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A ESCOLA INGLESA

DA PSICANÁLISE
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Sumário
MELAINIE KLEIN -------------------------------------------------------- 3

AS DIFERENÇAS NOS ESTUDOS DE MELANIE KLEIN -------------- 4

TEORIA DAS RELAÇÕES OBJETAIS ----------------------------------- 5

PANORAMA DAS PUBLICAÇÕES E INTRODUÇÃO À OBRA DE


FAIRBAIRN: MUDANÇAS DA CONCEPÇÃO TRADICIONAL DA
TEORIA DA LIBIDO. ----------------------------------------------------- 6

A PSICOGÊNESE DO EGO ----------------------------------------------- 7

ESTRUTURAS ENDOPSÍQUICAS DINÂMICAS: INSEPARABILIDADE


DE ESTRUTURA E IMPULSO ------------------------------------------- 8

O APARELHAMENTO PSÍQUICO EM FAIRBAIRN -------------------- 9

AS FANTASIAS NOS CONTEÚDOS PATOLÓGICOS E NO TRABALHO


ANALÍTICO -------------------------------------------------------------- 10

POSIÇÃO ESQUIZOPARANOIDE E DEPRESSIVA SEGUNDO


MELANIE KLEIN -------------------------------------------------------- 11

CONCEITOS INTRODUTÓRIOS EM WINNECOTT ------------------- 12

A INFLUÊNCIA DECISIVA DO AMBIENTE SOBRE O


PSIQUISMO ------------------------------------------------------------- 13

CASO DICK – MELAINE KLEIN --------------------------------------- 14

ESTUDO DE CASO WINNECOTT ------------------------------------- 15

CASOS INTRODUTÓRIOS E AVANÇADOS -------------------------- 16


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A ESCOLA INGLESA DA PSICANÁLISE

Chegando à Inglaterra em 1926, Melanie Klein (1882-1960) passou a


trabalhar com Ernest Jones. A sua teoria psicanalítica divergiu e
diferenciou-se das teorias de Freud em alguns pontos. Dentre eles,
está o fato de que ela deu muito mais atenção às crianças do que o
pai da psicanálise. Por outro lado, é importante considerar que Klein
sempre se considerou como uma seguidora dele, e sempre fez questão
de expor isso.
Entretanto, Melanie propôs inovações ao ter dedicado parte de seu
estudo psicanalítico às crianças, diferente de Freud, que não
acreditava que isso fosse possível. Mas um dos maiores
desapontamentos de Melanie foi o fato de Freud ser indiferente em
relação a seus trabalhos. Anna Freud também desenvolveu um
trabalho psicanalítico sobre crianças, entretanto o estudo de
Melanie sobre o assunto é bastante diferenciado do dela.
Melanie Klein desenvolveu um novo ramo da psicanálise. Sendo as
crianças o foco de parte de seu estudo, ela desenvolveu uma terapia,
por meio do jogo, para tratar de crianças a partir de dois anos
através da ludicidade.
Diferente de Freud, Melanie atribuía maior importância às primeiras
fases do desenvolvimento da criança, ou seja, fases anteriores ao
complexo de Édipo. Ela afirmava que os primeiros estágios da vida
psíquica eram muito mais importantes do que declarou Freud em
seus estudos. Os estudos de Klein acabam, assim, indo além da
própria psicanálise, sendo também pertinentes a outras áreas,
inclusive à educação e no que concerne ao desenvolvimento infantil.
O seu trabalho foi e ainda é considerado como muito importante,
principalmente após a morte de Freud. Inclusive diversos estudiosos
da área, na época da morte do pai da psicanálise, apontaram-na
como a sua sucessora.

MELAINIE KLEIN

CONCEITOS INTRODUTÓRIOS DE MELAINIE KLEIN

As contribuições de Melanie Klein para a psicanálise vão além de seu


estudo voltado para as crianças. Dentre essas contribuições,
algumas são consideradas como conceitos clássicos, são eles:
1. Conceitos a respeito das etapas mais primitivas do
desenvolvimento psicossexual.
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2. Conceito de posição.
3. Conceitos sobre a formação do ego e do superego e conceito a
respeito da situação edipiana.
4. Conceito de mundo interno.
5. Novo status dado ao objeto e sobre as relações internas de objeto.
6. Conceito dos mecanismos de introjeção e projeção, os quais são
tidos como atuantes desde o início da vida psíquica em bebês. Esse
conceito foi desenvolvido intensivamente, a posteriori, cujos estudos
culminaram com a conceituação da identificação projetiva.

As Diferenças nos Estudos de Melanie Klein

Para muitos estudiosos, a dinâmica a respeito do psiquismo pode ser


considerada como a principal questão que diferencia os estudos de
Melanie dos de Freud Este teoriza o desenvolvimento psíquico a
partir de três fases, consideradas como estanques: a fase oral, a fase
anal e a fase fálica.
Klein propõe a esse período uma dinâmica até então não considerada
pela psicanálise. Primeiramente, ela desconsiderava a palavra
‘fase’. Segundo ela, existem ‘posições’ que não terminam e que se
alternam durante a vida. Além disso, para ela, essas posições sequer
se sucedem, tal como defendeu Freud. Na teoria de Melanie Klein, já
no primeiro ano de vida a criança alterna, em seu psiquismo, as
posições esquizoparanóide e depressiva. Para ela, essas ‘posições’
não terminam, em função de um pretenso desenvolvimento psíquico.
Sendo assim, esse comportamento de alternância se repetirá
constantemente.
De acordo com sua teoria, a posição denominada esquizoparanóide
engloba as ansiedades de natureza persecutória. Já a posição
depressiva dá origem a todas as ansiedades advindas do estado
depressivo. Dessa forma, todos os problemas emocionais são
analisados a partir dessas duas vertentes ou posições.
Para Klein, apenas o equilíbrio entre essas duas posições pode
equacionar o
psiquismo. Por meio desse equilíbrio, podem se erradicar problemas
como depressão, esquizofrenias e neuroses.
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TEORIA DAS RELAÇÕES OBJETAIS

Mudanças e diversificações da psicanálise no decurso de sua história


justificaram se na ampliação do seu alcance terapêutico às
configurações psicopatológicas originariamente dela excluídas (as
psicoses e as perversões, por exemplo) e no entendimento de
transformações das demandas de tratamento que a ela chegavam,
apresentando novas organizações subjetivas e novos sintomas.
A compreensão da existência de novas demandas se fez parceira de
mudanças sociais e culturais, acontecidas de maneira mais ou
menos abruptas e mais ou menos perceptíveis ao momento. Foi
assim que, na década de 40 do século passado, devido aos efeitos da
Segunda Grande Guerra Mundial, traumatizados e órfãos tornaram-
se objeto de preocupação de analistas como Fairbairn e Winnicott,
sendo que tais casos, em sua maioria, eram formados pelo que se
denominaria posteriormente de pacientes-limite ou borderlines, cuja
configuração psíquica supõe-se na fronteira entre a neurose e a
psicose.
Para apreender os fenômenos instituídos por essa nova clínica,
importantes mudanças na compreensão da psicanálise foram
realizadas, o que resultou, dentre outras coisas, em tornar
secundário um de seus pilares segundo a tradição freudiana, isto é, a
sexualidade.
As teorias das relações de objeto, em suas diversidades, surgem
dessa nova clínica. Como base comum, elas têm o objetivo de
apreender os mecanismos mais originais da constituição do ego,
destacando a decisiva importância das primitivas relações de objeto
em substituição à influência dos impulsos libidinais.
As teorias de relações de objeto têm sua origem, de forma efetiva, em
Melanie Klein e Willian Ronald D. Fairbairn, autores que se
detiveram na concepção do objeto na sua relação com o sujeito (ou
vice-versa), mas também do objeto dito interno, isto é, o objeto
representado, assimilado ou incorporado.
A noção de um mundo interno de objetos associados pela
identificação ao ego ou a suas partes cindidas compõe, de modo
geral, o fundamento de suas teorias, apesar de as concepções desses
dois autores possuírem consideráveis diferenças, que não serão aqui
pormenorizadas.
É fato que, na história da psicanálise, as relações de objeto e a
sexualidade não encontraram integração na teoria e no tratamento,
sendo que a importância conferida a um desses aspectos tende a
excluir o outro. Tal incompatibilidade pode ser observada nas
dispersões no movimento psicanalítico contemporâneo.
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Tendo em vista a história das incompatibilidades entre a


sexualidade e as relações de objeto, a concepção fairbairniana,
tomada como radical e paradigmática com respeito ao abandono do
papel da sexualidade na constituição psíquica, desafia-nos à
exposição e reflexão sobre o pensamento de Fairbairn, com sua
exclusiva ênfase nas relações do ego com o objeto para a
compreensão da constituição e estruturação psíquica: a base
fundamentalmente esquizoide da personalidade e a reconsideração
quanto à natureza da libido com a inversão de sua meta são os
aspectos marcantes de sua concepção de personalidade.

PANORAMA DAS PUBLICAÇÕES E INTRODUÇÃO À OBRA DE


FAIRBAIRN: MUDANÇAS DA CONCEPÇÃO TRADICIONAL DA
TEORIA DA LIBIDO

Willian Ronald D. Fairbairn (1889-1964) desenvolveu sua obra do


final dos anos 20 até o começo da década de 50 do século XX. Ela foi
reunida em três livros: Estudos Psicanalíticos da Personalidade
(1952/1980) e dois volumes intitulados FromInstinctto Self.
O pensamento de Fairbairn desenvolveu-se no sentido da
formulação de uma estruturação psíquica egóica cindida.
Acompanharemos seu caminho tal como expresso em Teoria das
Relações Objetais da Personalidade, privilegiando seus momentos
teóricos e metapsicológicos. Ao final, exporemos nossa compreensão
das teses que permeiam sua obra, desdobrando-nos, então, em
considerações finais.
A base da teoria da personalidade em Fairbairn é a descrição dos
fatores esquizoides da personalidade na vida psíquica rudimentar da
criança.Em Fatores Esquizoides da Personalidade, de 1940, o autor
apresenta a tese de que as defesas dissociativas são fenômenos
presentes na personalidade de um modo geral.
Respaldando-se na experiência clínica e interessado na psicogênese
do ego, ele identifica aproximações entre os processos do ego
rudimentar da criança e os do esquizoide, que seriam:
a) Tendência à orientação para um objeto parcial;
b) Predomínio do tomar sobre o dar na atitude libidinal;
c) Tendência à incorporação e à internalização do objeto;
d) Sobrevalorização dos estados opostos de plenitude e vazio.
Estas aproximações já trazem de modo não totalmente explícito a
preponderância do objeto na determinação das atitudes libidinais, e
é isso que constitui o gérmen das principais críticas de Fairbairn à
teoria da libido freudiana, concebendo, assim, a mudança da meta
libidinal.
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Ao escrever Revisão da Psicopatologia das Psicoses e Psiconeuroses,


