada! — Abri um sorriso amarelo e dei uns tapinhas na mão


dele.

— Mama, mamãe! — Kin começou a puxar a minha blusa.

— Vou fazer mamadeira para você, tá bem? — Fiz carinho no


rostinho dela e beijei-a na testa.

— Por que não vai dar peito a ela? — questionou a minha irmã. —
Achei que ainda a amamentasse.
— Amamento, mas vou esperar que o álcool de ontem saia do meu
sistema. Eu bebi um pouco além da conta.

— Isso explica muitas coisas. — Olhou para o Felipe e depois para


mim. — Eu fiz pão de queijo. Vocês querem? Está uma delícia, a Kin
já comeu uns três.

— Aceito sim. — Estava com a barriga roncando, queria tanto ver a


minha filha logo que nem me preocupei em tomar café da manhã.

Seguimos com a minha irmã até a cozinha. Estava com a minha


filha no colo e a coloquei no chão apenas para pegar alguns pães de
queijo, no entanto, não tirava os olhos dela por um único minuto.

— Então, quando vocês voltaram? — Minha irmã pegou um iogurte


na geladeira e se virou para nós, tentando puxar assunto, porém, eu
não me senti confortável que o tema fosse aquele.

— Hoje de manhã. — Felipe tinha um largo sorriso nos lábios.

— Ah, vocês dormiram juntos?

— Dormimos, mas só dormimos.

— Daqui a pouco eu vou ter mais uma sobrinha — debochou Alex


e se tivéssemos apenas nós duas, eu teria dado um tapa nela para
que parasse de gracinha.

— Não seria nada mau. — Felipe caiu na onda dela e isso fez com
que eu revirasse os olhos para ele.

— Deixa só a Kin.
— Por enquanto. — Ele me deu um beijo no ombro.

Qual é? Contenha-se! quis gritar para ele. Tinha aceitado voltar a


namorar com ele e não um pedido de casamento com direito a troca
de votos e planos.

Peguei um pão de queijo e coloquei dentro da boca dele para que


ficasse calado por alguns minutos. Imaginava que, com o tempo,
fosse me acostumar com essas ideias em relação a ele. Já havia nos
imaginado casando antes, infinitas vezes, entretanto, naquele
momento, a ideia me incomodava de uma forma que eu não sabia
explicar.

— Você deve ter muita coisa para fazer hoje, Alex. Acho que já vou
indo. — Peguei Kin pela mão no momento em que ela estava prestes
a abrir o armário da tia e pegar as panelas para fazer bagunça.

— Que isso! Eu estava esperando que fossem almoçar comigo


hoje. Ia fazer aquela lasanha de berinjela que você gosta tanto.

— Sabe que ela fala que gosta só para agradar você, né, amor? —
disse Tadeu da sala.

— Ao menos é saudável. — Alex deu de ombros. — Vão ficar? —


Fez olhinhos de cachorro pidão.

— Ia ter que começar o almoço do zero em casa mesmo. Posso


ajudar você aqui.

— Ótimo! — Minha irmã abriu um largo sorriso e apertou meu braço


com as pontas dos dedos.
— Felipe, porque não vai assistir televisão com o Tadeu e olha a
Kin para mim?

— Princesa, vem comigo. — Ele estendeu os braços para a minha


filha que caminhou até ele sem qualquer hesitação.

— Achei que você não fosse voltar para ele — falou a Alex vários
tons mais baixos para que o Felipe e o Tadeu não ouvissem da sala.

— É, eu também não. — Peguei as berinjelas que estavam em uma


sacola de supermercado e comecei a descascar enquanto olhava
para o exaustor prateado em cima do fogão sem encarar a minha
irmã.

— Então por que voltou?

— Parece o melhor.

— Ah, fala sério, Lis! Melhor para quem? — Ela quase gritou, mas
voltou a baixar o tom de voz. — Você nunca foi do tipo que fazia o que
parecia melhor. Lembra quando desafiou todo mundo para fazer Artes
Visuais?

— Por que está falando isso? — Coloquei a berinjela cortada em


tiras em uma bacia com água.

— Porque você não parece animada com a volta do namoro. Ouso


dizer que nem feliz.

— O Felipe é bom para mim e para a minha filha. Isso tem que ser
o suficiente. Ele está há dois anos tentando, talvez seja o momento de
dar a ele uma segunda chance.
— Eu espero que sim.

Alex não voltou a falar nada. Iria respeitar a minha decisão, ainda
que claramente discordasse dela.
Dezessete

Coloquei a mecha solta do meu rabo de cavalo atrás da orelha


antes de descer do carro. Estava com um estranho calafrio na barriga,
mas tentei manter o sorriso ao soltar minha filha do cinto da
cadeirinha e a colocar no carrinho de bebê.

— Você voltou mesmo para ele? — Jaqueline estava parada ao


meu lado, segurando a mala da Kin como se fosse um guarda-volume
sem mover um único músculo. Parecia tão surpresa quanto a minha
irmã com a novidade.

Não conseguia entendê-las, haviam torcido tanto para que eu me


acertasse com ele ou arrumasse outro cara, e agora, ficavam me
olhando como se fosse o fim do mundo.

Jaqueline havia passado todo o final de semana fora, eu gostaria


de supor que ficara em uma vigília na igreja por todos os pecados
cometidos na despedida de solteira da sexta-feira, entretanto, era
capaz de apostar que ela havia cometido outros tantos na companhia
do noivo.

Nós nos encontramos no horário de vir para o ateliê e eu havia


contado para ela durante o caminho sobre ter reatado com o Felipe. A
reação dela me surpreendeu, porque tinha colocado tanta pilha para
que eu parasse de bancar a solitária e voltasse para ele ou
encontrasse outro.
— Pela reação sua e da Alex agora, eu acho que fiz a pior escolha
do mundo.

— Sabe que não fez, amiga. — Abriu um sorriso. — Mas, sei lá, só
achei que não fosse voltar para ele e não está tão feliz quanto
deveria.

— Estou feliz, só não estou radiante.

— Se é o que está dizendo. — Deu de ombros. — Bom, vamos


trabalhar porque eu prometi duas esculturas para um cliente até o fim
do mês.

— Aquelas estátuas que está fazendo, das crianças?

— Sim. São os filhos dele.

— Entendi. — Olhamos para a rua e esperamos o sinal fechar para


atravessar, empurrando o carrinho com a Kin dentro.

Assim que chegamos na porta do ateliê uma pessoa se encontrava


de pé, um homem alto de cabelos pretos cortados baixos e vestindo
roupas sociais, virou-se para mim e eu senti minhas pernas ficarem
bambas. Parei de respirar com a pressão sobre o meu peito e foi
como se tudo ao meu redor tivesse sido congelado. Fiquei grata por
Kin estar no carrinho e não nos meus braços, pois perdi o total
controle sobre meu corpo.

— Lis. — A voz ainda era exatamente como eu me lembrava e isso


fez com que meu coração disparasse, mas não consegui voltar a
respirar.
— Ji Won? — Achei que ele parado diante do meu ateliê não
poderia ser nada além de uma miragem, uma ilusão gerada pelo meu
cérebro esperançoso e tolo.

— Espera... Ji Won, O COREANO? — Jaqueline está boquiaberta


ao meu lado, mas o fato dela também estar enxergando o cara me
deixou ainda mais surpresa.

— Finalmente encontrei você. — Ele sorriu. Ainda tinha o mesmo


sorriso que por tantas vezes eu eternizara em meus desenhos e
pinturas.

— O que está fazendo aqui? — Inspirei longa e profundamente


quando finalmente consegui voltar a respirar.

— Precisava ver você de novo. — Com as mãos nos bolsos e o


cabelo sendo soprado pelo vento da manhã, ele caminhou até mim e
parou diante do carrinho.

Ji Won parou de me olhar e fitou por longos minutos a Kin que o


encarou de volta.

— Esse bebê... — Foi a vez de ele ficar paralisado. — É minha


filha?

— Maior Q.I. do mundo, amiga. — Jaqueline deu uns tapinhas no


meu ombro e seguiu para dentro do ateliê, me deixando sozinha no
meio daquela situação.

— Sim, é sua — respondi logo porque não sabia por onde começar
a conversa com ele. Durante muitos momentos eu havia fantasiado o
nosso reencontro, mas eu nunca pensei que isso iria acontecer de
fato.

Ele arregalou os olhos de uma forma que eu não julgava ser


possível e ficou calado por muito tempo. Tão em choque quanto eu
quando o vi.

— Por que não me contou?

— Eu tentei. Vamos entrar. — Apontei para o ateliê. — Acho que


temos muito o que conversar.

Ele assentiu e caminhou ao meu lado. Assim que chegamos perto


de uma elevação de degrau da entrada, ele parou e se inclinou para
tirar os sapatos, porém, toquei o ombro dele antes que prosseguisse.

— Não precisa. Não tiramos os sapatos aqui.

— Ah, não?

— Não. — Ergui um pouco o carrinho para que ele passasse no


degrau e segui com minha filha até a pequena sala na entrada, onde
havia um sofá e poderíamos conversar de uma forma mais
confortável.

Deixei o carrinho virado para mim, com minha filha observando


tudo sem entender nada do que estava acontecendo, e sentei-me no
sofá. Ji Won se sentou na outra extremidade olhando para mim.

— Nós temos uma filha... — Passou as mãos pelos cabelos,


puxando o topete para trás.
— Temos... — Segurei a minha calça, apertando o jeans entre os
meus dedos sem saber se olhava para ele ou para nossa filha. Escolhi
ficar olhando para a Kin, o que me deixou mais confortável.

— Foi embora daquele jeito porque sabia que estava grávida?


Sequer me deu a oportunidade de me despedir de você
pessoalmente.

— Não. Eu não sabia que estava grávida. Ainda era cedo demais.
— Escorreguei a mão pela lateral do carrinho enquanto mantinha o
meu olhar fixo na Kin, que olhava para o Ji Won provavelmente se
perguntando quem era aquele cara. — O que rolou entre nós dois
deveria ter sido apenas um caso. Além disso, sou péssima com
despedidas. — A verdade é que eu estava com medo de não querer ir
embora se o visse por uma última vez, mas não contei isso. —
Quando eu vim embora, acabou e tudo bem para mim, mas algumas
semanas depois descobri que estava grávida.

— Não achou que eu merecia saber? — Vi um raio de raiva brilhar


nos olhos escuros dele e me encolhi involuntariamente. Imaginei que
deveria estar furioso comigo.

— Achei... Mandei uma mensagem para você dizendo que


precisávamos conversar. Que eu tinha um assunto importante para
dizer, mas você visualizou e nunca me respondeu. Depois disso,
todas as mensagens que eu enviei para você nunca mais foram
entregues. Imaginei que houvesse me bloqueado.
— Eu jamais bloquearia você. Talvez você tenha me bloqueado,
porque eu mandei mensagens e tentei ligar para você tantas vezes
que não conseguia mais contar.

— Meu celular foi roubado, perdi aquele número...

— Quer dizer que não recebeu nenhuma das minhas ligações?

Fiz que não.

— Achei que nunca mais fosse voltar a vê-lo, Ji Won.

— Não pretendia levar a minha filha até a Coréia para que eu


pudesse conhecê-la?

Fiz que não e vi o que ainda restava da expressão doce dele ser
completamente transformada em fúria e revolta.

— Não sabia se iria encontrá-lo e caso encontrasse o que poderia


ter mudado. Criei ela sozinha aqui.

— Longe de mim.

— Não fazia parte dos meus planos, mas eu não imaginava que
ficaria grávida por uma noite de descuido sem preservativos. Imaginei
que não fosse o que você quisesse também.

— Não deveria ter feito inferências sobre mim. — Não olhou mais
diretamente para mim, no entanto, podia sentir sua raiva parar no ar
ao redor de nós. Juro que não era dessa forma que eu havia
imaginado que seria o nosso reencontro.
— Oi, filha! — Ele puxou o carrinho para mais perto e Kin continuou
o encarando, sem entender o que ele havia dito em inglês.

— Ela ainda está começando a falar português. Ainda não teve


nenhum contato com o inglês.

— Deveria ter tido. As crianças na Coréia...

— Não estamos na Coréia, Ji Won — interrompi-o antes que


começasse a questionar a forma como eu havia criado a Kin. Sabia
que estava furioso por ter passado todo esse tempo sem saber da
existência dela, mas eu não lidaria bem se ele chegasse e começasse
a questionar a forma como eu havia feito as coisas até aquele
momento. Havia criado a Kin sozinha e não o queria questionando as
decisões que havia tomado sobre ela até ali.

— Eu tinha o direito de saber dela e ela de mim.

— Tinha. Eu sinto muito por isso.

— Sentir muito não parece o bastante para mim.

— O que mais queria que eu tivesse feito?! — Ergui o tom de voz e


a Kin se assustou, dando um pulinho de susto no carrinho.

— O mínimo que deveria ter feito era tê-la levado até a Coréia. Eu
ainda moro no mesmo lugar onde eu a levei. Seria mais fácil me
encontrar do que foi para eu encontrá-la.

— As coisas não são tão simples como você está dizendo. —


Cruzei os braços, irritada. — Não levaria a minha filha para um país
desconhecido do outro lado do mundo sem saber o que encontraria lá.
— Não é um país desconhecido, é o país dela. Ela encontraria o
pai lá.

— O país dela é o Brasil!

— Ela foi concebida na Coréia.

— Mas nasceu e foi registrada aqui.

— Isso não importa.

— Não? — Foi a minha vez de cerrar os dentes. — Não sei como


chegou até mim, mas se veio até aqui só para me desafiar, talvez
tenha perdido o seu tempo e seja o momento de retornar para a
Coréia.

— Eu vim até aqui reencontrá-la. Há pouco menos de um mês eu


me deparei com uma reportagem sobre você em uma revista de arte
americana e com ela eu vi o nome do seu ateliê. Era muito genérico,
mas com alguns dias de pesquisa eu encontrei um endereço. Esse
endereço. — Apontou para o chão. — Estava preparado para muitas
coisas, inclusive para encontrá-la casada, mas não para termos uma
filha juntos.

— A Kin foi uma surpresa para mim. Depois de algumas coisas que
haviam acontecido na minha vida... — O término do Felipe comigo.
Algo que o Ji Won não precisava saber. — Eu não planejava ser mãe
tão cedo, então ela aconteceu.

— Queria ter compartilhado essa surpresa.


— Sinto muito, Ji Won. Mas pode conhecê-la agora. — Peguei a
Kin do carrinho e a entreguei a ele.

Ela estranhou o desconhecido que a segurou e ficou me encarando


com os olhinhos escuros cheios de lágrimas, como se estivesse
prestes a chorar a qualquer momento.

— Esse é o papai, filha. Seu pai.

— Papai?

— É, meu amor, seu pai.

Ela ficou me olhando sem entender até que começou a chorar e


tombou o corpo para mim, querendo sair do colo do Ji Won e vir para
o meu.

— Mamãe... Mamãe.

Assim que a peguei do Ji Won, a nossa filha parou de chorar, mas


quem ficou com cara feia foi ele.

Tentei pensar na situação de uma forma um pouco mais racional,


ainda que o meu coração estivesse batendo apertado e um nó se
formasse na minha garganta, me impedindo de respirar direito. Por
mais que eu tivesse as minhas justificativas, não havia contado para o
Ji Won que estava grávida dele. Ele não conviveu com a Kin durante
um ano e meio, chegou aqui e descobriu que ela existia. Era de se
esperar que estivesse no mínimo confuso e chateado.

— Ela nem quer ficar perto de mim.


— Só não conhece você ainda.

— As coisas não deveriam ser assim. Ela deveria me conhecer


desde o momento que nasceu.

— Não me culpa por isso! — Alterei o tom de voz, ficando


involuntariamente irritada.

— Então devo culpar quem? — Ele me encarou de volta com


firmeza e fúria, fazendo-me engolir em seco. — Você foi embora sem
se preocupar em me dizer adeus pessoalmente. Você não me contou
que estava grávida. Se para a minha filha eu sou um estranho, a culpa
é sua.

Cerrei os dentes. Mandei a racionalidade para Marte e fiquei muito


irritada com as palavras dele.

— Se você veio da Coréia até aqui só para me ofender, é melhor


voltar para sua casa!

— Eu não vou a lugar nenhum sem a minha filha.

— Eu cuidei dela desde que nasceu. Estávamos bem sem você.

— Nunca me deu a chance de estar presente na vida dela.

— Mamãe! — Kin me abraçou, assustada com o tom de voz


alterado de nós dois e começou a chorar.

— Calma, filha. — Retribuí ao abraço dela e a beijei no alto da


cabeça, murmurando a música que cantarolava para ela dormir. —
Está tudo bem, minha princesinha.
Ela soluçou e parou de chorar, mas continuou aninhada a mim, sem
olhar para o Ji Won sentado na outra extremidade do sofá.

— O que está falando para ela?

— Ela só está assustada. Vamos falar mais baixo.

Ji Won chegou mais perto devagar e fez um carinho leve na cabeça


dela, que não se assustou dessa vez.

Ficamos em silêncio por alguns minutos e eu consegui respirar


melhor com o clima pesado que ia se dissipando, mas pairava sobre
mim a terrível sensação de que aquela calmaria não ia sobreviver
nem 24 horas.
Dezoito
Ji Won

Cheguei ao hotel com uma raiva que não havia sentido em nenhum
outro momento da minha vida. Eu tinha uma filha e havia sido privado
do convívio com ela! Fora difícil sair do ateliê da Alissa e deixar a
minha filha com ela, ainda que houvéssemos entrado em consenso
sobre eu passar o dia seguinte na companhia da menina.

Sentei-me na cama e abri as abotoaduras da minha camisa. Minha


mente estava cheia e o meu coração pesado. De todas as situações
que eu imaginara que passaria ao chegar no Brasil, ter uma filha não
estava entre elas e deparar-me com esse fato deixou-me muito
abalado. A situação deixara de ser Alissa ter ido embora e
desaparecido, mas se complicara. Estava com raiva e esse
sentimento obscureceu qualquer outro que pudesse ter me
impulsionado até ali.

Nada parecia mais importante do que a menina. Kin... minha filha.

Meu celular tocou e eu o puxei do bolso. Surpreendi-me em ser


meu tio.

— Ahjussi, Chung-hee!

— Ji Won, já chegou ao Brasil?

— Sim, já faz quase um dia. Estou em um hotel agora.

— Como foi? Encontrou a sua garota estrangeira?


— Sim...

— Por qual motivo não parece feliz?

— Ela está com a minha filha. Eu tenho uma filha.

— Fi-filha? — gaguejou o meu tio do outro lado da linha, surpreso


com a minha revelação. Eu, na posição dele, também ficaria. A
situação era pouco provável, mas eu vira a menina com meus
próprios olhos. — Do que está falando, Ji Won?

— No tempo em que ela passou na Coréia, nós tivemos relações


sexuais e ela engravidou. A menina nasceu aqui, no Brasil, mas
possui os meus traços nos cabelos, nos olhos...

— Oh! Ela nunca contou para você?

— Não. Esperei por ela no endereço em que encontrei e quando


ela chegou, estava com a menina. Pelo crescimento dela e as suas
feições, foi fácil deduzir que teria sido concebida no momento em que
passamos juntos.

— E o que você fará agora?

— Eu não sei. Mas a criança é minha filha e não abrirei mão dela.

— Sua tia ficará feliz em saber que, em breve, teremos uma criança
em casa. Ela sente falta...

— Estou me sentindo como se parte da minha vida e da dela


houvesse sido roubada de mim — continuei sem dar importância ao
que ele havia falado.
— Acredito que sim. Espero que consiga resolver da melhor forma.
Se precisar que eu envie dinheiro ou alguma outra coisa, não evite
entrar em contato comigo.

— Obrigado, Tio.

Lis

Tirei a Kin da banheira e a enrolei em uma toalha. Ela deixou o


patinho de borracha cair no chão e ficou apontando.

— Patinho! — pedia até que eu me curvei e peguei-o para ela.

Levei-a para minha cama enrolada em uma toalha e a sequei,


esfregando seu corpinho e seu cabelo. Ela estava se divertindo
chupando e mordendo o patinho enquanto eu passava a colônia de
bebê e a vestia.

— Lis, está tudo bem? — Jaqueline chegou na porta do quarto e


observou a forma como eu estava tremendo.

— Não! Eu não estou nada bem — nem me dei ao trabalho de


mentir. Estava desmoronando por dentro e a Jaqueline era uma das
poucas pessoas com quem eu poderia contar.
— O que foi? — Ela fechou a porta, veio até mim e se sentou ao
lado da Kin.

— Confesso, é ridículo, porque o que nós tivemos foi apenas um


caso, mas passei todo esse tempo sonhando com o dia que
reencontraria o Ji Won. Aí ele aparece na porta do ateliê como se
todos os meus pedidos tivessem sido atendidos... — Inspirei
profundamente tentando não começar a chorar na frente da minha
filha. — E esse sonho vira um pesadelo.

— O que vocês dois conversaram? Eu até tentei espiar, mas sabe


que o meu inglês é horrível.

— Ele está me odiando porque não contei que estava grávida para
ele.

— Eu falei para você contar, amiga.

