Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
IMPLANTATÓRIO1
por Silmara Juny de Abreu Chinellato 2
1. Introdução
• A revolução biotecnológica na quarta era dos direitos
A “Quarta era dos direitos" 3 é caracterizada pelos avanços tecnológicos no âmbito da
Genética e da Medicina, bem como das Telecomunicações, com grande impacto no âmbito
jurídico.
Para Van Rensselaer Potter 4 a ponte entre as culturas científica e humanista dá origem à
Bioética, que tem como conceito “estudo sistemático da conduta humana no âmbito das
ciências da vida e da saúde considerada à luz de valores e de princípios morais”.
Hans Jonas 5 enfatiza que é no princípio da responsabilidade que se embasa a ética para a
"era da técnica" que busca apresentar critérios rigorosos para nela intervir.
Não há consenso, mas Elio Sgreccia sustenta que três grandes momentos do tratado de
Bioética:
Bioética geral: estudo dos valores e princípios originários da ética médica e fontes
documentais;
Bioética clínica: examina no caso concreto da práxis médica, quais os valores em
jogo e por quais caminhos se poderá encontrar a linha de conduta sem modificar
tais valores;
Bioética especial: analisa os grandes problemas enfrentados no âmbito médico e
no biológico: engenharia genética, aborto, eutanásia, experimentação clínica em
seres humanos.
Técnicas de reprodução assistida propiciaram o surgimento dos "direitos de quarta
geração" 6 e uma nova reflexão acerca da natureza do embrião pré-implantatório
(deslocamento das discussões sobre o nascituro).
2. Tutela civil do nascituro
• Conceito de Nascituro. O embrião pré-implantatório.
O direito brasileiro emprega o termo nascituro: pessoa por nascer, já concebida no ventre
materno.
Há necessidade de que a legislação futura proteja especificamente o embrião pré-
implantatório (fecundação in vitro).
o A propósito há Recomendação do Conselho da Europa que proíbe
experiências que visem criar seres em laboratório (ectogênese).
10
"Tendo em mente que, como indicado na Declaração sobre os Direitos da Criança, a criança, em razão de sua falta de
maturidade física e mental necessita proteção e cuidados especiais, incluindo proteção jurídica apropriada antes e depois do
nascimento".
11 O de ser reconhecido ainda no ventre materno, o de ser representado, o de ser adotado, o de ter curador.
12 Artigos 127, 128, 563, 1. 784, 2.020, todos do Código Civil e os artigos 877 e 878 do Código de Processo Civil.
13 Repetição dos argumentos já apresentados.
Autora considera retrocesso a retirada da previsão expressa sobre adoção do Código,
embora ela possa ser subsumida do art. 2º. Entende necessária a alteração do caput do
art. 1.6201. A adoção de nascituro atende aos interesses dele e dos pais, desde a
concepção, proporcionando-lhe alimentos desde então por meio da assistência pré-natal,
cuja importância foi prestigiada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 7º).
Legislações mais avançadas têm tutela do embrião pré-implantatório, por meio de
curador, permitindo sejam adotados, um dos destinos dignos aos embriões
excedentes. Manter a redação do artigo 372 Código Civil revogado melhor atende
a adoção de nascituros implantados e não implantados.
Art. 2º permite reconhecer o direito a alimentos ao nascituro e investigar a paternidade. O
nascituro pode ser beneficiário de direitos patrimoniais materiais, sendo que o nascimento
com vida apenas os consolida. Código filia-se à corrente concepcionista.
3. Reprodução humana assistida
• Conceito. Aspectos gerais. A falta de regulação específica.
Há impropriedade técnico-vocabular do Código Civil ao tratar das técnicas de reprodução
assistida. Fertilização e concepção são sinônimos, embora na linguagem médica se utilize
“fertilização" e "concepção" na linguagem jurídica.