em 1941, ele expõe sua compreensão acerca das limitações
intrínsecas à teoria da libido, a fim de justificar a proposição de uma
teoria do desenvolvimento com base na qualidade da dependência do
objeto.
O ponto de partida privilegiado por Fairbairn para sua crítica é a
noção de zona erógena, como desenvolvida por Freud e modificada
por Abraham, porque tal noção conduziria ao desprezo da qualidade
e da função do objeto.
Diante da compreensão da manifestação do ego como "uma atitude
libidinal em busca do prazer", circunscrito na zona erógena,
pergunta-se: por que um lactante chupa o polegar? Nessa simples
pergunta jaz todo o destino do conceito de zonas erógenas e a forma
da teoria da libido baseada nele. A resposta de que o lactante chupa
o polegar porque lhe proporciona prazer erótico é convincente,
porém na realidade nos afasta do tema. Por que o polegar? Porque
não tem um seio para chupar.
O autor sugere que a criança, ao depender de uma relação que não
pode estar atenta a todas as suas necessidades, estabelece técnicas
que façam reparação a seu vínculo com o objeto, o que equivaleria a
chupar o dedo. A ausência do seio, como uma relação de objeto
insatisfatória, seria o determinante para uma atitude libidinal oral,
e não o prazer suposto nessa zona corporal.
Prosseguindo, Fairbairn contrapõe-se à suposta perspectiva
freudiana segundo a qual o desenvolvimento libidinal se daria no
sentido de uma integração das zonas erógenas em favor da
supremacia da atitude genital. Em seu discordante ponto de vista,
apenas uma relação de objeto satisfatória poderia levar à integração
do ego e à atitude genital, pois é determinante para a justa
compreensão do desenvolvimento da libido a relação de objeto e a
integração do ego que ela propicia.
A mudança assim entendida da meta libidinal, de busca do prazer
para a busca do objeto constitui-se no fundamento das
transformações das proposições introduzidas por ele.Fairbairn
golpeia a teoria da libido para provar a existência do mundo externo
(os objetos) e a necessária contribuição para o desenvolvimento do
ego.
No mesmo texto de 1941, Fairbairn descreve uma teoria do
desenvolvimento, e é curioso como a nomeia: "Desenvolvimento das
relações de objeto baseada na qualidade de dependência em relação
ao objeto". A curiosidade dessa afirmação é que ela conduz ao
entendimento de que o desenvolvimento do ego não se processa
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de modo autônomo, ao contrário, portanto, do que julga ser o


desenvolvimento da libido a partir das zonas erógenas e da busca do
prazer.
De fato, para Fairbairn o processo de desenvolvimento da
personalidade definese como desenvolvimento da relação de objeto.
O ego está, inicialmente, submetido à dependência radical do objeto.
O processo de desenvolvimento consiste na diminuição da
dependência e na progressiva diferenciação com respeito ao objeto.
O propósito (um certo propósito egóico, como se verá à frente, com a
noção de ego rudimentar) desse processo seria o de salvaguardar a
perda do ego diante da circunstancial, porém inescapável
inadequação das relações de objeto.
São basicamente três, segundo Fairbairn, as fases do
desenvolvimento da relação de objeto:
1ª) dependência infantil – na qual existem duas subfases orais: a
primeira, pré-ambivalente em relação ao objeto (sugar ou recusar o
seio), a segunda, ambivalente (sugar ou morder o seio) –;
2ª) etapa de transição
3ª) dependência madura.
As principais características da dependência infantil são as atitudes
incorporativas e a identificação indiferenciada com o objeto. Essas
características fazem com que a perda ou o afastamento do objeto
sejam acompanhados pelo sentimento de aniquilação do ego. Esse
aspecto é extremamente significativo na teoria, é o motivo que leva
à esquizoidia como condição estruturante, pois todos passam,
inevitavelmente, por essa extrema dependência oral do objeto.
Na etapa de transição, ocorre o início da diferenciação com o objeto.
Para evitar que as frustrações impostas pelas relações objetais
conduzam à perda do ego, a defesa é acionada. Sendo insuportável
para o ego a ambivalência responsiva do objeto às suas
necessidades, o ego cinde o objeto em suas partes: o aceito e o
recusado. Esses objetos serão, no processo de desenvolvimento,
internalizados ou externalizados. As neuroses clássicas são
consideradas como conflito nessa fase.
Já a dependência madura, última fase do desenvolvimento das
relações de objeto, é caracterizada pela possibilidade de relações
menos dependentes do objeto. Fairbairn não pormenoriza técnicas
defensivas nessa fase, apenas indica que o grau de dependência é
diminuído, o que se esperaria de um adequado desenvolvimento.
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O desenvolvimento das relações de objeto está, portanto,


relacionado com o grau de identificação do ego com o objeto e com as
técnicas para lidar com suas relações.
Quanto maior o número de estratégias dissociativas para lidar com o
objeto, maior seria a dependência infantil, ou a sua permanência e
não-superação.

A PSICOGÊNESE DO EGO

O primeiro momento em que Fairbairn fornece indícios de uma teoria


da psicogênese do ego é em 1940, quando descreve o ego da criança
como um ego bucal. Como o autor não volta a tematizar o caráter
desse rudimento egóico, não fica clara sua natureza, mas é certo que
em suas teorizações não há lugar para compreensões de egos
rudimentares constituídos como efeitos das ações de instintos de
vida ou de morte, que procuram o objeto para a gratificação.
Progredindo, Fairbairn mostra em 1941 uma original compreensão
das relações primitivas de objeto, aproximando as incorporações de
verdadeiras assimilações dos objetos reais e concretos. O seio da
mãe e o leite materno irão dar os primeiros contornos egóicos à
criança. Em razão disso, as falhas inevitáveis nas relações objetais
primitivas estruturam o ego por meio de processo defensivo, como
veremos à frente. Tais falhas correspondem à angústia de destruição
e morte para a criança, que está dependente do encontro com o
objeto.
A concepção de Fairbairn não exclui ou descarta a ideia de um ego
inicialmente constituído, mesmo que radicalmente dependente do
objeto. Este paradoxo pode ser entendido como a necessidade de se
adotar simultaneamente duas perspectivas aparentemente
excludentes:
1) A do ego rudimentar e, nem tanto, já constituído – responsável
pelas múltiplas defesas nas relações com o objeto, como divisão
ambivalente, incorporação, identificação e repressão ou a rejeição
do objeto.
2) a do ego dependente do objeto – constituindo-se de modo
subordinado à qualidade da relação de objeto e estruturando-se em
face dessa qualidade e, até mesmo, moldando suas defesas a ela.
Uma teoria do desenvolvimento supõe, de algum modo e a priori, um
ego rudimentar que se defende das relações objetais, ou um ego
dependente do objeto que se estrutura em face dessa dependência?
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Para Fairbairn, nenhum dos dois casos se aplica propriamente, mas


sim a proposição de uma relação de objeto que se desenvolve
segundo a qualidade da dependência.
Novas revisões fairbairnianas na Teoria da Repressão: lidando com
objetos maus
A dependência para com o objeto e a estruturação do ego segundo a
qualidade das relações de objeto conduzem Fairbairn à revisão da
teoria da repressão.
Comparando o seu próprio percurso ao anunciado por Freud em o Ego
e o Id, que teria partido da preocupação com o reprimido para chegar
posteriormente ao interesse pela instância repressora, busca então
uma compreensão do reprimido, mas agora segundo o princípio da
importância do objeto.
Em Repressão e Retorno dos Objetos Maus (com especial referência
às "Neuroses de Guerra"), de 1943, Fairbairn desenvolve a ideia
principal acerca da natureza do reprimido. Ele consistiria em objetos
maus com os quais o ego está identificado, e não em impulsos
culpáveis ou lembranças intoleráveis, como Freud concebera.
Nesse ponto, Fairbairn demonstra conceber um estatuto bastante
particular a respeito da maldade do objeto, pois, se a qualidade das
relações objetais não responsivas caracteriza o grau de maldade do
objeto – e um grau de nãoresponsividade do objeto estará sempre
presente, devido às necessidades do ego no estado de dependência –,
a maldade torna-se uma característica do objeto, e não mais da
relação.
As relações objetais responsivas na tenra infância, uma vez que
cumpram a satisfação das necessidades do ego dependente, terão
esgotado o seu valor, por assim dizer, na compreensão de Fairbairn.
Ao contrário, predominam sobre o ego os efeitos das relações não
responsivas com o objeto mau. Para evitar a dependência de objetos
maus, a criança encontra modos defensivos de se relacionar com
esses objetos, identificando-se com a maldade presente neles e assim
se considerando má.
É uma estratégia para sobreviver em um mundo incondicionalmente
mau (e que sempre será mau no sentido libidinal), visto que seria
melhor para ela considerar que a maldade presente nas relações de
objeto é condicional à sua pessoa, e não uma consequência
inevitável do objeto do qual depende. É mais esperançoso ser má em
um mundo bom que ser boa em um mundo mau.
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Assim, como a criança identificou-se com a maldade, ela torna-se


uma ameaça para si mesma. Ela procuraria, então, um modo de
controlar e livrar o mundo externo de sua maldade e de seu potencial
destruidor identificando-se com os objetos maus, trazendo-os para
dentro de si e reprimindo-os. A repressão ocorreria, então, sobre os
objetos maus identificados com o ego.
Os objetos maus estariam relegados ao inconsciente e a culpa seria
uma forma de defesa contra as relações do ego com esses objetos.
Desse modo, a criança vítima de abuso só experimentaria essa
situação como algo vergonhoso porque a vergonha seria o resultado
da identificação com o objeto mau e o testemunho de uma relação de
dependência.
A posterior internalização de objetos bons seria a forma
compensatória, que impediria o sujeito de identificar-se plenamente
com o objeto mau. Os objetos bons encontram finalmente um lugar
subsidiário na compreensão de Fairbairn, aspecto que retomaremos
mais adiante.

ESTRUTURAS ENDOPSÍQUICAS DINÂMICAS:


INSEPARABILIDADE DE ESTRUTURA E IMPULSO

No trabalho Estruturas Endopsíquicas Consideradas em Termos de


Relações Objetais, Fairbairn propõe a substituição do que avalia
como a antiquada psicologia dos impulsos por uma psicologia da
estrutura dinâmica. Nesse ponto, existe a proposição de um novo
aparelho psíquico, em face das modificações concebidas acerca da
dinâmica da repressão e, evidentemente, dirigidas novamente pela
determinação do objeto na atitude libidinal.
Freud teria se baseado numa concepção atomista e molecular do
aparelho psíquico. Fairbairn, leitor das novas descobertas da física,
propõe uma teoria psicanalítica em consonância com a ideia de que
existe uma inseparabilidade entre energia e partícula.
Assim, as estruturas e subestruturas não seriam preenchidas ou
habitadas por representações ativadas por moções afetivas, mas
seriam elas mesmas partes dinâmicas do ego, marcadas ou
constituídas pelos objetos com os quais mantêm estreitas relações de
dependência e identificação.
A palavra "dinâmica" tem fundamental importância para Fairbairn.
Significa que o ego é ativo na busca dos objetos, não cabendo uma
distinção entre ele e a suposta energia que o animaria, advinda de
outra fonte (como do id, em Freud).
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Assim, o ego é determinado, já desde o início, pelo princípio da


realidade, e não do prazer. A busca pelo prazer torna-se então algo
secundário e deteriorado, uma escapatória para o ego diante de
sérias dificuldades de adaptação.
No entanto, Fairbairn assume que Freud já introduzira a concepção
de uma estrutura ao mesmo tempo repressora e reprimida, como
seria o superego, a partir do que desenvolve a ideia de estruturas
dinâmicas. Mas somente até aí vai sua aproximação com a
metapsicologia freudiana, visto que para ele a repressão ocorre
sobre os objetos maus internalizados e não sobre representações de
experiências regidas pelo princípio do prazer.
Na trilha da proposição de um novo psiquismo, ele considera que
também são reprimidas as partes do ego, inseparáveis dos objetos.
Isso quer dizer que não seria o caso de considerar que os objetos
maus, e somente eles, seriam reprimidos, mas também, e
fundamentalmente, as partes do ego a eles associadas, a eles
vinculadas pela necessidade, na dependência, e pela identificação.
O resultado dessa revisão é a constituição de um aparelho cindido e
dinâmico, onde uma parte dinâmica do ego reprime outras partes
também dinâmicas e fortemente associadas aos objetos maus.