— Eu tentei! Não acredito que vai ficar do lado dele?

— Eu estou ao seu lado, amiga. Sempre estarei, você sabe disso.


Só estou tentando entender o que aconteceu. O que ele veio fazer
aqui?

— Leu uma reportagem sobre mim e a exposição da Coréia em


uma revista americana e achou o endereço do ateliê na internet.

— Que fofo! Ele veio atrás de você!

— Mas isso está sendo tudo, menos o reencontro dos meus


sonhos. Eu imaginei que o veria, correria para os braços dele como
naquelas cenas de filmes e nos beijaríamos. Sem sombra de dúvidas,
não foi nada disso que aconteceu.

— Onde ele está?

— Num hotel na Savassi, perto do ateliê. Combinei de me


encontrar com ele amanhã cedo para que pudesse passar um tempo
com a Kin. Ela chora toda vez que ele tenta pegar ela.

— Sabe que ela nunca gostou muito de ficar perto daqueles que
não conhece. — Jaqueline afagou a cabecinha da minha filha que
olhou para ela e sorriu.

— Espero que ela se acostume com ele antes que a situação fique
ainda pior.

— Bom, não quero deixar você pior, mesmo achando que vai ser
inevitável, mas preciso lembrar você de uma coisa. Você voltou com o
Felipe no sábado.

— Jaqueline, eu odeio você!

— Ainda bem que esse é um sentimento que dá e passa. — Afagou


meu ombro e eu revirei os olhos. — Mas eu continuo amando você.

— Ah, em que confusão eu fui me meter, Jaque? — era uma


pergunta retórica e eu não esperava uma resposta dela.

— Acho que o pior nem é o Ji Won nesse caso. O Felipe vai ficar
muito puto quando souber que o coreano está por aqui.

— Eu não deveria ter bebido na sexta-feira.


— Não culparia a vodka. Creio que você acabaria cedendo à
pressão do Felipe em um momento ou outro. Ele estava sempre por
perto, cuidando de você e da Kin, sendo o quebra-galho perfeito.
Estava na cara que só esperava o momento de assumir o posto
oficial.

— Achei que fosse a melhor coisa para Kin, aí o pai dela de


verdade aparece. — Olhei bem para ela e cruzei os meus braços.

Jaqueline começou a rir e eu me segurei para não dar nela.

— Desculpa, amiga. – Colocou a mão na boca para encobrir o riso.

— Em algum momento você tinha a intenção de fazer com que eu


me sentisse melhor? Porque não funcionou.

— O que mais preocupa você agora?

— Tudo! Absolutamente tudo. Estou desesperada. — Meus olhos


se encheram de lágrimas que não tardaram a cair. — Mas
principalmente a Kin. Posso ficar sem eles, mas ficar longe da minha
filha seria ter o meu coração arrancado do peito. Não tem nada mais
importante no mundo para mim do que ela. — Peguei-a da cama e a
abracei.

— Calma, amiga, ele não é louco de tentar tirar ela de você.

— Não estou tão segura quanto a isso. — Engoli parte das


lágrimas.

— Calma! O Ji Won está bravo, mas ele vai entender.


— Espero que sim.

Ji Won

Mais por curiosidade do que pelo fato de acreditar verdadeiramente


nas palavras da Alissa, deitado na cama e sem conseguir adormecer,
abri a lista de bloqueios do meu celular. Não era grande e por isso não
levei muito tempo para encontrar um número brasileiro bloqueado há
dois anos. Já havia trocado o meu aparelho algumas vezes, mas a
lista de números era sempre salva.

Desbloqueei o número e fiquei pensando no motivo daquilo ter


acontecido, foi então que lembrei que na época estava em um
encontro às cegas com a Min Jee e ela pegou meu telefone para,
supostamente, tirar fotos dela para mim. Não duvidaria que ela fosse
capaz de apagar as mensagens e bloquear o número da Alissa.

Isso poderia até em partes justificar a falta de contato, mas ainda


não era o suficiente para ela não ter apresentado a minha filha. Eu saí
da Coréia sem nada além de uma matéria de revista e um endereço
em um site de buscas, porém, ela sabia onde eu morava e tinha
acesso a todas as informações para me encontrar. Se ela quisesse,
eu não teria passado todo esse tempo sem saber da minha filha.

Lis

— Alguém em casa? — Ouvi a voz do Felipe e me encolhi inteira.


Não! Mil vezes não. Tudo o que não precisava era dele ali naquele
momento.

— Me explica por que ele ainda tem a chave? — murmurei para a


Jaqueline, que deu de ombros.

— Foi você quem deu, amiga. É você quem tem que tomar.

— Eu dei quando ainda namorávamos da primeira vez. Me lembra


de trocar a fechadura.

— Você está aqui, Lis? — Bateu na porta do quarto. — Eu posso


entrar?

— Pode... — Respirei fundo. Queria apenas um momento de paz,


mas parecia tão impossível naquele momento.

Ele abriu a porta e entrou de mansinho. Ele estava de cabelo


molhado e banho tomado, mas o perfume era forte demais. Deixei a
Kin na cama e me levantei para abrir as janelas, deixando que o ar
fresco da noite invadisse o quarto.

Eu me virei para sair de perto da janela e dei de cara com ele


parado a centímetros de mim. Tão próximo que o perfume chegou a
me enjoar.

— O que foi?

— Acho que você passou perfume demais — confessei, esperando


ser a desculpa perfeita para que ele não ficasse tão colado em mim.

— Desculpa. — Felipe baixou a cabeça e deu dois passos


hesitantes para trás.

Eu passei por ele, sentindo-me mais desconfortável do que nunca


com a sua presença. Sabia que isso não era só por causa do
perfume.

Nada me garantia que eu e o Ji Won fôssemos nos entender,


principalmente depois do péssimo reencontro que tivemos, porém,
estava muito arrependida de ter concordado em voltar para o Felipe.

— Acho que essa é a minha deixa. — Jaqueline se levantou da


cama e caminhou até a porta.

— Jaque! — chamei-a antes que conseguisse sair.

— O que foi? — Virou-se girando o corpo na ponta dos pés.

— Pode ficar de olho na Kin por alguns minutos? Preciso falar com
o Felipe a sós.
— Está bem! — Ela se debruçou sobre a cama. — Vem com a
dinda, princesa. — Fez um gesto com as mãos e Kin engatinhou até
ela. Jaqueline pegou minha filha no colo e saiu do quarto.

Sozinha com o Felipe, apontei para cama e ele se sentou com um


sorrisinho malicioso nos lábios.

— Eu também estava morrendo de saudades de transar com você,


mas achei que esperássemos ao menos a Kin dormir.

— Nós não vamos transar, Felipe. — Cruzei os braços e olhei para


ele, séria. — Eu só queria que você sentasse.

— Por quê?

— Tenho uma coisa para contar que provavelmente não vai deixar
você contente, mas como vai acabar sabendo uma hora ou outra, é
melhor que eu fale logo.

— Está me deixando assustado. — Ele segurou firme a colcha cor


creme da minha cama enquanto mantinha os olhos nos meus.

— O pai da Kin está aqui.

— O quê?! Você está de sacanagem comigo?

— Não. Cheguei no ateliê hoje pela manhã e ele estava na porta.

— O que ele queria? — Mordeu os lábios e começou a bufar como


um touro.

— Não chegou a falar sobre isso, porque viu a Kin, descobriu que
era filha dele e está muito furioso. Como se eu fosse a vilã da história.
— Ele é um idiota!

— Não sei... Não sabia qual reação esperar dele se um dia


soubesse que tivemos uma filha.

— Como pode defender ele?!

— Não estou defendendo ninguém. Na verdade, estou sim. A mim


e a minha filha.

— Lis. — Felipe se levantou e pegou as minhas mãos entre as


suas. — Sabe o quanto eu amo você e que estarei ao seu lado
sempre que precisar de mim.

— Obrigada! — Sorri e ele me deu um selinho.

— Espero que aquele cara volte logo para a Coréia e deixe a gente
em paz.

— É... — Não tinha certeza se era exatamente isso que eu queria,


mas a sensação em meu coração era que não. — Vem, vou preparar
algo para nós comermos e a mamadeira da Kin. — Puxei-o comigo
para fora do quarto.
Dezenove

Acordei bem cedo naquele dia e amamentei a Kin. Dei um banho


nela e a vesti da forma mais fofa que encontrei. Coloquei um vestido
listrado de mangas compridas e uma tiara com um lacinho de bolinhas
sobre os cabelos ralos e pretos dela. Dava vontade de morder
tamanha gostosura. Levei-a ao piniquinho antes de sairmos e me
certifiquei de que havia tudo o que era necessário, para passarmos o
dia fora, dentro da malinha dela.

Havia prometido que me encontraria com o Ji Won no hotel onde


ele estava hospedado e Jaqueline teria que abrir o ateliê sozinha. Eu
esperava que a nossa experiência com ele e a nossa filha fosse
melhor do que a do dia anterior, em que tudo o que ele fizera fora me
alfinetar a respeito de todas as decisões que eu havia tomado.

Desci até a garagem de mãos dadas com a Kin, incentivando-a a


caminhar e fomos até o carro. Abri a porta traseira e ela ficou
saltando, dando pequenos pulinhos, escorada na minha perna para
que eu a pegasse no colo.

— Calma, filha!

— Passear!

— Sim, vamos passear. Ver seu pai.

— Pai? — Ela franziu o cenho. Não era uma palavra que


costumava usar muito.
— Sim, seu pai é um homem que ama muito você. — Ou espero
que seja e não tente apenas me enlouquecer. — Pai é igual a mamãe,
mas homem.

— Pai mamãe.

— Isso! Hoje você vai ficar com o papai e a mamãe. — Peguei-a no


colo e a sentei na cadeirinha, prendendo-a com o cinto. — Nós vamos
nos divertir bastante hoje. — Mais uma vez, esperei não estar iludindo
a minha filha.

Entrei no carro e segui pelo Anel Rodoviário, passando em frente


ao Shopping BH e seguindo pela Avenida Nossa Senhora do Carmo
até o hotel na Savassi, onde o Ji Won estava hospedado. Eu fazia
aquele caminho todos os dias para ir até o ateliê, porém, daquela vez,
eu senti certa estranheza ao segui-lo. Parei diante do hotel que tinha
belas fontes jogando água para cima, fazendo os olhos da minha filha
brilharem.

Um homem bateu na minha janela, eu avisei que estava ali para


visitar um hóspede e ele indicou a vaga onde eu deveria estacionar.
Puxei a mala da Kin de cima do banco do carona e a coloquei sobre o
meu ombro, antes de tirar a minha filha, que se remexia inquieta na
cadeirinha.

— Vamos sair para ver seu pai?

— Passear...
— É, estamos passeando. Você nunca veio aqui antes, nem a sua
mãe.

Apresentei-me na recepção, onde a mulher custou a sair do


telefone e prestar atenção em mim. Assim que entreguei os meus
documentos, ela me deixou entrar e indicou o elevador.

Kin olhava tudo com um ar de curiosidade e surpresa, do vaso de


planta num canto ao espelho do elevador, onde ela ficou fazendo o
que me pareceram ser caretas para o seu próprio reflexo e
surpreendendo-se com a forma como era retribuída.

Chegamos diante da porta do quarto onde o Ji Won estava


hospedado e eu estufei o peito, respirando fundo e torcendo para que
tudo saísse da melhor forma possível. Dei duas batidas na porta e
esperei.

Levou pouco menos de um minuto para que ele abrisse. Olhei-o


enquanto ele olhava para mim e senti minhas pernas tremerem outra
vez, odiava esse efeito que o Ji Won era capaz de provocar. Ele
estava com uma calça de moletom larga, uma camiseta branca e os
pés descalços. Simples, mas incrivelmente bonito.

— Você veio.

— Eu disse que viria. — Mantive a voz no tom mais firme que


consegui, dada as circunstâncias.

— Entre. — Ele abriu mais a porta. — Por favor, tire os sapatos.


Assenti e tirei minhas sandálias, deixando ao lado dos sapatos
sociais dele. Fiz o mesmo com o sapatinho da minha filha, que me
olhou sem entender, porque eu não tinha o hábito de deixá-la andar
descalça por aí. Sempre tinha a sensação de que ela poderia se
machucar ou ficar doente.

— Chinelo? — A Kin olhou para mim. Estava acostumada a que eu


lhe entregasse o chinelo assim que tirava o seu sapato. Por sorte,
acho que havia trazido um par comigo, pois sempre deixava na bolsa
caso estivesse quente demais para tênis ou sapatinho.

Ajudei-a a calçar o chinelo limpo e ela ficou parada ao meu lado,


ainda receosa quanto ao homem que conhecia tão pouco.

— Comprei algo para você. Vem comigo ver. — Ji Won estendeu a


mão para a Kin e ela olhou para mim como se não entendesse o que
estava acontecendo. Realmente, ela não entendia o pai porque eu
ainda não havia ensinado nada de inglês a ela, considerando que não
falava nem português direito ainda.

— Vai com o seu pai, filha. — Eu a empurrei pelos ombros na


direção dele.

Minha filha cambaleou um passo para a frente e olhou para mim


com uma expressão irritada antes de acatar a minha ordem e chegar
mais perto do Ji Won.

Ele segurou a mão dela e a guiou até a cama, onde havia um


enorme embrulho de presente. Ela se empolgou com a cor tão
chamativa, como eu não a recriminei, tentou puxar, mas quase que o
embrulho pesado caiu em cima dela, mas Ji Won segurou antes que
qualquer acidente pudesse acontecer.

— Cuidado! Você pode se machucar, filha. — Tocou o alto da


cabeça dela. — Por que não abrimos juntos?

A Kin provavelmente não estava entendendo nada do que ele


falava, porém, não protestou quando ele a pegou no colo dessa vez.
Imagino que estivesse tão entretida com o brinquedo que para ela não
faria a menor diferença a quem quer que a pegasse naquele
momento. Ji Won a sentou na cama e sentou-se ao lado dela. Juntos,
começaram a rasgar o embrulho do presente.

Acomodei-me em uma poltrona em um canto próximo à porta,


colocando a pesada mala da Kin sobre a escrivaninha próxima, e
fiquei apenas observando-os. Kin estava curiosa e Ji Won parecia um
pouco perdido quanto à forma de lidar com um bebê de um ano,
porém, visivelmente se esforçava.

Assim que removeram por completo o papel de presente, num


vagaroso movimento, já que ele estava tentando fazer as coisas no
ritmo da filha. Eu me surpreendi com o que era quando o Ji Won tirou
da caixa, um cachorro eletrônico. Achei que talvez uma boneca fosse
um brinquedo mais conveniente, mas tudo bem.

Levantei e cheguei mais perto para entender o que era.

— Por que um cachorro robô?


— Para estimular os conhecimentos dela. Ele só responde os
comandos em inglês, pode ajudá-la com a língua também.

— Ela ainda é bem nova para isso, talvez algum brinquedo mais
simples...

— Na Coréia...

— Okay! — interrompi sua fala. — Vamos ligar e ver o que faz?

Ele assentiu e foi tirar o cachorro da caixa. Na tentativa de ajudá-lo,


nossas mãos acabaram se tocando e eu senti um calafrio que me
varreu inteira, seguido de uma onda de calor. Péssima hora para o
meu corpo reagir daquela forma à presença dele. Por que as coisas
tinham que ter ficado tão complicadas? Eu me lembrei da primeira vez
em que o vi e da forma como pensei que poderia desenhar os seus
lábios com um compasso. Naquele instante, ele estava tão próximo,
mas a possibilidade de voltar a beijá-lo era tão nula como a de antes
de nos conhecermos.

Ele ligou o cachorro e a Kin fez uma verdadeira festa, de bater as


mãozinhas e pular na cama. Não tínhamos um bichinho de verdade e
para ela, o robô poderia ser uma boa experiência.

Não discutimos sobre as decisões que eu havia tomado no


passado e isso tornou aquele dia mais agradável. A Kin estava feliz,
divertindo-se muito com o cachorro robótico, ainda que não
entendesse uma única palavra que o pai dizia. A alegria dela fez com
que eu me sentisse ainda melhor.
Na hora do almoço, fomos até um restaurante de comida oriental
próximo ao hotel e foi a primeira vez que a Kin teve contato com esse
tipo de culinária, já que eu dava para ela apenas comidas mais
simples e mamadeira.

Depois do almoço, fomos até a Praça da Liberdade. Enquanto a


Kin se equilibrava, tentando ir até o coreto, o Ji Won tirava fotos dela e
eu os observava de longe. Senti como se fosse um déjà-vu em que
éramos a família com a qual eu sonhei.

— Acho que precisamos ir para casa — comentei quando o sol


baixava no horizonte, o clima começava a esfriar e Kin veio na minha
direção coçando os olhinhos e bocejando. Peguei-a no colo e ela
tombou a cabeça sobre o meu ombro, não tardaria a dormir.

— Quero ficar mais tempo com ela.

— Ela está cansada, Ji Won. É só um bebê.

Ele torceu a cara para mim e percebi que o nosso momento nos
dando bem em prol da nossa filha havia acabado, no entanto, ela era
mais importante do que qualquer cara feia dele.

— Vamos voltar para o hotel. Preciso pegar meu carro e levar ela
pra casa.

— Eu posso ir com você.

— É melhor não.

— Você já me privou de tantos momentos com ela. Acho que eu


tenho esse direito.
Respirei fundo para não pronunciar nenhum palavrão perto da
minha filha, ainda que fosse em uma língua que ela não
compreendesse. Não queria dar mau exemplo, por mais que o pai
dela tivesse me talhando o sangue.

— Ela só vai chegar em casa e dormir.

— Não tem problema. Podemos ir?

Suspirei ao perceber que não importava o que eu dissesse, não iria


fazê-lo mudar de ideia. Juro que estava tentando compreendê-lo,
porém, às vezes me sentia num fio de perder a paciência.

Voltamos para o hotel e ele foi comigo no meu carro até o


apartamento em que eu morava com a Jaqueline. Pelo horário,
imaginei que ela já tivesse chegado do ateliê ou estaria chegando.
Assim que saímos do elevador, eu vi a luz da sala acesa por uma
fresta na lateral da porta e um cheiro gostoso que inundava o
corredor. Talvez ela houvesse chegado de bom humor e já preparado
o jantar.

Abri a porta e entrei empurrando o carrinho da Kin para dentro. Ji


Won entrou logo atrás de mim.

— Que cheiro gostoso, Jaque!

— Estou fazendo aquele tropeiro que você adora — respondeu a


voz da cozinha e eu quase tive um pequeno infarto. Era o pior dia e
horário para o Felipe estar ali sem ser convidado.
Ele saiu da cozinha e entrou na sala secando as mãos em um pano
de prato. Assim que colocou os olhos no Ji Won, senti que ele
dispensava qualquer apresentação. Os dois se encararam e senti
como se uma explosão pudesse acontecer a qualquer momento.

— Quem é ele? — Ji Won buscou o meu olhar com um ar confuso


e eu segurei a respiração.

— O namorado dela. — Odiei me lembrar dessa forma que o Felipe


sabia falar inglês.

Ji Won manteve seu olhar em mim, porém, a expressão em seu


rosto se transformou de apenas observar para um certo ar de
desprezo. Foi como se mais uma fina camada da ligação que
tínhamos houvesse se quebrado.

A Kin começou a chorar e os dois se aproximaram do carrinho, no


entanto, como era de se prever, ela estendeu os braços para o Felipe,
o rosto que conhecia desde o momento em que havia nascido. Ele a
pegou no colo e minha filha envolveu seu pescoço com os bracinhos
finos e aninhou a cabecinha no ombro dele.

— Você está cansada, não é, princesa? Vou levar você para dormir.
— Felipe se afastou de nós sem dar a menor importância para a
expressão de poucos amigos que tomava o rosto do Ji Won e levou a
minha filha para o quarto dela.

— Você tem um namorado?


A pergunta dele me deixou completamente desconfortável. Por
mais óbvia que fosse a resposta, eu não queria contá-la para ele.

— Sim. Não vai me dizer que você ficou sozinho por esses dois
anos? — Alfinetá-lo não era a melhor alternativa, porém, eu
simplesmente não consegui me conter.

— Eu tive uma namorada — disse naturalmente e isso me acertou


como uma facada na boca do estômago.

Foi idiotice pensar que ele passara todo esse tempo sem alguém. Ji
Won era bonito, tinha uma ótima e louvável carreira, além de ser de
boa família. Era o que as coreanas considerariam como um ótimo
partido, não haveria motivos para que ele passasse todo esse tempo
sozinho. Fazendo o quê? Esperando por mim... Seja menos idiota,
Alissa.

— A nossa princesinha dormiu. — Felipe parou na minha frente e


me deu um selinho como se o Ji Won não estivesse ali. Para ser
sincera, alguns minutos depois, eu comecei a pensar que ele havia
feito isso justamente porque o Ji Won estava vendo.

— Isso é muito inadequado — murmurou o Ji Won.

— Beijar a minha namorada é inadequado? — Felipe começou a rir.


— Inadequado é você ter vindo aqui para o Brasil.

