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ANEMIA HEMOLÍTICA HEREDITÁRIA

Anemia hemolítica é a destruição precoce das hemácias (menos que 120 dias)

Laboratório típico de hemólise: reticulócitos aumentados, haptoglobina reduzida (rapta


hemoglobina livre), bilirrubina indireta aumentada e LDH aumentado

Tipo de hemólise:

 Extravascular: baço, macrófagos (esferocitose hereditária, autoimune quente,


hiperesplenismo, talassemias)
 Intravascular: tende a apresentar produtos renais no exame de urina,
hemoglobinúria, hemossiderina por exemplo (deficiência de G6PD, autoimune
fria, PTT, HPN)

Classificação da anemia hemolítica:

 Defeito intrínseco: de dentro da hemácia


- Na membrana (esferocitose, HPN)
- Em enzimas: deficiência de G6PD
- Hemoglonopatias: anemia falciforme, talassemia
 Fator extrínseco: de fora da hemácia
- Hiperesplenismo
- Anemia hemolítica autoimune
- Anemia hemolítica microangiopática

ANEMIA FALCIFORME

Incidência: maior prevalência na Africa, mas também muito prevalente no Brasil e India
(no Brasil 4% na população geral tem traço falciforme, principalmente nas regiões com
predominância negra)
Genética: a doença é uma hemoglobinopatia, onde há uma mutação da hemoglobina
beta

Alfa + beta = A (principal hemoglobina do adulto)

Alfa + delta = A2

Alfa + gama = fetal

No período fetal temos a hemoglobina fetal mais prevalente (alfa+gama)  logo após
o nascimento a hemoglobina A1 começa a subir (se a criança nasce com anemia
falciforme a hemoglobina A é trocada por hemoglobina S, por isso que após os 6 meses
de vida que os sintomas começam a aparecer)

Tipos de doença falciforme (todas as heranças com hemoglobina S):

 Quando vem em homozigose é a anemia falciforme (SS)


 A gravidade oscila de acordo com o genótipo:
- SS e Sbzero (quando não produz nada de beta) são as mais graves

Diagnostico laboratorial:

 Hemograma – anemia:
- Normocítica e normocromica (VCM e HCM normais) quando SS/SC
 Provas de hemólise:
- Reticulocitose, LDH e BI elevados
 Confirmação:
- Eletroforese de hemoglobina
- HPLC
- Eletroforese capilar

Fisiopatologia da doença falciforme:

1. Polimerização da hemoglobina S dentro da hemácia


Há uma mutação na posição 6 do gene da betaglobina do cromossomo 11 (ao
invés de um acido glutâmico entra uma valina) – isso muda a carga elétrica da
globina e confere a capacidade de se polimerizar, ou seja, fica mais rígida. O
eritrócito que tinha uma forma arredondada agora apresenta uma forma de
foice
Quando a oxihemoglobina torna-se em desoxihemoglobina ela falceriza (se a
gente oferece oxigênio ela volta a forma normal, mas com o tempo ela vai
ficando com o formato irreversível)
2. Processo de vasoclusão
Quando as hemácias ficam em formato de foice elas perdem a maleabilidade e
a capacidade de passar por vasos, podendo causar vasoclusão em vasos de
pequeno calibre
Além disso, os leucócitos (neutrófilos) participam da vasoclusao, uma vez que o
processo inflamatório da doença faz com que as células endoteliais expressem
com mais força moléculas de adesão que atraem células da circulação a
aderirem ao endotélio  podendo causar isquemia
3. Processo hemolítico
Sequestro de oxido nítrico (vasodilatador) pela hemólise, assim há
vasoconstrição e fica mais fácil de ocorrer a vasoclusão.
Quanto mais hemoglobina fetal, maior a proteção dos vasos, menor falcização.
Podemos aumentar a hemoglobina fetal pela hidroxiureia.