O APARELHAMENTO PSÍQUICO EM FAIRBAIRN

Em termos de uma estrutura dinâmica, a situação das relações


objetais primitivas e da constituição do ego volta à tona. Nesse
momento, a ideia sustenta o fundamento a partir do qual se assenta
sua ênfase no objeto.
Reafirmando sua compreensão de libido, após considerada nas
concepções em Abraham e Klein, ele escreve:
“Do ponto de vista da psicologia das relações objetais, é axiomático
que nenhum esquema de desenvolvimento libidinal pode ser
satisfatório a menos que esteja baseado na consideração dos objetos
naturais e biológicos do indivíduo em desenvolvimento, nos diversos
estágios”.
Será então em face da naturalidade do objeto e de sua função
biológica que Fairbairn precisará a constituição do ego. Nos
momentos iniciais da vida psíquica, em que a dependência do objeto
é radical, o objeto (vale dizer, o objeto externo) é separado em dois,
segundo sua ambivalência fundamental: objeto bom e objeto mau.
Eles são representativos da ambivalência vivida em relação à mãe e
congregam, respectivamente, os aspectos responsivos e não
responsivos do objeto às necessidades da dependência.
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Em seguida, o objeto mau é internalizado, na forma de incorporação


oral, como uma tentativa de controlar a maldade presente nas
relações objetais, que, então, passam a ser relações com o objeto
mau internalizado. O objeto mau internalizado, que agora ameaça
desde dentro, é novamente cindido, dando origem ao objeto
excitante e ao objeto rejeitante/necessitado. A fim de reprimi-los e
separá-los de si, o ego utiliza-se da agressão em seu interior, força da
repressão.
O princípio predominante da dinâmica psíquica é, segundo Fairbairn,
divisão e assimilação do objeto para dominá-lo.A repressão atua
sobre os objetos e sobre estruturas do ego vinculadas a eles.
Assim, a repressão do objeto excitante é acompanhada pela
dissociação e repressão de uma parte do ego libidinal enquanto a
repressão do objeto rejeitante é acompanhada pela dissociação e
repressão de parte do ego, denominado então, sabotador interno.
A repressão dos objetos internalizados acaba por cindir o ego,
precisamente pela dependência do objeto e por qualificar a estrutura
do ego vinculada a ele.
O ego central – o ego que dá origem aos demais – corresponde a uma
estrutura primária que manteve e mesmo desenvolveu suas funções
egóicas relativamente preservadas das relações não responsivas
com os objetos. Esse ego mantém relações com os egos subsidiários,
a saber, o ego libidinal e o sabotador interno, marcados pela
repressão e cisão.
Os egos subsidiários permanecem inconscientes e reprimidos, mas
não menos dinâmicos.O ego libidinal aproximar-se-ia do id
freudiano, permanecendo um derivado do ego central. Esse ego
manteria ainda cristalizados os vínculos com o objeto
correspondente – o objeto excitante – sem perder sua força dinâmica,
o que o torna profundamente ativo em relação de oposição ao ego
central.Por fim, quanto ao sabotador interno, trata-se do ego
identificado com o aspecto rejeitante ou destrutivo do objeto mau,
que adquiriu autonomia de objeto por cisão. As relações entre os
objetos e os egos subsidiários são libidinais: enquanto a relação dos
egos entre si é movida pela agressão que reprime, o que é reprimido é
um excesso de excitabilidade ou um excesso de agressão envolvido
na relação da estrutura com os objetos internalizados.
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Já as relações entre os egos e seus objetos são múltiplas e


complexas. O ego libidinal possui uma relação de natureza libidinal
com o objeto excitante, eo sabotador interno uma relação de
natureza também libidinal com o objeto rejeitante. A relação do
sabotador e do ego central é de natureza agressiva e repressora para
com o ego libidinal e seu objeto excitante.
Os egos são cindidos e reprimidos devido à maldade dos objetos aos
quais estão vinculados, são dissociações do ego que não se
desenvolveram na linha que avança no sentido da dependência
madura. Eles permanecem caracterizados segundo a dependência
infantil com relação aos objetos aos quais estão vinculados e
identificados: egos imaturos, petrificados em suas funções egóicas,
se não determinados pelo vínculo com os objetos, sendo esse vínculo
também enrijecido como efeito da repressão.

CINCO TESES DO PENSAMENTO FAIRBAIRNIANO ACERCA DO


PSIQUISMO Como vimos, o pensamento de Fairbairn não é dado de
uma só vez, ele caminha em seus textos no sentido progressivo,
acrescentando aspectos e deixando ou recuperando outros. Por vezes
seu pensamento se torna fragmentário, particularmente quando se
procura fazer dele uma apresentação detalhada.
Propomo-nos, a seguir, sumarizar em cinco teses os argumentos de
sua obra teórica, de forma a mostrar sua evolução e os fundamentos
de uma nova compreensão. São estas as teses:
1. Os fatores esquizoides estão universalmente presentes na
personalidade e possuem uma estreita relação com o funcionamento
psíquico rudimentar da criança.
2. Diante da constatação da esquizoidia como um fenômeno
universal e de sua relação com a dependência do objeto, a teoria da
libido possui uma série de limitações intrínsecas. Empreende-se uma
necessária revisão das neuroses e psicoses que destaque a primazia
do objeto na constituição psíquica.
3. O ego, em sua psicogênese, está exposto a uma dependência
radical do objeto, que implica em que a perda do objeto seja
acompanhada pela perda do ego. Deriva-se disso que a dinâmica da
personalidade depende da qualidade das primitivas relações de
objeto, o que leva à consideração de que os conflitos orais – da
dissociação – estão subjacentes a todos os estados clínicos.
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4. Tendo em vista ainda o papel do objeto na constituição psíquica,


Fairbairn considera que a repressão ocorre sobre os objetos maus,
que foram internalizados e com os quais o ego está identificado. Isso
significa que partes estruturais do ego são reprimidas, e não, como
suporia a teoria da libido, pulsões ou representações das
experiências de satisfação pulsional.
5. O prolongamento dessa revisão é a proposição de uma estrutura
endo psíquica cindida, de caráter egóico e dinamicamente
relacionada.
A tese fairbairniana de uma estrutura dinâmica é fundamental, pois
é sobre ela que o autor sustenta (ou conclui) sua radical diferença em
comparação à tese de uma estrutura psíquica estimulada ou
investida por uma energia, como seria a construção baseada na
teoria da libido.
Nesse contexto, a esquizoidia é como uma condição anterior à da
sexualidade pela qual o ego se estrutura ante a situação de
dependência plena do objeto. Desse modo, as características orais,
como formas condicionantes da relação de identificação, envolvem o
sujeito em uma tragédia de fragmentações internas, porquanto
nunca os objetos serão plenamente responsivos.
A inevitabilidade da estruturação esquizoide permite compreender
que está ausente à elaboração fairbairniana o que, por outro lado,
considera fundamental ser considerado nas relações primitivas com
o objeto. Trata-se da possibilidade de recuperação da adaptação pela
ação do meio, isto é, do objeto que assim compensaria o estado de
desvalimento absoluto em que se encontra a criança.
As perspectivas terapêuticas de Fairbairn, bem como suas
interpretações socioculturais de certos e predominantes quadros
psicopatológicos, podem ser bastante profícuas para a reflexão da
clínica psicanalítica na contemporaneidade. Ele sugere avaliações e
alternativas de compreensão que podem ser úteis para o psicanalista
ou o psicoterapeuta ainda hoje, somando e talvez até impulsionando
as perspectivas psicanalíticas do atendimento e tratamento dos
chamados casos difíceis, borderlines e psicóticos.
Fairbairn não somente amplia Freud. Ao inverter o caráter da meta
libidinal, colocando-a em busca do objetivo e não, do prazer, ele
pretende consolidar estados mais primitivos do funcionamento
psíquico sob a base das relações de objeto e fundamentar a
esquizoidia como estrutura básica e inescapável dos processos de
subjetivação.
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AS FANTASIAS NOS CONTEÚDOS PATOLÓGICOS E NO


TRABALHO ANALÍTICO

Ademais, também ficou conhecido o estudo psicanalítico de Melanie


Klein desenvolvido a respeito do que ela denominou como fantasias.
Para ela, as mentes consideradas como normais, assim como as
mentes neuróticas, perversas ou psicóticas, também possuem
fantasias. E isso ocorre em todas as faixas etárias.
Com relação à patologia, o que diferencia uma fantasia de uma
mente normal de uma fantasia patológica é o modo como ela é
tratada. Isso inclui os processos mentais por meio dos quais as
fantasias são trabalhadas e modificadas, assim como o grau de
adaptação do indivíduo ao mundo real. O neurótico pode possuir uma
censura menor ou não satisfatória quanto as suas fantasias. Ele é
considerado diferente conforme mostra mais claramente o que
encontra-se encoberto em sua mente normal.
Melanie Klein também defende a importância do trabalho analítico.
Para ela, esse trabalho é uma importante via de acesso à vida
fantasmagórica. Além disso, para ela a função da análise em
crianças tem a mesma função que a análise em adultos,
principalmente pelo fato de se embasar a análise na interpretação de
fantasias inconscientes. Além disso, Klein era contra outras
funções, como educação e fortalecimento, expostas por outros
estudiosos da área.
Freud sempre abordou a questão das fantasias inconscientes como
vinculadas a conteúdos sexuais, desde quando iniciou os seus
estudos a respeito das fantasias. Melanie também trabalhou essa
questão em suas teorias, inclusive concordando com Freud em
alguns pontos. Para ela, a vida também pode ser concebida como
uma luta constante entre os instintos de vida e de morte, luta que
tem na sexualidade a base para desenvolver os instintos de vida. Por
outro lado, para Klein, a questão das fantasias de conteúdo sexual
pode ser comprovada em um estágio posterior da vida. As fantasias
continuam presentes na idade adulta, mesmo que elas se
manifestem de forma menos clara do que na infância. As fantasias
sexuais também permanecem atuantes na psique do adulto, podendo
ter efeitos inconscientes ou causar distúrbios na vida sexual do
indivíduo, dentre eles a frigidez e a impotência, por exemplo.
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POSIÇÃO ESQUIZOPARANOIDE E DEPRESSIVA SEGUNDO


MELANIE KLEIN

Muitos outros conceitos são ainda atribuídos a Melanie Klein, como o


fato de que a pulsão de morte, assim com a pulsão de vida, seria
inata e acompanharia o indivíduo desde o nascimento.
Ela acreditava que essas pulsões marcavam a sua existência pelo
constante conflito entre elas, além de ver a mente como um universo
de objetos internos que estão relacionados entre si através das
fantasias inconscientes, constituindo a realidade psíquica.
Porém, uma das maiores contribuições de Melanie Klein foi a
conceituação do desenvolvimento psíquico diferente de Freud. Ela
sugeriu a noção de posição, dando a elas o nome de “posição
esquizoparanóide” e “posição depressiva”, que revolucionaram as
teorias psicanalíticas.
De uma forma geral, pode-se dizer que essas posições são períodos
normais do desenvolvimento da vida de todas as crianças, tais como
as fases do desenvolvimento psicossexual criadas por Freud.
Contudo, são mais maleáveis do que estas fases, devido ao fato de se
instalarem por necessidade e não por maturação biológica – muito
embora a autora não deixe de considerar as fases da teoria freudiana
a respeito do desenvolvimento infanto-juvenil.