— Felipe, por favor... As coisas na Coréia são um pouco diferentes


das daqui. Não é bem-vista demonstração de afeto em público.
— A cada coisa que me conta sobre esse país, dá menos vontade
de ir até lá.

— Não há motivos para você ir até lá. Talvez pessoas com o seu
perfil não sejam arqueadas à Coréia.

Eles se fuzilaram de um jeito que imaginei que causou em mim


uma sensação de que colocariam fogo na sala.

— Por favor. — Coloquei a mão sobre o peito de cada um deles. —


— Sejam gentis.

— Eu vou até o quarto da Kin. — Ji Won passou por mim como se


tivesse ignorado a minha fala e seguiu pelo corredor do apartamento
até a porta onde o Felipe havia entrado com a Kin.

— Então é esse o tal cara? — questionou Felipe no momento em


que ficamos sozinhos na sala. — A Jaqueline tem razão, são todos
iguais. Ainda bem que a Kin puxou a sua beleza.

— Felipe, por favor, não o provoque — pedi quase em uma súplica.

— Eu não estou fazendo nada. — Deu de ombros, fingindo-se de


desentendido.

— Independente de qualquer coisa, ele é o pai da Kin! Não


precisamos e não quero entrar em conflito com ele.

— Esse cara não deveria ter vindo até aqui. Você e a Kin estavam
muito bem sem ele.

— Mas ele veio, então, por favor, não o provoque.


— Como se ele não estivesse me provocando.

— Felipe...

— Tudo bem, meu amor, da forma como você quiser. Afinal, ele é o
pai da Kin.

— Isso, ele é. Vai terminar o jantar. — Dei alguns tapinhas no


ombro dele. — Estou com fome.

— Por que não me ajuda?

Afastei-o antes que envolvesse a minha cintura com os braços. A


expressão dele tomou um ar de raiva, contudo, não disse nada.

— Vou ver como está a Kin e o Ji Won. — Passei as mãos pela


gola da camisa polo azul que ele estava vestindo e dei o meu melhor
sorriso, tentando ser gentil, ainda que a situação fosse desconfortável.

— Não gosto desse cara aqui. — Felipe cruzou os braços e fechou


a cara, fazendo-me perceber que o assunto estava longe de
terminado.

— Ele é o pai da Kin. Se esforce para ser ao menos educado.

— Esse cara só forneceu o esperma, sou muito mais pai da Kin do


que ele. Ou se esqueceu de todas as vezes que eu estive aqui
quando ela precisou?

— Eu sei... — Massageei as têmporas e respirei fundo. — Sou


grata a tudo que fez e faz por mim e pela minha filha, mas, por favor,
não vamos discutir isso agora.
— Tá! — Ele se afastou e foi para a cozinha, entretanto, não sem
antes deixar estampado no rosto o quanto estava insatisfeito com a
situação.

Caramba! Eu queria gritar e, se talvez a minha filha não estivesse


dormindo tão perto, eu teria gritado. Estavam todos de cara feia, todo
mundo irritado. Mas será que nenhum deles poderia parar por um
minuto e pensar o quanto estava sendo difícil para mim e para a Kin?
A minha filhinha estava sendo obrigada a conviver com um homem
que nunca tinha visto antes e eu precisava lidar com o olhar dele me
julgando a cada momento, como se a culpa de toda aquela situação
fosse minha. Era em partes, confesso, porém, não sei se eu tivesse
ficado mais tempo na Coréia e me despedisse dele direito teria
mudado as coisas. Tentei ser a melhor mãe para a Kin que pude,
dentro das minhas limitações, e ver que ele não reconhecia isso me
deixava muito irritada.

Ouvi a porta da sala sendo aberta e quando me virei, dei de cara


com a minha melhor amiga entrando ainda um pouco suja de tinta,
com os cabelos bagunçados, parcialmente presos em um coque, e
com várias sacolas nos braços.

Respirei fundo, tentando parar de tremer e abri um sorriso.

— Amiga, está tudo bem? Você parece meio pálida. — Chegou


mais perto, quase me farejando como um cachorro fazia.

— O Felipe está na cozinha e o Ji Won no quarto com a Kin.


Jaqueline fez uma careta e me entregou as sacolas do
supermercado.

— Acho que eu vou dormir no Ricardo hoje. Amanhã a gente se vê


na prova final do vestido.

— Não me abandona. — Segurei as mãos dela enquanto meus


olhos se enchiam de lágrimas.

— Amiga, não tem nada que eu possa fazer. Acho que a minha
presença aqui só pode deixar as coisas ainda mais estranhas. Você
vai dar conta e a gente se fala amanhã.

— Jaque!

Ela não deu a mínima para o meu protesto. Abriu a porta e saiu por
onde havia entrado, sem nem se dar ao trabalho de pegar alguma
coisa no quarto. Como se casaria no sábado, a maioria dos seus
pertences já estavam na casa do noivo. Sei lá, talvez só estivesse
dormindo ali ainda para que a separação dela, minha e da Kin fosse
menos brusca. Dividia apartamento com a Jaqueline há anos e
realmente iria sentir falta dela.

Peguei as sacolas de compras, que estavam pesando os meus


dedos, e fui até a cozinha. Lá, Felipe estava terminando de picar a
couve para acompanhar o feijão tropeiro que eu gostava tanto, porém,
tinha a sensação de que daquela vez ele teria um gosto amargo.

— Quem era? — Felipe secou a mão no pano de prato e chegou


mais perto de mim.
— A Jaqueline.

— Uai, cadê ela? — Franziu o cenho enquanto olhava em volta.

— Deixou as compras e foi dormir no Ricardo.

— Ela vai se casar sábado, por que ainda faz compras para cá?

— Acho que é força do hábito.

Abri a geladeira e coloquei as carnes no freezer. Joguei fora um


pote de maionese que estava vencido e coloquei os iogurtes num
canto, antes de tirar as verduras das sacolas. Jaqueline havia
comprado a uva que a Kin adorava e pensei no quanto seria difícil
para mim e para a minha filha não termos mais a minha melhor amiga
com a gente.

Puxei para trás uma mecha do meu cabelo castanho-acobreado,


que estava sobre os meus olhos, e me levantei, guardando as sacolas
vazias na parte debaixo do cesto de frutas, pois elas sempre eram
úteis depois. Enquanto isso, afastei os pensamentos sobre o
casamento da Jaqueline, tinha problemas bem maiores para lidar
naquele momento.

— Prova um pouco. — Felipe veio com uma colher até a minha


boca e eu não tive tempo de dizer não.

Abri a boca e aceitei a amostra de comida. Estava delicioso, Felipe


sempre fora um ótimo cozinheiro, melhor do que eu, porém, o meu
sorriso amarelo, forçado, não condizia com o sabor na minha boca.

— Está uma delícia!


— Ei, o que foi? — Abandonou a colher suja na pia e me puxou
pela cintura.

Eu queria empurrá-lo, mas Felipe era tão gentil comigo que eu não
consegui.

— Está tudo bem.

— Não é o que parece, amor. Já está sentindo a falta da


Jaqueline?

Fiz que sim e ele segurou meu rosto, acariciando minha bochecha
com o polegar. Encarei os olhos castanhos dele, tão amistosos e
gentis, mas, mesmo assim, eu não consegui sorrir.

— Talvez seja o momento de me mudar para cá. Sempre estou por


perto, mas morando aqui...

— Felipe, não!

Ele arregalou os olhos, surpreso com a minha resposta enfática


que interrompeu sua fala.

— Desculpa, não é o momento.

— O que eu fiz de errado? — Apertou o braço contra a minha


cintura, pressionando o meu corpo ainda mais contra o dele.

Mordi o lábio inferior sem saber o que dizer. Talvez nada, talvez
tudo... Eu estava perdida, como alguém que era sugado por um
ciclone e girara, girava... Ver o Felipe tentar, se esforça e não ficar
contente com isso me deixava ainda pior.
— Nada. Só não quero morar com você.

— Não é o momento. — Ele sorriu. — Entendi, daqui a alguns


meses, então.

Estava torcendo desesperadamente para que esse momento não


chegasse e isso fez com que eu me sentisse pior.

— Vem aqui. — Ele me puxou pela nuca e me beijou.

— Lis...

Afastei o Felipe e vi o Ji Won parado na porta da cozinha. A


expressão dele não poderia ser pior. Ver outro cara me beijando com
toda a certeza não o agradou, mas ele permaneceu parado, de braços
cruzados e com seus olhos escuros como um abismo presos aos
meus de uma forma que me julgava e me oprimia. Algo dentro de mim
estava espremendo o meu peito e me deixou completamente sem
fôlego e sem reação.

— Acho que está na hora de eu ir embora.

— Para a Coréia?

Quis socar o Felipe, mas me contive.

— Não, vou para o hotel. A Kin está dormindo, vejo vocês duas
amanhã.

— Quer que eu chame um táxi para você?

— Por favor, eu seria grato.


Voltei para sala para pegar meu celular e o Ji Won me seguiu.
Sentia um clima terrível pesando na sala, esmagando os meus
pulmões. Eu simplesmente não sabia como corrigir aquilo e fazer com
que a minha vida deixasse de parecer um pesadelo terrível.

Chamei um táxi por um aplicativo e ficamos esperando. Toda vez


que ele olhava para mim, eu me perguntava no que ele estaria
pensando. Dois anos haviam se passado desde quando nos
conhecemos, muita coisa havia mudado, mas não era possível que eu
nunca voltaria a sentir apenas aquela sensação gostosa perto dele ao
invés de toda culpa do mundo. A minha esperança de voltarmos a nos
pegar tinha ido para Marte, no entanto, precisávamos nos dar bem por
causa da nossa filha e ele não estava colaborando nem um pouco.

O táxi chegou e o Ji Won foi embora. Ao invés de ficar aliviada, eu


continuei preocupada. Aquele clima desagradável era a pior coisa do
mundo.

Eu me servi um pouco do feijão tropeiro, porém, levei uma


eternidade para comer algumas colheradas. Sentada na mesa da
sala, com o olhar perdido entre a estante de livros atrás do Felipe e
alguns quadros de natureza morta que havia pintado, dispostos nas
paredes brancas, minha mente vagava procurando alguma solução
para a situação, mas eu não tinha uma máquina do tempo para fazer
as coisas de uma forma diferente. Querendo ou não, a Kin era tudo o
que tinha de mais importante na minha vida, e por pior que tivesse
sido o meu reencontro com o pai dela, para tê-la, eu não me
importaria em passar por tudo de novo.
— Lis, você não disse uma única palavra e não consegue comer. —
Felipe apontou com o garfo para o meu prato praticamente cheio. —
Eu salguei demais?

— Não é isso! Você nunca errou na cozinha antes.

— Mas pela sua cara...

— Eu só estou tentando lidar com as coisas.

— Sabe que tem a mim para ajudá-la.

Fiz que sim.

Felipe se levantou da mesa, empurrando o próprio prato para um


canto e me estendeu as mãos.

— Vem, vamos tomar um banho? Acho que tudo o que você


precisa nesse momento é relaxar um pouco. Vou fazer uma
massagem em você...

— Não. Quero ficar sozinha agora.

— Não acho que seja o que você precise. Vai, me deixa te fazer se
sentir melhor? — Ele me chamou com as mãos de um jeito que eu
sabia que não deveria se fazer na Coréia e isso pesou meu peito
ainda mais.

— Eu acho que foi um erro.

— Trazer o coreano até a sua casa? Concordo plenamente.

— A gente ter voltado...


— Não! Não começa! Só está dizendo isso porque esse otário
apareceu. Quem liga se ele é pai da Kin. Não fez a menor diferença
até hoje e não precisa fazer. Eu posso ser tudo o que ela precisar que
eu seja e tudo que você precisar que eu seja. Lis, meu amor, não
deixa que ele bagunce a sua cabeça.

— Felipe, não é isso.

— Amamos tanto um ao outro. Você sabe que sim.

— Eu já te amei muito um dia... — Ele cobriu a minha boca com os


lábios antes que eu terminasse a frase.

— Sei que está abalada com tudo que está acontecendo, mas
errado vai ser se nos separarmos de novo. Vai acabar percebendo
isso.

— Eu só quero ficar sozinha agora.

— Tudo bem, mas para de pensar em coisas como essas e apenas


descanse.

— Tá bom.

Ele me deu um beijo na testa antes de sair pela porta da sala e a


sensação de peso em minha cabeça e no meu coração não diminuiu.
Ji Won

Assim que o táxi me deixou diante do hotel, passei apenas na


recepção para pegar a chave do quarto e segui para ele. Ainda tinha
na minha mente, tomando os meus pensamentos como um pesadelo,
a imagem da Alissa sendo beijada por outro homem. Provavelmente,
se não tivéssemos uma filha, aquela cena fosse o bastante para me
fazer pegar um avião de volta ao meu país natal.

O dia que passara com a minha filha, vê-la sorrir, divertir-se com o
brinquedo robô que eu lhe dera, fora um dos melhores momentos da
minha vida. Alguns amigos, aqueles que eram modernos o bastante
para se aproximarem da tarefa de ser pai, diziam ser o momento mais
importante e transformador de um homem e pude perceber que
estavam certos.

Vir para o Brasil em busca de uma forma de amor, mas encontrar


outra que se revelara ainda mais gratificante. Eu poderia nunca
recuperar a Alissa, mas a minha filha era algo que não deixaria que
tirassem de mim outra vez. Não importava o que eu tivesse que fazer
por isso.

Desabotoei a minha camisa e estava caminhando para o banheiro


quando o telefone ao lado da cama e diante do abajur começou a
tocar.

Peguei e atendi sem pensar muito.


— Senhor Kim.

— Sim, é ele.

— Há um homem aqui na recepção querendo falar com o senhor.


Diz que tem um assunto importante e que é o namorado da Lis. O que
eu digo a ele?

— Que eu vou descer.

— Certo! Obrigado, senhor.

Abotoei a camisa outra vez e ajeitei os meus sapatos antes de


descer. Não imaginava o que aquele homem poderia querer comigo,
entretanto, quis ouvi-lo. Ainda que fosse apenas para observá-lo e
tentar compreender o motivo de Alissa o ter escolhido.

No momento em que a porta da recepção se abriu, eu o vi sentado


em um dos sofás brancos. Ele estava com as mãos sobre os joelhos e
ergueu a cabeça, encarando-me assim que me avistou. Fui para mais
perto com movimentos calmos, estudando cada reação dele aos meus
passos, até parar diante do homem e o encarar de volta.

— Posso saber o que faz aqui? A Alissa o mandou?

— Ela não sabe que estou aqui. — Ele se levantou me encarando


ao estufar o peito. Se esperava me assustar com aquela postura, foi
um tolo.

— Então, por qual motivo está aqui?


— Não sei por que veio para o Brasil. Mas já está na hora de você
voltar.

— Imagino que seja um homem minimamente inteligente, então


sabe o motivo pelo qual eu vim para cá. Se não soubesse, não estaria
aqui agora.

— Ela é minha! — Cerrou os dentes.

— Então por que está preocupado?

— Só veio aqui para bagunçar a cabeça dela e deixá-la irritada.


Seu lugar não é aqui. Volte para a Coréia, que é o melhor a fazer para
todo mundo.

— Não vou a lugar algum sem a minha filha.

— Você pode até ter feito sexo com a Lis e engravidado ela, mas
eu fui muito mais pai para aquela menininha do que você será. Era eu
quem estava ao lado dela todas as vezes em que ficou doente e a Lis
a levou para o hospital. Eu estava lá nos primeiros passos dela. Para
a Kin, eu não sou um estranho, mas você é.

— Não é como se eu tivesse escolhido não estar lá e você sabe


disso. Kin é minha filha. Ela é fisicamente muito mais coreana do que
brasileira. Se eu não estava com ela nas primeiras palavras, nos
primeiros passos, é porque fui privado disso. Mas agora que sei da
existência dela, não perderei mais nenhum dos momentos
importantes, nem que tenha que levá-la para a Coréia comigo.

— A Lis nunca vai deixar isso acontecer. Nem eu! A Kin é nossa.
— Não. A Kin é minha e da Lis, não importam as circunstâncias.
Fomos nós quem a concebemos. Se me dá licença, vou retornar ao
meu quarto. Não há nenhuma justificativa para ficar conversando com
um homem alterado e que não possui nenhum argumento lógico.

— Seu filho da puta!

Deixei-o xingando e fui para o elevador.

Ele poderia estar com a mulher que eu amava, mas não parecia um
candidato melhor do que eu e isso me fez sorrir.
Vinte

Lis

Estacionei em frente ao prédio do Ricardo, onde minha melhor


amiga moraria em breve, e abri a porta para que ela entrasse.

— Oi, Kin! — Ela curvou o corpo para os bancos de trás e sorriu


para a minha filha, que estava na cadeirinha.

— Dinda!

— Como foi a noite de ontem? — Jaqueline ajeitou o corpo e


colocou o cinto de segurança antes que eu desse partida no carro.

— Uma tragédia! — Bufei, segurando firme o volante e contendo a


minha vontade de gritar.

— Eles brigaram? Quebraram muita coisa? Deram tanto soco um


no outro que estão os dois no hospital agora? Ah, eu não acredito que
perdi isso. Deveria ter sido engraçado.

— Não! Eles não brigaram.

— Nem um soquinho?

— Jaqueline, eles não são animais!

— Amiga, eles estão brigando por você. Eu ia estar me sentindo


um máximo.
— O Ji Won só está brigando pela Kin.

— Você já foi menos idiota, Alissa. Minha Nossa Senhora das


tapadas! O homem saiu da Coréia para cá e não sabia que tinha uma
filha, por qual motivo você acha que ele veio e parou na porta do
nosso ateliê procurando você? Esse homem te quer.

— Não sei se continua querendo depois de descobrir a Kin. Parece


que me odeia porque não contei da filha para ele.

— Era de esperar que ele ficasse com raiva, não é? Não preciso
repetir que eu disse que ele precisava saber, mas estou repetindo. Ele
precisava! Talvez você tivesse se casado bem antes de mim se
tivesse contado para ele lá atrás.

— Jaque, não exagera! — Fuzilei-a com o olhar assim que parei o


carro diante da loja Sonho de Noiva onde ela havia alugado o vestido.
Com tantas lojas perto de onde morávamos, não sabia por qual
motivo ela havia escolhido uma no centro da cidade, onde era um
inferno para estacionar. — Desce logo e leva a Kin com você. Vou
procurar uma vaga para estacionar.

— Acho que tem um rotativo na rua de cima, lembra? Onde você


deixou da última vez — comentou enquanto tirava a Kin da cadeirinha.

— Eu vou lá. — Saí com o carro assim que ela e a Kin seguiram
para o interior da loja.

Levou quase meia hora para que eu achasse uma vaga para
estacionar e um vigia com o canhoto do rotativo, mas quando entrei
na grande loja, com dois andares e uma frente de vidro expondo os
vestidos de noiva, eu encontrei a minha melhor amiga e a minha filha
sentadas em um banco da recepção.

— Espero que você não se case outra vez.

— Obrigada por me desejar um casamento feliz e duradouro.

— Entenda como quiser. — Dei de ombros ao guardar a chave do


carro dentro do bolsa.

— Xixi! — A Kin puxou minha calça jeans para que eu prestasse


atenção nela. — Xixi, mamãe!

— Eu vou levar você ao banheiro, filha. — Peguei-a no colo. —


Para onde é o banheiro? — perguntei à recepcionista que apenas
apontou, exibindo a unha vermelha.

— Vou colocar o vestido enquanto você leva a Kin ao banheiro.

Assenti e fui na direção indicada. Não levou muitos passos para


que eu visse as portas indicadas com as placas de banheiro feminino
e masculino. Empurrei com o ombro e entrei com a minha filha.
Coloquei papéis no vaso para que ela pudesse sentar e ajudei a
abaixar a calça. Fazia pouco tempo, dois ou três meses que tinha
tirado a fralda dela durante o dia, mas ela era muito esperta e havia
entendido bem como fazer.

Quando acabou, eu a levei até a pia, lavei suas mãozinhas e fomos


até a sala onde a Jaqueline deveria estar. No exato momento em que
cruzamos a porta, minha melhor amiga saiu do provador ajeitando o
vestido.

— Vocês não acham que está apertado? — perguntou a mim e a


atendente. — Acho que estou parecendo um botijão de gás com
aqueles forros de renda que a minha avó fazia achando que estava
bonito, mas todo mundo sabia o quanto era brega e nunca contavam
para ela.

— Amiga, para com isso! Você está linda.

Olhei para o vestido dela, ele tinha mangas compridas feitas de


renda, mas os ombros ficavam nus. Sobre o decote em forma de
coração, havia a mesma renda das mangas, como se todo o tecido
estivesse ligado. A parte do busto à cintura estava ricamente bordada
com fios prateados, pedras brilhantes e pérolas. A saia era rodada e
volumosa, com o mesmo bordado do busto na barra.

— Muito linda, Jaque! Diz para a Dinda que ela está linda.

— Linda, Dinda! — Kin tombou a cabecinha e a Jaqueline começou


a rir.

— Se você está dizendo, princesinha, eu acredito.

— Vai ser incrível o seu casamento, Jaque!

— Vamos aproveitar e experimentar de novo o vestido da daminha?


— A atendente estendeu a mão para mim e para a Kin.

