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Questão de aula – Educação Literária

Letras em dia, Português, 12 .° ano

Nome: N.º: Turma:

Avaliação: O(A) professor(a):

Fernando Pessoa ortónimo

Lê atentamente o poema que se segue.

Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.


Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
5 Quem tem alma não tem calma1.
Quem vê é só o que vê.
Por isso, alheio, vou lendo
Quem sente não é quem é.
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
Atento ao que sou e vejo,
20 O que passou a esquecer.
Torno-me eles e não eu.
Noto à margem do que li
10 Cada meu sonho ou desejo,
O que julguei que senti.
É do que nasce, e não meu.
Releio e digo, «Fui eu?»2
Sou minha própria paisagem,
Deus sabe, porque o escreveu3.
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só. PESSOA, Fernando, 2008. Poesia do Eu.
15 Não sei sentir-me onde estou. 2.ª ed. Lisboa: Assírio & Alvim (pp. 210-211)

1. Variantes dos versos 5 e 6: «De tanto ser, não conheço/Mudaram-me sempre o preço.»; 2. Variante do verso: «O que anotei
era eu?»; 3. Variante do verso: «Sabe-o Deus, que é quem [porque o] ‘screveu».

1 Atenta na primeira oitava do poema e explica a relação que se estabelece entre os primeiros quatro
versos, destacando a expressividade:
a. do tipo de frase utilizado;
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b. das formas verbais e respetivo(s) tempo(s).

1.1. Explicita o valor da anáfora usada no final da estrofe.

1.2. Refere o motivo apresentado para a perda de identidade do «eu».


2 Na segunda estrofe, o sujeito poético apresenta o(s) resultado(s) da sua inconstância psicológica.
Menciona-o(s).

2.1. Transcreve o verso que sintetiza a sua personalidade e comenta a sua expressividade.
Sugestões de resolução
Letras em dia, Português, 12 .° ano

3 Relaciona o conector e o complexo verbal presentes no verso 17 com o conteúdo da última oitava. LDIA12DP © Porto Editora
Questão de aula – Educação Literária
Letras em dia, Português, 12 .° ano

Questões de aula – Educação


Literária
Fernando Pessoa ortónimo, p. 63
1. a. Através de frases de tipo declarativo, o sujeito
poético pronuncia-se sobre o seu estado psicológico
e a sua personalidade.
b. As formas verbais usadas pelo eu lírico
denunciam a sua estranheza («estranho») face a si
mesmo, resultante da sua permanente mudança
(«mudei»). Estas conclusões são o resultado da sua
autoanálise («achei»), numa reflexão que parte das
transformações sentidas no passado (formas verbais
no pretérito perfeito do indicativo: «mudei» e
«achei») e que determinaram o que sente no
presente (formas verbais no presente do indicativo:
«tenho» e «estranho»).

1.1. A anáfora do pronome contribui para a


indefinição em torno da identidade e unidade do
sujeito poético.

1.2. O «eu» sente perder a sua identidade por «tanto


ser» e só ter «alma», ou seja, por sentir e pensar de
modos distintos e, por essa razão, não ser «quem
é».

2. A inconstância psicológica provoca no sujeito


poético uma transformação noutras figuras («Torno-
me eles», v. 10), que sonham e desejam
independentemente de si mesmo. Por isso, passa a
entender-se como uma «paisagem» (v. 13), um
pano de fundo, um corpo por onde circulam outros e
por onde ele apenas cumpre uma «passagem» (v.
14), sem uma existência completa («Não sei sentir-
me onde estou.», v. 16).

2.1. «Diverso, móbil e só» (v. 15), com uma


gradação que acentua o isolamento do «eu»,
resume o entendimento que ele tem de si próprio:
múltiplo e fragmentado («Diverso»), causa e agente
inconstante de outras existências («móbil») e, por
isso, solitário («só»).
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3. A última estrofe, como o conector «Por isso»
anuncia, apresenta as consequências da maneira de
ser do sujeito poético descrita nas estrofes
anteriores, destacando-se a ideia de que continua o
seu processo de autoanálise, sugerida pelo recurso
ao complexo verbal «vou lendo».

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