Quadro clínico:

Evolução grave: pacientes que tem muita dor, AVC ou síndrome torácica aguda

Dactilite:

 Inchaço doloroso das mãos e pés devido a vaso-oclusão e inflamação do


periósteo
 É um processo autolimitado (10 a 15 dias com auxílio de anti-inflamatórios)
 Muitas vezes é a primeira manifestação clínica da infância (6m a 2 anos)

Síndrome torácica aguda:

 Febre, dor torácica, tosse, chiado, hipóxia e infiltrado pulmonar novo


 Comum em crianças, porém mais grave em adultos
 2ª principal causa de hospitalização e principal causa de mortalidade
 Quadro pode deteriorar rapidamente, as vezes com necessidade de ventilação
invasiva
 Aumento da fosfolipase A2
 Suplementar O2 se saturação menor que 92%, controle da dor, profilaxia para
TVP, uso de broncodilatadores de broncoespasmo
 ATB empírico para todos (cefalosporina + macrolídeo), concentrado de
hemácias, prevenção com hidroxiureia

AVC

 Acomete 45 dos pacientes com DF (principalmente de 1 a 9 anos)


 Recidiva elevada
 Oclusão de vasos calibrosos
 Padrão moya-moya (mortalidade maior) – neoformação de vasos
 Eventos neurológicos subclínicos e infartos silenciosos são mais comuns
 AVCi na infância: transfusão de concentrado de hemácias para deixar HbS
menor que 30% (nao usar trombolítico); nos adultos igual a população geral
Crise dolorosa:

 Principal causa de hospitalização e morbidade


 Causada por oclusão microvascular e isquemia tecidual
 Acomete 70% dos pacientes principalmente os SS
 Fatores que predispõe: desidratação, infecção, hipoxia, alterações climáticas.
Mas na maioria das vezes é imprevisível
 Manejam a dor em casa, mas em casos de dor grave devem procurar o hospital
(opioides EV)
- Classificar a dor de 1-10
- Morfina dose inicial 0,1mg/kg
- Reavaliar a cada 15 a 30 min
- Tempo médio de hospitalização é de 7 dias
- NÃO DEIXE DE PRESECREVER OPIOIDE EM CRISE ALGICA
 3 ou mais crises dolorosas graves por ano = doença de evolução grave
 Alta: dor menor que 7 ou redução de 2 pontos, controle da dor com medicação
oral, sem necessidade de transfusão, ausência de infecção, sinais vitais estáveis,
agendamento de retorno com hemato
 Prevenção da crise: hidroxiuréia quando 3 ou mais crises graves em 1 ano

Osteonecrose:
Úlcera de perna:

Infecção na anemia falciforme:

 Asplenia funcional (auto-esplenectomia)  perda da função do retículo-


endoteliar
 Infecção por bactérias encapsuladas (pneumococo, H. influenzae)
 Bacteremia 300x acima do normal

Crise aplásica:

 Redução da hemoglobina e reticulocitopenia


 Supressão transitória total ou parcial da eritropoese
 Fator de risco: parvovírus B19
 Tratamento: transfusão de CH
 Diagnostico diferencial: mielotoxicidade por hidroxiureia

Sequestro esplênico:

 Redução da hemoglobina e esplenomegalia


 Acomete até 1/3 das crianças (principalmente de 1 a 4 anos)
 Fator de risco: infecção
 Tratamento: transfusão de CH
 Alta taxa de recorrência: considerar esplenectomia

Crise de falcização hepática aguda:

 Dor em hipocôndrio direito, icterícia, náuseas, febre


 Elevação das transaminases e dos marcadores de colestase
 Tratamento: hidratação + analgesia

Priapismo:

 Ereção peniana persistente não relacionada a desejo ou estímulo sexual


 40% dos pacientes
 Mais de 95% é priapismo isquêmico (diminuição ou ausência de fluxo
sanguíneo nas artérias penianas causado pelo aumento da pressão no corpo
cavernoso levando a rigidez e dor)
 Se menos de 4 horas manejo de casa: ingesta hídrica, analgesia, exercício,
masturbação, compressas
 Se mais de 4 horas: risco de dano permanente (ir para o hospital)
 Se mais de 24 horas: necrose tecidual, fibrose e disfunção erétil

Tratamento:

Fazer em todos: acido fólico + penicilina profilática + vacinação

As vezes: transfusão de sangue, hidroxiureia (quase sempre) e transplante de medula


(único tratamento curativo)

TALASSEMIA

É uma anemia hereditária conhecida como anemia de cooley ou anemia do


mediterrâneo

A talassemia é uma hemoglobinopatia (há uma alteração do DNA que leva a alteração
da globina – cadeia alfa ou beta)