Eu assenti e ela foi buscar o vestido.


— Eu estava pensando uma coisa — Jaqueline começou a dizer. —
Por que não convida o Ji Won para o meu casamento? A Kin vai ser
daminha, é um momento importante. Acho que ele tem que
presenciar.

— Mas o Felipe vai...

— Eu sei.

— Não quero transformar o seu casamento em uma baixaria.

— Estou contando com isso. Como acha que os meus convidados


vão se divertir?

Torci os lábios e ela caiu na gargalhada.

— Brincadeiras à parte, vai fazer bem para ele ir.

— Se você está dizendo. — Estava com o pé super atrás com


aquela ideia. Entretanto, a verdade era que tudo me deixava com
receio. Jaqueline tinha razão. Seria um momento diferente e
importante para a Kin, seria bom ter o pai dela nessas memórias. —
Eu vou falar com ele assim que o vir mais tarde.

A atendente voltou com o vestido da Kin e fomos colocar nela.


Ficamos na loja por mais alguns minutos para os últimos ajustes, e
então fomos embora. Precisávamos abrir o ateliê e preparar as coisas
para receber a visita de um curador à tarde.
— Ainda tem algum daqueles quadros sobre a Coréia? — O
curador andava de um lado para o outro olhando para tudo, porém,
sem demonstrar interesse em coisa alguma. — Tenho um comprador
interessado.

— Não tenho mais nenhum, Lúcio. Todos foram vendidos.

— Tem certeza? — Ele coçou o queixo ao parar na minha frente.

— Sim, mas tenho umas pinturas novas inspiradas na Pampulha


que ficaram bem interessantes.

— Não. O comprador pediu exatamente uma sua inspirada na


Coréia. Consegue fazer e me entregar até sexta-feira?

— Não, acho quase impossível. Principalmente se for a óleo e


grande.

— Então se vire com o impossível, querida. Porque nós dois


podemos ganhar um bom dinheiro com ela se atendermos a essa
demanda. — Lúcio estava gesticulando muito, mas suas mãos
pararam quando ele viu o Ji Won entrar no ateliê. — Oh, nossa! Quem
é esse?

— A inspiração da Lis — debochou Jaqueline ao apontar a cabeça


atrás do quadro que estava pintando.
— O pai da sua filha, posso presumir?

Apenas balancei a cabeça em afirmativo. Não queria que o Ji Won


se tornasse foco dos questionamentos do Lúcio, ele era um bom
curador, sempre vendia os meus quadros pelos melhores preços nas
galerias, mas costumava ser bem invasivo quando o assunto era vida
pessoal.

— Oi, Lis! Tudo bem? Onde está a Kin? — Ji Won parou na minha
frente após cumprimentar o homem com um breve curvar de cabeça.

— No cercadinho ali. — Apontei.

— Eu vou lá ficar com ela.

— Tudo bem, pode ir.

— Oi! — Lúcio parou na frente dele. — Não fala português?

— Não, apenas inglês, coreano e mandarim. — Ji Won ergueu a


sobrancelha, estranhando a atitude invasiva do homem.

— É um enorme prazer conhecê-lo. A Lis foi muito indelicada não


apresentando a “musa” dela. Conhecia a filha de vocês, mas ela...

— Lúcio, o Ji Won não é um objeto de pesquisa e está aqui para


ver a Kin. Vamos, por favor, deixá-lo em paz. — Peguei o curador
pelos ombros e o puxei para um canto, liberando a passagem para o
Ji Won.

— Obrigado. — Ji Won abaixou a cabeça e seguiu até o lugar onde


eu havia indicado que estaria a nossa filha.
— Sua estraga-prazeres. — Lúcio fez bico.

— Você veio aqui para ver meus quadros ou para dar em cima do
pai da minha filha?

— Agora entendo por que nunca o apresentou antes. Ciumenta! —


Gargalhou todo cheio de gracinhas.

— Eu nunca o apresentei antes porque é a primeira vez que ele


vem para o Brasil. De qualquer forma, não faz muita diferença.

— Faz sim! Lembro-me de ter visto um quadro com o rosto dele.


Onde está?

— Esse não está à venda. Não adianta fazer careta ou me oferecer


um caminhão de dinheiro. Não está!

— Então vá trabalhar e me entregue um quadro até sexta-feira. —


Cerrou os dentes.

— Não prometo que vá conseguir.

— Transe mais com o coreano e pinte mais sobre a Coréia.

Eu teria rido da fala dele se não soasse tão estúpida diante das
circunstâncias. Sexo era a última prioridade naqueles dias.

— Então vá embora e me deixe trabalhar.

— Podia me passar o telefone dele antes, né? Eu tenho muitas


coisas para perguntar.

— Não está dando em cima dele assim na minha cara ou está?


— Vai que cola. — Riu. — Venho aqui na sexta-feira para pegar o
seu quadro sobre a Coréia e o seu sobre o Deserto, Jaqueline. Até
mais.

Ele saiu e eu me senti um pouco aliviada. Lúcio era bom para


negócios, mas sempre me sufocava além do limite.

— Ele sabe que não vamos entregar os quadros na sexta-feira, né?


Ainda mais com o meu casamento no sábado. Dois dias é
humanamente impossível, ainda mais com tinta a óleo.

— Deixa o coitado se iludir com um prazo que só é viável dentro da


cabeça dele.

Jaqueline colocou o pincel de lado e começou a rir.

Larguei o meu material de pintura e fui até o fundo da sala onde


estava o cercadinho da Kin. Ji Won estava agachado ao lado dela e
falava coisas em coreano que nem mesmo eu compreendia, quanto
mais uma criança de um ano que nunca tivera contato com a língua.
Entretanto, para a minha surpresa, a Kin tinha sua total atenção presa
no pai, como se ao menos estivesse se esforçando para entender.

— Acho que ela deve estar com fome. Vou preparar uma
mamadeira para ela.

Ji Won apenas assentiu com um movimento de cabeça, porém, não


pareceu dar muita atenção para o que eu tinha acabado de falar.

Assim que virei meu corpo para ir até a cozinha, eu pisei em uma
pequena poça e perdi o equilíbrio. Aquele maldito chão virava quiabo
quando molhado. Deveria ter alguma goteira no telhado ou a água
simplesmente infiltrara com a chuva que caíra de madrugada, o que
era bem comum em construções mais velhas como aquela. Estava
divagando, pronta para o tombo quando o Ji Won enlaçou a minha
cintura e me puxou para ele. Foi como se o mundo ao meu redor
tivesse parado. Senti o coração dele batendo tão perto do meu, que
vislumbrei a possibilidade de segurá-lo entre os meus dedos. Fazia
dois anos que eu não tinha mais contato com o toque dele, mas foi
como se a minha pele despertasse memórias que me causaram
calafrios e me fizeram suspirar. Minha respiração parou, tornou-se
ofegante e depois parou de novo enquanto nossos olhos se
encaravam em uma eternidade, que parecia boa e ao mesmo tempo
torturante. Imaginei que ele fosse me beijar e aguardei ansiosa por
isso, meu corpo praticamente suplicou, por mais que, na teoria, fosse
muito errado porque eu havia aceitado voltar a namorar o Felipe.

Felizmente, ou não, Ji Won me equilibrou no chão e afastou as


mãos.

— Você está bem?

Poderia estar melhor, pensei, incapaz de verbalizar uma coisa


dessas.

— Estou, obrigada! Maldita goteira.

— Precisa secar o chão para que a Kin não se machuque.

Claro! Como se eu quisesse que a minha filha se machucasse.


Porque não poderíamos ficar apenas nos momentos gostosos, sem
que ele dissesse qualquer coisa que soasse como um
questionamento às minhas decisões e atitudes como mãe?

— Vou fazer a mamadeira primeiro. Fique de olho para que ela não
se machuque.

Ele assentiu e eu fui para a cozinha saltando as poças pelo


caminho. Depois voltaria passando um pano de chão, porque
realmente estava perigoso.

Coloquei água para esquentar e escorei-me na parede, pensativa.


Às vezes parecia que ele me dava corda só para cortá-la quando eu
parecesse interessada, ou era apenas coisa da minha cabeça.

Voltei com a mamadeira e entreguei-a para a Kin antes de pegar o


pano e me certificar de que todas as poças foram secas.

— Ji Won. — Aproximei-me dele novamente. — Minha amiga irá se


casar no sábado e aqui no Brasil é comum as crianças entrarem na
frente da noiva como damas de honra, e a Kin será uma das damas
dela. Queria que você fosse para estar lá com a nossa filha nesse
momento.

— Quer que eu vá? — A expressão dele foi de surpreso a feliz em


poucos instantes.

— Sim, eu quero. Para ficar com a nossa filha. — Aquela tinha sido
uma ideia da Jaqueline, mas ele não precisava saber disso.

— O que preciso vestir?

— Apenas um terno.
— Okay! Obrigado pelo convite. — Foi a primeira vez que ele me
dirigiu um sorriso amoroso depois que descobrira a filha e isso fez
meu coração bater um pouco menos apertado.

— Por nada, vai ser bom para vocês dois.

— Lis, eu liguei para o consulado para dar entrada no registro


coreano de nascimento da Kin e me pediram alguns documentos que
preciso que você me dê.

— Consulado? Registro? — Não sei se deveria, mas aquela frase


dele me deixou preocupada.

— Sim, quero registrar a Kin como cidadã coreana. É direito dela.

— Eu sei... — Eu me senti ameaçada, mas não disse isso para ele.


Ji Won estava certo, independente do que eu sentisse, era direito da
Kin. — Mas primeiro, imagino que tenhamos que mexer no registro
dela aqui, já que não tem o seu nome na certidão de nascimento dela.

— Tem o do Felipe? — Foi fácil perceber a fúria dele em meio a


pergunta descabida.

— Claro que não! Tem apenas o meu. Eu a registrei sem nome de


pai, me aconselharam a abrir um processo de investigação de
paternidade onde contatariam você, mas eu não quis.

— Eu queria que tivesse feito.

— Agora é tarde.
— Imagino que não para o meu reconhecimento legal de
paternidade.

— Vou ligar para o cartório e perguntar como funciona,


principalmente pelo fato de você ser estrangeiro, mas se for simples,
podemos fazer isso amanhã.

— Obrigado.

Abri um sorriso amarelo.

Ji Won passou a tarde e o início da noite no ateliê conosco. Com


ele cuidando da Kin, eu pude me concentrar em pintar e fui produtiva
como não me lembrava de ser há muito tempo. Talvez conseguisse
entregar o quadro em tempo recorde para o curador.

Estava distraída quando senti uma respiração próxima à minha


orelha e ouvi a sua voz.

— Essa é a Aldeia Hanok de Bukchon?

Fiz que sim, recuperando-me do efeito que a proximidade dele


causou em meio a um arrepio. Talvez fosse pelo fato de termos uma
filha juntos ou qualquer explicação mais lógica, mas o Ji Won me
provocava sensações que o Felipe nunca provocou, nem antes de
terminarmos da primeira vez.

— Por que está a pintando?

— Porque é linda! Um dos lugares que mais gostei de ir quando


visitei Seul. Além disso, eu fiz uma exposição de pinturas sobre a
Coréia e todos os quadros foram vendidos, mas hoje, o curador
apareceu aqui com o pedido de mais um.

— Então escolheu a aldeia?

Fiz que sim.

— Boa escolha. Uma pena todos os quadros terem sido vendidos,


queria um para mim.

— Talvez eu tenha uma coisa para você. — Sorri para ele ao


colocar o pincel no suporte do cavalete e segurei-o pelo pulso,
puxando-o comigo. — Vou te mostrar uma coisa.

Eu o arrastei até uma sala nos fundos do ateliê. Lá, guardávamos


os quadros paras as próximas exposições e outros que nunca
chegaram a ser vendidos, alguns por falta de interesse do público e
outros apenas porque queríamos para nós, como era o caso do que
eu puxei de um canto, guardado em um tubo plástico para preservar.
Eu o desenrolei e mostrei para o Ji Won. Era ele sorrindo em meio às
cerejeiras enquanto as pétalas voavam ao seu redor, exatamente
como um flash de memória que nunca saía da minha mente.

— Esse é um presente.

— Não precisa me dar.

— Acho que sempre foi seu.

Ele sorriu e se aproximou de mim. Meu coração parou de bater


quando ele segurou minha mão e eu senti uma onda de calor e frio ir
da ponta da minha cabeça até os dedos dos meus pés. Entrelacei
meus dedos nos dele. Fechei os olhos e imaginei que ele finalmente
fosse me beijar.

— Lis, onde você está? — Ouvi a voz do Felipe e me afastei do Ji


Won como se tivesse sido atingida por um spray de pimenta.

— Pode guardar aqui. — Entreguei a tampa e o tubo para o Ji Won


antes de sair toda atrapalhada da sala. — Oi, Felipe!

Deparei-me com o meu “namorado” no meio do caminho e quase


trombei com ele de frente. Dei alguns passos para trás e abri um
sorriso amarelo.

— O que você está fazendo aqui?

— Você não estava em casa, imaginei que só pudesse estar aqui.

— Veio dirigindo até aqui no meio do horário do rush?

— Já são quase oito da noite.

— Sério? — Arregalei os olhos, surpresa. — Imaginei que fosse


mais cedo. Devo ter perdido a noção do tempo por causa de uma
pintura que estava fazendo.

— E o que estava fazendo lá dentro? — Apontou para a porta de


onde eu tinha acabado de sair.

— Fui procurar um quadro mais antigo. — Peguei-o pelo pulso e


puxei comigo. — Vamos até a cozinha, preciso dar algo para a Kin
comer.
Agradeci mentalmente pelo Ji Won não ter saído junto comigo. Iria
causar uma dor de cabeça e uma briga que eu não queria no
momento. Era bem provável que o Felipe iria criar um barraco, por
mais que não tivesse acontecido nada entre mim e o Ji Won lá dentro.

Peguei uma vasilha com uva e fui até o cercadinho da minha filha,
mas ela estava dormindo.

— Vamos para casa? — chamou Felipe, virando-se na direção da


porta, mas com a minha visão periférica eu vi o Ji Won passar e eu
girei o Felipe pelos ombros para que ficasse olhando para mim
enquanto o coreano ia embora, como se fôssemos adolescentes
escapando dos nossos pais. Eu não tinha nem mais idade nem
coração para aquilo.

— Por que me puxou assim? — Felipe colocou as mãos na minha


cintura aproximando os lábios para me beijar, mas eu me esquivei.

— Não dá para você ir para lá hoje.

— Por que não?

— Ela precisa me ajudar com umas coisas do casamento e não vai


ter tempo para namorar hoje. — Jaqueline me puxou dando-me a
desculpa perfeita para eu me esquivar do grude que era o Felipe.

— Tem certeza? — Ele olhou para mim com um ar pidão e


esperançoso.

— Casamento dá muito trabalho. Vou pensar mil vezes antes de


decidir fazer um meu.
— É uma pena, então. — Ele me deu um selinho antes que eu
pudesse evitar. — Nos vemos amanhã?

— Sim, amanhã!

— Boa noite, meu amor! Boa noite, Jaqueline.

— Boa noite, Felipe. — Ela se despediu dele com um breve aceno


e eu fiquei com cara de paisagem.

Assim que ele saiu do ateliê, a Jaqueline me segurou pelos ombros


e me chacoalhou.

— O que foi isso?! O que você e o Ji Won estavam fazendo no


quartinho lá atrás para ele sair de fininho desse jeito? Deus do céu!
Achei que o Felipe fosse pegar vocês dois no maior amasso.

— Não aconteceu nada. Acredite, nada mesmo. — A minha cara de


desapontamento foi o suficiente para convencer a Jaqueline de que
eu estava falando a verdade.

— Que merda!

— Às vezes, eu acho que ele quer, e em outras, acho que ele me


odeia.

— Amiga, você precisa terminar com esse empata-foda do Felipe e


se acertar com o seu coreano. Odeio essa sua cara de foi e não foi.

— Eu já tentei terminar com o Felipe. Ele diz...

— Não importa o que ele diz! Está estampado na sua cara que é o
Ji Won que você quer, não só por ele ser o pai da Kin.
— Você tem razão.

— Sempre tenho razão. — Ela me mandou um beijinho. — Agora,


vamos para casa porque já está tarde.

Assenti e fui pegar a minha filha adormecida no cercadinho e as


coisas dela.

— Alex, oi, irmã! Sei que não liguei para você depois de domingo,
mas é que aconteceu uma coisa que me deixou meio fora de órbita.

— Não vai me dizer que você está grávida do Felipe.

— Quê!? — Andei de um lado para o outro do meu quarto. Se ela


estivesse ao meu lado, eu teria batido a sua cabeça na parede por
uma afirmação tão descabida quanto aquela. — Claro que não!

— Imaginei que fosse, já que vocês voltaram.

— Não tem nada a ver com isso. É o pai da Kin, ele está aqui e
estou avisando porque você deve conhecê-lo no casamento da
Jaqueline no sábado. Ele chegou na segunda-feira.

— Caralho! Como você não me contou isso antes?! O coreano dos


seus sonhos está aqui e você achou que eu não merecesse saber,
logo a sua irmã mais amada do mundo?

— É a única que eu tenho, Alex.

— A nossa mãe vai ter um piripaque.

— Estou contando com você para preparar ela.

— Vou fazer o meu melhor, mas estou muito ansiosa para conhecer
ele.

— Não vamos fazer disso um circo, por favor, Alex.

— Mais uma vez, prometo fazer o meu melhor. Vejo você e ele no
sábado, então.

— Obrigada por conversar com a mamãe por mim, boa noite.

— Boa noite, Lis.

Soltei meu corpo na cama, exausta, torcendo para que as coisas no


dia seguinte fossem um pouco mais calmas do que estavam sendo.

Ji Won

Eu deveria ter deixado que aquele homem me visse, deixado que


ele pensasse que a Alissa e eu havíamos feito coisas que não
havíamos feito de fato. Porém, não o fiz, saí de forma discreta para
que ele não me visse. A verdade era que eu não queria causar
problemas para ela.

Saí de lá caminhando pela rua até o hotel onde eu estava


hospedado, sentindo-me arrependido de apenas uma coisa: deveria
tê-la beijado. Ela pareceu querer, eu queria. Precisava ter tomado o
impulso que não tomei e tinha a certeza de que isso correria a minha
mente durante a noite.

Alissa dava sinais o tempo todo de que me queria, mas eu não


conseguia entender porque ainda estava com aquele homem.

Cheguei ao meu quarto de hotel, abri as janelas para que um


pouco do vento entrasse e renovasse o ar, afastando as cortinas
brancas. Depois, abri a pintura que ela havia me dado, desenrolando-
o sobre a cama. Ela era muito talentosa, perfeito como uma foto, mas
com muito mais alma, era como se Alissa houvesse capturado aquele
momento nosso na tela através de seus belos olhos verdes. Iria
mandar emoldurá-lo e colocar em uma parede do meu quarto.
Vinte e um
Lis

Cheguei bem cedo ao hotel do Ji Won naquela manhã. Esperava


não encontrar uma fila muito grande no cartório ou que, no melhor dos
casos, fôssemos os primeiros a sermos atendidos. Eu odiava aquele
tipo de burocracia.

— Bom dia! — Ji Won abriu a porta do carona e deu um sorriso ao


me ver e eu involuntariamente sorri de volta. — Podemos ir?

— Está com o seu passaporte e o equivalente coreano à certidão


de nascimento?

— Sim, o consulado o enviou para mim, chegou bem cedo.

— Então podemos ir.

Ele sentou e colocou o cinto. Eu dirigi até o cartório próximo à


maternidade onde a Kin havia nascido. Deixei o carro em um
estacionamento e seguimos os três até o cartório. Não estava tão
vazio quanto eu gostaria, mas pegamos uma das primeiras senhas.
Levou cerca de meia hora para sermos atendidos, enquanto isso,
esperamos sentados em algumas cadeiras. Assim que a Kin acordou,
Ji Won começou a conversar com ela em coreano e, em alguns
momentos, percebi que ela tentava repeti-lo. A minha filha era tão
inteligente que não demoraria para que ela aprendesse ao menos a
entender o coreano.

Nossa senha foi chamada e nós seguimos até o guichê.

— Bom dia, em que posso ajudá-los? — perguntou a atendente um


tanto aérea, prestando atenção em tudo, menos em nós.

Sentei-me na cadeira e o Ji Won ficou de pé com a Kin nos braços.

— Eu quero alterar a certidão de nascimento da minha filha. Um


reconhecimento amigável de paternidade. — Estendi a certidão antiga
dela, os meus documentos e os do Ji Won.

— Vocês são casados?

— Não, e ele é estrangeiro, coreano. Não fala português.

— Tudo bem. Preciso que ele preencha esses formulários e você


também. Depois, voltem aqui.

Assenti e fomos para um canto com um balcão onde eu pude


apoiar os papéis. As outras pessoas olhavam curiosas para ele e para
a nossa filha, principalmente por ele não estar falando em português
com ela. Assim que precisou preencher os formulários, colocamos a
Kin de pé, comigo segurando-a pela mão e ditando ao Ji Won o que
ele precisava escrever, já que tudo estava em português.