As características da Posição Esquizoparanóide

Segundo Klein, o bebê nasce imerso na posição esquizoparanóide,


cujas principais características são a fragmentação do ego e a
divisão do objeto externo, a mãe, ou, mais particularmente, de seu
seio, já que este é o primeiro órgão com o qual a criança estabelece
contato. Desta forma, tem-se o seio bom e o seio mau. O primeiro é
aquele que a gratifica infinitamente, enquanto o segundo somente
lhe provoca frustração, despertando a agressividade e a realização
de ataques sádicos dirigidos à figura materna.
A partir da elaboração e superação desses sentimentos, tem início a
posição depressiva. Ela tem como principais atributos a integração
do ego e do objeto externo (mãe/seio), sentimentos afetivos e defesas
relativas à possível perda do objeto em decorrência dos ataques
realizados na posição anterior.
Estas posições continuam presentes pelo resto da vida, porém elas se
alteram em função do contexto, embora a posição depressiva
predomine em um desenvolvimento saudável.
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A posição esquizoparanóide ocorre do nascimento até os seis meses,


mais ou menos. Desde o nascimento, o ego imaturo do bebê é exposto
à ansiedade provocada pela polaridade inata dos instintos de vida e
de morte. Além disso, também provoca ansiedade a sua exposição ao
impacto da realidade externa. É nessa posição que ocorre a primeira
relação do bebê com o seio materno, que é “mau” e “odiado”.
Veremos, então, como funciona a formação do seio mau.
Quando o ego é confrontado com a ansiedade produzida pelo instinto
de morte, ele se divide. Com isso, acaba projetando a parte que
contém o instinto de morte para o objeto externo original, que é o
seio. Importante ressaltar que só reconhece um outro ego, o ego já
formado.
Sendo assim, o bebê, com o seu ego imaturo dotado apenas de
fantasias primitivas e instintivas, não vê a pessoa da mãe ou do pai.
Para esse bebê, tudo se resume ao seio, pois é com o seio sua primeira
relação.

O “seio mau”

Na fantasia da criança, o ódio e a destrutividade direcionados ao seio


mau vão se voltar contra ela em busca de vingança. Este medo da
vingança é denominado ansiedade persecutória. O conjunto da
ansiedade persecutória com as suas respectivas defesas é
denominado de posição esquizoparanóide. Nesta posição, o
desenvolvimento do eu é definido pelos processos de introdução e de
projeção. Diante da violência da angústia persecutória, a meta da
criança nesta fase é de possuir o objeto bom, introjetando-o. Além
disso, ele quer projetar o objeto mau para fora, a fim de evitar assim
os impulsos destrutivos.

O início da posição depressiva

A posição depressiva é posterior à posição esquizoparanóide. Ela


ocorre por volta dos quatro meses e é progressivamente superada
durante o primeiro ano de vida. No entanto, ainda pode ser
encontrada durante a infância e reativada no adulto,
particularmente nas situações de luto e estados depressivos. Com o
desenvolvimento do ego do bebê, ele vai progressivamente
percebendo que o mesmo objeto que odeia o “seio mau” é o mesmo
objeto que ama o “seio bom”.
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Seu ego já tem maturidade suficiente para perceber que ambos os


registros fazem parte de uma mesma pessoa. Dessa forma, a
clivagem “ou cisão” do objeto vai sendo abrandada, pois agora há a
percepção de que as pulsões libidinais e hostis estão sendo
direcionadas ao objeto em sua totalidade. Portanto, isso desencadeia
um outro processo.

A angústia da separação no bebê

Com essa percepção, a angústia recai de forma diferente, pois o bebê


percebe como perigo iminente a perda da mãe. Ele teme perder o seio
bom, pois fantasia que seus ataques de ódio e voracidade o possam
ferir ou aniquilar.
Esse medo da perda do objeto bom do objeto bom é chamado de
ansiedade depressiva. Essa angústia é combatida pela utilização de
mecanismos de reparação. Como exemplo, citamos o que ocorre
quando o objeto amado é introjetado de forma estável e
tranquilizante.
É na posição depressiva que o bebê adquire a capacidade de amar e
respeitar os objetos como distintos e separados dele. Melanie Klein
diz que o psiquismo possui um funcionamento dinâmico entre as
posições esquizoparanóide e depressiva. Elas têm início no
nascimento e terminam com a morte.
As neuroses, esquizofrenias e depressão são afastadas a partir
dessas duas posições. Dessa forma, na análise Kleiniana não adianta
trabalhar o sintoma se não trabalhar também os processos que
levaram ao seu surgimento. Esse processo envolve as ansiedades dos
tipos persecutória e depressiva.

CONCEITOS INTRODUTÓRIOS EM WINNECOTT

Quanto à psicanálise de Winnicott, ela foi embasada nas relações


entre a criança, quando nasce, e o ambiente em que ela vive, que
corresponde à sua mãe. Segundo o estudioso, as crianças nascem
indefesas e com um potencial de se desenvolver.
No entanto, para que esse potencial se concretize, é necessário que o
ambiente seja propício, ou seja, é importante que seu ambiente
familiar, econômico e social sejam suscetíveis a esse
desenvolvimento.
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Primeiramente, é necessário apontar o que seria esse


desenvolvimento. De acordo com as ideias do psicanalista inglês, a
criança passa da fase da dependência à fase da independência. A
finalidade desse processo é a formação da identidade desse
indivíduo.
Porém, para que o desenvolvimento dessa pessoa ocorra de maneira
satisfatória, cabe à mãe oferecer o suporte necessário para o bebê.
Para que você entenda melhor essa ideia, introduziremos aqui o
conceito de Winnicott chamado “goodenoughmother”.

A mãe suficientemente boa

De acordo com ele, uma mãe precisa estar apta, primeiramente, para
fazer com que o bebê se sinta onipotente. Isso significa que ela
precisa suprir as carências da criança, fazendo com que o bebê
acredite que ele mesmo produziu aquilo que precisava. Depois disso,
é necessário que a mãe passe a não atender de imediato as
necessidades do bebê, para que ele passe a lidar com certas
frustrações.
Tal processo de desilusão implica a existência de objetos
transicionais. Esse novo conceito é utilizado por Winnicott para
nomear o utensílio utilizado pela criança para ela conseguir superar
a separação de sua mãe.
Pode-se afirmar que esse recurso revela a passagem de uma
dependência absoluta da criança a uma dependência relativa.

Psicoses

É importante abordar, também, o que significam as psicoses para


Winnicott. Segundo as ideias desse estudioso, elas seriam resultado
de um processo de desenvolvimento defeituoso.
Para ele, caberia à família propiciar o ambiente favorável para uma
boa evolução acontecer. Isso porque, para o psicanalista, uma
criança só conseguiria fazer uso das suas percepções e do seu
aparelho mental se ele tiver um bom convívio com a sua mãe.
Para entender ainda melhor essa ideia, é importante introduzir os
conceitos de holding, de self verdadeiro e de self falso.
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Podemos chamar de “holding” a disposição que uma mãe tem de


amparar as crianças nas suas necessidades. Tendo isso em vista,
quando o holding não é adequado, o self verdadeiro não consegue se
desenvolver. Dessa forma, quando o auxílio materno falha, o falso
self surge como uma forma de defesa do self verdadeiro. Pode-se
afirmar que ele se constitui uma forma de adaptação da criança.
Além disso, entende-se que o desenvolvimento desse falso self está
vinculado às tendências anti-sociais e a transtornos mentais.

A INFLUÊNCIA DECISIVA DO AMBIENTE SOBRE O PSIQUISMO

Para Winnicott, o ser humano tem a tendência a se desenvolver e


unificar, e o faz através do processo de maturação, ou seja, através
da formação e evolução do ego, superego, inconsciente e os
mecanismos de defesa. A saúde psíquica estaria no livre desenrolar
deste processo, mas para isso é fundamental o papel do ambiente. No
caso o ambiente inicial representado pela mãe ou seu substituto esta
é a interação inicial, só a primeira de muitas outras.
Por isso, para Winnicott, a influência do ambiente é decisiva sobre o
desenvolvimento psíquico do ser humano, e é em função dela que o
autor vai falar de duas fases iniciais do desenvolvimento: do
nascimento aos 6 meses (dependência absoluta) e dos 6 meses aos
dois anos (dependência relativa). No estudo destes momentos
iniciais reside grande parte da contribuição de Winnicott.

A fase da “Dependência Absoluta”

A dependência é vista como “absoluta” porque não haveria chances


de sobreviver sem os cuidados do ambiente (mãe). Há uma total
dependência.
O bebê depende totalmente, mas o interessante é que ele desconhece
esse estado de dependência, pois entende que ele e o meio são uma
coisa só. É nesse momento que a mãe age, para o atendimento às
necessidades do bebê, através de três funções maternas exercidas
simultaneamente:
A primeira é a apresentação do Objeto – a função de apresentação do
seio ou da mamadeira. Em razão de seu estado vital, a criança passa
a “esperar” algo, e quando esse algo surge ela naturalmente aceita o
objeto oferecido.
É nesse momento que o bebê tem a ilusão de ter “criado” esse objeto
para a sua satisfação, ele estava quase imaginando-o quando ele
surgiu.
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É com esta “ilusão” que o bebê tem uma experiência de onipotência,


