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RESUMO
1 INTRODUÇÃO
A Língua Brasileira de Sinais, por séculos, sofreu e ainda sofre com julgamentos
simplistas e preconceituosos que consideram a língua de sinais “[...] não como língua de
comunicação entre os surdos, mas como mímica. E seus usuários – os surdos, como inferiores
aos ouvintes” (OLIVEIRA et. al., 2011, p.8). No entanto, “Linguisticamente, pode-se afirmar
que a língua de sinais é língua porque apresenta características presentes em outras línguas
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Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Letras como um dos pré- requisitos para aprovação na
disciplina Prática de Pesquisa em Língua Portuguesa.
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Discente do IX Semestre do curso de Letras da Universidade Estadual de Santa Cruz.
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Discente do IX Semestre do curso de Letras da Universidade Estadual de Santa Cruz.
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Prof.ª Dr.ª do Departamento de Letras e Artes da Universidade Estadual de Santa Cruz e orientadora do
trabalho.
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Prof. do Departamento de Letras e Artes da Universidade Estadual de Santa Cruz e orientador do trabalho.(
wolney_22@yahoo.com.br
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naturais e, essencialmente, porque é humana” (GESSER, 2009, p.27). Além disso, “[...] esta
apresenta características semelhantes às outras línguas, como as diferenças regionais,
socioculturais e sua própria estrutura gramatical bem elaborada” (OLIVEIRA et. al., 2011,
p.4).
O desconhecimento também se dá no que se refere à cultura dos surdos, pois visto
que estes estão inseridos numa comunidade onde a maioria é ouvinte é de se esperar que “[...]
não conseguem receber através da oralidade o repasse cultural, uma vez que uma das vias de
maior repasse cultural é a língua” (OLIVEIRA, et.al., 2011, p.3). Assim, é importante
reconhecer que “O surdo tem diferença e não deficiência [...]” (PERLIN, 2005, p.56), e,
diferente dos ouvintes, que se comunicam oralmente, “[...] as pessoas surdas necessitam da
língua de sinais e das experiências visuais para realizarem uma comunicação satisfatória com
outras pessoas.” (TESKE, 2005, p.148)
Nesse sentido, a Língua Brasileira de Sinais é a língua natural dos surdos e utilizada
por estes para interagirem entre si e se posicionarem, pois “O adulto surdo, nos encontros com
outros surdos, ou melhor, nos movimentos surdos, é levado a agir intensamente e, em contato
com outros surdos, ele vai construir sua identidade fortemente centrada no ser surdo, a
identidade política surda.” (SILVEIRA, 2007, p.160).
Apesar de se provar a legitimidade da Língua Brasileira de Sinais, esta só foi
reconhecida com “[...] o status de L1, ou seja, primeira língua da minoria surda brasileira
através da Lei 10.436 de 24 de abril de 2002” (OLIVEIRA et.al. 2011, p.1). Esse
reconhecimento da LIBRAS, como língua, foi resultado de estudos linguísticos que “[...] no
Brasil estão começando a se estabelecer de forma mais ampla. Esses estudos tiveram início na
década de 80, com Lucinda Ferreira Brito” (QUADROS, 2012, p.1).
O trabalho aqui desenvolvido não tem por objetivo trazer novos conceitos acerca da
estrutura da LIBRAS, mas sim fazer uma reflexão embasada em pesquisas já existentes a fim
de exercer um senso crítico e não se limitar a um conhecimento superficial e limitado acerca
dessa língua que, assim como as demais, é caracterizada pela complexidade. Assim, tornam-
se bastante pertinentes as palavras de Bagno (2004, p.58) “[...] é investigando, explorando,
pesquisando a realidade dos fatos que nós podemos construir, produzir nosso próprio
conhecimento, descobrir o verdadeiro funcionamento das coisas, que muitas vezes poderá ser
diferente daquilo que a tradição nos ensinou”.
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A Universidade de Gallaudet foi fundada por Edward, filho do americano Thomas Hopkins Gallaudet que,
desacreditado no método de oralização, foi para França em busca de ajuda para a filha surda de seu vizinho,
Alice Cogswell de oito anos. Na França, Gallaudet teve contato com o surdo Laurent Clerc, aprendeu a língua
francesa de sinais e convidou Clerc para os Estados Unidos onde em 1817 fundaram a primeira escola surda que
recebia surdos de vários países e que serviu de modelo para a abertura de outras escolas. Em 1864, o filho de
Gallaudet fundou a Gallaudet University (LANE, 1984 apud GESSER, 2009).
