II Seminário ATIID - Acessibilidade, TI e Inclusão Digital, São Paulo-SP, 23-24/09/2003

A PERSPECTIVA DE ESTABELECER INTERAÇÃO DO AUTISTA

EM MEIO INFORMÁTICO

Marilei de Fátima KOVATLI, João Bosco da Mota ALVES, Elisabeth

TORRES
UFSC / Universidade Federal de Santa Catarina, RExLab -
Laboratório de Experimentação Remota, Florianópolis-SC, Brasil
marilei@inf.ufsc.br

RESUMO: Este artigo descreve um estudo de caso, demonstrando como

um ambiente modelado de acordo com as necessidades do aluno
possibilita situações de interação entre o autista e o meio informático.
Este projeto foi aplicado em uma turma de alunos portadores de
transtorno invasivo do desenvolvimento – autismo, no Instituto de
Educação Especial “Professor Manoel Boaventura Feijó” da APAE de
Florianópolis. Neste trabalho é descrita uma experiência pedagógica que
tem por objetivo verificar a utilização de ambientes interativos como
suporte para o desenvolvimento cognitivo de pessoas com transtorno
autista.

INTRODUÇÃO em uma escola da educação especial.

Esta experiência investiga a
Os transtornos invasivos do possibilidade de estabelecer processos
desenvolvimento formam um grupo de de interação do autista com a máquina,
características psiquiátricas que através do uso de um ambiente de
comprometem múltiplas áreas do aprendizagem modelado de acordo com
desenvolvimento, dentre elas as as necessidades específicas do aluno.
habilidades sociais, o desenvolvimento
da linguagem e o repertório OBJETIVOS
comportamental, que não se
desenvolvem de maneira adequada ou O computador permite a criação de
então são perdidos no início da infância. ambientes de aprendizagem adequados
O transtorno autista é ao desenvolvimento das potencialidades
caracterizado por comprometimentos de crianças com dificuldades de
nas interações sociais recíprocas, aprendizagem. Nesses ambientes é
desvios na comunicação e padrões possível criar situações que propiciem o
comportamentais restritos e desenvolvimento intelectual, social e
estereotipados; segundo (Kaplan, afetivo dos indivíduos com necessidades
1997) mais de dois terços dos especiais.
indivíduos com transtorno autista têm Os objetivos deste trabalho são
retardo mental. proporcionar condições para que se
Este artigo apresenta a estabeleçam processos de interação dos
possibilidade de trabalhar a informática alunos autistas e o meio informático, de
educativa com uma turma de alunos modo que esses processos possam
autistas, demonstrando como os desencadear o desenvolvimento de suas
recursos tecnológicos podem ser potencialidades tanto no campo social,
utilizados no ambiente de sala de aula cognitivo, como no afetivo.
 II Seminário ATIID - Acessibilidade, TI e Inclusão Digital, São Paulo-SP, 23-24/09/2003
METODOLOGIA
A modelagem de um ambiente de
aprendizagem interativo considerando
as necessidades dos alunos, pode
estabelecer situações que favoreçam o
desenvolvimento da cognição.
Quando um ambiente é modelado
de acordo com as significações dos
alunos, com suas reais necessidades,
tem-se uma maior probabilidade de
atingirmos êxito nos objetivos
propostos. É papel da escola
estabelecer condições que propiciem
aos alunos com necessidades especiais
a efetivação de sua aprendizagem e
inclusão na sociedade. O acesso às
tecnologias pelos alunos com
necessidades especiais é um problema
que deve ser repensado, pois implica
em um uso dessas ferramentas de uma
forma diferenciada, visto que os
softwares e os sites existentes em geral
estão despreparados para este tipo de
atendimento.
Considerando os diferentes níveis
de aprendizagem e o diferencial entre o
desenvolvimento da aprendizagem nas
crianças da educação especial e nas
demais (CAMPOS, 1984), enfatiza-se
que todas essas especificidades
existentes podem interferir na
aprendizagem, sendo esta considerada
um processo fundamental da vida, onde
todo o indivíduo desenvolve os
comportamentos que o possibilitam a
exercer sua cidadania.
Quando se modelam ambientes
com fins educacionais, deve-se levar
em conta o público alvo e seus
interesses, bem como uma definição da
metodologia para atingir seus objetivos
propostos.
Este experimento foi dividido em
várias etapas: observação em sala de
aula e em laboratório de informática;
utilização de softwares educativos;
modelagem do ambiente; construção e
experimentação do ambiente;
observação e análise das atividades em
meio informático.
De acordo com MORAN (2000),
para os alunos, a questão da estética é
uma qualidade fundamental de atração,
pois uma página bem apresentada,
oferecendo vários recursos atraentes,
tem maior probabilidade de ser
acessada, ser selecionada e pesquisada.
Considerando-se esta questão, ao fazer
a modelagem de um ambiente com fins
educacionais deve-se primeiramente
procurar conhecer as especificidades da
turma, para descobrir qual mecanismo
será apropriado para cada aluno, para
então projetar atividades que
contemplem estas necessidades.
Um ponto a ser destacado em
relação ao comportamento dos autistas