Levamos os papéis de volta para a atendente e ela conferiu com


uma breve passada de olho, cobrou uma taxa e me entregou um
comprovante.
— Depois de cinco dias úteis, podem voltar aqui e pegar a certidão
nova lá no balcão perto da entrada.

— Já temos o documento que eu preciso para enviar para o


consulado? — perguntou o Ji Won quando voltamos para o meu
carro.

— Ainda não, vai levar pelo menos uma semana para ficar pronto.

— Por que todo esse tempo só para nos entregarem um papel?

— No Brasil, o sistema é muito lento.

Ele bufou, mas não disse mais nada.

Estava receosa com o que aquilo poderia significar mais para a


frente. Eu tinha medo, mais do que gostaria, embora não houvesse
motivo aparente para isso. Porém, eu não poderia mais voltar atrás,
agora o Ji Won era o pai da Kin legalmente e a minha menininha não
era mais só minha.

— Olá! Como foi no cartório? — Jaqueline acenou para nós assim


que entramos no ateliê.

— Deu tudo certo. — Sorri para ela.


— Isso é ótimo! — Ela chegou mais perto de mim e me puxou para
um canto mais longe do Ji Won e da nossa filha, antes de comentar.

— Felipe me ligou perguntando de você. Disse que não está


atendendo o telefone.

— Eu estava ocupada. — Mordi o lábio.

— Ele não me pareceu muito contente.

Dei de ombros sem dizer nada. Estava ficando de saco cheio de


toda aquela amolação do Felipe, não era como se ele realmente
tivesse direito a alguma coisa.

— Amiga, não acredito que ainda não terminou com ele. Tá na cara
que é o que está impedindo você e o pai da Kin de fazerem um
irmãozinho para ela.

— Não seja exagerada! — Revirei os olhos. — Nem sei se o Ji Won


ainda quer algo comigo depois de tudo.

— Tem um jeito muito simples de saber. Pergunta para ele.

— Lis, acho que a Kin está com fome — chamou o Ji Won dando
um fim ao meu assunto com a Jaqueline.

Levei a minha filha ao banheiro e depois preparei algo leve para ela
comer.

Toda a vez que Ji Won chegava perto de mim, eu sentia uma


tensão louca que quase me deixava ofegando. Meu primeiro impulso
era me atirar nos braços dele. Porém, uma linha invisível segurava
nós dois. Era ridículo, mas ao mesmo tempo que parecia a coisa mais
simples do mundo de resolver, era como se fosse impossível ficarmos
juntos depois de tudo. Isso estava me enlouquecendo.

— Obrigado, Lis! — Ji Won parou ao meu lado enquanto eu levava


uma rodela de cenoura cozida à boca da Kin, que comia com gosto.

— Pelo quê? — Não olhei para ele, continuei com a minha atenção
na nossa filha.

— Me deixar reconhecê-la legalmente.

— É direto de vocês dois, eu não teria como me impor de qualquer


forma, nem se eu quisesse. Um juiz acabaria me obrigando a fazer
um exame de DNA e a aceitar a alteração no registro dela.

— De qualquer forma, poderia ter tornado as coisas muito mais


difíceis e não tornou.

— Era a forma mais racional de agir.

— Que bom que pensa dessa forma. Preciso ir ao hotel resolver


algumas coisas, há um tempo não ligo para os meus tios e precisam
de mim para algumas pendências do hospital.

— Você está encrencado?

— Tirei um mês de licença para vir para cá. Mas ainda estou
acompanhando alguns pacientes à distância.

— Vocês não param de trabalhar nunca?

— Faz parte da nossa cultura.


— É, eu sei.

— Nos vemos amanhã no casamento?

Fiz que sim.

Ji Won beijou a Kin no alto da cabeça, falou algo em coreano com


ela que eu não compreendi, então afastou-se e foi embora. Fiquei
olhando para a porta por uns dez minutos até que a Kin cutucasse o
meu braço para continuar dando comida para ela.
Vinte e dois

Fugi dos telefonemas do Felipe na noite anterior e fiquei grata por


ele não ter aparecido no apartamento no fim da noite. Era véspera do
casamento da Jaqueline e nos afundamos em preparativos. Mesmo
que não fosse, não estava a fim de vê-lo, não até ter um argumento
irrefutável para terminar o estúpido namoro que não deveria ter
reatado.

Minha melhor amiga estava certa, talvez o fato de estar namorando


o Felipe fosse uma maldita trava moral dos meus atos. Queria me
jogar nos braços do Ji Won, dizer para ele que sentia muito pelo que
havia acontecido, mas que ainda poderíamos ser uma família se ele
quisesse. Estava louca para sentir os lábios dele outra vez e odiava o
fato dele estar ali há dias e sequer termos nos abraçado.

— Lis, você está aí? — Jaqueline estalou os dedos diante dos


meus olhos me trazendo de volta à realidade.

— Estou... — Respirei fundo e tentei puxar a mão para levá-la aos


meus cabelos, porém, a manicure a segurou. Foi então que eu me
toquei que estávamos no salão de beleza em meio ao dia de noiva da
minha melhor amiga.

— Pensando em quê?

— Em como está a Kin na casa da minha mãe.


— Ah, conta outra! Você não engana ninguém.

— Então por que está perguntando? — Franzi o cenho e virei o


corpo para encará-la de cara feia.

A manicure deu um tapinha na minha mão para que eu ficasse


quieta e por pouco não arrancou um bife no meu anelar.

— Queria que você admitisse que não consegue tirar o coreano da


cabeça.

— Não consegui tirar nesses últimos dois anos. Por que iria
conseguir tirar agora, que o vejo todos os dias? — confessei sem
medo de ser julgada.

— Ah, amiga! Estou com dó de você. — Jaqueline segurou o riso e


também recebeu uma bronca da sua manicure.

— Por que dó? Eu já me decidi, vou terminar com o Felipe amanhã.


Não terminei ontem porque vamos ser seus padrinhos e não quero
estragar o clima com ele me olhando torto durante a cerimônia.

— Lide como quiser com a sua falta de coragem de dizer ao Felipe


que não importa o que ele tenha feito nos últimos anos.
Absolutamente não importa o quanto ele tenha se esforçado para ser
o namorado e o pai perfeito, esse lugar não é dele! Tá na cara que
não é ele que você quer.

— Eu não sou covarde! — rosnei mostrando os dentes.

— Se você está falando. — Deu de ombros. — Só estou dizendo


que você precisa resolver logo essa situação, porque está dando
agonia até em mim. Além disso, sei que se ficar nesse chove e não
molha, o homem que você ama pode voltar para a Coréia e você vai
ficar de mãos abanando.

— Não queria machucar o Felipe sendo escrota demais com ele —


admiti sentindo um gosto amargo na boca.

— Já reparou que está machucando você mesma com essa atitude


idiota? O Felipe não se manca, então não vai ter jeito de não
machucar ele. Precisa ver o que realmente vale a pena. Vai ficar
nessa só para fazer feliz um cara que já te chutou uma vez?

As palavras de Jaqueline me atingiram como uma bofetada e eu


fiquei com a garganta seca. Eu não poderia discordar de nada do que
ela havia dito. Precisava terminar com o Felipe, o relacionamento que
nem deveríamos ter recomeçado, e ficar com o homem que eu
realmente queria, que ainda por cima era pai biológico da minha filha.

Passamos o resto da manhã e parte da tarde no salão de beleza.


Bem no fim da tarde, minha mãe trouxe a Kin para que fizessem o
penteado nela, colocando uma coroa e vários adereços brilhantes em
seu cabelo preto, fino e escorregadio. Precisou de muito laquê e gel
para que tudo ficasse no lugar. Depois que colocamos o vestido,
minha filha ficou parecendo uma verdadeira princesa, meus olhos
ficaram marejados com a emoção, mas, por sorte, não estraguei a
maquiagem. O vestido dela era branco na parte de cima, com uma
faixa de cor salmão ao redor da cintura e a saia num rosa-pêssego
bem claro. Os sapatinhos também eram brancos e combinavam com
os de Jaqueline.

— Você está muito linda, minha princesinha.

Ela tombou o rostinho, botou as mãos nas bochechas e sorriu para


mim. Aquela cena encheu meu coração com ainda mais alegria. A Kin
era a razão da minha vida, não importava o que acontecesse, a minha
filha sempre me fazia sorrir. Por ela eu era capaz de enfrentar
qualquer desafio no mundo.

— Desculpa, Jaqueline, mas a fofura da minha neta vai roubar a


noite.

— Tenho certeza de que sim. — Minha melhor amiga riu para a


minha mãe.

A noite caiu, estava amena e o calor foi bem-vindo, pois a minha


filha não sentiria frio com os bracinhos de fora por causa do vestido.
Deixei-a com a minha mãe, que havia ensaiado para ajudá-la a entrar
na igreja sozinha, assim que encontrei o Felipe.

— Lis, meu amor! — Ele envolveu a minha cintura com os braços e


tentou me beijar, mas eu me esquivei, fazendo-o olhar para mim com
cara feia.

Estávamos cercados de outros padrinhos do lado de fora da igreja


e ele não ousou perguntar o motivo da minha reação, entretanto,
manteve a mão na minha cintura, como se quisesse reafirmar para
todos que nós éramos um casal. Eu até quis protestar, porém, sobre
seu ombro, eu vi a imagem do Ji Won descendo do táxi e parei de
pensar em qualquer outra coisa. Ele passou a mão pelo cabelo preto,
jogando o topete para trás e não consegui conter o suspiro. Estava
ainda mais lindo do que o comum em um terno azul, com gravata
cinza e sapato social preto. Eu me senti uma adolescente entrando
em histeria quando via o crush.

Empurrei o Felipe para lá e fui até o Ji Won, correndo


desengonçada com meu salto agulha no chão irregular e cheio de
pequenos buracos, onde cresciam ervas daninhas.

— Ji Won!

— Lis. — Ele abriu um sorriso enorme para mim e senti as minhas


pernas ficarem bambas. — Você está linda.

— Obrigada! — Minhas bochechas estavam ardendo. — Você


também.

— Onde está a Kin?

— Para lá, com a minha mãe. — Apontei. — Você pode ficar com a
minha mãe e a minha irmã até o fim da cerimônia. A Alexandra, minha
irmã, fala inglês, você vai conseguir conversar com ela.

— Onde você vai ficar?

— Sou madrinha, me sento perto do altar.

— Com ele? — Ergueu o queixo na direção do Felipe, que nos


encarava com uma expressão de poucos amigos.
— Somos padrinhos juntos.

— Entendi. — O sorriso lindo nos lábios do Ji Won desapareceu e


eu senti um certo pesar. — Vou procurar a Kin.

— Estão por ali. Não vai ser difícil de achar.

— Obrigado. — Ji Won passou por mim para encontrar a nossa


filha e eu senti como se houvesse perdido mais uma oportunidade de
dizer a ele como eu estava me sentindo.

Voltei-me para perto do Felipe e o que encontrei foi uma expressão


de fúria e dentes cerrados como se eu tivesse feito a pior coisa do
mundo.

— Precisa ir toda se derretendo para cima dele?

— Hein? — Arqueei uma sobrancelha.

— Não se faz de desentendida.

— Está na hora dos padrinhos entrarem — anunciou a


cerimonialista e parei de dar importância para o que o Felipe falava.

Ji Won
Fiquei deslumbrado quando vi a Lis andar até mim. Ela já era uma
mulher muito bonita, mas arrumada daquela forma, estava ainda mais.
O vestido azul-claro feito em uma seda leve, bordado com renda e
pedras, moldava-se perfeitamente às curvas do seu corpo. A Lis era
magra, o que atendia ao perfil de beleza coreano, porém, possuía
curvas bem mais acentuadas, o que chamava atenção aos meus
olhos. Às vezes, a vontade de olhar para o seu decote era mais forte
do que eu.

Quando ela chegou perto de mim, com o cabelo preso em uma


trança lateral e os olhos verdes radiantes, eu sorri sem comedimento.
O que não gostei foi vê-la voltar para perto daquele homem. No
momento em que meus olhos cruzaram com os dele, quis poder cortá-
lo ao meio com uma espada afiada.

Fui procurar a minha filha e a encontrei no colo de uma mulher


mais velha que em vários traços assemelhava-se a Alissa. Deduzi ser
a sua mãe.

— Ajumma. — Fiz uma breve reverência no instante em que ela


olhou para mim.

— Oi! — Sorriu, mas pareceu não saber mais o que dizer.

— Você deve ser o Kim Ji Won? — Alguém cutucou o meu ombro e


eu me virei para ver quem era. Deparei-me com uma mulher mais
jovem, e que também tinhas traços que me lembravam da Alissa.

— Sim.
— Sou Alexandra, a irmã da Lis, mas pode me chamar de Alex, é
como todo mundo chama. É um prazer conhecer o pai da minha
sobrinha fofa.

— O prazer é meu.

— Venha comigo. Vamos nos sentar nos bancos lá dentro da igreja


junto aos demais convidados. A Kin precisa ficar aqui fora um pouco.
Minha mãe irá ajudá-la a entrar na igreja quando for o momento da
cerimônia.

— Não irão precisar da minha ajuda?

— Não será necessário, elas já ensaiaram bastante.

Segui a irmã da Alissa para dentro do templo católico, que estava


cuidadosamente decorado com muitas rosas brancas, flores de
laranja e orquídeas no mesmo tom. Entre os bancos, ligando um ao
outro, estava um tecido branco. No altar, diante da cruz e outros
adereços religiosos, o padre parecia fazer os últimos ajustes.

Sentei-me em um banco de madeira ao lado da irmã da Alissa e do


marido. Pouco tempo depois, o pai da Alissa também se juntou a nós.
A família dela pareceu contente em me ter por perto, ao menos a
expressão era melhor do que a que Felipe dirigia a mim em todas as
ocasiões que nos encontramos.

Uma música começou a tocar e eu movi a cabeça para encarar as


portas da igreja. Por ela entraram alguns casais, entre eles o Felipe e
a Alissa. Não conseguia negar o mal-estar que os ver juntos causava
em meu estômago.

Ela sorriu para mim ao passar do meu lado e eu sorri de volta.


Percebia alguns sinais que me dava e o fato de ainda estar com o
Felipe só me deixava ainda mais confuso...

Parei de pensar quando minha filha deu os primeiros passos


cambaleantes sobre o tapete vermelho jogando pétalas de rosas
vermelhas no chão e, atrás dela vinha a Jaqueline em um volumoso
vestido branco. Fiquei contente por ter sido convidado para presenciar
aquele momento. Lá na frente, a Kin cambaleou para os braços da
avó que logo a pegou no colo e a trouxe para perto de mim.

Murmurei um “parabéns” para ela em coreano e minha filha sorriu


para mim.

O casamento seguiu normalmente, ainda que eu não


compreendesse o que era dito, o sorriso de Jaqueline e de seu futuro
marido eram bons indicativos. Ao fim da cerimônia, os noivos saíram
primeiro e logo Lis veio até nós e pegou a Kin nos braços, cobrindo a
menina de beijinhos nas bochechas.

— O que achou? — perguntou a mim.

— Vocês duas foram deslumbrantes.

— Obrigada! — Percebi que ela estava corada outra vez. Estava


acontecendo com muito mais frequência depois que quase nos
beijamos em seu ateliê.
— Vai vir para a festa conosco?

— Vou para onde você quiser que eu vá.

Lis corou ainda mais.

— Vem no meu carro comigo. O salão fica a alguns quilômetros


daqui.

— Tudo bem.

Ela me entregou a Kin para procurar a chave do carro em uma


pequena bolsa que a mãe lhe entregou. Lis se virou, conversou algo
com o Felipe que eu não entendi, mas pela cara dele, isso não o
agradou, então ela se voltou até mim.

— Vamos?

Eu a segui para o estacionamento da igreja onde estava o carro,


colocamos a Kin na cadeirinha e eu sentei ao seu lado no banco do
carona.

— Gostou do casamento?

— Da parte que eu entendi, sim.

Lis começou a rir e eu abri um sorriso amarelo.

Levou cerca de dez minutos em um trânsito calmo para que


chegássemos ao local da festa. Vários carros já estavam
estacionados na porta e os convidados passavam por um homem que
me pareceu estar recolhendo convites.
A Kin estava empolgada, o que me surpreendeu, porque imaginava
vê-la cansada naquele horário. Assim que a libertamos da cadeirinha,
ela saltitou para o chão, dizendo “dinda”, uma palavra que eu não
sabia o significado. Porém, Lis me explicou ser “madrinha”, o que a
Jaqueline era dela.

Passamos pelo segurança e a Lis entregou os convites, havia um


para mim também. O salão era grande, com várias mesas decoradas
com arranjos de rosas vermelhas, brancas e velas. Fomos guiados
por uma cerimonialista até uma das mesas e nos acomodamos lá.

Um fotógrafo veio tirar várias fotos da Kin e quando ele se afastou,


o Felipe estava atrás. O homem, que parecia o único empecilho para
que a Alissa ficasse comigo, agachou-se no chão e estendeu os
braços.

— Kin! — chamou pela minha filha. Não entendi o restante da frase


dele, porém, a palavra “pai” ressoou na minha cabeça e não me
deixou nada contente. O que ele estava pensando? O pai da Kin sou
eu!

Puxei minha filha dos braços dele antes que pudesse envolvê-la em
um abraço.

— O que você disse? — Foi a primeira vez que demonstrei falta de


controle.

— Vem aqui com o papai, Kin. — Ele se levantou com um sorriso


nos lábios ao perceber que havia conseguido o que queria ao fazer
aquilo, provocar-me.
— Felipe, ficou louco! Por que está fazendo isso? — questionou
Lis. Ele havia conseguido irritar, mas não apenas a mim. — Nunca
deixei que a Kin se referisse a você como se fosse o pai dela!

— É só uma palavra idiota! Eu fui muito mais o pai dela do que


esse otário. Eu estava lá quando ela precisava. Fui eu quem a levei
ao médico. Eu quem a observei dormir nas noites de cólica. E agora,
esse cara aparece aqui, querendo tirar de mim a minha bebê e a
mulher que eu amo como se tivesse qualquer direito sobre elas?

— É você que não tem direito nenhum sobre a minha filha. —


Coloquei a Kin sentada na cadeira e segurei o homem pela gola da
camisa, sem me preocupar com os demais convidados da festa
olhando para nós.

— Ela me ama muito mais do que a você. Não passa de um


desconhecido para ela. Não importa o que um papel ou um teste de
DNA digam.

Eu nunca havia batido em alguém antes, meus pais e meus tios,


depois da morte deles, criaram-me para ser um homem pacífico e
gentil, entretanto, quando aquele homem passou dos limites, eu o
acertei com um soco bem no meio do rosto.

— Acha que bater em mim vai mudar as coisas? — Ele começou a


rir e eu o soquei de novo.

— Ji Won, para com isso! — gritou Lis, tentando segurar o meu


braço.
— Depois que eu levar a Kin para a Coréia, ela nem vai se lembrar
de você. — Soltei o Felipe e ele caiu de joelhos no chão.

— Era para isso que você queria reconhecê-la legalmente? —


Virei-me para Lis e ela estava com os olhos cheios de lágrimas. — É
isso o que você está tentando fazer, tirar ela de mim? — Lis pegou a
Kin nos braços e a aninhou junto ao peito.

Ela envolveu nossa filha e correu para longe, deixando tudo para
trás, sua bolsa e a mala com as coisas da Kin. Felipe começou a rir e
eu teria dado outro soco nele se não tivesse percebido o que acabara
de dizer e a raiva que poderia ter feito a Alissa sentir de mim.

— Lis, espera!

Corri atrás dela, mas acabei perdendo-a de vista no jardim em meio


aos convidados que enchiam cada vez mais o local.
Vinte e três
Lis

Eu era capaz de ouvir a voz da Jaqueline ecoando na minha


cabeça e dizendo o óbvio: Se você tivesse terminado com o Felipe
antes, ele não teria tomado uns sopapos do Ji Won. Estava
arrependida de ser o foco de um barraco no casamento dela, ainda
que a probabilidade disso acontecer fosse bem alta desde o início.

Independente da briga dos dois, eu estava me sentindo uma idiota.


Acreditei que algo entre mim e o Ji Won pudesse voltar a rolar e nós
seríamos uma família junto com a nossa filha, mas eu, muito idiota,
estava apenas a entregando de bandeja para ele entrar com um
processo e tirá-la de mim, levando a minha filha e minha razão de
viver para o outro lado do mundo.

Sentei-me em um banco no jardim do salão de festas, próximo a


uma fonte e cercado por luminárias com aspecto antigo. Coloquei a
Kin entre as minhas pernas e ela colocou a mãozinha no meu rosto
quando percebeu que eu estava chorando. O gesto dela fez ainda
mais lágrimas descerem.

— Mamãe ama muito você. Muito mesmo.

— Amo você, mamãe. — Ela abraçou meu pescoço e as lágrimas


não pararam nunca.