ou seja, é como se o objeto adquirisse existência real quando
desejado e esperado. À medida que a mãe vai sempre estando à sua
disposição, esta ilusão vai sendo reforçada e, ao mesmo tempo,
protege-o de fontes de angústia que seriam insuportáveis.
A segunda é a função de holding – trata-se de uma função de
“sustentação”, ou seja, a mãe instaura uma rotina (repetitiva) de
cuidados cotidianos que vão sustentar, não somente corporal, mas
psiquicamente, a criança. Desse modo, a realidade externa para o
bebê é muito simplificada e permite que ele crie pontos de referência
simples e estáveis, facilitando sua integração no tempo e no espaço.
A terceira, Handling, trata-se da função de “manipulação” do bebê
enquanto ele é cuidado. É uma função que harmoniza a vida psíquica
com o corpo, e que Winnicott chama de “personalização”.
Nesta fase, a mãe que realiza bem estas três funções é chamada de
mãe suficientemente boa, ou seja, boa o suficiente para que o bebê
possa conviver com ela sem prejuízos psíquicos. Ela representa o
“ambiente bom” e permite que a criança coloque em prática sua
tendência inata ao desenvolvimento e continuidade da vida fazendo
emergir o verdadeiro self.
O termo “self” foi introduzido por Hartmann, um dos fundadores da
escola da Psicologia do Ego, em 1950, para designar a representação
da pessoa inteira (corpo e organização mental. Mas para Winnicott
haveriam dois aspectos no self que estariam presentes em qualquer
ser humano em proporções variadas: um verdadeiro e um falso.
O verdadeiro é a pessoa que é eu e apenas eu, a pessoa que se
constrói a partir do emprego de suas tendências inatas. Este self se
manifesta nos gestos espontâneos e das ideias pessoais, pois só o
verdadeiro self é criador e pode ser sentido como real. É ele,
portanto, que resulta de uma mãe suficientemente boa.
Mas, e quando a mãe é insuficientemente boa? Isto ocorre quando a
mãe não se identifica com as necessidades do filho, não responde aos
seus gestos e é ausente. Surge daí uma “adaptação falha ao bebê”
devido à divisão da mãe em “pedaços”.
Que distúrbios psíquicos podem resultar da mãe insuficientemente
boa? É importante destacar que, neste momento, as falhas da mãe
não são sentidas como “frustração”. O que elas provocam são
carências na satisfação de necessidades, dificultando o desenrolar
de seu desenvolvimento.
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A angústia que daí resulta é impensável, e surge como “ameaça de


aniquilação do eu” (despedaçamento, impressão de queda infindável,
sentir-se levado para alturas infinitas, ausência de relação com o
corpo, ausência de orientação espaço temporal) – a essência da
angústia psicótica Claro que o bebê pode encontrar formas de
“arranjar-se”, pois não há determinismo, mas daí podem surgir
organizações patológicas da personalidade, como:
– Autismo ou esquizofrenia infantil;
– Esquizofrenia latente (que se manifesta em fases de tensão e
fadiga);
– Estado limítrofe (o paciente apresenta-se como neurótico, mas o
núcleo do distúrbio é psicótico);
– Personalidade esquizoide (personalidade sadia com elementos
esquizoides);
– Personalidade baseada no falso self;
A respeito do “falso self”, vemos que ele é a principal reação do bebê
às falhas de adaptação da mãe. O bebê renuncia à esperança de ver
suas necessidades satisfeitas e vai adaptando-se aos cuidados que
não lhe convêm, e é aí que ele passa a adotar um modo de ser falso e
artificial.
Com isso, o indivíduo experimenta sentimentos de irrealidade e
vacuidade a respeito de si mesmo, dos outros e da vida, e pode se
comportar como um ser que não se adapta, mas se funde ao
ambiente, passando a reagir especularmente (como espelho,
reflexo). E quanto aos tratamentos? Para os que passaram por essa
fase inicial na presença de uma mãe suficientemente boa, a
organização psíquica futura seria de ordem neurótica. Mas, para os
demais, seria preciso dar forma a uma relação de dependência
extremamente forte ou absoluta com o terapeuta, que ficaria no
lugar da mãe, fazendo o papel de “suficientemente bom” e
identificando as necessidades do paciente.
É assim que ele assegura, no nível simbólico, a função de
sustentação (holding) que possibilitará a maior autoconfiança no
paciente. O analista é utilizado pelo paciente da forma que melhor
lhe convier. Se ele precisar ficar quieto, ficará quieto, por exemplo.
São previsíveis os comportamentos tipicamente infantis. De
qualquer forma, é essa capacidade de identificar-se com as
necessidades do paciente que acarreta o descongelamento de sua
situação primitiva de carência ambiental, permitindo ao eu evoluir.
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O paciente pode, então, demonstrar sentimentos diversos, como


raiva. É esse sentimento que fica no lugar da angústia, vivenciando-
a sem risco de aniquilamento. A sequência é a seguinte:
– Adaptação do analista às necessidades do paciente;
– Liberação dos processos de maturação (descongelamento);
– Intervenção de uma falta de adaptação;
– Cólera sentida e expressada pelo paciente;
– Novo progresso do eu;

A fase da “Dependência Relativa”

Esta fase vai dos 6 meses aos 2 anos, e nela a dependência é relativa
porque a criança se conscientiza de sua sujeição (na primeira fase
ela não se vê separada, mas fundida à mãe), e tolera melhor as
falhas de adaptação da mãe, tirando proveito delas para se
desenvolver.
Isso porque a criança já percebe a existência de uma realidade
externa separada dela. Ela também já consegue se antecipar aos
acontecimentos e prever as ações de sua mãe.
Por seu lado, a mãe se desliga um pouco do estado intenso de
identificação e retoma outras coisas de sua vida, fazendo surgir as
“falhas de adaptação moderadas”, que a criança vive sem prejuízo
para sua evolução psíquica.
Mas isso não significa que a mãe esteja dispensada. A criança, por
exemplo, pensa estar relacionando-se com duas mães: uma é a mãe
dos momentos calmos, e a outra é a dos momentos de excitação em
que a agressividade está presente, principalmente nas refeições.
O bebê pode imaginar que a satisfação de sua fome acarreta a
deterioração do corpo da mãe. Isso agora lhe preocupa pois ele
reconhece que depende da mãe.Por isso, para evitar este sentimento,
é importante que ele perceba que se trata da mesma pessoa. É um
processo de integração das duas figuras maternas.
Para isso, é fundamental a presença da mãe suficientemente boa.
Ela deve sobreviver, e é a representação desta mãe e a crença em
sua existência que devem ser interiorizadas pela criança.
Ela então passa a perceber que, com sua agressividade, é a essa mãe
total e única que ela pode destruir (angústia depressiva). É daí que
advém então a culpa, pois a mesma mãe que ataca é a mãe que lhe
cuida (culpa depressiva).
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É por esta angústia e culpa que a criança desenvolve atividades de


reparação e restauração, sob a forma de presentes e gestos de
ternura. Isso, repetindo, só pode ocorrer se tiver uma mãe
suficientemente boa. Com isso, a criança continua em sua evolução
psíquica.
Então, é nesta fase, por volta do segundo semestre de vida, que
depois de ter passado por uma fase de ilusão de onipotência onde cria
os objetos de suas necessidades, a criança vai descobrindo que ela e
sua mãe são separadas e que ela depende da mãe para suas
necessidades.
É uma fase de desilusão onde a criança desenvolve atividades como
levar os dedos ou algum objeto à boca, como a ponta de um lençol ou
fralda; começa a puxar fiapos de lã e fazer bolotas com que se
acaricia; sons bucais diversos, etc.
Estas atividades têm algo em comum: elas surgem em momentos em
que poderia surgir a angústia (separação da mãe, hora de
dormir).São atividades que Winnicott chama de fenômenos
transicionais, e quando envolverem um objeto este será chamado de
objeto transicional. São “transicionais” porque ocupam um espaço
intermediário entre a realidade interna e a externa, com a função de
amortecer o choque da conscientização de uma realidade externa.
Então, trata-se da existência de um espaço transicional onde
ocorrem fenômenos transicionais que podem, ou não, envolver um
objeto transicional. Quando se trata de um “objeto”, ele sempre
representa a mãe dos momentos tranquilos. É um momento em que o
bebê passa da situação de controle pela onipotência para a de
controle pela manipulação, ainda anterior ao reconhecimento da
realidade externa enquanto tal. Esse espaço transicional persiste ao
longo de toda a vida. Ele será ocupado por atividades lúdicas e
criativas extremamente variadas e terá por função aliviar o ser
humano da constante tensão suscitada pelo relacionamento da
realidade de dentro com a realidade de fora.
Para Winnicott, o aparecimento deste espaço é sinal de que a mãe da
primeira fase foi suficientemente boa.Mas mesmo aí se pode detectar
uma psicopatologia quando, por exemplo, a mãe se ausenta por um
tempo que ultrapassa a capacidade da criança mantê-la viva em sua
lembrança, podendo ocorrer um desinvestimento do objeto.
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Os diferentes distúrbios psíquicos ligados ao sentimento de falta de


sobrevivência da mãe podem ser agrupados sob o termo “doenças da
pulsão agressiva” (tendência antissocial, hipocondria, paranoia,
psicose maníaco-depressiva, algumas formas de depressão).
Para o tratamento, Winnicott chama a atenção para o fato de que a
análise vai cuidar de acontecimentos ligados ao embate entre
agressividade e a libido, entre o ódio e o amor, num momento em que
a criança se preocupa com as consequências de seu ódio e sente
culpa por ele.
Assim, o que vai importar é a sobrevivência do analista e que ele
sustente a situação analítica, não fazendo represálias ao ódio
expresso ou atuado pelo paciente. Assim,o ambiente constitui o
esteio indispensável em que o ser humano se apoia para construir as
bases de sua personalidade.
A partir dessa perspectiva desenvolvimentista, é fácil imaginar que
o ambiente continua a exercer influência na criança que cresce, no
adolescente e até no adulto. Se essa influência descreve uma curva
decrescente, ela nunca para por completo.
Por fim, uma última palavra. Winnicott achava que Freud tinha dito
tudo o que havia para dizer no campo das neuroses, e sua técnica
terapêutica estava adaptada aos neuróticos. Ele não via o que
acrescentar nesse campo, daí voltou-se para os recém-nascidos e
seus distúrbios. É certo que já havia as contribuições de Melanie
Klein, mas em vários aspectos ele rompia com ela, principalmente
quanto à importância da influência do ambiente. Foi assim que
Winnicott passou dos conflitos “intrapsíquicos” para o estudo dos
conflitos “interpsíquicos”, ou seja, para o estudo das distorções
psíquicas provocadas por um ambiente patogênico.
Daí a necessidade de uma nova terapêutica para estes casos em que
o ambiente fracassara na adaptação às suas necessidades.

O papel do psicanalista para Winnicott

Tendo em vista todas essas questões, o psicanalista assume a função


de levar um indivíduo com falhas em seu desenvolvimento
novamente aos estágios de dependência, de modo a encaminhar o
processo de forma adequada. Isso porque entende-se que só dessa
maneira o seu desenvolvimento será concluído com sucesso.
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CASO DICK – MELAINE KLEIN

O menino Dick, de quatro anos, chegou ao consultório de Melanie


Klein em 1929.O caso apresentava os seguintes sintomas: problemas
para defecar, urinar e molhar-se na água; pobre na fala; intelecto de
um bebê com um ano e pouco; sem relações emocionais; não
brincava; não demonstrava interesse em se fazer entender.
Em alguns momentos Dick pronunciava as palavras corretamente, e
em outros não, nem que a mãe pedia para que ele repetisse estas
juntamente com ela. Além disso, tinha dificuldades para manipular
facas e tesouras, apesar de manusear a colher muito bem;
manifestava coordenação motora deficiente e anorexia desde o
período lactante, no qual teve desconfortos como hemorroidas, além
de um prolapso anal.
Anteriormente, ele esteve um período na casa da avó, aos dois anos
de idade. Ela e principalmente a babá lhe deram muito amor, e
consequentemente ele aprendeu algumas palavras novas, começou
andar, conseguiu controlar os esfíncteres e iniciou interesse pela
alimentação. Até que começou a masturbar-se e foi repreendido pela
babá.
Alguns elementos do consultório chamavam a atenção de Dick,
como as maçanetas e a porta dupla, que apresentava um espaço
entre as portas no qual ele se alojava. Mas num geral apresentava
comportamento de exploração do consultório sem maiores
interesses, e era desatento para as relações interpessoais. Após
alguns meses, Dick exteriorizou sua angústia, interagindo com o
ambiente do consultório e com M. Klein e demonstrando interesse
por nomes de objetos, com intenção de nomeá-los.