Um individuo com talassemia vai ter uma alteração do DNA que vai fazer produzir
menos globina ou do tipo alfa ou beta – desequilíbrio na síntese de uma globina

 Quando a globina alfa está afetada  talassemia alfa  cromossomo 16 – 4


genes que produzem globina alfa
 Quando a globina beta está afetada  talassemia beta  cromossomo 11 – 2
genes que produzem globina beta

Pacientes portadores são assintomáticos (talassemia menor)

Pacientes doentes se caracterizam por anemia intensa com necessidade de transfusões


de sangue regulares e tratamento para retirar o ferro em excesso do organismo e
graves complicações.

Fisiopatologia:

 A deficiência da produção de cadeias de globina


 Como tem essa deficiência a hemácia não consegue sintetizar a quantidade de
hemoglobina que deveria (hipocromia)  diminuição do HCM
 Hemácia pequena porque não tem uma quantidade suficiente de hemoglobina
 microcítica
 A cadeia alfa ou beta em excesso precipita e forma agregados no interior do
glóbulo vermelho, que causam lesões na membrana e destruição celular
(hemólise) – aumento do LDH
 Alteração de componentes da membrana (canais iônicos, lipídeos e proteínas
 Excesso de ferro: o individuo tem a quantidade necessária de ferro para fazer as
hemácias, mas como está faltando globinas ele não está sendo utilizado por
completo. Além disso, o corpo entende que a diminuição de hemoglobina seria
por falta de absorção de ferro, então passa a absorver mais ferro no intestino.
 Poiquilocitose: presença de hemácias em alvo, formas bizarras de hemácias

Consequências celulares:

 Célula se torna muito deformada, com incapacidade fisiológica na distribuição


de oxigênio
 Alterações nos receptores de membrana
 Alterações morfológicas devido a precipitação de globinas

TALASSEMIA ALFA:

Cromossomo 16: genes da globina alfa

4 genes que atuam para fazer a cadeia alfa (2 genes alfa íntegros em cada um dos dois
cromossomos 16)

A talassemia alfa ocorre quando 1, 2, 3 ou 4 genes alfa estão alterados (1 OU 2 GENES


AFETADOS TRAÇO TALASSEMICO; 3 OU MAIS FORMA GRAVE DA DOENÇA OU
HIDROPSIA FETAL)

Por que a eletroforese de hemoglobina não vai estar alterada? Porque vai diminuir na
mesma proporção A, A2 e Fetal (está faltando alfa para todas!)
A sobra das cadeias beta pode se juntar e formarem cadeias beta4 (HbH)  ela
podemos pesquisar no exame de eletroforese de Hb e também em esfregaço (mas a
HbH é muito instável  precipitação de HbH podemos ver em esfregaço)

HbH

Hemoglobina Bart’s:

 A diminuição da síntese de globina alfa tem inicio na fase fetal, assim o


desequilíbrio ocorre na combinação entre globinas alfa e gama.
 Quando o feto tem talassemia as globinas gama da HbF sobram e precipitam
nos eritrócitos em forma de tetrâmeros de globina gama (g4) e compõe
moleculas instáveis de HbBart’s
 Essas hemoglobinas tem afinidade muito maior pelo oxigênio, ou seja, o
oxigênio não consegue se desligar dela  hipoxia de tecidos

Hemograma:

Portador silencioso (1 gene alterado): Hb perto do limite inferior, VCM levemente


microcítico, morfologia normal

Traço talassemico/alfa menor: anemia discreta (Hb de 11 a 13), microcitose (VCM<80),


hipocromia, discreta anisocitose

HbH: anemia moderada (Hb entre 8 e 11), microcitose e hipocromia (VCM e HCM),
hepatoesplenomegalia, reticulocitose

Hidropsia fetal: anemia grave (Hb<7), muitos eritroblastos, anisocitose, grande


aumento do baço e fígado, morte com poucas horas de nascimento
TALASSEMIA BETA:

Caracterizam-se por uma alteração quantitativa da síntese de globinas beta

 Talassemia beta menor: redução da síntese de cadeia beta (beta+) – predomínio


de HbA2
 Talassemia beta maior: ausência de cadeia beta (beta0) – nenhum dos 2 genes
– predomínio de HbFetal