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tradicionalmente a visão de língua tem sido fortemente pautada por uma perspectiva
essencialmente oral-auditiva” (GESSER, 2009, p. 55). Aliado a isso, existe o
“desconhecimento no que se refere não só à cultura, mas também à língua utilizada pela
comunidade surda” [...] que “faz com que muitos concebam os sinais como mímica gestual ou
uma forma de imitação de outra língua, sem estatuto de língua” (OLIVEIRA et. al., 2011,
p.3).
Assim, torna-se necessário o desenvolvimento de pesquisas que propõe “[...]
descrever as Línguas de Sinais- sua estrutura, variações dialetais das diversas comunidades
surdas, mudanças ao longo do tempo, influências dos gestos “caseiros” etc que são
características próprias das línguas naturais” (VALIANTE, 2009, p.49).
Segundo Tarallo (1999), a partir de 1960, surgiu uma nova maneira de estudar a
língua, considerando os fatores sociais da comunidade para explicar as mudanças que ocorrem
na língua e os vários modos de falar das pessoas. Essa corrente é denominada Sociolinguística
e tem como principal representante Willian Labov, que desenvolveu um modelo de
procedimentos que tornou possível a investigação de fatores internos e externos que podem
aumentar ou diminuir a frequência de determinadas variantes linguísticas resultando, assim,
na heterogeneidade da língua.
Segundo Valiante (2009, p.49), “[...] o embasamento teórico da Sociolinguística [...]
pode ser estendido aos estudos das Línguas de Sinais e das comunidades surdas” (p.50),
lembrando que “O aspecto que diferencia as Línguas de Sinais das Línguas orais/auditivas é
que utilizam a modalidade espaço-visual”.
Os estudos sociolinguísticos constatam o fato de que os brasileiros, apesar de falarem
a mesma língua, o português, não apresentam uma uniformidade nem uma homogeneidade,
pelo contrário, existem variações em vários níveis “fonológico (pronúncia), morfológico
(palavras) e sintático (sentenças)” resultantes de fatores “sociais de idade, gênero, raça,
educação e situação geográfica” (GESSER, 2009, p.39). Por que seria diferente com a Língua
de sinais? Assim:
[...] os surdos adultos e adolescentes variam em seus sinais, da mesma forma que os
surdos cearenses, paranaenses, cariocas... Quem já não ouviu alguém dizer ‘esses
sinais são ‘antigos’, do tempo dos avós!’ ou ainda ‘naquele lugar se fala diferente’.
Essa diferença não deve ser encarada como erro [...] (GESSER, 2009, p.39).
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Bagno (1999, p.52) explica a variação apontando que “nenhuma língua é falada do
mesmo jeito em todos os lugares, assim como nem todas as pessoas falam a própria língua de
modo idêntico”. Assim, “[...] a LIBRAS também varia no território brasileiro, apresentando
regionalismos, variedades e ‘sotaques’, de norte a sul [...]” (GESSER, 2009, p.81). É o que
mostram as variações acima. Portanto, são indispensáveis as seguintes palavras:
visual na LIBRAS, embora tenhamos como recuperar o fato de ser um item lexical da língua
falada” (QUADROS, 2012, p.6).Por exemplo....
Além disso, os empréstimos também acontecem quando o usuário recorre para o
grupo onde está inserido para se expressar e se comunicar a exemplo do grupo familiar , e,
mesmo que esses sinais não sejam conhecidos pela maioria dos surdos, ainda são
considerados como forma legítima de expressão (VALIANTE, 2009). Entretanto, “[...] o
surdo só poderá desenvolver verdadeiramente um repertório linguístico, isto é, dominar uma
gama de variedades (sociais, profissionais, geográficas, estilísticas, etc) que lhes permitam
comunicar-se em diversas situações, se aprender a Língua de Sinais.” (VALIANTE, 2009,
p.58).
Segundo Gesser (2009, p.54), a afirmação “o surdo tem uma identidade e uma
cultura própria” é relevante ao passo que intenta tornar visível um grupo excluído pela
maioria dominante, no entanto, essa ideia é essencialista e “[...] uma ‘pseudo’uniformidade
coletiva [...]” (p.53, grifo do autor), pois “não se pode criar o mito de que o surdo não
compartilharia de outras culturas como, por exemplo, das culturas ouvintes”.