Intervenção de Melanie Klein e alguns conceitos:

M. Klein atribuiu um significado à angústia ocultada que o menino


tinha de forma que ele começasse simbolizar os sentimentos dele
através do brincar. “Trem-papai” e “Trem-Dick”: foi o início da
intervenção de Melanie Klein.
A partir desse caso, a psicanalista percebeu que deveria mudar sua
técnica de análise, pois uma vez que Dick não brincava, primeiro
tinhade adquirir a capacidade de simbolizar. Assim, logo a
psicanalista percebeu que nem toda criança consegue fazer isso.
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O curioso era que quando a babá o deixava no consultório, ele não


manifestava nada. Com isso, Klein trabalhou a questão da angústia
devido ao sentimento que ele tinha pelos seus pais. Ele estava
passando pelo Complexo de Édipo, e censurava-se devido a isso,
manifestando reclusão dentro si.
A angústia se dava pelos sentimentos ambivalentes que Dick sentia
pelos pais: ao sentir ódio, Dick culpava-se e tinha medo de sofrer
retaliações, e não exteriorizava sua angústia. Ao mesmo tempo, não
conseguia afirmar uma relação afetiva com seu pai e sua mãe.
Por esse medo de sofrer retaliações, Dick empregou um mecanismo
de defesa, isolando-se do contato interpessoal. Esse menino
identificou-se com o objeto odiado e não aceitou esse sentimento
sádico, ou seja, se há identificação com aquilo que odeia, ocorre um
conflito porque nessa identificação há culpabilização.
A identificação, segundo linha teórica kleiniana, se dá por meio da
revelação das fantasias sádicas que o bebê emprega contra sua mãe.
A angústia fica insuportável quando o pequeno nega que pode ser
sádico com sua mãe durante a fase precoce do Complexo de Édipo, ou
se condena por isso.
O diagnóstico desse caso foi de esquizofrenia, apesar de que a
referida psicanalista admitisse que o caso apresentasse uma
peculiaridade com relação aos demais casos de esquizofrenia na
criança. Dick apresentava um bloqueio no desenvolvimento do Eu, e
nos demais casos apresentava regressão após uma etapa do
desenvolvimento cumprida.
Klein acreditava que os sintomas apresentados eram característicos
de psicose. Outros psicanalistas, depois de Leo Kanner, divergem
dessa perspectiva e afirmam que o caso é característico de autismo.
É fato que algumas características da esquizofrenia são bastante
parecidas com as características do autismo, em ambos há um
distanciamento da realidade e das relações interpessoais e afetivas.
Um dos psicanalistas que se referiram a esse caso e debruçaram-se
sobre o entendimento do processo que constitui as psicoses e o
autismo foi Jacques Lacan. Atualmente, muitos dos artigos
científicos de referencial psicanalítico utilizam a perspectiva dele
para entender os processos de identificação e de ingresso no mundo
simbólico.
A partir disso, pretendo explorar o olhar lacaniano sobre a fase
especular, já tendo alguma noção da concepção de M. Klein sobre o
caso Dick. Lacan analisou o caso Dick partindo do ponto de vista de
que o menino era autista. Em sua análise, ele abordou a questão da
linguagem no autismo.
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A criança autista estaria afastada da linguagem por faltar o


simbolismo que nasce na identificação, faltava o traço unitário que
introduz a criança no campo do simbólico.
Isso se dá na fase do espelho, seguindo a perspectiva lacaniana. Essa
fase é muito importante na formação de um sujeito, e posso dizer que
é negado esse lugar de sujeito ao menino Dick, considerando que ele
tinha autismo. M. Klein ofereceu ao pequeno justamente o traço
faltante que une o Imaginário e o Real, dando sentido à existência.
Outra comparação possível entre os dois diagnósticos, que é mais
conceitual, se refere ao significante primordial responsável pelo
encadeamento de todos os significantes existentes no inconsciente.
Na esquizofrenia existem vários significantes primordiais, não
estabelecendo ligação alguma entre esses. Por isso, há quebra ou
esquize do sujeito. O sujeito diagnosticado como esquizofrênico não
encontra coerência na sua percepção de mundo, porque os fatos
reais e os imaginados formam um todo fora do discurso. Porém ele
sempre tenta simbolizar sua percepção, para poder entender a si
próprio e atribuir significado a sua experiência.
Já o autista, ao contrário do psicótico, não consegue simbolizar ou
tentar simbolizar. No autismo falta mais que o significante
primordial, falta o vínculo afetivo com seus cuidadores. Em nota de
rodapé, em seu texto “A importância da formação de símbolos no
desenvolvimento do eu”, a psicanalista apresenta que a mãe do
menino já o considerava anormal quando este completou um ano
Aqui é revelado o contexto de como Dick foi recebido por sua mãe e
como ele era recebido por seu pai e sua babá. Considerado doente por
sua mãe e sendo subjetivado dessa forma, ele não teve a chance de
revelar-se como sujeito parte do social – visto como doente desde o
início, foi excluído. É também interessante incluir a citação de F.
Azevedo, porque ela faz uma diferenciação entre a psicose e o
autismo em um contexto de tratamento terapêutico:
“Vimos, então, que é a partir das significações de Melanie Klein
(1930) que Dick pôde progredir. Portanto, podemos concluir que na
direção da cura com autistas torna-se necessário um oferecimento
de significação. Essa posição parece ser distinta da direção da cura
na psicose. Isto porque, na psicose, parece que é o próprio "sujeito"
que dá a significação, como Schreber, que, diante das mensagens
interrompidas, das vozes que lhe enviam os inícios das frases, ele
devia, sem um minuto de descanso ou remissão, completar”.
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Nesse fragmento é colocada a questão do simbólico no autismo e na


psicose. O que acontece com Dick para que ele não consiga nomear-
se? Antes, ele precisa ser nomeado.
A partir da intervenção de Klein, o menino adquiriu a fala. Essa
intervenção consistia em atribuir significação ao objeto. Com isso,
vê-se que no autismo a criança tem contato com a linguagem, só não
sabe como aproximar-se dela.
A linguagem possibilita afeição, revelando-se tão rica e importante
tanto para o contexto terapêutico transferencial como para a noção
de vida e saúde do sujeito.
Vamos analisar o caso nesse próximo capítulo.

O Caso Dick - Introdução

Em seu artigo “A importância da formação de símbolos no


desenvolvimento do ego”, publicado em 1930, Melanie Klein disserta
sobre o caso de Dick, um menino de quatro anos de idade que se
encontrava no nível intelectual de uma criança de 15 a 18 meses.
Para Klein, o garoto apresentava um quadro curioso, visto que era
diferente de todos os outros que ela já havia tratado e não se
encaixava inteiramente em nenhum diagnóstico conhecido em seu
tempo. O registro desse caso teve enorme repercussão. Ele tem sido
amplamente discutido na psicanálise por diversos autores, sendo
considerado um caso clássico de uma criança em sofrimento psíquico
grave.

Sintomas apresentados por Dick

A autora relata que, nas primeiras consultas, Dick demonstrava ser


carente de qualquer afeto ou angústia e indiferente à presença ou
ausência da mãe ou da amaseca. Não mantinha contato com seu
meio ambiente e não tinha interesse pelos brinquedos (a não ser um
interesse muito específico pelos trens, estações, maçanetas e
portas). Pareciam estar completamente ausentes a adaptação à
realidade e as relações emocionais com seu meio. “A expressão de
seus olhos e seu rosto era fixa, ausente e de desinteresse”. Também
demonstrava grande insensibilidade à dor, sem a menor
preocupação de ser mimado ou consolado, e quase nunca
manifestava ansiedade.
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Por vezes, seus movimentos pareciam estar falhos de coordenação:


era extremamente desajeitado em quase todos os seus movimentos,
especialmente ao manusear facas e tesouras. No primeiro dia, Dick
correu de um lado para o outro do consultório, tratando Klein como
um objeto a mais na sala: “...ele correu em volta de mim como se eu
fosse um móvel”. O menino articulava sons ininteligíveis, repetia
constantemente certo ruídos e, quando falava, utilizava
incorretamente seu vocabulário. Apresentava um negativismo ativo,
fazia exatamente o contrário do que era dele esperado. Por exemplo,
quando sua mãe tentava fazê-lo repetir algumas palavras (as quais
em outras ocasiões ele poderia pronunciar corretamente), ele as
alterava completamente, ou mesmo, as repetia de forma incessante
e mecânica.

História do desenvolvimento de Dick

A história dos primeiros anos de Dick foi conturbada. A sua lactância


havia sido insatisfatória devido à recusa do peito, a ponto de o
menino quase morrer de inanição. Foi então preciso recorrer à
alimentação artificial. Depois apresentou recusa de alimentos
sólidos, sofreu de transtornos digestivos, prolapso anal e
hemorroidas, e teve dificuldade em aprender a controlar as funções
excretórias. Apesar dos cuidados recebidos, não recebia amor de sua
mãe, de seu pai, nem da sua ama-seca.
Aos dois anos, esse quadro começou a mudar: Dick teve outra ama-
seca mais carinhosa e foi morou um tempo com a avó, também muito
dedicada, tendo apresentado melhoras no desenvolvimento.
Manifestou grande melhora às censuras, um interesse um pouco
maior pela comida, aprendeu a caminhar, a pronunciar algumas
palavras novas e alguns hábitos de asseio. Porém, os defeitos
fundamentais não haviam modificado. Nem mesmo as duas
conseguiram pôr em marcha a “ausente relação objetal” (Klein, 1981,
p.301).