Eu não entendia nada de direito privado internacional, nem do


brasileiro para ser sincera, advocacia sempre foi a praia da minha
irmã e não a minha, porém, independente do que poderia acontecer,
não iria deixar que um juiz tirasse a minha filha de mim. Por mais
patriarcal que fosse a Coréia, eles não iriam me separar da Kin, nem
que para isso eu tivesse que fugir com ela para um interior remoto,
onde nunca nos encontrariam. Eu tinha um bom dinheiro guardado,
ainda dos quadros da Coréia que me renderam uma pequena fortuna,
seria o suficiente para nos manter fora do mapa por alguns anos.
Poderia usar um pseudônimo, vender os quadros por um valor mais
barato, desde que fosse o bastante para nos manter.

— Lis!

Levantei a cabeça e vi o Ji Won caminhando até mim e eu senti um


misto de desespero e raiva enquanto escondia a minha filha com o
meu corpo.

— Nem o governo da Coréia, nem o papa vão ser o suficiente para


você conseguir tirar a minha filha de mim. Se tentar, juro que vai
conhecer o meu pior lado!

— Lis, tenha calma! — Ele se sentou no banco ao meu lado, e


antes que eu tentasse me levantar, colocou a mão sobre o meu ombro
para que eu não conseguisse. — Você entendeu errado, nunca
pretendia tirar a Kin de você.

— Não foi o que acabou de dizer para o Felipe?

— O que eu disse ao Felipe é que vou levar a Kin para Coréia.


— Eu não vou deixar! — rosnei, voltando a envolver a minha filha.
— Vão ter que passar em cima do meu cadáver para isso.

— Não seja exagerada. — Bufou.

— Não faz ideia do meu amor pela Kin.

— E você não faz ideia do meu amor por você!

Engoli em seco, contendo um pouco das lágrimas e virei a cabeça


para o lado para encará-lo.

— O que está dizendo?

— Lis, eu vim da Coréia para cá atrás de você, porque não havia


outra mulher que eu quisesse para mim, não importava quantas
candidatas meus tios ou meus amigos me apresentassem em
encontros às cegas. Eu continuava querendo você. Era o rosto de
uma estrangeira de cabelos avermelhados que vinha à minha mente
todas às vezes que eu fechava os olhos para dormir. Eu vim até aqui
para me declarar, para levá-la para Coréia como minha esposa.
Quando isso acontecer, a Kin virá conosco, mas nunca sem a mãe.
Mas não espere que eu desista de levá-las comigo, vocês duas,
mesmo que precise da ajuda do papa para você escolher a mim, ao
invés daquele outro cara.

Não consegui conter o riso diante da última frase dele.

— Nunca mais me faça pensar que você vai tirar a Kin de mim.

— Eu não irei. — Curvou-se e beijou nossa filha no alto da cabeça.


Ele ergueu o rosto e eu interceptei seus lábios com os meus. Tinha
dois anos de saudades daqueles lábios macios, dois anos me
perguntando se um dia os beijaria outra vez. Tirei a Kin do meio das
minhas pernas e a sentei no banco ao meu lado enquanto me
aproximava mais do pai dela. Ele subiu a mão pela minha nuca,
entranhando os dedos no meu cabelo trançado e colou meu rosto ao
dele. Perguntei-me se havia deixado de lado todo pudor coreano de
não trocar afeto em público para me beijar com vontade ou apenas se
lembrou de que estávamos no Brasil, e ninguém nos recriminaria por
um beijinho mais quente.

Naquele beijo estavam todos os dois anos separados e a última


semana tensa. Mordi o lábio inferior dele e pressionei a língua,
pedindo passagem para dentro da sua boca. Queria me sentar no colo
dele, porém, me contive, pois, a nossa filha estava ao lado, assistindo
tudo. Teria que ser apenas um beijo daquela vez.

— Por que, Lis?

Interrompi o beijo gostoso que estava trocando com o Ji Won e


encontrei o Felipe parado a poucos metros de nós. Ele estava com as
mãos dentro dos bolsos da calça social preta e nos encarava com um
misto de raiva e tristeza.

— Eu fui o melhor cara que poderia por você! Estive ao seu lado
sempre que precisou de mim, mas bastou esse coreano chegar para
você se jogar nos braços dele, como se tudo o que eu fiz não tivesse
significado nada!?
Respirei fundo, não adianta assoprar, precisava resolver a situação
de uma vez por todas. Não havia sido sincera com o Felipe desde o
início e isso só acabara piorando tudo.

— Nunca pedi para que você ficasse ao meu lado, que dormisse lá
em casa quando a Kin estava doentinha. Para ser sincera, eu insistia
para que você fosse embora, mas você nunca ia. Eu nunca senti por
você o que eu sinto pelo Ji Won, nem antes de terminar comigo pela
primeira vez. Eu só aceitei voltar por estar cansada demais da sua
insistência, isso não significa que eu te amo, na verdade, acho que
nunca te amei, estava só acostumada à sua presença.

— Só está dizendo isso...

— Não, Felipe — interrompi-o. — Estou dizendo o que eu sinto de


verdade. Estou tentando terminar desde que, por estupidez, aceitei
voltar com você. Isso foi um erro, mas eu estava tentando não te
machucar, outro erro, isso apenas piorou tudo. Só acabei me
machucando e à minha filha. Que idiotice foi essa de pedir a ela para
que te chamasse de pai!? Não deixei que fizesse isso nem quando o
Ji Won não estava aqui. Você não é o pai dela!

— E me odeia por ter feito isso?

— Não odeio você, Felipe! Ainda quero você como meu amigo,
mas nós dois não funcionamos mais juntos, nem sei se chegamos a
funcionar um dia ou talvez estivéssemos apenas acostumados com a
presença um do outro.

— Lis...
— Não discute, só vai piorar as coisas. Você sabe que, no fim das
contas, estou certa, que não temos química nenhuma e só estávamos
prolongando o inevitável.

— Espero que ele faça você mais feliz do que eu fiz.

— Obrigada, Felipe.

Ele deu às costas e foi embora, derrotado. Sabia que discutir era
inútil e não adiantava insistir.

— Ele não está contente — comentou o Ji Won.

— Não, mas não tinha outro jeito. Eu estava adiando demais as


coisas e dei para ele esperanças que não deveria.

— Eu fico contente.

— Pelo quê? — Franzi o cenho.

— Esse cara finalmente não estar mais entre nós dois. — Ji Won
puxou meu rosto e me deu mais um beijo.

— Por que não vamos para a minha casa? — sugeri ao perceber


que a Kin estava se escorando em mim, sonolenta, procurando uma
posição confortável para dormir.

— Será que a sua amiga não vai ficar chateada se formos embora
cedo?

— A Kin está cansada. — Levantei e peguei a minha filha no colo.


— Além disso, a Jaqueline vai entender os meus motivos.
— Tudo bem — ele assentiu. — Vou buscar suas coisas no salão e
já vamos.

Suspirando, andei até o carro no estacionamento. Terminar com o


Felipe foi como tirar o peso do mundo de cima das minhas costas. Por
pior que parecesse para ele, esperava que, em algum momento,
Felipe percebesse que havia males que vinham para o bem. Eu não
era a garota certa para ele, mas Felipe era um cara legal. Iria achar
outra pessoa.

Cheguei perto do meu carro e me dei conta de que não estava com
a chave, entretanto, não demorou muito para que o Ji Won chegasse
e destravasse o veículo. Ele abriu a porta para mim e eu coloquei a
Kin na cadeirinha antes de pegar a chave da mão dele e assumir o
volante.

Dirigi de volta para casa da maneira mais calma que consegui,


observando o Ji Won com a minha visão periférica e contando os
minutos para ficar sozinha com ele. Meu coração estava disparado e
minhas mãos suavam frio. A ansiedade era tão grande, que me senti
como se fosse perder a virgindade. Estava curiosa, afoita, quase
tendo um ataque de nervos.

Parei na garagem do prédio, que estava na penumbra devido à luz


queimada em cima da minha vaga. Ji Won pegou a Kin nos braços e
eu fui abrindo as portas pelo caminho até chegarmos dentro do meu
apartamento e no quarto da nossa filha. Ele a colocou no berço e eu
tirei o vestido, trocando-o por uma fralda limpa e um pijama
confortável. Ela deu uma resmungada e choramingou enquanto eu
atrapalhava o seu sono para prepará-la para dormir, mas assim que a
acomodei no berço, ela entrou em um sono profundo.

— Descansa, minha princesa. — Beijei-a na testa. Pelo dia agitado


como dama de honra, tinha certeza de que ela iria dormir direto até o
dia seguinte.

Afastei-me do berço e encarei o Ji Won parado atrás de mim. Sem


dizer nada, peguei a mão dele e o puxei comigo. Arrastei-o até o meu
quarto, liguei a babá eletrônica e fechei a porta. A única luz próxima
era de um poste na rua, mas mesmo sob as sombras, pude ver o
sorriso nos lábios dele quando o Ji Won envolveu a minha cintura e
puxou o meu corpo para junto do seu. Cada terminação nervosa
minha entrou em curto-circuito e eu estremeci inteira. Sentia falta,
muita falta daquelas sensações que faziam meu corpo vibrar e arder.
Os lábios dele envolveram os meus com ardor, sem qualquer
comedimento, pois não estávamos mais em um local público. Mordi
seu lábio enquanto ele me empurrava contra a parede. Minha cabeça
bateu na superfície dura e gelada, soltei um leve gemido e cravei as
unhas nos ombros dele, protegidos pelo paletó do terno.

Ji Won beijou a minha boca, lambeu os meus lábios, desceu a


língua pelo meu pescoço e me fez ter a sensação de que minhas
pernas eram moles feito gelatina, mas suas mãos na minha cintura
me mantiveram de pé. Ele me virou de costas, mordeu a minha nuca
enquanto deslizava o zíper do meu vestido até a base das minhas
costas.
Espichei-me, arrepiada, quando a brisa fria que entrou pela janela e
a boca quente do Ji Won escorregando pela linha da minha coluna
tocaram a minha pele sensível. A cada carícia, meu corpo ia se
lembrando do que ele era capaz de provocar e clamava por mais.
Fiquei de frente outra vez e puxei o rosto dele para o meu enquanto
tirava o seu paletó e o jogava sobre o meu vestido no chão. Fui
abrindo botão por botão da sua camisa social enquanto nossos lábios
se tocavam, se chocavam e se esfregavam com a pressão dos
nossos beijos. A língua dele estava grudada à minha, rodopiando pela
minha boca. Empurrei-o pelos ombros e Ji Won caiu sentado na
minha cama. Subi no colo dele enquanto removia o meu sutiã e o
deixava cair no chão diante da cama. Ele abocanhou um dos meus
seios e eu joguei a cabeça para trás, gemendo. A pressão e a
palpitação entre as minhas pernas se tornaram mais intensas. Eu o
queria em mim assim como dois anos atrás. Ainda lambendo e
sugando os meus seios, Ji Won abriu o cinto da calça e eu ajudei a
removê-la, juntamente com a cueca.

Ainda de calcinha, levei as mãos dele por um caminho pelas


minhas coxas até a lateral de minha cintura. Ele entendeu o recado e
puxou a peça para baixo, revelando o meu sexo úmido e ansioso por
ele.

Estava pegando fogo. Há muito tempo não me sentia assim, com


tanto desejo. Agarrei seu cabelo, puxando-o para trás, mordendo o
seu pescoço enquanto se sentava devagar, aproveitando cada
centímetro que ele ia entrando em mim. Estremeci inteira, vibrando, e
soltei um longo e prolongado gemido quando eu o senti me preencher
por completo.

— Senti falta disso — murmurei contra a sua orelha ao começar a


me mexer.

Ele colocou uma das mãos na minha cintura e a outra na minha


nuca, em meio a beijos calorosos, ajudava a guiar meus movimentos.
Fechei os olhos, me entregando à espiral sedutora de sensações.

Ji Won nos girou e me jogou na cama, surpreendida, fiquei imóvel


enquanto ele se posicionava entre as minhas penas e colocava um
dos meus pés em seu ombro. Ele esfregou a ponta úmida contra o
meu sexo escorregadio em uma deliciosa fricção que me deixou
ofegando. Brincou comigo, me fez gemer e suplicar com o olhar antes
de voltar a deslizar para dentro de mim, unindo nossos corpos
novamente.

A pouca luz era o suficiente para que eu pudesse observar o rosto


do Ji Won e o quanto aquele prazer era real, e não mais uma das
inúmeras vezes em que havia me tocado pensando nele. Ele
começou a se mover mais rápido e os meus gemidos de prazer foram
ficando histéricos. Peguei um dos travesseiros e cobri a boca, não
queria acordar a minha filha com todo aquele barulho. Eu me retorci
na cama enquanto gozava e ele continuava a se mover dentro de
mim. Levou alguns minutos para que ele se juntasse a mim e os dois
caíssem exaustos.
Assim que recuperei o fôlego, fui ao banheiro e me limpei. As
chances de ficar grávida daquela vez eram bem mais baixas, já que
eu estava usando um DIU desde que a Kin nasceu.

Voltei para cama e me aninhei nos braços do Ji Won, estávamos


tão cansados que logo pegamos no sono.

Acordei com o sol invadindo o quarto e incomodando os meus


olhos. Havia me esquecido de fechar a cortina. Virei-me na cama e
me deparei com o Ji Won ainda dormindo. Era real! Ele estava ali
comigo.

Meus movimentos o acordaram e ele abriu os olhos profundamente


negros, encarando-me com curiosidade.

— Bom dia! — Dei um selinho nele. — Dormiu bem?

— Foi a minha melhor noite em dois anos.

— Exagerado! — Dei uma risadinha.

— Não sabe o quanto pode ser sombria uma noite sem seu toque,
seu carinho... — Ele colocou o nariz no meu pescoço e eu me encolhi
com a cócega. — Sem seu perfume... Eu amo você, Lis!
— Eu também amo você, Ji Won. —
­ Não contive o sorriso que
tomou conta do meu rosto.

— Lis, sobre a Coréia...

— Espera! Antes que eu diga qualquer coisa, eu preciso entender.


Aquilo ontem foi um pedido de casamento?

— Não necessariamente. Eu quero me casar com você, mas acho


que o pedido pode ser feito de uma forma mais adequada e
cerimoniosa.

— Eu aceito.

Ele franziu o cenho.

— Aceito me casar com você. Aceito me mudar para a Coréia, mas


eu tenho algumas condições.

— Quais seriam elas?

— Quero continuar pintando, ter o meu ateliê e fazer as minhas


exposições, mesmo que às vezes eu tenha que viajar para outras
partes do mundo.

— Tem uma sala de pintura na minha casa, podemos reformar para


ter o que você precisa.

— A Kin não vai estudar até a exaustão.

— Não estudamos até a exaustão...

Olhei torto para ele e Ji Won apenas assentiu com um movimento


de cabeça.
— Tem mais uma coisa. Eu vou aprender coreano, mas vou
continuar falando português com a Kin dentro de casa. Bom que você
aprende também.

— Algo mais? — Ele sorriu e me beijou, antes de se levantar e


procurar algo dentro do bolso da calça.

— É provável que eu queira mais um filho. Não agora, mas quando


a Kin estiver um pouco mais velha.

— Gosto muito dessa sua condição, minha noiva. — Ele tirou uma
caixa da calça e estendeu para mim o anel mais bonito que eu já tinha
visto na vida. Uma verdadeira obra de arte.

Coloquei o anel no dedo e o puxei de volta para a cama.


Epílogo
Cinco anos depois...

Um garçom se aproximou de mim e me ofereceu uma taça de


champanhe, mas eu recusei com um movimento de cabeça. Será que
ele não havia notado que eu estava grávida? Ou notou e não deu
importância, pois a barriga de seis meses era bem aparente no
vestido preto que eu estava usando.

Olhei em volta e sorri ao comtemplar a bela exposição em minha


homenagem no Palácio das Artes. Fazia anos que eu não voltava ao
Brasil e era bom que fosse naquelas circunstâncias. A galeria estava
linda, com várias pinturas de diversos momentos da minha carreira,
algumas delas imaginei que nunca voltaria a ver.

Ji Won parou ao meu lado e me estendeu a mão. Entrelacei meus


dedos aos dele e sorri. Meu amado marido havia tirado folga de três
dias do hospital para vir comigo e eu estava muito contente. Era muito
difícil fazê-lo entender que trabalhava demais e merecia um descanso
às vezes. Os coreanos não eram acostumados a tirar férias anuais
como nós, nem tinham tantos feriados.

— Lis!

— Marcelo! — Abri um largo sorriso ao me virar e ver meu amigo


de faculdade caminhar até mim. Vários anos se passaram e ele ainda
continuava um cara bonitão. Com os cabelos raspados, a pele negra
reluzente por debaixo de uma camiseta verde e calça jeans.

Ao lado dele, estava uma mulher loira e sorridente. Depois que nos
afastamos do abraço, outra coisa que levou um tempo para que o Ji
Won se acostumasse, com aos hábitos brasileiros, eu olhei bem para
ela. O cabelo loiro estava preso em um rabo de cavalo e usava um
vestido azul da cor dos seus olhos. Havia um menino com ela, de pele
morena e olhos verdes, que eu presumi ser filho dos dois.

— Essa é a minha esposa, Emy — apresentou.

— É um prazer conhecê-la, Emy. — Estendi a mão para ela.

— O prazer é meu, o Marcelo fala muito do seu talento.

— Ele também é muito talentoso, um dos melhores fotógrafos que


conheço.

— Eu me esforço. — Marcelo sorriu.

— Me deixem apresentar para vocês. — Dei um passo para o lado,


revelando o Ji Won. — Esse é meu marido.

— É um prazer conhecer um amigo da Lis — disse Ji Won em um


português perfeito.

— Finalmente posso conhecer você. — Uma outra voz chamou a


minha atenção e eu girei o corpo sem sair do lugar para ver quem era.

Uma mulher morena, com olhos e cabelos castanhos estava


parada não muito longe de mim.
— Oi! — Sorri para ela.

— Sou a Joyce. Marcelo é o fotógrafo da minha família, eu vi uns


quadros seus no estúdio dele uma vez e fiquei encantada. Tenho uns
dois na minha casa. Você é muito talentosa.

— Obrigada.

— Será que aquele quadro abstrato da entrada está à venda? —


Um homem ruivo se aproximou dela e colocou a mão sobre seu
ombro. Pelas alianças semelhantes nos dedos deles, presumi que
eram casados. — Achei incrível!

— Preciso ver com o curador, porque alguns quadros são de


coleções particulares.

— Obrigado, eu adoraria fazer uma oferta.

— Ji Won, cadê a Kin? — Olhei em volta e não vi mais a minha


filha. Ela deveria estar brincando perto de uma das pinturas na
distância do meu olhar, mas não estava.

— Não estava ali? — Ele também ficou preocupado quando não a


enxergou.

Entretanto, antes que saíssemos atrás dela feito dois


desesperados, nossa filha de seis anos veio correndo e agarrou-se à
minha perna.

— O que foi, Kin? — Tombei a cabeça para olhá-la nos olhos.


— Eles tentaram me beijar. — Apontou para dois meninos que
estavam no início do corredor.

— Théo! — gritou Emy.

— Ian! — Joyce torceu os lábios.

— Crianças — balbuciou o Marcelo e todos nós começamos a rir.

Fim!
Agradecimentos

Meu agradecimento mais que especial às minhas


leitoras e meus leitores, que me motivam a continuar
sempre, em particular a todos os participantes do meu grupo
do Whats “Leitoras da Jessica”: Gaby, Tatiana Amorim, Nalu,
Mi, SUELEN, Juliana Lelis, Ilza Mendes, Tatiane, Cleonice
Siqueira, Ana Paula Carvalho, Gardenia Feitosa, Amelia
Luize, Simenya Elayne, Ivana Sandes, Claudete Silva, Lais
Calmon, Carla Staub, Sandilha Cristina, Pauline Quesada,
Aline Gomes, Cintia, Keyla, Leidiana, Eglaia, Cristina Tiemi,
Jessyka Monyka, Jeanille, Jhully Santos, Priscilla, Angelica,
Nedja, Nil, Micaela Larré, Maria Yasmin, Ana Laura Oliveira,
Alecssandra, Mariana Telles, Angela, Ivana Sandes, Lidiane,
Carol, Francine, Roverta Frosi, Pricila, Adrielly, Larissa
Costa, Pathy, Fatima Aguiar, Keth Silva, Joana Ramos,
Vanessa Oliveira, Katia Rozendo, Mariza, Gilvane Rosyh
Ferreira, Elaine David, Sandra Cecília Aline Araujo, Thaty,
Ticyanne Brito, Chirly Rodrigues, Silvana Brito, Regina
Fabbris Camila De Oliveira, Registela, Marinalva Sales,
Luana Malhães, Fernanda Rulfino, Ana Paula Mendes,
Beatriz Soares, Cassia e todas as outras. Agradeço também
aos leitores do Instagram e Facebook por todo o carinho e
incentivo constante, em especial à Micheline, amiga,
apoiadora e leitora pela qual tenho um carinho todo especial.

Obrigada, Rosi, por todo carinho. O seu trabalho duro


em me assessorar em todas as etapas dos meus livros, da
criação à divulgação, é responsável pelo meu sucesso. Em
especial por me acolher, apoiar, dar conselhos que acabam
se transportando para as páginas dos livros.

Gratidão a toda equipe do Grupo Editorial Portal.