Lesão genética no cromossomo 11, sendo que temos apenas 2 genes que produzem a
globina beta (1 da mãe e 1 do pai)

Precipitação de globinas alfa  danos a membrana  destruição celular  anemia

Agora a eletroforese de Hb estará alterada: terá um aumento de Hb A2 e Hbfetal, uma


vez que está sobrando alfa

Paciente relata fraqueza, cansaço, dores nas pernas, não responde ao tratamento com
ferro (talassemia beta menor)

Na talassemia beta maior há:

 Anemia grave desde o nascimento


 Deformações ósseas (devido a expansão da medula óssea do tecido
hematopoiético)

 raioX de crânio com estriacoes em forma de pente (parece cabelo), por causa
da expansão do tecido hematopoiético da medula ossea

 Atraso do crescimento (estatura menor, ausência de desenvolvimento de


órgãos sexuais)
 Hepatoesplenomegalia em acentuado grau
 Febre e vômito
Hemograma:

 Quantidade de hemácias normal


 Hb baixa discretamente
 VCM diminuído
 HCM diminuído
 Morfologia: microcito, dacriocitos, pontilhados basofílicos

Testes específicos:

 Talassemia beta menor:


- HbA2 aumentada (4 a 7%) em 95% dos casos
- HbFetal normal ou discretamente aumentada
 Talassemia beta maior:
- Anemia e hipocromia de grau acentuado
- Anisocitose (+++), esquizócitos, formas bizarras
- Eritroblastos (+/+++)
- HbFetal aumentada em todos os casos (20 a 95%)
- Reticulócitos aumentados (por que está liberando células jovens)
- BI aumentada
- Ferritina aumentada, ferro sérico aumentado
- Hiperplasia eritrocitária (medula)
- Transfusão regular

ESFEROCITOSE HEREDITÁRIA

É causa mais comum de anemia hemolítica causada por defeito em membrana e é


resultado de alterações em genes que codificam proteínas de membrana

Geralmente autossômica dominante

É mais comum ser uma esferocitose moderada

Esferócitos são hemácias que reduziram sua flexibilidade e quando vão passar por
vasos menos calibrosos sofrem hemólise (hemólise extravascular - esplenomegalia)

Características:
 Anemia normo ou microcítica (CHCM aumentado - hipercromica)
 Icterícia
 Esplenomegalia
 Colelitíase em até metade dos adultos

O diagnostico se da pela curva de fragilidade osmótica desviada para a direita (quando


coloca em um meio muito hipotônico = hemólise; paciente com esferocitose a hemácia
é mais suscetível a lise osmótica, vai formar uma curva desviada para direita!!!)

Tratamento: Suporte!!

 Não há tratamento para defeito de membrana


 Acido fólico
 Transfusões de anemia grave

DEFICIÊNCIA DE G6PD

Distúrbio enzimático mais comum das hemácias

A enzima G6PD participa no:

 Metabolismo contribuindo com a geração de NADPH


 Protegendo a célula contra dano oxidativo

Doença ligada ao X (tipicamente os homens são afetados e as mulheres portadoras)

Classificação:

 Classe I – deficiência enzimática grave (< 10%); anemia hemolítica crônica


 Classe II – deficiência enzimática grave (< 10%); hemólise intermitente
 Classe III – deficiência enzimática moderada (10-60%); hemólise intermitente
 Classe IV – normal; ausência de deficiência enzimática ou hemólise
 Classe V – aumento da atividade (> 2x normal); não tem significado clínico

Manifestações clínicas (dependem da gravidade do defeito enzimático):

 Maioria é assintomático e não tem evidência de hemólise em estado basal


 Suspeita: início súbito de icterícia, palidez, urina escura e queda do Hb após
estresse oxidativo (medicações, alimentos ou infecções)
 Hemólise intra e extravascular

Sangue periférico:
Diagnóstico:

Testar atividade enzimática e análise molecular em:

 Anemia hemolítica com coombs negativo inexplicado

Tratamento:

 Não há tratamento específico


 Tratamento de suporte a depender da apresentação clínica
 A principal estratégia é evitar o uso de medicações que levem a hemólise por
stress oxidativo

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