Intervenção feita por Melanie Klein

Segundo Klein, o ego de Dick havia cessado de desenvolver sua vida


de fantasia, sua formação de símbolos e sua relação com a realidade.
Havia então se revelado o obstáculo fundamental para o começo da
análise dele: a sua falta de interesse pelo ambiente e a ausência de
relação simbólica com as coisas.
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Por esse motivo, a psicanalista modificou sua técnica habitual e fez


suas próprias interpretações à base de seu conhecimento
geral.Apesar da indiferença de Dick, Melanie seleciona dois trens –
um grande e um pequeno – e os nomeia, respectivamente, de “Trem
Papai” e “Trem Dick”.
Após Dick ter pego o trem pequeno, oempurrando até a janela e dito
“estação”, Klein lhe responde: “A estação é a mamãe; o Dick está
entrando na mamãe”. Assim, partindo desse primeiro ponto, a
psicanalista cria um jogo simbólico a ser compartilhado com Dick, no
qual ela ‘empresta’ as suas representações, visto que Dick não é
capaz de criá-las. Pôde assim, acessar seu inconsciente, diminuindo
as suas dificuldades, e assim, abrir caminho para o desenvolvimento
do ego.
O papel da conceituação da identificação projetiva
Para Melanie Klein, os primeiros estágios do complexo de Édipo
estão dominados pelo sadismo, e é só nos estágios posteriores que
aparece a defesa contra os impulsos libidinosos.
A primeira defesa levantada pelo ego é dirigida contra o próprio
sadismo e contra o objeto atacado, por serem considerados
perigosos. Esta defesa é violenta, diferente dos mecanismos de
recalque. Nos meninos, essa defesa também se dirige contra o
próprio pênis, como sendo o órgão executor do seu sadismo.
Após meses de análise, Klein conclui que, no caso de Dick, a defesa
prematura e excessiva do ego contra o sadismo impediu o
estabelecimento da relação com a realidade e o desenvolvimento da
fantasia.
Consequentemente, a apropriação e exploração sádica do interior do
corpo da mãe e do mundo ficaram detidas, suspendendo a relação
simbólica com as coisas que representam o corpo da mãe, ou seja,
com o meio em que vive. Todo este retraimento constituiu a base da
falta de afeto e da ansiedade. Por fim, a formação de símbolos se
detivera pelo temor ao castigo que receberia por parte do pênis do pai
quando houvesse penetrado o corpo da mãe.
A dificuldade de alimentação seria explicada por defesas contra seus
impulsos destruidores ao mastigar os alimentos. Não podia manejar
talheres e facas, também por defesa contra os impulsos sádicos
dirigidos contra o corpo materno.
Dick rompeu os laços com a realidade refugiando-se no corpo vazio e
escuro de sua mãe e afastando sua atenção dos diversos objetos do
mundo que representavam o conteúdo do corpo de sua mãe – o pênis
do pai, fezes. Por serem agressivos, ele precisava se desfazer do
próprio pênis e dos seus excrementos.
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Evolução do caso de Dick

Em questão de meses, o quadro de Dick teve uma melhora


surpreendente. Melhora essa que pode ter sido favorecida por ele ter
ido morar com a avó, mais afetuosa, aos dois anos, e por ter trocado
de uma ama seca para uma mais afetuosa. O menino começou a
manifestar angústia, passando a chamar Klein e depois a
demonstrar que sentia falta da ama-seca. Houve aumento do
interesse pelos objetos e por palavras tranquilizadoras, e uma
transferência cada vez mais intensa com a analista. Dick passou a
demonstrar interesse por sentir-se compreendido, começou a usar
seu vocabulário, mesmo que ainda pobre. Tornou-se mais afetuoso
com a mãe e a ama-seca. Apareceram, também, indícios de uma
atitude edípica normal em relação ao pai. Muitos dos problemas
peculiares que se apresentaram, demonstraram ser solucionáveis.

A questão do diagnóstico

Dick fora diagnosticado como um caso de demência precoce pelo Dr.


Forsyth que o encaminhara à psicanalista para tratamento. Para
Klein, quando doutor elaborou o diagnóstico, ele levou em conta
apenas os sintomas da criança (e de fato o quadro clínico coincidia
em muitos aspectos importantes) e não o seu histórico, já que o traço
fundamental no caso de Dick era a inibição do seu desenvolvimento,
e não a sua regressão.
Klein conclui sua análise sem propor um diagnóstico, mas chama a
atenção para que “o conceito de esquizofrenia em particular e de
psicose em geral, tais como ocorrem na infância, deveria ser
ampliado”, afirmando que se assim for feito, se justificará a sua
classificação da enfermidade de Dick como esquizofrenia.
A impossibilidade de Dick em simbolizar e fantasiar a realidade foi
vista por Klein como uma primeira manifestação da esquizofrenia.
Essa forma de compreender o sofrimento psíquico grave de uma
jovem criança serviu de alavanca para o avanço da clínica
psicanalítica com crianças isoladas, posteriormente denominadas de
autistas.
Vale também ressaltar que o autismo, enquanto entidade clínica,
ainda não existia. O termo autismo havia sido empregado por
Bleuler, que o havia cunhado em 1911 para designar um dos sintomas
da esquizofrenia.
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Apenas em 1938 Leo Kanner isolou, dentro do grupo maior das


psicoses infantis, uma nova categoria com suas particularidades
próprias, que segundo ele tinha as características de uma síndrome:
o Autismo Infantil Precoce.
Durante todo o século XX, houve uma séria discordância sobre as
diferenças entre a psicose infantil e o autismo, que ocorreu mesmo
entre psicanalistas de diferentes filiações teóricas. A Associação
Americana de Psiquiatria passou, desde 1994, a tentar produzir uma
uniformidade diagnóstica, a classificar dentro de uma mesma
categoria as crianças que eram anteriormente consideradas
psicóticas e autistas, sem levar em consideração as causas
admitidas.
Em sua quarta edição do Manual de Diagnóstico e Estatística de
Distúrbios Mentais (DSM-IV), às crianças desta ampla categoria foi
atribuído o nome de "portadores de distúrbios globais do
desenvolvimento. "Esta classificação poderia ter facilitado as trocas
entre os profissionais da área, porém ela não produziu um avanço
real na compreensão desses quadros, considerando que fornecia
apenas uma descrição.
Os psicanalistas, então, prosseguem utilizando-se dos diagnósticos
de psicose infantil e de autismo, tentando definir dois quadros
distintos, porém, ainda não chegaram a um consenso sobre o que
sejam verdadeiramente uma psicose infantil ou um autismo infantil,
e tampouco sobre a sua etiologia.

ESTUDO DE CASO: WINNECOTT

Winnicott explicitou várias anomalias, problemas insolúveis da


psicanálise freudiana, e as usou para justificar, inicialmente, a sua
pesquisa revolucionária e, em seguida, para oferecer razões a favor
das mudanças paradigmáticas conceituais ou processuais que
introduziu.
Exemplos típicos de casos anômalos estão na categoria das psicoses,
das dissociações graves e da atitude antissocial. O caso Jung,
reconstituído por Winnicott na resenha da autobiografia de Jung
como exemplo de esquizofrenia infantil decorrente da depressão
materna e do posterior distanciamento entre os pais, é uma
ilustração particularmente esclarecedora dos limites da psicanálise
freudiana praticada no referencial da teoria das neuroses baseada
na teoria da sexualidade.
Ao mesmo tempo, Winnicott apresentou um número impressionante
de casos resolvidos com sucesso na sua nova matriz disciplinar.
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Um dos mais conhecidos é o caso B, que demonstra, entre outras


coisas, a eficácia do procedimento winnicottiano de manejo,
acompanhado de um uso de interpretação diferente daquele da
psicanálise tradicional, servindo mais de meio para revelar o sentido
da situação do paciente e para fazer comentários a respeito do que
como desvendamento do recalcado. Esse caso também oferece claras
indicações da insuficiência do modelo edipiano para a análise de
problemas da depressão psicótica e até mesmo da sexualidade dos
pacientes com esses distúrbios
Esses e outros tantos atendimentos relatados por Winnicott, que
exemplificam soluções bem-sucedidas, são legítimos constituintes
do que podemos chamar de ciência normal winnicottiana, servindo
de provas da sua teoria e de guias para o ensino e para a realização
de pesquisas.
Outros casos são apresentados por Winnicott como exemplos de
limites do poder solucionador do seu paradigma. A falta de efeito
terapêutico de seus atendimentos é assinalada, por exemplo, na
consulta 7 de Consultas terapêuticas. A consulta 21 do mesmo livro
contém material que obriga Winnicott a reconhecer que a
delinquência potencial do paciente George "não pode ser tratada
adequadamente pelo tipo de trabalho que estou descrevendo neste
livro" (1971b/1984, p. 380).
No final do texto, ele adverte o agente social que o caso poderá
terminar nos tribunais e acrescenta: "O procedimento está em
discussão, mas deixei claro que sabia que, mesmo que eu pudesse
compreender [o caso] em termos da etiologia, eu não podia alterar o
problema básico dessa família nem o de George".
Aqui temos uma evidência a mais para a repetida afirmação de
Winnicott de que, dependendo das circunstâncias, o tratamento de
crianças antissociais pode estar fora do alcance da psicanálise,
mesmo ampliada à maneira de Winnicott.
Tampouco são raros os casos nos quais o psicanalista admite seus
erros terapêuticos, entre eles os de interpretação, por esta ter sido
feita cedo demais ou por ter caminhado na direção errada (confira a
sessão do dia 10 de fevereiro de Holding e interpretação). Convém
notar que relatos de análise com Winnicott feitos por Harry Guntrip
e Margaret Little oferecem tanto exemplos negativos de
procedimento psicanalítico tradicional quanto exemplos positivos
referentes ao trabalho dele.
Um grupo de casos do estudioso tem a função específica de ilustrar a
formação de conceitos winnicottianos, tanto teóricos como clínicos;
um outro grupo contém material que serve para ensinar os
procedimentos winnicottianos de resolução de problemas clínicos,
isto é, as suas novas práticas clínicas.
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Um número significativo de casos do primeiro grupo ilustra conceitos


de distúrbios do tipo especificamente winnicottiano, que não
resultam, como os da psicanálise tradicional, de conflitos pulsionais
intrapsíquicos ou de frustrações externas das moções pulsionais,
mas revelam problemas no processo de amadurecimento pessoal.
O seu estudo permite que se examine tanto a etiologia como a
natureza desses tipos de problemas psíquicos, por exemplo: o caso da
Senhora H exemplifica a necessidade de reviver a experiência
malsucedida de nascimento; o caso Bob traz um exemplo de
esquizofrenia infantil e o caso FM contém o material relativo a uma
dissociação primitiva da personalidade; o caso menino do cordão faz
ver o processo pelo qual objetos transicionais se tornam fetiches,
num sentido radicalmente diferente do de Freud; o caso Liro ilustra o
processo de personalização de um menino que nasceu com um
defeito físico; e o caso Hesta refere-se a problemas da integração do
corpo na adolescência.
Nota-se que um mesmo estudo pode apresentar material relativo a
problemas de várias épocas da vida, o que não significa, contudo, que
não seja possível identificar um distúrbio inicial que está na base de
todas as formações defensivas posteriores.
Ao grupo de exemplares que ilustram de modo particularmente claro
a técnica winnicottiana, ou seja, seus procedimentos de cura de
distúrbios clínicos, pertencem, além do caso Piggle, os casos Patrick,
Philip e Kathleen, que trazem materiais preciosos relativos a uma
das maiores inovações introduzida por Winnicott na prática clínica
psicanalítica, o manejo. A mesma prática é ilustrada
detalhadamente por vários casos de Consultas terapêuticas. O caso
Cecil, por exemplo, é uma excelente apresentação do conceito
ampliado de manejo ou do seu uso fora do setting analítico
propriamente dito. No relato de todos os casos tratados por
Winnicott, entre eles os casos Piggle, B e o da moça que sonhou com
a tartaruga, podem-se encontrar exemplos do uso modificado que
Winnicott faz da interpretação.
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CASOS INTRODUTÓRIOS E AVANÇADOS

Os casos usados no treinamento dos iniciantes não são


necessariamente os mesmos usados na resolução de problemas pelos
psicanalistas de ponta. E Winnicott sabia disso. O caso Piggle é
apresentado de forma a servir para o ensino sistemático da
psicanálise winnicottiana, tanto da sua parte teórica como da
clínica. Já os casos do livro O Brincar e a Realidade, em particular os
dos capítulos 2 e 4, trazem pontos teóricos e clínicos muito
sofisticados e não convém usá-los no ensino elementar. Nota-se
ainda queos casos de neuroses são mais simples teoricamente e
menos exigentes pessoalmente para ao analista que os de psicose,
razão pela qual o treinamento na solução desses casos deveria
preceder o treinamento no tratamento das psicoses.