Agradeço meu marido, Gabriel, por estar sempre ao


meu lado, me dando apoio incondicional.

Gratidão aos meus mentores e protetores espirituais!


Que meu caminho até vocês sempre esteja aberto para que
possam me orientar e proteger, para que eu tome as
melhores decisões e nunca desista dos meus sonhos.
Sobre a autora

Jéssica Macedo é mineira, de 27 anos, e Under 30 da


Forbes Brasil, a lista dos jovens mais promissores do país.
Mora em Belo Horizonte, Minas Gerais. De dentro de seu
apartamento, na companhia do marido e de três gatos, ela
produz uma série de livros fantasia, romances de época e
contemporâneos, e, principalmente, obras da literatura hot,
um verdadeiro fenômeno editorial entre o público feminino,
vendidas em um ritmo intenso nas plataformas digitais.

Autora best-seller da Amazon, iniciou sua experiência


no mundo da escrita aos nove anos e tornou-se autora aos
14, com o lançamento do seu primeiro livro “O Vale das
Sombras”. Com mais de 100 obras publicadas, é escritora,
editora, designer e roteirista. Ajudou a adaptar um dos seus
romances “Eternamente Minha” para um longa-metragem
lançado na plataforma Cinebrac. Hoje, Jéssica é o principal
nome de um time de autores, a maioria mulheres, que
compõem o catálogo do Grupo Editorial Portal, que ela
fundou a partir das experiências vividas em outras editoras.

Acompanhe mais informações sobre outros livros da


autora nas redes sociais.
Facebook - http://www.facebook.com/autorajessicamacedo/
Instagram -
www.instagram.com/autorajessicamacedo/
Página da autora na Amazon -
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Outras obras
Rejeitada no altar

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Sinopse:

Deveria ser o dia mais feliz da vida de um casal, mas ele destruiu
o coração dela...

Ian Gray é o CEO do hospital San Rose. Uma instituição que há


anos foi criada pela sua família. Mas, por trás de sua aparência
impecável e fria, esconde uma ferida que o faz se afundar em um
mar de amargura.
Priscilla Menezes, teve seu coração destroçado pelo homem que
acreditava ser o amor de sua vida. Abandonada no altar, sem
quaisquer explicações e apenas um profundo vazio. Dias depois,
descobriu que estava grávida, mas ele não estava disposto a ouvi-
la, nem para que contasse da filha, fruto do amor com que um dia se
iludiu, pensando que duraria para sempre.

Ela não imaginava que voltaria àquele hospital, nem veria


novamente o homem que a destruiu. Contudo, um acidente com a
sua bebê a deixou sem escolhas, só que ela sabia não estar
preparada para confrontá-lo, muito menos lidar com a dor da
rejeição.
O preço da verdade

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Sinopse:

Suzana perdeu tudo o que mais importava e sobrevivia


dedicando-se ao trabalho. Focada, determinada, implacável, mas
por detrás da detetive durona, havia uma mulher estilhaçada. Ela
acreditava que carregaria aquele terrível vazio pelo resto da vida até
ser chamada para um caso. O que deveria ser apenas mais uma
investigação de homicídio, vai revirar o seu passado e trazer à tona
velhas feridas.
Victor tinha uma vida perfeita: era um médico de sucesso, tinha
um casamento feliz e uma filha linda, até que os seus planos para
uma noite romântica foram interrompidos e tudo ruiu. Ele teve a
esposa assassinada e, para piorar, foi preso, acusado pelo crime e
afastado de sua garotinha.

O caso começa a se tornar pessoal quando a detetive passa a


acreditar na inocência do médico e a encontrar ligações desse caso
com o maior caso que já enfrentou e ainda sem solução: o
assassinato do seu marido e filho.

Suzana e Victor terão suas vidas entrelaçadas na busca pela


verdade que pode ter um preço alto demais.
Disputa entre vizinhos (Rancho Collins Livro
5)

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Sinopse:

Um peão cafajeste e provocante.


Uma patricinha da cidade grande.
Eles vão acabar como vizinhos, dispostos a enlouquecerem um
ao outro.

Liam sempre foi o mais apaixonado pela fazenda, dentre os


irmãos Collins, o que mais se dedicava ao rico rancho da família. Ao
lado do pai, ele cuidava dos animais e de toda a gestão da
propriedade, mas no tempo livre, participava de competições de
montaria e adorava exibir o belo corpo musculoso para as mulheres
da região. Cafajeste inveterado, o garanhão adorava colecionar
conquistas. Bonito demais para dar trabalho a qualquer uma que
tentasse laçar seu coração selvagem.

Suelen Jones nunca imaginou deixar a sua vida na cidade grande


para ir morar no campo, porém, as dívidas se acumularam e para
piorar, seu irmão e único parente acabou morrendo, deixando para
ela um rancho para ser administrado e um sobrinho de três anos
órfão.

Aprender a cuidar de uma fazenda e criar uma criança, não serão


seus maiores desafios quando ela entrar na mira do maior
conquistador da cidade.
Rendida (Império do Caos Livro 2)

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Sinopse:

AGE GAP + DARK FANTASY


Entregue para a morte, ela ressurgiu das cinzas, mas se
esqueceu de que ele ainda era o vilão.
Nos braços do Imperador do Caos, a jovem princesa da Nação
da Água revelou poderes que desconhecia e o salvou de um final
trágico. Mari, que por muito tempo foi tida como uma medíocre,
descobriu em si uma força narrada apenas em lendas.

Até controlar todo poder que existe dentro dela, precisará de


muita dedicação, mas está disposta a dar tudo de si para se tornar
mais forte e construir um lar onde finalmente se encontrou.
Entretanto, ela não fazia ideia de que era apenas uma peça num
plano maior do Senhor do Fogo.

Arrasada pela verdade, Mari decidiu que não seria mais


manipulada e lutaria para a sua liberdade. Não disposta a se tornar
uma arma no jogo de poder entre as nações, vai precisar fugir e se
esconder enquanto busca aliados nas outras nações dispostos a
ensiná-la a controlar os demais elementos.

Em sua busca pelo domínio do mundo, Arden não vai desistir


facilmente de sua arma mais poderosa e escapar dele será um dos
muitos desafios que Mari terá que enfrentar.

Atenção! Esse livro pode acionar gatilhos em pessoas sensíveis.


O herdeiro da máfia (Herdeiros da máfia Livro
10)

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Sinopse:

Dante Bellucci se tornou o chefe da máfia italiana. Desde criança,


ele sabia que quando esse momento chegasse, ele seria o homem
mais poderoso da Itália, capaz de decidir quem iria viver ou morrer.
Entretanto, isso não o privava de desafios, e lidar com uma mulher
se tornou o maior deles.
Liziane Sanchez era a única filha do chefe da máfia espanhola.
Após a morte do pai, ela lutou para ter a posição que era sua por
direito, ainda que a dificuldade de ser respeitada por homens fosse
enorme. Determinada a ditar as regras no seu país, ela se
transformou numa dor de cabeça aos Bellucci, quando interrompeu
a passagem do contrabando deles através do seu território.

Dante tinha que resolver esse enorme problema que estava


atrapalhando seus negócios, mas Liziane não estava disposta a
recuar diante das imposições do italiano. Inimigos declarados, com
uma explosão de ego e disputa por poder, falharam na enorme
tarefa de resistir ao tesão que queimava entre eles. Entretanto, o
que Dante não imaginava era ter um filho que a espanhola
escondeu dele.

Aviso: O herdeiro da máfia, livro 10 dos herdeiros da máfia, é um


volume único. Por ser com casais diferentes, cada livro da série
pode ser lido separadamente, mas o posterior contém spoilers do
anterior.
A série herdeiros da máfia contém spoilers da série Máfia
Bellucci.

ATENÇÃO! Essa história contém cenas impróprias para menores


de dezoito anos. Contém gatilhos, palavras de baixo calão e
conduta inadequada de personagens. Apesar de ter a máfia como
plano de fundo, esse não é um romance dark, se você espera cenas
de abuso sexual, esse livro não corresponderá as suas
expectativas.
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Acidentalmente Grávida: De repente amor

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Sinopse:

Hector Borges é o tipo certo de cara errado. Um homem jovem,


bonito e rico que poderia aproveitar a vida da forma que quisesse. O
CEO cafajeste colecionava conquistas e não “perdoava” uma mulher
bonita.

Alecsandra da Costa foi escolhida para passar despercebida por


ele e se focar no trabalho. Era uma ótima secretária e braço-direito
do chefe. Sabia das empregadas com que Hector se envolvia, mas
estava acostumada ao seu jeito.
Ela só tinha uma preocupação, ser uma boa funcionária e manter
o emprego. O que a jovem secretária não esperava era acabar
grávida do chefe ainda sendo virgem, mas um incidente mudará a
vida de ambos..
A menina dos marinheiros

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Sinopse:

Um romance militar de harém às avessas


Um navio no meio do oceano. Oito militares lindos e sarados.
Quem diria que ser deixada para morrer acabaria tornando a
existência de uma garota muito mais deliciosa e divertida?

Eu tinha uma vida que todos achavam perfeita, pai rico, um


namorando bonito e muitas festas em iates luxuosos. Até que o cara
em que eu mais confiava no mundo me abandonou a deriva. Fui
deixada em um bote e achei que morreria até que um navio da
Marinha me encontrou.

Os militares me trouxeram para dentro do barco. Fui cuidada,


protegida e alimentada. No entanto tivemos que esperar por um
bom tempo até terem a autorização dos superiores para me levar à
costa.

Estava com oito homens lindos que haviam ficado sozinhos no


mar há meses.

Era completamente impossível não olhar para eles com cobiça.

Eu queria recompensá-los por tudo e me tornar a menina deles


parecia uma ótima ideia.
O quarterback e a aluna exemplar

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Sinopse:

Enemies to lovers + Fake Date + Hot


[Livro único]

Ele tem vinte anos e é a estrela do time de futebol americano.


Ela tem dezoito e só pensa em estudar.
Não havia motivos para que os opostos se envolvessem e
acabassem em um namoro falso.
Luke Mazzi-Sartori era o quarterback da NYU. Além de um atleta
de destaque, tinha um império o aguardando para quando se
formasse. O herdeiro cresceu tendo sempre tudo o que quis.
Cafajeste inveterado, colecionava conquistas e nem se lembrava do
nome das mulheres com quem dormia.
Mariana Soares era a típica aluna exemplar. Sempre se esforçou
muito nos estudos e isso garantiu a ela uma bolsa em uma das
universidades mais prestigiadas do mundo. Com dezoito anos, não
tinha outro objetivo que não fosse se dedicar ao máximo e
aproveitar a oportunidade de ouro.

Luke e Mariana eram completos opostos, até se cruzarem e ele


fazer da garota um dos seus maiores objetivos. Ela não iria se
deixar seduzir pelo quarterback, sempre foi muito obstinada e não
seria um sorriso bonito que a faria mudar de ideia. No entanto,
armaram para os dois e, com um boato terrível que pode acabar
com a vida de ambos, vão precisar se unir.

Eles acreditavam que poderiam lidar com um namoro falso sem


se envolverem demais, iriam resolver a questão e cada um seguir a
sua vida. Entretanto, quando atração entra em jogo, é difícil evitar
um touchdown.
O brinquedo do mafioso (Herdeiros da máfia
Livro 9)

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Sinopse:

Giovane Bellucci aprendeu desde cedo que ele poderia ter o que
quisesse. Como um príncipe da máfia, sabe as regras do jogo.
Expert em tecnologia, ele cuida da empresa da família e é o hacker
da máfia.

Gabriela da Silva é uma estrangeira em terras italianas. Ela


trabalhava para uma grande empresa de tecnologia depois de ter se
formado na universidade de Roma. Tudo o que mais desejava era
construir uma vida no país pelo qual era apaixonada.

Ela já havia escutado rumores sobre a família Bellucci, mas não


fazia ideia do quanto estar perto deles era arriscado até chamar a
atenção do chefe.

Tornar-se o brinquedo de um mafioso poderia ser apenas o início


de uma vida muito perigosa para a qual ela não estava preparada.
Sacrificada (Império do Caos Livro 1)

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Sinopse:

Ele era o vilão do mundo dela...


Em um mundo corrompido e dominado pelos elementum, Arden
de Haddan se tornou o imperador do Caos. O brutal líder da Nação
do Fogo fez as cidades se ajoelharem diante da sua crueldade e
tirania. Seu nome era temido e ele fazia questão de lembrar aos
seus inimigos que não havia piedade para aqueles que o
desafiassem.

Mari era herdeira de um poderoso clã, mas foi rejeitada desde a


infância, tratada como a escória. Ela não era nada e o destino se
mostrou ainda mais cruel para a jovem inocente quando foi usada
em benefício de sua família.

Ao se ver cara a cara com um homem mais assombroso do que o


próprio Diabo, ela saberá que o seu sacrifício é apenas o início. Em
um jogo cruel de política e intrigas, Mari descobre mais sobre si
mesma e a proximidade com Arden evolui de pavor e repulsa a uma
paixão avassaladora. Entretanto, quando se há poder envolvido, o
preço sempre pode ser alto demais.
O amor que me rejeitou (Rancho Collins Livro
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Sinopse:

Um CEO cafajeste e arrogante.


Uma professora doce e amável.
Uma aposta do passado que a deixou de coração partido.

Justin Foster partiu de sua cidade natal há dez anos e sua vida
mudou completamente. O jovem rancheiro se tornou um grande
empresário do setor financeiro. Ele não tinha qualquer intenção em
retornar ao local onde nasceu, entretanto a morte do seu pai o
arrastou de volta ao passado.

Zoe Collins era uma menina apaixonada quando Justin a levou


para a carroceria da caminhonete e tirou a sua virgindade. Ela
entregou o coração e o teve despedaçado. Só conseguiu esquecê-lo
quando Justin foi embora, devido ao divórcio dos pais. Os anos se
passaram e Zoe imaginou ter seguido em frente, curado as
cicatrizes, mas rever o homem que a rejeitou e brincou com ela,
pode mudar tudo.
Falcão: O resgate do meu bebê (agents of
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Sinopse:

Por trás do sorriso enigmático e do rosto bonito do bilionário


Alexander Holles, existe muito mais do que sonham as solteiras de
Londres que cobiçam o homem. Além de herdeiro de uma família
tradicional inglesa, ele faz parte do serviço de inteligência da coroa,
atuando em missões ultrassecretas para defender o país de
ameaças de guerra.

Daniela Gladstone já deveria estar morta.


Após ser pega em uma emboscada, a agente foi capturada por
forças inimigas que a torturaram e mantiveram prisioneira. O que ela
não imaginava era que antes do cárcere ela houvesse engravidado
de Alexander.

Trancafiada em uma cela, Daniela deu à luz a um lindo menino


que foi arrancado dos seus braços instantes depois.
Alexander imaginava ter perdido o amor da sua vida, mas foi
surpreendido com a notícia de que além de Daniela estar viva, eles
tiveram um filho.

O agente vai precisar de todas as suas habilidades para


encontrar e resgatar o seu bebê.
Tommaso: Amor Eterno (Conexão V)

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Sinopse:

Tommaso Neri construiu um grande império no ramo de couro na


Florença italiana, mas o homem recluso levava uma vida reservada,
porque com exceção do seu braço direito, ninguém sabia que ele
era um vampiro.

Sua natureza não era o único mistério que rondava o empresário


e pintor renascentista. Há séculos ele perdeu o grande amor da sua
vida e aguardava uma promessa de retorno, afundando-se cada vez
mais na escuridão.

Micaela Benni aceitou uma proposta de emprego em Florença,


mas não esperava que o convite fosse mudar a sua vida
completamente. Seu encontro com o perigoso vampiro revelaria
segredos e verdades que ela poderia não estar pronta para lidar.
Um amor que sobreviveu há séculos pode não ser o suficiente
para convencer uma jovem amedrontada diante de um predador…
Comprada pelo juiz (Clube da Lei)

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Sinopse:

AGE GAP + Compra de virgindade + Gravidez acidental


Para ganhar uma aposta, ele a comprou.

O juiz David Nichols é um homem implacável, arrogante, bonito e


um cafajeste inveterado, que construiu uma carreira de sucesso no
judiciário de Chicago, mas uma ameaça à sua imagem surgiu com
uma ligação do passado.

Ionara Kennet finalmente conquistou o que havia sonhado,


tornando-se advogada de um prestigiado escritório, mas corre o
risco de perder tudo. Após entrar em um caso contra uma
companhia, seu passado foi revirado e pode ser exposto se ela não
abandonar seu cliente.
David e Ionara se conhecem, mas foram enterrados nas
lembranças um do outro. Porém a ameaça pode revelar que ele
comprou a virgindade dela e que Ionara precisava do dinheiro para
concluir a faculdade de direito.
Sete anos se passaram...

Eles pensavam que nunca mais cruzariam o caminho um do


outro, contudo, diante da possibilidade da carreira de ambos ser
destruída, precisarão se reencontrar e David vai descobrir que
aquela noite também gerou um garotinho que poderia chamá-lo de
pai.
Rejeitada pelo bilionário italiano (Magnatas
Europeus)

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Sinopse:

Um cafajeste a engravidou e rejeitou o bebê.

Rafaela Borges viveu o sonho de conhecer a Itália após ser


enviada a trabalho para o encantador país da Europa. O que ela não
previa era o envolvimento casual com um canalha.

Andrea Carraro era um bilionário do ramo dos vinhos que possuía


uma bela propriedade na região de Veneto, mas às vezes ele ia até
Veneza se passar por gondoleiro e se envolver com turistas que
nunca mais veria novamente.

Rafaela deveria ser apenas um desses casos, mas a moça fora


enviada para negociar a importação dos vinhos do bilionário. O que
a fez descobrir quem ele realmente era.

O destino fez com que o sexo casual gerasse fruto, mas o


cafajeste não acreditou que o bebê era dele.
O pai é o bilionário Grego

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Sinopse:

Ela queria uma criança para amar.


Ele já havia abandonado as esperanças de ser pai.
Uma bebê fofa vai uni-los.

Depois de perder o amor da sua vida, Carla tomou uma decisão,


que parecia a única forma de mantê-lo por perto, ter um bebê a
partir do esperma que o marido havia congelado antes de morrer.
Disposta a ser mãe solteira, a criança era uma chama de esperança
em meio à tragédia.

Mas a clínica cometeu um erro...


O bilionário Argos Kouris estava com o casamento em colapso.
Ele e a esposa já não se entendiam mais e a única saída era o
divórcio, mas ela recorreu a outra tentativa de inseminação artificial
que fracassou. O problema foi que a clínica trocou o seu material
genético e acabou inseminando uma desconhecida.
Inimigos também se amam

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Sinopse:

Um médico viúvo e arrogante.


Uma enfermeira determinada.
Uma bebezinha fofa para aquecer o coração de um pai.

O neurocirurgião Brandon Hanks sofreu uma perda terrível que


fez com que se afastasse de Dallas e fosse assumir uma pequena
clínica no interior.

O viúvo só queria fugir da dor, mas a enfermeira da cidade


pequena o enlouqueceu. Inimigos à primeira vista, nenhum dos dois
estava disposto a ceder, porém, a atração fez com que se
entregassem ao desejo.
Cora Collins não imaginava ficar grávida daquele médico
arrogante, muito menos ser abandonada quando ele foi embora.
Disposta a superar, iria criar a filha sozinha e não esperava que
Brandon voltasse.
O bebê do juiz

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Sinopse:

Um juiz cafajeste
Uma advogada recém-formada.
Um filho rejeitado para abalar as estruturas de um homem.

Tyler Lennox veio de uma família com uma forte tradição em


direito e se tornou um respeitado juiz. Diferente de seu irmão mais
velho, ele levava uma vida devassa e se divertia com todas as
mulheres possíveis.

Tatiane Fisher tinha o sonho de se tornar uma grande promotora


e via em Deborah Lennox uma inspiração. Conseguir um trabalho
como estagiária do seu maior modelo de carreira era uma enorme
realização, só que isso a colocou no caminho do juiz e Tyler não
deixaria escapar a jovem estagiária da sua irmã.

Ele rejeitou a gravidez, achava que o bebê não era seu, mas os
sentimentos podem mudar ao reencontrá-la no tribunal meses
depois.
A virgem e o CEO POPSTAR

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Sinopse:

Há muito tempo a minha vida se transformou, meus pais


morreram e eu deixei a minha infância pobre e tudo que estava
ligada a ela. Quinze anos se passaram e eu construí uma carreira,
me tornando CEO de uma gravadora de sucesso. Conquistei
prêmios, fortuna, fama e me adaptei a uma existência solitária.

Frio, distante, ambicioso e egocêntrico, não tinha motivos para


ser diferente até vê-la cantando...

Camile Parker era só uma garotinha quando eu a deixei. Eu


costumava protegê-la de tudo, éramos melhores amigos, mas muito
tempo se passou e eu não fui o único a mudar. Restava saber se eu
estava disposto a tê-la de volta na minha vida e para isso, abrir mão
do meu coração de gelo.
Uma grávida em apuros

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Sinopse:

Um CEO bilionário
Uma gravidez inesperada
Uma mulher em apuros

Eros Bianchi era o CEO de uma agência de publicidade em


ascensão. Prestes a se casar, parecia ter a vida perfeita depois que
uma de suas campanhas o fez ganhar o prêmio Cannes, entretanto
pegou a noiva transando com o seu melhor amigo no dia em que
trocariam votos.