é a questão da tolerância frente as
atividades a serem executadas e o
tempo necessário para desenvolvê-las,
pois eles apresentam uma insistência
em repetir as tarefas, o que leva
também a uma resistência em relação à
mudanças na rotina. No caso
investigado, introduzir uma nova
ferramenta no lugar do software
Micromundos constitui-se um desafio,
que precisa de tempo e habilidade por
parte do professor.
Com o material coletado nas
atividades realizadas em sala de aula e
laboratório de informática, criou-se um
banco de dados, que possibilitou a
escolha dos elementos significativos
para a construção do ambiente de
aprendizagem. O ambiente foi
modelado para apresentar as seguintes
tarefas: exercício de reconhecimento de
expressões faciais; percepção;
desenvolvimento da escrita; relações
entre comparações de expressões
faciais.
Na construção do protótipo do
ambiente foram observados alguns
 II Seminário ATIID - Acessibilidade, TI e Inclusão Digital, São Paulo-SP, 23-24/09/2003
itens definidos na proposta de BARTHET
(1998) sobre as recomendações
ergonômicas para definição da interface
de aplicações interativas. Uma das
recomendações observadas foi quanto à
sucessão de operações, que enfoca a
adequação entre a ordem das
operações fixadas pela máquina e
aquela necessária ao aluno para
executar sua tarefa independentemente
do ambiente. Uma das características
de sucessão tem como fonte a estrutura
do software que, neste ambiente, já
está determinada na representação
conceptual das telas e seus links.
Quanto à recomendação sobre a
linguagem de interação, procurou-se
usar uma linguagem acessível para as
dificuldades apresentadas pelos alunos
e utilizou-se de linguagem simbólica,
com fotografias, desenhos e símbolos,
para que o aluno tivesse condições de
ordenar as operações que deseja que a
máquina efetue; usou-se páginas de
hipertexto na interpretação das
respostas que lhe são fornecidas após a
execução das operações solicitadas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para ser possível observar o processo
de interação do uso do ambiente pelos
alunos, optou-se por serem deixados
livres para explorarem e como é o caso das comparações de
experimentarem o ambiente. Foram
observadas as reações dos alunos
quanto ao reconhecimento das imagens
e dos recursos apresentados.
Nesta investigação, as intervenções
só ocorrem mediante solicitação do
próprio aluno, ou quando a alunos.
pesquisadora percebe que o aluno está
com dificuldades para assumir o
controle da atividade no ambiente.
Ressalta-se que intervenções em
momentos inadequados podem
modificar o desenvolvimento do
trabalho e constituir um viés no
resultado da análise.
Na modelagem do ambiente
considerou-se o modo como se dá o
raciocínio do aluno, estando-se atento
ao que o aluno diz ou faz mas sem
corrigir as palavras digitadas de acordo
com o seu próprio raciocínio; na
operação da escrita é utilizado um leitor
de tela que fornece feedback para o
aluno, fazendo com que ele repense
sobre o problema e ele mesmo construa
sua conclusão.
Cabe salientar que este ambiente é
um protótipo de um ambiente de
aprendizagem interativo e foi
desenvolvido a partir de objetivos claros
e específicos para atender a um
determinado público, objetivando que
este estudo possa trazer uma
contribuição para a educação ao tornar
o uso da tecnologia disponível de uma
forma mais adequada às reais
necessidades dos alunos.
Neste trabalho, observou-se como
o uso do computador pode contribuir no
desenvolvimento da aprendizagem dos
alunos com necessidades especiais. O
ambiente possui alguns recursos que
procuram despertar no aluno a
curiosidade de saber o que irá aparecer
após uma ação (como o clique do
mouse) e que relações poderão ser
feitas a partir de situações de desafios,
expressões faciais.
É importante ressaltar que para
se fazer uma análise dos resultados que
podem ser obtidos através da utilização
de um ambiente interativo, exige-se um
tempo maior de experimentação pelos
A experiência vivenciada
forneceu um referencial para verificação
de como é possível integrar as
ferramentas tecnológicas no sistema
educacional com alunos com
necessidades especiais.
 II Seminário ATIID - Acessibilidade, TI e Inclusão Digital, São Paulo-SP, 23-24/09/2003

REFERÊNCIAS MORAN, JM (2000) “Ensino e

Aprendizagem Inovadores
BARTHET, MF (1998) Logiciels com Tecnologias”
interactifs et ergonomie. Informática na Educação: Teoria
Dunod, Paris. & Prática,- vol. 3, nº1. p.140-
141. Porto Alegre: UFRGS.
CAMPOS, DMS (1984) Psicologia da Programa de Pós-Graduação em
Aprendizagem. Petrópolis: Informática na Educação.
Vozes, 16ed.
Importante:
KAPLAN, H (1997) Compêndio de
Psiquiatria – Ciências do Qualquer citação deste texto ou partes
Comportamento e Psiquiatria dele, sob qualquer forma ou meio, deve
Clínica. 7ª edição. Porto Alegre: obrigatoriamente incluir, além do título
Artes Médicas. e autor, a menção de "Anais do II
Seminário ATIID, São Paulo-SP, 23-
24/09/2003" disponível online em:
http://www.fsp.usp.br/acessibilidade