Casos históricos e vinhetas

Como em Kuhn, os casos winnicottianos são ora fragmentos


detalhados de análises efetivamente realizadas, contendo
descobertas decisivas que marcaram o desenvolvimento da
psicanálise winnicottiana e o levaram a modificar o paradigma da
psicanálise, tanto do ponto de vista teórico quanto clínico; ora
versões idealizadas desses resultados na forma de vinhetas.
Os casos do primeiro tipo encontram-se em obras tais como Holding
e interpretação, que relata o conteúdo das sessões com o paciente B
durante os primeiros sete meses de 1955. Nesse relato, Winnicott não
apenas aponta as deficiências do paradigma freudiano, como põe à
mostra o andamento do processo analítico que o levou a descobrir
conceitos novos e atitudes novas: a diferença entre retraimento e
regressão, o reconhecimento da relação mãe-bebê como modelo da
relação entre analista e pacientes regredidos, o acolhimento da
regressão ao colo do analista, o manejo da dependência no setting
analítico etc.
O caso Piggle (1964-1966) evidencia a descoberta da psicanálise
compartilhada e da psicanálise praticada sob demanda. E o caso FM
contém dados clínicos relativos a uma dissociação da personalidade,
que forneceram pontos de partida para uma outra descoberta: a da
sexualidade com base na raiz identitária. Esses e outros textos
merecem ser tratados como "clássicos" para o estudo da história da
psicanálise winnicottiana.
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Na qualidade de vinhetas, os exemplares são as soluções de


distúrbios apresentadas de maneira esquemática, fora do contexto
geral da análise como um todo e, nesse sentido, idealizadas.
Para o ensino básico (esclarecimento inicial de questões conceituais
e de técnica), os exemplares "idealizados" são muito mais
apropriados, não só na física – Kuhn deixou bastante claro esse
ponto –, mas também na psicanálise. Eles são formulados na forma:
"Neste estágio, se tudo correr bem, o bebê... Se o ambiente falhar, o
bebê...". Podem ser usados, é claro, também as vinhetas de
Winnicott, como a de um menino psicótico que precisava nascer no
colo dele, sem explicitar, como acontece no relato sobre a Piggle, por
exemplo, o quadro geral no qual surgiu tal material.
Em Winnicott também se aplica a observação de que os exemplares
são objeto de constante reinterpretação, que faz parte da
permanente rearticulação da teoria. No interior da clínica dele,
vários exemplares passaram por uma evolução, como condição e
como reflexo do progresso da pesquisa. Em 1953, o estudioso
introduziu o conceito de objeto transicional − distinto de objeto
interno, que é mental, e do objeto externo, que é objetivamente
percebido.
Em textos posteriores, ele vai opor o objeto transicional ao objeto
subjetivo, que não é nem interno nem externo. Mais tarde ainda, ele
reformulará a sua teoria de relações objetais em termos da
diferença, conceitualmente nova, entre ser e fazer.

O ensino de casoswinnicottianos

Conforme vimos, Kuhn propõe diferentes maneiras de ver e praticar


o ensino e o aprendizado dos casos – pelo estudo historiográfico, por
meio de comentários clínicos e teóricos, pela aplicação prática da
psicologia cognitiva (processamento de estímulos) e das
neurociências ou pelos exercícios e verbalização. Várias dessas
modalidades estão presentes em Winnicott.
Ele recomenda explicitamente o estudo dos clássicos da história da
psicanálise. Em Natureza humana, após apresentar uma teoria
própria das fases do desenvolvimento instintual, ele escreve: "O
leitor deve formar uma opinião pessoal sobre esses assuntos, depois
de aprender o que é ensinado tanto quanto possível de maneira
histórica, que é o único caminho pelo qual uma teoria, num dado
momento, torna-se inteligível e interessante" (1988/1990, p. 42).
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Mais adiante, acrescenta: "Não há nenhum exemplo melhor para a


necessidade de perspectiva histórica na leitura de teoria
psicanalítica do que aquele relacionado às raízes precoces da
genitalidade feminina".
O que vale para o aprendizado da teoria vale certamente também
para os casos clínicos nos quais esta se baseia. As sociedades
psicanalíticas reconheceram cedo que uma das maneiras mais
eficientes de ensinar a psicanálise de Freud consistia no estudo de
casos descritos por ele que ilustram suas descobertas
revolucionárias.
Da mesma forma, creio ser particularmente instrutivo aprender a
psicanálise winnicottiana com base nos casos que motivaram sua
pesquisa revolucionária e que, em seguida, foram usados por ele
próprio para resolver problemas não solúveis no paradigma
freudiano.
Nesse sentido, convém fazer um paralelo entre a prática
psicanalítica, estabelecida a partir dos anos 1920, de analisar todo o
material clínico à luz do complexo de Édipo (criança na cama da
mãe) e a exigência, imposta a Winnicott pela clínica, de tratar os
casos de esquizofrenia tomando como modelo os problemas
ambientais (o bebê no colo da mãe).
Como disse anteriormente, o caso B de Holding e interpretação,
sobretudo o material contido na introdução a esse livro escrita por
Masud Khan, pode ser usado como uma das fontes históricas da
convicção de Winnicott de que a psicanálise edipiana esgotou seus
recursos teóricos e clínicos.
O mesmo texto é também a principal fonte para o estudo histórico de
descobertas winnicottianas decisivas, entre elas as do caráter
exemplar da situação do bebê no colo da mãe, do valor da regressão à
dependência e do manejo desse tipo de relacionamento do paciente
com o analista. Resta, portanto, toda uma pesquisa a ser realizada a
respeito dos múltiplos casos espalhados pela obra de Winnicott que
inspiraram outras descobertas importantes, tanto clínicas como
teóricas, entre elas a ampliação da distinção entre os objetos
inicialmente apresentados pelas mães aos seus bebês e os objetos
objetivamente percebidos, feita, por ele, nos anos 1940.
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Já nessa época, os primeiros objetos de um bebê foram concebidos


como criados pelos bebês em virtude da criatividade originária. Em
seguida, esta tese foi ampliada para envolver a criação do espaço
transicional e a criatividade que é exercida nesse espaço (1953). Na
sequência, a própria realidade externa era dita criada pelo bebê,
num texto tardio de 1968 ("O uso de um objeto"). Depois de 1966, a
distinção entre ser e fazer também é remetida a diferentes modos de
relacionamentos com objetos. Tudo isso é parte essencial da história
da psicanálise winnicottiana, importante e visível na sua obra, mas
apenas parcialmente estudada até o presente momento.
Isso decorre do fato de que nem o paradigma freudiano nem o
winnicottiano podem ser ensinados por manuais. Contudo, no seu
relato do caso Piggle, Winnicott chega, tanto quanto possível, perto
de um manual.
O material é dividido em anotações relativas a sessões, comentários
de pontos significativos e explicitação de elementos da teoria do
amadurecimento usados na compreensão e na conduta do caso.
Além disso, como indiquei anteriormente, as vinhetas, exemplares
esquemáticos, são perfeitamente apropriadas para esse fim.
Deixarei em aberto aqui a questão de saber como as teses da
psicologia cognitiva assimilada por Kuhn poderiam ser aplicadas ao
ensino e à articulação adicional do paradigma winnicottiano, por
exemplo, ao ensino e desenvolvimento da teoria dele do
reconhecimento da mãe pelo bebê.
Diferentemente de Kuhn, Winnicott não pensa que o bebê reconhece
a mãe em primeiro lugar, ou mesmo exclusivamente, pelas
apresentações sucessivas sensoriais, ou seja, mediante dados
cognitivos, mas pelos cuidados que recebe dela. O reconhecimento é
de ordem prática, não cognitiva ou, mais precisamente, não
representacional. O mesmo vale para o reconhecimento da
identidade de objetos transicionais etc.
Os recentes avanços de neurociências parecem oferecer mais
chances de diálogo produtivo. Essas disciplinas dispõem de grande
número de casos clínicos (veja, por exemplo, os casos de distúrbios
apresentados por António Damásio em suas diferentes obras), que as
levam a atribuir uma importância decisiva ao relacionamento
efetivo das mães com os bebês no desenvolvimento, não somente da
capacidade emocional, mas também das aptidões cognitivas e
processuais.
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Isso indica que casos e verbetes winnicottianos relativos a esse tipo


de relação (e certamente os que dizem respeito a outros tipos de
relacionamento) poderiam ser traduzidos para a linguagem dessas
disciplinas e ensinados com a ajuda destas – uma tarefa que pode ser
vista como relativa à articulação e ao desenvolvimento do
paradigma winnicottiano.
A terceira modalidade de ensino considerada por Kuhn repousa
sobre a aquisição da linguagem, conforme o linguisticturn ensaiado
por ele nos anos 1980 e 1990.
Essa abordagem poderá ser usada para pôr em evidência várias teses
de Winnicott relativas ao discurso psicanalítico, em particular:
1) a distinção entre termos teóricos ("terms") e descritivos ("words"),
emprestados da linguagem cotidiana,
2) a interpretação verbal do sentido do comportamento e dos
sintomas,
3) a insuficiência da linguagem sexual e metapsicológica da
psicanálise tradicional para essa tarefa, e
4) a necessidade de usar, na descrição de cada fase de
amadurecimento, uma linguagem diferente, ou seja, termos teóricos
e palavras descritivas apropriadas para os estados de coisas em
pauta.
Em consonância com a tese de Taylor a respeito do caráter
hermenêutico da interpretação das ciências humanas e com a
generalização dessa tese por Kuhn para as ciências factuais em
geral, o paradigma winnicottiano da psicanálise contém de fato algo
como uma base hermenêutica para a psicanálise, permitindo a
interpretação e a auto interpretação, ambas baseadas na
compreensão de comportamentos humanos em determinados
ambientes e situações.
Não se deve perder de vista, contudo, que para Winnicott essas
operações têm também o caráter pré-verbal, "intuitivo". Ele mostrou
que os objetos subjetivos (seio, leite, mãe, braços da mãe) são
identificados pelos bebês e pelos pacientes, sem o uso de conceitos.
Indo além de Taylor, podemos dizer que existe uma dimensão de
dação de sentido por meios não-verbais, temática tratada tanto pela
hermenêutica filosófica do tipo heideggeriano quanto pela
psicanálise winnicottiana.
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Fonte:

KLEIN, M. (1981). Contribuições à Psicanálise (2ª ed.). (M. MAILLET,


Trad.). São Paulo: Mestre Jou. 539p. (Obra original publicada em
1947).

Klein, Melanie (1978). Obras Completas II: contribuciones al


psicoanalisis. La importancia de la formación de símbolos em
eldesarrollodelyo. Buenos Aires: PAIDOS-HORME.

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