Graça Rodriguez levava uma vida humilde como camareira em


um resort de luxo no Caribe e não esperava que o seu caminho
fosse cruzar com o do belo e irresistível canadense, que veio para o
hotel após uma desilusão amorosa.

Eles viveram uma intensa paixão, mas com dias contados,


porque Eros precisava retornar para seu país. Graça imaginava que
nunca mais voltaria a vê-lo, porém o envolvimento gerou frutos e,
um tempo depois da partida do CEO, ela descobriu que estava
grávida. No entanto, o bebê não era o único desafio da jovem, pois
seu irmão se envolveu com homens perigosos que estavam atrás
dela.

Eros não esperava ter uma mulher em sua vida de novo, mas
faria de tudo para protegê-la e ao seu filho.
Sob a proteção do mafioso (Herdeiros da
máfia Livro 5)

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Sinopse:

Ettore Bellucci é a mente mais brilhante por trás da temida máfia


italiana. Ele nasceu na família que lidera a organização e desde
novo aprendeu a cuidar dos negócios, tornando-os o seu principal
foco, pelo qual estava disposto a matar e morrer.

Nedja Al-Kudsi era uma jovem ingênua que viu seu mundo ruir
quando o pai foi assassinado. Tudo que amava e a pouca liberdade
que tinha foram arrancados dela de forma cruel e por pouco ela não
perdeu a própria vida, entretanto, continuar escapando dos
monstros que queriam matá-la seria um desafio que não poderia
cumprir sozinha.
Ettore tinha um objetivo: comprar tecnologia no Oriente Médio e
retornar para casa. Era evidente que ele não deveria ser notado,
tampouco se envolver em qualquer conflito local, mas quando a
moça foi atacada diante dele o seu instinto foi protegê-la. Era um
homem esperto, sabia que tinha de se livrar daquela confusão o
quanto antes, mas Nedja precisava dele e o único jeito de tirá-la
daquele local em segurança era casando-se com ela.

O matrimônio falso seria apenas o início de uma missão muito


mais desafiadora.
Esposa por obrigação do Sheik

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Sinopse:

O playboy Zyan Ahmad Al-Sabbah há dez anos afastou-se das


suas origens e tudo o que elas representavam, levando uma vida de
cafajeste nas passarelas da Europa, onde atuava como modelo.
Entretanto uma doença terminal acometeu seu pai, obrigando-o a
retornar ao Emirado e assumir os seus deveres como sheik. O que o
mulherengo inveterado não previa era que além de um reinado, um
casamento arranjado aguardasse por ele.

Regina era uma mulher doce, ingênua e inocente. Criada para o


matrimônio, ela temia acabar nas mãos de um homem tão cruel
quanto o próprio pai, quando ele escolhesse o seu futuro marido. Só
que a beleza inegável e o ar sedutor do jovem sheik pareciam tornar
a união uma tarefa mais tentadora.
Zyan fugiu dos deveres com o seu povo a vida inteira, mas com a
morte do pai ele já não podia mais. O casamento seria apenas mais
uma de suas obrigações, mas ele sempre se esforçou para ser um
homem diferente de seu progenitor e a presença da amável esposa
pode revelar espaços em seu coração que nem mesmo ele
conhecia.
Esse filho é meu!

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Sinopse:

Ter um filho sempre foi um sonho para mim, mas não significava que
eu precisava de um homem para isso. Decidi que teria meu bebê
sozinha, produção independente, mas eis que um cara bonito e rico
cisma de sacanear a vida de uma mulher bem-sucedida e cheia de
si. Foi exatamente o que pensei quando aquele sujeito arrogante
decidiu que tinha qualquer direito sobre o meu filho. Ele não deveria
passar de um doador de esperma, mas ao que parece, a clínica que
fez a minha inseminação artificial usou uma amostra que não
deveria, e um juiz sem noção determinou uma guarda
compartilhada. Teria que conviver com ele como "pai" do meu filho,
até conseguir reverter essa situação insana.
Aprisionada a L'Rell: Amores em Conyex

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Sinopse:

O poderoso príncipe, L’Rell não imaginava que o seu pai fosse


bárbaro o bastante para matar a mulher que ele amava e obrigá-lo a
se casar com uma desconhecida em uma maldita aliança visando a
evolução do seu povo.

Adolane tinha uma vida humilde e aprendeu desde nova a cuidar de


si sozinha. Esforçando-se para sobreviver em um mundo cruel, ela
não estava preparada para o pesadelo que recairia sobre ela
quando foi arrancada do bar onde trabalhava e levada para outro
planeta.

Ele não se importava se ela morresse.


Ela só queria uma forma de voltar para casa.

Para ambos, aquele casamento era uma obrigação. Eles não se


conheciam e nem queriam fazer com que desse certo, mas a
convivência pode fazer com que descubram novos sentimentos.
Dona da minha redenção (Irmãos Vaughn
Livro 4)

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Sinopse:

Mocinho? Não... eu fazia o tipo vilão, me divertia com o caos. A


minha família pensava que poderíamos viver o sonho americano,
que todos os Vaughn tinham o destino nobre de serem médicos,
mas nunca me encaixei nessa palhaçada.

Deslocado da família, ganhava a vida cuidando dos meus próprios


negócios e principalmente uma boate agitada no centro de Chicago,
por onde transitavam pessoas não tão corretas assim, talvez como
eu mesmo.
Numa noite, acabei me envolvendo em um jogo com um velho
conhecido. O traficante era péssimo e perdeu tudo para mim, mas
como compensação ele me ofereceu uma das garotas que tinham
chegado ao país.

Levar uma mulher para casa e torná-la minha propriedade nunca


esteve nos meus planos, muito menos perceber o quanto ela era
frágil e estava estilhaçada.

Eu gostava da confusão, então ela me atropelou.

Foi aí que percebi que para me consertar, só alguém mais quebrado


do que eu.
Os gêmeos e eu: Dupla Escolha

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Sinopse:

O conto que virou livro.


Sarah Walker não imaginava que ao realizar o sonho de ingressar
na Universidade fosse cruzar o caminho dos irmãos Lewis. Iguais,
mas completamente diferentes em personalidade, vão deixá-la louca
até saber que são dois.
Marcos e Mathews são populares no campus e conhecidos pela
fama de compartilharem mulheres. Filhos de um rico advogado de
Boston, foram mandados para Nova York com o objetivo de
esconder um escândalo, mas eles não conseguem ficar longe de
confusão.
Para os gêmeos, Sarah deveria ser só mais uma como tantas outras
calouras com quem já se envolveram, mas a vizinha de quarto vai
chamar a atenção dos dois e fazer com que a disputem.
Decidir entre a calmaria e a tempestade pode ser muito mais difícil
do que ela pensava.
Leiloada para o mafioso (Herdeiros da máfia
Livro 4)

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Sinopse:

Thiago Bellucci é herdeiro da família mais poderosa da Itália e


desde garoto aprendeu a derramar sangue. Ele se tornou assassino
da máfia, cruel, impiedoso e temido pelos inimigos. Não havia
motivos para que um homem como ele se envolvesse com mulher
alguma. Sem a obrigação de ter herdeiros, todas eram apenas
passatempos.

Juliana Kouris era uma garota simples, que nasceu em uma ilha de
pescadores. Com uma vida pacata, nunca imaginou que seus
caminhos se cruzariam com o de um mafioso. Ela não conhecia
esse mundo perigoso, mas uma decisão errada do seu pai culminou
no seu sequestro e fez com que descobrisse o lado mais cruel dos
seres humanos.

Thiago tinha uma missão: entrar, matar aqueles que haviam


desafiado a sua família e sair sem ser notado, mas ele se viu num
antro de pecado onde mulheres eram vendidas para quem pudesse
pagar mais. Ele não é uma alma boa e não estava ali para fazer
qualquer ato de caridade. Quando o seu caminho se cruzou com o
da jovem inocente, ela era só uma ferramenta para os seus planos,
mas seria o início do seu caos pessoal.
Quando Rosimeire ganhou uma viagem para Dubai, não previa se
tornar alvo dos desejos de um homem poderoso. Ela não queria se
envolver com alguém de uma cultura tão incompatível com a sua.
Entretanto, o sheik não desistiria dela.
Hassan estava disposto a tudo para torná-la sua.
Comprada pelo bilionário Grego

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Sinopse:

O bilionário grego do ramo hoteleiro, Klaus Demetriou, há cinco


anos sofreu um terrível acidente que custou a vida de sua esposa e
o deixou entre a vida e a morte. Resgatado por uma família de
pescadores, ele sobreviveu por um milagre, mas voltou para casa
com um grande débito.

Pedro Katsaros era um sujeito simples, que se orgulhava da vida


que levava e jamais pediria qualquer favor ao homem que resgatou
na praia, mas algo terrível aconteceu com a sua única filha e ele não
teve outra alternativa a não ser recorrer ao magnata mais poderoso
que conhecia.
Klaus não queria se envolver, preso a seus próprios fantasmas, não
precisava complicar a sua vida, mas não teve escolha. Dívidas
como a que tinha com o pescador precisavam ser pagas,
principalmente quando o pobre foi assassinado pelos mesmos
criminosos que levaram a sua filha. Rhea se tornou sua
responsabilidade e para trazê-la de volta em segurança precisaria
comprá-la.
A virgem que me pertence (Herdeiros da
máfia Livro 3)

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Sinopse:

Luca Mancini é o capo de Palermo, chefe da Sicília, o berço da


máfia italiana. Quando ainda era um menino, a sua vida foi marcada
pelo assassinato do seu pai e ele aprendeu muito rápido que a
máfia exige sacrifícios. Para se manter no poder e controlar uma
rixa com Roma, concordou com um casamento arranjado que
selaria o acordo e traria paz.

Perla é filha de Marco Bellucci, o chefe da máfia italiana, e


sempre soube que em algum momento o pai escolheria um marido
para ela. Só não previa que o desafio pudesse ser ainda maior do
que imaginava. Cresceu entre monstros, mas não estava pronta
para um ainda mais assustador.

Muito sangue foi derramado entre sicilianos e romanos na disputa


pelo poder da Itália e a união do casal não foi bem-vista por todos.
Luca precisava estar pronto para assumir a aliança e proteger Perla
a qualquer custo, principalmente quando um bebê está a caminho.
Alugada para o Natal

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Sinopse:

Estava no auge da minha carreira, CEO de uma empresa em


expansão tinha tudo o que acreditava ser necessário para uma vida
perfeita, mas a minha família discordava disso. As cobranças para
ter um relacionamento eram frequentes, mas sempre estive mais
preocupado com o meu trabalho e em curtir a vida do que em ter
uma esposa.

Com a proximidade do Natal e um grande evento em família,


estava farto de toda a cobrança, então decidi dar a eles o que tanto
queriam. Convenci uma garota que conheci numa festa a se passar
por minha namorada. Ela precisava de dinheiro e eu estava disposto
a contar uma mentira.
Alugar uma mulher para o Natal parecia a solução dos meus
problemas, mas poderia acabar me forçando a rever meus
conceitos.
Prometida para Killian: Alfas Gemini

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Sinopse:

O poderoso alfa, Killian Moon, tinha uma obsessão na vida e isso


fez com que, por séculos, ele perseguisse uma lenda. O sexy,
porém, mortal e perigoso líder de uma das maiores e mais temidas
alcateias, acreditava que se encontrasse uma Gemini seria ainda
mais forte.

Essa busca parecia inalcançável até que um lobo rechaçado e


solitário apareceu com uma proposta para que finalmente tomasse
posse da sua ambição. Ela era tudo o que Killian queria e ele
aceitou o acordo, mas no momento de finalmente conseguir sua
recompensa, a garota fugiu.

Depois da morte dos pais, tudo o que Lara tinha era a irmã, pois
foram aprisionadas pelo tio e viveram uma década longe do mundo.
Quando receberam a notícia de que seriam entregues a
pretendentes, elas se desesperaram com a possibilidade de serem
separadas, então decidiram fugir.

Killian estava disposto a tudo pela sua obsessão e faria o


necessário para encontrá-la. No entanto, quando ele finalmente a
encontrou, deparou-se com uma garota ingênua e indefesa que
precisava da sua proteção.
Casamento arranjado com o rei: Família Real
Fiori

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Sinopse:

Arthur Fiori é o rei de Grã-Aurora, um país insular que vive em


monarquia em pleno século XXI. Sendo um homem frio e impopular,
ele sempre esteve muito mais preocupado com números do que
com fotos e aparições públicas. Enquanto o povo queria adorá-lo,
ele focava na gerência do país e suas atitudes contribuíam para o
crescimento de um partido republicano que queria acabar com a
monarquia.
Desde a adolescência, Beatriz estava prometida ao rei de Grã-
Aurora. Criada para ser rainha, ela só via o seu noivo através de
notícias na internet, mas com a chegada do casamento, aquilo que
não passava de uma ideia se tornou real. A jovem gentil e
carismática logo ganhou a atenção e o coração do povo, mas a vida
dentro do palácio não era tão simples. Um casamento ia muito além
de um acordo, papéis assinados e alianças trocadas.
Um rei distante e frio.
Uma rainha jovem e gentil.
Um casamento de conveniência.
Arthur queria manter a menina longe, pensava que o casamento
não precisava ir além das aparências, porém, tudo o que Beatriz
mais desejava era um espaço no seu coração.
O pai misterioso do meu bebê

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Sinopse:

Rico desde que nasci, cresci numa redoma, distante das pessoas
comuns e convivendo apenas com outros como eu. Herdeiro,
prestes a assumir um império, era tratado como tal. Entretanto havia
algo em mim que me impulsionava a querer conhecer uma versão
do mundo onde as pessoas não me vissem como o futuro CEO da
Fontana Empreendimentos.

Em uma louca aventura, peguei o carro do jardineiro e me passei


por motorista de aplicativo, conhecendo pessoas diferentes e indo a
lugares da cidade que nunca havia frequentado. Foi então que eu a
conheci.
Aos prantos, Thaís entrou no carro depois de ter visto o ex-
namorado a traindo. Decidi levá-la para se distrair, mas a nossa
noite acabou indo muito além de um sanduíche e algumas risadas.

Então o meu pai ficou doente e eu precisei deixar de lado as


distrações para assumir a minha responsabilidade com todo o
legado que ele estava deixando para mim. Achei que nunca mais
voltaria a ver a Thaís, mas a reencontrei um tempo depois e
descobri que estava grávida e eu era o pai do bebê. Mas, para ela,
eu não passava de um humilde motorista, então vi a oportunidade
de construir uma relação que não fosse fundamentada no meu
dinheiro. Porém mentiras não duram para sempre. Em algum
momento eu teria que contar para ela quem eu era de verdade.
Meu bebê, minha redenção

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Sinopse:

Badboy e bilionário, eu sou o rei do Texas! CEO e principal dono


da Global Oils, uma enorme petrolífera, sempre tive tudo o que quis
e dinheiro suficiente para liquidar qualquer empecilho. Beleza e
charme também são umas das minhas qualidades, o que fazia com
que as mulheres se atirassem aos meus pés.

Prestes a iniciar a extração de uma nova jazida petrolífera, que


me tornaria ainda mais rico e poderoso, Olivia Garcia se tornou uma
pedra no meu caminho. A rancheira pobre se recusava a vender a
propriedade para a minha empresa, mas ela iria descobrir que
dinheiro não era o meu único poder.

Disposto a tudo para conseguir o que eu queria, me passei por


um cowboy, a seduzi e convenci a me dar o que queria.
O destino sempre esteve na minha mão, ou eu achava que era
assim até uma reunião de negócios em um restaurante me fazer
reencontrá-la com um bebê nos braços, que tinha os meus olhos
azuis, mudando instantaneamente a minha noção de amor...
Richard e a Sugar Baby: Amante Secreto

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Sinopse:

Richard Lewis tem dinheiro, status e é dono de uma das maiores


companhias de tecnologia do Vale do Silício, mas ainda é solteiro.
O CEO da Genesis Technology teve uma adolescência complicada.
Discriminado pelos seus colegas de classe, se isolou, no entanto,
sua inteligência fez com que construísse um grande império. Mas
um convite para uma reunião de ex-alunos o faria reviver momentos
ruins. Para compor a imagem de homem bem-sucedido, seu melhor
amigo contrata uma garota no site Sugar Baby para acompanhá-lo
nessa festa.
Kimberly Adams é uma aluna dedicada e se esforça para ser a filha
perfeita, pois quer orgulhar o pai, que se doou ao máximo para
cuidar dela. Determinada a se destacar na faculdade, ela quer se
ver longe de problemas, mas uma noite de loucura, proposta por
sua melhor amiga, pode mudar sua vida toda. Desafiada, Kimberly
aceita se inscrever em um site para se passar por sugar baby. Ela
acreditava que seria apenas uma noite na companhia de um homem
mais velho, sem qualquer intimidade, mas apenas um beijo será o
suficiente para que ele fique em sua mente.
Eles não deveriam voltar a se ver, entretanto o que não esperavam
era que na manhã seguinte entrariam na mesma sala de aula,
Richard como professor, um hobby que cultiva há alguns anos, e
ela, a aluna.
Eles são proibidos um para o outro, mas o amor não se importa com
obstáculos...
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Sinopse:

Há cinco anos, Jefferson Miller abandonou a sua família e a


empresa para viajar pelo mundo a bordo de um barco, em busca do
próprio destino. Depois de tanto tempo distante, ele retornou a São
Francisco para o enterro do seu irmão mais velho, aquele a quem
era mais apegado. Porém não esperava que, além da multinacional
do ramo esportivo, Jonathan também deixasse uma esposa no
testamento.
Para assumir a presidência da Athena, se tornar o CEO e trazer
estabilidade para os negócios diante do mercado, ele precisou
cumprir o último pedido do irmão: casar-se por meio de um contrato
com sua viúva, uma mulher dez anos mais jovem que ele e que só
conheceu no funeral.
Clare tinha o emprego dos sonhos trabalhando como secretária do
melhor amigo, à frente de uma das maiores companhias esportivas
do mundo, contudo um terrível acidente mudaria sua vida para
sempre. Jonathan jurou protegê-la e então decidiu casar-se com ela,
mas era um arranjo de fachada, que também o ajudaria a esconder
sua orientação sexual.
Virgem e viúva, não esperava viver um grande amor ao se ver
enredada em um segundo casamento de contrato, mas o que Clare
e Jefferson não imaginavam é que poderiam encontrar o seu porto
seguro nos braços um do outro.
Sedução por Vingança

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Sinopse:

Philip Carter é o poderoso CEO da Carter Atlantics, uma empresa


multibilionária com atuação no mundo todo. Rico, poderoso, frio e
solitário, ele tem tudo aos seus pés, mas nem sempre foi assim...
Órfão, precisou conquistar tudo por seus próprios méritos e não
deixar que nada nem ninguém ficasse no seu caminho.
Vitória vive em um dos bairros mais pobres de Nova York, perdeu a
mãe muito jovem, a irmã mais nova foi tirada do seu convívio, além
de ser obrigada a aturar o pai alcoólatra, que a fez crescer
acreditando que a culpa de todas as tragédias de sua vida era do
CEO da Carter Atlantics.
Com o objetivo de se vingar de Philip Carter, ela vai se tornar sua
secretária e usar todas as suas armas de sedução para descobrir o
ponto fraco daquele homem que ela acreditava ser o culpado de
todas as mazelas da sua vida.
Philip não queria se envolver com a secretária onze anos mais nova,
mas a convivência, o desejo, as insinuações e toda a atração
tornarão impossível conter seus instintos. O que começa com um
desejo por vingança pode mostrar a dois corações feridos o que
realmente é o amor.
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Sinopse:

Casar era algo que eu nunca tinha imaginado fazer. A vida de


solteiro me proporcionava muitos benefícios e eu usufruía muito
bem de todos eles.
Nasci numa família influente, dona de uma companhia aérea, e
sempre tive tudo, mas a política me deu poder. Porém, sempre fui
um homem muito ambicioso.
Eu queria mais, almejava a presidência do país.
Acreditava ser a melhor escolha, não apenas pelo meu ego, mas
pelos meus feitos políticos. Entretanto, muitos membros do partido
pareciam discordar da minha candidatura.
Não era o homem perfeito aos seus olhos, mesmo com todo o
dinheiro e influência. Eles preferiam outro candidato, alguém que
prezasse pelos valores tradicionais, um homem comprometido com
a família.
Eu precisava ser casado.
Mas o dinheiro poderia solucionar tudo, sem que eu tivesse que
mudar meu estilo de vida. Um casamento por contrato era o que eu
precisava.
Penélope é doze anos mais jovem do que eu, ingênua, pobre e
facilmente moldável. Ao meu lado, ela seria a decoração perfeita.
Nunca teve nada e iria se comportar para manter o mundo que
oferecia a ela.
Eu controlaria tudo, como sempre controlei. Mas não poderia
prever que ela seria capaz de se infiltrar nas barreiras do meu
coração.

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