Os incisos III e IV do artigo 1.597 poderiam empregar a expressão fertilização
homóloga; e o V fertilização heteróloga ou por doador. 14
A autora enumera as principais variações dos procedimentos de fertilização in vitro15. Para
o Direito importa a fertilização homóloga (sêmen do marido ou do companheiro) ou por
doador (sêmen de terceiro). Há, ainda, possibilidade de gestação de óvulo fertilizado por
outra mulher que não a gestatriz e a gestação por substituição. O relevante é enfatizar a
participação de terceiro na geração do nascituro.
É de melhor técnica utilizar "fertilização por doador", pois a denominação
"heteróloga" só se justificaria se o sêmen não fosse humano.
Os incisos I e II do art. 1.597, correspondentes aos do art. 338 do Código de 1916, deve ser
combinado aos incisos III, IV e V, que tratam de reprodução assistida.
Há hipóteses de fertilização em que o lapso de 180 dias não deverá ser considerado
para afastar a presunção de o filho ter sido concebido na constância do casamento.
A fertilização homóloga e implantação de embriões excedentes pode ultrapassar
trezentos dias da dissolução da sociedade conjugal.
• Reflexos no Direito de família e das sucessões
Inseminação post mortem
O sêmen será destruído se não houver manifestação expressa de vontade quanto
à inseminação post mortem.
14 Enunciado 105 da I Jornada de Direito Civil: Art. 1.597: as expressões "fecundação artificial", "concepção artificial" e
"inseminação artificial" constantes, respectivamente, dos inc. III, IV e V do art. 1.597, deverão ser interpretadas como "técnica de
reprodução assistida”.
15 Detalhes técnicos da fertilização que não parecem relevantes para o propósito do texto.
Apesar de o ideal ser a biparentalidade, não se pode afastar a inseminação post
mortem na hipótese de ter havido um projeto biparental em vida identificando-se
a receptora do sêmen.
O Enunciado n. 106 da I Jornada de Direito Civil pressupõe o consentimento
expresso do marido e que a viúva esteja nessa condição para que seja presumida a
paternidade, qualidade essa passível de boa polêmica.
Admitida a inseminação post mortem, não deve haver discriminação ao filho assim
gestado, subtraindo-lhe quaisquer direitos e status.
o A inseminação post mortem é admitida com reservas pela legislação
estrangeira, que prevê a possibilidade de não repercutir nos direitos
patrimoniais, o que não é compatível com a igualdade de todos os filhos
acolhida pela norma constitucional.
Irrevogabilidade do consentimento do marido
José Carlos Moreira Alves critica o inciso V do artigo 1.597, pois não haveria
presunção, como prevê o caput, se há prévia autorização do marido.
A irretratabilidade significa que, uma vez realizada a fertilização com sêmen de
doador com o consentimento do marido, ele não mais pode se retratar. Se não foi
feita, o consentimento é, em tese, retratável.
Questão polêmica é a disputa entre a mulher, agora infértil que quer a implantação,
e o ex-marido que não a quer. Para evitar a destruição de embriões excedentes,
melhor será implantá-los na mãe biológica do que encaminhá-lo à adoção. Nesse
caso, pai será o marido ou companheiro da gestatriz que concordou com a
implantação.
A irretratabilidade decorre do sistema civil de proteção da filiação e dos Direitos da
Personalidade. O reconhecimento de filhos havidos fora do casamento é
irrevogável 16. No mesmo sentido, os artigos 1.609 e 1.610 do Código Civil e artigo
48 do Estatuto da Criança e do Adolescente quanto à adoção.
o A autora concorda com a irretratabilidade do consentimento prevista no
Enunciado n. 258 da III Jornada de Direito Civil 17.
As normas só aludem a reconhecimento de filho fora do casamento pois, os havidos
do casamento presumem-se do marido.
A revogabilidade do consentimento do marido só pode ser aceita, em tese, antes
da fertilização. A partir desse momento deve ser considerada a proteção jurídica ao
nascituro.
A falta de autorização prévia do marido para a fertilização heteróloga configura
violação de deveres conjugais, sendo causa para separação judicial culposa
(“adultério casto”), pela quebra do dever de respeito e considerações mútuos ou