Na atual sociedade globalizada, a busca pela autoafirmação, é caracterizada, segundo
Bauman (2005), pela evasibilidade e imprevisibilidade, assim, é impossível encontrar uma
essência, pois trata-se de uma busca inacabada. Além disso, é importante considerar o caráter
ambíguo da identidade cujas “[...] intenções includentes se misturam com suas intenções de
segregar, isentar e excluir”, pois ao mesmo tempo em que se trata de uma luta por espaço,
tanto o grupo ameaçado, como o ameaçador tendem a lutar para se sobreporem um sobre
outro, sem levar em conta a diferença (BAUMAN, 2005, p.85). Segundo Hall (2006), a
construção identitária, é um processo instável, possui um caráter pluralizante, e se forma
continuamente sem alcançar uma plenitude.
Portanto, a busca identitária, pela comunidade surda, trata-se de uma busca constante
e marcada pela pluralidade, e, sobretudo trata-se de uma estratégia “[...] para que a cultura
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dominante não reforce as posições de poder e privilégio” (PERLIN, 2005, p.57), pois para
Teske (2005) existe o que ela denomina de “cultura ouvinte elitista ocidental” (p.146) que
desconsidera o seguinte fato:
Além disso, essa autoafirmação contesta os discursos ouvintistas 7 acerca dos surdos
e a “[...] hegemonia discriminatória de sua produção cultural” (PERLIN, 2005, p.55).
Portanto, trata-se de contestar o ouvintismo e reconhecer o sujeito surdo sob um outro olhar:
Para identificar a marca ‘surdo’ que apresentamos, preciso aproximar o que é fácil
entender por sujeito surdo. [...] Os surdos são surdos em relação à experiência visual
e longe da experiência auditiva. Essa diferença que separa a identidade surda e a
identidade ouvinte também é relatada noutro depoimento da mesma mulher surda:
Um dia descobri que nunca iria falar como os ouvintes, seria mesmo impossível. Era
preciso pegar o meu jeito próprio de ser surda, de ter minha comunicação visual
(PERLIN, 2005, p.54).
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“Academicamente, esta palavra- ouvintismo- designa o estudo do surdo do ponto de vista da deficiência, da
clinicalização e da necessidade de normalização” (PERLIN, 2005, p.59).
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[...] ser surdo é pertencer a um mundo de experiência visual e não auditiva. [...] A
cultura ouvinte no momento existe como constituída de signos essencialmente
auditivos. [...] Um surdo não vai conseguir utilizar-se de signos ouvintes como, por
exemplo, a epistemologia de uma palavra. Ele somente pode entendê-la até certo
ponto, pois a entende dentro de signos visuais. O mesmo acontece com a pronúncia
do som de palavras (PERLIN, 2005, p.56).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Podemos citar, como exemplos, os sites: http://www.dicionariolibras.com.br/website/portifolio_imagem.asp?
id_categoria=241&cod=124&idi=1&moe=6 e http://valpimentinha.blogspot.com.br/2011/06/dicionario-de-
libras-on-line.html
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REFERÊNCIAS
BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico: o que é, como se faz. São. Paulo: edições
Loyola, 1999.
GESSER, Audrei. LIBRAS? Que língua é essa? Crenças e preconceitos em torno da língua
de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola Editorial. 2009.
POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. 16ª Reimpressão, Campinas,
SP: Mercado das Letras: Associação de Leituras no Brasil, 2006. (VER DIREITO!)
PERLIN, Gladis T.T. Identidades Surdas. In: SKLIAR, C. (Org.). A surdez: um olhar sobre
as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 2005, 3ª ed.
QUADROS, Ronice Müller. Estudos de línguas de sinais: uma entrevista com Ronice
Müller de Quadros. ReVEL, vol. 10, n. 19, 2012 [www.revel.inf.br].
STROBEL, Karin Lilian. História dos surdos: representações “mascaradas” das identidades
surdas. In: QUADROS, Ronice Muller. PERLIN, Gladis (org.). Estudos Surdos II.
Petrópolis: Arara Azul, 2007.
VALIANTE, Juliana Brazolin Gomes. Língua Brasileira de Sinais: Reflexões sobre a sua
oficialização como instrumento de inclusão dos surdos. 2009.88f.Dissertação (Mestrado
em Linguística)-Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas,
Campinas, 2009. Disponível em:<